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Resumo
Durante toda sua obra, Freud concebe os processos psíquicos como derivados da atividade do cérebro.
Aqui é proposta uma reconstituição dos passos inferenciais (constituindo uma seqüência lógica e não cro-
QROyJLFDSRVVLELOLWDGRVSRUHVVDFRQFHSomRSVLFRQHXUDOTXHOHYDUDPVREDLQÀXrQFLDGRVIDWRVFOtQLFRV
DRFRQFHLWRSVLFDQDOtWLFRGHLQFRQVFLHQWH2VSURFHVVRVQHXUR¿VLROyJLFRVVXEMDFHQWHVDRSVtTXLFRGHYHP
SRVVXLUFRPSOH[LGDGHVX¿FLHQWHSDUDMXVWL¿FDUDVSURSULHGDGHVSVtTXLFDVFRQKHFLGDVSHODFRQVFLrQFLD3DUD
Freud, a consciência é uma espécie de percepção interna de processos psíquicos. Como a consciência não é
inerente a esses processos, torna-se natural imaginar que eles possam também ocorrer sem serem percebidos
(processos pré-conscientes). O conceito de inconsciente propriamente dito também se mostra tributário de
sua concepção psiconeural.
3DODYUDVFKDYHIUHXGPHWDSVLFRORJLDSUREOHPDPHQWHFpUHEURGXDOLVPRPRQLVPRLQFRQVFLHQWH
Abstract
The genesis of the Freudian concept of the unconscious.$ORQJDOOKLVZRUNV)UHXGFRQFHLYHVRISV\FKLFDO
SURFHVVHVDVGHULYHGIURPWKHDFWLYLW\RIWKHEUDLQ:HRIIHUKHUHDUHFRQVWUXFWLRQRIWKHLQIHUHQWLDOVWHSV
PDNLQJXSDORJLFDODQGQRWDFKURQRORJLFDOVHTXHQFHPDGHSRVVLEOHE\WKLVSV\FKRQHXUDOFRQFHSWLRQWKDW
KDYHOHGXQGHUWKHLQÀXHQFHRIFOLQLFDOIDFWVWRWKHSV\FKRDQDO\WLFDOFRQFHSWRIWKHXQFRQVFLRXV1HXUR-
SK\VLRORJLFDOSURFHVVHVXQGHUO\LQJSV\FKLFDOUHDOLW\PXVWSRVVHVVHQRXJKFRPSOH[LW\WRMXVWLI\WKHSV\FKLFDO
SURSHUWLHVNQRZQE\FRQVFLRXVQHVV$FFRUGLQJWR)UHXGFRQVFLRXVQHVVLVDVRUWRILQWHUQDOSHUFHSWLRQRI
SV\FKLFDOSURFHVVHV$VFRQVFLRXVQHVVLVQRWLQKHUHQWWRWKHVHSURFHVVHVLWLVQDWXUDOWRLPDJLQHWKDWWKH\
PD\DOVRRFFXUZLWKRXWEHLQJSHUFHLYHGSUHFRQVFLRXVSURFHVVHV7KHFRQFHSWRIWKHXQFRQVFLRXVSURSHUO\
VDLGDOVRDSSHDUVDVGHSHQGHQWRQWKLVSV\FKRQHXUDOFRQFHSWLRQ
.H\ZRUGVIUHXGPHWDSV\FKRORJ\PLQGEUDLQSUREOHPGXDOLVPPRQLVPXQFRQVFLRXV
E
PWUDEDOKRDQWHULRUPRVWUDPRVTXHDRFRQWUiULRGRTXH jFRQFHSomRGHXPDSDUHOKRSVtTXLFRFRPH[WHQVmRHVSDFLDO
muitas vezes se pensa, Freud sempre manteve a concep- originando o ponto de vista tópico da teoria psicanalítica (Go-
ção de que os processos psíquicos dependem do funcio- mes, 2005).
namento do cérebro (Gomes, 2005). Citações cobrindo toda sua 1RSUHVHQWHWUDEDOKRGLVFXWLUHPRVRSDSHOHVSHFt¿FRGHVVD
REUD)UHXGDDD concepção sobre a relação mente-cérebro no desenvolvimento
EEF GRFRQFHLWRIUHXGLDQRGHLQFRQVFLHQWH1XPPRPHQWRGHJUDQGH
EPRVWUDPTXH desenvolvimento das neurociências e de questionamento sobre
Freud sempre considerou a atividade psíquica como tendo fun- as relações entre neurociências e psicanálise, evidencia-se a
GDPHQWRQRVSURFHVVRVQHXUR¿VLROyJLFRVGRFpUHEUR relevância da questão proposta.
