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A Arte de Envelhecer: Um
Estudo Exploratório Sobre
a História de Vida e o
Envelhecimento
The Art of Aging: An Exploratory
Study on Life History and Aging

El Arte de Envejecer:
Un Estudio Exploratorio Sobre la
Historia de Vida y el Envejecimiento

Priscilla Melo
Ribeiro de Lima
Universidade Federal de
Goiás, bolsista CAPES

Vera Lúcia Decnop Coelho


Universidade de Brasília
Artigo

O presente artigo é
derivado da dissertação
de mestrado da primeira
autora sob a orientação da
segunda e contou com o
apoio financeiro do CNPq.

PSICOLOGIA CIÊNCIA E PROFISSÃO, 2011, 31 (1), 4-19


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PSICOLOGIA:
CIÊNCIA E PROFISSÃO, Priscilla Melo Ribeiro de Lima & Vera Lúcia Decnop Coelho
2011, 31(1),4-19

Resumo: O presente estudo objetivou, a partir da teoria epigenética do ciclo de vida e da perspectiva do
desenvolvimento ao longo da vida, (1) conhecer aspectos do envelhecimento à luz da história de vida de
oito idosos, (2) investigar o modo como estratégias de seleção, otimização e compensação e envolvimento
vital se manifestam e (3) explorar contribuições da geratividade e da participação social no processo de
envelhecer de oito idosos. Os idosos participaram de entrevista semiestruturada. A análise dos dados revela
que fatores como participação social, geratividade e relacionamento com filhos e netos influenciam a
construção de um envelhecimento bem-sucedido. Por outro lado, fatores como estagnação e ausência de
envolvimento social parecem contribuir para o aparecimento de sintomas psicopatológicos.
Palavras-chave: Desenvolvimento psicossocial. Envolvimento social. Geratividade.Envelhecimento.

Abstract: The present study, based on the life cycle epigenetic model and lifespan psychology, was designed
to (1) understand aspects of the aging process from eight elders’ life stories, (2) investigate the way selective
optimization with compensation strategies and vital involvement aspects appear in old age as well as (3)
the contributions of generativity and social participation to the aging process. The subjects participated in a
semi-structured interview. A qualitative analysis of the data pointed out the influence of several factors on
the construction of a successful aging such as generativity, social participation and relationship with their
children and grandchildren. Factors such as stagnation and lack of social involvement seem to contribute
to the development of psychopathology symptoms.
Keywords: Psychosocial development. Social involvement. Generativity. Aging.

Resumen: El presente estudio objetivó, a partir de la teoría epigenética del ciclo de vida y de la perspectiva
del desarrollo a lo largo de la vida, (1) conocer aspectos del envejecimiento a la luz de la historia de vida de
ocho personas de edad, (2) investigar el modo como estrategias de selección, optimización y compensación e
involucración vital se manifiestan y (3) explotar contribuciones de la generatividad y de la participación social
en el proceso de envejecer de ocho personas de edad. Estas personas de edad participaron de entrevistas
semi-estructuradas. El análisis de los datos revela que factores como participación social, generatividad
y relacionamiento con hijos y nietos influencian la construcción de un envejecimiento bien llevado. Por
otro lado, factores como estancamiento y ausencia de envolvimiento social parecen contribuir para el
aparecimiento de síntomas psicopatológicos.
Palabras clave: Desarrollo psicosocial. Participación parental. Generatividad. Envejecimiento.

Pesquisas nos campos da Psicologia do social. Dentre as propostas teóricas da


desenvolvimento e da gerontologia têm Psicologia do desenvolvimento que estudam
demonstrado que o fenômeno do envelhe- esses fenômenos, destacaremos o modelo
cimento é complexo e envolve vários fatores epigenético do ciclo de vida e a perspectiva
que se entrelaçam no decorrer da vida (An do desenvolvimento ao longo da vida
& Cooney, 2006; Baltes & Baltes, 1990; (Lifespan Psychology).
Erikson, 1950/1963, 1982/1998, 1986; Neri
& Yassuda, 2004; Tornstam, 1999). Sobretudo O modelo epigenético
os estudos de Baltes e Baltes (1990) e Erikson do ciclo de vida
(1986, 1982/1998) demonstram que o
desenvolvimento humano é multidirecional, Esse modelo entende o desenvolvimento
multidimensional e dinâmico, balanceando humano a partir de fases sucessivas com
ganhos e perdas. Assim, não são apenas tarefas específicas a serem realizadas. De
os aspectos da atualidade do idoso, como acordo com Erikson (1982/1998), cada fase é
boa saúde física e mental, que caracterizam assinalada por um balanço dinâmico entre um
a velhice como bem-sucedida, pois esta componente sintônico – que busca o equilíbrio
necessita ser construída durante todo o ciclo interno – e um distônico – caracterizado
de vida. O estudo aqui apresentado buscou pela desarmonia. Denominou-se crise à
explorar a influência de alguns fatores na tensão dinâmica entre esses componentes,
construção do envelhecimento de oito cuja resolução objetiva a conquista de
idosos: estratégias de seleção, otimização e uma força psicossocial. A fim de superar
compensação, geratividade e envolvimento cada crise, o sujeito precisa experimentar

