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na Aprendizagem da
Matemática
Prof ª. Dr ª. Nelma Sgarbosa Roman de Araujo
Prof a. Me. Lussuede Luciana de Sousa Ferro
2021 by Editora Edufatecie
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Profª. Me. Lussuede Luciana de Sousa Ferro
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APRESENTAÇÃO DO MATERIAL
A matemática é considerada por muitos como “um bicho de sete-cabeças”. Será mesmo? É
isso que, juntos, iremos descobrir e aprender em nossos estudos, pois ensinar matemática
é uma tarefa que se tornou desafiadora para muitos professores do ensino básico.
Pensando nisso, organizamos esse material com uma proposta de estudo que considera
a linguagem matemática como um bem cultural que traz em si consubstanciada, toda a
síntese humana produzida e materializada nos instrumentos e signos.
Nessa perspectiva, consideramos que a apropriação desses instrumentos e signos pre-
sentes nos conhecimentos matemáticos, potencializam as formas mais avançadas do
pensamento humano nas suas relações com os diferentes fenômenos no mundo. Dessa
forma, defendemos a ideia da matemática como um instrumento do pensamento.
A aprendizagem dos conhecimentos matemáticos ocorre em diferentes situações do coti-
diano, pois é uma linguagem inerente à vida humana. No entanto, somente em situações de
ensino sistematicamente organizadas, é possível desenvolver as formas mais complexas
do pensamento, logo, na escola.
Porém, algumas crianças, adolescentes e adultos apresentam dificuldades para se apro-
priarem dos conceitos matemáticos, representadas em alguns casos por transtornos ou
distúrbios de aprendizagem, entre eles, a discalculia e a acalculia. Alunos com dificuldades
de aprendizagem não aprendem matemática pelos caminhos tradicionais que comumente
se ensina nas escolas, o que demanda reorganização da prática pedagógica.
Assim, objetivamos com esse material de estudo, como educadoras que somos, oferecer
aos psicopedagogos e professores, apoio teórico metodológico para um ensino de mate-
mática que considere o aluno em suas múltiplas determinações, isto é, enquanto um ser
físico, biológico, psíquico e social.
Para isso, na Unidade I discutiremos o processo histórico de produção da matemática para
compreender como ocorre a apropriação dessa linguagem como ferramenta do pensamento.
Na sequência, refletiremos na Unidade II a respeito das dificuldades de aprendizagem e
suas concepções; a importância de identificar as causas e as consequências que essas
dificuldades de aprendizagem podem gerar na vida das crianças, adolescentes e adultos,
em especial os transtornos ou distúrbios denominados de discalculia e acalculia.
Na Unidade III trataremos das definições de discalculia e acalculia, suas especificidades,
sinais e sintomas que podem acometer as pessoas com dificuldades para aprender mate-
mática. A partir dessa compreensão, teceremos considerações acerca das intervenções
psicopedagógicas e desenvolvimento dos discalcúlicos e acalcúlicos.
Nesse percurso, na Unidade IV apontaremos encaminhamentos de investigação que con-
tribuem na identificação e compreensão dos casos de alunos que têm dificuldades com a
matemática no ambiente escolar; e orientaremos intervenções pedagógicas nesse ambiente
e no convívio familiar.
Também, nessa unidade, desvelaremos o jogo e as ferramentas tecnológicas, como uma
das possibilidades de organização do trabalho educativo em sala de aula e recurso didático
que contribui no processo de ensino e aprendizagem dos alunos com dificuldades para
aprender matemática.
Esperamos que as discussões, encaminhamentos e sugestões, presentes neste material
de estudo, contribuam efetivamente no processo de formação profissional, que visa o de-
senvolvimento das potencialidades máximas de todos os alunos.
Desejamos bons estudos e excelentes sínteses!
UNIDADE I....................................................................................................... 4
Contextualizando a Matemática
UNIDADE II.................................................................................................... 28
Dificuldades de Aprendizagem da Matemática
UNIDADE III................................................................................................... 51
Acalculia e Discalculia
UNIDADE IV................................................................................................... 72
Intervenções Psicopedagógicas
UNIDADE I
Contextualizando a Matemática
Profa. Me. Lussuede Luciana de Sousa Ferro
Profa. Dra. Nelma Sgarbosa Roman de Araujo
Plano de Estudo:
● O surgimento da linguagem matemática como produção humana
● A formação do pensamento matemático no processo de ensino e
aprendizagem escolar
● Aprender matemática não é um bicho de sete cabeças
Objetivos da Aprendizagem:
● Conceituar e contextualizar as necessidades históricas que motivaram
a produção da matemática pela humanidade e sua função social.
● Compreender como ocorre o processo de apropriação dos conceitos matemáticos
e suas implicações na formação da consciência humana.
● Estabelecer a importância da matemática no processo de ensino e
aprendizagem escolar como uma ferramenta do pensamento.
4
INTRODUÇÃO
O que vem à sua mente quando pensa na palavra matemática? Para a maioria
das pessoas a matemática está relacionada a números ou registros de cálculos e fórmulas
complexas que podem preencher páginas escritas para alcançar o resultado que, muitas
vezes, não é exato, mas relativo ou proporcional.
No Dicionário Etimológico (2021), a palavra matemática deriva do grego “matema-
thike”, que significa a arte ou técnica de explicar os números e as formas geométricas. Já
em Houaiss e Villar (2009, p. 492), os autores afirmam que matemática é a “ciência que
estuda objetos abstratos (números, figuras e funções) e as relações existentes entre eles”.
A partir desses conceitos gerais, percebemos que os números fazem parte da
matemática, sendo esta compreendida como ciência ou como instrumento utilizado para
quantificar algo ou medir as diferentes situações do nosso dia a dia.
Você sabia que foram séculos de descobertas para a construção desses conceitos?
Tais conceitos foram sendo constituídos por homens que passaram a sua vida
[...] criando meios para suprir suas necessidades básicas, que vão desde a
sua sobrevivência aos modos mais avançados de organização laboral. Isso
significa que foram muitos anos de transformação social para que a ideia de
matemática, compreendida hoje cientificamente, superasse o plano empírico
para o abstrato, isto é, nos primórdios, a matemática se assentava nas expe-
riências do cotidiano das civilizações, as quais motivaram os povos a produzir
uma linguagem que pudesse comunicar sobre a quantificação das coisas, do
espaço e das formas (FERRO, 2016, p. 19).
Isso nos mostra que a produção dos conhecimentos matemáticos não segue uma
ordem cronológica de acontecimentos dos fatos e descobertas, mas se faz no decorrer do
desenvolvimento histórico e social dos homens. Assim como outros conhecimentos implí-
citos nas mais diversas ciências, os conceitos matemáticos se constituem por avanços e
recuos em diferentes condições de vida dos homens. E quais foram estas condições que
resultou no aparecimento dos primeiros vestígios da matemática?
Não pretendemos aqui discorrer, na íntegra, todos os fatos ou conceitos matemá-
ticos produzidos, mas aqueles que revelam as necessidades que motivaram os homens
a criarem formas cada vez mais elaboradas para entenderem os mistérios da natureza e
fazer dela sua aliada para resolver os problemas da vida cotidiana.
Sautoy (2013) relata que a matemática surgiu a partir das necessidades de os
homens controlarem os fenômenos da natureza, compreendendo as sequências e os pa-
drões que formam o mundo natural, como, por exemplo: por que o dia vira noite? Por que
uns dias são quentes e outros frios? Por que os animais migram de uma região a outra?
Foram essas e tantas outras constantes transformações (visíveis ou não aos olhos), das
paisagens e de outros fenômenos da natureza, que fez a humanidade buscar meios de
compreender o mundo à sua volta.
No ano 6.000 a.C., quando o homem deixa de ser nômade e passa a fixar-se em
uma região, precisa produzir parte do seu próprio alimento, então, surge a necessidade do
grupo desenvolver técnicas de agricultura, obrigando-o a entender os padrões da natureza
e criar meios de organizar a vida coletiva. Para isso, tiveram que encontrar formas de
medir os espaços (moradia e plantação), controlar os estoques da colheita, fazer trocas etc.
(SAUTOY, 2013).
Podemos dizer que, até hoje, fazemos uso desse modelo de contagem que her-
damos culturalmente de nossos antepassados. Nas mais diferentes ações do nosso dia a
dia, utilizamos os dedos para realizarmos cálculos simples ou agruparmos coisas, como,
por exemplo, os ovos em dúzias no supermercado ou geladeira; as pilhas em duplas, trios
ou quartetos para o uso de controles remotos; par de brincos para ordenar as orelhas;
sete dias para marcar a semana; e tantas outras possibilidades de contagem nos dedos e
agrupamentos de objetos, pessoas, animais ou situações.
Percebam que, no passado, os diversos recursos materiais utilizados pelos ho-
mens se tornaram representações numéricas, mas eles ainda tinham o desafio de criar
uma forma de escrever as quantidades, pois agrupar coisas por meio desses instrumentos
de contagem não garantia o arquivo das informações e a precisão dos cálculos. Dessa
forma, o controle de quantidades se transformou em símbolos numéricos e conquistaram
notoriedade nas sociedades modernas.
Foi nesse percurso que os números passaram a ser representados como hoje conhe-
cemos, e avançaram “[...] para a criação das palavras numéricas, termos, conceitos e ideias
matemáticas que estão presentes no cotidiano dos indivíduos, muitas vezes sem que eles
próprios percebam a linguagem matemática em seu vocabulário” (FERRO, 2016, p. 30).
A Figura 1 representa a evolução dos registros numéricos na história humana,
signos que herdamos de nossos antepassados e utilizamos para materializar a forma como
controlamos as diferentes grandezas.
Quando você olha para esta imagem, o que primeiro chama a sua atenção? As
ilustrações ou a escrita? Geralmente, as ilustrações são os primeiros elementos que nos
saltam aos olhos e, depois, a escrita. Nesta situação, ambas são importantes para com-
preendermos por que o comprido pode ser curto e o pouco pode ser muito” (MASUR, 2009,
p. 2), e em qual situação isso pode acontecer.
Nesse caso, a situação é um jogo de futebol e a primeira relação de grandeza a
ser analisada é o tamanho do goleiro: ele é uma pessoa curta ou comprida, alta ou baixa?
Para você definir se o goleiro é uma pessoa comprida ou curta, alta ou baixa, precisará
identificar: em relação a que está estabelecendo essa comparação?