Discutimos também as conseqüências desta concepção do
SVtTXLFRFRPRIXQGDPHQWDGRQXPVXEVWUDWRQHXUR¿VLROyJLFR 2LQFRQVFLHQWHQDQHXUR¿VLRORJLDGRVpFXOR;,;
Em primeiro lugar, destacamos a adesão ao pensamento causal A criação por Freud de uma teoria do inconsciente é muitas
em que esta posição implica. Inegavelmente, a pressuposição vezes vista como uma ruptura em relação às tentativas de sua
do determinismo psíquico é um dos componentes essenciais época de explicar os fenômenos psíquicos pelo funcionamento
da teoria freudiana. Em segundo lugar, lembramos o aspecto GRFpUHEUR0DUFHO*DXFKHWHPVHXOLYUR/¶LQFRQVFLHQWFpUp-
quantitativo presente em todos os aspectos de sua teoria, e que bral RSHUD XPD PRGL¿FDomR FRPSOHWD GHVVH TXDGUR
decorre diretamente da suposição de um fundamento material (OHPRVWUDFRPRDQHXUR¿VLRORJLDGRVpFXOR;,;WLQKDGHIDWR
dos processos mentais. Finalmente, a suposição de que o sistema DEHUWRRFDPLQKRSDUDRFRQFHLWRIUHXGLDQRGHLQFRQVFLHQWH,VVR
nervoso é responsável pela atividade anímica leva naturalmente não quer dizer que este estivesse de alguma forma presente ou
32 G.Gomes
RFXOWRQDVIRUPXODo}HVGRVQHXUR¿VLRORJLVWDVFRPRSRGHULDP 3DUDRXWURVFRPR3ÀJHURX/HZHVDXQLGDGHSVLFRQHXUDOWHUi
ID]HUSHQVDUDVSURSRVWDVPHQRVULJRURVDVGH/DQFHORW:K\WH como conseqüência uma extensão das qualidades da consciência
em seu livro The unconscious before Freud (1960). VHQVLELOLGDGHHYRQWDGHDRVSUySULRVUHÀH[RV*DXFKHW
Sem negar a originalidade de Freud, é preciso, entretanto, 3DUD)UHXGHODOHYRXjSRVVLELOLGDGHGHSHQVDUXPDYRQWDGHLQ-
UHFRORFDUDFULDomRGDSVLFDQiOLVHHPVHXFRQWH[WRKLVWyULFR1R FRQVFLHQWHUHSUHVHQWDo}HVLQFRQVFLHQWHVSHQVDPHQWRVGHVHMRV
FDVR*DXFKHWID]XPDDQiOLVHGHWDOKDGDGHWRGRXPVHWRUGHVVH HFRQÀLWRVLQFRQVFLHQWHV
FRQWH[WRKLVWyULFRKiPXLWRWHPSRHVTXHFLGRRXLJQRUDGRR
GDVGLVFXVV}HVGRVQHXUR¿VLRORJLVWDVHQHXURORJLVWDVGDpSRFD
Passos inferenciais para a elaboração do conceito
sobre o inconsciente, concebido ainda sob a perspectiva da teoria freudiano de inconsciente
GRVUHÀH[RVPDVWHQGRGHTXDOTXHUIRUPDRHIHLWRGHTXHEUDU Confrontando a teoria freudiana do inconsciente com sua
muito efetivamente a concepção tradicional do papel central da concepção sobre a relação mente-cérebro, podemos reconstituir
FRQVFLrQFLDHGDYRQWDGHFRQVFLHQWH1mRHUDDLQGDRFRQFHLWR os seguintes passos inferenciais como etapas lógicas que levaram
freudiano que estava presente, mas sim toda uma problemática – em colaboração com outros fatores, sem dúvida – ao conceito
que estava claramente colocada, todo um novo campo do “pen- IUHXGLDQRGHLQFRQVFLHQWH
ViYHO´TXHHVWDYDDEHUWRFRPRGL]*DXFKHW Primeiro passo. Se os fenômenos psíquicos conscientes têm
Desse ponto de vista, podemos encontrar um sentido no um substrato neural, os processos neurais que constituem esse