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a sintonia e a distonia. O êxito da sintonia ativas suas relações sociais. Erikson, Erikson, e
dependerá do contexto e das relações sociais Kivnick (1986) afirmam que essa capacidade
além da capacidade interna em vencer as de envolvimento habilita o indivíduo a
próprias limitações. As fases propostas por estabelecer relações recíprocas com o meio
Erikson (1950/1963; 1982/1998) e as forças social, e precisa ser sempre estimulada.
psicossociais a serem adquiridas são: (1 a)
confiança versus desconfiança: esperança; Na velhice, com o aumento da força do
(2 a ) autonomia versus vergonha: força elemento distônico desespero e a contínua
de vontade; (3 a) iniciativa versus culpa: sensação de estagnação, ou seja, de ausência
propósito; (4a) realização versus inferioridade: de propósito, a necessidade de vínculos
competência; (5a) identidade versus confusão sociais torna-se mais evidente. Compartilhar
de papéis: fidelidade; (6a) intimidade versus da vida dos filhos e netos, ensinar e deixar
isolamento: amor; (7a) geratividade versus algo para as próximas gerações e manter
estagnação: cuidado; (8a) integridade versus relações sociais pode gerar e aumentar o
desespero: sabedoria; (9a) ressurgimento das envolvimento vital. Muitas vezes fisicamente
crises anteriores: gerotranscendência. limitado e confrontado com a finitude da
vida, o idoso se encontra lutando para
Joan Erikson (1998) Durante todo o ciclo vital, o indivíduo é aceitar a inalterabilidade do passado e a
afirma que as desafiado a estabelecer novas relações consigo incognoscibilidade do futuro, reconhecer
virtudes adquiridas
e com o mundo e a superar limitações. Cada erros e omissões e balancear o consequente
ao longo do
desenvolvimento estágio envolve o indivíduo em um processo desespero com o senso de integridade que
são desafiadas de reintegração dos temas psicossociais é essencial para continuar vivendo (Erikson,
ao final da vida, Erikson, & Kivnick, 1986).
principalmente
experimentados em estágios precedentes a
na nona etapa, novos temas relacionados à idade (Erikson,
pelo declínio das Erikson, & Kivnick, 1986; Wadensten, 2006). Joan Erikson (1998) afirma que as virtudes
habilidades físicas
Os principais desafios associados à oitava e à adquiridas ao longo do desenvolvimento são
e mentais. desafiadas ao final da vida, principalmente
nona etapas são resolver conflitos do passado,
na nona etapa, pelo declínio das habilidades
investir nas relações sociais do presente e
físicas e mentais. O idoso que tiver superado
encarar a finitude da vida com serenidade.
anteriormente as crises e estiver inserido
Assim, a aquisição da virtude sabedoria
em um contexto psicossocial que o auxilie
corresponde à capacidade de equilibrar um
na superação das dificuldades dessa etapa
sentido de coerência e plenitude pessoal com
não permitirá que o desespero tome conta
o desespero perante a proximidade da morte,
de sua existência. Dessa forma, tenderá a
além da aceitação das falhas e omissões do
encarar a finitude da vida com serenidade
passado. Nessa perspectiva, o elemento
e sabedoria, experimentará envolvimento
sintônico do sétimo estágio, a geratividade, vital e, possivelmente, adquirirá a virtude
é um aliado na luta contra o desespero. da gerotranscendência (Yount, 2009). Esta
Esse fenômeno envolve a capacidade e a envolve transcender as limitações corporais,
necessidade produtiva inerente a todo ser experimentar nova compreensão do tempo,
humano, abrange a geração e o cuidado com de si mesmo e das relações sociais, sensação
os filhos e desafia o sujeito a se comprometer de conexão com as gerações anteriores e nova
com múltiplas esferas sociais, exercer compreensão da vida e da morte (Erikson,
função de liderança e orientação na relação 1998).
com filhos e netos, além de auxiliá-los a
desenvolver confiança, autonomia, iniciativa No outro extremo, temos o elemento
e identidade (Bradley & Marcia, 1998). É a distônico do desespero, que se contrapõe à
geratividade que suscita o envolvimento vital integridade. Esse elemento é experimentado
no idoso e o auxilia a sentir-se vivo e a manter quando o idoso, ao olhar sua trajetória,

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vislumbra sua existência através dos erros sociedade. Dessa forma, concebem-se três
cometidos. A vida, sob o olhar do desespero, influências que atuam sobre o sujeito durante
é vista como um conjunto de tarefas não seu ciclo vital: (1) influências normativas
terminadas, falhas e limitações. Yount ontogenéticas, ou seja, eventos que ocorrem
sustenta que o idoso em desespero “abriga de forma relativamente homogênea entre
ressentimentos acerca da brevidade da os sujeitos, p. ex., infância, adolescência,
vida e do fato de que não pode começar menopausa, etc; (2) influências normativas
tudo de novo” (2009, p.79). O sujeito, históricas, que envolvem acontecimentos
portanto, é incapaz de integrar experiências macroestruturais que originam mudanças
positivas e negativas, erros e acertos, em uma
biossociais, como é o caso de guerras, crises
perspectiva ampla da vida. Muitas vezes, esse
econômicas, novas tecnologias, etc., e (3)
idoso acaba por desenvolver psicopatologias
influências não normativas, que podem
como fuga ante o desgosto de viver (Birman,
ter caráter biológico ou societário e são
1995; Goldfarb, 2004).
imprevisíveis, como doença grave, luto,
ganhar na loteria, etc. Esses fatores estão
Cada crise surge em resposta a uma demanda
continuamente compelindo o indivíduo e
psíquica e a uma demanda psicossocial.
Assim, Erikson faz um entrelaçamento dos seu ambiente a se adaptarem. O sujeito é,
mundos interior e exterior do indivíduo então, constantemente requisitado a buscar
e de suas influências em cada etapa equilíbrio entre limitações e potencialidades.
do desenvolvimento. Nas duas últimas O êxito desse balanceamento é o que
etapas, o ambiente social se faz ainda mais caracterizaria o desenvolvimento bem-
preponderante no auxílio à superação da sucedido (Baltes, 1987).
distonia. Erikson ressalta que “a falta de um
ideal culturalmente viável da velhice faz com A partir dessa concepção e com o foco
que nossa civilização não tenha realmente na plasticidade comportamental, Baltes
onde ancorar um conceito de totalidade da e Baltes (1990) propuseram um modelo
vida” (1982/1998 p. 114). Na medida em adaptativo composto de estratégias de
que a sociedade não consegue valorizar o seleção, otimização e compensação (SOC).
idoso e proporcionar-lhe ambiente saudável Essas estratégias são utilizadas pelo indivíduo
e motivador, ter um senso de completude e com o objetivo de manejar satisfatoriamente
de totalidade da vida se torna mais difícil. mudanças biológicas, psicológicas e sociais e
propiciam oportunidades e limitações (Neri,
A perspectiva da Psicologia do desen- 2006a). Objetivando um desenvolvimento
volvimento ao longo da vida (Lifespan bem-sucedido, a seleção abrange a busca
Psychology), desenvolvida por Paul Baltes e por melhor funcionamento psíquico ante
colaboradores (1987), também concebe o novos desafios, como o aprendizado de novos
desenvolvimento humano como um processo
comportamentos, englobando a minimização
contínuo, com seus ganhos e perdas em todas
das perdas de determinadas capacidades.
as etapas, como veremos a seguir.
Isso ocorre na velhice, por exemplo, quando
o sujeito buscará amenizar perdas físicas e
Perspectiva do desenvolver novas habilidades. É uma tarefa
desenvolvimento ao longo da adaptativa que abrange demandas ambientais
vida (Lifespan Psychology) e motivações e capacidades individuais. A
otimização inclui a aquisição ou a articulação
Essa perspectiva compreende o de meios, internos ou externos, para viabilizar
desenvolvimento a partir do indivíduo e do a conquista dos alvos estabelecidos pela
que é comum aos membros de determinada seleção. O indivíduo poderá utilizar recursos

