Você está na página 1de 116

See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.

net/publication/337657594

"Ano Mundial da Física": A história de Albert Einstein e o papel do jornalismo


mundial.

Book · December 2019

CITATIONS READS
0 199

1 author:

Ricardo Henrique Almeida Dias

20 PUBLICATIONS   29 CITATIONS   

SEE PROFILE

All content following this page was uploaded by Ricardo Henrique Almeida Dias on 01 December 2019.

The user has requested enhancement of the downloaded file.


“Ano Mundial da Física”: A história de Albert Einstein e o papel
do jornalismo mundial

Ricardo Henrique Almeida Dias

1
Índice

Introdução ..........................................................................................................................
Capítulo I - Ano Mundial da Física ................................................................................... 8
Capítulo II - Albert Einstein – Vida e Obra ....................................................................... 23
Capítulo III - Jornalismo científico e o ensino de ciências ................................................ 77
Capítulo IV - Análises dos meios midiáticos ..................................................................... 96

2
Prefácio

O “Ano Mundial da Física”, celebrado há quase 15 anos, foi um ponto marcante na


minha trajetória enquanto pesquisador universitário das áreas de comunicação e educação.
O fato da física entrar na pauta midiática, o que não é muito usual, fez com que me
despertasse o interesse em pesquisar o assunto para o meu trabalho de conclusão de curso
(TCC) de Comunicação Social da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Em 2005,
pude estudar e pesquisar alguns conceitos de física necessários para o entendimento da vida
e da obra científica de Albert Einstein, que na época era celebrado o aniversário de um
século do Annus Mirabilis, o ano que Einstein publicou artigos que revolucionaram a física
no século XX e ajudaram a contribuir para o desenvolvimento da sociedade eletrônica e
digital de hoje. Também pude pesquisar como alguns meios de comunicação trataram do
“Ano Mundial da Física” e o objetivo dos organizadores em dedicar um ano para a
celebração da física. O produto final do TCC, uma monografia, foi defendido no mês de
dezembro de 2005 e teve grande aceitação pela banca. A partir dele pude continuar os meus
estudos de pós-graduação em educação na Faculdade de Educação da Unicamp, tendo por
meta, nos 10 anos vividos em Campinas, o estudo e pesquisa das relações entre
comunicação, educação e ciências.
Essa monografia, agora transformada em livro, pode ser de grande auxílio aos
estudantes das ciências exatas quando se deparam com aspectos filosóficos, históricos e
sociais da ciência, já que possui um capítulo inteiro dedicado a vida e a obra científica de
Albert Einstein e como essa obra se relacionou com as pesquisas de outros físicos e
químicos. Também há aspectos do contexto histórico em que Einstein viveu, o que pode ser
uma contribuição relevante para os estudos de Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente
(CTSA).
Os estudantes de comunicação também podem se beneficiar da leitura do livro, pois
há um estudo de como algumas mídias dedicaram seus espaços à física. Pode-se aplicar a

3
mesma metodologia com outros assuntos, o que se constitui na análise de conteúdo dos
meios de comunicação ou de um observatório de mídia. Outra metodologia utilizada foi o
uso de entrevistas. Alguns professores e pesquisadores foram entrevistados pessoalmente e
outros responderam aos e-mails que eu enviei. As entrevistas foram indicadas no texto a
partir das notas de rodapé, sendo que as respostas dos e-mails podem ser vistas pelo assunto
“Monografia - Ano Mundial da Física” e pela indicação “[mensagem pessoal]”.
Por fim, a obra também pode ser útil para estudantes de pedagogia e das
licenciaturas pela abordagem dos aspectos pedagógicos e didáticos dos meios de
comunicação.
Agradeço a todos os físicos que me concederam entrevista para a coleta de
informações para este trabalho. Agradeço ao meu orientador, o Professor Doutor Mauro
César Silveira, pelo grande apoio dado ao trabalho.
Desejando a todos uma boa leitura, aspiro que a obra também seja relevante para
que outros estudos similares sejam realizados para pesquisar as relações entre ciência,
comunicação e educação para que cada vez mais a nossa sociedade proporcione a
alfabetização científica para todos os cidadãos.

O autor.
Abril de 2019

4
Apresentação

Há exatos 100 anos Albert Einstein contribuía para a grande ruptura do pensamento
científico e filosófico mundial. Em 1905, ele publicou trabalhos sobre vários temas da
física, como novos estudos sobre as propriedades da radiação, a comprovação da realidade
das concepções atômicas, e revolucionários conceitos sobre grandezas até então
indiscutíveis, como o espaço, o tempo, a matéria, massa e energia. Os acontecimentos
posteriores levaram à criação de uma das mais significativas e impactantes teorias da área:
a relatividade geral.
Após sua comprovação empírica no eclipse de Sobral, Albert Einstein alvoreceu
para a sociedade e para o mundo. Tornou-se uma figura lendária e sua fama é comparável a
de Jesus, Buda ou Gandhi.
No aniversário de um século de seu Annus Mirabilis – termo em latim que significa
“ano miraculoso” ou “ano milagroso” – as sociedades de física de todo o mundo
propuseram à ONU e à UNESCO que estabelecessem 2005 como sendo o “Ano
Internacional da Física”.
Assim, vários eventos foram programados para celebrar a data em várias partes do
globo. Agências de fomento e órgãos governamentais destinaram recursos especiais para
promover a comemoração do centenário. Os meios de comunicação foram acionados para
divulgar eventos, pesquisas ou congressos da física. Os organizadores mostraram não
somente a história e os avanços dessa ciência básica, mas suas inter-relações com outras
grandes áreas do conhecimento e sua influência no desenvolvimento do pensamento
humano em sociedade.
Foram analisados os veículos especializados e não-especializados de algumas
mídias do Brasil e do exterior. Verificou-se a quantidade de espaço dado, bem como a
avaliação dos conteúdos apresentados.

5
Introdução
Para um melhor aproveitamento dos estudos, esta monografia foi dividida em quatro
capítulos. Embora elas sejam distintas em seu foco de abordagem, elas contêm
intercorrelações mútuas.
No capítulo I foram conceituadas as definições, objetivos e princípios essenciais do
“Ano Mundial da Física”. As informações passadas fazem parte de relatos dos
organizadores, físicos e professores, além dos sites oficiais de divulgação do evento. Foram
citados alguns exemplos de comemorações, congressos, seminários e encontros acontecidos
em várias partes do Brasil, na Alemanha, em Portugal e nos Estados Unidos. Pretendeu-se
averiguar se os objetivos dos organizadores estavam sendo cumpridos e analisar o nível de
eficácia dessa missão.
Já no capítulo II foi a vez de verificar se os feitos de Albert Einstein em 1905
mereciam realmente uma celebração desse porte. Os dados e contextos históricos da ciência
antes do surgimento do famoso físico alemão foram contados com base na literatura
existente no assunto. Passou-se posteriormente a contar um pouco das influências da vida
de estudante do jovem Albert e seus primeiros trabalhos. Foram explanados os artigos de
1905 minuciosamente um por um e seus desdobramentos posteriores. Também foram
abordadas a criação da teoria da relatividade geral e a fama repentina de Einstein após sua
comprovação empírica. Os debates com a comunidade científica sobre a teoria corpuscular
da luz e a mecânica quântica e algumas prováveis aplicações das teorias de Einstein no
desenvolvimento tecnológico do século XX. Também foi dada uma atenção especial ao
pensamento filosófico que se pode estabelecer dentro da obra de Albert Einstein.
No capítulo III foi observado o papel da mídia no auxílio a execução das metas
propostas pelos organizadores do “Ano Mundial da Física”. Foram definidos os conceitos
básicos de jornalismo científico e sua função educativa. A busca pelo conhecimento
globalizado e verdadeiro como caminho à educação do futuro e como o jornalismo
científico pode participar desse processo.

6
O capítulo IV buscou analisar e comparar diversos meios de comunicação –
especializados e os gerais – para verificar se os objetivos primordiais do “Ano Mundial da
Física” estavam sendo cumpridos. Como a mídia se comportou no evento? Para responder
essa questão, foram feitas minuciosas análises dos veículos gerais como as edições online
da Folha de São Paulo, o Estadão, a agência de notícias BBC e a versão eletrônica da
Deutsche Welle. Na categoria de veículos especializados, foram estudadas as revistas
Ciência Hoje, Comciência e Ciência & Ambiente.

7
Capítulo I - O Ano Mundial da Física
1. Definição, objetivos e metas
O “Ano Mundial da Física” foi instituído pelas sociedades de física em várias
reuniões realizadas em diversas partes do globo. No Congresso Internacional de Sociedades
de Física, em Berlim, acontecido no mês de dezembro de 2000, mais de 40 físicos
aprovaram a proposta para declarar 2005 como sendo o “Ano Internacional da Física”,
devido ao Annus Mirabilis de Albert Einstein, ano em que ele publicou cinco artigos que
alteraram significativamente alguns sólidos conceitos da área. Trabalhos inovadores e
corajosos que englobavam novas concepções sobre o caráter corpuscular da luz, o
movimento browniano e a relatividade restrita.
Logo após ter sido apresentada no Congresso das Sociedades da Física, a União
Internacional de Física Pura e Aplicada (IUPAP, da sigla em inglês International Union of
Pure and Applied Physics) ratificou a proposta e determinou que o ano de 2005 fosse eleito
para as celebrações do aniversário de um século dos cinco papers de Einstein e celebrar a
grande ruptura no âmbito científico que eles provocaram.
Em novembro de 2003, a proposta do “Ano Mundial da Física” foi aprovada por
unanimidade na 32ª sessão da Conferência Geral da UNESCO, que ficou responsável por
coordenar os trabalhos. Segundo resolução da UNESCO:

A Assembleia Geral;
Reconhecendo que a física promove uma significante base para o
desenvolvimento de a compreensão de natureza. Acentuando que a
educação em física proporciona para as mulheres e para os homens as
ferramentas científicas para construir a infraestrutura essencial para
desenvolvimento. Considerando que a pesquisa em física e suas aplicações
foram, e continuou sendo, uma força motriz para desenvolvimento
científico e tecnológico, e permanece um fator vital que se dirige para os
desafios do século XXI. Estando atento que o ano de 2005 marca o
aniversário de cem anos de uma série de grandes avanços científicos por
Albert Einstein. Acolhe a resolução da União Internacional de Puras e
Aplicadas Físicas (IUPAP), uma iniciativa da Sociedade Física europeia,
que declarou o ano de 2005 como o Ano Internacional da Física e leva a
cabo, dentro deste período, atividades para promover a física em todos os

8
níveis mundiais. Assim, decide apoiar a iniciativa do Ano Internacional da
Física e convida o diretor-geral a pedir para a Assembleia Geral das Nações
Unidas declarar 2005 como o Ano Internacional da Física.

Em junho de 2004 foi a vez da Organização das Nações Unidas proclamar o “Ano
Mundial da Física”.

Pelas condições de outra resolução adotou hoje, contida em documento


A/58/L.62, a Assembleia declarou o ano 2005 o Ano Internacional de
Físicas, e convidou a UNESCO para organizar as atividades, colaborando
com sociedades de físicas e grupos ao longo do mundo, incluindo nos
países em desenvolvimento. Introduzindo o texto, Lebohang K. Moleko
disse que, em 1905, Albert Einstein publicou vários artigos científicos que
influenciaram profundamente o entendimento do Universo. Ele introduziu
ideias totalmente revolucionárias em questões fundamentais, incluindo a
existência de átomos, a natureza de luz e os conceitos de espaço, energia e
matéria. O “Ano Internacional” entrou além da mera celebração de um das
maiores mentes da física no século XX. O evento é uma oportunidade para
o maior reconhecimento do progresso e da importância deste grande campo
de ciência. O “Ano” também deve ser a ocasião para o início dos debates da
grande necessidade para a pesquisa científica no século XXI. Os debates
também tem que relacionar assuntos sociais que acompanham a prática das
ciências em geral, e da física, em particular. As responsabilidades éticas
para os físicos são enormes.

No Brasil, as atividades estão sendo organizadas pela Sociedade Brasileira de Física


(SBF), com o apoio do Ministério da Ciência e Tecnologia. Segundo Studart, no editorial da
revista Física na Escola:

O Ano Mundial da Física foi instituído para chamar a atenção do público


em geral para a importância e o impacto da física no mundo
contemporâneo. Proposto inicialmente por sociedades científicas de vários
países, em seguida, a IUPAP adotou, por unanimidade, uma resolução
apoiando a iniciativa. Finalmente, a ONU, também através de resolução,
declarou 2005 o Ano Internacional da Física delegando à UNESCO a
realização das atividades comemorativas. No Brasil, as atividades estão
sendo organizadas pela Sociedade Brasileira de Física com o apoio do
Ministério da Ciência e Tecnologia e suas agências financiadoras. Uma
chamada da SBF para apresentação de propostas resultou em mais de 150
pedidos de auxílios para a realização de conferências, semanas acadêmicas,
produção de materiais didáticos, exposições e ações para a melhoria dos
ensinos fundamental e médio de física. São inúmeras atividades sendo
desenvolvidas visando à divulgação dos temas de fronteiras da física,

9
realçando a contribuição da física ao desenvolvimento da ciência e da
tecnologia no país e debatendo o ensino da física nos vários níveis
educacionais (2005, p. 1).

Eventos estão acontecendo em todas as partes do mundo. Congressos, semanas,


exposições e encontros estão debatendo vários tópicos da história da física, a vida e obra de
Albert Einstein, as novidades acadêmicas da pesquisa científica e estão ocorrendo reuniões
entre professores, estudantes e a sociedade em geral. A proposta dos organizadores
caracteriza-se pela abrangência. Segundo Fazzio:

O maior objetivo deste ano é chamarmos a atenção do público em geral, e


em especial dos jovens, para a importância das ciências no
desenvolvimento de um povo. Mostrar como a ciência pode melhorar as
condições de vida e auxiliar na construção de um mundo melhor. 1

Studart comenta que não apenas os artigos de Albert Einstein serão celebrados, mas
haverá uma busca para a melhora da divulgação da física em todos os meios e âmbitos da
sociedade:

A importância da física já é comprovada, mas é preciso ser dito mais


explicitamente a importância da física na sociedade. Ela existe, mas precisa
ser melhor divulgada. Então, o objetivo maior do ano é justamente
aproveitar a celebração do Einstein (aniversário de um século dos cinco
artigos que mudaram a história da física). Não que queremos apenas
celebrar os papers de Einstein, queremos divulgar a física em todos os
meios, mostrar as nossas contribuições, tanto as antigas quanto as atuais, do
dia a dia e em todos os setores, atrair novos talentos para a física, etc. 2

Desmistificar a física e atrair novos talentos para a área. Esse é um dos enfoques
principais do “Ano Mundial da Física”, como diz Knobel:

O objetivo do Ano Mundial da Física é despertar o interesse nessa área tão


importante para a humanidade. Comemora-se os cem anos de três trabalhos
espetaculares do Einstein, e com isso aproveita-se para divulgar os diversos
aspectos da Física, que muitas vezes não são conhecidos dos estudantes e
do público de uma maneira geral. Busca-se estimular o gosto pela ciência, o
1
FAZZIO, A. Discurso na cerimônia de posse dos novos acadêmicos da Academia Brasileira de Ciências,
2005. Disponível em: <http://www.if.usp.br/bifusp/bifold/bif0517.shtml>. Acesso em 16 de abril de 2019.
2
STUDART, N. Nelson Studart depoimento [mar. 2005]. Entrevistador: Ricardo Dias. São Carlos. Entrevista
concedida durante a I Semana de Física da UFSCar.

10
pensamento crítico e, quem sabe, futuros talentos para a área. Há diversas
atividades sendo desenvolvidas no Brasil e no mundo, devido ao Ano
Mundial da Física.3

Segundo informações do site da Sociedade Brasileira de Física, além do objetivo


principal que é chamar a atenção da sociedade em geral, quer se destacar também as
contribuições da física para nossa visão do mundo e sua interdisciplinaridade com outras
áreas da ciência:

Um dos principais objetivos do WYP2005 (da sigla em inglês, World Year


of Physic) é chamar a atenção do público em geral, mas especialmente dos
jovens, para a importância e o impacto da física no mundo contemporâneo.
Tal impacto abrange não só as aplicações práticas fundamentais que
decorreram de avanços teóricos e experimentais da física, mas também as
contribuições da física para a construção da nossa visão do mundo e suas
inter-relações com as outras áreas do conhecimento. Os aspectos culturais e
humanísticos da física deverão ser também destacados.

Adilson Oliveira ressalta o dia da física em 19 de maio. Essa foi a data do eclipse de
1919 no nordeste brasileiro quando pesquisadores comprovaram a teoria da relatividade
geral e fez de Albert Einstein um dos grandes mitos do século XX. Ele reconhece como um
dos objetivos principais a popularização da física, tornando-a mais acessível e simpática, já
que ela está muito próxima do nosso cotidiano, sem que nos percebemos disso.

O ano de 2005 foi declarado pela UNESCO como o ano internacional da


Física em homenagem ao centenário da publicação dos trabalhos de
Einstein. No Brasil, em particular, o dia 19 de maio será considerado o dia
da Física, pois nesse mesmo dia no ano de 1919 foi observado um eclipse
total do Sol em Sobral, no Ceará, que foi determinante para comprovar as
ideias de Einstein. A Sociedade Brasileira de Física, os departamentos e
institutos de Física da maioria das universidades estarão durante todo ano
empenhados na divulgação dessa ciência, com o objetivo de torná-la mais
simpática e acessível para a sociedade. Afinal de contas, os fenômenos que
ela explica estão presentes nas nossas vidas muito mais do que
imaginamos.4

Na sessão solene de abertura do “Ano Internacional da Física”, Fernandes reforça a


ideia da mudança na noção que as pessoas têm da física e anunciou o volume de
3
KNOBEL, M. Monografia - Ano Mundial da Física [mensagem pessoal].
4
OLIVEIRA, A. Aol – Educação. 2005.

11
investimentos que o Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT) vai destinar para as
atividades do “Ano Mundial da Física” no Brasil:

Subjacente à ideia está a necessidade sentida de projetar a imagem da física


– e da ciência em geral – não só no universo das decisões sociais,
econômicas e políticas, mas ainda no imaginário popular e, sobretudo, na
visão dos jovens, cujo interesse por carreiras científicas se trata de reavivar.
Quer-se disseminar a consciência de que a física está na base do
desenvolvimento tecnológico e econômico que o mundo alcançou até aqui;
chamada também, neste alvorecer do século XXI, a intensa cooperação
multidisciplinar na solução de problemas cruciais, de magnitude mundial
como são – citando apenas dois exemplos – a produção de energia e a saúde
pública. Convém de fato expandir a noção de que na verdade a física
permeia o dia a dia da existência das pessoas, traduzida tanto em aplicações
essenciais à vida contemporânea como em conhecimento, cultura e visão do
mundo e na influência que ela exerce sobre o desenvolvimento de tantos
outros ramos do saber e áreas de atividade. E anuncio com viva satisfação
que o MCT decidiu alocar, via suas agências, um milhão de reais para o
financiamento de atividades do Ano Internacional da Física no Brasil. Que
os resultados destas atividades possam estimular e iluminar nossa trajetória
comum.5

O lançamento do “Ano Mundial da Física” no Brasil aconteceu no XVI Simpósio


Nacional de Ensino de Física no Rio de Janeiro. A Sociedade Brasileira de Física está
organizando os eventos conjuntamente com as universidades de todo o Brasil:

A SBF lançou o AMF2005 durante a abertura do XVI Simpósio Nacional


de Ensino de Física (XVI SNEF), realizada na Universidade Estadual do
Rio de Janeiro (UERJ) em 24 de janeiro de 2005, e está coordenando toda a
programação nacional, contando com a colaboração de diversas instituições
e Departamentos de Física de todo o país. Ao todo, teremos cerca de 120
eventos ocorrendo em todo território nacional, a um custo total de um
milhão de reais financiados pela FINEP, evidenciando uma grande
demonstração de integração nacional em torno deste tema. 6

Para alterar a visão que as pessoas têm da física são necessárias mudanças no
sistema de ensino. Inserir mais tópicos da física contemporânea e demonstrar as aplicações
que surgiram com os avanços na compreensão dos fenômenos físicos. Esse também é um
5
FERNADES, L. Discurso do ministro. Disponível em:
<http://www.sbf1.sbfisica.org.br/eventos/amf/discurso.htm>. Acesso em: 16 de abril de 2019.
6
SOCIEDADE BRASILEIRA DE FÍSICA. Ano Mundial da Física – 2005. Disponível em:
<http://www.sbf1.sbfisica.org.br/eventos/amf/>. Acesso em: 16 de abril de 2019.

12
dos objetivos do “Ano Mundial da Física”, como conta Oliveira:

O principal objetivo é fazer com que as pessoas saibam que a Física é


importante na vida delas. Infelizmente, o nosso ensino fundamental e médio
ainda não trouxe de maneira completa para a sala de aula a importância da
física, principalmente a física contemporânea, que está cada vez mais
presente no nosso cotidiano. Computadores, televisores, telefones celulares,
entre outros, não existiriam sem os avanços da física. Entretanto, a maioria
das pessoas ainda desconhece isso. Dessa forma, o Ano Mundial da Física
tem esse objetivo. Mostrar para as pessoas que a física é algo importante e
que deve ser valorizado.7

Miranda explana os principais avanços tecnológicos que surgiram a partir dos


trabalhos de Einstein e acredita que, ao mostrar algumas aplicações cotidianas, promove-se
o despertar do entusiasmo pela ciência:

Os objetivos do ano Mundial da Física no contexto brasileiro são vários:


aproximar a física das pessoas comuns e dos alunos de primeiro e segundo
graus; despertar o interesse dos estudantes por essa área da ciência;
propiciar aos professores universitários e de segundo grau uma ideia melhor
a cerca dos conceitos que Einstein introduziu e que deram (e serviram de)
impulso a toda a física do século XX e agora do XXI; mostrar como todo
esse conhecimento gerado se aplica no dia a dia das pessoas através da
ressonância magnética nuclear, relógios atômicos, GPS, computadores
quânticos, etc. Pouca gente sabe que os trabalhos de Einstein, publicados
em 1905, levaram ao desenvolvimento de todas essas áreas que mencionei.
Quem hoje tem dúvidas quanto a importância, por exemplo, da ressonância
magnética nuclear no diagnóstico seguro de doenças? Se as pessoas
percebem o que o conhecimento e o avanço da física propiciou e irá
propiciar para a humanidade, então elas entenderão que um país só avança,
só se desenvolve, através do investimento em ciência pura e aplicada, e com
escolas de qualidade que proporcionem aos estudantes a chance de
despertar o gosto e o entusiasmo pela ciência. 8

2. Os trabalhos de 1905
O ano de 2005 foi escolhido para a grande celebração mundial da física por ser o
aniversário de um século do Annus Mirabilis de Albert Einstein. Logo no começo de sua
carreira, com apenas 26 anos, ele publicou cinco artigos que alteraram o fluxo do
pensamento científico apresentado até então. Foram trabalhos de grande criatividade e
7
OLIVEIRA, A. Monografia - Ano Mundial da Física [mensagem pessoal].
8
MIRANDA, O. Monografia - Ano Mundial da Física [mensagem pessoal].

13
inovação, que provocaram uma ruptura na história da ciência.
No primeiro artigo, “Sobre um ponto de vista heurístico concernindo a geração e a
conversão de luz”, Albert Einstein propõe novas concepções sobre a natureza da radiação.
A luz apresenta um caráter corpuscular, além da característica ondulatória pregada por
várias gerações de cientistas. Einstein reconheceu esse trabalho como sendo muito
revolucionário, em carta para seu amigo Conrad Habicht.
O segundo e o terceiro artigo fazem parte da sua tese de doutorado e comprovaram a
existência de átomos e moléculas, assunto ainda bem incipiente e controverso no início do
século XX. Ele determinou as dimensões moleculares e criou métodos para o cálculo do
número de Avogrado9, ao analisar os movimentos desordenados dos grãos de pólen em um
fluido em repouso, também denominado movimento browniano. Esses são os trabalhos
mais citados de Einstein, pela enorme gama de aplicações práticas (PAIS, 1995, p. 102.)
Os dois últimos artigos de 1905 são os primeiros trabalhos relativos à teoria da
relatividade restrita que acabaram se tornando a marca registrada de Albert Einstein.
Mesmo que muitos autores antes dele já pesquisassem os fenômenos eletrodinâmicos e as
concepções sobre o espaço e o tempo, Einstein deu um grande passo ao abolir conceitos
indiscutíveis como o éter luminífero. “Sobre a eletrodinâmica dos corpos em movimento” e
“A inércia de um corpo depende de sua energia?” modificaram as noções mais básicas da
física como espaço, tempo, velocidade, massa e energia. Uma primeira versão da equação
mais famosa da ciência e estampada em camisetas e adesivos foi teorizada em 1905:
E=mc2.
Muitos historiadores da ciência discutem se 1905 foi o ano mais importante da vida
científica de Albert Einstein e da física. John Stachel acredita que 1915, quando a teoria da
relatividade geral foi desenvolvida, é realmente o ano mais importante. 10 Mas se
considerarmos que a teoria da relatividade geral foi criada com base na relatividade restrita,
conclui-se que o ano de 1905 semeou os alicerces do nascimento de uma teoria de campo
mais unificada. Studart (2005, p. 3) explica os motivos da escolha da celebração do annus
9
Número de moléculas por mol (unidade para a quantidade de matéria).
10
Cf. em NOGUEIRA, S. Einstein previu “doutrina Bush”, diz físico. Folha Online – Ciência. Disponível
em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u12890.shtml>. Acesso em: 16 de abril de 2019.

14
mirabilis:

A escolha do ano de 2005 deve-se à comemoração do centenário dos


trabalhos produzidos por Albert Einstein que tiveram um impacto
extraordinário na Física do século XX: a teoria da relatividade restrita, a
hipótese do fóton, a equivalência da massa-energia e a teoria do movimento
browniano e suas implicações para a confirmação da existência de átomos.

Os trabalhos de Einstein de 1905 abrangeram diversas faces da física e foram os


germes de diversas outras teorias que surgiram ao longo do século XX. O primeiro artigo
abordou as características atomísticas da luz e prenunciou o nascimento da física quântica.
Os trabalhos sobre as dimensões moleculares e do movimento browniano comprovaram a
existência de átomos e moléculas, assunto que ainda engatinhava no início do século XX.
Os dois últimos artigos revelaram outra preocupação constante de Albert Einstein referente
aos fenômenos macroscópicos e do campo contínuo, que mais tarde seriam sintetizadas na
teoria da relatividade geral e que foi responsável pela fama mundial que fez de Einstein
uma lenda. Assim explica-se a importância vital do ano de 1905 para a física e toda a
ciência em geral.
A necessidade urgente de chamar a atenção da sociedade para a física pode explicar
a escolha de 1905 para as celebrações mundiais dos feitos de Albert Einstein e não esperar
até 2015 para isso. Isso não quer dizer que os outros momentos científicos foram menos
importantes. Assim, por que não criar um “Ano Mundial da Física II” em 2015, realizar um
megaevento em Sobral no ano 2019, comemorando um século do eclipse que mudou a
história do mundo, ou organizar uma enorme celebração intitulada “Ano Nacional da
Física” no ano de 2047, um século após a detecção do méson-pi pelo brasileiro César
Lattes. O “Ano Mundial da Física” não deve ficar restrito apenas ao ano de 2005.

3. Eventos que ocorreram no Brasil e no mundo


Serão explanadas, a seguir, as principais atividades que celebraram o “Ano Mundial
da Física” em 2005. Foram escolhidos alguns eventos de destaque no Brasil e alguns
exemplos de iniciativas na Alemanha – um dos pontos principais da comemoração, já que

15
foi o país onde Einstein nasceu e dedicou grande parte da sua obra científica – e nos
Estados Unidos, país que Einstein pediu asilo, após os nazistas tomarem o poder, e onde
viveu até sua morte.