fato de a psicanálise não ter sido criada por um psicólogo ou substrato devem ter as características dos fenômenos psíquicos
XP¿OyVRIRPDVVLPSRUXPQHXURORJLVWD(YLGHQWHPHQWHHVVD LVWRpFDUDFWHUtVWLFDVTXHOKHVSHUPLWDPVHUFRQVLGHUDGRVFRPR
SUREOHPiWLFDQHXUR¿VLROyJLFDGR³LQFRQVFLHQWHFHUHEUDO´QmRIRL UHSUHVHQWDo}HVGHVHMRVDIHWRVSHQVDPHQWRVHWF
o único fator que propiciou a criação do conceito psicanalítico de Segundo passo. Se existem processos neurais que funcio-
LQFRQVFLHQWH$TXHVWmRFOtQLFDGDVQHXURVHVMiEHPGLVWLQJXL- nam como os processos psíquicos de que temos consciência,
das dos outros quadros clínicos de que os neurologistas deviam SRGHHQWmRKDYHUSURFHVVRVQHXUDLVTXHIXQFLRQDPGDPHVPD
FXLGDURVSUREOHPDVGRKLSQRWLVPRDWHRULDGDHYROXomRQD PDQHLUDPDVVHPFRQVFLrQFLDSHQVDPHQWRVGHVHMRVHWFSUp
ELRORJLDWRGRVHVVHVIDWRUHVFRPRPRVWUD*DXFKHWIRUDPYH- conscientes).
WRUHVFXMDFRQYHUJrQFLDFRQVWLWXLXXPD³HQFUX]LOKDGD´P~OWLSOD Terceiro passo. Se existem processos neurais com todas
QRXQLYHUVRFXOWXUDOGDVHJXQGDPHWDGHGRVpFXOR;,;FULDQGR as características do psíquico consciente menos a consciência,
2
as condições de emergência do conceito freudiano. SRGHHQWmRKDYHURXWURVSURFHVVRVQHXUDLVFRPDOJXPDVGHVVDV
7DPEpPGHHVSHFLDOLQWHUHVVHSDUDFRPSUHHQGHUDLPSRUWkQ- características (as que permitem caracterizá-los como repre-
FLDGRSHQVDPHQWRQHXUROyJLFRHQHXUR¿VLROyJLFRQDIRUPDomR VHQWDo}HV GHVHMRV SHQVDPHQWRV OHPEUDQoDV HWF PDV VHP
GH)UHXGpRSRXFRGLYXOJDGROLYURGH3HWHU$PDFKHUFreud’s algumas outras (negação lógica, contradição, temporalidade,
QHXURORJLFDO HGXFDWLRQ DQG LWV LQÀXHQFH RQ SV\FKRDQDO\WLF consideração da realidade, etc.).3
WKHRU\ 1HOH SRGHPRV YHU FODUDPHQWH FRPR DXWRUHV 3URSRQKRHVVHVSDVVRVFRPRXPDVHTrQFLDlógicaVXEMD-
FRPR %UFNH 0H\QHUW H ([QHU TXH IRUDP SURIHVVRUHV GH cente ao desenvolvimento do conceito freudiano, e não como
Freud, pensavam questões muito próximas às que moldaram o uma sucessão de formulações que o autor deveria ter enunciado
pensamento desse último. H[SOLFLWDPHQWHHFURQRORJLFDPHQWH1mRSUHWHQGRDOpPGLVVR
TXHRFRQFHLWRSVLFDQDOtWLFRGHLQFRQVFLHQWHVHMDRVLPSOHVUHVXO-
Conseqüências da concepção psiconeural tado de uma inferência lógica a partir de certos pressupostos. É
A busca de entender os fenômenos psíquicos como derivados claro que ele resultou também de questões clínicas e teóricas com
da atividade cerebral, entretanto, pode levar a diferentes tipos de DVTXDLV)UHXGDFKDYDVHFRQIURQWDGR2TXHSUHWHQGRPRVWUDU
conseqüências na elaboração de uma teoria explicativa. O notável é como a resposta que deu a essas questões foi atingida por um
HP)UHXGpTXHVXDFUHQoDQHVVDEDVH¿VLROyJLFDGRVIHQ{PHQRV FDPLQKRTXHQHFHVVLWRXGHVVDVSUHVVXSRVLo}HV
