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Oficina VIII: Questões de autoria e

plágio
Brenna de Souza Torres
Resenha do filme Cópia Fiel
Cópia fiel, Copie conforme (título original), é um filme produzido por Abbas
Kiarostami, nascido em Teerã, no Irã, em 1940. Kiarostami, após concluir a
licenciatura em Belas-Artes pela Universidade de Teerã, resolveu dedicar-se à
cinematografia, primeiramente, como assistente de direção e depois, como diretor.
Nesse filme, ele participa das três áreas mais importantes para a criação
de um filme: direção, roteiro e fotografia. Além de dirigir o filme, o roteiro foi escrito
por Kiarostami com o auxílio de Carolina Eliacheff, uma escritora francesa que também teve uma
participação ativa na direção de fotografia junto a Luca
Bigazzi, cinematógrafo italiano. Os atores escolhidos para estrelarem o filme
foram William Shimell, interpretando James Miller e Juliette Binoche, interpretando
Elle. William Shimell é um barítono inglês, nascido em 1952, que teve uma carreira
internacional performando em óperas desde os anos 80 e ,mais recentemente,
atuando em filmes. A atriz Juliette Binoche é uma francesa, nascida em 1964. Com
a sua brilhante atuação no filme Cópia fiel, Binoche ganhou o prêmio de melhor atriz
no Festival de Cinema de Cannes, em 2010.
O filme começa com o lançamento do livro “Copie conforme” de James
Miller,um escritor inglês. Em seu livro, Miller defende que a cópia soma valor às obras
originais e que a cópia poderia ser tão boa quanto uma obra original. Elle é uma
mãe solteira, dona de uma galeria de arte, que defende fielmente que cópias não
teriam tanto valor quanto as obras originais, apesar de se opor às ideias de James,
Elle vai ao lançamento de seu livro e lá, ao encontrar com o tradutor do livro para o
Italiano, marca um encontro com o próprio autor,James Miller. O encontro começa na
galeria de arte da Elle, mas ela decide levar James à Lucignano, uma comuna na
região de Toscana,em que há um museu de artes e ela acha pertinente apresentar
para James uma pintura que foi considerada original por muito tempo, mas que
recentemente havia perdido o seu valor, segundo ela, por terem descoberto que a
pintura era uma cópia. Durante a viagem até o local, começa-se uma discussão em
relação ao tema abordado do livro, que chega ao ápice quando James, ao ser
apresentado à pintura “falsa”, não se sente tão empolgado com o que vê, já que para
ele aquilo seria algo comum. A partir dessa cena, um jogo de convencimento se inicia
e o casal embarca na atuação de uma vida a dois.
A princípio, ao lermos o título do filme, pensamos em algo mais teórico, um
roteiro mais técnico abordando conceitos e definições, mas ao assistirmos ao filme
nos deparamos com o oposto. Ao invés de o produtor, Kiarostami, apenas jogar
conceitos e impor pensamentos no filme, ele dá autonomia aos espectadores para
chegar às suas próprias conclusões e criar suas próprias opiniões, o diretor está mais interessado
em criar dúvidas, em criar questões que nos
levem a refletir sobre o assunto.
O filme é riquíssimo em detalhes e não transmite mensagens apenas pelo
diálogo, mas também pela forma, expressões, gestos, ações, por atos minimalistas
que nos prendem às cenas. Além disso, o jogo de câmera estabelece uma relação
entre o filme e o espectador. Na primeira cena, em que Elle chega no lançamento do
livro e James Miller está comentando sobre sua obra, o espectador, intuitivamente,
quer prestar atenção no que ele fala, porém há uma distração em torno da cena, Elle
brigando com o filho, falando com o tradutor, algo que acaba tirando o foco do
discurso, nos atrapalhando e nos colocando no lugar dos ouvintes que estão naquele
local e se sentem incomodados com toda a movimentação que Elle e seu filho fazem
durante a fala do escritor. Durante o filme, o diretor também não se preocupa em
retirar os ruídos das cenas, enquanto o casal discute no meio da multidão, por
exemplo, podemos ouvir os ruídos da multidão. Isso faz com que as cenas pareçam
mais reais.