3.1. Eventos nacionais


- XVI Simpósio Nacional de Ensino de Física. Evento acontecido no Rio de Janeiro
no período de 24 a 28 de janeiro. Lá ocorreram as cerimônias de abertura do “Ano Mundial
da Física” no Brasil e contou com a presença do especialista na história de Albert Einstein,
John Stachel, da Universidade de Princeton. O tema principal foi “O Ensino no Ano
Mundial da Física”, um dos objetivos essenciais dos criadores e idealizadores do evento
mundial. Os tópicos abordados foram: A didática da física: materiais, métodos, estratégias e
avaliação. A física moderna e contemporânea e a atualização curricular. A formação do
professor de física (em todos os níveis de escolaridade). A educação científica e formação
profissional. O ensino de física para a graduação (física, engenharias, química, biologia,
arquitetura, arte, etc.). A alfabetização científica e tecnológica. A filosofia, história e
sociologia da ciência. As tecnologias (laboratório, vídeo e informática) no ensino de física.
As políticas para o ensino de ciência e de tecnologia. A arte, cultura e educação científica. A
divulgação científica e a comunicação e a interdisciplinaridade no ensino de física.
- Convite à Física – 2005. Palestras e colóquios durante o período entre 09 de
fevereiro e 31 de novembro, promovidos pelo Instituto de Física da Universidade de São
Paulo. No primeiro semestre foram abordados temas históricos do contexto científico que
precederam Albert Einstein, as teorias sobre a relatividade e demais estudos sobre o campo
contínuo. Já durante o segundo semestre as palestras abrangeram os artigos sobre o efeito
fotoelétrico e o movimento browniano, ou seja, as características quânticas da matéria e da
radiação. Os colóquios demonstraram consequências diretas ou indiretas de tais estudos.
- I Semana de Física da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Evento
realizado durante toda a semana, entre 14 a 18 de março, coordenado pelo Departamento de
Física da UFSCar. As palestras, mesas-redondas e minicursos explanaram vários temas da
física, como nanomagnetismo, cosmologia, astrofísica estelar, física médica,

16
supercondutividade, mecânica quântica, laser e a história do Annus Mirabilis de Albert
Einstein foi contada por Nelson Studart. Foram abordados também vários tópicos sobre
ensino de física, a filosofia da ciência e o mercado de trabalho para bacharéis e licenciados
em física. Outros fatos marcantes do evento foram as apresentações culturais e sociais.
- Ano Mundial da Física na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
As atividades estão programadas por todo o ano de 2005 e englobam vários tópicos
históricos e epistemológicos da física, bem como todo o desenvolvimento científico e
tecnológico do século XX. Foram explanadas também novas ferramentas para a prática do
ensino da física, bem como teorias psicológicas e sociais da aprendizagem e a inserção da
física moderna e contemporânea no ensino médio. O Instituto de Física da UFRGS abriu
seus laboratórios para as visitações pedagógicas do ensino fundamental e médio, visando
mostrar a importância e o impacto da física teórica e experimental no mundo
contemporâneo.
- Ano Mundial da Física na Universidade de Campinas. Realizado durante todo o
ano de 2005, foi composto de oficinas, exposições e palestras. As oficinas abordaram os
100 anos da teoria da relatividade, a astronomia, a vida de Einstein e suas contribuições e a
física moderna aplicada à medicina. Também aconteceram atividades expositivas, como a
“Nanoaventura”, um circo itinerante que percorreu as cidades do Rio de Janeiro e
Campinas, levando para estudantes do ensino secundário as noções e conceitos básicos
referentes à nanotecnologia, através de jogos eletrônicos e vídeos com alto grau de
sofisticação.
- Ano Mundial da Física na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Durante todo o ano aconteceram atividades relacionadas ao evento mundial. A I Semana de
Física aconteceu nos dias 17 a 19 de maio e foram apresentados vários tópicos da física
moderna como a nanotecnologia e a astronomia. Discussões mercadológicas como as
possibilidades da atuação do físico e suas funções dentro de uma indústria. Ildeu Castro
Moreira e Roberto Martins falaram sobre o Annus Mirabilis e as pesquisas precedentes à
teoria da relatividade, respectivamente. Uma grande inovação do evento foram os
espetáculos “Física mais que divertida” e “A Física como inspiração para criar, planejar e

17
executar: números de mágica inspirados em teorias da física”. Os programas de extensão do
departamento de física para a divulgação e a educação em ciência, o LABIDEX
(Laboratório de Instrumentação, Divulgação e Experimentação em Física), proporcionou
atividades voltadas para os estudantes e professores do ensino médio, tendo por objetivo
demonstrar de maneira interativa e descontraída diversos conceitos da física. Já o “Baú de
Ciências” foi destinado prioritariamente ao ensino fundamental e realizou atividades
experimentais nas escolas durante o horário escolar.
As atividades na UFSC objetivaram atingir principalmente os jovens do ensino
médio e fundamental, atendendo a um dos objetivos principais dos idealizadores do “Ano
Mundial da Física”, que é atrair os jovens para a carreira científica.
- Simpósio Mineiro do Ano Mundial da Física – A inserção da física moderna nos
ensinos médio e fundamental. Esse evento ocorreu nos dias 19 a 21 de maio e demonstrou
um panorama da física moderna através de temas atuais e discutiram os instrumentos e
práticas para a viabilização da sua inserção nos ensinos fundamental e médio. As palestras
giraram em torno de temas como partículas, aceleradores e detectores. A física antes e
depois de Einstein. Alguns problemas biológicos abordados pelos físicos. Nanotecnologia e
cosmologia, além de uma palestra sobre a UNESCO e o evento global.
- Ano Mundial da Física no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Durante o
período entre 14 de junho e 16 de novembro aconteceram ciclos de palestras com a
temática: “A evolução do conceito espaço-tempo”, abrangendo as pesquisas sobre o campo
contínuo de Albert Einstein. Depois, dentro da “Semana Nacional de Ciência e Tecnologia”,
foram abordados temas referentes à cosmologia e as teorias modernas sobre o espaço e o
tempo.
- X Semana da Física da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Evento
ocorrido entre os dias 24 a 27 de outubro e coordenado pelo departamento de física da
UEL. Os conteúdos das palestras abrangeram tópicos bem atuais da física, tais como as
fibras ópticas, os neutrinos massivos e sua relação com a transição de fase em bio-
moléculas, o estado atual da magnetorecepção em insetos sociais, imagens por ressonância
magnética nuclear: princípios e aplicações em medicina, o laser e a fluorescência: suas

18
aplicações em biofísica, o Annus Mirabilis, as pesquisas sobre a abordagem histórico-
filosófica no ensino e na aprendizagem de física, astronomia, os aspectos políticos da vida
de Albert Einstein e uma mesa redonda com o tema: divulgação em ciência e tecnologia.
Nota-se a grande importância dada ao último tópico, mostrando a relevância fundamental e
estratégica da divulgação e do jornalismo científico em cumprir as metas dos organizadores
do “Ano Mundial da Física”.
- Peças de teatro em comemoração ao Ano da Física. Ótima iniciativa desenvolvida
pela Estação Ciência em São Paulo. O evento consistiu em três obras teatrais com o
objetivo de mostrar outros lados da física. A primeira peça com o título “Prof. Gervásio e a
energia elétrica” mostrou questões sobre energia elétrica, sua história e os fenômenos
físicos que ela apresenta. A segunda, “Marte, a viagem - Uma comédia no espaço”, um
astrônomo e uma mitóloga tentam explicar o Sistema Solar e seus planetas, mas um
assistente novato e atrapalhado sempre interrompe as explicações. A última peça, intitulada:
“O Monocórdio de Pitágoras: Uma história de cordel” usou a música e a matemática para
ensinar as descobertas do filósofo e matemático Pitágoras.
As criações artísticas que ensinam ciências são uma excelente maneira de mostrar
uma física divertida e desmistificada, como preveem os idealizadores do Ano Mundial da
Física.
As metas dos organizadores nacionais do Ano Mundial da Física foram atingidas e
muitas vezes superaram as expectativas, com novas alternativas e soluções para a física
demonstradas ao longo do ano de 2005.

3.2. “Welt-Jahr der Physik”


O “Ano Mundial da Física” foi celebrado com muita ênfase na Alemanha, pois lá foi
o local de nascimento de Albert Einstein e o desenvolvimento de muitas de suas obras
científicas.
Para facilitar nossos estudos, foram escolhidos dois eventos bem inovadores e
abrangentes. O primeiro se trata do MS-Einstein, um barco que navegou pelos rios e canais
das principais cidades alemãs como Bremen, Hannover, Potsdam, Berlim, Dortmund,

19
Düsseldorf, Colônia, Bonn, Wiesbaden, Frankfurt, Karlsruhe e terminou sua jornada em
Basel, já em território suíço.
O barco se tornou uma exposição itinerante da vida e da obra científica de Albert
Einstein. Lá foram expostas suas teorias, sua biografia, experiências dos seus estudos e
vídeos demonstrativos. Tudo com muito luxo e sofisticação. O MS-Einstein foi financiado
pelo Bundesministerium für Bildung und Forschung11.
A casa de verão de Albert Einstein em Caputh, distante seis quilômetros ao sul de
Potsdam, foi transformado em um museu de exposição de Albert Einstein. Segundo seus
desejos pessoais antes de morrer, ele não gostaria que se levantassem monumentos em seu
nome e que sua casa em Caputh fosse apenas um ponto de diálogo científico, político e
cultural. Assim, dentro do interior da casa só se encontram móveis e cômodos dispostos da
mesma maneira que Einstein deixou quando precisou fugir para os Estados Unidos para
evitar o terror nazista. Seus escritos e documentos pessoais estão na Universidade Hebraica
de Jerusalém, onde estão sendo analisados e estudados.

3.3. “Ano Mundial da Física” em Portugal


As comemorações relativas ao “Ano Internacional da Física” também estão sendo
comemorados com muito vigor pelos portugueses. Praticamente todas as suas universidades
prepararam atividades exclusivas para lembrar os trabalhos científicos de Albert Einstein.
Aliás, a Sociedade Portuguesa de Física teve uma fundamental importância para a proposta
do evento entregue à UNESCO (assim como Brasil e França). Explanaremos dois exemplos
de eventos acontecidos em Portugal:
- 2005, Ano Internacional da Física - Comemorações no Instituto Superior de
Engenharia de Lisboa. Lá ocorreram ciclos de palestras sobre Albert Einstein e o
nascimento da mecânica quântica, o movimento browniano, a teoria da relatividade, a
mecânica clássica e os planetas extra-solares, nanoeletrônica e bioeletrônica, as interações
fundamentais da natureza e supercondutores. Nota-se a semelhança com os eventos
ocorridos no Brasil, ao tentarem apresentar os aspectos históricos de Albert Einstein e
11
O Ministério de Ciência e Tecnologia alemã.

20
relacionar com as novas tecnologias emergentes no século XX.
- Conferência sobre “As energias do presente e do futuro”. Evento acontecido nos
dias 21 e 22 de novembro de 2005, no Centro de Congressos do Instituto Superior Técnico
da Universidade Técnica de Lisboa, com enfoque geral na temática energética. Os assuntos
discutidos foram a física e a energia, o problema dos combustíveis fósseis, a energia e o
meio ambiente. As energias hídrica, eólica, solar térmica, solar fotovoltaica, das ondas e
biocombustíveis. Os veículos alternativos e a energia para todos.
Esse foi um exemplo de um evento que aconteceu no “Ano Mundial da Física”, mas
que buscou especificar somente o problema energético, assunto tão em voga nos dias atuais
e que está intimamente ligado ao desenvolvimento da física.

3.4. “World Year of Physics”


As atividades referentes ao “Ano Mundial da Física” se espalharam por todos os
estados, universidades, centros de pesquisas, museus de ciência ou corporações
tecnológicas nos Estados Unidos. Separamos três exemplos de eventos para termos noções
básicas das celebrações na América do Norte.
Na Universidade de Princeton foram realizados colóquios e seminários sobre o
“Ano Mundial da Física”. Os colóquios abordaram os legados de Einstein e os desafios e
recompensas de editar sua história científica e biográfica, tais como o grande erro de
Einstein com relação à cosmologia, o futuro da física, o significado da naturalidade e a
supersimetria na natureza, a origem do conceito de massa e a fragilidade da interação
fundamental gravitacional, as realidades físicas dos buracos negros e a história entre
Friedrich Adler e Albert Einstein contada pelo historiador da ciência Peter Galison.
Em Washington DC, as atividades referentes ao “Ano Mundial da Física”
percorreram todo o ano na Universidade George Washington. Lá foi debatido o milagroso
ano de Einstein, o lançamento da biografia de “Robert Oppenheimer: de Hiroshima para o
Inferno” e uma peça de teatro intitulada “Jogando dados com o Universo”, em alusão à
famosa frase de Einstein sobre a mecânica quântica.
Perto dali, no “NASA Goddard Space Flight Center”, ocorreram discussões sobre

21
astrofísica, cosmologia, física teórica e uma palestra intitulada “Além de Einstein: A
procura da NASA para as respostas”.
As perspectivas futuras na física, assim como no Brasil, também foram bem
exploradas nos eventos realizados nos Estados Unidos.
Veremos agora se a vida e a obra científica de Albert Einstein justificam a escolha
da celebração do “Ano Mundial da Física” exatamente um século após os seus primeiros e
significativos trabalhos ocorridos em 1905.

22
Capítulo II – Albert Einstein: Vida e Obra
1. A ciência antes de Einstein
Albert Einstein nasceu em uma época que a física, a filosofia e as demais ciências
passavam por uma enorme transformação causada pelas novas descobertas empíricas. Por
muitos séculos, os grandes alicerces que sustentavam a ciência eram a geometria grega
euclidiana e a física desenvolvida por Galileu e Newton, também denominada “física
clássica”. Pela geometria de Euclides entenda-se por definições sólidas como ponto, reta e
plano. O mundo era concebido como um enorme sistema de coordenadas onde três
dimensões limitavam o universo. A geometria grega era um grande axioma que pretendia
explicar todas as formas do universo. Segundo Capra:

Levando-se em conta que a geometria era vista como a revelação de Deus,


era óbvio, para os gregos, que os céus deveriam exibir formas geométricas
perfeitas, o que equivalia a afirmar que os corpos celestes deviam mover-se
em círculos. (1983, p.127)

Durante muitos séculos, a geometria euclidiana dominou todo o pensamento


científico do ocidente. Poucos pensadores ousavam em duvidar de premissas tão fortes e
ancoradas em várias esferas do pensamento humano. Toda a astronomia e a física se
baseavam na geometria dos gregos. As explicações astronômicas eram concebidas por
formas belas e perfeitas, nas quais seguiam as regras de que tudo era uma combinação
perfeita de lógica e beleza. No modelo proposto por Ptolomeu no século II d.C, conhecido
como Sistema Geocêntrico, a Terra ocupava o centro do Universo, e tudo o mais girava ao
seu redor. Esse sistema foi idealizado a partir da observação do movimento diário dos
astros e foi usado até o século XVI. Na época acreditava-se que o céu era um local perfeito
e, portanto, os astros deveriam realizar movimentos perfeitos.12
Johannes Kepler, ao analisar o rico banco de dados observacionais elaborado por
Ticho Brahe, no início do século XVII, encontrou discrepâncias entre os dados
observacionais e a teoria das órbitas perfeitamente circulares propostas pelos gregos. Com

12
GREGÓRIO-HETEM, J. e JATEMCO PEREIRA, V. Observatórios Virtuais – Fundamentos de
Astronomia. Disponível em <http://www.astro.iag.usp.br/~jane/aga215/>. Acesso em 16 de abr. 2019.

23
base nessa contradição, Kepler revolucionou ao afirmar que as órbitas dos planetas em
torno do Sol descrevem elipses e não círculos. Na conhecida primeira lei de Kepler, as
órbitas dos planetas estão fixas no mesmo plano e descrevem elipses ao redor do Sol, no
qual está localizado em um de seus focos. Assim, caía, definitivamente, uma lei que
vigorava por aproximadamente 1500 anos e a ideia que o mundo era regido por formas
perfeitas.
Mesmo com a contestação dos conceitos absolutos dos geômetras gregos, esse
modo de ver o mundo perdurou até o início da revolução causada pela física moderna no
início do século XX. O livro Elementos, de Euclides, tornou-se texto padrão adotado nas
escolas europeias até o início do século passado e a geometria euclidiana foi considerada
como a natureza verdadeira do espaço por mais de dois mil anos. Albert Einstein, em seu
livro Notas Autobiográficas, relata a profunda abstração que os livros de geometria lhe
causaram ainda na infância. Segundo Einstein:

Aos doze anos experimentei minha segunda sensação de espanto (...),


provocada por um livrinho de geometria plana de Euclides, que veio ter às
minhas mãos no início do ano escolar. Ali estavam afirmações como, por
exemplo, a intersecção das três alturas do triângulo num determinado ponto
que – embora não fosse evidente – podia ser provada com tal certeza que
qualquer dúvida estava fora de cogitação. O fato de os axiomas serem
aceitos sem prova não me perturbou. De qualquer forma, era bastante poder
basear as provas em proposições cuja validade me parecia livre de qualquer
dúvida (1982, p. 19).

Não só na geometria os gregos influenciaram o pensamento científico. Leucipo e


Demócrito instituíram o conceito de átomo, como a menor unidade indivisível e retrataram
a matéria como sendo “blocos básicos de construção”. Aristóteles dá os primeiros passos
para o desenvolvimento da lógica e estabelece a teoria da causa, efeito e finalidade que
participa ativamente na construção intelectual da mente humana até os dias atuais. Aliás, os
pensamentos dos antigos gregos até hoje permeiam o inconsciente coletivo de bilhões de
pessoas.
Da mesma forma que a geometria euclidiana e a filosofia aristotélica, a física
newtoniana também experimentou uma enorme influência no pensamento científico

24
mundial. Por mais de 300 anos, ninguém ousava duvidar de seus rígidos conceitos. A física
passava por um momento extremamente mecanicista, na qual as estruturas eram definidas
por conceitos absolutos do espaço e do tempo. A essência da matéria era concebida como
pequenos objetos sólidos que se moviam no espaço. Ao conhecer a posição inicial, a
velocidade e o tempo decorrido, poder-se-ia prever com exata precisão a posição final, ou
vice-versa, prever a velocidade ou o tempo decorrido conhecendo os demais parâmetros
físicos apresentados. Newton também postulou leis para a gravitação, na qual matéria atrai
matéria. Toda a física era explicada por tais pressupostos. Segundo Einstein:

Segundo Newton, os fenômenos físicos devem ser interpretados como


movimentos regidos por leis. Assim, pois, este sistema teórico em sua
estrutura fundamental se apresenta como um sistema atômico e mecânico.
Portanto todos os fenômenos têm de ser concebidos do ponto de vista
mecânico, quer dizer, simples movimentos de pontos materiais submetidos
à lei do movimento de Newton (1981, p. 192).

A física desenvolvida por Isaac Newton foi considerada, no ano em que formulou
tais axiomas13, a regra final que explicava todos os fenômenos físicos conhecidos na época.
Suas ideias são classificadas nas definições, axiomas e leis fundamentais, que passaremos,
então, a explanar, em alguns de seus pontos principais. Segundo Isaac Newton (1990), em
sua obra Principia: princípios matemáticos da filosofia natural:

Lei I: Todo corpo continua em seu estado de repouso ou de movimento


uniforme em uma linha reta, a menos que ele seja forçado a mudar aquele
estado por forças imprimidas sobre ele.
Lei II: A mudança de movimento é proporcional à força motora imprimida,
e é produzida na direção da linha reta na qual aquela força é imprimida.
Lei III: A toda ação há sempre oposta uma reação igual, ou, as ações mútuas
de dois corpos um sobre o outro são sempre iguais e dirigidas a partes
opostas.

Logo após, surge a lei da gravitação universal, na qual matéria atrai matéria na razão
direta das massas e inversa do quadrado da distância, na qual dois corpos interagem
instantaneamente em um espaço vazio.
Observa-se que o vocábulo “lei” antecede todos os pressupostos de Newton.
13
O ano de 1665 também é conhecido como o Annus Mirabilis de Isaac Newton.

25
Tentaremos conceituar brevemente o que significa esse vocábulo. O dicionário Aurélio traz
10 explicações para a palavra lei: regra de direito ditada pela autoridade estatal e tornada
obrigatória para manter, numa comunidade, a ordem e o desenvolvimento; norma ou
conjunto de normas elaboradas e votadas pelo poder legislativo; obrigação imposta pela
consciência e pela sociedade; domínio, poder, mando; norma, preceito, princípio, regra;
condição imposta pelas coisas, pelas circunstâncias; religião, crença; título (12) de moeda
ou metal; relação necessária entre fenômenos, entre momentos de um processo ou entre
estados de um ser, e que lhes expressa a natureza ou a essência e fórmula geral que enuncia
uma relação constante entre fenômenos de uma dada ordem; lei natural.
Desses conceitos, quais deles se assemelham às proporções que as leis de Newton
abrangeram à ciência? Tirando alguns paradigmas adotados pelas ciências jurídicas e o
título de moeda ou metal, todas as demais explicações são válidas para o impacto que as
leis de Newton causaram em praticamente todo o universo científico por quase 300 anos.
“Toda a evolução de nossas ideias sobre a maneira pela qual até agora imaginamos as
operações da natureza pode ser concebida como um desenvolvimento das ideias
newtonianas”. (EINSTEIN, 1981, p. 191)
Outra tendência filosófica que moldou o pensamento científico no ocidente foi o
racionalismo e o empirismo pregado por filósofos como René Descartes e Francis Bacon.
Segundo esses autores, os fenômenos físicos eram totalmente explicados como processos
absolutamente mecânicos. Diante de um embate filosófico, deve-se decompor o problema
em tantas partes isoladas quanto possível. O universo, segundo Descartes, era uma enorme
máquina composta por engrenagens. Com a análise das engrenagens podia-se chegar ao
verdadeiro conhecimento da realidade. Capra expõe a influência que o filósofo René
Descartes exerceu sobre a física clássica:

A divisão “cartesiana” permitiu aos cientistas tratar a matéria como algo


morto e inteiramente apartado de si mesmos, vendo o mundo material como
uma vasta quantidade de objetos reunidos numa máquina de grandes
proporções. Essa visão mecanicista do mundo foi sustentada por Isaac
Newton, que elaborou sua Mecânica a partir de tais fundamentos, tornando-
a o alicerce da Física clássica. Da segunda metade do século XVII até o fim

26
do século XIX, o modelo mecanicista newtoniano do universo dominou
todo o pensamento científico (1983, p. 25).

Tudo corria bem para os axiomas da física clássica, até o momento em que as
teorias começaram a se defrontar com resultados empíricos e fenômenos sem explicação.
Como explicar a precessão no periélio da órbita de Mercúrio constatada em 1859? E quanto
aos fenômenos eletromagnéticos? A física clássica começa a ter seus alicerces
comprometidos quando físicos teóricos como Michael Faraday e James Clerk Maxwell
estabelecem o conceito dos campos. A matéria não interage instantaneamente à distância e
em um campo vazio como na mecânica de Newton, mas elas interagem em um campo
provocado pela manifestação das cargas elétricas. Como diz Einstein: “quando eu estava
ainda na universidade, o assunto mais fascinante era a teoria de Maxwell. O que lhe dava
um aspecto revolucionário era a transição da ação à distância para os campos, como
variáveis fundamentais” (1982, p. 39).
Faraday e Maxwell uniram três grandes teorias físicas da época: a eletricidade, a
óptica e o magnetismo. Por métodos empíricos postularam a ideia do campo elétrico e
magnético, unindo-os. Como diz Capra:

O conceito de campo foi introduzido no século XIX por Faraday e


Maxwell, através de sua descrição das forças entre cargas e correntes
elétricas. Um campo elétrico é uma condição no espaço em torno de um
campo carregado e que produzirá uma força sobre qualquer outra carga
nesse espaço. Os campos elétricos são, pois, criados por corpos carregados
e seus efeitos só podem ser experimentados por corpos carregados. Campos
magnéticos são produzidos por cargas em movimento, isto é, por correntes
elétricas, e as forças magnéticas daí resultantes podem ser sentidas por
outras cargas em movimento (1983, p. 158).

Quando Faraday produziu uma corrente elétrica em uma bobina, ao movimentar um


ímã ao lado dela, colocou em xeque teorias que dominavam a ciência desde os antigos
gregos. Maxwell postulou que o campo possuía sua própria realidade e podia ser estudado
sem qualquer referência a corpos materiais. Com a eletrodinâmica, a luz não passa de um
campo eletromagnético de alternância rápida e que percorre o espaço sob a forma de ondas.
Segundo Einstein:

27
O que levou finalmente os físicos, após longa hesitação, a abandonar a
crença na possibilidade de toda a física ter como base a mecânica de
Newton foi a eletrodinâmica de Faraday e Maxwell. Essa teoria, confirmada
pelas experiências de Hertz, provou a existência de fenômenos
eletromagnéticos que por sua própria natureza são separados de toda
matéria ponderável – a saber, as ondas no espaço vazio, que consistem em
“campos” eletromagnéticos (1982, p. 32).

Na física newtoniana, o espaço era considerado uma enorme arena onde aconteciam
todos os fenômenos físicos. A passividade do espaço, que era postulada por Newton, foi
contestada pela primeira vez por Maxwell e Faraday com a formulação da teoria
eletrodinâmica. Segundo esses autores, o espaço não é um lugar vazio e participa
ativamente dos acontecimentos. Segundo Einstein:

E, no entanto, na consciência e na imaginação dos físicos, o espaço


conservou até os últimos tempos o aspecto de um território passivo para
todos os acontecimentos, estranho ele mesmo aos fenômenos físicos. A
formação dos conceitos começa a tomar outra feição somente com a teoria
ondulatória da luz e a teoria do campo eletromagnético de Maxwell e
Faraday (1981, p. 168).

Em sua obra literária, Albert Einstein deixa clara a importância que a eletrodinâmica
de Faraday e Maxwell proporcionou para a toda a física teórica. Ele esclarece como a
criação de uma nova espécie de objetos físicos, como o conceito de campo, abalaram as
estruturas tão fortemente enraizadas da física clássica.

A maior revolução dessa base axiomática da física ou de nossa


compreensão da estrutura da realidade, desde que a física teórica foi
estabelecida por Newton, foi provocada pelas pesquisas de Faraday e de
Maxwell sobre os fenômenos eletromagnéticos (1981, p. 192).

A teoria da eletricidade de Maxwell ataca e abala pela primeira vez a


doutrina do movimento de Newton, considerada como programa de toda a
física teórica. Pela concepção de Faraday, estabelece-se que existe, ao lado
do ponto material e de seu movimento, uma nova espécie de objetos físicos
reais; dão-lhe o nome de “campo” (idem, p. 189).

Mesmo com tantas contradições com a física clássica, Maxwell, ainda fortemente
influenciado pela mecânica de Newton, explicou que os resultados que obtivera eram

28
resultados de interações da matéria com o meio que preenchia todo o espaço do Universo,
denominado éter14. O conceito de “éter luminífero” seria o grande problema da física por
quase meio século e cientistas como Henri Poincaré e Hendrik Lorentz eram totalmente
favoráveis, ao contrário de Einstein, que baniu o conceito como veremos mais adiante.
Einstein alertou para o fato dos teóricos da eletrodinâmica estarem ainda presos na teia da
mecânica newtoniana:

Maxwell e Hertz, que podem ser considerados os cientistas que abalaram a


crença de que a mecânica é a base final e definitiva do pensamento físico,
eles também, no seu pensamento consciente, atinham-se à noção de que a
mecânica era a base da física (1982, p. 28).

Veremos mais adiante, como o eletromagnetismo desenvolvido por Faraday e


Maxwell não só estremeceu as bases da física teórica embasada na mecânica, mas também
exerceu influência significativa sobre a teoria da relatividade e na mecânica quântica. A
eletrodinâmica deu o primeiro passo para a evolução científica na qual viria ocorrer logo
após, prenunciando o desenvolvimento da física moderna e toda sua evolução tanto na
esfera científica quanto tecnológica.

2. Albert Einstein – acontecimentos antes de 1905


Albert Einstein nasceu na cidade de Ülm, no estado de Baden-Württemburg, no sul
da Alemanha, em 1879, mas logo com um ano mudou-se para Munique. Com apenas 6 anos
tinha aulas de violino e aos 10 anos lia Crítica da razão pura, do filósofo alemão Immanuel
Kant. Nessa fase, o pequeno Albert começava a ler livros populares sobre ciência que lhe
foram sugeridos por um estudante de medicina chamado Max Talmud. Einstein e Talmud
passavam horas discutindo esses livros. A precocidade na infância e juventude é facilmente
perceptível em Albert Einstein no estudo e aprendizagem das mais diversas áreas
científicas. Em sua autobiografia, Einstein deixa bem clara essa tendência:

Aos 4 ou 5 anos, (...) quando meu pai mostrou-me uma bússola. O fato de a
agulha comportar-se de uma certa forma não se encaixava entre os tipos de
14
Proposto como um meio necessário para a luz se deslocar no vácuo.

29
ocorrências que podiam ser colocados no mundo inconsciente dos
conceitos. Lembro-me ainda que essa experiência causou-me uma
impressão profunda e duradoura. Devia haver algo escondido nas
profundezas das coisas (1982, p. 18).

A precocidade científica de Einstein também pode ser explicada pela atividade que
exerciam seu pai e seu tio. Eles se dedicavam ao desenvolvimento de artefatos
eletromecânicos, como ressalta Galison:

O conhecimento de Einstein sobre mecanismos eletromecânicos vinha em


parte do negócio de família. Na verdade, o pai de Einstein, Hermann, e seu
tio Jakob, construíram seu negócio a partir das patentes do tio sobre
sensíveis mecanismos elétricos semelhantes a relógios, para medir o uso de
eletricidade (2005, p. 17).

As discussões com seu amigo Max Talmud vieram seguidas de uma liberdade de
pensamento que colocaram seus dogmas religiosos em total contradição. Vale a pena
ressaltar que Einstein, aos 10 anos, entregou-se a uma religiosidade profunda, apesar de ser
filho de pais absolutamente não-religiosos. Segundo Einstein:

A leitura de livros científicos populares convenceu-me de que a maioria das


histórias da Bíblia não podia ser real. A consequência foi uma orgia
positivamente fanática de livre-pensamento, combinada com a impressão de
que a juventude é decididamente enganada pelo Estado, com mentiras; foi
uma descoberta esmagadora. Essa experiência fez com que passasse a
desconfiar de todo tipo de autoridade, adotando uma atitude cética quanto
às convicções vigentes em qualquer ambiente social específico (1982, p.
14).

Os estudos primários escolares de Albert Einstein foram intensos. Com 12 anos


começava a estudar o cálculo diferencial e integral. Aos 17, ingressava no curso de
formação de professores secundários de matemática e física da Escola Politécnica de
Zurique. Na virada de século, Einstein se formava na universidade, mas não conseguiu uma
vaga para assistente na escola. Nesse momento, Einstein tinha 21 anos e passava por um
momento conturbado em sua vida. Ele mudou várias vezes de emprego e foi obrigado a
desenvolver sua tese de doutorado na Universidade de Zurique. Aos 23 anos, Einstein
ingressava como técnico de terceira classe no escritório de patentes em Berna, onde passou

30
7 anos, ou seja, o Annus Mirabilis aconteceu durante esse período.15
Vale a pena ressaltar a importância que o trabalho no escritório de patentes teve na
obra científica de Einstein. Lá, ele tomou contato com todos os tipos de novidades nas áreas
de artefatos elétricos e inovações na emergente área de telefonia. O grande esforço dos
pesquisadores da época era criar soluções envolvendo compostos elétricos e de
comunicações. Segundo Galison:

A tecnologia que brotava produziu patentes em cada setor da rede: patentes


de geradores de baixa voltagem, patentes de receptores eletromagnéticos,
com todos os seus escapamentos e armaduras, patentes de interruptores de
contato. (...) Havia patentes de alarmes remotos, regulagem remota de
pêndulos, transmissão de tempo por telefone – mesmo sem fio; outras
patentes chegavam propondo relógios para as saídas e chegadas das
estações de trem, além de patentes para relógios que indicavam a hora em
outras zonas de tempo. Todas essas patentes cronométricas – juntamente
com um grande número de outras relacionadas a elas – passaram pelo
escritório suíço de patentes em Berna, e indubitavelmente muitas delas
passaram pela mesa de trabalho de Einstein (2005, p. 16).

O contato com a família, a vida universitária e a experiência no escritório de


patentes tiveram uma influência significativa no desenvolvimento científico do jovem
Albert Einstein, segundo Moreira (2005, p. 40):

No contexto formativo, o envolvimento da família de Einstein em negócios


ligados à tecnologia elétrica – uma das fronteiras tecnológicas da época –
deve tê-lo influenciado significativamente. Seu pai, que queria vê-lo
formado em engenharia elétrica, e seu tio produziam equipamentos de
precisão para medidas elétricas e dínamos. Por outro lado, como estudante
universitário, Einstein passava longas horas no laboratório: “Trabalhei a
maior parte do tempo no laboratório de física, fascinado com o contato
direto com a experiência”. Já sua atividade no escritório de patentes – de
junho de 1902 a outubro de 1909 – foi “uma verdadeira benção para mim.
Isso me forçou a um pensamento multilateral e também forneceu um
importante estímulo para a reflexão em física”.

Galison demonstra que ao ingressar no escritório de patentes na função de perito,


Einstein tomou contato, em sua mesa de trabalho, com todas as inovações tecnológicas
criadas na época.
15
Cf. VIEIRA, Cássio Leite. Albert Einstein – uma cronologia. Ciência & Ambiente, n. 30, 2005.