SVtTXLFRVQmRRFRQGX]LXDDSOLFDUDHVWHVRVFRQFHLWRVGD¿-
VLRORJLD±FRPRWRGRVDTXHOHVTXHQRVpFXOR;,;FRQVWUXtUDP Processos neurais com características de processos
VXDVWHRULDVGR³LQFRQVFLHQWHFHUHEUDO´VREUHRPRGHORGRUHÀH[R psíquicos
*DXFKHW0XLWRDRFRQWUiULRpVXD³QHXUR¿VLRORJLD´TXH Antes de tudo, o que importa constatar é que a suposição de
vai incorporar os conceitos do psíquico, como representação, processos neurais possuidores das características dos processos
GHVHMRDIHWRSUD]HUDQJ~VWLDSHQVDPHQWRHWF,VWRMiDSDUHFH SVtTXLFRV IRL D FRQGLomR SDUD IRUPXODU D KLSyWHVH GH XP LQ-
muito claramente no Projeto, de 1895. Mais tarde, ele abandonou consciente que é verdadeiramente psíquico, e não simplesmente
DVKLSyWHVHVHVSHFt¿FDVVREUHRVPHFDQLVPRVQHXUDLV0DVRTXH UHÀH[R FRPR R SURSRVWR SRU RXWURV DXWRUHV 3RU RXWUR ODGR
HVWiSUHVHQWHGHVGHRLQtFLRDWpR¿PpDLGpLDGHTXHRVSURFHVVRV como ele é concebido como constituído por processos naturais,
QHXUDLVGHEDVHTXDLVTXHUTXHVHMDPGHYHPFRPSRUWDUWRGDD isso permite considerá-lo como dependente de mecanismos
riqueza dos processos psíquicos. causais que podem ir além daquilo que se costumava atribuir
3DUDUHÀH[RORJLVWDVUHGXFLRQLVWDVFRPR0DXGVOH\RX6H- DRVSURFHVVRVSVtTXLFRVDSDUWLUGRFRQKHFLPHQWRGHVWHVSHOD
WFKrQRYDFRQFHSomRQHXUDOGRSVtTXLFROHYRXjHOLPLQDomRGD consciência. Sem essa pressuposição de processos neurais
vontade consciente e à substituição dos princípios explicativos com características psíquicas, o inconsciente se mostraria ou
derivados da consciência de si e dos outros pelos princípios desprovido das características dos fenômenos psíquicos, ou tão
H[SOLFDWLYRV GD ¿VLRORJLD UHÀH[R H[FLWDomR LQLELomR HWF dependente dessas que seria impossível concebê-lo como consti-
Conceito freudiano de inconsciente 33
será mesmo preciso ir contra as facilitações presentes (Freud, SRVVtYHO IDODU HP UHSUHVHQWDo}HV SHQVDPHQWRV H GHVHMRV QmR
SHpReu que tornará isso possível (p. conscientes. Como, nessa etapa, são pensados processos não
9HUL¿FDPRVTXHQmRVmRVLPSOHVUHÀH[RVRXDVVRFLDo}HV conscientes que têm as mesmas propriedades dos processos
que vêm tomar o lugar do pensamento. Ao contrário, Freud se FRQVFLHQWHVWHPRVDTXLRVSURFHVVRVFKDPDGRVSRU)UHXGGH
esforça para construir um modelo neural do pensamento que pré-conscientes. (Segundo passo inferencial).
possa representar as características psicológicas do próprio pen- 3RGHVHSHUFHEHUDTXLTXHDFRQFHSomRSVLFRQHXUDOQmRpGH
VDPHQWRWDOFRPRHOHQRVpGDGRDFRQKHFHUSHODFRQVFLrQFLD todo indispensável a esse segundo passo inferencial, que pode
mas nem por isso limitando-o ao que essa revela). VHUMXVWL¿FDGRXQLFDPHQWHSHODWHRULDGDFRQVFLrQFLD7RGDYLD
essa concepção o torna mais fácil de realizar.