No exemplo do livro, podemos dizer que o goleiro é curto em relação à distância
da bola, o que dificultou impedi-la de entrar no gol e o time adversário marcar um ponto no
placar. Para determinar se a quantidade um é pouco ou muito, depende do que estamos
estabelecendo como objeto de comparação, em uma partida de futebol o placar 1 X 0 é o
suficiente para a vitória.
Exemplos como esses, revelam que no movimento de formação do pensamento
matemático, a criança irá identificar semelhanças e diferenças, estabelecer comparações e
relações com outras vivências, ou seja, as evocações daquilo que ela perceber e se atentar,
caminhará para ações integradas do pensamento e abstrações cada vez mais elaboradas.
Após a definição das regras, estabeleceu-se como objetivo geral do jogo: retirar o
maior número de bolinhas da caixa com as varetas. Para esta tarefa, as crianças deveriam
utilizar as varetas de hashi (com ou sem apoio do elástico). A seguir o quadro de regras do
jogo em detalhes, organizado pelos pesquisadores.
1) Decidindo quem inicia o jogo: cada jogador escolhe uma bola da caixa e pesa na
balança, inicia o jogo quem tiver a bola mais pesada ou mais leve. Variação: de olhos
vendados, cada jogador escolhe uma bola, inicia o jogo quem tiver a bola maior ou
menor;
2) O jogador, com ajuda dos pegadores, deve retirar as bolinhas da caixa pelos furos
superiores;
3) Em cada rodada, o jogador terá quatro chances para jogar e, a cada jogada, a
bolinha escolhida deve ser retirada por um dos furos superiores da caixa.
4) O vencedor será aquele que conseguir o total de bolinhas mais pesadas ou mais
leves (dependendo do critério estabelecido pelo professor ou pelos jogadores).
Fonte: Elaborado pelos pesquisadores da OPM (2020).
SAIBA MAIS
REFLITA
LIVRO
Título: Educação matemática nos anos iniciais do ensino funda-
mental: princípios e práticas pedagógicas.
Autor: Vanessa Dias Moretti e Neusa Maria Marques de Souza
Editora: Cortez
Sinopse: O ensino de Matemática nos anos iniciais do Ensino
Fundamental consiste em um frequente desafio para professores,
do mesmo modo que o ensino da língua materna. Com base nes-
sa realidade, as autoras elaboram a presente obra, cujo objetivo
principal é oferecer a professores e educadores dos três primeiros
anos do Ensino Fundamental respaldo teórico e metodológico para
um ensino da Matemática que seja incentivador de aprendizagem
e possibilite às crianças o desenvolvimento do pensamento teórico
sobre os conceitos e as noções referentes a essa disciplina.
FILME/VÍDEO
Título: Gênio Indomável
Ano: 1997
Sinopse: Will é um rapaz brilhante e tem um grande talento para a
matemática, mas trabalha como faxineiro em uma famosa univer-
sidade. O psicólogo Sean Maguire o ajuda a formar sua identidade
e lidar com as emoções, direcionando-o na vida.
Plano de Estudo:
● Dificuldades de aprendizagem e suas concepções
● As dificuldades de aprendizagem e o ensino de matemática
● A organização do ensino de matemática: variáveis que afetam a aprendizagem
Objetivos da Aprendizagem:
● Conceituar as dificuldades de aprendizagem e suas
concepções no decorrer da história humana.
● Compreender o percurso de aprendizagem da linguagem matemática
pelas crianças e o seu processo de apropriação.
● Estabelecer a importância de identificar as causas e trabalhar com as consequências
das dificuldades de aprendizagem na vida das crianças.
● Compreender a linguagem matemática como uma
ferramenta do pensamento.
28
INTRODUÇÃO
UNIDADE II
I Dificuldades
Contextualizando
de Aprendizagem
a Matemáticada Matemática 29
1. DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E SUAS CONCEPÇÕES
1 Alfred Binet foi um psicólogo francês que contribuiu com suas pesquisas no campo da psicometria ao
criar o primeiro teste bem-sucedido de inteligência, a Escala Binet-Simon, que serviu de base para vários dos
atuais testes de QI que hoje conhecemos.
UNIDADE II
I Dificuldades
Contextualizando
de Aprendizagem
a Matemáticada Matemática 30
Para Cordié (1996), os problemas de aprendizagem surgiram com a instauração
da escolaridade obrigatória no fim do século XIX. Assim como as exigências da sociedade
moderna causam os distúrbios, a expressão do mal-estar das pessoas visivelmente impres-
sa na linguagem de uma época em que o poder do dinheiro e o sucesso social são valores
predominantes, também contribui para as diferentes dificuldades no processo de ensino e
aprendizagem escolar.
Nesse contexto, a escola surgiu com a proposta de disciplinar e melhorar as condições
de vida na sociedade moderna e acabou, na contemporaneidade, por ocupar o papel de repeti-
ção da marginalização ao reputar o insucesso acadêmico a milhares de crianças e jovens.
Com isso, a escola fortalece a divisão de classes e dissemina os sentimentos de
não pertencimento e merecimento disseminados pela classe dominante. De acordo com
Cordie (1996), Jules Ferry (1832 - 1893), então ministro da educação na França, estabe-
leceu a instrução laica e obrigatória em 1880, a qual tinha como objetivo superar a divisão
de classes sociais e permitir que as crianças pobres tivessem acesso à educação formal.
Entretanto, esse acesso ficou restrito ao que se convencionou chamar de primário,
pois este era o suficiente para que os menos abastados conseguissem manusear as má-
quinas cada vez mais frequentes nas fábricas.
No Brasil, o conhecimento é tido como fonte de poder social, logo, a educação é
realizada de modo a privilegiar alguns e discriminar muitos, gerando o fracasso escolar. A
condição de não alfabetizado ou não letrado nem sempre foi vista como um problema social
ou clínico, pois as pessoas que não tivessem instrução formal poderiam exercer diversos
ofícios que precediam desse atributo.
Com o ritmo acelerado das mudanças do modo de produção, essa concepção
mudou de forma drástica a partir do final do século XIX e continua em ritmo acelerado. A
escolarização passou a ser entendida como fundamental para a execução de atividades,
inclusive artesanais, pois os artesãos precisavam aprender como gerenciar uma loja antes
de abrir seu negócio, por exemplo.
Assim, o desemprego passou a ser justificado pela dificuldade de se empregar pes-
soas que não fossem escolarizadas, pois os valores essenciais de vida são considerados
todos aqueles relacionados ao sucesso financeiro: dinheiro, posses de bens materiais e o
poder que representam socialmente esses bens.
Dessa forma, o fracasso escolar se tornou sinônimo de fracasso na vida (CORDIE,
1996). No âmbito escolar e de investigação das dificuldades de aprendizagem, o conceito
e definições sofreram a influência do grande desenvolvimento das ciências médicas e bio-
lógicas, principalmente da psiquiatria, ocorrido entre os séculos XVIII e XIX.
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Estudos de neurologia, neurofisiologia e neuropsiquiatria, realizados em labora-
tórios anexos às instituições asilares, como os hospícios, passam a se referenciar aos
internos como anormais. Essa ideia adentrou as instituições escolares: os alunos que não
acompanhavam a turma eram vistos como anormais e a justificativa de seu fracasso era
reputada a alguma causa orgânica (SCOZ, 2013). Mas afinal, o que é ser normal?
Segundo o dicionário Houaiss (2009), normal significa aquilo que é usual, natural;
o que não é diferente, ou seja, aquilo que é igual à maioria que está ao seu redor, não se
destaca; algo comum. Para discutirmos o conceito de normalidade, requer refletirmos aos
preceitos cotidianos sobre o que é ou não esperado da criança em desenvolvimento.
De acordo com Drouet (1997), a normalidade está relacionada ao padrão de com-
portamento esperado para uma determinada população, baseado na maior incidência deste
padrão, ou seja, varia de acordo com a história do grupo, pois, o que hoje é considerado
normal pode não ter sido no passado e vice-versa.
Dentro de uma mesma sociedade esse comportamento ainda sofre variações,
quando se considera grupos diferentes: de idade, sexo, status social, família, cultura, raça e
religião. Para a psicopatologia, ser “normal” remete à saúde integralmente orgânica, física,
psíquica e social.
Como podemos perceber, ao conceituarmos a palavra “normal”, precisamos con-
siderar as questões éticas, sociais, culturais, econômicas e políticas, pois somos seres
sociais, formados social, cultural e historicamente. Nesse contexto, consideramos, em
Saviani (1995), que não nascemos humanos, mas nos tornamos humanos por meio das
relações sociais, logo, a potencialidade do outro é trabalhada e valorizada pelo seu igual,
por aquele que é mais experiente.
Nessa perspectiva de normalidade, pautada no aprender para se desenvolver, é
perigoso pontuar que uma criança não está dentro do padrão de normalidade, pois se
não a considerarmos em suas múltiplas determinações, podemos reforçar a concepção
patologizante, impedindo o outro – no caso a criança – de ter acesso pleno.
Se não tivermos clara compreensão do processo de desenvolvimento e aprendiza-
gem humana, corremos o risco de “rotular” a criança, de julgar sua dificuldade em aprender
de forma descontextualizada, ou seja, perderemos a compreensão global para além da
responsabilidade individual da criança. Quando olhamos para a criança em sua totalidade,
compreendemos que os indivíduos aprendem de forma singular e não homogênea.
É nesse contexto que surgiram disciplinas específicas para o cuidado com a
criança, como a Psicologia da Aprendizagem e, nesta área, subáreas de estudos como a
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I Dificuldades
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a Matemáticada Matemática 32
Psicopedagogia, que tem como um dos pilares o trato direto de crianças e adolescentes
que apresentam dificuldades significativas em seu processo de aprendizagem. Dessa
subárea, temos os estudos acerca das dificuldades de aprendizagem, dos transtornos de
aprendizagem; sintomas e intervenções escolares rumo ao desenvolvimento.
Ciasca (2003) pontua que os primeiros relatos médicos acerca da questão das difi-
culdades datam de 1917 na literatura inglesa, sendo formulada por Glasgow como cegueira
congênita das palavras. Em 1925, Samuel Orton descreveu um quadro que identificava pro-
blemas de leitura e escrita, principalmente na caligrafia, o qual nomeou como estrefossimbolia
(transtorno para a leitura a escrita) para distorções, substituições e escrita especular.