De um modo geral, Abbas Kiarostami transforma um duelo intelectual em
uma espécie de jogo. O duelo intelectual tem início no começo do encontro, quando
conversam pela primeira vez e cada um defende suas opiniões, quando tentam
formular argumentos para convencer o outro da sua razão. Durante todo esse
momento inicial, há um clima de batalha nas cenas, uma tensão decorrente da
discordância entre o casal. A partir do momento em que Elle assume uma relação,
mesmo que sendo falsa, com James, e eles embarcam nessa atuação, o duelo se
transforma em uma espécie de jogo, em vez de um tentar convencer o outro, o foco
passa a ser quem cede primeiro.
Assim que a atuação começa, esse jogo também começa e se dá de uma
forma bem sutil. Por se tratar de um filme que aborda o valor do original e da cópia,
com esse jogo, podemos perceber referências ao tema o tempo todo. Quando James
e Elle conversam, ele conta como criou inspiração para escrever o livro, observando
uma mãe e um filho em volta de uma fonte admirando uma escultura. A imagem
criada por James repete-se no filme pelo próprio casal, uma cópia do que James
havia falado. Além disso, ainda há uma alusão ao tema central, que é repetida
insistentemente: Os casais que aparecem em cena o tempo todo, noivas em seu
vestido branco, tirando fotos, visitando a igreja, comemorando o casamento etc, uma
verdadeira cópia do casamento tradicional.
Por trás de todo esse tema, em segundo plano, ainda há a atração entre os
dois, os jogos de sedução. Durante o diálogo entre os dois, há momentos em que a
atriz tira o casaco deixando mais aparente o colo, que é uma parte do corpo atrativa.
Detalhes da alça do vestido caindo em algumas cenas. Na cena em que Elle se
levanta da mesa pra ir se arrumar, passar um batom da cor vermelha, cor que
representa a paixão, colocar brincos, podemos dizer que é uma cena de sedução.
Ela pode ter ido com a intenção de chamar a atenção do seu “marido”, de acordo
com a atuação, mas essa cena tinha algo mais provocador da parte da mulher. E
esse jogo chegou ao ápice nas cenas finais, em que eles entram em um quarto de
hotel e Elle se deita na cama. Todo o clima é criado por meio de recordações de uma
lua de mel. James demonstra resposta a esse jogo, ao passar pelo espelho, por
exemplo, e arrumar o cabelo, até mesmo o fato dele não ter ido embora, pois tinha
um compromisso marcado.
Quando o casal se coloca no jogo teatral, reproduzindo uma vida de casados,
eles estavam fazendo a cópia de um casamento verdadeiro e isso é tão bem
interpretado no filme que, em alguns momentos, ficamos na dúvida se o casal já se
conhecia antes, ou se eles realmente eram casados.
Podemos analisar o filme a partir do momento em que o casal começa sua
vida de “casados”, como um jogo de quem cederia primeiro, quem reconheceria
primeiro que aquela atuação não seria tão boa quanto a vida real entre casais. Com o
passar do filme, percebemos que a cópia é tão verdadeira e convincente quanto a
relação entre os verdadeiros casais. Esses indícios se dão com os comentários das
pessoas, ao confundirem Elle e James com um casal, ao não estranhamento das
pessoas quando eles se afirmam como casal. Elle começou esse jogo por ter a
opinião oposta a James. Ao começar a atuação ela queria provar para ele que a
cópia não teria tanto valor quanto a original, que em algum momento algo daria
errado, mas o envolvimento do casal na atuação foi tão grande que poderia ser
comparado ao nível de envolvimento em um casamento verdadeiro pela naturalidade
entre eles, a falta de acanhamento e os diálogos.
Por fim, na cena em que Elle e James chegam ao hotel, a atuação acaba
virando verdadeira. Estava chegando o fim da tarde, James tinha um horário para ir
embora, mas resolve ficar, transformando a cópia de uma relação a dois em algo
verdadeiro, pois eles passam da área da atuação para uma relação real. A última
cena marca essa transformação da cópia para o original, o real, que é reafirmado
com o som final do filme: sinos soando, que é uma marca tradicional no fim de um
casamento na igreja, mais uma vez relembrando a cópia do casamento.

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