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educacionais e sociais visando a sua saúde às condições histórico-culturais, ao apoio


e a habilidades sociais, como a participação social e aos recursos da personalidade
em associação de idosos. A compensação presentes ao longo da vida. Se estiverem
compreende uma reação à perda de certas presentes, mesmo frente às perdas da velhice,
aptidões e envolve buscar novas maneiras o idoso poderá desfrutar de continuidade
de manter ou melhorar habilidades. Assim, em seu funcionamento psicossocial e de
ao enfrentar, por exemplo, dificuldades de bem-estar na velhice (Neri, 2006b). Assim,
memorização, o indivíduo pode utilizar-se o envelhecimento bem-sucedido pode
de bilhetes em lugares estratégicos para se ser apreendido como uma competência
lembrar. adaptativa de responder aos desafios
emergentes a partir do corpo, mente e
Os resultados esperados ao final da SOC são: ambiente com resiliência (Featherman, Smith,
a maximização de ganhos, a regulação e a & Peterson, 1990).
Uma habilidade
minimização de perdas e a manutenção de
resultante do uso
das estratégias funções adquiridas, incluindo a resiliência. Pontos e contrapontos
de SOC ao Essas estratégias são utilizadas a cada mudança
longo da vida
no curso de vida, em decorrência de Não obstante enfocarem aspectos diferentes
é a sabedoria.
Na psicologia influências normativas graduadas pela idade, do desenvolvimento humano, pois Erikson
do Lifespan, pela história ou não normativas. A forma (1950/1963; 1982/1998; 1986) investigou
essa virtude é
de utilizar esses instrumentos de adaptação o desenvolvimento do ego e Baltes (1987;
concebida como
o resultado da depende de fatores pessoais e sociais. 1990; 1997), os aspectos cognitivos e
articulação de Atividades educacionais e motivacionais adaptativos do indivíduo, tentaremos articular
componentes
promovidas pela comunidade, como as algumas questões que possam contribuir
cognitivos e
sociais que visam universidades abertas, contribuem para que para a compreensão da velhice. Ambas
a converter idosos possam lançar mão dessas estratégias as perspectivas enfocam a importância
situações
adaptativas de forma eficaz (Baltes & Baltes, do contexto social no enfrentamento das
negativas em
positivas; seria 1990). perdas e na busca por novas possibilidades
uma aptidão de superá-las. É inegável a influência do
pessoal e
Uma habilidade resultante do uso das ambiente na construção da identidade e na
social utilizada
para negociar estratégias de SOC ao longo da vida é a promoção de estratégias adaptativas que
mudanças e sabedoria. Na psicologia do Lifespan, essa auxiliem na superação de desafios inerentes
desafios da vida,
virtude é concebida como o resultado da à condição humana.
objetivando viver
uma boa vida articulação de componentes cognitivos
e buscar o bem e sociais que visam a converter situações Baltes e Baltes, (1990) ressaltam a importância
comum (Glück,
negativas em positivas; seria uma aptidão de um engajamento pessoal por estilo de vida
Bluck, Baron, &
McAdams, 2005). pessoal e social utilizada para negociar saudável a fim de reduzir a probabilidade
mudanças e desafios da vida, objetivando de condições patológicas na velhice. O
viver uma boa vida e buscar o bem comum fortalecimento das capacidades cognitivas
(Glück, Bluck, Baron, & McAdams, 2005). dos indivíduos através da educação, a
Apesar de estar comumente associada à motivação e as atividades relacionadas à
velhice, a sabedoria é uma capacidade saúde, além da formação e da manutenção
construída durante a vida. de redes sociais de apoio são importantes
para uma velhice bem-sucedida. Devido à
O processo de envelhecimento biológico diminuição de sua capacidade adaptativa,
pressupõe redução da plasticidade pessoas idosas terão especial necessidade de
comportamental e da resiliência biológica. apoios compensatórios; destarte, ambientes
Esses fatores estão intrinsecamente ligados favoráveis que tragam melhorias nas

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condições desenvolvimentais e que exijam o vislumbre de dar algo à posteridade e de


menos da capacidade cognitiva do idoso sentir-se integrante da dimensão histórica da
são imprescindíveis para uma boa velhice. A vida é uma forma de enfrentar o desespero
mudança no equilíbrio entre ganhos e perdas ante a finitude.
sugere levar-se em consideração a busca de
estratégias para facilitar o ajuste do idoso à Respeitando - se as peculiaridades de
realidade. A grande questão será auxiliar o cada teoria, ambas oferecem subsídios
velho na aquisição de estratégias adaptativas importantes para se avaliar a velhice. Dessa
que envolvam mudanças em aspirações e forma, utilizaram-se no presente estudo os
projetos e que se adequem às suas novas pressupostos do envolvimento vital e das
demandas. Dessa forma, a abordagem estratégias de SOC, além dos conceitos
baltesiana reflete uma visão voltada para a de sabedoria, objetivando: 1. conhecer
pragmática da vida atual do indivíduo. aspectos do processo de envelhecimento
à luz da história de vida de oito idosos; 2.
Erikson (1982/1998) enfatiza igualmente a investigar como se dá o envolvimento vital
importância de ambiente social favorável e o processo de SOC durante a trajetória
ao idoso e às suas necessidades. Enquanto de vida e no presente desses idosos; 3.
Baltes (1987; 1990; 1997) realça o auxílio investigar as contribuições da geratividade
ambiental na construção de estratégias e da participação social na construção do
para o enfrentamento de perdas, Erikson envelhecimento.
(1982/1998; 1986) possui um caráter mais
reflexivo acerca da vida e da velhice. Esse Método
autor destaca a necessidade de olhar para
dentro de si, das relações sociais e da Participantes
geratividade na construção do envolvimento
vital. Participaram do estudo oito idosos, sendo
cinco mulheres e três homens entre 68 e 81
A crise da sétima etapa – geratividade e anos. A amostra foi de conveniência (Moura
estagnação – permanece presente na velhice & Ferreira, 2005), formada por quatro
e exige do indivíduo a revisão de seus próprios pacientes do Centro de Medicina do Idoso
anos de responsabilidade ativa na criação dos (CMI) da Universidade de Brasília e por
filhos, além da retomada de experiências de quatro residentes em Anápolis. Na tentativa
cuidado em relação à geração de seus pais.
de conhecer a experiência de idosos que
Assim, a frustração e o arrependimento pelo
estavam inseridos em um contexto hospitalar,
abandono de projetos de estudos e carreira
optou-se por selecionar indivíduos pacientes
em função do casamento e dos filhos muitas
de um centro de assistência multidisciplinar a
vezes são substituídos pelo orgulho em ver as
idosos da rede pública de saúde. Objetivando
conquistas dos próprios filhos e netos. Alguns
conhecer aspectos da experiência de vida e
idosos conseguem, após a aposentadoria
de envelhecer em idosos da comunidade,
e a saída dos filhos de casa, reinvestir em
projetos devidamente adaptados à fase atual foram selecionados participantes moradores
da vida. O relacionamento com os netos de Anápolis e membros de uma igreja que
pode oferecer ao idoso nova oportunidade oferece atividades sociais. O objetivo do
de geratividade e cuidado e possibilidade de estudo não era comparar os grupos, mas
ser lembrado após a morte (Erikson Erikson, investigar os aspectos do envelhecimento de
& Kivnick, 1986). Tornstam (1999) afirma que cada sujeito.