31
Quando Einstein veio para o escritório de patentes de Berna em 1902,
penetrou em um mundo no qual o triunfo do elétrico sobre o mecânico já
estava simbolicamente a sonhos da modernidade. (...) o escritório era uma
tribuna de honra para o grande desfile das modernas tecnologias. (2005, p.
33)

O contexto histórico no qual se deu a formação acadêmica de Albert Einstein foi


uma época de profunda transição na ciência. As novas tecnologias emergentes e resultados
inexplicáveis através de novos domínios da experiência influenciaram sua maneira de
pensar. Mesmo assim, havia um problema em que os pesquisadores não conseguiam
resolver: a sincronização dos relógios, um dos grandes problemas que dominavam a
Europa.
Com o advento de trens cada vez mais velozes e da comunicação à distância através
do telefone, fazia-se necessária uma sincronização precisa dos relógios. A contagem do
tempo, no século XIX e começo do XX, era totalmente desorganizada. Havia um relógio
central, também chamado relógio mestre, que era conectado via cabos elétricos com os
demais relógios da região. A transmissão dos sinais se dava por sistemas de distribuição
elétrica e com aparatos mecânicos. Galison define bem essa realidade:

Essa estrutura coordenada de relógio radial, e que se espraia em braços,


visível em cabos, geradores e relógios, mostrada em livro após livro sobre a
mensuração do tempo, era precisamente aquela do sistema europeu do
relógio-mestre, bem como seus dependentes secundários e terciários.
Quando os sinais enviados a partir do centro chegavam aos pontos
distantes, estivessem eles na sala ao lado ou a 100 quilômetros de distância,
eram definidos como simultâneos; e com base nisso os trens viajavam, as
tropas eram movidas e as mensagens do telégrafo eram enviadas (2005, p.
25, grifos do autor).

A confusão era tamanha que, por exemplo, a Torre da Ilha em Genebra possuía três
relógios em série. O relógio do meio marcava o tempo local, por exemplo, 10h13min.
Nesse exato momento, o relógio da esquerda marcava 9h58min com referência a Paris ao
longo da via férrea da companhia de trem Paris-Lyon-Mediterranée. O relógio da direita
exibia a hora de Berna com cinco minutos adiantado, 10h18min. Em países como a
Alemanha, esse problema se intensificava com a existência de cinco unidades diferentes de

32
tempo.
Tal problema sempre intrigava o jovem Albert Einstein. Em sua caminhada diária
até o seu trabalho no escritório de patentes, ele passava pelas grandes torres do relógio em
Berna e percebia o grande sistema de relógios coordenados. Sem dúvida alguma, a
sincronização dos relógios era um grande enigma que perturbava os cientistas da época e de
todas as pessoas que dependiam da marcação do tempo com precisão. Mais adiante
veremos como o problema foi solucionado. Voltemos as explanações referentes às
influências científicas de Albert Einstein.
A transição do século XIX e XX experimentou o nascer de uma nova concepção
sobre a realidade da matéria. Essa nova maneira de explicar os processos atômicos fez parte
constante do estudo científico de Einstein e trouxeram para ele grandes debates filosóficos.
Estamos falando do nascimento da mecânica quântica.
Em 1900, o físico alemão Max Planck postula que a luz é transferida através de
pacotes de energia, denominados quantum. A luz apresenta um caráter dual, sendo
composta, ao mesmo tempo, de onda eletromagnética e partícula. Com isso nasce a teoria
dos quanta, que até hoje intriga físicos e pesquisadores da área. Segundo Einstein:

Assim, a revolução começada com a introdução do campo não terminara


ainda. Então, no início do século (...), houve uma segunda crise
fundamental, cuja gravidade imediatamente se reconheceu, devido às
investigações de Max Planck sobre a radiação do calor (1982, pp. 42-43).

Com o início dos estudos dos fenômenos atômicos, Albert Einstein sempre procurou
respostas para tais acontecimentos, sem deixar de lado sua preocupação com os estudos
referentes à relatividade. Devido a isso, a obra científica de Einstein parece estar dividida
em duas abordagens teóricas distintas da matéria: o campo contínuo – teoria da relatividade
e cosmologia – e as propriedades atômicas e quânticas dos corpos. Segundo Paty:

Podemos acompanhar, na verdade, ao longo de suas pesquisas, desde os


primeiros trabalhos até suas derradeiras reflexões, a permanência desta
dupla preocupação, com o campo contínuo e com os quanta, bem como a
dualidade persistente, nessas duas direções, de sua metodologia, constituída
sempre de um exame crítico com vistas a uma construção teórica (2005, p.

33
37).

Os artigos publicados em 1905, na revista científica alemã Annalen der Physik,


deixaram bem clara essa tendência. Poucos são os trabalhos científicos de Einstein em que
se encontram unidas as considerações relativas às duas maneiras distintas dos domínios da
física, que envolvem a teoria da relatividade e da física quântica. Aliás, até hoje persegue-se
uma teoria unificada que englobe a relatividade e o fenômeno dos quanta. Em uma das
muitas cartas de Einstein aparece seu desejo de unificar as teorias da física: “A verdadeira
meta de minha pesquisa sempre foi a simplificação e a unificação do sistema da física
teórica” (1979, p. 15).
Veremos, então, como foi o desenrolar de um dos anos mais importantes para a
ciência.

3. O Annus Mirabilis
O ano de 1905 ficará marcado para a história como o ano em que apenas uma
pessoa desenvolveu estudos científicos que marcaram toda a evolução da ciência e do
mundo.16 Nesse ano surgiram teorias revolucionárias que derrubavam alguns conceitos
fixos dentro da comunidade científica da época. Os cinco papers de Einstein abrigavam
muitos dos grandes problemas da física, como a relatividade e os fenômenos quânticos. Em
uma carta para seu amigo Conrad Habicht, em maio de 1905, Einstein resume o momento:

Eu lhe prometi quatro trabalhos. O primeiro trata da radiação e das


propriedades energéticas da luz e é muito revolucionário como você verá. O
segundo é uma determinação dos tamanhos reais dos átomos a partir da
difusão e da viscosidade de soluções diluídas de substâncias neutras. O
terceiro prova que, baseado na hipótese da teoria molecular do calor, corpos
da ordem de 1/1.000 mm, suspensos em líquidos, devem executar um
movimento aleatório observável, que é produzido pelo movimento térmico;
de fato, os fisiologistas observaram movimentos de pequenos corpos em
suspensão, inanimados, os quais chamam de ‘movimento browniano’. O
quarto artigo, neste momento apenas um rascunho grosseiro, é uma
eletrodinâmica de corpos em movimento, que utiliza uma modificação da
16
É certo que alguns dos conceitos apresentados já estavam sendo desenvolvidos por outros autores como
Poincaré ou Lorentz. A grande sacada de Einstein foi romper grandes paradigmas, como a teoria ondulatória
da luz e o conceito do éter.

34
teoria do espaço e do tempo.17

Passaremos à explanação dos cinco artigos de 1905. “Sobre um ponto de vista


heurístico concernindo a geração e a conversão de luz” foi concluído no dia 17 de março e,
segundo Einstein, classificado como “a ideia mais revolucionária de sua vida”.
Basicamente consiste em explicar que a luz, sob certos aspectos, se comporta como
partícula. Tal ideia contradizia a eletrodinâmica de Maxwell, na qual a luz somente se trata
de uma onda eletromagnética. Durante todo o século XIX, a teoria ondulatória da luz era de
enorme aceitação para os físicos da época. A luz se deslocava no espaço através de um
meio que lhe dava suporte, o éter18. Talvez por isso Einstein declara que sua ideia é
revolucionária. Por contradizer postulados aceitos por praticamente todos os pesquisadores
da época. Segundo Einstein:

... diante dos fatos observados, a teoria ondulatória da luz sacode as


barreiras. Antes, imaginava-se a luz no espaço vazio como um fenômeno de
vibração do éter. Mas começa-se a brincar a sério ao vê-la como um
conjunto de pontos materiais! (...) Assim, em um setor particular da física
teórica, o campo contínuo e o ponto material são os representantes da
realidade física (1982, p. 195).

A teoria ondulatória sofre uma contradição ao não conseguir explicar a “radiação do


corpo negro”, experimento realizado em 1860 por Gustav Kirchoff – o teste recebeu esse
nome pois a pesquisa foi feita usando-se um recipiente metálico fechado, aquecido, e
observou-se a radiação emitida por uma pequena abertura nele feita (MOREIRA, 2005, p.
36).
Max Planck interpreta o fenômeno propondo que a troca de energia entre a radiação
luminosa e a matéria só pode ocorrer através de quantidades com um certo valor mínimo –
o quantum de energia – e não de forma contínua, como exigido pela teoria ondulatória
(ibidem).
Albert Einstein não considerava as leis da mecânica clássica e nem da
17
Cf. em MOREIRA, Ildeu de Castro. 1905 – Um ano miraculoso. Revista Ciência Hoje, v. 36, n. 212, 2005.
18
Em 1881, o físico Albert Abraham Michelson, no famoso experimento conhecido como interferômetro
Michelson-Morley, tentou comprovar a realidade física do éter. Nada foi detectado, causando uma crise nos
conceitos teóricos existentes.

35
eletrodinâmica como sendo definitivas ou absolutas. Por isso sempre suspeitava dos
preceitos regidos por tais teorias. Max Planck, apesar da grande inovação de suas
explicações, ainda estava preso à ideia de que a luz se comportava somente como onda
eletromagnética se deslocando no éter. Segundo Paty:

Ora, nesse justo momento ele estava consciente de outras dificuldades da


teoria eletromagnética, como as que se referem ao espectro da radiação da
luz, dificuldades que transpareciam nos trabalhos de Planck e cujo caráter
problemático ele foi o primeiro a perceber – donde a necessidade de dispor
de uma outra teoria. Isso devia tornar-se evidente pela descontinuidade da
energia dos quanta de radiação, dos quais a teoria do campo
eletromagnético contínuo não podia dar conta: os trabalhos de Planck de
1900 só citavam uma quantificação de trocas de energia, sem mencionar a
radiação em si mesma (2005, p. 42-43, grifos do autor).

Segundo Davidovich: “Einstein propõe (...) que a luz comporta-se como se fosse
constituída de unidades elementares de energia proporcional à sua frequência” (2005, p.
84).
Com esse postulado, Einstein semeava o conceito de fótons que são a base dos
estudos da física quântica. Se a luz é composta por partículas, então ela deve interagir com
a matéria, fazendo com que as superfícies de certos metais emitam elétrons se a luz for
incidida sobre ela. O caráter corpuscular da luz faz com que elétrons sejam arrancados da
placa de metal por incidência de radiação. Os elétrons são arrancados, pois sofreram
excitação advinda dos quanta de luz. Dessa maneira, o fenômeno fotoelétrico, que é
conhecido desde as experiências de Hertz em 1887, é explicado e futuramente traria o
prêmio Nobel para Einstein em 1921. Segundo Einstein (apud MOREIRA):

Penso que as observações sobre a radiação do corpo negro, a


fotoluminescência, a produção de raios catódicos [elétrons] pela luz
ultravioleta, e outras classes de fenômenos concernentes à produção e à
transformação da luz, parecem mais compreensíveis se admitirmos que a
energia da luz está distribuída de maneira descontínua no espaço. Segundo
a hipótese proposta aqui, na propagação de um raio luminoso, emitido por
uma fonte pontual, a energia não está distribuída de maneira contínua sobre
espaços cada vez maiores, mas é constituída de um número finito de quanta
de energia localizados em pontos do espaço, cada um se deslocando sem se
dividir e podendo ser absorvido ou produzido apenas em bloco (2005, p.

36
36).

Davidovich demonstra os conceitos teóricos do fenômeno fotoelétrico, compara


com as explicações da teoria eletrodinâmica e esclarece a equação E = h ν.

O artigo publicado por Einstein em 1905 propõe uma explicação para o


efeito fotoelétrico: luz incidindo sobre a superfície de certos metais leva à
emissão de elétrons, cuja energia independe da intensidade da luz e parece
aumentar com a frequência. A teoria clássica do eletromagnetismo, por
outro lado, previa que a energia do elétron deveria aumentar com a
intensidade da luz. Einstein propõe que a emissão de um elétron deve-se à
absorção de um fóton de energia hν, sendo h a constante de Planck e ν a
frequência da luz. A energia do elétron emitido é dada por E = h ν – W,
sendo W a energia necessária para vencer uma barreira de energia que
depende do metal (2005, p. 85).

Com esse artigo, Albert Einstein deu início a uma das mais polêmicas teorias da
física: a mecânica quântica. Apesar de ser um dos seus fundadores, Einstein futuramente
seria um de seus grandes críticos, como veremos mais adiante. Todavia, ele proporcionou
um enorme passo ao questionar toda uma geração de físicos presos a conceitos absolutos da
ciência.
“Uma nova determinação das dimensões moleculares”. Esse trabalho fez parte da
sua tese de doutorado apresentada na Universidade de Zurique. Em outra frente de
abordagem, Einstein buscava uma pesquisa na qual poderia ser mais facilmente
comprovada pela experiência empírica com o intuito de ser mais aceito pelos físicos da
universidade, já que se tratava de uma tese de doutorado. Aliás, desde 1901 ele tentava
obter o título de doutor pela Universidade de Zurique e obteve grandes frustrações nesse
esforço.
Albert Einstein buscava nesse artigo demonstrar experimentalmente a realidade
física de átomos e moléculas, como calcular seu tamanho. Como ele mesmo disse em carta
a Conrad Habicht: “O segundo artigo é uma determinação dos tamanhos reais dos átomos a
partir da difusão e da viscosidade de soluções diluídas de substâncias neutras”. Segundo
Oliveira, “Einstein mostrou uma nova maneira de se determinar o tamanho de moléculas a

37
partir da difusão de átomos em soluções”.19 De acordo com Salinas:

Einstein adotou desde cedo uma visão realista, objetiva, sobre a existência
de átomos e moléculas. Na sua tese de doutoramento, Einstein analisa o
fenômeno de difusão das partículas do soluto numa solução diluída
(moléculas de açúcar em água) com o objetivo de obter estimativas para o
número de Avogadro e o diâmetro das partículas do soluto (2005, p. 24).

Segundo Pais:

Na tese de doutoramento, Einstein descreveu um novo método teórico para


determinar os raios moleculares e o número de Avogrado (N). Da
comparação das equações finais com os dados sobre soluções de açúcar em
água, determinou que N = 2,1 x 1023 (1995, p. 100).

Veremos mais adiante que esse número ainda não correspondia à realidade. Einstein
buscaria métodos melhores em seu próximo trabalho.
“Sobre o movimento de partículas suspensas em fluídos em repouso”,
desdobramento da tese (recebido para a publicação apenas 11 dias após a tese), foi um
estudo que abordou o movimento browniano. Esse fenômeno leva esse nome porque Robert
Brown, botânico inglês, observou no microscópio o movimento irregular errático de
partículas de pólen suspensa em água em 1828. Albert Einstein explica o fenômeno como o
produto de colisões das partículas suspensas na água com as moléculas do fluído,
produzindo energia térmica e um movimento desordenado da partícula. Muitos consideram
como a prova direta da existência das moléculas. Segundo Moreira:

Einstein previu a variação (média) na posição da partícula ocasionada por


essas colisões, variação essa que pode ser medida pela observação em um
microscópio. Deduziu também uma maneira de se calcular o número de
Avogadro (cerca de 6 x 10 23), ou seja, o número de átomos (ou moléculas)
existentes em uma quantidade prefixada – o chamado átomo-grama (ou
molécula grama) – de um elemento químico ou substância (2005, p. 37).

Em 1905, as interpretações dos fenômenos microscópicos ainda eram vistos com


muita desconfiança pela comunidade científica da época. A explicação da natureza mais
íntima da matéria não trazia resultados consistentes e Einstein trabalhou ativamente nesse

19
OLIVEIRA, A. Aol - Educação. 24 de nov. 2005.

38
aspecto, principalmente no início da carreira. Segundo Rosenfeld: “Usando dados
experimentais da época, Einstein encontrou valores para o número de Avogadro (6 x 10 23) e
o tamanho da molécula de glucose (15 Å)”. Segundo Oliveira:

Einstein imaginou que o zigue-zague dos grãos de pólen no movimento


browniano era devido às moléculas de água atingindo os pequenos grãos de
pólen. Os grãos de pólen eram visíveis, mas as moléculas de água não. (...)
Importantíssimo mesmo foi que esse trabalho fez predições acerca das
propriedades dos átomos que podiam ser testadas experimentalmente. 20

Com essa pesquisa, não somente foram explicados fenômenos microscópicos e


atomísticos, mas o lado estatístico da tentativa de prever o movimento médio da partícula
submersa na água fez surgir um cálculo de probabilidades utilizado até hoje em várias áreas
das ciências como a economia, a ecologia e na engenharia. De acordo com Rosenfeld:

Uma nova matemática teve que ser desenvolvida para descrever trajetórias
do movimento browniano: o cálculo estocástico. Assim, a tese do
movimento browniano é usada como modelo para inúmeros processos
estocásticos, não só em Física, mas também em outras áreas, como
finanças, por exemplo (ibidem).

“Sobre a eletrodinâmica dos corpos em movimento”. Artigo recebido para


publicação em 30 de junho, trata de um dos temas que ligariam o nome de Albert Einstein
até os dias de hoje: a teoria da relatividade. Nesse caso, estamos falando da teoria da
relatividade especial ou restrita, na qual Einstein propõe novas concepções envolvendo a
natureza do espaço e do tempo. A simultaneidade dos fatos não ocorre de fato, partindo do
princípio que a velocidade da luz é finita e obedece a uma velocidade constante c. Dois
eventos que são simultâneos para um observador em repouso, não o são se ele estiver em
movimento. Desse modo, Einstein resolveu um dos grandes problemas do século XIX e já
mencionado anteriormente: a sincronização dos relógios. Segundo Galison:

Em algum momento, em meados de maio de 1905 – e notamos que Einstein


se mudou para o limite da zona de tempo unificado de Berna em 15 de maio
– ele e seu amigo mais chegado, Michel Besso, cercaram o problema do
eletromagnetismo por todos os lados. “Então”, recorda Einstein, “de repente
20
OLIVEIRA, A. Aol – Educação. 2005.

39
entendi onde estava a chave do problema.” Ele nem saudou Besso no dia
seguinte e já foi dizendo: “Pode me dar os parabéns; resolvi completamente
o problema. Uma análise do conceito de tempo foi minha solução. O tempo
não pode ser definido em termos absolutos e há uma relação inseparável
entre tempo e velocidade sinalizada” (2005, p. 23).

A partir desse postulado, as coordenações dos relógios começaram a serem feitas


utilizando-se meios luminosos, como por exemplo, sinais de rádio. Sua nova definição para
se medir o tempo e sincronizar os relógios, por meio de sinais luminosos, levou ao
abandono da noção de tempo absoluto (MOREIRA, 2005, p. 38).
Na teoria da relatividade restrita, espaço e tempo não podem ser considerados como
características absolutas. Velocidade, distância e tempo são relativos com relação ao estado
de movimento do observador não passando de fenômenos de perspectiva. Segundo Videira:
“Para Einstein, nem todas as propriedades mensuráveis de um sistema físico lhe são
intrínsecas e, portanto, absolutas, as mesmas para qualquer observador, mesmo que esta se
desloque rapidamente relativamente ao objeto em causa” (2005a, p. 68).
Esse estudo foi fruto da interpretação de duas linhas da física vigentes na época: o
princípio da relatividade galileana21 e a teoria eletrodinâmica, que entravam em contradição
uma com a outra. A cinemática de Galileu-Newton não satisfazia a dinâmica de Maxwell.
Assim, Albert Einstein em sua teoria, unificava essas duas teorias da física clássica, mas
que implicava transformações drásticas nos conceitos de espaço e tempo. Segundo Einstein:
“A teoria da relatividade restrita se originou das equações do campo eletromagnético de
Maxwell. Por outro lado, este último só pode ser compreendido de modo satisfatório por
meio da relatividade restrita” (1982, p. 63).
Inúmeros físicos da época como Hendrik Lorentz e Henri Poincaré chegaram a
desenvolver estudos sobre a teoria da relatividade, mas nunca obtiveram uma versão final
da teoria. Eles tentavam resolver o problema a partir da dinâmica, ao tentarem criar uma
nova teoria para o eletromagnetismo. Também ficaram presos ao conceito do éter, meio que
permeia sutilmente todo o universo. Segundo Stachel22:
21
As leis do movimento de uma massa são as mesmas para todos os observadores que se desloquem
uniformemente uns relativamente aos outros (VIDEIRA, 2005a, p. 71).
22
STACHEL, J. As visões de Einstein. Revista Ciência Hoje, v. 36, n. 214, 2005.

40
Eles (Lorentz e Poincaré) achavam que os problemas da óptica, da
eletrodinâmica dos corpos em movimento tinham que ser resolvidos dentro
da estrutura de uma teoria dinâmica. Einstein foi o primeiro a perceber que
se poderia separar totalmente as questões cinemáticas – como velocidade e
a natureza do espaço e do tempo – da dinâmica. A cinemática é a fundação
da física, e ele foi o único a notar isso e chegar à teoria. Por isso, as
fórmulas de Lorentz e Poincaré são iguais às de Einstein, mas a
interpretação muda. Por exemplo, a contração de Lorentz, para o próprio
Lorentz, é um efeito físico dinâmico real, que faz com que os corpos que se
movem pelo éter alterem seu comprimento, que se contraiam realmente.
Para Einstein, isso era apenas o efeito cinemático, a partir de um referencial
em movimento, para o comprimento de um objeto que está em outro
(referencial), estático. Não há contração realmente. É um efeito de
perspectiva. Lorentz e Poincaré nunca perceberam que não se precisava
resolver os problemas dinâmicos, mas sim criar um novo modelo de
cinemática do espaço-tempo e do movimento para reconciliar os problemas
mecânicos e dinâmicos (2005, p. 7).

A teoria da relatividade restrita prevê que em velocidades próximas à da luz, o


tempo se dilata e o espaço se contrai, se for analisada por um observador externo. Para o
objeto se deslocando à velocidade da luz, nada acontece. Segundo Videira:

Assim, a teoria da relatividade restrita estabelece que a maior distância


entre dois pontos sobre uma régua é aquela medida no referencial próprio
da régua e que o menor intervalo de tempo é o medido no referencial
próprio relógio (2005a, p. 69).

O astrofísico britânico Arthur Stanley Eddington (apud VIDEIRA, 2005a) cita outro
exemplo:

Quando um bastão passa do repouso para o movimento uniforme, nada


acontece com ele. Diz-se que ele se contrai, porém o comprimento não é
uma propriedade do bastão, mas sim uma relação entre o bastão e o
observador. Até que se especifique o observador, o comprimento do bastão
é inteiramente indeterminado.

Moreira também exemplifica as novas concepções do espaço e do tempo trazidos à


tona pela teoria da relatividade restrita. As características mensuráveis como metro e
segundo são relativos com relação ao movimento do observador com o objeto observado:

41
... o tempo flui em taxas diferentes para observadores em movimento
relativo entre si; tanto os intervalos de tempo quanto os comprimentos
medidos variam com o observador, dando origem, respectivamente, ao que
se convencionou chamar dilatação temporal e contração espacial (2005, p.
39).

Vale a pena ressaltar que tais fenômenos acontecem somente a velocidades


próximas à velocidade da luz. É quase impossível comprovar essa tese por experimentos.
Albert Einstein, em seu livro sobre a relatividade intitulado Sobre a teoria da relatividade
especial e geral, deixa bem clara essa ressalva: “Movimentos tão rápidos só nos mostra
pela experiência em elétrons e íons; em outros movimentos as discrepâncias respeito às leis
da mecânica clássica são demasiados pequenas para serem detectáveis na prática (1999, p.
21).
Com o surgimento de novas concepções envolvendo a natureza do tempo e do
espaço conclui-se que essas entidades não são independentes uma da outra. O espaço e o
tempo se encontram intimamente vinculados dando forma a um novo conceito de
dimensão. As três dimensões já conhecidas se unem com o tempo para formar o continuum
quadridimensional. Segundo Einstein:

A relatividade da simultaneidade é reconhecida e, ao mesmo tempo, o


espaço e o tempo são vistos como unidos em um único continuum,
exatamente como anteriormente haviam sido reunidas em um continuum
único as três dimensões do espaço. O espaço físico está agora completo. É
espaço de quatro dimensões, por integrar a dimensão tempo. O espaço de
quatro dimensões da teoria da relatividade restrita aparece tão estruturado,
tão absoluto quanto o espaço de Newton (1981, p. 171).

Videira ressalta a importância da velocidade da luz para o continuum


quadridimensional. Para a luz, não existe a entidade espaço separada do tempo, mas sim o
espaço-tempo.

De acordo com a teoria da relatividade restrita, as medidas de tempo e


espaço tomadas separadamente variam de observador para observador;
variações essas, porém, que se cancelam mutuamente ao se considerar a
geometria quadridimensional do espaço-tempo construído pela união do tri-
espaço com o tempo, intervindo a velocidade da luz como “cola” entre o
espaço e o tempo, de modo a ter-se uma única entidade espácio-temporal

42
(2005a, p. 69).

Na teoria da relatividade restrita, a velocidade da luz no vácuo é constante e


apresenta um valor finito, aproximadamente 300 mil km/s. Nada pode ultrapassar esse valor
e assim caía outro conceito da física newtoniana como a soma das velocidades. Por
exemplo, uma esteira com velocidade de 50 km/h e uma pessoa correndo a 9 km/h.
Obviamente o produto dessa interação seria um deslocamento de 59 km/h. Já na teoria da
relatividade restrita essa situação muda. Por exemplo, uma nave espacial se movendo a 250
mil km/s atira um míssil com velocidade 100 mil km/s. O míssil não atingirá 350 mil km/s,
porque nenhum objeto físico pode superar a velocidade da luz no vácuo, que é 300 mil km/
s. Segundo Moreira: “A nova lei de somas das velocidades – que não obedece mais à soma
direta das velocidades v = v1 + v2, como ocorria na mecânica newtoniana – permite resolver
a aparente inconsistência entre seus dois princípios”23 (2005, p. 39).
Capra reforça a ideia da união entre espaço e tempo e aponta as divergências entre a
física clássica e a teoria da relatividade restrita.

De acordo com a teoria da relatividade, o espaço não é tridimensional e o


tempo não constitui uma entidade isolada. Ambos acham-se intimamente
vinculados, formando um continuum quadridimensional, o “espaço-tempo”.
Na teoria da relatividade, portanto, nunca podemos falar acerca do espaço
sem falar acerca do tempo e vice-versa. (...) o conceito newtoniano de
espaço absoluto como o palco dos fenômenos físicos é posto de lado,
ocorrendo o mesmo com o conceito de tempo absoluto. Tanto o espaço
quanto o tempo tornam-se meramente elementos da linguagem utilizada por
um observador particular para descrever os fenômenos observados (1983, p.
54).

A teoria da relatividade restrita e suas novas concepções sobre o espaço e o tempo


transformaram também outros conceitos como massa e energia. Einstein já havia alertado
quanto a esse considerável poder heurístico de sua teoria:

Esta é uma condição matemática determinada que a teoria da relatividade


prescreve as leis naturais, com o qual se converte em um valioso auxiliar
heurístico na busca de leis gerais da natureza. Se encontrar uma lei geral da
23
Os dois princípios da teoria da relatividade restrita são a constância e finitude da velocidade da luz e o
princípio da relatividade galileana.

43
natureza que não cumpra essa condição, ficaria refutado pelo menos um dos
pressupostos fundamentais da teoria (1999, p. 20).

Einstein tinha razão, como veremos mais adiante. A partir da teoria da relatividade
restrita novas formas de interpretar o mundo apareceram junto com ela. Surgiram também
novos problemas para serem solucionados…
“A inércia de um corpo depende de sua energia?”, recebido para publicação em 27
de setembro e fruto de conclusões obtidas através do quarto artigo. A energia cinética e a
massa se equivalem e se relacionam com a velocidade da luz no vácuo. As equações
contidas nesse artigo, dois anos depois, apresentarão a fórmula mais famosa da física e
quase uma lenda: E = mc2. Segundo Capra:

Os conceitos de espaço e tempo são tão básicos para a descrição dos


fenômenos naturais que sua modificação impõe a modificação de todo o
referencial que utilizamos para descrever a natureza. A consequência mais
importante dessa modificação é a compreensão de que a massa nada mais é
que uma forma de energia. Mesmo um objeto em repouso possui energia
armazenada em sua massa e a relação entre ambas é dada pela famosa
equação E = mc2, sendo c a velocidade da luz (1983, p. 54).

Albert Einstein cita essa equivalência como sendo uma das elucidações de natureza
definitiva que a física deve à teoria da relatividade restrita. “Os princípios da conservação
do momentum linear e da energia fundem-se em um único princípio. A massa inerte de um
sistema isolado é idêntica à sua energia, eliminando assim a massa como conceito
independente” (1982, p. 61).
O conceito de massa sofre uma revolução, já que pela física newtoniana, a massa
era definida como um “estofo” da qual fazia parte da matéria. Com Einstein, a massa nada
mais é que uma forma de energia e vice-versa. Moreira também aponta para a equivalência
entre massa e energia e ressalta que pequenas quantidades de massa podem se transformar
em grandes quantidades de energia.

Einstein deduziu uma fórmula, relacionando a energia de um corpo com sua


massa (inércia), que indica que quantidades muito pequenas de massa
podem ser convertidas em quantidades enormes de energia e vice-versa. A
massa e a energia são de fato equivalentes (2005, p. 39).

44
Albert Einstein considera o novo conceito de massa como um dos pontos mais
importantes da teoria da relatividade restrita. A independência entre massa e energia
postulada por Newton perde sua validade. Segundo Einstein:

O resultado mais importante de índole geral a que foi conduzido a teoria da


relatividade especial concerne ao conceito de massa. A física pré-relativista
conhece dois princípios de conservação de importância fundamental, o da
conservação de energia e o da conservação da massa; estes dois princípios
fundamentais aparecem completamente independentes um de outro. A
teoria da relatividade os funde em um só (1999, p. 22).

Na teoria da relatividade restrita, a radiação carrega inércia entre os corpos


emissores e os corpos que absorvem, por ser o elo entre energia e massa. O corpo que
emana energia perde massa, e o que absorve aumenta. A massa e a energia não são
constantes sólidas e as leis de conservação de energia e massa de Newton são unidas.
Segundo Einstein:

... a massa inercial de um corpo não é uma constante, sem variar segundo a
modificação de sua energia. A massa inercial de um sistema de corpos cabe
contemplá-la precisamente como uma medida de sua energia. O postulado
da conservação da massa de um sistema coincide com o da conservação da
energia e só é válido na medida em que o sistema não absorve nem emite
energia (1999, p. 23).

Como diz Paty:

Einstein havia mostrado, em 1905, num artigo que completava o da


relatividade estabelecendo a inércia (com a fórmula E = mc 2), que “a
radiação transporta inércia entre os corpos que a emitem e os corpos que a
absorvem” (2005, p. 44).

A velocidade de um sistema também participa do processo de transferência de


energia. Um corpo se movendo a uma velocidade constante e que absorve energia em forma
de radiação tende a aumentar a energia se a velocidade for mantida. Segundo Albert
Einstein, “um corpo que se move com velocidade ν e que absorve a energia E 0 em forma de
radiação sem variar por isso sua velocidade, experimenta um aumento de energia” (1999, p.