Strauss e Lehtinen (1947) são os autores que introduziram o termo Lesão Cerebral
Mínima ou Síndrome de Strauss para qualificar crianças que apresentassem quaisquer
alterações relacionadas ao ato de aprender. Entretanto, o termo lesão passou a ser questio-
nado, pois muitas crianças não apresentavam lesão aparente no Sistema Nervoso Central.
Por esse motivo, Denhoff passou a defender que, não havendo evidência de lesão
orgânica, o nome correto seria Disfunção Cerebral Mínima, caracterizada por “distúrbio hiper-
cinético do impulso”, abarcando os seguintes sintomas: “agitação, hiperatividade, diminuição
progressiva da atenção, concentração escassa, distração, irritabilidade” (CIASCA, 2003, p. 23).
Esse conceito das dificuldades de aprendizagem das crianças chegou ao Brasil
em 1960 com maior aceitação pelos professores e pelos pais, uma vez que esta era tida
como neurológica. Esse entendimento, por um lado, serviu para melhorar o acolhimento da
criança, mas, por outro, favoreceu o desinvestimento educacional por parte dos educadores
e reforçou o tratamento medicamentoso.
Em 1988, a Organização Americana National Joint Committee of Learning Disabilities
(Comitê Conjunto Nacional de Deficiências de Aprendizagem) definiu as dificuldades de
aprendizagem como um termo geral que se direciona a um grupo de diferentes desordens
manifestadas por dificuldades significativas na aquisição e utilização da compreensão da
audição, da fala, da leitura, da escrita e também do raciocínio matemático (FONSECA, 1995).
As definições apresentadas até aqui consideram as dificuldades de aprendizagem
como tendo causas intrínsecas às crianças e de ordem neurológica. Na atualidade, os
avanços nos estudos chegaram à compreensão que as dificuldades de aprendizagem
podem ter causas diversas de ordem extrínseca (causas ambientais), intrínseca (causas
neuropsicológicas) e interativa (causas relacionadas às extrínsecas e intrínsecas).
Quando as causas das dificuldades são extrínsecas, advêm do contexto social, cul-
tural, familiar ou pedagógico ao qual a criança está inserida. Os sintomas mais frequentes
nestes casos são fracasso na aprendizagem, inadaptação escolar, desinteresse, comporta-
mento hiperativo ou hipoativo.
UNIDADE II
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Contextualizando
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Dificuldades de aprendizagem na perspectiva intrínseca, podem decorrer de dano
cerebral, alterações nos processos maturativos, inabilidade psicolinguística, inabilidade no
processo de informação. Atraso percepto-motor (motor e cognitivo), dificuldades globais na
aprendizagem, alterações nos processos de codificação e decodificação linguística (disfasia)
e demais dificuldades seletivas, como a dislexia, disgrafia, disortografia, discalculia e acal-
culia, são os sintomas que mais acometem as crianças que apresentam essas dificuldades.
Na perspectiva interativa, as causas podem estar, em boa parte, relacionadas tanto às
questões intrínsecas quanto às extrínsecas. Quando essas características do desenvolvimento
são pontuais, ficam inseridas no padrão de normalidade e dificuldades que, aos poucos, se
resolvem. Todavia, quando a situação é constante, certamente algo errado está ocorrendo.
As desordens no ato de aprender específicas do indivíduo são determinadas por
problemas no funcionamento do Sistema Nervoso Central. Essas desordens são de origem
neurológica denominadas de Transtornos de Aprendizagem e compreendem uma inabilida-
de específica em leitura, escrita ou matemática, em crianças que, geralmente, apresentam
inteligência média ou acima da média; adequado aparato sensorial e condições sociais,
mas têm um desempenho significativamente abaixo do esperado para seu nível de desen-
volvimento, escolaridade e capacidade intelectual (MORI, 2016).
A autora revela que além das dificuldades específicas na aprendizagem, os transtor-
nos ou distúrbios de aprendizagem são acompanhados de manifestações comportamentais,
ressaltando que a expressão transtorno da aprendizagem deve ser restrita às perturbações
específicas resultantes de alterações no sistema nervoso central.
De acordo com Mori (2016), os alunos com Transtorno de Aprendizagem não são
considerados parte do público-alvo da política nacional de educação inclusiva. Dificilmente
eles têm acesso a salas de recursos e/ou atendimentos educacionais especializados dentro
das escolas regulares.
Entretanto, no Paraná, o atendimento educacional especializado inclui quadros
de origem neurológica, os quais são denominados Transtornos Funcionais Específicos e
abrangem: Distúrbios de aprendizagem (Dislexia, Disortografia, Disgrafia e Discalculia) e
Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). O DSM-5-Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014) e o
CID-10 (Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento), são as duas classifi-
cações mais utilizadas na saúde e educação (OMS, 1997).
No DSM-5 consta como Transtorno de Aprendizagem Específico aquele que apre-
senta prejuízo na leitura, em matemática e escrita. Os casos podem ser classificados em
leve, moderado ou grave (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).
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I Dificuldades
Contextualizando
de Aprendizagem
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No CID-10 denomina-se Transtornos Específicos do Desenvolvimento das Habili-
dades Escolares aqueles que apresentam transtorno específico da leitura, da soletração, da
habilidade em aritmética e misto de habilidades escolares e transtornos não especificados
do desenvolvimento das habilidades escolares (OMS, 1997).
Segundo Fonseca (1995), a discussão sobre a etiologia das dificuldades de apren-
dizagem norteia a prática educativa, bem como o atendimento dirigido à criança que não
aprende como as demais. Psicólogos, fonoaudiólogos e pedagogos tendem a analisar os
casos pela perspectiva interativa, ou seja, dirigem o olhar para diferentes fatores de ordem
psicológica, pedagógica, sociológica e linguística. Já os pediatras e neurologistas tendem a
analisar principalmente pelos aspectos orgânicos. Por isso, a avaliação e o trabalho devem
ser multidisciplinares.
Mori (2016) ressalta que a investigação de um quadro de transtorno é uma tarefa
complexa e, por isso, exige equipe multidisciplinar e compreensão do processo de alfa-
betização da pessoa avaliada. A análise cuidadosa do desenvolvimento, do processo de
aprendizagem e das produções escolares fornecerão os indicadores para diferenciação
entre problemas/dificuldades de aprendizagem e transtornos de aprendizagem e encami-
nhamentos necessários.
A identificação precoce e as devidas intervenções amenizam o impacto da disfunção
na funcionalidade do indivíduo. Todavia, o fechamento do diagnóstico só é possível após os
primeiros anos escolares e de o indivíduo ter passado pelo processo de alfabetização. Se
o indivíduo não passou pelo processo, como afirmar que ele tem transtornos? A pergunta
parece óbvia, mas não é incomum crianças com 6, 7 ou 8 anos assim diagnosticadas.
Por outro lado, diagnósticos tardios podem ser muito prejudiciais, causando problemas
comportamentais, baixa autoestima e evasão escolar (MORI, 2016).
Nessa direção, devemos pensar que o termo desenvolvimento é muito mais amplo
que saúde física, pois define o processo organizado e contínuo que promove o desenvol-
vimento da própria vida, no ato da concepção, e abrange todas as transformações que
ocorrem no organismo e na personalidade das pessoas.
Isso significa considerarmos os aspectos biológicos e os comportamentos mais
sofisticados, decorrentes do crescimento e amadurecimento físico e dos estímulos am-
bientais. Porém, como vimos anteriormente, os primeiros estudos acerca da infância foram
concebidos a partir de um olhar evolucionista na lógica de periodização do ciclo da vida e
de se ater ao que é esperado de cada faixa etária. Essa concepção ofereceu base para a
construção das teorias inatistas-maturacionistas (FONTANA; CRUZ, 1997).
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I Dificuldades
Contextualizando
de Aprendizagem
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A abordagem inatista-maturacionista de desenvolvimento parte do pressuposto que
os fatores hereditários ou de maturação são mais significativos para o desenvolvimento da
criança, para determinar suas capacidades, do que os aspectos relacionados à aprendiza-
gem e experiência. O que podemos entender por hereditariedade e maturação?
Na perspectiva inatista-maturacionista, Fontana e Cruz (1997) explicam heredita-
riedade como sendo o conjunto de qualidades ou características que são determinadas
na criança desde o nascimento, como: cor dos olhos, cor da pele, formato da orelha, tipo
sanguíneo etc. Já maturação, são os padrões de mudanças que todos os sujeitos de uma
espécie vivenciam em idades aproximadas, como a transformação do corpo, o crescimento
de órgãos e o domínio do corpo.
De acordo com a abordagem inatista-maturacionista, todo comportamento e desen-
volvimento é considerado normal ou não quando apresentado pela maioria das crianças.
Esse desenvolvimento e comportamento, determinados biologicamente, foram considera-
dos para todas as crianças independente da sua cultura e da sua classe social.
Sob essa perspectiva teórica (inatista-maturacionista), tanto a cor dos olhos quan-
to as características individuais e inteligência seriam herdadas biologicamente dos pais.
Então, desde o nascimento a criança já estaria determinada a ser ou não apta a executar
determinadas atividades, não sendo influenciadas pela aprendizagem ou pelas experiên-
cias vividas socialmente.
Compreender o desenvolvimento pelas vias biológicas influenciou o processo de
ensino e aprendizagem escolar pautado na ideia de que a aprendizagem dependeria do de-
senvolvimento da criança, ou seja, não se deveria adiantar determinados conhecimentos para
ela, pois não estaria apta a aprender em razão de sua imaturidade biológica para assimilar.
Por isso, na escola e em outras situações sociais, é comum ouvirmos “Filho de
peixe, peixinho é”; “Ele(a) é tão inteligente como o pai/a mãe”; “Fulano(a) ainda não tem
maturidade para aprender”; ou ainda “Ele(a) herdou o dom da mãe/do pai para cozinhar”.
Dessa forma, a aprendizagem é que depende do desenvolvimento. O que a criança
é capaz de aprender ou não depende do seu nível de maturação, de sua inteligência. Essa
visão inatista-maturacionista permeou os primeiros questionamentos sobre os problemas
de aprendizagem, explicados apenas por meios dos testes psicométricos.
Como já apresentado, Alfred Binet (1857-1911) foi o primeiro profissional a sistema-
tizar um modo de avaliar o Coeficiente Intelectual das crianças (QI), em especial da criança
deficiente, com o objetivo de averiguar o nível de inteligência e, assim, auxiliar os profissionais
da educação a elaborarem um plano de escolarização adequado ao perfil da criança.