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Instrumentos, procedimentos e com mais saúde. Pelo tipo de vida que levo,
análise de dados não fiz tanto estrago assim pra merecer esse
AVC e estar com essas limitações. Era muito
Foi realizada entrevista semiestruturada, com serelepe, não tomava remédio nenhum”. Esse
ênfase na história de vida do idoso, cujos fato parece trazer-lhe um questionamento
tópicos abordaram: eventos marcantes na sobre o presente e talvez uma confusão de
vida pregressa e atual, vida social, história identidade ao se deparar com uma nova
ocupacional, relações familiares e conquistas situação em seu ciclo vital. O presente parece
e perdas passadas e presentes. O projeto foi ainda indefinido, um interlúdio entre o que foi
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa e o que será: “Mas não me considerava velho
da Faculdade de Medicina da Universidade não, me achava garoto maduro, e, com o AVC,
de Brasília. As entrevistas foram gravadas com fiquei velho de uma noite... pro amanhã... me
a permissão dos participantes e analisadas a alertou que eu não tinha mais 17 anos”. Para
partir de uma análise qualitativa. O método quem sempre gozou de boa saúde, trabalhou
utilizado foi o estudo de caso devido às com disposição grande parte da vida, e se via
peculiaridades de cada história, e teve como um garotão parece estar sendo difícil
o intuito de preservar o caráter unitário reconhecer-se velho. Embora tenha parado
dos relatos (Minayo, 2007). A síntese das de trabalhar, Geraldo utiliza a internet para
histórias procurou identificar: geratividade e manter-se produtivo, escrever e publicar
estagnação, participação social, estratégias de artigos, entrar em contato com amigos e
SOC, integridade e desespero ante a finitude escritores. A produtividade intelectual e o
da vida e sabedoria. As informações pessoais trabalho são aspectos marcantes em sua vida.
e os nomes dos sujeitos foram alterados. Os
primeiros quatro sujeitos são pacientes do Uma das sequelas do AVC é a dificuldade
CMI, e os demais, moradores de Anápolis. em enxergar. Os olhos são seus instrumentos
de trabalho e se relacionam com atividades
Resultados que aprecia: ler e escrever. Diante disso, a
intervenção cirúrgica à qual foi submetido
Geraldo: a arte de vislumbrar um parece trazer-lhe alento e vislumbre de
futuro possível possibilidade de futuro e adiamento da morte:
“Tá parecendo agora que fiz operação de vista,
Geraldo tem 75 anos, é casado há 42 que posso ter tempo ainda pra terminar meu
anos e tem 3 filhas. Nasceu no interior de livro”. O assunto tratado pelo livro é segundo
Minas Gerais e mudou-se para a capital Geraldo, a relação do homem com a natureza
para terminar o ensino fundamental. Após e como será o futuro da humanidade e a vida
a conclusão do ensino médio, cursou das gerações futuras.
Sociologia. Aposentou-se como professor
universitário, mas continuou a trabalhar O tema família também é presente no
como sociólogo e articulista de alguns sites depoimento de Geraldo, que demonstra
de Sociologia e política quando sofreu um orgulho do seu casamento e das filhas, e de
acidente vascular cerebral (AVC) aos 73 ter lhes dado a melhor educação possível. Sua
anos. A partir de então, sua vida mudou. participação social atual envolve, sobretudo,
Apresenta dificuldades para caminhar, para eventos familiares. Relata que, quando
articular palavras e enxergar. Durante a jovem, era muito farrista, tocava violão e
entrevista, sua fala deixou transparecer certo fazia serenatas. Mas, atualmente, afirma não
desapontamento com a vida: “Eu podia estar ter hábito de sair.

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Luíza e a elaboração do luto pelos em definitivo para Brasília, continuou


sonhos não realizados trabalhando na igreja em que ele trabalhou
como pastor titular. Entretanto, com a
Luíza tem 74 anos, é casada há 51 anos e tem aposentadoria do esposo, Luíza precisou
4 filhos. Nasceu e viveu no Rio de Janeiro deixar funções de liderança no departamento
até os 8 anos, quando a família decidiu se de mulheres, e assumiu papel mais periférico
mudar para Goiás. Moraram durante algum na comunidade.
tempo no interior, mudando-se para a
capital quando Luíza tinha 10 anos, e lá fez Em alguns momentos durante seu
o ensino médio em contabilidade. Afirma depoimento, demonstrou insatisfação com
que precisava trabalhar durante o dia para suas atividades atuais, religiosas e domésticas.
conseguir pagar os estudos e ajudar em casa. Mas percebe aspectos positivos na velhice ao
Após o ensino médio, começou a trabalhar. compará-la com as fases anteriores da vida
Ao se casar, largou o emprego: “Naquela em que precisou mudar-se constantemente.
época, quando casava tinha que sair do A velhice, de acordo com seu relato, tem lhe
trabalho... foi bobagem minha. A gente quer proporcionado a oportunidade de se fixar em
viver ao lado do marido, arrumando casa um lugar e vivenciar situações novas, como
feito uma Amélia. Foi tudo errado”. Declara fazer amizades e ter tempo para estar com
que sempre abriu mão de sonhos em função o marido e a família: “Somos os mais idosos
do trabalho do marido e imputa a este a da igreja e respeitam muito a gente”, “Uma
responsabilidade pelo que não conquistou: idade de ficar mais junto com meu marido,
“Não fiz faculdade porque morava sempre com meus netos”.
em lugar ruim e pequeno por causa dele,
e não parava muito tempo, era três, cinco, Apesar de ter uma vida inteira dedicada
dois anos. Pra mim foi sofrido, eu achei um à igreja, o discurso religioso não é muito
pouco difícil”. presente na fala de Luíza, apenas em situações
vistas como imutáveis ou inexplicáveis, como
A falta de estudos parece ter impossibilitado a morte do irmão: “Muita tristeza, mas
a melhoria de vida ao se mudar para Brasília sabemos que foi a vontade de Deus”. Ao se
quando o marido deixou de trabalhar em deparar com situações difíceis, dispôs-se a
uma instituição, chamada genericamente de enfrentar e a superar dificuldades através do
missão, que treina voluntários para implantar trabalho.
igrejas. Ao relatar esse momento, mostra
contrariedade, mas, ao mesmo tempo, Joaquim: satisfação no cuidado com
demonstra orgulho pela disposição que as pessoas
teve para o trabalho. Como consequência,
buscou realização nas conquistas dos filhos: Joaquim tem 80 anos, é casado com Luíza e
“Agora joguei para os filhos aquela vontade tem 4 filhos. Durante a entrevista, demonstrou
(de cursar uma faculdade) que eu tinha”. bom humor e disposição em contar sua
De certa forma, Luíza encontra uma forma história. Nasceu no interior de Minas Gerais,
de compensar a perda de projetos e tenta sendo único filho do primeiro casamento da
usufruir da sensação de ter produzido algo mãe. Perdeu o pai aos 3 anos e, logo depois,
durante a vida. Embora tenha abandonado sua mãe casou-se novamente e teve 4 filhos.
projetos e mudado constantemente de Estudou com a ajuda financeira dos vizinhos,
cidade, envolveu-se nas comunidades e, posteriormente, cursou o seminário de
onde morou, fazendo amizades. Após a teologia com a ajuda de agência missionária
saída do marido do emprego e a mudança americana. Tornou-se missionário e, por 11