45
22).
Com as novas modificações envolvendo os grandes parâmetros físicos como espaço,
tempo, momentum, massa e energia. Albert Einstein provocou enormes mudanças na física.
Ele criticou a visão clássica e eletromagnética do mundo, que a maioria dos cientistas
seguiam, em seus primeiros artigos científicos, deixando evidente uma linha que seria
constante em sua vida acadêmica. Os artigos de 1905 – principalmente os dois últimos
sobre a teoria da relatividade restrita – foram um passo à frente em busca da solução dos
grandes enigmas da ciência. Mais adiante, retornaremos a explanar alguns dos princípios
básicos dos artigos de 1905, ano em que Einstein ainda era um desconhecido, mas sua
intensa produção científica e, a revolução que a partir dela surgiu, geraram enorme
controvérsia no nicho acadêmico do qual ele fazia parte. Sua fama mundial só seria iniciada
após a comprovação da teoria da relatividade geral e o recebimento do prêmio Nobel em
1921. Analisemos, então, esse período em que Einstein viveu praticamente no anonimato.

4. Momentos antes da fama


Após o ano miraculoso, Einstein imediatamente voltou seus olhos para as pesquisas
envolvendo o fenômeno dos quanta. Artigos sobre calores específicos e radiação dos
corpos negros foram o principal empenho de Einstein até 1911. Segundo Paty:

De 1905 a 1911, sua atenção se fixou nos quanta, com exceção do artigo –
fundamental – de 1907, em que apresentava uma primeira síntese das ideias
sobre a relatividade. (...) Tendo obtido resultados significativos com os
quanta – uma primeira forma de dualidade ondulatório-corpuscular para a
luz, a extensão da hipótese quântica à estrutura atômica através do
problema dos calores específicos (2005, p. 37).

Logo após esse período de estudos sobre os fenômenos dos quanta, Einstein voltou
a se preocupar com as pesquisas referentes ao campo contínuo. Ele descobriu que os
pressupostos básicos da teoria da relatividade restrita não se encaixavam quando se levava
em conta a gravitação. Segundo ele mesmo: “O fato de ser a teoria da relatividade restrita
apenas o primeiro passo de um desenvolvimento necessário só se tornou evidente para mim
quando procurei representar a gravitação na estrutura dessa teoria” (1982, p. 63).

46
A gravitação já havia sido explicada por Isaac Newton como sendo uma força
misteriosa que os corpos instantaneamente interagem. Relembrando o aspecto básico da lei
da gravitação universal: matéria atrai matéria na razão direta das massas e inversa do
quadrado da distância, na qual dois corpos interagem instantaneamente em um espaço
vazio.
Pois bem, levando-se em consideração uma das premissas básicas da teoria da
relatividade restrita, a luz apresenta uma velocidade constante e finita, sendo que nada pode
superá-la. Ora, dois corpos não podem interagir instantaneamente como na física clássica,
pois o postulado da constância da velocidade da luz seria superado e colocaria a teoria da
relatividade restrita em contradição. Era necessária, afinal, uma nova teoria dos campos de
gravitação. Segundo Einstein:

Ao me arriscar a tratar a lei da gravitação no contexto teórico da


relatividade restrita, agi como a maioria dos sábios daquele tempo. Quis
estabelecer uma lei do campo para a gravitação, já que, evidentemente, a
introdução de uma ação imediata a distância não era mais possível (1981, p.
159).

Einstein sugeriu novas concepções referentes ao conceito de gravitação. Com


Newton, matéria e espaço vazio eram entidades isoladas e, por exemplo, uma pedra era
atraída ao solo simplesmente porque a Terra o atraiu. Albert Einstein, tendo por base os
conceitos de campo introduzido pela eletrodinâmica, conclui a existência de um campo
gravitacional tal como o campo eletromagnético. Segundo Einstein: “A influência da Terra
sobre a pedra se produz indiretamente. A Terra cria ao seu redor um campo gravitacional.
Esse campo atua sobre a pedra e ocasiona seu movimento de caída (1999, p. 32).
Einstein deixa clara a diferença entre campo gravitacional e campo eletromagnético,
exemplificando a velha experiência dos corpos de massas diferentes que chegam ao mesmo
tempo ao chão.

O campo gravitacional, ao contrário do campo elétrico e magnético, mostra


uma propriedade peculiar que é de importância fundamental para o que
segue. Os corpos que se movem para baixo pela ação exclusiva do campo
gravitacional experimentam uma aceleração que não depende do material

47
nem do estado físico do corpo. Uma pluma e um tronco de madeira, por
exemplo, caem exatamente iguais no campo gravitacional (em ausência de
ar) quando os deixamos cair sem velocidade inicial ou com velocidades
iniciais iguais (1999, p. 32).

Com Newton, as dimensões do espaço e tempo eram separadas da gravitação.


Einstein, após os trabalhos com a teoria da relatividade restrita, percebeu que havia
contradições com os conceitos de gravidade. Ele buscou unificar essas duas concepções e
elaborar uma teoria que explicasse todos os fenômenos do Universo. Em 1911, Einstein
publica um artigo que aborda a questão de como a luz é desviada ao passar nas
proximidades de um campo gravitacional intenso. Mas foi em 1915 que surge a teoria da
relatividade geral, trabalho que para muitos historiadores da ciência foi o principal estudo
de Einstein em toda a sua vida, sendo sua maior contribuição para a física, o que lhe trouxe
fama mundial e toda a mistificação que nos atinge até os dias atuais. “A relatividade geral é
uma bela teoria que está de acordo com todas as observações feitas”, afirma Stephen
Hawking (1997). De acordo com Videira. “Ela (teoria da relatividade geral) constitui
indubitavelmente umas das mais profundas, mais deslumbrantes, mais belas produções do
espírito humano”. (2005a, p. 66)
Partindo do princípio que as massas inerciais e gravitacionais se equivalem, ou seja,
uma pessoa dentro de um foguete acelerando a 10 m/s 2 apresenta a mesma massa e
sensação de outra pessoa na superfície da Terra, Albert Einstein, através de minuciosos
cálculos tensoriais e geometria avançada, cria a teoria da relatividade geral. Nela, os corpos
tendem a curvar o espaço com uma força equivalente a suas massas. Assim, a velha
geometria euclidiana é revista em certos casos e a lei de gravitação universal de Newton
também entra em crise. Não só as características geométricas são revistas, mas a interação
entre matéria e radiação também são influenciadas pelo novo teorema. Segundo Videira:

A teoria da relatividade geral distingue-se, contudo, das demais por ser


exemplo único de uma teoria física em que a sua arquitetura apresenta a
face geométrica (o palco do espaço-tempo) e a face entidades dinâmicas (os
atores matéria e radiação) explicitamente entrelaçados na sua equação
fundamental do campo gravitacional – a chamada equação de Einstein
(2005a, p. 79).

48
Com a teoria da relatividade geral, Einstein demonstra que tanto a radiação quanto a
matéria são influenciados pela presença de corpos e a relação desse encurvamento se
relaciona com a massa. Segundo Einstein:

Segundo a teoria da relatividade geral, as propriedades geométricas do


espaço não são independentes, sem que venham condicionadas pela
matéria. Por isso não é possível inferir nada sobre a estrutura geométrica do
mundo a menos que a reflexão se funde no conhecimento do estado da
matéria (1999, p. 52).

Vale a pena ressaltar que essa situação só é verificada pelos meios experimentais
quando a matéria está sendo influenciada por corpos extremamente massivos. Mesmo o
Sol, que contém 99,8% da massa de todo o Sistema Solar e 330 mil vezes mais que a massa
do nosso planeta, é capaz de causar apenas sensíveis alterações ao seu redor. Segundo
Einstein:

Ainda que uma reflexão detida demonstre que a curvatura que prediz a
teoria da relatividade geral para os raios luminosos é ínfima nos casos de
campos gravitacionais que nos brinda a experiência, tem que ascender a 1,7
segundos de arco para raios de luz que passam pelas imediações do Sol.
Este efeito deveria traduzir-se no fato de que as estrelas fixas situadas nas
cercanias do Sol, e que são observáveis durante eclipses solares totais,
apareçam afastadas dele nessa quantidade, comparado com a posição que
ocupam para nós no céu quando o Sol se acha em outro lugar da abóbada
celeste (1999, p. 36).

Isso quer dizer que as estrelas fixas que se encontram ao lado do Sol sofrem desvios
da sua posição original e nos mostram apenas uma posição aparente. Vimos que não apenas
a radiação é alterada, mas também a matéria. A precessão no periélio da órbita do planeta
Mercúrio24 que já é conhecida desde 1859 confirma as predições da teoria da relatividade
geral. De acordo com Einstein:

Agora bem, do planeta Mercúrio sabemos desde Leverrier que a elipse de


sua órbita com respeito às estrelas fixas, uma vez corrigida no sentido
24
Primeiro planeta se contado a partir do Sol e localizado a apenas 58 milhões de km da estrela. Com uma
massa relativamente pequena, se trata do único planeta em que foi detectado esse desvio na órbita causada
pela teoria da relatividade geral.

49
anterior, não é fixa, senão que rompida – ainda que lentamente – no plano
orbital e no sentido de sua revolução. Para este movimento de rotação da
elipse orbital se obteve um valor de 43 segundos de arco por século. (1999,
p. 48)

Esse fenômeno ocorre em todos os planetas e objetos que se encontram no campo


gravitacional do Sol, mas devido aos parâmetros físicos e orbitais do planeta Mercúrio, e
sua relativa pequena distância da nossa estrela, apenas nele é possível detectar um desvio
dessa ordem. Nos demais objetos ainda não há instrumentos tão sensíveis para verificar
desvios na trajetória tão ínfimos.
Com a tese apresentada à Preussische Akademie der Wissenschaften, faltava agora a
comprovação empírica da teoria da relatividade geral. Albert Einstein já tinha indicado que
a comprovação viria através da comparação da posição de um grupo de estrelas com e sem
a presença do Sol nos arredores. Como a presença do Sol obviamente ofuscaria o brilho das
estrelas próximas, era necessário que acontecesse um eclipse solar total para fazer tal
estudo comparativo. A Lua deveria cobrir o Sol de maneira que barrasse quase toda a sua
luz e fazer com que as estrelas próximas ficassem visíveis.
Toda a comunidade científica mundial se empenhou em buscar os próximos eclipses
que iriam acontecer. Algumas expedições foram feitas para os locais onde ocorreriam o
fenômeno e fornecer dados para a comprovação da teoria da relatividade geral. A primeira
tentativa foi em 1912 no Brasil. Machado conta que “a primeira tentativa de comprovação
da Teoria da Relatividade foi feita no Brasil, na cidade de Passa Quatro, na divisa dos
estados de Minas Gerais e São Paulo, mas no dia 10 de outubro de 1912, dia do eclipse,
choveu e o mau tempo impediu as observações”.25 (2004, p. 8)
O eclipse de 1912 e a expedição promovida por astrônomos argentinos, alemães e
ingleses – dentre eles o famoso Arthur S. Eddington, talvez o personagem principal na
história da comprovação experimental da teoria da relatividade geral – acabou sendo um
enorme fracasso, uma vez que choveu torrencialmente, o que impossibilitou o registro
fotográfico do fenômeno. (VIDEIRA, 2005b, p. 158).
No entanto, os astrônomos calcularam outro eclipse que aconteceria no dia 29 de
25
MACHADO, S. Sobral: onde a luz curvou-se perante Einstein. Revista Macrocosmo. n. 6, 2005.

50
maio de 1919 e que o local mais viável para a observação seria o nordeste do Brasil e Ilhas
do Príncipe, na África Ocidental. Sobral, cidade localizada no Ceará, foi escolhida para
abrigar os pesquisadores e astrônomos. Segundo Machado:

Sobral fica na região do semiárido, onde a possibilidade de chuvas em


certas épocas do ano é quase mínima. Além disso, a locomoção até Sobral
seria facilitada pelo porto de Camocim, de onde existe uma ligação via
férrea com a cidade. No início do século XX, os instrumentos de
observação e fotografia eram pesados e de difícil locomoção, o que facilitou
a escolha da cidade cearense. Em termos astronômicos, comparados com
outras cidades brasileiras onde daria para acompanhar o eclipse total,
Sobral estaria no centro da zona de totalidade, dando mais tempo para os
cientistas acompanharem (2004, p. 10).

O eclipse de 1919 fornecia condições excelentes para a verificação da teoria da


relatividade geral. Além do fenômeno ter uma longa duração, o Sol estava posicionado no
meio da constelação de Touro e bem próximo das Hyades, região do céu com enorme
quantidade de estrelas. Isso facilitou os estudos comparativos dos astrônomos e físicos.
Assim, no dia 26 de abril, chegaram a Sobral dois membros da equipe inglesa, Andrew
Crommelin e Charles Davidson. A expedição brasileira chegou no dia 9 de maio. Como diz
Videira:

De acordo com o relatório que Crommelin escreveu mais tarde, o dia 29 de


maio amanheceu nublado. Contudo, horas depois, as nuvens se dissiparam,
abrindo-se um buraco entre elas, onde o Sol permaneceu durante toda a
duração do eclipse. As fotografias foram tiradas. De Sobral, Crommelin
expediu um curto telegrama com os dizeres: “Esplendido eclipse” (2005b,
p. 159).

Arthur Eddington e colaboradores seguiram até as Ilhas do Príncipe, mas lá o


eclipse foi atrapalhado por nuvens que cobriram o disco solar, ressaltando ainda mais a
importância dos dados colhidos em Sobral.
Os pesquisadores permaneceram em Sobral durante mais dois meses para obterem
as imagens das estrelas já sem a presença do Sol. Após a revelação das fotos e um
minucioso estudo comparativo os cientistas ingleses, chefiados por Arthur Eddington,
concluíram que os dados obtidos poderiam ser utilizados para a comprovação da teoria de

51
Einstein. Em reunião realizada na Royal Astronomical Society foi apresentado as
conclusões das pesquisas fruto das observações astronômicas durante o eclipse solar.
Segundo Machado:

No dia 6 de novembro de 1919, uma reunião conjunta da Comissão do


Eclipse da Royal Society e da Royal Astronomical Society foi convocada.
Sir Frank Dyson, astrônomo real, anuncia que os resultados das medidas
confirmaram as previsões de Einstein. No dia seguinte, entre as manchetes
do Times, de Londres, encontrava-se: “Uma revolução na ciência. As ideias
de Newton estão arruinadas” (2004, p. 11).

Essa manchete, que à primeira vista pode soar sensacionalista, talvez tenha
resumido um sentimento de enorme transformação que se iniciava nesse instante. Todas as
noções de espaço e tempo que a humanidade tinha formulado durante séculos entravam em
crise e precisavam ser revistas. De acordo com Videira:

Essa conclusão (pesquisa do eclipse) foi oficialmente divulgada em 6 de


novembro de 1919 ao mundo, numa sessão solene da Royal Astronomical
Society. O ambiente na ocasião foi de profunda emoção, como foi relatado
por Alfred N. Whitehead, que compareceu à sessão. No dia seguinte, o
jornal inglês The Times anunciava em suas páginas que uma revolução
havia acontecido na ciência. O nome de Albert Einstein tornava-se
celebridade mundial (2005, p. 159).

Após a comprovação da teoria da relatividade geral, Albert Einstein experimentou


um súbito aumento de fama e prestígio. Começava, ali, a exercer enorme influência sobre
todos os ramos da física, da ciência e até da política. Ele foi uma pessoa que viveu
intensamente o contexto social e político que acontecia na Europa e na América nos
conturbados momentos da primeira metade do século XX. Viajou por vários lugares do
mundo, inclusive o Brasil, como veremos adiante. Por ser descendente de judeus foi
aclamado por congregações e sinagogas judaicas e causou furor em diversas universidades
e academias de ciências em várias partes do globo. Em muitas de suas cartas, Einstein
escreve para seu amigo Heinrich Zangger:

Com a fama, eu estou ficando cada vez mais estúpido, o que, naturalmente,
é um fenômeno muito comum. Existe uma desproporção enorme entre o

52
que você é e o que os outros pensam que você é ou, pelo menos, com o que
dizem que você é. Mas você tem de aceitar tudo isto com bom humor
(1979, p. 13).

Em 1921, Albert Einstein recebe o prêmio Nobel e reforça mais ainda sua fama
mundial. É curioso notar que o motivo que o levou a receber o prêmio foi devido às suas
explicações envolvendo o fenômeno fotoelétrico e não sua grande obra-prima, a teoria da
relatividade. Está no site26 da organização do prêmio Nobel a seguinte frase referindo-se ao
prêmio de Einstein: “Pelos seus serviços à física teórica, e em especial pela descoberta da
lei do efeito fotoelétrico”. Isso exprimia a grande ressalva dos físicos que escolhiam e
indicavam os laureados ao prêmio e esperavam maiores comprovações empíricas da teoria
da relatividade. Geralmente, os organizadores do Nobel premiavam físicos que descobriam
algum novo artefato ou conhecimento que pudesse ser facilmente aplicado e acabavam
preterindo os físicos teóricos. Henri Poincaré diversas vezes foi indicado, mas nunca levou
o prêmio.

5. Após a fama mundial


Na década de 20 do século XX, Albert Einstein passou grande parte do tempo em
viagem pelo mundo. Visitou diversos países como os Estados Unidos, França, Japão,
Palestina, Argentina e até o Brasil. Em cada país visitado, Einstein explicava suas teorias,
as últimas novidades na física e os grandes embates científicos e filosóficos do momento.
Esse período marcou o grande avanço de uma teoria que havia se principiado com ele e que
causou grandes debates dentre os físicos: a teoria quântica.
Mais adiante, explanaremos as visões de Einstein sobre os fenômenos dos quanta.
Agora, concentremo-nos na sua viagem para o Brasil.

5.1. Visita ao Brasil


Albert Einstein viajou pela América do Sul nos meses de abril e maio de 1925.
Inicialmente passou pelo Rio de Janeiro, sendo recebido por uma comissão composta por
26
The Nobel Prize in Physics 1921 - <https://www.nobelprize.org/prizes/physics/1921/summary/>. Acesso
em: 16 de abr. 2005.

53
cientistas, jornalistas e membros da comunidade judaica. Nessa rápida passagem, escreveu
para um jornalista a célebre frase: “O problema que minha mente formulou foi respondido
pelo radiante céu do Brasil”. Depois seguiu viagem rumo à Argentina e o Uruguai. No dia 4
de maio retornou ao Brasil. Os motivos que fortaleceram o assentimento de Einstein ao
convite da comunidade científica brasileira estavam em total acordo com a linha política do
famoso físico. Segundo Videira:

Desde a sua juventude, havia esposado ideias liberais em política e em


ciência. (...) Entre esses temas, estava o apoio que os governos nacionais
deveriam dar à ciência. Em 1925, a ciência brasileira ainda buscava
conseguir as condições que lhe permitissem a concretização de seus
anseios. Por exemplo, não existiam universidades, que eram vistas como o
local apropriado para a pesquisa científica (2005b, p. 160).

Albert Einstein permaneceu no Rio de Janeiro por oito dias e visitou diversos
centros de pesquisa científica, como o Museu Nacional, Instituto Oswaldo Cruz e o
Observatório Nacional. Ele proferiu palestras sobre a relatividade e as novas ideias da
física. Na Academia Brasileira de Ciências, ele deixou de lado os discursos protocolares e
fez uma ótima explicação da situação de um dos embates científicos que intrigavam
grandes físicos da época: a teoria da luz. Segundo Einstein:

Até pouco tempo atrás, acreditava-se que com a teoria ondulatória da luz,
na sua forma eletromagnética, tivéssemos adquirido um conhecimento
definitivo sobre a natureza da radiação. No entanto, sabemos já, desde uns
25 anos atrás, que essa teoria não permite explicitar as propriedades
térmicas e energéticas da radiação, embora descreva com precisão as
propriedades geométricas da luz. Uma nova concepção teórica, a teoria do
quantum luminoso, semelhante à teoria da emissão de Newton, surgiu ao
lado da teoria ondulatória da luz e adquiriu uma posição firme na ciência
pelo seu poder explicativo. Não se conseguiu, até hoje, uma síntese lógica
da teoria dos quanta e da teoria ondulatória, apesar de todos os esforços
feitos pelos físicos. É, por essa razão, muito discutida a questão da
realidade dos quanta de luz (1995, pp. 61-64).

Físicos famosos, como Niels Bohr e Hendrik Kramers, resistiam fortemente à ideia
do caráter corpuscular da luz defendida por Einstein. Em 1924, um trabalho de John Clark
Slater, defendia a ideia de um “campo de radiação virtual” emitida por osciladores virtuais.

54
Segundo Moreira:

Bohr e Kramers viram nisso a possibilidade de usar o campo para induzir


uma probabilidade de transição e não para guiar os quanta corpusculares.
Os três escreveram então um trabalho no qual dispensavam o conceito de
quantum de luz. (...) Eles abandonaram qualquer tentativa de uma conexão
causal entre transições em átomos distantes e a aplicação dos princípios de
conservação da energia e do momento, que passavam a ter apenas um
significado estatístico (2005, pp. 147-148).

Com isso, surge a teoria BKS (iniciais dos nomes de seus autores) em total
contradição aos trabalhos científicos desenvolvidos por Albert Einstein, como, por
exemplo, o artigo de 1905 sobre o quantum e o efeito fotoelétrico. Ele reagiu com enorme
oposição à teoria BKS e, em um jornal alemão e em uma conferência no Brasil, disse
esperar com grande interesse o resultado de pesquisas experimentais de Hans Geiger e
Walther Bothe no Instituto Físico-Técnico de Berlim.
Arthur Holly Compton, em 1923, já havia realizado experiências com raios-X.
Segundo seu estudo, o comprimento de onda dos raios-X aumentava quando eram
espalhados por elétrons – e na explicação proposta por ele (um fóton se chocaria
individualmente com um elétron livre e as leis de conservação se verificariam) uma
evidência definitiva sobre a realidade dos fótons. Segundo Moreira:

A possibilidade de construir um aparato experimental para testar as


previsões da teoria BKS foi explorada, em junho de 1924, pelos físicos (...)
Walther Bothe e Hans Geiger. A teoria BKS, se aplicada ao experimento de
Compton, levaria à conclusão de que o espalhamento dos raios-X, que leva
a uma variação no comprimento de onda, não estaria necessariamente
correlacionado com o recuo de um elétron individual. Bothe e Geiger
utilizaram em seu aparato um detector de coincidência com dois contadores
de ponta: um para a detecção dos raios-X (fótons) espalhados e outro para
registrar os elétrons de recuo (2005, p. 148-149).

Nessa expectativa e indefinição, Albert Einstein embarca para a América do Sul. É


forçoso concluir que sua preocupação na conferência da Academia Brasileira de Ciências
estava direcionada aos acontecimentos científicos na Europa. Em trechos do seu discurso,
Einstein explica a situação das pesquisas sobre a luz e a teoria BKS:

55
Para que se possa compreender o efeito Compton pela teoria de Bohr,
Cramers e Slater, é necessário conceber a difusão da radiação como um
processo contínuo em que tomam parte todos os átomos da substância que
difunde aquela radiação, enquanto a emissão dos elétrons tem apenas o
caráter de acontecimentos isolados que obedecem a leis estatísticas. Pela
teoria dos quanta de luz, também a difusão da luz possui o caráter de
acontecimentos isolados, devendo sempre existir, em uma determinada
direção, um elétron emitido toda vez que é produzido um efeito secundário
pela radiação que incide sobre a matéria (2005, p. 151).

Após as explanações na Academia Brasileira de Ciências, Albert Einstein retorna


para a Europa no dia 12 de maio e assim satisfez alguns propósitos da comunidade
científica do Brasil, como auxiliar na difusão da ciência pura, chamar a atenção da
sociedade brasileira e, principalmente, despertar os governantes para o investimento em
ciência e tecnologia no país.
Quanto às pesquisas referentes à natureza da luz, Einstein obteve boas notícias ao
desembarcar na Europa. Os experimentos de Bothe e Geiger foram favoráveis às suas ideias
do caráter corpuscular da luz. Como diz Moreira:

Os resultados definitivos (...) saíram publicados em 12 de junho de 1925.


No experimento, observou-se que aproximadamente um em cada 11 quanta
de luz coincidia com um elétron de recuo. Isso mostrou que as chances de
essas coincidências serem acidentais eram muito pequenas, contrariando a
previsão de coincidências meramente ao acaso da teoria BKS. Os autores
chegaram à conclusão de que os resultados de seu experimento eram
incompatíveis com a interpretação de Bohr, Kramers e Slater para o efeito
Compton e que “o conceito de quanta de luz possuía mais realidade do que
essa teoria supunha” (2005, p. 153).

As discussões sobre a natureza da luz e a dualidade ondulatória e corpuscular que


foram objetos de intensas discussões entre Einstein e Bohr prenunciaram um dos maiores
conflitos entre os cientistas da época e que faz perder o sono dos físicos até hoje. Estamos
falando da mecânica quântica e teorias subjacentes.

5.2. Einstein e a mecânica quântica


Como vimos acima, Max Planck e Albert Einstein postularam a ideia do quantum

56
como explicação para os fenômenos atomísticos da radiação. Da teoria que dela surgiu,
nasce a mecânica quântica, sendo que vários físicos se dedicaram exclusivamente para a
explicação dos fenômenos microscópicos e a natureza mais íntima da matéria. Seus
principais autores são: o inglês Paul Dirac, o austríaco Erwin Schrödinger, o francês Louis
de Broglie e o alemão Werner Heisenberg. Esse último, autor do famoso princípio da
incerteza. Segundo Oliveira:

Um dos conceitos introduzidos pela Mecânica Quântica que teve um


impacto profundo na nossa compreensão da natureza foi o Princípio da
Incerteza proposto por Heisenberg em 1927. Esse princípio introduziu a
ideia que é impossível conhecer com certeza absoluta de maneira
simultânea a posição e a quantidade de movimento de uma partícula. Da
mesma forma, ele limita também a nossa percepção em relação ao tempo e
a energia de uma partícula. Essa limitação não é tecnológica, mas sim uma
imposição da natureza e faz parte do âmago da Mecânica Quântica. 27

O advento da mecânica quântica fez com que diversas premissas pregadas pela
física clássica fossem alteradas. Alguns conceitos básicos como espaço, tempo e velocidade
foram novamente revistos. Segundo Davidovich:

Na teoria clássica, o estado de uma partícula é definido pela posição e pelo


momentum da mesma. Conhecidas essas duas quantidades em um dado
instante, e as forças que agem sobre a partícula, é possível prever o valor da
posição e do momentum da partícula em qualquer instante futuro. Na teoria
quântica, a posição e o momentum não podem ser conhecidos com precisão
arbitrária no mesmo instante. O estado quântico é definido por uma função
matemática, a função de onda, que permite determinar as probabilidades de
obter valores da posição e do momentum, ou de qualquer outra grandeza
física, quando se realizam medidas sobre a partícula. Conhecida a função de
onda em determinado instante, a equação de onda permite determiná-la em
qualquer instante posterior. (2005, pp. 90-91)

Capra também versa sobre a incerteza de encontrar a posição fixa da partícula e


reforça o caráter probabilístico da mecânica quântica através de “quantidades matemáticas
abstratas”:

No nível subatômico, não se pode dizer que a matéria exista com certeza

27
OLIVEIRA, A. A incerteza faz parte da vida. Aol – Educação. 27 de nov. 2005.

57
em lugares definidos; diz-se, antes, que ela apresenta “tendências a existir”,
e que os eventos atômicos não ocorrem com certeza em instantes definidos
e numa direção definida, mas, sim, que apresentam “tendências a ocorrer”.
No formalismo da teoria quântica, essas tendências são expressas como
probabilidades, e são associadas a quantidades matemáticas que tomam a
forma de ondas. Essa é a razão pela qual as partículas podem ser ao mesmo
tempo ondas. Elas não são ondas tridimensionais “reais”, como as ondas
sonoras ou as ondas na água. São, em vez disso, “ondas de probabilidade”,
quantidades matemáticas abstratas, com todas as propriedades
características de ondas, que são relacionadas às probabilidades de se
encontrar as partículas em determinados pontos do espaço e em
determinados instantes. Todas as leis da física atômica são expressas em
termos dessas probabilidades. Jamais podemos prever um fato atômico com
certeza; podemos unicamente supor quão provável é a sua ocorrência
(1983, p. 58).

Outra característica da mecânica quântica é não-separabilidade dos sistemas. Sendo


com que duas partículas interagem à distância, com suas respectivas partículas de interação,
podem-se definir os parâmetros físicos de um sistema medindo o outro, e vice-versa. É
como se fosse uma complexa teia interligada.
Albert Einstein via o surgimento de tais teorias com muita desconfiança e acabou se
tornando um dos críticos mais vorazes da mecânica quântica. Ele buscava a realidade e a
objetividade na física e deixou isso bem claro em inúmeros artigos e livros de sua autoria.
Ele detestava o caráter probabilístico e afirmava que o conceito da não-separabilidade
entrava em contradição com alguns conceitos básicos da física. Segundo Einstein:

A física é uma tentativa de compreensão conceptual da realidade,


considerada como algo independente da observação. Nesse sentido, falamos
de “realidade física”. Na física anterior à teoria dos quanta, não havia
dúvida quanto ao modo de compreender esse conceito. Na teoria de Newton
a realidade era determinada por um ponto material no espaço e no tempo;
na teoria de Maxwell, pelo campo no espaço e no tempo. Na teoria
mecânica dos quanta a situação é menos clara. A pergunta: a função Ψ da
teoria dos quanta representa um fato real no mesmo sentido que um sistema
material de pontos ou um campo eletromagnético? – hesitamos em
responder com um simples “sim” ou “não”. Por quê? O que a função Ψ
(num tempo definido) formula é o seguinte: qual a probabilidade de
encontrar uma quantidade física q em um dado intervalo definido, se o
tempo usado para medi-lo t? (...) Não há resposta definitiva a essa questão
na estrutura da teoria (existente), uma vez que a medição é um processo que
implica um distúrbio finito do sistema, vinda do exterior; seria portanto

58
concebível que o sistema obtivesse um valor numérico definido para q,
valor numérico medido apenas através da sua própria medição (1982, p.
78).

Albert Einstein acreditava que a teoria quântica era apenas provisória e que logo a física
iria chegar a um ponto mais real do fenômeno dos quanta. “Reconheço que esta interpretação
me parece provisória. Porque creio ainda na possibilidade de um modelo da realidade, quer
dizer, de uma teoria que represente as coisas mesmas, e não apenas a probabilidade de sua
existência” (1981, p. 153).

Estou intimamente persuadido de que os físicos não se contentarão por


muito tempo com semelhante descrição insuficiente da realidade, mesmo
que se chegasse a formular de modo logicamente aceitável sua teoria, de
acordo com o postulado da relatividade geral. (idem, p. 197)

Apesar disso, Einstein reconhece que, no momento, é a melhor teoria para explicar
os fenômenos subatômicos, mas deixa bem clara sua posição contrária aos postulados da
mecânica quântica. Segundo ele próprio:

O caráter estatístico dessa teoria origina-se necessariamente da insuficiência


da descrição dos sistemas na mecânica dos quanta, e não haveria motivo
algum para pressupor que, no futuro, a física viesse a ter como fundamento
básico a estatística. Em minha opinião, a teoria contemporânea dos quanta
representa a melhor formulação do relacionamento, dados certos conceitos
básicos fixos provindos quase todos da mecânica clássica. Entretanto,
acredito que essa teoria não oferece um ponto de partida apropriado para o
desenvolvimento futuro (1982, p. 82).