UNIDADE II
I Dificuldades
Contextualizando
de Aprendizagem
a Matemáticada Matemática 36
Para Binet as capacidades que compõem a inteligência, ou seja, atenção, julga-
mento, compreensão e raciocínio, não eram aprendidas e, sim, determinadas pela herança
genética da criança. A escala de inteligência elaborada por Binet foi amplamente utilizada
como respaldo para determinar os aptos e os não aptos à aprendizagem. Todavia, surgiram
outras correntes que ampliaram o conhecimento e os critérios de análise sobre o processo de
desenvolvimento e aprendizagem.
As novas correntes filosóficas destacam que o processo de desenvolvimento humano
necessita ser observado a partir de algumas vertentes, sendo elas: a biológica, psicológica,
histórica, social e a cultural. Dentre as teorias psicológicas que problematizam esses aspec-
tos, ressaltamos o posicionamento da teoria histórico-cultural, ao afirmar que a criança nasce
em um mundo humano e não em um mundo natural. Corroborando Vigotski (2000), Fontana
e Cruz (1997, p. 57) explicam:
[...] desde o nascimento, a criança está em constante interação com os adul-
tos, que compartilham com ela seus modos de viver, de fazer as coisas, de
dizer e de pensar, integrando-a aos significados que foram sendo produzidos
e acumulados historicamente. As atividades que ela realiza, interpretadas
pelos adultos, adquirem significado no sistema de comportamento social do
grupo a que pertence.
Podemos afirmar, então, que a criança não se adapta ao meio, ela o internaliza, o
modifica e o estrutura; transformando-se de ser biológico em social. Ao falar em processo
de aprendizagem e desenvolvimento, Vigotski (2000) destaca a importância do processo de
escolarização na vida da criança, pois o contato sistematizado e intenso delas com sistemas
organizados de conhecimentos, fornecem instrumentos para elaborar e mediatizar seu pro-
cesso de desenvolvimento.
Sob o olhar da abordagem histórico-cultural, a concepção de maturidade é ampliada,
transpondo as bases biológicas ao compreendê-la como o esforço para se conseguir atingir
algo, impulsionado pelo processo de mudança pelo qual passa o indivíduo.
Nesse sentido, maturação não significa “estar pronto para”, mas sim uma condição
pela qual passamos durante nosso desenvolvimento na busca para se tornar verdadeiramen-
te parte do gênero humano. Mas se maturidade não tem a ver com processos puramente
biológicos, poderíamos ensinar uma criança de quatro anos de idade a ler sem problema
algum? Por que existem crianças que apresentam dificuldades de se apropriarem dos conhe-
cimentos matemáticos?
Tais questões são pertinentes e serão respondidas no decorrer dos estudos de diver-
sas formas. Neste momento buscamos refletir a afirmação amplamente difundida no âmbito
escolar de que a não aprendizagem esperada da criança é decorrente de sua imaturidade
biológica, pois ainda não estaria preparada para aprender os conteúdos escolares.
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I Dificuldades
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Contrário a essa ideia, Vigotski (2000) defende que uma criança imatura correspon-
de àquela que precisa do auxílio de um par educativo mais desenvolvido que ela, para que
consiga na relação de superação e incorporação, internalizar a lógica intrínseca ao processo
em questão, de tal modo que consiga realizar a atividade sem auxílio posterior.
Em termos conceituais, estamos falando da zona de desenvolvimento próximo. O
que significa isso? Vigotski (2000) ao trabalhar com a área de desenvolvimento humano,
denomina duas grandes áreas de desenvolvimento: zona de desenvolvimento próximo (tudo
aquilo que a criança não consegue realizar sem as intervenções de um par mais experiente
ou de um adulto) e zona de desenvolvimento atual (todas coisas que a criança consegue
realizar sozinha, sem a intervenção de um par mais desenvolvido que ela (uma criança mais
velha ou um adulto).
[...] o desenvolvimento atual de uma criança é aquele que pode ser verificado
através de testes nos quais a criança resolve problemas de forma indepen-
dente, autônoma. Já a zona de desenvolvimento próximo abarca tudo aquilo
que a criança não faz sozinha, mas consegue fazer imitando o adulto [...]
(VIGOTSKI, 1993, p. 238-246).
O papel da escola como via de formação é fundamental nesse processo, pois coloca
a criança sob o olhar de incompletude a ser preenchido pela educação. Com isso, o não
aprender ganha destaque e passa a não ser mais analisado somente pela perspectiva orga-
nicista. Por isso a necessidade de discutirmos os conceitos de normalidade e de maturidade,
para desmistificarmos a cultura enraizada até hoje, de que o não aprender é unicamente de
responsabilidade da criança.
Ao refletirmos a evolução histórica sob essas duas áreas de desenvolvimento huma-
no (inatista-maturacionista e histórico-crítica), podemos entender melhor as teorias acerca do
desenvolvimento e posicionar adequadamente o papel do aparato biológico no processo de
aprendizagem e nas possíveis intercorrências que podem advir dessa influência, mas não
como causa única das etiologias do não aprender.
Apesar de estarmos enfatizando o período da infância para problematizar a questão
da maturidade e aprendizagem, cabe ressaltar que esses processos não ocorrem somente
nesta etapa da vida.
Dar ênfase à infância justifica-se, pois é nesse período que se encontra a gênese do
desenvolvimento humano, ou seja, a infância representa o centro da pré-história do desenvol-
vimento cultural, devido ao processo de internalização dos instrumentos e dos signos.
UNIDADE II
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2. AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E O ENSINO DE MATEMÁTICA
UNIDADE II
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Assim como a história do desenvolvimento das sociedades, vimos que a matemática
percorreu diferentes caminhos até chegar aos nossos dias e sua principal finalidade é esta-
belecer um sistema convencional e que, por meio dele, os membros de um grupo possam
controlar as diferentes grandezas de forma precisa e duradoura.
Ao buscarmos elementos para a compreensão da função social da matemática, com-
preendemos que o desenvolvimento das ações por parte de cada sujeito ocorre mediante a
apropriação dos bens culturais historicamente constituídos e socialmente determinados.
Existe, assim, na trajetória do desenvolvimento da humanidade a necessidade de
intercâmbio entre os indivíduos durante o trabalho; se por um lado essa atividade teve seu
início com a utilização dos instrumentos para transformar a natureza e atender às necessida-
des básicas de sobrevivência, por outro, com ela foi preciso criar um sistema de controle de
quantidades, grandezas e formas que revelasse a matemática como um produto social; um
meio de interação com o mundo e resultado das relações humanas.
Nesse processo de compreensão, Vigotski (1998) tem como premissa que o apren-
dizado e o desenvolvimento fazem parte da vida da criança desde seu nascimento, pois os
considera inter-relacionados. Assim, o aprendizado escolar é aquele que depende direta-
mente do desenvolvimento das funções psíquicas, como a memória, a atenção voluntária, a
abstração, a imaginação, que, de acordo com Vigotski (1998), são os processos psicológicos
superiores de origem sociocultural, enquanto os processos elementares são de origem bio-
lógica, os quais, por meio dos signos, transformam-se em funções superiores. Para o autor,
[...] as principais fases formais que percorre a personalidade da criança em
sua formação estão diretamente ligadas ao grau de desenvolvimento de seu
pensamento, já que, do sistema de cognição em que se realize toda a expe-
riência interna e externa da criança, dependerá o aparelho psíquico que a
divida, análise, conecte e elabore [...] (VIGOTSKI, 1998, p. 76).
Com base nesse pressuposto teórico, entende-se que, com o desenvolvimento das
funções psíquicas superiores, a criança avança concomitantemente em seu desenvolvimen-
to, ou seja, por meio das interações sociais, da relação com o outro e da apropriação da
matéria (conceitos, signos, elementos mediadores...) desenvolve-se as funções complexas
do pensamento.
Desta forma, podemos dizer que o processo de construção das ideias matemáticas é
mediado por estes signos transmitidos socialmente e, como vivemos numa sociedade letrada,
a criança tem contato com esse sistema desde muito cedo. Com isso, compreendemos que,
para a criança se apropriar dos conceitos matemáticos, é necessário que ela seja ensinada e,
nesse processo de aquisição, implica uma necessidade, um motivo, um desejo de apropria-
ção desses conhecimentos.
UNIDADE II
I Dificuldades
Contextualizando
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Pensando na escola como sendo o espaço sistematizado de ensino e no professor,
como aquele que internalizado os instrumentos e signos que medeiam com os alunos, a
elaboração de intervenção pedagógica, deve compreender e organizar o processo de ensino
de matemática em interação com criança, de forma que ela seja motivada a aprender.
O ensino da matemática deve ser uma prática significativa que vai além de um ensino
ou uma técnica e, como tal, deve constituir-se como ações significativas do pensamento, in-
serido também numa situação com significado e não apenas manipular objetos com números
ou repetir sequencialmente os números impressos na parede das salas dezenas de vezes.
Nessa perspectiva, os instrumentos e signos são mutuamente ligados e funda-
mentais no desenvolvimento cultural do indivíduo. Enquanto os instrumentos influenciam
externamente a ação do homem sobre os objetos, os signos orientam internamente o
controle do próprio indivíduo.
Tanto os instrumentos quanto os signos ampliam a capacidade humana de interagir
com a natureza e, ao interagir, o homem modifica a natureza ao mesmo tempo em que modifica
a si mesmo e é nessa interação que se desenvolveu a linguagem matemática, como um signo
que permite às pessoas agirem umas com as outras num processo dialético de transformação.
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3. A ORGANIZAÇÃO DO ENSINO DE MATEMÁTICA: VARIÁVEIS QUE AFETAM
A APRENDIZAGEM
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Ao ingressar na escola, as aprendizagens, denominadas de senso comum, que a
criança traz consigo são superadas por modos cada vez mais complexos do pensamento
pela aquisição dos conhecimentos científicos. De acordo com Sforni (2004, p. 11),
A regularidade do processo de aprendizagem e a singularidade do desenvol-
vimento do aluno revelam a complexidade do ato de ensinar. Diante disso, é
possível afirmar que há indicadores relevantes que orientam a tomada de deci-
sões no ensino, mas não há modelos. Na organização da atividade educativa é
fundamental ter clareza quanto à sua intencionalidade e aos instrumentos ade-
quados ao alcance dos objetivos, mas garantindo flexibilidade suficiente para
permitir mudanças de rumos conforme as necessidades surgidas na interação
entre alunos e professores e o novo objeto de aprendizagem.