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anos, percorreu várias cidades instalando Helen e a dificuldade de superar a


igrejas: “Nessa missão foi difícil. A gente tá estagnação
no lugar tanto tempo, tem muito trabalho.
De repente, era outra mudança! Não era Durante toda a entrevista, Helen mostrou-se
fácil, mas o novo trabalho era bom, tinha apática, desinteressada e com dificuldades
novidade. Esses tempos foram bons, me em desenvolver o raciocínio que iniciava. A
comunicava bem com os americanos”. Após dificuldade em falar de si mesma, do que não
aposentar-se, atuou por algum tempo como estava satisfatório em sua vida, do significado
pastor em igreja brasileira, e atualmente das perdas sofridas e as formas como as
continua ajudando a comunidade através
enfrentou esteve presente durante toda a
de visitas e palestras. Esse senso de cuidado
entrevista. Os episódios que se seguem,
e envolvimento com as pessoas à sua volta é
portanto, não foram obtidos necessariamente
marcante em Joaquim: “Já tivemos na igreja
nessa ordem.
viúva que não tem nada. Eu fico com dó.
São eventos importantes que a gente tem
interesse de ajudar”. Em seu depoimento, Helen tem 81 anos, é viúva, nasceu no
fala com satisfação também acerca dos netos: interior de São Paulo e mora com a filha. É
“Quando chegam lá em casa, é uma confusão. a caçula de uma prole de 18 filhos. Cursou
Mas é bom, acham que sou o rei das piadas o ensino fundamental em colégio de freiras
(risos)”. junto com as irmãs; cursou magistério e
trabalhou como professora. Relata que pôde
A velhice é experimentada por Joaquim como se dedicar aos estudos quando criança, pois
tempo de estar quieto, de lembranças, de ter o pai sempre sustentou a família. Contou
o respeito das pessoas, mas também como que não se casou muito jovem, e teve 2
tempo de perdas: “(A saúde) Vai indo, pra 80 filhas. Lecionava na mesma escola onde o
anos até que tá bem”, “A idade foi chegando marido trabalhava como inspetor de alunos.
e a gente vai ficando mole, a memória já tá Por causa disso, precisou deixar as filhas com
cansada”, “A vantagem é muito respeito na empregada doméstica enquanto trabalhava.
igreja, o povo considera, respeita a idade”. A
proximidade da morte parece incomodá-lo,
Trabalhou por cerca de 30 anos. A partir
e reage ora com humor, ora lançando mão
de então, passou a preencher seu tempo
da religiosidade: “(na leitura e assinatura do
com crochê e outras atividades em casa.
Termo de Consentimento) Fazendo isso aqui,
Não soube dizer há quanto tempo é viúva
a gente fica mais novo? (risos)”, “(idade) 80,
ou quando foi morar com a filha. Na sua
passando um pouquinho, negociei com a
morte e ela me deu mais 20 (risos)”,“(sobre vida atual, transparece a monotonia, pois a
medo da morte) Não, tudo tá em Cristo, filha não a deixa fazer nada: “Eu faço mais
aparece mal, ninguém evita, mas se tá aqui é crochê. Assisto televisão. Minha filha não
na Terra tem que ser firme”. deixa eu fazer as coisas”. Assim, Helen ajuda
a empregada quando a filha sai para trabalhar,
Apesar de ter sido criado em família muito e, no restante do dia, ocupa o tempo com
pobre, orgulha-se das próprias realizações, crochê e televisão, mas não se recorda do
como ter casa própria, aposentadoria, ter nome das novelas que assiste. Helen não
criado os filhos e ter lhes dado estudo: “Sair participa de atividades sociais. É católica, vai à
de uma vida tão difícil e chegar a esse ponto missa aos domingos, mas não relata amizades
não foi fácil, o que consegui é meu esforço na comunidade da igreja. Mantém pouco
próprio e de muita luta que cheguei à posição contato com amigos de São Paulo e afirma
que estou, a vida não foi moleza”. não ter amigos onde mora.

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Em relação ao casamento, afirma que viveu queria que eu casasse cedo. Gostava que eu
bem com o marido. Com a viuvez, afirma fizesse tudo (se emociona). Era muito apegado
ter sentido falta do marido, mas não esboça comigo...”
qualquer sentimento. A dificuldade em se
lembrar de datas e idades específicas foi Apesar de não ter tido um emprego formal,
marcante no discurso de Helen. Durante todo a produtividade fez parte de sua vida. Como
o depoimento, ocorreram confusões de datas relatado acima, cuidou dos afazeres da casa
e dificuldade em se localizar temporalmente. quando criança. Depois de casada, envolveu-
Parece que os esquecimentos já fazem parte se no cuidado dos filhos e em fazer alimentos
de sua vida. Afirma que se esquece de fatos para vender. Na velhice, confecciona e vende
do dia a dia: “Agora, depois de velha, é que tô toalhas bordadas.
esquecida. A gente acostuma”. Em momento
algum demonstrou aborrecimento em não se Outro aspecto importante na vida atual
lembrar de datas, de fatos importantes e do de Joana é o contato com os filhos. Tem o
nome dos netos e bisnetos. Atribuiu à velhice costume de visitar e almoçar com as filhas
os problemas de memória. regularmente, e filhos e netos frequentam sua
casa: “A casa não é tão grande, mas tem quintal
Joana e a manutenção do senso de que os meninos gostam, família grande quando
cuidado e produtividade ajunta...” O envolvimento e a participação
na comunidade foram presentes na vida de
Joana tem 68 anos de idade, é casada e Joana. Desde o início do casamento, participa
tem 7 filhos. Nasceu em uma fazenda no frequente e ativamente das atividades de sua
interior de seu Estado, e é a quinta filha igreja. Conta que, mesmo a pé e morando
de uma prole de sete. Vem de uma família longe, ia aos cultos semanais e levava os
de pequenos agricultores e quase não teve filhos. Provavelmente, a ausência do marido
acesso à educação. Estudou apenas a cartilha, no dia a dia da dinâmica familiar tenha levado
aprendeu a ler e a escrever, mas precisou Joana a buscar, na religião, o conforto de que
abdicar da escola para ajudar o pai na colheita precisava para continuar lutando por dias
de café e nos afazeres da fazenda. Relata que melhores em sua vida. Atualmente, continua
abandonou os estudos contra a sua vontade. participando de todas as programações da
Não ter tido a oportunidade de estudar e não comunidade religiosa.
ter retornado aos estudos mais tarde ainda a
entristece: “Teve época que fiz matrícula pra Joana afirma que sua saúde está boa, mas
começar a estudar, mas não tinha como deixar apresentou dois episódios depressivos nos
meus filhos”. últimos três anos. Esses episódios foram,
segundo a idosa, decorrentes de situações
Sua infância foi preenchida pelo trabalho, familiares que envolviam problemas de saúde
ajuda na roça e papel de cuidadora. Quando das filhas. Embora reconheça a necessidade
a mãe morreu, Joana tinha 8 anos e assumiu de ajuda especializada, apegou-se às crenças
as tarefas da casa: “Assumi a casa, toda a religiosas, que parecem lhe proporcionar a
responsabilidade. Gostava de fazer as coisas, certeza de que tudo vai se resolver.
aprender, aprendia com minha avó”. A morte
da mãe é marcante para Joana, que se A velhice, para Joana, possui aspectos
emociona ao relatar os detalhes. Igualmente, positivos e negativos, e alegra-se por estar com
o relacionamento com o pai parece ter sido saúde, apesar de querer mais vigor. A crença
assinalado por cuidado mútuo: “Demorei religiosa parece auxiliá-la a encarar os desafios
mais a casar porque parecia que meu pai não e as debilidades da velhice: “Queria ter mais