Em uma de suas cartas, Einstein escreve: “Parece difícil dar uma espiada nas cartas
de Deus. Mas que ele jogue dados e use métodos ‘telepáticos’ (como a atual teoria dos
quanta exige dele) é algo em que não posso acreditar por um momento sequer” (1979, p.
55).
Muitos autores utilizam essa frase para exprimir a insatisfação de Einstein com o
caráter probabilístico da teoria quântica, mas o que ele mais criticava era a questão da não-
separabilidade das partículas subatômicas. De acordo com Stachel:

Algumas pessoas acham que a probabilidade era o principal ponto de

59
discussão. Costumava-se citar a famosa frase de Einstein: “Deus não joga
dados”. No entanto, esse caráter probabilístico não era a questão mais
importante para Einstein, mas sim a chamada não-separabilidade. O artigo
Einstein-Podolsky-Rosen baseia-se na proposta de que a mecânica quântica
não pode ser uma teoria completa, porque ela propõe que dois sistemas,
uma vez que tenham interagido, não podem ser separados. Mesmo que
estivessem a milhares de quilômetros de distância, uma medida efetuada
sobre um desses sistemas irá alterar o estado do outro. (Einstein
denominava esse fenômeno “fantasmagórica ação à distância”). Para que
isso aconteça, a transmissão de informações teria que ser praticamente
instantânea, ou seja, mais rápida que a luz. Era essa característica da teoria
quântica que desagradava a Einstein 28 (2005, p. 9).

Em artigo publicado em 1935, Einstein, juntamente com Boris Podolsky e Nathan


Rosen, expõe as contradições da teoria quântica. Surge o conceito de “elemento de
realidade física” que está sutilmente contida na teoria quântica, sendo contra ao princípio da
incerteza, e se contrapondo às suas bases teóricas. Segundo Davidovich:

Supõe-se então que a partícula 1 é observada muito depois das duas partículas
terem interagido, quando estão muito distantes uma da outra. Como q é bem
definido, se medirmos a posição da partícula 1 poderemos saber a posição da
partícula 2, sem interagir diretamente com esta partícula. Portanto, de acordo com
os autores, q2 é um elemento de realidade. Por outro lado, poderíamos também
medir o momentum da partícula 1, e assim determinar o momentum da partícula 2
sem interagir com ela. Segue assim que p2 é também um elemento de realidade.
Mas a mecânica quântica afirma que q2 e p2 não podem ser simultaneamente
elementos de realidade, pois não podem ser bem determinados ao mesmo tempo.
Portanto, segundo os autores, a mecânica quântica seria uma teoria incompleta
(2005, p. 93).

Depois da divulgação do “paradoxo EPR” (iniciais dos seus autores) houve


manifestações de grande parte dos físicos defensores da nova teoria quântica, dentre eles
Niels Bohr e Erwin Schrödinger que em sua resposta diz uma frase interessante: “A melhor
informação possível do todo não inclui a melhor informação possível sobre suas partes – e
isso é que vem constantemente nos assombrar”. Schrödinger propõe ainda um experimento
mental para mostrar um aparente paradoxo que resulta das leis da física quântica. A
proposta, conhecida como “gato de Schrödinger”, ganhou fama nas décadas seguintes e
ainda hoje é um bom exemplo da relação extremamente sutil entre os mundos microscópico
28
STACHEL, J. As visões de Einstein. Revista Ciência Hoje, v. 36, n. 214, 2005.

60
e macroscópico (DAVIDOVICH, 2005, p. 94). Experiências realizadas posteriormente
refutaram os postulados do paradoxo EPR. John Stachel conta que os “experimentos têm
comprovado a não-separabilidade” (idem).
Paty toca em outro ponto que Einstein não acreditava na mecânica quântica: o seu
fraco poder heurístico e coloca algumas aspirações do famoso físico:

Os fenômenos quânticos, no estado atual das coisas, sinalizavam para uma


abordagem diferente daquela proposta em termos de campo definido sobre
o continuum espaço-temporal, e as considerações de Einstein sobre a
mecânica quântica limitavam-se à especificidade desta última. Um dia seria
preciso harmonizar numa unidade maior a teoria da matéria elementar e a
teoria da gravitação: para além de suas críticas imediatas, era com um
programa desse tipo que Einstein sonhava constantemente. Para tanto, ele
não impunha à mecânica quântica as exigências que formulava para a teoria
de campo; ele se perguntava apenas se a mecânica quântica podia servir de
base para ir mais longe, se ela estava “completa”, em sentido fraco (...),
para servir de base à construção de uma teoria “completa”, em sentido
forte: uma teoria completa da relatividade geral seria uma teoria do campo e
de sua fonte, sem parâmetro arbitrário (2005, p. 50).

A partir desse ponto, Albert Einstein passou grande parte da sua vida buscando
unificar as teorias da física. Ele concentrou seus esforços para as explicações envolvendo a
gravitação, considerada por ele a chave do processo de unificação.

Mas o ponto central é, para mim, a questão: o que pode ser feito, com
alguma esperança de sucesso, tendo em vista a situação atual da teoria
física? Minhas esperanças estão nas experiências com a teoria da
gravitação. Para mim, essas equações têm maiores probabilidades de nos
fornecer informação precisa do que quaisquer outras equações da física
(1982, p. 83).

No período em que esteve nos Estados Unidos, fugindo da ameaça nazista na


Europa, Einstein tentou obter uma teoria de campo unificado para a física, sem sucesso. Em
1951 – quatro antes de sua morte – em carta para seu amigo Michele Besso, ele diz: “Os 50
anos de meditação consciente não me levaram mais próximo da resposta à questão: o que
são os quanta de luz?” (MOREIRA, 2005, p. 153). Em outra carta, para diz: “Quanto mais se
persegue os quanta, melhor eles se escondem” (1979, p. 55). Já essa carta, de 1937,

61
exprime a sensação de busca sem fim de Einstein:

Depois de falar sobre outros assuntos, ele terminava mencionando as


atividades de pesquisa que estava desenvolvendo no momento e que se
relacionavam com sua longa busca de uma teoria de campo unificado que
ligasse a gravitação e o eletromagnetismo. “Eu ainda luto como os mesmos
problemas de há dez anos. Tive sucesso em coisas pequenas, mas o
verdadeiro objetivo continua inatingível, embora às vezes pareça
palpavelmente próximo. É duro e ao mesmo tempo gratificante: duro,
porque o objetivo está além das minhas forças, mas gratificante porque nos
torna imunes às distrações da vida diária” (1979, p. 65).

A busca de uma teoria que unifique e convirja os dois alicerces da física


contemporânea, a teoria da relatividade geral e a mecânica quântica está sendo, até
hoje, um dos grandes desafios da ciência. A revista Science, na edição de
comemoração do seu 125° aniversário, publicou as 125 questões que poderão ser
respondidas no século XXI. Umas das perguntas que continuam sem resposta, e que se
encontra em maior destaque na revista, se trata justamente de quando será o dia em
que unificaremos a mecânica quântica e a relatividade num todo racional. 29 Alguns
defendem que a teoria da relatividade geral precisa ser alterada para se adequar à
mecânica quântica, outros defendem que as teorias quânticas é que precisam ser
mudadas, mas somente uma coisa é certa: essa discussão gera enormes debates em
várias universidades e centros de pesquisa do mundo, como o debate entre Stephen
Hawking, defensor das teorias quânticas, e Roger Penrose, favorável a teoria da
relatividade geral, acontecido em 1994 na Universidade de Cambridge e registrado no
livro A natureza do espaço e do tempo (HAWKING e PENROSE, 1997).
Quando a ciência chegará a desenvolver uma “teoria quântica dos campos” ou uma
“gravitação quântica”? Só o tempo irá dizer…

6. Algumas aplicações da obra científica de Einstein


Antes de contarmos o desenvolvimento de algumas tecnologias que diretamente ou

29
NOGUEIRA, S. ‘Science’ lista questões da ciência do século 21. Folha de São Paulo. Folha Ciência, 1º de
julho de 2005.

62
indiretamente são legados de Albert Einstein, é necessário deixar bem claro que o físico
alemão era um teórico por essência. Ele não estava nem um pouco interessado se de suas
teorias surgissem equipamentos ou artefatos para uso tecnológico. Aliás, algumas de suas
teorias são difíceis até de se comprovar pela via experimental, exigindo situações
completamente fora do alcance humano.30 Albert Einstein era a síntese do que podemos
chamar de “cientista puro”, que tem a priori o objetivo de descobrir conhecimentos que
explicassem as leis que regem o universo e não a ciência desenvolvida para fins políticos,
militares ou industriais.
Para fins de estudo, vamos escolher quatro possíveis aplicações das teorias de
Einstein: o nascimento da cosmologia, o cálculo estatístico fruto de sua tese de doutorado e
o movimento browniano, o desenvolvimento do laser e a enorme polêmica da fabricação da
bomba atômica.

6.1. Einstein e a cosmologia


Após o desenvolvimento e comprovação da teoria da relatividade geral, Albert
Einstein permitiu a evolução de uma ciência que vinha caminhando com passos lentos: a
cosmologia. Essa ciência estuda as origens, história, composição e a compreensão de todo o
Universo. Também traz consigo uma característica enigmática muito forte, já que, a todo
instante, observações astronômicas e os avanços tecnológicos reforçam ou refutam teorias.
Todavia, na época de Einstein, as tecnologias observacionais eram extremamente
incipientes (se comparado aos dias atuais) e não se sabia da existência de galáxias. Eles
imaginavam que todas as estrelas vistas no céu pertenciam ao mesmo grupo de objetos
fazendo parte do Universo. Mesmo assim, Albert Einstein foi o pai da cosmologia moderna
ao desenvolver a teoria da relatividade geral e, logo após, postulou os primeiros modelos
cosmológicos. Segundo Waga:

A cosmologia moderna iniciou-se com Einstein, em 1917, pouco tempo

30
A teoria da relatividade restrita necessita da observação de objetos se movendo perto da velocidade da luz
(300 mil km/s) e a teoria da relatividade geral precisa de campos gravitacionais intensos, como buracos
negros, estrelas de nêutrons ou supernovas para suas comprovações empíricas.

63
após ele haver publicado seu trabalho sobre a teoria do campo
gravitacional, a relatividade geral. O primeiro modelo cosmológico
relativista proposto por ele, além de espacialmente homogêneo, isotrópico e
finito (com curvatura espacial constante e positiva), possui a propriedade de
ser estático (2005, p. 158).

A partir da relatividade geral, inúmeros cientistas do mundo começaram a investigar


os fenômenos cosmológicos. Com o surgimento do “modelo cosmológico padrão” é
ressaltado o enorme caráter heurístico da generalização da teoria da relatividade de
Einstein. O conhecido Big Bang parte desse modelo. Como diz Rosenfeld: “A teoria da
relatividade geral, suplementada pela teoria da física das partículas elementares, fornece um
modelo para a evolução do Universo, o chamado Modelo Cosmológico Padrão, nome mais
pomposo para o Big Bang” (2005, p. 34).
Albert Einstein postula que o Universo é estático e, considerando que a premissa
básica da gravitação é a atração da matéria, precisaria de alguma força contrária para poder
sustentar o Universo. Surge, então, o termo ou constante cosmológica. Segundo Carneiro:
“Para obter uma solução estática, Einstein foi obrigado a adicionar às equações originais da
relatividade geral um novo termo, por ele denominado termo cosmológico” (2005, p. 107).
Para Waga, “sendo a gravitação atrativa, para obter um universo estático, Einstein
modificou as suas equações originais do campo gravitacional introduzindo um termo
repulsivo, a chamada constante cosmológica” (2005, p. 158).
O que Albert Einstein não contava era que dados experimentais colocariam a ideia
de que o Universo é estático em xeque. No mesmo ano, 1917, o astrônomo holandês
Willem de Sitter, com base em dados espectrais que mostraram o desvio para o vermelho
das galáxias e, levando-se em consideração o efeito Doppler31, previu que o Universo se
expandia. Mas sua explicação para o fenômeno desconsiderava essa premissa. Como conta
Waga:

A velocidade de afastamento de objetos (e o consequente desvio espectral


para o vermelho) em um universo de Sitter, (...) era por ele considerada um
31
Modificação no comprimento de onda e frequência, quando uma fonte emissora de luz se movimenta em
relação ao observador. Quando a fonte se afasta do observador, o comprimento de onda aumenta e a
frequência diminui. Quando a fonte se aproxima do observador, nota-se o inverso.

64
efeito espúrio, consequência do sistema de coordenadas usadas e não
decorrente da expansão do espaço (ibidem).

Alguns autores como o russo Aleksandr Aleksandrovich Friedmann e o padre e


astrofísico belga Georges Édouard Lemaître expuseram teorias afirmando que o Universo
estava se expandindo, até que, em 1929, o astrônomo americano Edwin Hubble, através de
minuciosos cálculos matemáticos de distâncias e velocidades das galáxias, postula que o
universo está em expansão e não é estático como previam os primeiros modelos
cosmológicos propostos por Albert Einstein. Segundo Rosenfeld:

Por muito tempo, pensou-se que, descontado o movimento aparente das


estrelas devido à órbita da Terra ao redor do Sol, o universo seria estático,
imutável. Mesmo Einstein acreditava nisso, pois não havia evidências
experimentais do contrário. Porém, em 1929, o astrônomo norte-americano
Edwin Hubble (1889-1953) observou que as galáxias estão se afastando de
nós, ou seja, que o universo está em expansão (2005, p. 33).

O afastamento das galáxias é comprovado ao analisar a espectroscopia dos mesmos.


O desvio para o vermelho prova que as galáxias estão se afastando e conclui-se que o
Universo está em expansão. Segundo Gregorio-Hetem e Jatenco Pereira:

No caso de objetos em afastamento, observa-se λ > λ 0 (portanto ν < ν0)


32
dizemos que ocorreu um desvio para o vermelho (redshift), cor que
corresponde às menores frequências na região do visível no espectro
eletromagnético, relacionado ao afastamento do objeto. 33

A interpretação dos resultados de Hubble de que o universo está em expansão foi


prontamente aceita pela maioria dos cientistas (WAGA, 2005, p. 161).
Com tantos fatos surgindo nos estudos cosmológicos, Albert Einstein propõe o
abandono definitivo da constante cosmológica. Aliás, segundo Carneiro: “Einstein nunca
escreveu, (...) a frase famosa de que foi o maior erro da vida dele. Recebemos essa frase de
segunda mão, de alguém que disse que ouviu ele dizer isso. De qualquer forma, ele
escreveu, sim, que o termo cosmológico devia ser abandonado”.34
32
λ = comprimento de onda, ν = frequência.
33
GREGÓRIO-HETEM, J. e JATEMCO PEREIRA, V. Observatórios Virtuais – Fundamentos de
Astronomia. Disponível em <http://www.astro.iag.usp.br/~jane/aga215/>. Acesso em 16 de abr. 2019.
34
CARNEIRO, S. Ano Mundial da Física. [mensagem pessoal].

65
Por muito tempo, acreditou-se que a expansão do Universo seguia um curso
desacelerado, levando-se em consideração que a gravidade é atrativa. A gravidade
decorrente da matéria é atrativa e, portanto, ela desaceleraria a expansão. No entanto, como
já foi dito, na astronomia sempre aparecem novos dados que reforçam e refutam teorias.
Como já observamos:

Como na astronomia tudo nem sempre acontece como o planejado, o


Universo sempre apresenta novas características misteriosas que intrigam
os astrônomos e astrofísicos. Os conceitos são a todo tempo revistos, a
criação de novos postulados e princípios nem sempre seguem os
paradigmas da dialética ou da metodologia científica. A cada descoberta
surgem várias dúvidas, estabelecendo assim um ciclo de teses, antíteses e
sínteses que beira ao infinito35 (DIAS, 2005, p. 18).

Desse modo, observações e estudos recentes mostraram que a expansão do Universo


é acelerada, o que contraria os conceitos básicos de gravitação e traz de volta o termo
cosmológico de Einstein para as explicações envolvendo os modelos cosmológicos.
Segundo Rosenfeld:

Mas a Natureza tinha ainda uma outra surpresa guardada para os cientistas.
Graças a uma descoberta em 1998, considerada pela revista Science como
uma das mais importantes do século XX, sabemos hoje que cerca de 70%
do universo é composto de algo difuso, que não se concentra em galáxias e
que provoca a expansão acelerada do universo. (...) Podemos imaginar
então a presença de um meio extremamente tênue que permeia todo o
universo. Esse meio, porém, tem propriedades diferentes de um meio
material: apresenta uma pressão grande e negativa, o que causa um efeito
de anti-gravidade, resultando na expansão acelerada observada. A esse meio
foi dado o nome de energia escura. Esse meio poderia ser formado pela
chamada constante cosmológica, proposta por Einstein para explicar porque
o universo seria estático, que era o paradigma do início do século XX. Com
a descoberta da expansão do universo, Einstein reconheceu nessa constante
seu maior erro. Talvez Einstein estivesse certo, afinal (2005, p. 37).

Vale lembrar que a constante cosmológica de Albert Einstein foi introduzida no


intuito de explicar como o Universo se mantinha estático, sendo que pela natureza da
gravidade o correto seria os objetos se atraírem. O termo cosmológico foi postulado para

35
DIAS, R. A Gênesis Estelar. Revista Macrocosmo, n. 20, 2005.

66
ser uma força contrária à gravidade. Aproximadamente 80 anos depois, ao descobrir-se a
“energia escura” ou “quintessência36” como força que proporciona a repulsão cósmica – do
mesmo modo que a constante cosmológica – foi reestabelecido o termo de Einstein. Assim,
o seu maior erro acabou se tornando um grande acerto (mesmo que “no chute”).

6.2. Albert Einstein e as ciências estatísticas


A partir do desenvolvimento das explicações referentes ao movimento browniano,
Albert Einstein forneceu equações estatísticas para prever situações imprevisíveis e
indeterminadas, como a flutuação das bolsas de valores e outros fenômenos caóticos. Da
mesma maneira que a partícula de pólen se movimenta de maneira desordenada e
incessante quando mergulhada na água, as cotações em um pregão na bolsa de valores
também oscilam sem previsibilidade.
Um pouco depois de defender a tese, Langevin desenvolve equações estocásticas
que são utilizadas amplamente pelas ciências econômicas. Segundo Salinas:

Uma equação diferencial para o movimento browniano foi escrita por


Langevin em 1908, recuperando a relação de Einstein e fazendo contacto
com trabalhos paralelos de Smoluchowski. A moderna equação diferencial
estocástica associada à “dinâmica de Langevin” tem sido fartamente
utilizada a fim de introduzir um comportamento dinâmico no contexto de
sistemas estatísticos clássicos. Há um número crescente de aplicações
contemporâneas, em vários problemas em que as flutuações desempenham
papel relevante (2005, p. 26).

Dentre essas aplicações contemporâneas está o emprego dos cálculos estocásticos


para tentar prever o sobe e desce nas bolsas de valores. Mas é preciso ressaltar que tal
emprego da teoria sobre o movimento browniano talvez nem passasse pela cabeça de Albert
Einstein. Porém, ele gostaria de saber que seu trabalho rendeu frutos práticos em outras
áreas do conhecimento, como conta Pais:

... a tese, que trata de propriedades reológicas (volumétricas) de partículas


em suspensão, contém resultados com uma gama imensa de aplicações. São
relevantes para a indústria de construção (o movimento de partículas de
36
Não confundir com o conceito proposto por Aristóteles.

67
areia nas misturas de cimento), para a indústria leiteira (movimento de
micelas de caseína no leite de vaca) e para a ecologia (movimento de
partículas de aerossóis nas nuvens), para mencionar apenas alguns
exemplos dispersos. Einstein gostaria de ouvir isto, visto que lhe agradava
imensamente poder aplicar a física a situações práticas (1995, p. 102).

6.3. O advento do laser


Ao pesquisar a natureza e a constituição da luz, Albert Einstein acabou descobrindo
os pressupostos necessários para o desenvolvimento tecnológico do laser. Tudo começou
com o primeiro artigo dos Annus Mirabilis sobre as explicações envolvendo o fenômeno
fotoelétrico, no qual a luz interage com os elétrons na placa de metal. A comprovação do
caráter corpuscular da luz foi o começo das pesquisas com emissão estimulada de radiação,
que é um dos quesitos básicos para o advento do laser. Segundo Bagnato37:

Einstein investigou com muito cuidado a interação da luz com a matéria, e


descobriu as leis fundamentais da troca de energia-campo de radiação-
matéria. Estes estudos formariam as bases da moderna espectroscopia
atômica, tão amplamente utilizada nos laboratórios de pesquisa e mesmo
como técnicas analíticas industriais. As análises de Einstein da interação da
radiação com os átomos mostravam a ocorrência da chamada emissão
estimulada de radiação, fenômeno fundamental para o surgimento do laser,
aparelho que conquistou a humanidade tanto nos aspectos científicos
quanto tecnológicos.

Bagnato diz ainda que “Albert Einstein elaborou a teoria que mostra a ocorrência de
emissão estimulada de átomos excitados. Este é o fato mais importante para poder
viabilizar a construção de um laser”.38
Einstein não terminou sua investigação sobre a luz em 1905. Já em 1916 e 1917 ele
publicou artigos que tratam dos processos de emissão e absorção de radiação e que
introduzem dois tipos de emissão, espontânea e induzida. Segundo Davidovich:

A emissão espontânea ocorre quando um átomo ou molécula encontra-se


em um estado excitado e emite radiação, na ausência de qualquer campo
eletromagnético. Na emissão induzida, a radiação presente estimula o
átomo ou molécula excitada a emitir (2005, p. 86).
37
BAGNATO, V. Física atômica: perspectivas dentro do Ano Internacional da Física. Revista Comciência.
Disponível em: <www.comciencia.br>. Acesso em: 27 de nov. 2005.
38
BAGNATO, V. Monografia - Ano Mundial da Física. [Mensagem pessoal].

68
O processo de emissão induzida segue algumas regras, como diz Davidovich:

“Se um pacote de radiação faz com que uma molécula emita ou absorva
uma quantidade de energia hν, então um momento hν/c é transferido para a
molécula, dirigido ao longo do pacote no caso de absorção e na direção
oposta, no caso de emissão”. Einstein associa pois, pela primeira vez, um
momentum ao fóton! Muitos anos depois, o conceito de emissão induzida
teria aplicações importantíssimas no maser (1956) e no laser (1960) (2005,
pp. 86-87).

Kleppner comenta que do artigo de 1917 pode-se extrair várias pedras preciosas da
ciência. Uma delas é a demonstração que o fóton possui todas as propriedades de uma
excitação fundamental.

Outra pedra preciosa é o conceito de emissão estimulada. Reivindicar que


Einstein quase inventou o laser é um exagero, mas o mecanismo em que se
baseia o laser, a radiação estimulada da radiação, foi uma criação de sua
teoria da radiação (2005, p. 90).

Aqui é preciso novamente ressaltar que Albert Einstein talvez nem sonhasse que
esse conhecimento pudesse ser utilizado em larga escala em vários campos da ciência. O
laser é muito empregado na indústria, na engenharia e na medicina.

6.4. Albert Einstein e a bomba atômica


A relação de Einstein com o avanço das armas nucleares é um dos assuntos mais
polêmicos e controversos do planeta. O senso comum costuma atribuir a paternidade da
bomba atômica para Albert Einstein levando-se em consideração a relação entre massa e
energia que o físico alemão teorizou. Mais além, costuma-se utilizar a célebre equação
E=mc2 como a receita para fazer uma bomba nuclear.
Uma pequena quantidade de massa pode se transformar em uma enorme quantidade
de energia, isso está correto. Mas daí atribuir a Einstein a autoria pela fabricação da bomba
vai um longo caminho. O desenvolvimento da tecnologia de fissão nuclear criada no final
dos anos 30 foi certamente o maior responsável pelo nascimento das armas nucleares.
Segundo informações divulgadas no site do Observatório Nacional:

69
Em dezembro de 1938, os físicos alemães Otto Hahn e Fritz Strassman
tentaram criar em laboratório os chamados elementos transurânicos,
bombardeando urânio com nêutrons. Surpreendentemente, ao invés de
obterem os elementos pesados que eles esperavam, surgiram vários
produtos que eles não foram capazes de identificar imediatamente. Após
várias análises Hahn e Strassman concluíram que um dos produtos era o
elemento químico Barium 141. Por ser um resultado muito estranho e
totalmente não esperado, os cientistas relutaram até mesmo em publicá-lo,
só o fazendo em 1939. No entanto, esses dados chamaram a atenção da
física austríaca Lise Meitner, que já havia trabalhado com Hahn em
experiências de física nuclear.

Concomitante ao nascimento da tecnologia de fissão nuclear, o contexto geopolítico


estava muito tenso. Adolf Hitler e o nazismo já dominavam a Alemanha e começavam a
caçada aos judeus. Um dos termos do Tratado de Versalhes, que imprimia condições
humilhantes à Alemanha após a Primeira Guerra Mundial, foi quebrado quando Hitler
invadiu a Áustria. Isso fez com que Lise Meitner, que era judia, fosse morar na Suécia junto
com seu sobrinho Otto Frisch que também era físico nuclear, onde continuaram suas
experiências com o bombardeamento de nêutrons sobre núcleos pesados. Segundo
informações divulgadas no site do Observatório Nacional:

Meitner foi a primeira cientista a perceber o verdadeiro significado dos


resultados de Hahn e Strassman. Ela notou que o bário e os outros
elementos mais leves que resultavam desses processos de bombardeamento
de nêutrons eram devidos à fissão do átomo de urânio 235. Frisch e Meitner
prosseguiram essas experiências e mostraram que a fissão do urânio 235
liberava uma enorme quantidade de energia. Além disso, eles notaram que
este processo de fissão liberava pelo menos dois novos nêutrons para cada
nêutron que era absorvido na interação. Isto os levou a concluir que era
possível criar uma reação em cadeia com uma inacreditável liberação de
energia.

Dessa forma, a equação E=mc2 é comprovada pela via experimental. Entretanto,


vamos voltar um pouquinho na história e situar a posição de Albert Einstein, que era judeu,
no começo da década de 30 e no momento da chegada dos nazistas ao poder. Em 1932,
Einstein aceita um cargo no Instituto de Estudos Avançados, em Princeton, nos Estados
Unidos. Antes de retornar para a Europa em março, Adolf Hitler chega ao poder. Segundo

70
Vieira:

(Einstein) Renuncia à sua filiação à Academia Prussiana de Ciências, bem


como a filiação à Academia de Ciências da Bavária. Sua nacionalidade
honorária alemã é retirada pelo novo governo e suas propriedades
confiscadas. Na volta dos Estados Unidos, no fim de março, segue
diretamente para Le-Coq-Sur, em Ostende, na costa belga, onde tem,
durante sua estada de meses, a segurança pessoal reforçada, pois os
governantes e amigos temiam por um atentado contra sua pessoa (2005, p.
179).

Em outubro de 1933, Albert Einstein e sua família se mudaram para Princeton, onde
permaneceu até sua morte.
Logo após o início da Segunda Guerra Mundial, alguns cientistas temiam que a
Alemanha nazista pudesse desenvolver artefatos nucleares. A maioria dos ingredientes para
a fabricação da bomba atômica eles possuíam, tais como fartas jazidas de urânio na
Tchecoslováquia, renomados físicos e um ditador insano como Adolf Hitler no comando.
Leo Szilard e Eugene Wigner da Universidade de Colúmbia também trabalhavam
com física nuclear e foram os primeiros a se preocupar com a ameaça nazista. Assim sendo,
procuraram Albert Einstein para ajudá-los a tomarem medidas preventivas junto aos
governantes americanos. Eles redigiram quatro cartas para serem enviadas ao presidente
americano Franklin Roosevelt expondo as pesquisas envolvendo o enriquecimento de
urânio, o processo de reação em cadeia causado pelo bombardeamento do núcleo de urânio,
o perigo dos nazistas desenvolverem a bomba e ressaltaram a importância dos Estados
Unidos adotarem contramedidas.
Após receber as cartas, o presidente Franklin Roosevelt liberou apenas 6 mil dólares
para as experiências de Szilard e criou o Briggs Committee, que pouco funcionava.
Somente no dia 6 de dezembro de 1941 é que os americanos criaram um projeto para a
energia nuclear em larga escala. Coincidentemente, um dia antes do ataque japonês em
Pearl Harbor e a entrada dos Estados Unidos na guerra. O projeto mais tarde seria
conhecido como Projeto Manhattan, sendo dirigido pelo físico Julius Robert Oppenheimer
e contando com um time de cientistas de altíssimo nível.

71
No dia 12 de abril de 1945, Franklin Roosevelt morre e Harry Truman assume. Em
meados de 1945, a bomba atômica é criada e alguns próprios cientistas do projeto como
Szilard se mostraram contrários à utilização das bombas para fins militares. A guerra na
Europa já havia acabado e não havia sido encontrado nenhum indício de que os alemães
estavam desenvolvendo armas nucleares. Porém, na Ásia a guerra continuava e
simultaneamente a bomba nuclear era testada no deserto do Novo México nos Estados
Unidos.
Nos dias 6 e 9 de agosto de 1945 são lançadas as duas bombas sobre Hiroshima e
Nagasaki.
Albert Einstein recebeu as notícias da utilização das bombas atômicas contra
populações civis com extremo transtorno e revolta. No dia 19 de agosto de 1946, o jornal
New York Times colocou em sua primeira página um pequeno artigo com o título “Einstein
deplora o uso da bomba atômica”. Em novembro de 1954, Einstein escreve com
lamentação: “Eu cometi um grande erro em minha vida... quando assinei a carta ao
presidente Roosevelt recomendando que bombas atômicas fossem feitas, mas havia alguma
justificativa – o perigo que os alemães as fizessem”.
Albert Einstein (apud PAIS, 1995) disse também que “se soubesse que os alemães
não seriam bem sucedidos na produção da bomba atômica, não teria levantado um dedo”
(1995, p. 539).
Com relação à política, Albert Einstein experimentou algumas mudanças de postura.
Segundo Freire:

Ele defendeu o pacifismo e o desarmamento das nações na década de 1920


mas, na década seguinte, defendeu que as nações democráticas precisavam
estar preparadas para enfrentar a ameaça nazista também no terreno militar,
e essa foi a razão da carta que escreveu em 1939 ao Presidente Roosevelt,
alertando para os riscos de que a Alemanha nazista chegasse primeiro à
construção da bomba atômica, e conclamando os Estados Unidos para se
antecipar nesse processo (2005, p. 112).