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Partindo dessa premissa, entendemos que a promoção do desenvolvimento depen-
de “do que se adquire e de como se adquire” (KOSTIUK, 2005, p. 48). Ou seja, depende do
conteúdo adquirido e como ele é adquirido. Segundo Kostiuk (2005, p. 50), o domínio de um
objeto de estudo “perfeitamente determinado” não garante a promoção do desenvolvimento
real, é pelo desenvolvimento do pensamento da criança que isso ocorre, ou seja, da capaci-
dade de ela “analisar e generalizar os fenômenos da realidade, de raciocinar corretamente”.
É necessário
[...] desenvolver “no todo” as faculdades mentais. Se se pretende alcançar
esta meta, tem de se encontrar uma solução satisfatória para os problemas
do ensino. O desenvolvimento do pensamento lógico é um dos fatores mais
importantes do sucesso escolar. Todavia, isto não significa que qualquer en-
sino contribua para garantir esse desenvolvimento [...].
Pensando de acordo com essa perspectiva, o ensino não pode restringir-se apenas
à transmissão dos conhecimentos, mas organizar-se de forma a favorecer o desenvolvimento
de todas as características psíquicas, por meio de métodos que desenvolva o pensamento
e os demais processos mentais, uma vez que, “o domínio do material escolar” é o início do
processo de desenvolvimento. Para Vigotski (1993, p. 244-245)
[...] quando observamos o curso de desenvolvimento da criança durante a
idade escolar e no curso de sua instrução, vemos que na realidade qualquer
matéria exige da criança mais do que esta pode dar nesse momento, isto é,
que esta realiza na escola uma atividade que lhe obriga a superar-se. Isto se
refere sempre à instrução escolar sadia (VIGOTSKI, 1993, p. 244-245).
Com isso, percebemos “[...] que o que provoca o desenvolvimento da criança é o fato
desse conteúdo da aprendizagem exigir dela, criança, a utilização de capacidades que ainda
não estão formadas, que estão na zona de desenvolvimento próximo [...]” (DUARTE, 1996,
p. 97), pois se o professor fosse trabalhar com a criança apenas aquilo que ela já sabe e não
apresentar exigências que ela não consegue executar sozinha, a aprendizagem decorrente
dessa prática se limitaria ao nível de desenvolvimento atual.
O que podemos observar é que o ensino escolar sistematizado, planejado e orga-
nizado desempenha um papel fundamental na aquisição dos conhecimentos e desenvolvi-
mento da criança acerca das diferentes ciências e, entre elas, a matemática. Por isso, não
podemos esperar que as funções psíquicas da criança, com dificuldade de aprendizagem ou
não, amadureçam para que ela aprenda os conceitos matemáticos, pois
[...] o que a criança é capaz de fazer hoje em colaboração será capaz de
fazê-lo por si mesma amanhã. Por isso, parece verossímil que a instrução e
o desenvolvimento na escola guardem a mesma relação que a zona de de-
senvolvimento próximo e o nível de desenvolvimento atual. Na idade infantil,
somente é boa a instrução que vá avante do desenvolvimento e arrasta a
este último. Porém, à criança unicamente se pode ensinar o que é capaz de
aprender [...] (VIGOTSKI, 1993, p. 241 - 242).
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Desta forma, a educação não “espera” pelo amadurecimento das funções psíquicas
do sujeito, mas estimula e orienta o seu desenvolvimento, transformando a “[...] prática social
global não de forma imediata, mas sim pela mediação da transformação dos sujeitos da prá-
tica social [...]” (SAVIANI, 1989, p. 82) ou ainda, como afirma Leontiev (1972), para a criança
se humanizar, necessita apropriar-se dos resultados que foram produzidos e elaborados pela
humanidade, isto é, apropriar-se, por meio da educação, da cultura produzida socialmente
dando continuidade ao processo histórico. Para Leontiev (1972, p. 273), “[...] o movimento
da história só é possível com a transmissão, às novas gerações, das aquisições da cultura
humana, isto é, com a educação [...]”.
Com essa discussão, entendemos que o professor tem a tarefa de ensinar à criança
aquilo que ela ainda não é capaz de aprender sozinha, ele assume o papel de mediador dos
conteúdos científicos e faz a intervenção na formação dos processos psicológicos superiores,
dirigindo o desenvolvimento psíquico do indivíduo.
[...] a mediação realizada pelo professor entre o aluno e a cultura apresenta
especificidades, ou seja, a educação formal é qualitativamente diferente por
ter como finalidade específica propiciar a apropriação de instrumentos cultu-
rais básicos que permitam elaboração de entendimento da realidade social e
promoção do desenvolvimento individual. Assim, a atividade do professor é
um conjunto de ações intencionais, conscientes, dirigidas para um fim espe-
cífico [...] (BASSO, 1998, p. 3).
Para a efetivação dessa prática, se faz necessário que o professor seja um profissio-
nal, também, cientificamente instruído, ou seja, que ele domine seu objeto de estudo, o qual
deve estar enraizado na ciência. Somente nessa perspectiva é que ocorrerá a apropriação
do conhecimento científico por parte do aluno de maneira sistemática, dando continuidade ao
processo histórico de produção e transmissão cultural.
Podemos considerar que tão importante quanto o domínio da contagem de coisas e
escrita dos números, é a compreensão da finalidade social dessa linguagem numa sociedade
letrada. Nesse sentido, pensar em uma aquisição dos conceitos matemáticos que permita
ao homem colocar-se como interlocutor consciente no âmbito social, significa trazer para o
contexto da prática pedagógica escolar, necessidades e motivos que mobilizem as crianças
a buscarem formas de controlar as quantidades, grandezas e formas, assim como fizeram os
nossos antepassados.
Assim, é fundamental que as tarefas escolares, envolvendo os conhecimentos ma-
temáticos, façam sentido para a criança e para o professor e, para isso, é preciso que elas
estejam inseridas em situações de controle quantitativo.
UNIDADE II
I Dificuldades
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SAIBA MAIS
De acordo com Smith e Strick (2012), o estresse emocional pode comprometer o pro-
cesso de ensino e aprendizagem da criança. A ansiedade decorrente da mudança de
residência, atritos familiares ou doenças podem trazer prejuízos aos avanços cognitivos
da criança e, com o tempo, interferir de modo negativo em sua disposição para os estu-
dos e aquisição de confiança em si mesma, aspectos também importantes para apren-
der na escola.
REFLITA
“A escola [...] deve tratar o ser humano em toda sua dimensão, tendo como foco o indiví-
duo, rompendo com uma visão reducionista de aprendizagem, DA [dificuldade de apren-
dizagem] e inteligência. Além disso, não se pode ter uma visão que enfatiza a responsa-
bilidade do sucesso da aprendizagem sobre a criança, ou sobre o professor. Pode ser
que a responsabilidade do insucesso da aprendizagem seja de todo um sistema edu-
cacional e nessa dura realidade o professor torna-se o grande vilão da aprendizagem”
UNIDADE II
I Dificuldades
Contextualizando
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em nosso trajeto de estudos nesta unidade, vimos como a área médica se sobrepôs
às demais, justificando quaisquer distúrbios de aprendizagem em questões orgânicas, e
como algumas correntes da psicologia problematizaram aspectos ambientais que influen-
ciam no processo de aprendizagem, justificando o desempenho acadêmico dos alunos com
dificuldades de aprender.
É importante compreender, de forma contextualizada, o que são dificuldades,
problemas, transtornos ou distúrbios de aprendizagem justamente para rompermos com
abordagens que culpabilizam exclusivamente a criança por suas dificuldades. A partir da
perspectiva neuropsicológica, os problemas de aprendizagem devem ser pensados de
forma sistêmica, ou seja, concebidos de forma sistematizada e avaliada por métodos cien-
tíficos válidos, abordando três dimensões: a causa, o processo e o sintoma.
Ao avaliarmos as causas, determinamos os fatores que podem estar mobilizando a
não aprendizagem da criança, tendo por origem questões ambientais, neurológicas ou am-
bas. O processo implica a maneira pela qual vamos avaliar as funções mentais superiores,
bem como as estruturas sensoriais e os aspectos ambientais. Por fim, o sintoma remete à
expressão do não aprender em cada sujeito, manifestas no ambiente escolar.
Nesse percurso, analisar globalmente o desenvolvimento e aprendizagem humana,
permite-nos:
a. compreender que os indivíduos aprendem de forma singular e não homogênea;
b. valorizar a criança enquanto um ser capaz de aprender e lidar com questões
referentes ao seu aprendizado.
c. respeitar ao outro, naquilo que tange a sua totalidade enquanto ser humano no mundo.
d. garantir à criança o direito ao melhor tratamento de saúde possível, através de
métodos não invasivos visando oferecer assistência integral, inclusive serviços médicos,
sociais e psicológicos.
e. direcionar e orientar a criança com dificuldade de aprendizagem, estabelecendo
os parâmetros para o início de seu tratamento e direcionamento da aprendizagem rumo ao
desenvolvimento.
UNIDADE II
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Diante desse contexto, a aprendizagem é essencial para o desenvolvimento das
potencialidades de cada ser humano. Algumas crianças, mesmo não apresentando com-
prometimento no aparato biológico, nas condições ambientais, nos aspectos psicológicos e
sociais, enfrentam entraves para aprender.
A complexidade dos obstáculos para aprender e os recursos e estratégias peda-
gógicas para ensinar, demandam cuidado ético, formação, compromisso e envolvimento
dos profissionais que trabalham com crianças, adolescentes e adultos com transtornos de
aprendizagem.
UNIDADE II
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LEITURA COMPLEMENTAR
UNIDADE II
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MATERIAL COMPLEMENTAR
LIVRO
Título: Dificuldades de Aprendizagem de A a Z: guia completo para
pais e educadores.
Autor: Corinne Smith e Lisa Strick
Editora: Artmed
Sinopse: Importantes estudos sobre as dificuldades de apren-
dizagem foram feitos na década de 90, mas grande parte das
informações demorou para chegar ao grande público. Finalmente,
´Dificuldades de Aprendizagem de A a Z´ traz o que há de melhor
na pesquisa e na experiência educacional recentes para pais, pro-
fessores e todos aqueles que são responsáveis por crianças com
problemas de aprendizagem. Com entusiasmo e paixão, Corinne
Smith e Lisa Strick oferecem um guia abrangente para as causas,
identificação e tratamento das dificuldades de aprendizagem. Você
irá aprender como estes pequenos distúrbios podem ter impacto
significativo.
