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Atividade: fichamento nº 3
entre as camadas populares. Ambos os autores, assim, explicitam em seus trabalhos, esses fluxos
sociais e culturais da modinha, apesar de suas diferentes visões do processo.
Além disso, outra maneira de discutir esse intercâmbio cultural é pensar que tanto a elite
quanto o povo podem se apropriar de objetos, ideias e comportamentos da cultura um do outro,
ressignificando esses bens culturais e trazendo uma outra interpretação a eles, que façam mais
sentido dentro do seu próprio contexto. O autor Roger Chatier utiliza esse conceito, da
apropriação, como base de suas obras. É necessário, porém, tomar um certo cuidado para não
entender essas trocas de maneira equilibrada, pois ainda existe uma relação de imposição e
dominação cultural de um povo em relação a outro – principalmente, quando se trata de um caso
como o Brasil, onde se deu um longo processo de colonização. Stuart Hall define tal fluxo
desigual de apropriação como a dialética da luta cultural. Segundo ele, existe uma luta contínua
por parte da cultura dominante a fim de reorganizar a cultura popular e encaixá-la dentro de suas
próprias formas. Assim, a cultura dominante se deixa influenciar pela dominada, mas também a
influencia profundamente, ao impor essas adequações à sua maneira de se manifestar no mundo.
Nessa lógica, pode-se dizer que o lundu-canção – gênero híbrido entre a modinha e a
dança lundu – é produto desses cruzamentos culturais. Da mesma forma que a modinha, é,
também, da obra de Domingos Caldas Barbosa a mais antiga notícia do lundu-canção. Suas
composições nesse estilo eram marcadas por um caráter extremamente transgressivo para a
época, pois declaravam uma ruptura com antigas formas de canção, além de confrontar a própria
moral das elites. O que mais chocou os europeus da corte, a partir do contato com Domingos, foi
a malícia de seus versos, bem como a maneira descontraída e direta com que ele se dirigia às
mulheres. No entanto, nada disso o impediu de atingir um enorme sucesso por meio de sua
música na metrópole. Pode-se dizer, então, que suas canções experimentaram as possibilidades
subversivas do popular, atuando de maneira a se apropriar da cultura do outro, além de expandir
os limites da sua própria cultura.
aprofundamento a respeito da modinha deixa isso muito claro, sendo fácil perceber, ainda, o lugar
político e ideológico do qual cada autor escreve ao defender uma origem popular ou erudita do
gênero – em especial, Tinhorão e Kiefer. Assim, pensar que o consumo de uma música
considerada “erudita” e de “alto nível” é um privilégio de classes dominantes é tão problemático
quanto pensar o oposto – mesmo porque a própria definição de uma música de alto nível é algo
extremamente subjetivo e discutível. Desse modo, deve-se evitar toda e qualquer classificação
que generalize e banalize as inúmeras especificidades de um gênero musical, como a divisão
entre música erudita e popular. Repletas de juízos de valor, tais categorias apenas servem para
manter viva uma visão elitista da cultura, a qual visa à continuidade das hierarquias já existentes.