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vigor, gente mais nova supera as coisas mais com poucos meses de vida. Este, apesar de
fácil. Muitas coisas se passaram e tem que casado, é o mais próximo a Ivonete, e do
chegar nessa idade, não sou desesperadora qual ela demonstra sentir muito orgulho.
com isso. Tenho alegria de ter a força que Esse filho ajuda o pai na oficina mecânica,
Deus tem me dado”. faz as refeições do dia na casa de Ivonete e
é quem lhe dá assistência quando adoece.
Ivonete: superação das perdas Há quase 20 anos esse filho foi preso. Narra
corporais com detalhes os episódios desse fato e afirma:
“Deus me ajudou muito, eu fui com Deus
Ivonete tem 68 anos, é casada e tem 4 filhos, e minha Bíblia e com o advogado, sempre
sendo um adotado. Afirma que sua mãe não falava: ‘o Senhor tá junto comigo’”. Como
gostava muito de crianças e a deu para a avó. consequência de todas as emoções que sofreu
Não conheceu o pai e nunca se interessou para libertá-lo da prisão, Ivonete desenvolveu
em conhecê-lo. Diz ser resignada com isso, angina. Foi internada várias vezes com
não lamentar e ser grata por ter sido criada anemia, necessitando de transfusão de
pela avó e ter tido a vida que teve. Conta que, sangue há pouco tempo. A religiosidade
durante a infância, precisou auxiliar a avó no é presente em seu depoimento. A crença
sustento da casa. Ajudava a vender hortaliças religiosa lhe proporciona participação em
que cultivavam em casa e doces que a avó uma comunidade, além de esperança de que
fazia. “Tudo que sei, agradeço minha avó, ela os problemas se resolverão.
era lavadeira de roupa, estudei em escolas
públicas e nunca reclamei de nada. Vivi muito Isaura e o envolvimento social
bem, minha infância foi muito boa, minha
educação também”. Fez o curso de técnico Isaura tem 70 anos, é a quinta dentre 6 filhos,
em enfermagem e trabalhou em hospitais viúva e mãe de um filho adotivo. Nasceu
locais. Devido à escassez de mão de obra na Bahia, e mudou-se para Goiás quando
especializada na época, assumiu cargos de tinha um ano. Sua infância foi marcada pela
chefia no hospital psiquiátrico e coordenou pobreza e pela constante luta dos pais e dos
a maternidade até se aposentar após 30 de irmãos pelo sustento. Com muito esforço,
trabalho. Ainda mantém relacionamento seu pai conseguiu construir uma casa, mas
de amizade com pessoas que conheceu morreu logo depois: “Eu devia tá com uns
na época em que trabalhava no hospital. 12, por aí, foi logo que construiu a casa. Não
Atualmente, sua participação social envolve sei bem o que aconteceu”. Suas lembranças
atividades de sua comunidade religiosa e do da infância são poucas, mas parece não se
prédio onde reside. Demonstra satisfação em incomodar com isso. A vivência da pobreza,
falar sobre essas atividades. as dificuldades e as perdas enfrentadas
parecem estar bloqueadas ou ser evitadas.
No relacionamento com o marido, com quem Não se lembra de quando se mudaram de
é casada há 50 anos, parece haver diálogo e cidade, não soube falar como ficou a vida
respeito mútuo. Seu marido enfrentou câncer após a morte do pai e nem como foi a morte
de próstata há algum tempo, e, devido ao da mãe quando já estava na maturidade.
tratamento e à cirurgia, tornou-se impotente.
Demonstra ter orgulho do esposo: “Criou Ao relatar a morte do marido, há 11 anos, após
os filhos muito bem criados, eu sou muito complicações do tabagismo e alcoolismo,
feliz. Graças a Deus”. Seu relacionamento emocionou-se e chorou. Embora afirme que
com os filhos tem se caracterizado por seu casamento era normal, foi marcado por
proximidade maior com o caçula, adotado brigas, pelo alcoolismo e pela agressividade