FILME/VÍDEO
Título: O contador
Ano: 2016
Sinopse: O personagem Christian Wolff é diagnosticado com
autismo na infância e sua maior dificuldade é socializar. Ele tam-
bém possui uma grande habilidade com números e, ao crescer,
torna-se um respeitado contador. Um dia Wolff descobre que uma
empresa está envolvida em uma fraude de milhões de dólares a
partir dos livros contábeis, colocando a sua vida e a de sua colega
de trabalho em risco.
UNIDADE II
I Dificuldades
Contextualizando
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UNIDADE III
Acalculia e Discalculia
Profa. Me. Lussuede Luciana de Sousa Ferro
Profa. Dra. Nelma Sgarbosa Roman de Araujo
Plano de Estudo:
● Acalculia e discalculia: algumas considerações
● Discalculia: concepção; sintomas e possíveis causas
● Acalculia: concepção, sintomas e causas
Objetivos da Aprendizagem:
● Definir acalculia e discalculia diferenciando suas especificidades.
● Identificar os sinais e sintomas que acometem as pessoas com acalculia ou discalculia.
● Compreender o que causa a discalculia e a acalculia para a organização de
intervenções psicopedagógicas e desenvolvimento dos discalcúlicos e acalcúlicos.
51
INTRODUÇÃO
Com isso, percebemos que a discalculia é uma condição que afeta a capacidade
de os sujeitos adquirirem os conhecimentos matemáticos. Por isso, os estudantes discalcú-
licos podem apresentar dificuldades para compreender os diferentes conceitos numéricos
ou realizarem cálculos mentais simples, ou aprenderem sobre os fatos e os procedimentos
matemáticos.
Nesse caso, mesmo que a criança produza uma resposta correta ou use um método
assertivo na resolução dos problemas, realiza tais ações de forma mecânica, sem sentido
e significado das razões pelas quais são executadas (FARREL, 2008).
Estudos da área em neurociência explicam como o cérebro se organiza durante a
aprendizagem. Com os avanços tecnológicos, é possível verificar por meio de neuroimagem,
como funciona o processo de aprendizagem no Sistema Nervoso Central (SNC - formado
por cérebro e suas respectivas funções sistêmicas), ou seja, o que acontece nas áreas do
cérebro quando estas são ativadas na realização de tarefas matemáticas.
Segundo Dehaene (1997, p. 61), é no lobo parietal que ocorre o processamento
numérico, por isso a insuficiência de neurônios, produzidos nessa área, comprometem a
apropriação da
Habilidade para representar e manipular magnitudes numéricas não verbais
em uma linha numérica mental, orientada espacialmente, que está relaciona-
da à habilidade de rapidamente compreender, aproximar e manipular quan-
tidades numéricas. O senso numérico seria um sistema central dos números
que se ligaria às representações numéricas visuais e verbais para consolidar
um alto nível de desempenho aritmético.
Isso porque alguns estudantes podem apresentar excelentes notas nas avaliações
escolares, mas porque estudam sob controle e pressão coercitiva, portanto, estudam para
evitar o contato com situações aversivas em casa ou na escola relacionadas à aprendiza-
gem matemática. De acordo com Fassis, Mendes e Carmo (2014, p. 48),
A ansiedade matemática se configura por três componentes emocionais, um
contexto específico e três parâmetros delimitadores. Em relação aos três
componentes emocionais específicos, destacam: (a) reações fisiológicas
sentidas e relatadas como desagradáveis, tais como: taquicardia; sudore-
se; extremidades frias; gastralgias, cefaleias, náuseas; (b) reações de fuga
e esquiva [...] Como exemplo de fuga, tem-se: resolver rapidamente a prova
de Matemática; sair da sala quando o professor o requisita para ir ao quadro
negro, etc. No caso da esquiva, alguns exemplos são: faltar à aula de mate-
mática; adoecer no dia da prova ou no dia anterior à prova; (c) reações cog-
nitivas específicas, em forma de atribuições negativas à Matemática (regras)
e/ou autoatribuições negativas em relação ao desempenho em Matemática
(autorregras). Quanto ao contexto específico, tipicamente as reações emo-
cionais aqui descritas ocorrem em situações nas quais se faz necessária a
apresentação de habilidades matemáticas, seja em sala de aula ou em ou-
tras situações em que essa demanda se faz presente. Essas situações são
relatadas, por estudantes e outros indivíduos, como altamente aversivas. Os
três parâmetros definidores se referem a: (a) alta frequência de emissão das
respostas emocionais, desde as fisiológicas até as comportamentais e cog-
nitivas; (b) alta intensidade na emissão das respostas emocionais; gerando,
como consequência, (c) dificuldades acentuadas na aprendizagem da mate-
mática e na aplicação de conceitos e habilidades matemáticas no dia a dia.
Essa questão, levantada por Ferrari (2013), também nos inquieta, pois as concep-
ções que explicam as causas da discalculia, com base no biológico, traz o funcionamento
do sistema nervoso central como responsável pelas condições da aprendizagem ou não
das crianças.
Esse fenômeno, compreendido como causa biologizante, concentra as dificulda-
des com a matemática como sendo da própria criança, ou seja, nela estão “[...] as razões
orgânicas para o fenômeno do não aprender” (FERRARI, 2013, p. 24174). Dessa forma,
percebemos a naturalização das manifestações
Segundo Bastos (2008, p. 67), o termo acalculia “foi introduzido por Henschen em
1925, significando a perda da capacidade de executar cálculos e desenvolver o raciocínio
aritmético”. Para Bernardi (2006, p. 18), as acalculias “[...] são alterações intrínsecas ao ser
humano, causadas por disfunção no sistema nervoso central”. Portanto, as acalculias se
manifestam após lesão cerebral; ocorrem depois que as cognitivas já estão consolidadas.
De acordo com Campos (2014), a acalculia é a incapacidade de o sujeito realizar
operações matemáticas desde as mais rudimentares. A diferença entre discalculia e acalcu-
lia está na causa. Enquanto a discalculia é explicada por diferentes fatores externos e inter-
nos, a acalculia é causada por lesões no córtex cerebral devido a traumas cranioencefálicos
sofridos por acidentes, processos infecciosos, acidente vascular cerebral (AVC) ou outras
doenças que comprometem as funções cerebrais, ocasionando a perda das aprendizagens
matemáticas adquiridas.
A perda dessas aprendizagens pode ocorrer em níveis variados na realização de
operações matemáticas, por isso, “as acalculias são alterações intrínsecas ao ser humano,
causadas por disfunção no sistema nervoso central” (BERNARDI, 2006, p. 18).
Campos (2014) enfatiza que a acalculia pode se manifestar de três maneiras:
a) afásica: incapacidade de compreender os numerais e os símbolos numéricos
como linguagem como, por exemplo, dificuldade para nomear as pessoas e os
objetos;
Fonte: as autoras.
REFLITA
(CAMPOS, 2014).
KRANZ, Cláudia Rosana; HEALY, Lulu. Pesquisas sobre discalculia no Brasil: uma
reflexão a partir da perspectiva histórico-cultural. Ampliação de pesquisa realizada em 2011
e publicada no International Journal for Studies in Mathematics Education, v5 (2), 2012,
sob o título Focusing on dyscalculia: contributions from a historical-cultural lens. Disponível
em: http://www.matematicainclusiva.net.br/pdf/PESQUISAS%20SOBRE%20DISCALCU-
LIA%20NO%20BRASIL.pdf. Acesso em: 05 abr. 2021.
LIVRO
Título: Discalculia: o que é? Como intervir?
Autor: Jussara Bernardi
Editora: Paco Editorial
Sinopse: A obra descreve as definições de discalculia sob a ótica
de diferentes autores, buscando instrumentalizar o educador que
atua em sala de aula ou em espaços alternativos de aprendiza-
gem. Enumera determinadas características manifestadas pelos
estudantes discalcúlicos e apresenta sugestões de jogos e ativida-
des lúdicas que possibilitem a elevação dos níveis de autoestima
e autoimagem e o desenvolvimento das capacidades matemáticas
em alunos com o problema.
FILME/VÍDEO
Título: Não sei fazer isso, mas sei fazer aquilo
Ano: 2012
Sinopse: O documentário de curta metragem Não sei fazer isso,
mas sei fazer aquilo, produzido pela HBO, traz o relato emocionan-
te de crianças que possuem Transtornos de Aprendizagem, como
a dislexia, discalculia, disgrafia, déficit de atenção e desordem no
processamento auditivo. Apresenta-nos ainda o impacto destas di-
ficuldades nas habilidades escolares das crianças, assim como em
sua autoestima e autoconfiança. Destaca também como os pais e
professores possuem papel fundamental no desenvolvimento des-
tas crianças, quando conseguem compreender suas dificuldades
e estimular a expressão de seus sentimentos e o desenvolvimento
de habilidades que possuem.
Plano de Estudo:
● Intervenções no Processo de Aprendizagem da Matemática no Espaço Escolar
● O Uso de Jogos nas Ações Interventivas Escolares
● Recurso Tecnológico a favor da Aprendizagem: Jogos Virtuais
● A Escolha do Jogo como Recurso Pedagógico
Objetivos da Aprendizagem:
● Identificar, compreender e organizar possibilidades de investigação
da discalculia e/ou da acalculia no ambiente escolar.
● Reconhecer as possibilidades de organização de estratégias didáticas para o ensino
dos conhecimentos matemáticos na escola, bem como para as
intervenções psicopedagógicas.
● Compreender o jogo e as ferramentas tecnológicas como recursos didáticos que
contribuem no processo de ensino e aprendizagem dos alunos
com dificuldades para aprender matemática.
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INTRODUÇÃO
Estamos chegando ao final dos nossos estudos! Porém, esperamos que você
continue trilhando os caminhos da pesquisa para ampliar e aprofundar os conhecimentos
adquiridos acerca das dificuldades de aprendizagem em matemática e os processos inter-
ventivos no trabalho escolar.
Sabemos que os desafios continuarão diante das diferentes dificuldades que se
apresentam nas salas de aula e, nesse caso especificamente, àqueles relacionados aos
conteúdos de matemática como, por exemplo, interpretar os enunciados envolvendo as
situações problemas e resolvê-las de forma consciente.
Nas Unidades anteriores, estudamos sobre o processo histórico de produção da
matemática como ferramenta do pensamento (Unidade I); os obstáculos que a criança
poderá encontrar para se apropriar dos conceitos matemáticos na escola (Unidade II); os
transtornos ou distúrbios da discalculia ou acalculia como um desses entraves que pode
dificultar o processo de ensino e aprendizagem dos alunos nas diferentes etapas do desen-
volvimento escolar (Unidade III).