Albert Einstein era judeu e sentiu na pele todas as mazelas do antissemitismo


nazista. Ele pôde acompanhar de perto o início da militarização nazista, o desenrolar da

72
Primeira Guerra Mundial e a perseguição dos judeus pelo nazismo. Foi obrigado a fugir
para a Bélgica e depois se instalou permanentemente nos Estados Unidos. Ele tomou
conhecimento das pesquisas envolvendo a fissão nuclear e seu medonho emprego como
arma de destruição em massa. Ele, como cientista alemão, sabia da enorme tradição do país
em produzir talentos para a física e os estudos avançados que aconteciam em suas
universidades e academias de ciência. Como judeu, conheceu de perto a fúria do nazismo e
compreendia a noção exata do que Adolf Hitler era capaz de fazer para colocar seus planos
em prática. Albert Einstein tinha plena consciência que todo o futuro do planeta Terra
estava correndo sério risco se a Alemanha produzisse uma arma de destruição em massa.
Compreende-se, então, a natural atitude de Einstein pró-bomba atômica nessas condições.

7. Einstein e a filosofia
Não apenas contribuições para a física Einstein nos deixou. Com suas novas
concepções envolvendo o espaço e o tempo, bem como a matéria e a radiação, todo o
desenvolvimento filosófico sofreu alguma influência das ideias do físico alemão. Ao
romper com as bases da geometria euclidiana e com a física clássica de Newton, tão
enraizadas no subconsciente coletivo dos cientistas e filósofos, Einstein deu um passo rumo
ao desenvolvimento de novas maneiras de conceber o conhecimento e o pensamento
humano. Assim, conclui-se que Einstein, além de físico, foi também um filósofo. Segundo
Paty:

Einstein não era um filósofo convencional, isto é, o que escreve tratados,


mas em seu pensamento, expresso em artigos científicos, textos de alcance
geral ou cartas, nota-se que ele era muito bem informado sobre os grandes
debates filosóficos, antigos e contemporâneos, bem como sobre a história
da humanidade. Conhecia muito bem, por exemplo, os clássicos, como
Descartes, Spinoza, Kant (2000, p. 10). 39

Albert Einstein sempre buscava a realidade e a verdade em suas pesquisas, sendo


que o pensamento estritamente lógico era um empecilho para se atingir tal fim. Desde o
começo ele deixava clara essa tendência. Segundo Einstein:
39
PATY, M. O Século de Einstein. Entrevistador: C. Vieira. Revista Ciência Hoje, v. 28, n. 166, 2000.

73
... para atingir uma ciência que descreva a realidade, ainda faltava uma
segunda base fundamental que, até Kepler e Galileu, foi ignorada por todos
os filósofos. Porque o pensamento lógico, por si mesmo, não pode oferecer
nenhum conhecimento tirado do mundo da experiência. Ora, todo o
conhecimento da realidade vem da experiência e a ela se refere. Por esse
fato, conhecimentos, deduzidos por via puramente lógica, seriam diante da
realidade estritamente vazios. Um completo sistema de física teórica
comporta um conjunto de conceitos, de leis fundamentais aplicáveis a tais
conceitos, e de proposições lógicas normalmente daí reduzidas (1981, p.
147).

Em muitas de suas cartas, que foram sintetizadas na obra Einstein: o lado humano
(DUKAS e HOFFMAN, 1979), ele sempre enfatizava os objetivos e metas que trilhava durante
o desenvolvimento de suas teorias. A busca por entender a natureza sem se preocupar com
suas aplicações foi uma das principais marcas deixadas pelo físico alemão.

Meu trabalho científico é motivado por um desejo irresistível de


compreender os segredos da natureza e por nenhum outro sentimento. Meu
amor pela justiça e meu esforço para contribuir para a melhoria das
condições humanas são totalmente independentes de meus interesses
científicos (DUKAS e HOFFMAN, 1979, p. 19).

Para a criação de uma teoria, a mera coleção de fenômenos registrados


nunca é suficiente – deve sempre ser acrescentada alguma invenção livre da
mente humana que vá ao âmago da questão. E mais: o físico não se deve
contentar com as considerações puramente fenomenológicas pertinentes aos
fenômenos. Em vez disso, ele deve partir, decididamente, para o método
especulativo, que procura o padrão subjacente (idem, p. 28).

Einstein também deixou algumas considerações sobre o trabalho do físico teórico e


como ele deve se comportar com relação ao mundo.

Entre todas as imagens possíveis do mundo, que lugar conceder à do físico


teórico? Ela encerra as maiores exigências, pelo rigor e exatidão da
representação das relações, única a não ser autorizada pelo uso da
linguagem matemática. Mas em compensação, no plano concreto, o físico
deve se restringir, tanto mais quanto se contentar em representar os
fenômenos mais evidentes acessíveis à nossa experiência, porque todos os
fenômenos mais complexos não podem ser reconstituídos pelo espírito
humano com a precisão sutil e espírito de constância exigidos pelo físico
teórico. A extrema nitidez, a clareza e a certeza só se adquirem à custa de
imenso sacrifício: a perda de visão de conjunto (1981, p. 139).

74
De acordo com Einstein, “a construção do pensamento se processa, na maior parte
das vezes, sem o uso de signos e, além disso, em grande parte inconscientemente” (1982, p.
18). Albert Einstein acreditava com isso que a lógica e os estudos específicos dos
fenômenos ceifavam a essência do trabalho do físico. Este deveria ir mais além, penetrar a
fundo nos problemas e contradições da ciência. Poderíamos estender essa característica às
demais áreas da ciência como a biologia, a química, a medicina e, do mesmo modo, às
ciências sociais, às artes e à história. Indo mais além, por que não empregar tais conceitos à
prática do jornalismo?
Os princípios filosóficos de Einstein encontram-se dentro de sua obra científica de
maneira implícita e talvez nem fosse a pretensão dele se tornar um filósofo. Entretanto, ao
contextualizar seus trabalhos no âmbito dos movimentos culturais surgidos na primeira
metade do século XX, pode-se notar a influência que suas teorias exerceram no
modernismo e nos movimentos de vanguarda do século XX. Arthur Miller, em seu livro
Space, time, and the beauty that causes havoc40, traça paralelos entre as vidas do pintor
Pablo Picasso e do físico Albert Einstein, que tiveram ao mesmo tempo o seu ápice de
criatividade. Terão sido esses fatos frutos de mera coincidência?41

8. Considerações finais dos estudos da vida e obra científica de Einstein


Albert Einstein morreu no dia 18 de abril de 1955 no Hospital de Princeton, aos 77
anos. Uma semana antes de falecer, ele assinou o manifesto Russel-Einstein que alertava o
mundo para uma conflagração nuclear em níveis apocalípticos e propunha a busca de uma
solução pacífica para o impasse. Em 1954, a bomba H já estava sendo testada e o filósofo e
matemático Bertrand Russel buscou incessantemente reunir cientistas para o seu manifesto.
A participação de Albert Einstein foi fundamental para o sucesso do movimento e, logo
após a divulgação do documento, foi criado o Movimento Pugwash que se dedicou à paz

40
Lançado em 2001 pela editora norte-americana Perseus Books e indicado ao Pulitzer Prize. Sem tradução
para o português.
41
Cf. em ALMEIDA, C. Einstein e Picasso, dois gênios que tiveram seus períodos mais férteis de
criatividade na mesma época. Será coincidência? Jornal da Ciência. Disponível em:
<www.jornaldaciencia.org.br>. Acesso em: 27 de nov. 2005.

75
mundial.
A história de Albert Einstein, bem como as teorias que ele produziu, parece mostrar
alguns fatos que o distingue completamente das pessoas comuns. Einstein foi e continua
sendo até hoje uma lenda mundial. Sua busca por tentar compreender os mistérios da
natureza, a procura pela verdade científica e, principalmente, as comprovações empíricas da
teoria da relatividade geral, fizeram dele mais que um cientista. Ele acabou se
transformando em um mito. A revista Time elegeu recentemente Albert Einstein como um
tipo de personalidade síntese do século XX. Paty42 e Stachel43 definem bem essa conclusão:

Einstein tem um perfil intelectual e humano muito especial. Em outra


época, chego a pensar, ele poderia ter sido uma espécie de pensador que
seria referência para muitos, como foram, por exemplo, Cristo e Buda. De
certo modo, tinha as peculiaridades encontradas nos místicos. Era um
pensador profundo, solitário, mas cujas ideias tinham um apelo para um
grande número de pessoas - ele, por vezes, relacionou suas preocupações
com uma ‘religiosidade’ que denominou ‘cósmica’. Nesse sentido, ele está
muito próximo de uma espécie de profeta, um profeta da racionalidade, pois
certos componentes de sua personalidade, bem como o alcance de sua obra
e seu pensamento, nos levam a aproximá-lo de filósofos muito profundos,
como Spinoza, por exemplo, que trabalhava e pensava sozinho, mas que
iluminava muitas pessoas à sua volta e que continuaria iluminando outras
no futuro (2000, p. 12).

A própria imagem de Einstein atraía a atenção do público, pois ele se


parecia mais com um músico itinerante do que com um pesquisador. Além
disso, o público está interessado nas ideias e nos problemas relacionados ao
espaço, ao tempo e à natureza do universo. De alguma maneira, Einstein
também passava a ideia de ser um mago, uma figura mágica que foi
chamada ‘criador de universos’. (...) Certamente, há algo de inexplicável na
fascinação que ele exerce hoje, depois de tantos anos. Esse tipo de
questionamento pode ser feito também sobre Buda, Jesus ou qualquer outra
pessoa que se tornou lendária. Como separar o homem do mito? No caso de
Einstein, pode-se ver a lenda crescendo com o tempo (2005, p. 9).

Explica-se, dessa forma, a escolha das sociedades de física mundiais em celebrar o


Ano Mundial da Física, exatamente um século após os cinco artigos de Albert Einstein de
1905.
42
PATY, M. O Século de Einstein. Entrevistador: C. Vieira. Revista Ciência Hoje, v. 28, n. 166, 2000.
43
STACHEL, J. As visões de Einstein. Entrevistadores: C. Vieira e F. Furtado. Revista Ciência Hoje, v. 36, n.
214, 2005.

76
Capítulo III – Jornalismo científico e o ensino de ciências
1. O jornalismo e a educação como manifestações culturais
Como já foi mencionado anteriormente, os objetivos do “Ano Mundial da Física”
englobam vários princípios básicos, como aproximar a física das pessoas comuns, despertar
o interesse dos estudantes por essa ciência, atrair futuros talentos, ressaltar sua importância
no cotidiano, lembrar suas contribuições para a construção da nossa visão de mundo, ligar
suas inter-relações com outras áreas do conhecimento, mostrar seu caráter amplamente
interdisciplinar, disseminar a consciência de que ela está na base do desenvolvimento
tecnológico e econômico que o mundo alcançou até aqui, entre outros motivos.
Para cumprir com tais objetivos, os meios de comunicação de massa ganham uma
fundamental importância. Se os meios midiáticos forem utilizados de maneira correta e
consciente, um gigantesco avanço poderá ser sentido na busca pelo objetivo final, que é
chamar a atenção da sociedade para a física.
Um fato que nos chama a atenção, sempre que conversamos com autoridades no
ensino de física no país, é a finalidade do evento em atrair novos talentos, despertar a visão
dos jovens para a carreira de físico ou professor de física. Um dos motivos é desmistificar a
visão geral que os jovens têm da física, de chata e hermética. Passar a ideia que ela está
presente em todas as áreas do conhecimento e nos desenvolvimentos tecnológicos, que
podem ser banais em uma análise descuidada, mas que dependeram de alguma forma aos
avanços dessa ciência básica, que nossa visão normalmente fragmentária e encerrada nas
disciplinas não nos permite enxergar.
Com isso, cai cada vez mais a procura pelos cursos de física nos vestibulares do
nosso país. Isso futuramente acentuará o enorme deficit de professores de física para o
ensino médio nas escolas e reforçará ainda mais o desinteresse dos jovens pelos cursos
superiores da área, instaurando-se um círculo vicioso. Como prevê Vieira: “Chegaremos a
2010 com um deficit de aproximadamente 50 mil professores de ensino médio de física e
química”.44
Com a escolha da realização do “Ano Mundial da Física” exatamente no aniversário
44
VIEIRA, C. L. Monografia - Ano Mundial da Física. [Mensagem pessoal].

77
de um século dos cinco papers de Albert Einstein contidos no Annus Mirabilis, busca-se
aproveitar a imagem mítica do famoso físico alemão e, principalmente, associar a
importantíssima figura do cientista puro na mente das pessoas. A física desenvolvida para
buscar os segredos da natureza, procurar conhecer e dominar tanto os fenômenos
subatômicos quanto os grandes enigmas cosmológicos. Assim, ter por objetivo principal,
único e exclusivo, a melhoria na vida das pessoas e o conhecimento em prol da
coletividade, em detrimento da ciência desenvolvida especificamente para atender aos
interesses das grandes corporações industriais, incluindo fins bélicos.
O jornalismo científico passa a ter um papel fundamental nesse empenho, por ser
praticamente o único elo entre o que se passa dentro dos laboratórios e a vida da população
comum. Por jornalismo científico, entenda-se como uma especialização da prática de
jornalismo, muito embora ela possua todo um corpus próprio e autônomo. As definições de
jornalismo científico são um pouco complicadas, haja vista que se pode encontrar aspectos
e características dessa especialização em outras editorias, como economia, comunicação
rural, política e meio ambiente. Por isso, não vamos nos aprofundar nessa análise, já que
nem é a proposta primordial do presente trabalho. Iremos, então, apresentar algumas
definições já consagradas sobre o tema. Segundo Bueno:

O jornalismo científico se constitui em um caso particular de divulgação


científica e refere-se a processos, estratégias, técnicas e mecanismos para
veiculação de fatos que se situam no campo da ciência e da tecnologia. (...)
O conceito de jornalismo científico deve, obrigatoriamente, incluir o de
jornalismo, apropriando-se das características enunciadas por Otto Groth:
atualidade, universalidade, periodicidade e difusão (1985, pp. 11-14).

De acordo com Salles (apud BUENO, 1985), jornalismo científico é “... a informação
persistente de fatos, personalidades e acontecimentos relacionados ao campo da ciência,
veiculada através dos meios de comunicação de massa e transmitidas em linguagem
acessível ao grande público”. Segundo Lage, o jornalismo científico possui duas funções
principais:

O jornalismo cumpre dois papéis: o de divulgador do conhecimento e de

78
indexador, fornecendo o estímulo para investigação mais ampla dos
interessados. A difusão dos computadores, a extensão rural e os programas
de saúde pública estão entre as áreas que se beneficiam simultaneamente
dessas duas funções.45

Apesar de a priori não ser uma função básica do jornalismo científico, ela acaba
indiretamente cumprindo a função educativa para a população e fornecendo os parâmetros
necessários à educação continuada e permanente das pessoas. Segundo Bueno:

O jornalismo científico deve estar atento para o fato, já lembrado por José
Reis46, de que, em muitos casos, ele se constitui na única fonte popular de
informações sobre ciência e tecnologia. Num país como o nosso,
caracterizado pelo ensino desatualizado de ciências, passa a ser a única
forma pela qual os cidadãos tomam contato com a atividade e os produtos
de tecnólogos e cientistas (1985, p. 33).

Como afirma Melo, o jornalismo científico também tem um caráter educativo. Para
ele deve ser:

Principalmente educativa; dirigida à grande massa da nossa população e


não apenas à sua elite; promover a popularização do conhecimento que está
sendo produzido nas universidades e centros de pesquisa, de modo a
contribuir para a superação dos muitos problemas que o povo enfrenta; usar
uma linguagem capaz de permitir o entendimento das informações pelo
cidadão comum; gerar o desejo do conhecimento permanente, despertando
interesse pelos processos científicos e não pelos fatos isolados e seus
personagens; discutir a política científica, conscientizando a população que
paga impostos para participar das decisões sobre a alocação dos recursos,
que significam o estabelecimento de prioridades na produção do saber;
realizar um trabalho de iniciação dos jovens ao mundo do conhecimento e
de educação continuada dos adultos (1982, p. 21).

Segundo Caldas (2003, p. 75), “a informação é parte integrante do progresso


educativo. Isto porque, agregados à informação estão valores, crenças e ideologias que
constituem em fatores decisivos para a aquisição do conhecimento”. Mattozo indica o papel
dos meios midiáticos no processo de construção das representações sociais em busca da

45
LAGE, N. O jornalismo científico em tempos de confronto. In: Intercom – XXVI Congresso Brasileiro de
Ciências da Comunicação, 2003.
46
Médico e jornalista que sempre se empenhou em divulgar a ciência. Nasceu no Rio de Janeiro, e morreu em
São Paulo, no dia 16 de maio de 2002, aos 94 anos de idade.

79
compreensão e transformação da realidade:

A mediação promovida pela mídia desempenha um papel significativo na


sociedade contemporânea ao constituir e difundir representações sociais que
contribuem para formar condutas e orientar as comunicações sociais e
estabelecer um conjunto de princípios construído interativamente e
compartilhado pelos diferentes grupos sociais para compreender e
transformar a realidade (2002, p. 48).

Já a prática do ensino de física, principalmente no ensino médio, apresenta alguns


atrasos com relação ao próprio desenvolvimento dessa ciência. Os avanços proporcionados
por Albert Einstein e outros cientistas do século XX são praticamente esquecidos e
ignorados pelos professores da escola formal. O surgimento da física contemporânea passa
quase que despercebida e parece que os livros didáticos pararam em Isaac Newton, quando
muito tratam do eletromagnetismo de Maxwell. Isso pode ser uma das causas pelas quais o
aluno se desinteressa completamente pela área e, indo mais além, pode ser uma das causas
da dificuldade de aprendizado quando a física moderna é demonstrada. As visões
mecanicistas e causais da física de Newton o impedem de enxergar o grande avanço no
conhecimento provocado pela grande ruptura do século XX. Menezes destaca a importância
da física e propõe a utilização dos meios tecnológicos para fins educativos:

A Física está presente a cada momento, do nosso dia a dia; basta saber
enxergá-la nos mais banais acontecimentos e situações. Desempenhando tal
habilidade, o professor certamente poderá passar aos alunos a percepção
não limita-se a apenas um amontoado de equações que devem ser decoradas
(2005, p. 30).

O caráter estritamente empírico da ‘divisão cartesiana’ reforça ainda mais a visão


baseada apenas nos fenômenos apresentados aos sentidos e não percebe a realidade tal
como ela é. Segundo Morin:

Deve-se evocar aqui o “grande paradigma do Ocidente”, formulado por


Descartes e imposto pelo desdobramento da história europeia a partir do
século XVII. O paradigma cartesiano separa o sujeito e o objeto, cada qual
na esfera própria: a filosofia e a pesquisa reflexiva, de um lado, a ciência e
a pesquisa objetiva, de outro (2000, p. 26).

80
Einstein também percebeu o fato das especializações tirarem o conhecimento
humano do foco principal e indicou o desenvolvimento do espírito crítico na inteligência:

Não basta ensinar ao homem uma especialidade. Porque se tornará assim


uma máquina utilizável, mas não uma personalidade. É necessário que
adquira um sentimento, um senso prático daquilo que vale a pena ser
empreendido, daquilo que é belo, do que é moralmente correto. É preciso,
enfim, tendo em vista a realização de uma educação perfeita, desenvolver o
espírito crítico na inteligência do jovem (1981, p. 29).

Esse é um dos fatos causadores da crise no ensino de ciências no ensino médio. Ao


passar uma visão descontextualizada com a atualidade, e tendo por objetivo único a
preparação para o vestibular, deixa latente o desenvolvimento do espírito crítico e a
educação para a compreensão humana. Assim, por exemplo, o aluno que entra no curso de
biologia, esquece das lições de história; o estudante que passa no vestibular de física, deixa
de lado os exercícios de língua portuguesa e os que entram na faculdade de direito,
literalmente jogam as apostilas de matemática pela janela. Dessa forma, o único contato
que alguns profissionais têm com a ciência é através das publicações de divulgação
científica ou os cadernos de ciências dentro dos jornais diários. Um dos objetivos do “Ano
Mundial da Física”, segundo Studart, é justamente alertar as autoridades para a melhoria do
ensino de física em todos os níveis.

Estamos celebrando o Ano Mundial da Física (AMF) cujo objetivo


principal é a divulgação da Física em todos os setores da sociedade
exaltando sua relevância como a ciência mais fundamental (não quer dizer
que seja a mais importante!), suas contribuições para melhor compreensão
do Universo em que vivemos e para o desenvolvimento tecnológico. Na
educação, buscamos alertar o público e as autoridades para a necessidade
imperiosa da melhoria do ensino desta disciplina em todos os níveis e, em
particular, estabelecer estratégias para motivar os jovens para o estudo da
Física (2005, p. 3).

Com as rápidas mudanças científicas e tecnológicas percebe-se uma tendência que


vem se acentuando cada vez mais na pesquisa científica mundial: a junção de grandes áreas
do conhecimento para o mesmo fim. Um bom exemplo é o que vem sendo desenvolvido no
do Laboratório de Biofotônica do Instituto de Física de São Carlos da Universidade de São

81
Paulo. Lá, os pesquisadores utilizam vários conceitos advindos da física, da fisiologia, da
bioquímica, da medicina e da engenharia para desenvolver novas armas para combater o
câncer, principalmente os do tipo carcinoma. Esse é apenas um exemplo dentre muitos que
acontecem nas universidades e centros de pesquisa no mundo. A interdisciplinaridade
cresce cada vez mais nas pesquisas científicas, o que evidencia a unidade do conhecimento.
Morin prenuncia a era planetária, onde todos os conhecimentos são globalizados:

O global é mais que o contexto, é o conjunto das diversas partes ligadas a


ele de modo inter-retroativo ou organizacional. Dessa maneira, uma
sociedade é mais que um contexto: é o todo organizador de que fazemos
parte. O planeta Terra é mais do que um contexto: é o todo ao mesmo
tempo organizador e desorganizador de que fazemos parte (2000, p. 37).

Alguns pontos da fala de Morin podem ser correlacionados com alguns pontos da
física quântica que surgiu com Max Planck e Albert Einstein seguidos de Niels Bohr,
Edwin Schrödinger e Werner Heisenberg. Com a física quântica, surgem definições como
teia cósmica, tecido de eventos e complexidade quântica. Segundo Capra:

A teoria quântica revela assim um estado de interconexão essencial do


universo. Ela mostra que não podemos decompor o mundo em suas
menores unidades capazes de existir independentemente. À medida que
penetramos mais e mais dentro da matéria, descobrimos que ela é feita de
partículas, mas essas partículas não são os “blocos de construção básicos”
no sentido de Demócrito e de Newton. Elas, simplesmente, são idealizações
úteis de um ponto de vista prático, mas desprovidas de significado
fundamental. Nas palavras de Niels Bohr, “partículas materiais isoladas são
abstrações, sendo que suas propriedades só podem ser definidas e
observadas através de sua interação com outros sistemas” (1983, p. 108).

Isso demonstra a importância de se introduzir a física contemporânea nas aulas do


ensino médio e difundi-la amplamente nos textos de jornalismo científico. Não apenas com
o simples intuito de apenas acrescentar “algo mais” às aulas de física, mas com a finalidade
de passar toda a evolução filosófica e fornecer todos os pressupostos para o aluno formar
um senso crítico, compreender a relacionar os fatos, analisar todas as premissas de uma
situação para chegar a uma provável síntese e estabelecer uma percepção globalizada do
mundo.

82
No caso específico do jornalismo científico, sua utilização como material didático
pode auxiliar na relação professor-educando, já que os meios midiáticos acompanham com
maior velocidade os avanços da ciência do que os livros didáticos. Diversos autores já vêm
pesquisando essa possibilidade e já obtiveram grandes êxitos nesse empenho. Assim, o
jornalismo científico se transforma em uma boa ferramenta de ensino. Segundo Knobel:

O Jornalismo Científico é fundamental não somente para o aprendizado da


Física, mas também para qualquer outra disciplina científica. É através das
diversas expressões do jornalismo, e suas diferentes mídias, que as pessoas
podem ampliar seus horizontes, e começar a pensar sobre questões que
geralmente não passam pelas nossas cabeças, como o mundo nanoscópico,
como o universo, o tempo, os avanços da tecnologia, e assim por diante.
Além de auxiliar no estímulo para futuros cientistas, a divulgação científica
auxilia a promover o pensamento crítico, os métodos científicos, e a
compreender tantos benefícios que a ciência ofereceu para a humanidade. 47

Oliveira ressalta a importância de conceber a ciência como parte da cultura, além da


sua função educacional, e menciona a revista Ciência Hoje das Crianças, da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência:

O jornalismo científico e a divulgação científica não só auxiliam na


educação formal (escolar), mas principalmente na transposição para a
sociedade de uma parte fundamental da cultura humana, que é a Ciência.
Nos dias atuais (e nos futuros) não é possível passarmos à margem dessa
parte do conhecimento humano. Dessa forma, a divulgação de notícias,
quando bem fundamentadas e apresentadas em linguagem simples, ajudam
a estimular o interesse pela Ciência, em particular da Física. No meu ponto
de vista, qualquer ação que desperte o indivíduo para essa realidade é
válido, principalmente quando começamos esse hábito nas crianças
menores, como faz a Ciência Hoje das Crianças.48

A concepção da ciência como parte da cultura torna ainda mais importante o papel
dos meios midiáticos. Para Vigotsky et al. (1988) a força diretiva do pensamento é externa,
o mundo social é fundamental no desenvolvimento cognitivo, o conhecimento resulta da
apropriação cultural. As estruturas mentais são, desde a infância, construídas a partir de
concepções espontâneas dos fenômenos. A sociedade e a sua cultura determinam o

47
KNOBEL, M. Monografia - Ano Mundial da Física. [Mensagem pessoal].
48
OLIVEIRA, A. Monografia - Ano Mundial da Física. [Mensagem pessoal].

83
desenvolvimento da formação do pensamento humano. Assim, os meios de comunicação de
massa contribuem de maneira significativa nesse processo de construção do raciocínio
lógico, ao ser uma manifestação de destaque nas relações sociais. A transição entre as
concepções espontâneas para a formulação dos conhecimentos verdadeiros pode ser um dos
papéis do jornalismo científico, quando a educação formal for deficitária ou desmotivadora.
Segundo Gaspar:

A presença de um problema, representada em geral pelas tarefas que o


jovem enfrenta ao ingressar no mundo dos adultos, é necessária para o
surgimento de um pensamento conceitual, mas não suficiente. É preciso que
o meio ambiente o desafie, faça novas exigências a seu intelecto, caso
contrário o seu pensamento não atingirá os níveis cognitivos mais elevados
ou os atingirá com grande atraso (1993, p. 58).

Aqui, a motivação exerce um papel fundamental na alfabetização em ciências do


público em geral. Se dividirmos o vocábulo “motivação” em dois conceitos distintos,
teremos duas palavras: o motivar e a ação. O papel de motivar cabe aos professores do
ensino regular e, de certa forma, aos jornalistas que exercem sua influência através dos
meios midiáticos. A ação talvez seja um pouco mais difícil de definir e mais complexa. A
tarefa de fazer o aluno agir ativamente no processo de educação requer alguns cuidados
especiais e sempre vai estar atrelada à sua subjetividade histórica.
A utilização de textos de jornalismo científico talvez não responda a todos os
enigmas da física moderna ou dos complexos sistemas de sequenciamento genômico e é
bem provável que muitos conceitos ali apresentados não sejam aprendidos em sua
totalidade, mas farão despertar no aluno a questão da dúvida e da curiosidade. A busca pelo
conhecimento estabelecerá uma nova conquista por parte do jovem e, para conseguir
cumprir esse objetivo, ele procurará interagir socialmente com pessoas mais capazes ou
outras fontes de pesquisa. Esse processo dialético fornecerá parâmetros necessários para
trocar/abandonar suas concepções espontâneas em busca do conhecimento verdadeiro. Suas
bases cognitivas entrarão em crise quase que constantemente em busca de uma ancoragem
científica mais segura. Ao jornalismo científico cumpre esse caráter heurístico e indexador.
O diálogo promovido entre aluno-professor-jornalismo científico acaba se transformando

84
em um dos combustíveis da teoria de Vigotsky. O estímulo da curiosidade propicia o
autodidatismo nos jovens. Segundo Morin:

A educação deve favorecer a aptidão natural da mente em formular e


resolver problemas essenciais e, de forma correlata, estimular o uso total da
inteligência geral. Este uso total pede o livre exercício da curiosidade, a
faculdade mais expandida e a mais viva durante a infância e a adolescência
(2000, p. 39).

Do mesmo modo que a ruptura dos conhecimentos primordiais espontâneos e das


concepções científicas representam uma rápida metamorfose (quase que um choque), o
advento da física moderna também anunciou uma grande ruptura com a física newtoniana,
que tinha o objetivo de ser a última explicação para todos os fenômenos físicos. Simples
conceitos como distância, tempo e massa foram completamente revistos. As novas
descobertas do início do século XX causaram profundas mudanças não só na física, mas em
todo o pensamento filosófico da humanidade. Albert Einstein reforçou ainda mais essa
tendência ao postular a teoria da relatividade geral e a comprovação empírica do
encurvamento do espaço pela matéria o fez mundialmente famoso. Um pouco mais tarde,
com novas interpretações dos fenômenos quânticos, vieram à tona conceitos ainda mais
revolucionários e transformadores. Na teoria quântica não é possível determinar com
certeza o momentum e a posição das partículas, fazendo surgir o princípio da incerteza.
Mais tarde, foram descobertas novas partículas elementares como o múon, o méson pi e o
káon. A palavra ‘elementares’ não define fielmente a natureza das partículas subatômicas
aqui mencionadas. Não como blocos básicos de construção pregados pela ciência grega,
mas em um sentido muito mais abstrato e incógnito. Não é a proposta deste estudo a
prolongação nesse tema, pois estudos teóricos preveem a existência dos quarks, que seriam
constituintes mais profundos dentro das partículas subatômicas. O que vale aqui para o
nosso estudo é a incapacidade do estudo isolado das partes para uma compreensão do todo
globalizado. Para um ensino eficaz de ciências é necessário mostrar o vaivém da evolução
das ideias; o fluxo do saber deve buscar as verdades, sem deixar de lado as incertezas e
prováveis incoerências que surgem a cada instante. A determinação científica emana do

85
indeterminismo e do improvável. Morin expõe muito bem essa situação:

Toda evolução é fruto do desvio bem-sucedido cujo desenvolvimento


transforma o sistema onde nasceu: desorganiza o sistema, reorganizando-o.
As grandes transformações são morfogêneses, criadoras de formas novas
que podem constituir verdadeiras metamorfoses. De qualquer maneira, não
há evolução que não seja desorganizadora/reorganizadora em seu processo
de transformação ou de metamorfose (2000, p. 82).