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física e verbal do marido. Após a sua morte, A aposentadoria é considerada ruim, pois não
o envolvimento e a participação social de encontrou outra ocupação que o satisfizesse:
Isaura aumentaram e parecem trazer-lhe o “No começo foi bom, mas não foi bom porque
sentido de pertencimento e a possibilidade a gente fica quieto, não tem o que fazer, sente
de cuidar das pessoas à sua volta. Faz parte falta daquilo que a gente ficava trabalhando e
de uma comunidade religiosa há muitos anos hoje não tem mais que ficar lutando”. Diante
da falta de projetos, Lúcio busca consolo na
e participa ativamente das atividades. Afirma
religião: “Acabou os afazeres, então tem uma
que gosta de “visitar porque as pessoas tá
esperança, a vida eterna”. Outro agravante
precisando de ser ouvida”. A satisfação em
parece ser a falta de participação social.
fazer algo por alguém pode ser percebida em
Atualmente, apenas freqüenta as reuniões de
seu relato, o que demonstra a permanência sua igreja sem envolver-se ativamente.
do senso de cuidado na velhice.
Discussão
A religiosidade é presente ao relatar situações
difíceis: “Quando meu marido morreu, eu já Tendo como base as teorias propostas e as
tava preparada, Deus tinha me avisado”,“Tem histórias dos idosos, articularemos algumas
hora que passa por isso porque Deus questões que possam contribuir para a
permitiu”. As crenças religiosas parecem compreensão do envelhecimento. Dentre os
trazer explicação e aceitação para a morte. participantes, percebeu-se que alguns estão
Alega receber carinho e respeito das pessoas vivenciando uma velhice bem-sucedida.
da igreja e sentir-se amada, mas diz não Outros, porém, não conseguiram superar
perdas e manter o senso de engajamento e
ter amizades. Mora sozinha e possui boas
luta por um futuro possível.
expectativas futuras: “Vou longe, se Deus
quiser. Peço a Ele qualidade de vida”.
Um dos elementos sintônicos que parecem
contribuir para que Geraldo, Joaquim e
Lúcio e a falta de objetivos pelos
Joana experimentem um envelhecimento
quais lutar
com satisfação é a geratividade. Como
consequência do desenvolvimento e do
Lúcio tem 75 anos de idade, é casado e tem
fortalecimento desse senso, surge a força
3 filhos. Nasceu e morou na zona rural até
psicossocial do cuidado que contribui para o
a idade adulta. Trabalhou com o trator de
envolvimento vital. Esses três idosos cuidam
seu pai onde moravam e na construção de
e se preocupam com as pessoas próximas a
igreja na região. Sua infância foi assinalada
eles e com o futuro. Dentre esses três idosos,
pelo trabalho, por problemas de alcoolismo,
Geraldo parece exemplificar uma velhice bem
pela violência do pai e por nenhum acesso
adaptada. Enfrentar um trauma aos 73 anos
à educação. A morte da mãe foi um dos
e manter certo grau de satisfação consigo
eventos marcantes na vida de Lúcio: “Ela
mesmo e com a vida tem sido uma dentre suas
e minha esposa era muito ligada, morava
muitas conquistas. A psicologia do Lifespan
perto, e ficou muito abatida, e eu também
discorre sobre três tipos de envelhecimento:
fiquei muito triste, foi uma das coisas mais
patológico, normal e ótimo. Este último é
difícil, aí resolvi mudar pra cá”. Ao chegar caracterizado, principalmente, pela ausência
em Anápolis, trabalhou no beneficiamento de patologias físicas e psíquicas (Baltes &
de arroz e assumiu funções de pastor em Baltes, 1990). No entanto, a história de
igreja local. Manteve essa jornada dupla por Geraldo demonstra a possibilidade de usufruir
aproximadamente 40 anos. de envelhecimento bem-sucedido mesmo na

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presença de sintomas patológicos. Enfrentar além das perdas sucessivas decorrentes da


traumas e manter a geratividade são desafios velhice, o idoso precisa enfrentar preconceitos
que muitos idosos encaram e conseguem, sociais e lutar para conseguir um envolvimento
a partir deles, usar estratégias adaptativas e com a vida.
projetar o futuro.
Na velhice, a geratividade necessita ir além
Desenvolver atividades prazerosas que gerem do simples cuidado e preocupação com os
senso de produtividade e criatividade, seja outros. A grand-generativity (Erikson, Erikson,
de conhecimento, seja de artesanato ou de & Kivnick, 1986) envolve olhar para fora de si
cuidado com as pessoas, traz a esses velhos e envolver pessoas à sua volta, mas também
a oportunidade de manterem vínculos de olhar para dentro e preocupar-se consigo
amizade e de se sentirem realmente vivos. Na mesmo. Adicionalmente, engloba a utilização
velhice, atividades produtivas precisam ser de recursos para promover a própria saúde,
realizadas como estratégia para a conquista mental e física, e culmina no desenvolvimento
e a manutenção de ganhos. Manter o idoso da sabedoria (Baltes & Staudinger, 2000; Bluck
ocupado difere de envolvê-lo em atividades & Glück, 2004). Esse elemento está presente
que de fato lhe proporcionem satisfação. em Geraldo, Joaquim, Joana, Isaura e Ivonete,
Luíza, esposa de Joaquim, afirmou que e manifesta-se na preocupação em relação
“se tirar isso (trabalho) de uma vez, ele aos filhos, netos e gerações posteriores.
morre”. A geratividade proporciona a re- Esses sujeitos procuram maximizar ganhos
experimentação de outras forças psicossociais e minimizar perdas, mudam rotinas para
como competência, iniciativa e esperança, melhorar a saúde e buscam acompanhamento
que contribuem para o fortalecimento médico e formas de superar debilidades físicas.
do envolvimento vital na velhice e para De acordo com Messy (1999), a velhice não
o desenvolvimento da sabedoria e da é um acesso mandatório para a morte, assim
gerotranscendência. Pesquisa recente como demência não é, necessariamente,
demonstra que a geratividade contribui para consequência de uma idade avançada.
que o sujeito vivencie bem-estar psicológico,
satisfação e qualidade de vida na maturidade Lúcio e Helen, entretanto, demonstram não
e na velhice (An & Cooney, 2006). terem podido utilizar, eficientemente, estratégias
para selecionar novos objetivos e otimizar
A ausência da geratividade em Helen e Lúcio recursos disponíveis na superação de perdas.
após a aposentadoria parece ter fortalecido A carência de flexibilidade adaptativa ante
a estagnação. A aposentadoria não é apenas mudanças desenvolvimentais e circunstanciais
um evento subjetivo, é, sobretudo, um parece contribuir para que a viuvez e a
evento social com implicações psicológicas, aposentadoria ocasionem estagnação e
econômicas e culturais. Muitas vezes desinvestimento afetivo do mundo exterior
contrariando a vontade e a demanda do e de si mesmos. Birman (1995) afirma que
sujeito, essa conjuntura de fatores o compele sintomas depressivos e demenciais podem
a aposentar-se. Infelizmente, nossa sociedade surgir como manifestações de má adaptação à
ocidental acaba por “inscrever a pessoa numa vida e à velhice. Para Khoury e Günther (2006),
perda assimilada ao envelhecimento, dando- mudanças psicossociais ocorridas a partir da
lhe uma condição, a aposentadoria” (Messy, meia idade podem acarretar sentimentos
1999, p. 21). As representações sociais negativos e crenças disfuncionais sobre si mesmo
inerentes a essa condição trazem, muitas e sobre o mundo. Percebe-se que Joaquim se
vezes, o estereótipo de estagnação e doença sente inútil e sem sonhos pelos quais lutar, e
à condição de idoso e aposentado. Assim, Helen nem ao menos fala sobre o futuro.