Dessa forma, constatamos que a discalculia ou acalculia, assim como outros trans-
tornos e distúrbios, não tem como causa somente um fator, mas são multideterminados
pelas condições de vida dos sujeitos na relação com o mundo.
Seguindo esse percurso, nessa unidade primeiro discutiremos sobre os processos
interventivos, bem como algumas propostas e encaminhamentos de intervenções que po-
dem ser realizados com a criança ou adolescente discalcúlico ou acalcúlico. Assim, preten-
demos desvelar possibilidades de organização da prática pedagógica que instrumentalize
o professor em seu trabalho, de modo a garantir a todos os alunos, a aprendizagem e o
desenvolvimento em suas máximas potencialidades.
Para isso, primeiro discutimos no campo psicopedagógico os processos inter-
ventivos no espaço escolar; depois apresentamos sugestões de jogos como recursos de
trabalho pedagógico no ensino de matemática e, por fim, outras possibilidades tecnológicas
que poderão ser utilizadas nas ações de ensino a serem sistematizadas pelo professor.
Instituição de ensino:
Professor(a):
Aluno(a):
DN: Idade: Série/Ano: Nº de repetência:
Pai:
Mãe:
a. Queixa Principal (o professor relata os fa-
tores observados que têm contribuído para
as dificuldades do aluno em matemática).
EDUCAÇÃO INFANTIL
Aspectos a serem observados Registro das observações
1. Cita características dos objetos (cor, ta-
manho, espessura etc.)
2. Agrupa objetos por semelhanças.
3. Classifica objetos seguindo alguma quali-
dade proposta.
4. Compara objetos por semelhanças e/ou
diferenças.
5. Sabe diferenciar grande/pequeno, muito/
pouco, um, longo/curto, grosso/fino etc.).
6. Identifica dentro/fora, em cima/embaixo,
em frente/atrás, de um lado e do outro etc.).
7. Conta até quanto em ordem.
8. Reconhece figuras geométricas.
9. Relaciona número a quantidade.
10. Faz seriações e sequências seguindo
critérios propostos.
11. Compara quantidades (a mais, a menos,
igual etc.).
12. Resolve situações problemas conven-
cionais ou não (com desenhos, numerais,
oralmente etc.).
Fonte: as autoras.
O roteiro pode ainda conter outros aspectos investigativos do aluno, como o rela-
cionamento com os professores e colegas, se sabe esperar a vez de falar, realiza as tarefas
de casa e entrega nos prazos determinados, é apático ou inquieto, respeita regras, cons-
ciência corporal, organização de ideias, concentra-se na execução das tarefas escolares,
necessita de ajuda constante para executá-las, apresenta coordenação motora ampla e
fina adequadas, escreve de forma legível e outros aspectos relevantes do desenvolvimento
a serem considerados na investigação das aprendizagens matemáticas.
A partir dos dados levantados é possível traçar metas de aprendizagem ao aluno
e estratégias de ensino que demandam, muitas vezes, reorganização dos conteúdos, do
cotidiano escolar e especialmente da forma didática de ensinar os conteúdos e conceitos
selecionados para cada caso que se apresenta.
Isso porque cada aluno tem uma condição objetiva de vida que permeia a sua
relação com os diferentes fenômenos e, entre eles, os conceitos matemáticos. Por isso, é
importante solicitar a presença dos responsáveis pelo aluno na escola, para investigar a
vida cotidiana dele no convívio familiar e em outros espaços sociais.
DISCALCULIA E ACALCULIA
17. Organizar situações problema que mo- 17. Organizar situações problema aquém
tivam nos alunos o desejo de querer apren- do que o aluno é capaz de realizar, travando
der e que envolvam diferentes ações como, os seus avanços, pois ensinar aquilo que
por exemplo, classificar objetos do cotidiano ele não tem condições de aprender, é tão
em conjuntos; roupas que abotoam, objetos prejudicial quanto ensinar aquilo que ele já
que possuem simetria, calçados com cadar- sabe fazer sozinho (VIGOTSKI, 2000).
ço ou sem, objetos que carrega na mochila,
objetos que se usa na mesa nas refeições
etc.
18. Trabalhar jogos que explorem as rela- 18. Trabalhar jogos apenas como distração
ções numéricas e geométricas (grande/ e não ferramenta que movimenta o pensa-
pequeno; grosso/fino; largo/estreito; alto/ mento.
baixo etc.
19. Saber que para o discalcúlico ou 19. Utilizar a mesma estratégia ou encami-
acalcúlico, nada é óbvio, como pode ser nhamentos que para os outros alunos que
para alguns outros alunos que não têm não têm dificuldades com os conteúdos de
discalculia ou acalculia. matemática.
20. Promover situações de ensino em que 20. Desenvolver estratégias de ensino
discalcúlicos e acalcúlicos estabeleçam apenas individuais ou formar grupos de
relações de aprendizagem com seus pares trabalho entre os alunos com dificuldade em
mais desenvolvidos. aprender matemática como os discalcúlicos
e acalcúlicos.
Fonte: Bacelar (2017).
2.1. Jogo dos palitos: composto por um tabuleiro e dezesseis palitos, esse jogo
foi pensado para um jogador. O objetivo desse jogo é formar 3 quadrados, movimentando
apenas 4 palitos. Inicialmente, o jogador forma 5 quadrados utilizando os 16 palitos, con-
forme mostra a imagem. Depois, poderá movimentar somente quatro palitos para atingir o
objetivo. Os movimentos a serem realizados estão representados na imagem.
2.2. Tangram: esse jogo possui sete peças, entre elas um quadrado, um para-
lelogramo e cinco triângulos; e ainda uma cartela com diferentes figuras. Apesar de ser
indicado para um jogador, também pode ser desenvolvido por dois participantes, de modo
que ambos pensem em estratégias para alcançar o objetivo que consiste em formar um
quadrado com todas as peças.
Outro objetivo do jogo é utilizar as peças para formar as diferentes figuras pro-
postas nas cartelas (ou outras milhares que podem ser criadas), mas sem sobrepô-las,
ou seja, o(s) o aluno(s) poderão criar figuras inéditas, estimulando o desenvolvimento da
imaginação, do pensamento, da linguagem, da percepção, da atenção e outras funções
psíquicas superiores importantes nas aprendizagens matemáticas.
FIGURA 5 - TANGRAM
2.4. Botões matemáticos: Barreto (2012, p. 47) explica que esse jogo promo-
ve o desenvolvimento da “[...] habilidade de compreensão de sistema de numeração, a
coordenação motora e orientação espacial”. O professor solicita determinada quantidade e
cores de botões aos alunos, como, por exemplo, 15 botões verdes, uma dezena de botões
amarelos, meia dúzia de botões azuis, duas dúzias de botões divididas em 4 partes de
cores diferentes ou determinada quantidade dividida em 50% de uma cor e 50% de outra.
Aqui, além de trabalhar as quantidades e suas diferentes possibilidades de formação, o
professor também utiliza importantes termos matemáticos para orientar as ações.
Fonte: https://www.elo7.com.br/botoes-coloridos-para-roupas-e-artesanato-p/dp/EFEC13
Fonte: as autoras.
Esse jogo implica na participação de dois jogadores e têm como objetivo alcançar
o maior número de pontos. Para isso, os jogadores posicionam as trinta e cinco peças e o
curinga no tabuleiro, todas com as faces para cima. O jogador que começar a jogar, esco-
lhe se retira as peças posicionadas nas colunas (posição vertical) ou nas linhas (posição
horizontal) e, na primeira jogada, retira o curinga e uma peça que esteja na mesma linha ou
coluna (conforme a opção escolhida).
Na sequência, cada jogador, na sua vez, retira uma peça da coluna ou da linha da
qual foi retirada a última ficha. O jogo termina quando não tiver mais peças nas colunas
ou nas linhas e vence quem conseguir a maior soma dos números contidos nas peças,
lembrando que aqueles com sinais de adição (+) são somados e, aqueles com sinais de
subtração (–) são diminuídos no processo de contagem dos pontos.
Geralmente, os alunos tendem a escolher primeiro as peças com valor maior, mas
depois percebem (com as intervenções do professor) que é preciso criar estratégias para
conseguir o maior número de pontos e obstáculos para dificultar as jogadas do oponente.
2.6. A batalha: para jogar precisa das cartas de baralho de Às a 10 (ou confeccio-
nadas) e duplas de jogadores ou pequenos grupos. O objetivo é conquistar mais cartas.
As cartas são distribuídas entre os jogadores, uma para cada jogador em cada rodada. O
jogador que tirar a carta mais alta deve pegar todas as outras cartas do oponente para si.
Assim, essas ações se repetem em todas as jogadas até que todas as cartas já tenham
sido distribuídas. Se os jogadores retirarem cartas iguais, devem desempatar com a maior
carta a ser retirada na sequência.
Fonte: Pixabay
2.7. Jogo das sete cobras: nesse jogo utilizamos dois lápis, papel e dois dados.
Na folha de papel o aluno registra os numerais de 2 a 12. Cada jogador, na sua vez de jogar,
soma as quantidades sorteadas nos dados e marca um X no numeral que representa o
resultado. Se a soma das quantidades sorteadas tiver como resultado 7, o jogador desenha
uma cobra. Ganha quem marcar todos os números primeiro com o menor número de cobras
desenhadas.
Fonte: as autoras.
2.8. Jogo do detetive: esse jogo pode ser realizado em dois grupos e os materiais
utilizados são: dois jogos completos de blocos lógicos e um anteparo para esconder uma
das peças do grupo oponente. Cada equipe fica com um jogo de blocos lógicos e o jogo
poderá ser desenvolvido em quatro níveis:
a) nível 1: a equipe 1 escolhe uma peça e a esconde atrás do anteparo, enquanto a
equipe 2 organiza as peças dos blocos a sua frente e discute as estratégias que utilizarão,
por meio de perguntas, para descobrir qual peça a equipe oponente está escondendo. As
respostas da equipe 1 devem se limitar a SIM ou NÃO. Pode-se fazer quantas perguntas
necessárias, exemplo: é azul? Se a equipe 1 responder SIM, a equipe 2 mantém a peça,
mas, se a resposta for NÃO, a peça deve ser descartada. E assim segue até que a equipe
dois descubra a peça, invertendo as posições das equipes. Uma variante do jogo é marcar
o número de perguntas que cada equipe faz e ganha jogo quem fizer o menor número de
perguntas, mas, se chutar e errar, perde o jogo ou passa vez (SMOLE, 2000).
b) nível 2: os alunos podem olhar as peças do conjunto, mas não podem manipulá-
-las para descobrir qual é a peça escondida.
c) nível 3: os alunos devem descobrir qual é a peça escondida sem olhar para o
conjunto de blocos que dispõe na equipe.
d) nível 4: uma equipe esconde simultaneamente duas ou três peças, enquanto a
outra equipe deve descobrir quais são as peças ao mesmo tempo.