A prática do jornalismo científico deve seguir essa tendência para cumprir


rigorosamente sua proposta educativa. Normalmente, o profissional jornalista, ao se deparar
com uma pauta científica, busca a priori, sua aplicabilidade e seu emprego concreto.
Muitas vezes, privilegia as conclusões e descobertas palpáveis em detrimento à
metodologia científica utilizada e não procura saber quais conhecimentos levaram o
cientista para tal descoberta. Assim, o jornalista descontextualiza o conhecimento
produzido e categoriza a pesquisa através das suas visões interpretativas, fruto de sua
subjetividade que são consequência da sua percepção sensorial. A fragmentação do
conhecimento científico é endossada pelo jornalista e esse modo de ver a ciência atinge os
leitores. Moles define essa situação como sendo parte da “cultura mosaico”, na qual um
ambiente cultural se molda a partir da justaposição incompleta de fragmentos da realidade:

... os fragmentos de nosso conhecimento são pedaços desordenados, ligados


ao acaso por simples relações de proximidade, de época de aquisição, de
assonância, de associação de ideias, portanto, sem estrutura definida, mas
com uma coesão que pode, tanto quanto a ligação lógica (...), assegurar
uma certa densidade da tela de nossos conhecimentos, uma compacidade
tão grande quanto a da tela tramada que a educação humanista nos
propunha. Denominaremos uma tal cultura de cultura-mosaico, já que se
apresenta como essencialmente aleatória, como uma reunião de fragmentos,
por justaposição sem construção, sem pontos de referência, onde nenhuma
ideia é forçosamente geral, mas onde muitas ideias são importantes (ideias-
força, palavras-chave, etc.) (1974, p. 19, grifos do autor).

Os profissionais da comunicação devem estar preparados para tentar fugir de tal


pressuposto. As reportagens de divulgação científica não podem deslocar os conhecimentos
e tratá-los em separado. Desde a elaboração da pauta, passando pela redação da matéria até
a edição final, os conhecimentos não devem ser fragmentados. O escritor de ciência deve

86
estar atento ao público que vai atingir e de que maneira essa informação chegará até as
pessoas. O leitor que busca leituras científicas está ávido pelo sentimento de querer
compreender melhor o mundo que o rodeia em toda a sua plenitude. Os conhecimentos
científicos que o jornalista quer transmitir devem estar inseridos dentro da complexidade
humana, como diz Morin:

A complexidade humana não poderia ser compreendida dissociada dos


elementos (indivíduo, sociedade, espécie) que a constituem: todo
desenvolvimento verdadeiramente humano significa o desenvolvimento
conjunto das autonomias individuais, das participações comunitárias e do
sentimento de pertencer à espécie humana (2000, p. 55).

Um dos grandes desafios da nossa sociedade no século XXI está no


desenvolvimento de melhorias para a educação e a formação humana. As
hiperespecializações acentuam a segmentação do conhecimento e distanciam ainda mais a
ciência do público leigo ou não-especializado. Profundas mudanças deverão ser tomadas
em várias esferas públicas para promover a democratização do conhecimento. As
informações deverão ser reunidas. Segundo Davidovich e Morin:

... é preciso repensar os programas, estimular a formação interdisciplinar,


promover o ingresso em grandes áreas da universidade, adiando-se a
especialização, reduzir a carga horária de disciplinas obrigatórias e
aumentar o leque de eletivas, e oferecer oficinas de trabalho sobre temas
atuais. Assim, não só se estará incentivando a formação interdisciplinar,
como também se dará mais oportunidade de tratamento especial a alunos
excepcionais ou com dificuldade de aprendizagem (2005, p. 25).

... para a educação do futuro, é necessário promover grande


remembramento dos conhecimentos oriundos das ciências naturais, a fim de
situar a condição humana no mundo, dos conhecimentos derivados das
ciências humanas para colocar em evidência a multidimensionalidade e as
complexidades humanas, bem como integrar a contribuição inestimável das
humanidades, não somente a filosofia e a história, mas também a literatura,
a poesia, as artes... (2000, p. 48).

O jornalismo científico, ao adotar a linha do remembramento dos conhecimentos


defendidos por Morin, contribui para a difusão dos saberes científicos de modo uno.
Entretanto, o aproveitamento dos textos de divulgação científica nas salas de aula do ensino

87
formal exige muita responsabilidade por parte do professor e devem obedecer alguns
aspectos49, como diz Chaves:

Uma que envolve o tipo de notícia e informação relativamente a sua


veracidade e coerência que exige uma leitura apurada e detalhada. A outra
envolve a questão de como tornar didático esse tipo de material para ser
utilizado em sala de aula.50

A física moderna e contemporânea pode ser melhor compreendida utilizando-se tais


ferramentas. Os jovens aprendem a se localizar dentro dos conhecimentos surgidos no
século XX através das últimas novidades da física. Isso não significa que é preciso ensinar
o valor fracionário da carga elétrica do quark, mas alguns tópicos da física moderna são
interessantes para desenvolver o espírito crítico dos aspirantes ao ensino superior. As
teorias da relatividade, o fenômeno fotoelétrico, o caráter dualístico da luz, o princípio da
incerteza de Heisenberg, a astronomia, experiências com supercondutores e a
empregabilidade do laser são alguns assuntos que podem ser introduzidos no ensino médio.
Outra boa inovação é levar grupos de alunos para uma “tarde de visitações” aos
laboratórios das universidades. Lá eles observarão como os conhecimentos científicos são
empregados para fornecer novas tecnologias, ou o contrário, como as tecnologias são
utilizadas para promover o aumento da compreensão de determinado problema científico.
Aliás, ciência produz tecnologia que produz mais ciência em um fluxo incessante. Assim,
os jovens levarão para a sala de aula todas as informações necessárias para entender a
grande ruptura no final do século XIX, mas sem esquecer os conceitos clássicos e
tradicionais que precederam a ciência atual. Para perceber qual foi o resultado das visitas
aos laboratórios e o impacto em sua visão de mundo, pode-se solicitar uma pequena
redação ou dissertação sobre as informações colhidas. A proposta de elaboração da redação
só pode trazer resultados benéficos, como a melhoria da prática da escrita (tão importante
para os vestibulares atuais), a organização das informações, a adequação da linguagem e a
fixação dos conceitos aprendidos. Com as redações em mãos, o professor passa a analisar o
49
Além do cuidado especial com a evolução das pseudociências e outras futilidades contidas em revistas de
curiosidades.
50
CHAVES, T. Monografia - Ano Mundial da Física. [Mensagem pessoal].

88
conteúdo dos dados e indicar ao aluno a passagem na qual ele se equivocou ou no parágrafo
em que foi muito bem. A relação com a divulgação científica como instrumento de ensino
agora muda, não apenas a interação fica por conta pela relação professor-aluno, aluno-
aluno, aluno-texto de divulgação científica. Agora, a relação é texto de divulgação
científica-aluno-professor. A grande vantagem é perceber a elaboração de textos de
jornalismo científico por parte dos alunos. A prática de redigir trabalhos científicos, poderá
ser uma técnica muito utilizada na educação do futuro. Para conseguir desenvolver seu
trabalho, o aluno terá que interagir com várias fontes do conhecimento, como professores,
técnicos ou documentos científicos (jornal e internet). Terá que desenvolver várias
faculdades no processo, como a observação e a curiosidade, para elaborar um bom texto.
Assim, suas estruturas mentais e seu desenvolvimento cognitivo serão exercitados como
prevê a teoria de Vigotsky e fornece os parâmetros necessários para a definição da carreira
que o jovem quer seguir, tão indeciso nessa época da vida. Quem sabe, tal prática não
aumente a procura pelos cursos de física, química e matemática.
Moles já alertava para o fato dos meios midiáticos assumirem o papel educativo e
esse passa a ser até mais eficaz pelo estabelecimento do conhecimento na comparação com
a educação formal.

Em suma, atualmente o conhecimento não mais se estabelece, em sua parte


principal, pela educação, sendo feito pelos meios de comunicação de massa.
A tela de nossa cultura não é mais uma rede alinhada com traços principais
e traços secundários, uma espécie de tecido ou teia de aranha. Estes
fragmentos de pensamento agregam-se uns aos outros, à mercê da vida de
todos os dias, que nos prodigaliza um fluxo constante de informações
(1974, p. 19).

Gaspar ressalta que os meios midiáticos refletem o ambiente cultural da sociedade e


a alfabetização científica deve levar em conta tal fenômeno:

Parece-nos claro, finalmente, que a mídia impressa e eletrônica, mais do


que promotora de uma cultura ou de uma alfabetização em ciências, é um
reflexo do ambiente cultural que retrata. Na medida em que esse ambiente
cultural se enriqueça, o nível de exigência do seu público será maior e,
obrigatoriamente, melhor será a qualidade do seu trabalho (1993, p. 41).

89
No caso específico da física moderna, em especial a mecânica quântica, há um
paradigma fundamental: sua característica de improbabilidade. Segundo Piza:

A relação de incerteza de Heisenberg – que afirma a impossibilidade da


definição simultânea da posição e da velocidade (ou momento) de uma
partícula além de um determinado limite – nada mais é, na realidade, que
uma propriedade geral da interdependência das duas distribuições de
probabilidade e, portanto, uma consequência geral da definição quântica de
estado (2005, p. 44).

Os educadores e jornalistas científicos devem estar atentos ao fato mencionado


acima. Grande parte dos conhecimentos científicos e filosóficos permitem tantas variáveis,
que se tornam estatísticos e algumas postulam a incerteza como realidade inerente. Os
textos de jornalismo científico devem estar preparados para as incertezas, bem como o
ensino de ciências. Morin (2000) deixa essa tendência bem clara em sua obra literária:

Nova consciência começa a surgir: o homem, confrontado de todos os lados


às incertezas, é levado em nova aventura. É preciso aprender a enfrentar a
incerteza, já que vivemos em uma época de mudanças em que os valores
são ambivalentes, em que tudo é ligado. É por isso que a educação do
futuro deve se voltar para as incertezas ligadas ao conhecimento (p. 84).

O conhecimento é, pois, uma aventura incerta que comporta em si mesma,


permanentemente, o risco de ilusão e de erro. Entretanto, é nas certezas
doutrinárias, dogmáticas e intolerantes que se encontram as piores ilusões;
ao contrário, a consciência do caráter incerto do ato cognitivo constitui a
oportunidade de chegar ao conhecimento pertinente (p. 86).

Além de reconhecer as incertezas, Morin postula que o conhecimento pertinente


deve reconhecer as várias facetas que compõe a complexidade humana. Surge o conceito da
“multidimensionalidade” também no conhecimento humano:

Unidades complexas, como o ser humano ou a sociedade, são


multidimensionais: dessa forma, o ser humano é ao mesmo tempo
biológico, psíquico, social, afetivo e racional. A sociedade comporta as
dimensões históricas, econômicas, sociológicas, religiosas... O
conhecimento pertinente deve reconhecer esse caráter multidimensional e
nele inserir estes dados: não apenas não se poderia isolar uma parte do todo,
mas as partes uma das outras (idem, p. 38).

90
O jornalismo, como exemplo de discurso através do texto, é também
multidimensional, enquanto espaço simbólico. Por isso, deve estar preparado para a função
de mediação entre as diversas esferas das relações sociais, dentre elas a construção do
pensamento, a linguagem e o mundo, como diz Orlandi:

Do ponto de vista da significação, não há uma relação direta do homem


com o mundo, ou melhor, a relação do homem com o pensamento, com a
linguagem e com o mundo não é direta assim como a relação entre
linguagem e pensamento, e linguagem e mundo têm também suas
mediações. Daí a necessidade da noção de discurso para pensar essas
relações mediadas. Mais ainda, é pelo discurso que melhor se compreende a
relação entre linguagem, pensamento, mundo, porque o discurso é uma das
instâncias materiais (concretas) dessa relação (2004, p. 12).

Nesse empenho de unir as relações sociais, surgem novas concepções básicas no


alicerce dos meios de comunicação de massa. Devido à enorme quantidade de “analfabetos
científicos” na grande população geral, os meios midiáticos se tornam as únicas fontes do
saber para a grande massa. Segundo Lima, em sua dissertação de mestrado:

O Centro Interamericano para a Produção de Material Educativo e


Científico para a Imprensa (Cimpec) conceituou o jornalismo científico
enfatizando o seu caráter educativo: (...) trata da transmissão massiva, pelos
meios de comunicação, de conteúdos que ampliem e melhorem a
informação popular sobre ciência e técnica e contribuam para formar
interesses e vocações que levem as pessoas a novas ocupações surgidas
pelo progresso da sociedade (2000, p. 26).

Sagan conceitua o “analfabetismo científico” e prevê um grande problema social


advindo dele:

... sei que as consequências do analfabetismo científico são muito mais


perigosas em nossa época do que em qualquer outro período anterior. É
perigoso e temerário que o cidadão comum continue a ignorar o
aquecimento global, por exemplo, ou a diminuição da camada de ozônio, a
poluição do ar, o lixo tóxico e radioativo, a chuva ácida, a erosão da camada
superior do solo, o desflorestamento tropical, o crescimento exponencial da
população. (...) Como podemos executar a política nacional – ou até mesmo
tomar decisões inteligentes sobre nossas próprias vidas – se não
compreendemos as questões subjacentes (2003, p. 21).

91
O aprendizado, segundo Vigotsky, é desenvolvimento e um processo puramente
exterior, paralelo. Por um lado, o processo de desenvolvimento está concebido como um
processo independente do de aprendizagem, mas, por outro lado, essa mesma aprendizagem
considera-se coincidente com o desenvolvimento. Segundo Luria:

A presença de conceitos teóricos gerais, aos quais estão subordinados


outros mais práticos, cria um sistema lógico de códigos. À medida que o
pensamento teórico se desenvolve, o sistema torna-se cada vez mais
complicado. Além das palavras que assumem uma estrutura conceitual
complexa, e das sentenças, cuja estrutura lógica e gramatical permite que
funcionem como base de juízo, este sistema inclui também “expedientes”
lógicos e verbais mais complexos que lhe permite realizar as operações de
dedução e inferência (1988, p. 53).

Desse modo, aumentam as responsabilidades dos jornalistas de ciência e educadores


do século XXI, que devem estar atentos ao fato apontado por Luria. A segmentação do
conhecimento, tão já debatido neste capítulo, pode estar inserida no inconsciente coletivo
dos educadores, sem que eles se deem conta disso. Moles faz alusão à visão de mundo
“enciclopedista”:

O ponto de vista “enciclopedista” se baseia numa função quantitativa de


conhecimento, que é limitada pelas possibilidades naturais do cérebro
humano. O espírito humano encontra-se isolado diante de uma soma de
conhecimentos que se amplifica e não há mais medida comum entre o
conteúdo do espírito e o que o ambiente lhe propõe: está, portanto,
condenado a ser superficial (1979, pp. 12-13).

Aqui aparece o termo “superficialidade”, tão em voga nos dias atuais. Que pode ser
a maior crítica dos profissionais de ciência aos jornalistas. Uma pesquisa de décadas pode
ser resumida num lead de 700 toques. Uma grande descoberta científica da física é passada
segundo os moldes da pirâmide invertida e com todo o enfoque voltado para o valor
econômico que a provável aplicabilidade dessa ciência pode trazer. O lado humanístico da
ciência é esquecido. Aliás, a significação da palavra “humanidades”, sob o ponto de vista
cultural que normalmente é empregada, colabora para reforçar ainda mais a distância de
algumas grandes áreas da ciência para a sociedade em geral. Segundo Moles:

92
A palavra “humanidades” foi forjada de maneira formal nos séculos XVII e
XVIII, para designar uma concepção do homem cultivado que possuía
conhecimentos extensos sobre a maioria das atividades de seus congêneres.
(...) Esses conhecimentos deveriam ser adquiridos pelo estudo das artes
liberais e das línguas antigas, com a hipótese implícita, mas que foi
confirmada pelas pesquisas da psicologia moderna, de que as palavras
preexistem às ideias e as recobrem. Os quadros de nossa sociedade
ocidental ainda se baseiam, por inércia, nesta concepção humanista, que
falsifica nossa visão da cultura (1979, pp. 10-11).

Os jornalistas de ciência e educadores devem enxergar o lado humano da fórmula


matemática mais intrínseca existente. A física mais hermética e abstrata contém elementos
tão humanos e sociais quanto os próprios estudos antropológicos. O vocabulário
extremamente técnico contido em um relatório de biologia ou química pode assustar em um
primeiro momento, mas apresenta uma natureza extremamente humana em essência.
Assim, os profissionais de ciência e tecnologia são desmistificados e encurtam a distância
entre ciência e sociedade, promovendo a democratização do conhecimento e a inclusão
social das classes menos favorecidas. Einstein já dizia algo sobre a mistificação dos
cientistas e do teor espetaculoso das notícias de ciência que os jornalistas passavam ao
grande público:

Não é culpa minha se os leigos têm uma impressão exagerada da


importância de meus esforços. Isto se deve muito mais aos escritores de
ciência popular e, em particular, aos correspondentes de jornal que
apresentam tudo da forma mais sensacional possível (1979, p. 36).

A divulgação científica tinha grande importância para a vida de Albert Einstein e ele
também deixou alguns bons aforismos nessa área. Após as pesquisas sobre a teoria da
relatividade geral, ele percebeu a grande importância de divulgar seus estudos para um
público mais amplo. Segundo Studart e Moreira:

Em algum momento, no primeiro semestre de 1916, Einstein decidiu


escrever um livro, destinado a um público com formação de ensino médio
(no contexto alemão da época), que conteria tanto a relatividade especial
quanto a teoria da relatividade geral. Dizia, então, em carta a seu amigo
Michele Besso: ‘Por outro lado, se eu não o fizer, a teoria, simples como
basicamente ela é, não será entendida assim’. Einstein percebera que, para a

93
aceitação de sua teoria junto à própria comunidade científica, era necessário
que suas ideias centrais se tornassem palatáveis para um público mais
amplo. Por outro lado, julgava importante a difusão de um conhecimento
que achava necessário para o aprimoramento da cultura científica geral
(2005, p. 132).

Assim surge o livro: “Sobre a teoria da relatividade especial e geral” em 1917.


Albert Einstein deixou algumas críticas à divulgação científica como a que segue:

A maioria dos livros sobre ciência e que se dizem destinados ao leigo


procura mais impressionar o leitor (“espantoso!”, “como já progredimos!”,
etc.) do que lhe explicar clara e lucidamente os objetivos e métodos
elementares. Depois que um leigo inteligente tenta ler alguns destes livros,
ele fica completamente desanimado. Sua conclusão é: sou idiota demais, é
melhor eu desistir. Além disso, toda a descrição é feita, na maioria das
vezes de uma maneira sensacional que também repele um leigo sensato. Em
uma palavra: Não são os leitores que estão errados, mas os autores e
editores. Minha proposta é: nenhum livro “popular” de ciência deveria ser
publicado antes que ficasse provado que ele pode ser entendido e apreciado
por um leigo inteligente e judicioso (1979, p. 35).

Pode parecer um pouco difícil a definição de “um leigo inteligente e judicioso”.


Como mensurar a inteligência de um público tão amplo e heterogêneo como um conjunto
de pessoas em uma sociedade? O papel do escritor de ciências, ao redigir um texto, é
equilibrar as informações de modo que englobe tanto pessoas com nível médio quanto
acadêmico. Não é a proposta principal de um texto de divulgação científica explicar os
princípios básicos de determinada ciência, mas despertará no leitor o intuito de buscar
informações em outras fontes estudo, como as bibliotecas, documentários ou um amigo que
domina melhor o assunto.
Para os leitores de nível acadêmico, os textos de jornalismo científico serão um
momento para a atualização das novidades da pesquisa científica. Para os estudantes de
graduação, tais leituras poderão ser um reforço na absorção das informações aprendidas em
sala de aula e talvez serão decisivas para a escolha da linha de pesquisa que mais lhe atrai
para uma futura pós-graduação.
A partir dos dados fornecidos acima, percebe-se a importância do jornalismo
científico para aprimorar técnicas de ensino e divulgar as novas pesquisas lançadas.

94
Segundo Monteiro:

A ciência, como qualquer outra cultura, apresenta determinadas


características que só tem significação nesse espaço de correlação. Nessa
direção, os trabalhos voltados para divulgação científica podem contribuir
significativamente, na aculturação do aluno, tornando-o capaz de
compreender como dados experimentais são transformados em “verdades
científicas”. Entender os “rituais”, os procedimentos do trabalho do
cientista e da natureza da ciência nos parece fundamentais para a formação
do cidadão crítico e consciente de sua participação na sociedade. Assim, a
divulgação científica não é apenas importante na educação formal, mas
também na educação informal.51

Para cumprir sua função educativa, o jornalismo científico deve seguir os


pressupostos que foram expostos até aqui. Vamos destacar novamente os mais importantes.
O rigor científico deve imperar também no jornalismo científico, no qual muitas
metodologias empregadas na ciência são válidas. A compreensão dos conhecimentos tem
que atender aos conceitos globais e universais. A fragmentação do saber deve ser evitada ao
máximo. Do mesmo modo que Albert Einstein fundiu o tempo e o espaço, relacionou a
massa com a energia, demonstrou a dualidade existente entra onda e partícula, o jornalista
deve ter uma visão global do conhecimento, para transmitir a realidade científica da melhor
maneira possível.
Quanto ao Ano Mundial da Física, o jornalismo científico pode contribuir
significativamente para atingir os principais objetivos da celebração do aniversário de um
século do “Ano Miraculoso” de Einstein: a melhoria da imagem da física e a
desmistificação dessa ciência e dos profissionais que nela trabalham por todos os setores da
sociedade.

51
MONTEIRO, M. A. Monografia – Ano Mundial da Física. [Mensagem pessoal].

95
Capítulo IV – Análises dos meios midiáticos
1. Os meios de comunicação e o Ano Mundial da Física
Desde que a ONU e a UNESCO declararam 2005 como sendo o “Ano Internacional
da Física”, algumas mídias (a internet em especial) prepararam seções e selos 52 para
organizar as informações referentes ao evento. Pôde-se notar com clareza uma divisão entre
as seções especiais, que contaram a história de Albert Einstein, e às inserções relativas ao
“Ano Mundial da Física” dentro do noticiário comum, seja com a cobertura de eventos, ou
com o anúncio de pesquisas que de alguma forma estão ligadas ao trabalho científico de
Einstein.
As análises englobarão tanto os conteúdos epistemológicos e históricos da física
quanto a relevância dada aos eventos e pesquisas científicas. Algumas publicações, como a
revista Comciência e a revista Ciência Hoje, prosseguiram sua cobertura tradicional dos
avanços em ciência e tecnologia e fizeram seções e selos especiais ao aniversário de um
século dos trabalhos de Einstein. Esta última destinou, em todas as publicações do ano de
2005, um selo especial comemorativo indicando artigos na área da física ou de subáreas
correlatas. Os textos também podem ser classificados pela observação do nível de relação
com os primeiros trabalhos de Albert Einstein, em 1905, com o desenvolvimento científico
posterior ao longo de sua vida, as aplicações delas surgidas e, em alguns casos, quase
nenhuma menção à obra do físico alemão. Os artigos especiais da revista Ciência Hoje
enfocaram a física como um todo, e não somente os trabalhos de Einstein, como disse
Nelson Studart, sobre os objetivos do “Ano Mundial da Física”, no capítulo I deste
trabalho.
Outra classificação compreende o público-alvo das matérias. A abrangência vai
desde pós-graduados em física até o público leigo em geral. Os conteúdos das reportagens
que tiveram grande profundidade técnica nos forneceram ricas informações, embora
excluísse o público leigo. Os textos que tentaram simplificar os conceitos científicos de
maneira exaustiva foram os que ficaram mais sujeitos aos erros e ao fortalecimento de
mitos equivocados da obra científica de Einstein, como a relação entre a equação E=mc 2 e o
52
Selo é a marca visual de uma cobertura ou matéria especial no jornalismo.

96
desenvolvimento de armas de destruição em massa.
Dividimos os veículos em não-especializados e especializados. Na primeira
categoria entraram as edições online dos jornais Folha de S.Paulo e O Estado de S.Paulo –
o Estadão – e das emissoras BBC e Deutsche Welle. No segundo conjunto foram analisadas
as revistas Ciência Hoje e Comciência. Buscamos em seus bancos de dados os verbetes
“Ano Mundial da Física”, “Ano Internacional da Física” e “Albert Einstein”. As inserções
são referentes às reportagens publicadas antes do dia 1º de novembro de 2005.

2. Veículos não especializados


2.1. Folha online
A edição digital do jornal diário Folha de São Paulo dedicou muitas matérias
relativas ao “Ano Mundial da Física” e sobre Albert Einstein. Houve até casos de textos
sem qualquer atualidade aparente, como, no dia 20 de abril de 2005, na matéria intitulada
“Albert Einstein criou duas teorias da relatividade”, quando foi noticiado o aniversário de
50 anos da morte do físico alemão. O enfoque geral dado foi sobre a diferença entre a teoria
da relatividade restrita, desenvolvida em 1905, e a geral de 1915. Percebe-se o foco
estritamente histórico dado à nota.
Essa tendência fica evidente na matéria intitulada “Há cem anos Albert Einstein
assentava as bases da nova física”, veiculada na Folha Online, mas de autoria da agência
France Presse. Não há nenhuma menção aparente a um fato novo e são relembrados
minuciosamente os cinco artigos publicados por Albert Einstein em 1905 e suas influências
sobre as demais teorias posteriores.
Os eventos noticiados foram, na maioria dos casos, os acontecidos em São Paulo.
Os ciclos de seminários sobre Albert Einstein promovidos pelo Instituto de Física da
Universidade de São Paulo, a Sociedade Brasileira de Física e o jornal Folha de São Paulo
tiveram a presença dos maiores nomes da física atual, como Luiz Davidovich, João Steiner,
Adalberto Fazzio, Alberto Santoro, Vanderlei Bagnato, Gil da Costa Marques, entre outros.
Outros eventos de São Paulo noticiados foram as “Conferências sobre Cosmologia”,
promovidas pela Escola de Astrofísica, com a participação de profissionais do Instituto

97
Nacional de Pesquisas Espaciais, Universidade de São Paulo e Universidade Estadual
Paulista. O “Convite à Física”, já citado por esta monografia no capítulo I, também foi
divulgado na Folha Online.
Já os eventos ocorridos em outras partes do mundo foram divulgados através das
agências internacionais de notícias. Primeiro, a abertura do “Ano Mundial da Física” em
janeiro, na Alemanha, pelo então chanceler Gerhard Schroeder. Depois, o maior congresso
de física já realizado na Europa, acontecido em Berlim, no mês de março. Duas grandes
reportagens da agência France Presse foram veiculadas no site da Folha divulgando esse
evento, que contou com 7 mil físicos de várias partes do mundo. Foi mencionada também a
exposição da vida e da obra científica de Albert Einstein no Museu Histórico de Berna,
capital da Suíça.
Duas inserções ressaltaram o lado cultural do “Ano Mundial da Física”. No dia 5 de
junho foi apresentada uma matéria contendo dicas de filmes e livros com temas científicos
e biográficos da vida de Albert Einstein. Em julho, durante a reunião da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência, em Fortaleza, o jornalista Ricardo Bonalume Neto
entrevistou Arthur Miller, autor do livro que comparou as vidas e produções de Albert
Einstein e Pablo Picasso, já citado neste trabalho.
Analisando por aspectos científicos, as matérias sobre física da Folha Online foram
bem aprofundadas e elucidativas. Logo nos primeiros dias de janeiro foi publicada uma
reportagem sobre uma pesquisa nacional desenvolvida pelo Laboratório Nacional de Luz
Síncrotron e a Universidade Estadual de Campinas, envolvendo partículas elementares e
um novo método de investigação científica, que estuda os núcleos atômicos, ao invés de
analisar o elétron. No primeiro artigo de Einstein de 1905, nas explicações sobre o efeito
fotoelétrico – já discutido no capítulo II deste trabalho – elétrons são arrancados das placas
metal após serem excitados por uma fonte de emissão eletromagnética específica.
Normalmente, ao estudar o comportamento da matéria, os cientistas analisavam o elétron
que saltava, e não o núcleo atômico restante da placa de metal, que se transforma em íons.
A grande inovação dessa pesquisa é justamente a análise do núcleo atômico, que, segundo
os especialistas, contém muito mais informações.

98
Em abril foi noticiada uma pesquisa sobre estudos relativos à colisão de partículas
em situações de temperatura perto do zero kelvin – o menor número possível da escala. A
relação com a obra científica de Einstein fica por conta do artigo publicado em 1924 sobre
o fenômeno batizado de “condensado Bose-Einstein”, que prevê a aglomeração de átomos
se comportando como se fosse um único átomo, quando submetido à temperatura
extremamente baixa, já na ordem dos nanokelvins.
Outra matéria significativa ficou por conta do anúncio de um trabalho perdido do
físico César Lattes pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF). O artigo versava
sobre detalhes da cooperação entre Brasil e Japão nos estudos referentes aos raios
cósmicos. Um pouco antes de defender essa tese, em 1966, Lattes trabalhava interinamente
como professor na Universidade de São Paulo (USP). Um concurso foi aberto
especialmente para ele continuar seu trabalho como professor titular. Todavia, o físico
Jayme Tiomno resolveu participar da disputa, o que teria irritado Lattes e sua opção por
lecionar na então nova Universidade Estadual de Campinas. Sua tese sobre raios cósmicos
não foi defendida e ficou esquecida na USP. No entanto, no ano passado, o físico Alfredo
Marques, pediu autorização para César Lattes para publicar seu trabalho, em
comemorações aos 80 anos de seu aniversário 53. Então, o CBPF decidiu divulgá-lo
exatamente no ano de 2005 para as comemorações do “Ano Mundial da Física”.
A divulgação de conclusões de pesquisas internacionais da física também foram
intensas na Folha Online. Em janeiro uma equipe britânica criou uma réplica virtual do
cérebro de Albert Einstein. Os estudos neurológicos sobre o cérebro de Einstein foram
altamente investigados em várias partes do mundo. Os cientistas procuraram achar
diferenças e excentricidades do seu cérebro para identificar possíveis relações com sua
genialidade exacerbada.
Uma notícia polêmica foi publicada em março. Cientistas italianos e americanos
propuseram que a “energia escura”, meio difuso que é responsável pela expansão acelerada
do universo, não existe. E mais, ressuscitaram com todo o vigor, a constante cosmológica

53
César Lattes morreu no Hospital de Clínicas da Unicamp, em Campinas, vítima de uma parada cardíaca, em
8 de março de 2005.