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Os demais sujeitos, Geraldo, Luiza, Joaquim, social e não mais se projeta para o futuro,
Joana, Ivonete e Isaura, indicam ter utilizado, adoece.
no decorrer da vida, estratégias de seleção,
otimização e compensação, e, portanto, Outro fator observado na narrativa dos
parecem ter desenvolvido a sabedoria. participantes foi o relato sobre os filhos.
Conforme Baltes e Staudinger (2004), a As participantes Luíza, Joana e Ivonete
sabedoria abrange formas de adaptação mencionaram o cuidado com os filhos e os
que propiciam maximização de ganhos sacrifícios feitos para criá-los. Com exceção
e minimização de perdas. Assim, Ivonete de Ivonete, as outras idosas não seguiram
investe em relacionamentos e não permite carreira profissional e desenvolveram
que limitações físicas a impeçam de realizar a geratividade e o cuidado a partir da
atividades que a contentem. Luíza, ainda maternidade. Ivonete fortaleceu esses
diante de queixas do passado, encontra elementos junto à profissão. Helen, apesar
satisfação nos filhos e nas atividades religiosas. de duas filhas e da carreira, não fala sobre
Joana mantém seu envolvimento com a vida esse tema. Entre os homens, apenas Geraldo
através de pequenos projetos como bordar falou sobre as filhas. A criação e o cuidado
toalhas. Joaquim conservou a produtividade com os filhos parecem receber mais atenção
e o cuidado através da manutenção de de mulheres (Santos & Diniz, 2006). Cabe
atividades da sua profissão e do contato com ressaltar que os participantes da pesquisa
os netos. Isaura tenta superar um casamento nasceram na primeira metade do século
conturbado através da participação social. passado, quando o papel de cuidador era
Geraldo sonha e se empenha para publicar quase exclusivo da mulher. Percebe-se
seu livro e construir sites na internet. que, com a mudança socio-histórica que
vem ocorrendo, esse papel tende a estar
A religiosidade esteve presente nos relatos mais distribuído entre homens e mulheres.
de Luíza, Joaquim, Joana, Ivonete, Isaura e Certamente, os velhos das próximas gerações
Lúcio, ou seja, tanto em participantes do CMI terão vivenciado o cuidado com os filhos
como da instituição religiosa de Anápolis. A de forma diferente. Investigar os papéis
experiência religiosa parece ser elemento familiares e sociais através do viés do gênero
comum na velhice. Pesquisas realizadas por é essencial para melhor compreensão
Erikson, Erikson e Kivnick (1986), Monteiro da influência da dinâmica familiar no
(2004) e Yount (2009) constataram que, no envelhecimento.
fim da vida, a religião pode oferecer consolo
e sensação de continuidade existencial. Assim, a partir do que foi discutido, sugestões
Além disso, pode ser um recurso facilitador de intervenções psicossociais podem ser
na compreensão e na aceitação de perdas. feitas. A assistência a idosos, grupal ou
Apesar de esse tema não ser tratado no individual, parece trazer resultados muito
referencial teórico deste estudo, parece ser positivos. Pesquisas realizadas no Centro de
um aspecto presente na vida do idoso e digno Medicina do Idoso do Hospital Universitário
de pesquisa posterior. da Universidade de Brasília demonstram a
eficácia do suporte social e afetivo oferecido
Esses idosos nos ensinam que a vida vai além através da convivência de idosos em trabalhos
dos traumas e das dificuldades e precisa ser grupais. De igual modo, a psicoterapia de
vivida com intensidade e com a busca por indivíduos na maturidade pode resultar na
relacionamentos. Py (2004) afirma que o superação de sintomas depressivos e na
percurso existencial necessita ser um projeto aceitação dos efeitos do tempo sobre o corpo
individual que se articula com outros projetos e o psiquismo (Campos & Coelho, 2010).
da coletividade. Viver requer compromisso Auxiliar idosos-jovens a manter a geratividade
e envolvimento com o contexto relacional. e a participação social pode contribuir para o
Quando o sujeito se aliena de seu contexto bem-estar na velhice (An & Cooney, 2006).

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Considerações finais abordagem do paciente dementado ou


dotado de certo déficit cognitivo. Como este
Estudar o desenvolvimento humano, assim já apresenta dificuldades em falar de si, além
como o de outras esferas da existência, do aumento da dificuldade em concentrar
demanda pensamento holístico. A complexi- a atenção, o pesquisador precisa redobrar
dade da velhice precisa ser avaliada a partir seu cuidado durante a entrevista e buscar
da articulação de fatores além do psicológico, formas alternativas de obter as informações
como os aspectos sociais, históricos e desejadas. Perguntar de forma diferente
antropológicos; destarte, este artigo é e talvez trazer um componente lúdico ao
um recorte sobre a velhice, e, portanto, contato pode auxiliar tanto na obtenção
demonstrou certas limitações. Devido a de informações quanto no tratamento
dificuldades encontradas para agendar a psicoterapêutico.
entrevista com os idosos, haja vista que
todos tinham dificuldades em se locomover Todavia, observou-se que, mesmo diante
até o local do encontro, optou-se por de traumas e dificuldades no transcorrer da
realizar apenas uma entrevista. Entretanto, vida, esta pode ser vivida com intensidade
apenas um encontro se mostrou insuficiente e com a presença de relações sociais
para promover o acesso mais detalhado às saudáveis. Manter essas conquistas e buscar
informações das histórias de cada idoso. outras colaboram com a arte de viver e
Sugere-se, para estudos posteriores, que sejam envelhecer. A construção de uma boa
realizados mais encontros para a entrevista e velhice necessita de ambiente acolhedor
que seja repensada a forma de abordagem que auxilie o idoso no processo de revisão
desses pacientes. Intervalos no meio da sessão de vida, no enfrentamento de limitações e
psicoterapêutica podem ser um recurso que na elaboração de projetos. De igual modo,
auxilie o idoso a lidar melhor com seu tempo aproveitar oportunidades de crescimento e
e com as demandas internas. Normalmente, manter vínculos sociais contribuem para um
o velho demonstra dificuldade maior em envelhecimento bem-sucedido (Neri, 2005).
focalizar a atenção e a concentração, e possui A arte de envelhecer é, antes de tudo, uma
a tendência de cansar-se mais facilmente. arte de viver e de buscar satisfação em todas
São alterações desenvolvimentais que as etapas e contextos. Envelhecemos como
devem ser levadas em consideração, seja vivemos, afirma Messy (1999), nem mais,
na clínica, seja no âmbito da pesquisa. nem menos.
Outro fator que precisa ser ressaltado é a

Priscilla Melo Ribeiro de Lima


Mestre e doutoranda em Psicologia Clínica e Cultura Universidade de Brasília, Brasilia, DF – Brasil.
Professora assistente da Universidade Federal de Goiás, bolsista CAPES
E-mail: primlima@gmail.com

Vera Lúcia Decnop Coelho


Doutora em Psicologia pela Case Western Reserve University, Estados Unidos - EUA.
Pesquisadora associada da Universidade de Brasília
E-mail: vldc@unb.br

Endereço para envio de correspondência:


Rua 235, s/n, Setor Universitário, Goiânia – GO – Brasil. CEP 74605-050

Recebido 12/3/2010, 1ª Reformulação 31/5/2010, Aprovado 13/9/2010.

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A Arte de Envelhecer: Um Estudo Exploratório Sobre a História de Vida e o Envelhecimento

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