O professor pode pedir aos alunos para registrarem os pontos obtidos em cada
rodada. Para isso, os alunos podem utilizar o Quadro Valor de Lugar (QVL) como apoio,
pois o material dourado contempla o agrupamento e a troca, mas não o valor posicional dos
números.
Fonte: Slideplayer.
2.10. Fecha caixa com cartas: Nesse jogo, Moretti e Souza (2015) explicam que
os jogadores (de dois a cinco participantes) precisam de cartas numeradas de 1 a 9 e dois
dados. O objetivo consiste em desenvolver o cálculo mental e as primeiras ideias de adição.
Para jogar, as cartas devem ser colocadas sobre a mesa com os números à mostra. O
primeiro jogador lança os dados e soma os resultados das quantidades que aparecerem.
É notório o crescente avanço das novas tecnologias pelo mundo como ferramenta
no processo de ensino e aprendizagem. Essa realidade se amplia no contexto histórico atual
de pandemia da Covid-19 que estamos vivendo, que já impactou o processo de estudos de
cerca de 91% do total de alunos espalhados pelo mundo, segundo dados divulgados em
2020 pela Organização das Nações Unidas para a Educação (SAE DIGITAL, 2020).
Nesse cenário, não podemos ignorar que o uso das tecnologias é recorrente entre
professores e alunos na organização do ensino remoto emergencial e outras atividades e
eventos pedagógicos como lives, seminários, congressos e encontros formativos docentes.
Diante disso, percebemos que as ferramentas tecnológicas e os modos de usá-las, tornou-
-se forçosamente uma necessidade social que invadiu os processos educativos.
Por isso, precisamos usar conscientemente as tecnologias e fazer delas ferramen-
tas que possibilitam o acesso ao conhecimento científico e não à informação passageira
e esvaziada de sentido e significado; à aprendizagem de conceitos e não de notícias do
senso comum e aos processos de apropriação da cultura humana e não apenas como
passatempo e distração.
Pensando na tecnologia como prática pedagógica e, nessa discussão, como fer-
ramenta que possibilita instrumentalizar o professor para trabalhar com os alunos que têm
dificuldades com a matemática, os jogos virtuais devem ser explorados de forma contextua-
lizada, planejada e sistematicamente organizada para o ensino de matemática.
O jogo envolve as quatro operações e tem dois níveis de dificuldades que objetivam
ao aluno memorizar a tabuada, exercitar o cálculo mental, resolver problemas matemáticos
e estabelecer relação entre as operações.
Fonte: Zuzubalândia
Nesse jogo o aluno deve comparar duas imagens, aparentemente iguais, e encon-
trar sete diferenças entre elas. Essa situação de jogo desenvolve as ações de comparação,
percepção de semelhanças e diferenças; de análise das relações espaciais entre os objetos;
da memória de curto prazo e do pensamento abstrato.
Fonte: Zuzubalândia
Aqui o aluno deverá movimentar a abelha Zuzu e pegar as balas de mel espalhadas
pelo labirinto, sem ser pego pela aranha Garfídea. Assim como no jogo Labirinto Polar,
tem como objetivo estimular o raciocínio lógico e estratégico; noção espacial (lateralidade,
localização e direção); coordenação motora fina, atenção e concentração.
3.9 Dominó
3.10 Tangram
Esse jogo traz a opção de jogar com um colega ou com o próprio computador. O
objetivo é afundar as embarcações do adversário. Para isso, primeiro o aluno deve pla-
nejar as estratégias que utilizará para posicionar os seus navios em diferentes direções e
dificultar ser encontrado pelo adversário. Essas ações são importantes para a formação do
pensamento lógico matemático.
3.15 Robox
Vimos anteriormente que são muitas as possibilidades de jogos que podem ser
desenvolvidos em sala de aula, bem como uma ampla variedade de jogos virtuais que
podem ser utilizados como ferramenta pedagógica no ensino da matemática.
Ressaltamos que, antes de apresentar qualquer jogo e jogar com o aluno, em
especial aqueles que têm discalculia ou acalculia, precisamos saber se, além de o jogo
escolhido criar um ambiente de socialização, divertimento e interação com os pares mais
desenvolvidos, também promove a aprendizagem dos conceitos matemáticos e outros
conhecimentos que mobilizam a linguagem e o pensamento matemático.
Por isso, ao planejarmos a prática pedagógica por meio de jogo devemos:
a) fazer um levantamento dos jogos existentes;
b) analisar todas as possibilidades e recursos dos quais o jogo dispõe;
c) jogar antecipadamente (sem os alunos) para entender a dinâmica do jogo, sua
finalidade e dificuldades;
d) identificar quais conceitos matemáticos estão presentes no jogo;
e) identificar quais ações operacionais (comparação, classificação, análise, gene-
ralização etc.) são propostas no jogo;
f) reconhecer quais funções mentais (sensação, percepção, atenção, memória,
linguagem, pensamento, emoção e sentimento) o jogo desenvolve.
SAIBA MAIS
Chegamos ao fim de nossas discussões, mas não dos estudos em busca de am-
pliação e aprofundamentos das aprendizagens adquiridas até aqui.
Ao estudarmos sobre a importância do processo investigativo na escola dos alunos
que apresentam dificuldades para aprender os conceitos matemáticos, presentes nos mais
variados conteúdos dessa área do conhecimento, vimos que é preciso ter ética, responsabi-
lidade, compromisso e comprometimento com o percurso de estudos dos alunos enquanto
um sujeito integral.
Nesse percurso, aprendemos que nem todo aluno que tem dificuldade para apren-
der matemática é discalcúlico ou acalcúlico, assim como nem todo discalcúlico ou acalcúlico
tem dificuldade de lidar com as tarefas cotidianas que envolvem a linguagem matemática.
Diante disso, refletimos sobre as possibilidades de orientações para o professor, o
qual assume o papel de mediador consciente das aprendizagens que promovem o desen-
volvimento de todos os alunos, inclusive àqueles que têm discalculia ou acalculia.
Também discutimos sobre algumas ações interventivas que podem contribuir para
a participação dos responsáveis no processo de desenvolvimento dos alunos no convívio
familiar e situações do cotidiano, em que a linguagem está presente para resolver as mais
variadas situações problema da vida diária.
São nessas situações escolares e cotidianas que podemos potencializar a formação
e o desenvolvimento das funções psíquicas superiores, desde que as ações interventivas
nesses espaços façam sentido para o aluno, professores e seus familiares.
Assim, apresentamos os jogos e as ferramentas tecnológicas como importantes
recursos pedagógicos que contribuem no processo de ensino e aprendizagem dos alunos
com dificuldades para aprender matemática.
Para finalizar, esperamos que as discussões, encaminhamentos e sugestões
possam, de fato, contribuir com uma prática pedagógica significativa para o professor e
enriquecedora de aprendizagem e desenvolvimento para os alunos.
LIVRO
Título: Educação matemática nos anos iniciais do Ensino Funda-
mental: princípios e práticas pedagógicas
Autoras: Vanessa Dias Moretti e Neusa Maria Marques de Souza
Editora: Cortez
Sinopse: Com base nessa realidade, as autoras elaboram a
presente obra, cujo objetivo principal é oferecer a professores
e educadores dos três primeiros anos do Ensino Fundamental
respaldo teórico e metodológico para um ensino da Matemática
que seja incentivador de aprendizagem e possibilite às crianças o
desenvolvimento do pensamento teórico sobre os conceitos e as
noções referentes a essa disciplina.
FILME/VÍDEO
Título: O homem que viu o infinito
Ano: 2016
Sinopse: Esse filme conta a história real de Srinivasa Aiyangar
Ramanujan (1887-1920), um dos maiores gênios e mais influentes
matemáticos do século XX. De origem humilde e sem formação
acadêmica, ele contribuiu para a matemática com diversos traba-
lhos. Entre eles, estão a teoria dos números e séries infinitas.
DEHAENE, S. The number sense. Oxford, UK: Oxford University Press, 1997.
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nos e, o mais importante, compreendemos que nem sempre os estudantes que apresentam
dificuldade para aprender matemática tem discalculia ou acalculia, assim como nem todo
discalcúlico ou acalcúlico tem dificuldade com outras áreas do conhecimento ou situações
do cotidiano que envolvem os conceitos matemáticos.
A partir dessas discussões, na Unidade IV, apresentamos como pode ser realizado
o processo de investigação na escola para constatar a discalculia e acalculia e, juntos,
aprendemos que a causa pode envolver fatores multideterminados pelas condições de
vida dos estudantes. Também aprendemos como ocorrem os processos de investigação e
intervenções na escola e no ambiente familiar. Apresentamos o jogo como um dos recursos
que pode ser utilizado no ensino de matemática, além das versões virtuais que estimulam
por meio das novas tecnologias, ferramentas muito utilizadas na sociedade contemporânea
entre as crianças e adolescentes.
Para ilustrar as possibilidades de uso do jogo nos processos interventivos, ainda na
Unidade IV, selecionamos uma variedade de jogos que podem ser trabalhados em grupos
ou individualmente na sala de aula, no laboratório de informática, nas aulas de contraturno
ou outros espaços de ensino e aprendizagem.
Assim, chegamos até aqui e esperamos que você, assim como nós, tenha muitas
respostas acompanhadas de dezenas de perguntas, pois são as nossas e a suas inquieta-
ções que nos mobilizam a ressignificar o trabalho educativo, em especial o ensino de ma-
temática, por meio do conhecimento produzido historicamente e determinado socialmente.
Como pudemos ver, a maratona continua, mas, agora, com um jeito novo ou dife-
rente de caminhar, ou seja, com maior direcionamento na identificação das causas e con-
sequências dos transtornos ou distúrbios de aprendizagem da matemática, bem como nas
intervenções pedagógicas possíveis de serem realizadas nos ambientes escolar e familiar.
Abraço fraterno!
Profa. Me. Luciana e
Profa. Dra. Nelma
125
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