99
de Einstein, considerada por ele como o maior erro da sua vida. Segundo os pesquisadores,
a expansão acelerada do universo é o resultado de “vincos” no espaço-tempo, criados pelo
Big Bang, durante a chamada fase inflacionária, quando o universo se expandiu de forma
rápida. O resultado dessa pesquisa é bem controverso e muitos cientistas já criticaram tal
estudo.
Para os historiadores da física, uma ótima notícia surgiu em agosto: foi descoberto
um artigo perdido de Albert Einstein, na Universidade de Leiden, na Holanda. O texto, do
ano de 1924, tem 16 páginas e o título Quantentheorie des einatomigen idealen Gases -
Zweite Abhandlung, que trata das pesquisas referentes à condensação Bose-Einstein. O
descobridor foi um estudante holandês chamado Rowdy Boeyink que o encontrou durante
uma pesquisa.
Antes, o historiador da ciência, John Stachel, havia sido entrevistado pelo jornalista
Salvador Nogueira, em fevereiro. Stachel, da Universidade de Princeton, é um dos grandes
biógrafos e pesquisadores da vida e da obra científica de Einstein. Na entrevista, ele disse
que, em sua opinião, os trabalhos do ano de 1915, quando Einstein desenvolveu a
relatividade geral, foram o seu feito mais importante. Ele falou também sobre as críticas do
físico alemão à mecânica quântica e sobre o crescente militarismo americano depois da
Segunda Guerra Mundial. Stachel afirmou também que Einstein previu a possibilidade de
guerras preventivas e apoiou o desenvolvimento do estado de Israel, mas disse que a forma
como se daria a relação com seus vizinhos árabes seria o teste para ver se o novo estado
israelense é mesmo democrático ou não. Ele contou sobre a real relação de Einstein com a
bomba atômica e sobre o prêmio Nobel ganho por ele em 1921. Ele finalizou a entrevista
comentando os motivos quase lendários da figura de Einstein.
Além das notícias convencionais dentro da sua editoria de Ciência, a Folha Online
destinou uma seção especial comemorativa ao “Ano Mundial da Física”, quando fez um
resumo histórico sobre o Annus Mirabilis e a física antes, durante e depois de Albert
Einstein. Logo no primeiro texto, de autoria do jornalista Cássio Leite Vieira, foram
relembradas as teorias científicas e os aspectos biográficos da vida do famoso físico a partir
de 1905. Em outro texto, Vieira também contou sobre a infância e juventude de Einstein,

100
assim como sua vida acadêmica e algumas desilusões momentâneas antes do ano de 1905.
Em uma matéria de 5 de junho, foi contada a história da visita de Albert Einstein ao
Brasil, em 1925. Relembrou-se também a expedição de astrônomos ingleses à cidade de
Sobral para a confirmação da teoria da relatividade geral.
Também fazem parte do especial “100 anos da teoria de Einstein” uma minuciosa
biografia de Albert Einstein, uma detalhada cronologia dos anos com os fatos, dicas de sites
e explicações sobre a teoria da relatividade restrita, com muitos infográficos (marca
registrada da Folha).
Os conteúdos apresentados pela Folha Online demonstraram assuntos bem
aprofundados, que talvez escape um pouco do público-alvo primordial leigo dos veículos
não-especializados. Ao mesmo tempo, os conceitos científicos foram mostrados de maneira
clara e explicativa, provando que o jornalismo científico pode ser realmente um eficaz
instrumento educativo, como explanado no capítulo III desta monografia.

2.2. Estadão Online


Assim como no site Folha Online, o Estadão também apostou em uma seção
especial comemorativa ao “Ano Mundial da Física”. Já nas páginas destinadas ao noticiário
convencional foi divulgado que um grupo teatral comemorou as realizações da ciência em
vários espetáculos. As peças apresentaram fatos históricos da ciência, como um monólogo
de Einstein intitulado “A Dança do Universo”, que foi inspirado no livro de Marcelo
Gleiser. Em outro espetáculo foi demonstrado o encontro entre os cientistas Werner
Heisenberg e Niels Bohr.
Um artigo publicado em janeiro no Estadão contou sobre o centenário do Annus
Mirabilis de Einstein e demonstrou a importância de seus trabalhos no desenvolvimento das
tecnologias atuais.
Na seção especial dedicada ao “Ano Mundial da Física”, o jornalista Carlos Orsi
mostrou o contexto histórico e os acontecimentos científicos anteriores ao surgimento de
Einstein. Houve explicações envolvendo o fenômeno fotoelétrico e a teoria quântica da luz.
A teoria da relatividade especial, o abandono do conceito de éter e os paradoxos espácio-

101
temporais delas surgidas. A velocidade superior e finita da luz e a relação entre massa e
energia. Foram citados também os outros trabalhos de 1905 menos conhecidos, como as
determinações das dimensões moleculares e o movimento browniano. Para encerrar, foram
mostrados os acontecimentos posteriores ao Annus Mirabilis, como o desenvolvimento da
teoria da relatividade geral, os debates com os físicos da mecânica quântica, a famosa carta
para o presidente dos Estados Unidos alertando sobre os perigos de uma provável bomba
atômica alemã, o convite para ser presidente do estado de Israel e sua morte em 1955.
Do mesmo modo que a Folha Online, os conteúdos apresentados na seção especial
também aprofundaram os conceitos científicos, mas foram explicados de maneira muito
elucidativa e educativa.

2.3. BBC Brasil Online


A agência de notícias BBC Brasil também noticiou alguns eventos referentes ao
“Ano Mundial da Física”. Alguns deles já foram mencionados, como a cerimônia de
abertura do evento na Alemanha, pelo chanceler Gerhard Schroeder e o manuscrito
encontrado na Universidade de Leiden.
Uma notícia bem interessante foi a divulgação de uma pesquisa envolvendo as
comunicações por carta de Charles Darwin e Albert Einstein com seus respectivos públicos.
Cientistas das universidades de Notre Dame, nos Estados Unidos, e de Aveiro, em Portugal
concluíram que o padrão de suas correspondências seguem as mesmas leis matemáticas
obedecidas pelos usuários de e-mail. Darwin enviou aproximadamente 7.591 cartas e as
recebeu, mais ou menos, na mesma quantidade. Einstein enviou mais de 14.500 cartas e
recebeu mais de 16 mil. Os dois cientistas responderam às questões mais urgentes em dez
dias, mas outros temas menos relevantes tiveram que esperar por vários meses ou até anos.
Segundo os especialistas, a distribuição do tempo de espera por uma resposta segue
aproximadamente as mesmas leis obedecidas por usuários de e-mails atualmente, exceto
pelo fato de que as respostas mais rápidas fornecidas pelo computador permitem acesso
instantâneo a respostas. Os padrões de correspondências de Darwin e Einstein e dos e-mails
atuais seguem as mesmas leis de escalonamento.

102
Na BBC Brasil Online não houve seções especiais, como na Folha ou no Estadão.

2.4. Deutsche Welle


O site DW-World.de, versão em português, faz parte da tradicional emissora de rádio
e televisão alemã Deutsche Welle. Em seu portal eletrônico foi dedicada uma seção especial
intitulada: “2005 – Ano Einstein”, além das inserções referentes ao “Ano Internacional da
Física” no seu noticiário convencional.
Na seção especial, vários artigos trataram diversas faces do físico alemão, como um
texto sobre sua biografia. Sua relação com o judaísmo e a causa sionista. As questões
humanistas e suas concepções sobre religião. Há outro interessante artigo sobre as várias
homenagens que Einstein recebeu nas cidades alemãs por onde passou. Em algumas
cidades como Ülm (sua cidade natal), Potsdam e Berlim foram construídas obras
arquitetônicas e paisagens urbanistas, como a Einsteinturm54 e a reforma da casa de
veraneio de Einstein, em Caputh.
A viagem de Albert Einstein à América do Sul também foi detalhada em um artigo.
Novas maneiras de atrair os jovens para o estudo de física também foram abordadas. Na
solenidade de abertura do “Ano Mundial da Física”, em Londres, um rapper foi o
responsável pela apresentação dos palestrantes. A matéria apontou para a falta de
pesquisadores de física em centros de pesquisas do mundo e a baixa concorrência pelos
cursos de graduação em física nos vestibulares do Brasil.
Outra reportagem enfocou as inúmeras citações de Albert Einstein e seu emprego
em prédios públicos na Alemanha. Na Chancelaria Federal, em Berlim, foi colocada, a 36
metros do chão, uma frase em imensas letras vermelhas: “O Estado está para o povo e não é
o povo que está para o Estado”. Na embaixada suíça foi escolhida a frase: “A verdadeira
democracia não é uma insensatez vazia”.
O jornalista Tobias Jung escreveu um artigo sobre a lenda mitológica em torno da
figura de Albert Einstein, assim como suas teorias, seu pensamento político e desejos
pacifistas.
54
Torre Einstein.

103
Em uma curiosa matéria sobre uma campanha publicitária alemã para levantar a
autoestima da população (que anda meio baixa ultimamente) foram veiculadas imagens de
Einstein com a seguinte inscrição: “Du Bist Albert Einstein” (Você é Albert Einstein).

2.5. Conclusões sobre os veículos não-especializados


Apesar dos veículos não-especializados terem o público-alvo principal formado por
leigos, pôde-se perceber claramente que os tópicos científicos da física foram, em muitos
casos, aprofundados de maneira significativa. As explicações técnicas foram feitas com
metáforas, infográficos e esclarecimentos minuciosos, tendo por objetivo situar o leitor
não-especialista nos acontecimentos proporcionados por Albert Einstein. Os veículos não-
especializados cumpriram seu papel educativo, tão abordado no capítulo III deste trabalho.

3. Veículos especializados
3.1. Revista Ciência Hoje
Logo na capa da primeira edição do ano, a revista Ciência Hoje mostrou a
importância do “Ano Mundial da Física” para sua publicação. A imagem da capa exibe
Albert Einstein em sua cadeira lendo um livro. Foi criado um selo especial que
acompanhou todos os artigos da seção.
No primeiro artigo, Ildeu Castro Moreira explicou todos os trabalhos publicados no
“ano miraculoso”, em 1905, e os situou no contexto histórico e científico da época.
Demonstrou também as influências e fontes de inspiração do jovem Albert, na sua fase de
estudante. Finalizou contando sobre o pensamento social e político que acompanharam o
físico alemão em toda sua vida.
Na edição do mês de março, Antonio Fernando Ribeiro de Toledo Piza explanou
sobre o nascimento da física quântica e seus acontecimentos posteriores, como o princípio
da incerteza, o condensado Bose-Einstein, o paradoxo EPR e sobre a interpretação da
mecânica quântica para os fenômenos físicos.
Ronald Cintra Shellard versou, na edição de abril, sobre os raios cósmicos e como

104
as ideias de Einstein auxiliaram nas pesquisas sobre a área. O autor definiu o conceito de
raios cósmicos e o contextualizou com os trabalhos científicos do Annus Mirabilis. Ele
explicou sobre as novas tecnologias de detecção de partículas que provêm de lugares
aleatórios do Universo e previu o desafio futuro de compreender como eles são tão
energéticos e de precisar com exatidão sua origem.
Na mesma edição foi publicada a entrevista de um dos maiores estudiosos da vida e
da obra científica de Albert Einstein: John Stachel. Ele contou sobre os estudos biográficos
do famoso físico, dos mitos equivocados da sua imagem, da diferença entre sua teoria da
relatividade e dos estudos anteriores de Poincaré e Lorentz, seu debate com os físicos da
mecânica quântica e sobre sua figura lendária.
Na edição do mês de maio, Marcelo Knobel escreveu um artigo sobre as aplicações
do magnetismo. Ele contou os primórdios dos estudos envolvendo os fenômenos
magnéticos e seu avanço quando foi relacionado com a eletricidade. Explicou sobre o ciclo
de histerese do material, ou seja, sua capacidade de se magnetizar sob a influência de um
campo magnético e a permanência do estado de magnetização quando esse campo é
desligado. Ele mostrou também a evolução dos materiais utilizados nos ímãs, como o
alnico (constituídos de ferro, níquel e cobalto e dotados de pequenas quantidades de
alumínio, cobre e titânio), a liga de samário e cobalto e da descoberta recente de novos ímãs
de neodímio, ferro e boro. Ele falou sobre até onde a nanotecnologia pode auxiliar no
desenvolvimento de avanços industriais na área magnética, como o aumento na densidade
dos discos rígidos de computadores e na miniaturização dos aparelhos eletrônicos. Ele
concluiu mostrando as aplicações e promessas futuras da área.
O artigo de junho, de autoria de Thyrso Villela Neto, tratou de um dos temas mais
controversos da física e da astronomia: a cosmologia. Ele apresentou os dados históricos
dos primeiros modelos cosmológicos e a lei de Hubble, assim como as novas teorias
cosmológicas surgidas ao longo do século XX.
Na publicação do mês de julho, Henrique Toma e Koiti Araki versaram sobre a
nanociência e a nanotecnologia. Mostraram seus conceitos principais, sua evolução e sua
aplicabilidade nas outras áreas da ciência, como a biologia, a química e a computação. Essa

105
última ‘aguarda ansiosamente’ os desenvolvimentos dos computadores quânticos.
Sergio Machado Rezende demonstrou tópicos conceituais da física da matéria
condensada, na edição de agosto. O nascimento dos transistores e o grande avanço
tecnológico dos processadores de computador. Os grupos de pesquisas e laboratórios
espalhados pelo país e a grande concentração de doutores em física no ramo da matéria
condensada.
No artigo do mês de setembro, Paulo Murilo Castro de Oliveira escreveu sobre a
mecânica estatística, teoria do caos e complexidade. Ele demonstrou também o caráter
amplamente interdisciplinar do tema, ao englobar grandes áreas do conhecimento, como a
física, a biologia, a economia e a antropologia.
Em outubro foi a vez de Odair Dias Gonçalves e Ivan Pedro Salati de Almeida
contarem sobre os processos de fissão nuclear e seu grande aproveitamento na questão
energética. Eles conceituaram o fenômeno de reação em cadeia, princípio básico do
funcionamento das bombas nucleares, provocada pela transformação do núcleo de urânio
em elementos mais leves. Ele demonstrou a utilização do uso de radioisótopos na medicina,
na indústria e no meio ambiente. Explicou sobre o processo de geração de energia e
lembrou dos acidentes de Three Mile Island (Estados Unidos) e Chernobyl (Ucrânia) e as
medidas de segurança tomadas posteriormente.

3.2. Revista Comciência


Publicação mensal produzida pelo Laboratório de Estudos Avançados em
Jornalismo, da Universidade de Campinas. Seu site publicou, no mês de março, matérias,
reportagens e artigos sobre o “Ano Mundial da Física” e os aspectos biográficos de Albert
Einstein.
O físico Antônio Oliveira escreveu sobre os temas principais abordados por Albert
Einstein em 1905 e sua possível contribuição nos avanços tecnológicos dos dias atuais.
O historiador da ciência, Gildo Magalhães, falou sobre o ensino de história da
ciência nos cursos de graduação e o entendimento dos contextos sociais e econômicos no
processo de produção científica, mas sem desprezar o papel fundamental do indivíduo na

106
contribuição de cada cientista. O surgimento da teoria da relatividade de Einstein, com base
em autores como os físicos matemáticos Wilhelm Weber e Bernhard Riemann, o historiador
da ciência Ernst Mach e o filósofo Baruch Spinoza. Segundo Magalhães, os interesses
fundamentais de Einstein eram o de interpretar a física e procurar nela uma unidade
fundamental, não se limitando ao aspecto experimental e matemático usual. Assim surgiram
os artigos revolucionários de 1905, como as interpretações do efeito fotoelétrico, o
movimento browniano e a teoria da relatividade restrita. O autor expôs também sobre as
críticas e as propostas de revisões que as teorias do final do século XIX e início do século
XX sofreram por parte da comunidade científica.
Uma reportagem com o título “Viagem no tempo: teoricamente possível,
tecnicamente inviável” definiu os conceitos básicos da teoria da relatividade restrita e as
explicações envolvendo os fenômenos da dilatação temporal e as distorções no espaço-
tempo. A entrada do campo gravitacional como fator geométrico das dimensões espaciais e
temporais, na teoria da relatividade geral. Os estudos sobre “buracos de minhoca”, “buracos
negros” e sobre as concepções teóricas das “viagens no tempo”.
A matéria intitulada “Teoria unificadora permanece em aberto” mostrou as
principais teorias que Einstein desenvolveu, como os fenômenos quânticos da radiação, a
realidade dos átomos e moléculas a partir da análise do movimento browniano, as teorias da
relatividade restrita e geral e as consequências dos novos conceitos referentes à gravitação e
os novos modelos cosmológicos surgidos. Foi ressaltado que Einstein desenvolveu a teoria
da relatividade geral sem qualquer contrapartida empírica e que estas só aconteceram
posteriormente à conclusão da mesma. Recentemente pesquisadores da Universidade de
Stanford e da Nasa, construíram um experimento denominado Gravity Probe B para tentar
comprovar a teoria da relatividade geral. A matéria relembrou o nascimento da física
quântica com Einstein e sua postura extremamente crítica com os seus rumos. As
dificuldades em unificar as teorias quânticas com os estudos referentes ao campo contínuo,
como a gravitação e a teoria da relatividade geral.
Em outra abordagem do “Ano Mundial da Física”, mais voltada para os processos
biográficos do famoso físico alemão, a reportagem intitulada “Excentricidade e mitificação

107
marcam a vida de Albert Einstein” demonstrou os motivos da sua popularidade e seus
envolvimentos com as questões políticas e sociais de seu tempo. A matéria mostrou os
motivos da curiosa foto de Einstein em que está com a língua de fora, já com 72 anos.
A reportagem sobre a grande polêmica da bomba atômica também teve um
considerável espaço na revista Comciência. Tudo começou com as pesquisas sobre fissão
nuclear na década de 30. Os cientistas descobriram que bombardeando um nêutron em um
núcleo de urânio, esse fissionava em elementos mais leves e emanava grande quantidade de
energia. Mais tarde, o famoso físico alemão Werner Heisenberg percebeu que o
enriquecimento do urânio 235 seria, segundo ele, o único método de produzir explosivos
mais poderosos em inúmeras ordens de magnitude que os explosivos mais fortes
conhecidos.
Em 1939, com o avanço das pesquisas de reação em cadeia nos Estados Unidos, os
cientistas americanos temiam que o regime nazista produzisse armas de destruição em
massa. Sendo assim, alertaram os governantes americanos dessa possibilidade. Nesse
momento entra a figura de Albert Einstein, que participou ativamente desse alerta, já que
assinou um conjunto de cartas avisando o presidente Roosevelt dos perigos de uma
provável bomba nazista e pedindo uma rápida ação por parte do governo. Em 1942, os
Estados Unidos criaram o “Projeto Manhattan”, que foi um enorme esforço humano,
técnico e financeiro para desenvolver a bomba.
Após a rendição alemã, os mesmos cientistas que criaram e testaram a bomba
atômica com sucesso, se posicionaram contra o seu uso após saberem que não existia mais
o risco da bomba alemã. A reportagem passa a explicação dos motivos da não fabricação
das armas nucleares por parte dos alemães.
Vanderlei Bagnato, em seu artigo, contou as perspectivas da física atômica dentro do
“Ano Internacional da Física”. A história da mecânica quântica e sua relação com as teorias
de Einstein, como o estudo sobre o movimento browniano, a interação entre luz, matéria e
emissão estimulada de radiação, que mais tarde dariam origem ao laser. Suas pesquisas
conjuntas com o físico Nath Bose sobre o condensado de átomos quando colocado em
temperaturas próximas ao zero absoluto, e seu entendimento, proporcionaram

108
posteriormente a descoberta da supercondutividade e superfluidez, tão empregadas nas
pesquisas atuais. Ele concluiu prevendo que a compreensão dos fenômenos atomísticos
trará uma gama de evoluções em várias faces da ciência e que os estudos do mundo
microscópico são fundamentais para entender a característica do universo que nos rodeia.
As revistas especializadas cumpriram o que já era esperado. Seu aprofundado nível
oscilou entre o nível médio e acadêmico, mas foram um ótimo material de pesquisa e
análise dos assuntos referentes ao “Ano Mundial da Física” e Albert Einstein. Os temas
abrangeram diversos assuntos, não se limitando às produções científicas do famoso físico
alemão e buscaram contextualizar com os aspectos sócio-históricos e com as outras teorias
divergentes das ideias principais defendidas por Albert Einstein. As matérias e artigos
procuraram situar os novos acontecimentos da física e as novas tecnologias emergentes,
como propôs o físico Nelson Studart no capítulo I deste trabalho.

109
Considerações finais
1. Pesquisas futuras

Este trabalho não tem o objetivo de ser a versão final dos assuntos abordados ao
longo de suas páginas. Muito há o que ser pesquisado futuramente sobre o grande tema aqui
tratado ou a elaboração de investigações mais aprofundadas a partir dos tópicos citados.
Várias linhas de pesquisas em diversas grandes áreas do conhecimento podem prosseguir o
estudo, como veremos a seguir.
Pesquisadores em comunicação ou cientistas sociais podem verificar, no ano de
2015, se a procura pelos cursos de física aumentou, ou não, após a celebração do “Ano
Mundial da Física”, em 2005. O deficit de professores de física no ensino médio aumentou
ou diminuiu? O número de dissertações e teses defendidas na área de física evoluiu ou
regrediu?
Os psicólogos sociais e comunicólogos podem avaliar o impacto da mídia na
população com a exposição da física nos meios de comunicação e eventos. Analisar o
feedback e verificar se a física continuou com a imagem que tinha antes de 2005, ou não.
Os objetivos dos organizadores foram alcançados?
Em outra frente de pesquisa, pode haver um aprofundamento maior da história do
desenvolvimento científico antes de Albert Einstein. Desde as primeiras concepções
filosóficas do átomo, com os antigos gregos; passando pelos cientistas do renascimento,
como Giordano Bruno, Galileu Galilei, Johannes Kepler e Isaac Newton. O nascimento da
eletrodinâmica com James Clerk Maxwell, Michael Faraday e Heinrich Hertz. Os primeiros
conceitos da teoria da relatividade com Henri Poincaré e Hendrik Lorentz, até chegar em
Albert Einstein.
Sobre o famoso físico alemão, pode surgir uma pesquisa específica para ele. Ele
apenas compilou os dados de cientistas anteriores a ele, ou não, sobre a relatividade
restrita? Quais foram suas influências científicas? Albert Einstein pode ser considerado um
filósofo? Como ele desenvolveu suas teorias? Por que ele se tornou tão famoso? Quais são
os seus mitos mais equivocados construídos sobre ele, que o senso comum geralmente

110
apregoa? Quais são as posições políticas e sociais que Einstein possuía? Quais foram os
grandes legados dele aos desenvolvimentos científicos e tecnológicos dos dias atuais?
Quais suas concepções sobre os deveres da ciência e dos cientistas? Enfim, a vida de Albert
Einstein merece um estudo em separado, com vistas ao entendimento de grandes questões
que nos cercam até hoje.
Quanto aos tópicos abordados no capítulo III, outros assuntos merecem enormes
oportunidades de serem melhor estudados. Os pesquisadores em educação podem averiguar
se o jornalismo científico pode ser realmente um instrumento eficaz de ensino. Os
procedimentos de pesquisas podem englobar vários aspectos, como a relação dos textos de
divulgação científica com os alunos, a criação de textos como exercício da prática de
escrita e maior absorção dos temas técnicos, os cuidados que o professor deve tomar ao
lidar com textos de jornalismo científico e a inserção da física moderna no ensino médio
através dos meios de comunicação. Os psicólogos e pedagogos podem verificar a influência
dos meios midiáticos no desenvolvimento cognitivo das crianças e dos adolescentes.
As pesquisas sobre os objetivos e funções do jornalismo científico podem ir muito
mais além ao que foi apresentado no capítulo III deste trabalho. Qual o seu grande papel
social? Quais são os seus paradigmas e seus princípios deontológicos? Como tornar os
textos de jornalismo científico ferramentas para o ensino? Quais são os pressupostos
essenciais para escrever um bom artigo de divulgação científica?
A epistemologia e o desenvolvimento do conhecimento humano também podem ser
explorados por filósofos, psicólogos ou cientistas sociais. Eles devem buscar os caminhos
do conhecimento verdadeiro e globalizado e a interdisciplinaridade como princípio
essencial à educação do futuro.
Os investigadores em comunicação podem fazer uma análise quantitativa e
qualitativa referente ao “Ano Mundial da Física” nos meios midiáticos. Eles podem realizar
uma pesquisa comparativa entre os veículos especializados e os não-especializados, os
públicos-alvo de cada publicação e suas posturas editoriais.
Podem existir outras linhas de pesquisa referentes a esta monografia que não foram
citadas acima. Pela enorme abrangência e a grande amplitude disciplinar, alguns estudos

111
poderão surgir posteriormente. O que mais vale neste tópico é ressaltar o amplo caráter
heurístico deste trabalho.

2. Conclusões
Os veículos de grande circulação e de assuntos gerais, analisados no capítulo IV,
demonstraram que realmente é possível realizar certo aprofundamento nos assuntos
destinados à ciência e tecnologia e atingir o grande público. A criação de seções especiais
como ilustrações e infográficos também foram um excelente recurso na busca pela
divulgação do conhecimento.
Os meios de comunicação especializados em ciência cumpriram seu papel de situar
os leitores no contexto histórico de Albert Einstein, ao demonstrar os grandes avanços
científicos dos dias atuais e inter-relacionar a física com as demais áreas do conhecimento.
Os veículos especializados cumpriram o desejo do professor Nelson Studart no início deste
trabalho: “Não queremos apenas celebrar os papers de Einstein, queremos divulgar a física
em todos os meios, mostrar as nossas contribuições, tanto as antigas quanto as atuais, do dia
a dia e em todos os setores”.
Ainda não é possível saber se os objetivos e metas do “Ano Mundial da Física”
foram alcançados, mas pode-se adiantar que a enorme quantidade de eventos em várias
partes do mundo e suas repercussões na mídia, com certeza, cumprirão os objetivos dos
organizadores, parcialmente no mínimo.
A lembrança dos primeiros trabalhos de Albert Einstein, no Annus Mirabilis, foi
importantíssima para uma maior compreensão da história e do desenvolvimento científico
moderno. A pesquisa de sua vida também foi uma oportunidade para relembrarmos diversos
fatos marcantes acontecidos em todo o século XX. A grande ruptura paradigmática que
Albert Einstein ajudou a promover até hoje está influenciando a construção do pensamento
humano contemporâneo.
A grande importância dos meios midiáticos para a divulgação de eventos como o
“Ano Mundial da Física” ficou categoricamente comprovada. Isso talvez incentive a
criação de um “Ano Mundial da Biologia” ou “Ano Internacional da Química”. Os sucessos

112
do evento de 2005 podem ser repetidos em outras esferas científicas. O desenvolvimento
científico e tecnológico de toda uma sociedade precisa ser compreendido e celebrado por
toda ela, sem distinção de classe social ou educacional. A ciência necessita ser
desmistificada para cumprir seu papel social, e eventos como o “Ano Mundial da Física”,
podem ser uma solução inovadora nesse sentido.

113
Referências
BUENO, Wilson da Costa. Jornalismo Científico no Brasil: Uma relação de
dependência. Tese (Doutorado) – Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São
Paulo, São Paulo, 1985.
CALDAS, G. Comunicação, Educação e Cidadania: o papel do jornalismo científico. In:
GUIMARÃES, Eduardo (orgs). Produção e circulação do conhecimento. Campinas:
Ponte Editores, 2003.
CAPRA, Fritjof. O Tao da Física. São Paulo: Cultrix. 1983.
CARNEIRO, S. Einstein e a cosmologia. Ciência & Ambiente, n. 30, 2005.
DAVIDOVICH, Luiz. Einstein e a Mecânica Quântica. Ciência & Ambiente, n. 30, 2005.
DUKAS, H. e HOFFMAN, B. Einstein: o lado humano. Brasília: Editora da UnB, 1979.
EINSTEIN, Albert. A teoria da relatividade especial e geral. Rio de Janeiro: Contraponto,
1999.
________________. Como vejo o mundo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1981.
________________. Notas autobiográficas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.
FREIRE JR., O. Einstein e a Política. Ciência & Ambiente, n. 30, 2005.
GALISON, P. Os relógios de Einstein. Ciência & Ambiente, n. 30, 2005.
GASPAR, Alberto. Museus e centros de ciências: conceituação e proposta de um
referencial teórico. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Educação, Universidade de
São Paulo, São Paulo, 1993.
HAWKING, Stephen e PENROSE, Roger. A natureza do espaço e do tempo. Campinas:
Papirus. 1997.
KLEPPNER, D. Relendo Einstein sobre radiação. Revista Brasileira de Ensino de Física,
n. 1, v. 27, 2005.
LIMA, Lara Viviane Silva de. Jornalismo de precisão e jornalismo científico: estudo da
aplicabilidade. Dissertação (mestrado) – Programa de pós-graduação em Engenharia de
Produção, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2000.
MATTOZO, Vânia Aparecida. Mídia digital de informação científica e tecnológica sobre
energia. Dissertação (Mestrado) – Programa de pós-graduação em Engenharia de
Produção, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2002.
MELO, J. M. Impasses do Jornalismo Científico. Revista Comunicação e Sociedade, n. 7,
1982.
MENEZES, L. C. De corpo inteiro e viva, a física. Física na Escola, n. 1, v. 6, 2005.
MOLES, Abraham. Sociodinâmica da cultura. São Paulo: Perspectiva. 1974.

114
MOREIRA, I. 1905 - Um Ano Miraculoso. Revista Ciência Hoje, n. 212, v. 36, 2005.
MOREIRA, Ildeu Castro e VIDEIRA, Antonio Augusto. Einstein e o Brasil. Rio de
Janeiro: Editora da UFRJ, 1995.
MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Unesco/
Cortez, 2000.
NEWTON, Isaac. Principia: princípios matemáticos da filosofia natural. São Paulo:
Edusp 1990.
ORLANDI, Eni. Interpretação: autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico.
Campinas: Pontes, 2004.
PAIS, Abraham. Sutil é o Senhor: a ciência e a vida de Albert Einstein. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1995.
PATY, M. Campo contínuo e quanta: As duas abordagens teóricas da matéria segundo
Einstein. Ciência & Ambiente, n. 30, 2005.
PIZA, A. F. R. de Toledo. Mecânica quântica uma nova imagem do mundo. Revista
Ciência Hoje, n. 213, v. 36, 2005.
ROSENFELD, R. A Cosmologia. Física na Escola, n. 1, v. 6, 2005.
___________. O Movimento Browniano: a realidade física de átomos e moléculas. In:
Curso de Extensão: Física do Século XX. Bauru, 2005.
SAGAN, Carl. O mundo assombrado pelos demônios. São Paulo: Companhia das Letras,
2002.
SALINAS, S. Einstein, o Atomismo e a Teoria do Movimento Browniano. Física na
Escola, n. 1, v. 6, 2005.
SILVEIRA, Ada Cristina Machado da (org.). Divulgação científica e tecnologias de
informação e comunicação. Santa Maria: Editora FACOS/UFSM, 2004.
STACHEL, John. O Ano Miraculoso de Einstein. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 2002.
STUDART, N. Carta do Editor. Física na Escola, n. 1, v. 6, 2005.
STUDART, N. e MOREIRA, I. C. Einstein e a Divulgação Científica. Ciência &
Ambiente, n. 30, 2005.
VIDEIRA, A. L. L. A(s) Relatividade(s) de Einstein. Ciência & Ambiente, n. 30, 2005a.
VIDEIRA, A. A. P. “O radiante céu do Brasil”. Ciência & Ambiente, n. 30, 2005b.
VIGOTSKI, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e
aprendizagem. São Paulo: Ed. Cone. 1988.
WAGA, I. Cem anos de descobertas em cosmologia e novos desafios para o Século XXI.
Revista Brasileira de Ensino de Física, n. 1, v. 27, 2005.

115

View publication stats

Você também pode gostar