O papel da consciência nos processos psíquicos Em relação a esse segundo passo, podemos relembrar esta
É preciso considerar também qual é a teoria freudiana da passagem do Projeto
consciência. Isso importa, aqui, pois o problema mente-cérebro
7UDWDPRVRVSURFHVVRVSVtTXLFRVFRPRDOJRTXHSRGHULDGLV-
é antes de tudo o problema mente consciente-cérebro (Gomes,
SHQVDU HVVH FRQKHFLPHQWR SHOD FRQVFLrQFLD DOJR TXH H[LVWH
1995). É só secundariamente que se coloca o problema da relação
independentemente dela. Estamos preparados para descobrir
entre o psíquico inconsciente e o cérebro. Duas concepções sobre
TXHDOJXPDVGHQRVVDVVXSRVLo}HVQmRVmRFRQ¿UPDGDVSHOD
DFRQVFLrQFLDSRGHPVHURSRVWDV8PDFRQVLGHUDTXHDTXDOLGDGH
consciência. Se não nos deixarmos cair em erro nisso, eis o que
da consciência é intrínseca a todos os processos psíquicos. Mes-
VHVHJXHjSUHVVXSRVLomRGHTXHDFRQVFLrQFLDQmRGiXPFRQKH-
mo se restringirmos essa tese a uma parte somente dos processos
FLPHQWRFRPSOHWRQHPGLJQRGHFRQ¿DQoDVREUHRVSURFHVVRV
psíquicos, o importante aqui é ser a consciência considerada por
QHXURQDLVHVVHVSURFHVVRVGHYHPVHUFRQVLGHUDGRVGHLQtFLRH
esse ponto de vista como intrínseca a eles. A outra concepção
em toda sua extensão, como inconscientes, e devem ser inferidos
considera que a consciência é um evento mental distinto, que
FRPRRXWUDVFRLVDVQDWXUDLV)UHXGS
WHPFHUWRVSURFHVVRVSVtTXLFRVFRPRVHXREMHWReSRUWDQWR
uma propriedade relacional (pois envolve a relação entre dois Isso quer dizer que mesmo os processos psíquicos que são
HVWDGRVPHQWDLVHQmRXPDSURSULHGDGHLQWUtQVHFD5RVHQWKDO REMHWRGDFRQVFLrQFLDVmRFRQFHELGRVFRPRWHQGRXPDQDWXUH]D
*RPHV(VWDVHJXQGDFRQFHSomRpVHPG~YLGDD TXHQmRpQHPFRPSOHWDPHQWHQHPFHUWDPHQWHFRQKHFLGDSHOD
de Freud (Gomes, 2003). consciência.
-DPHV6WUDFKH\DFUHVFHQWDXPDQRWDQRSRQWRFRUUHVSRQ-
a consciência (...) é excitável (...) a partir (...) do sistema da per-
dente da Standard Edition (Freud, 1950/1966b, p. 308), dizendo
FHSomRHPSULPHLUDOLQKDHHPVHJXLGDDSDUWLUGDVH[FLWDo}HV
TXHD~OWLPDD¿UPDomRGDSDVVDJHPFLWDGDUHIHUHVHD³HQWLGDGHV
de prazer e desprazer (...) Mas (...) a consciência (...) tornou-se
¿VLROyJLFDV” e que será preciso um certo tempo para que o autor
também um órgão sensorial para uma parte de nossos processos
possa repeti-la, em A interpretação dos sonhos (1900/1982a, p.
GRSHQVDPHQWR)UHXGDS
580), em relação a “eventos psíquicos´2UD¿FDFODURTXHp
5RVHQWKDOSREVHUYDTXHHVVDFRQFHSomRQmR XPDFRQFHSomRGXDOLVWDTXHLPSHGH6WUDFKH\GHYHUTXH)UHXG
implica necessariamente numa teoria materialista do psíquico. Mi IDOD DTXL GH HYHQWRV SVtTXLFRV ± OHPEUHPRV R LQtFLR GD
Mas ela se adapta bem à tese da identidade psiconeural, ou dos SUySULDSDVVDJHPFLWDGD³7UDWDPRVRVSURFHVVRVSVtTXLFRV´
dois aspectos. 3RGHPRVOHPEUDUWDPEpPTXHHPRXWUDSDVVDJHPGRProjeto
Se queremos de fato estimar o papel da concepção de Freud )UHXGSSHOHHVFUHYH³SURFHVVRDQtPLFR
sobre a relação mente-cérebro na gênese do conceito psicana- ¿VLROyJLFR´ ³SK\VLRORJLVFKHU 6HHOHQYRUJDQJ”) – o que para
lítico de inconsciente, devemos relacionar essa concepção com outros seria uma contradictio in adjecto.
sua teoria da consciência. Se a consciência inclui a percepção Vimos que a concepção psiconeural não é, em realidade,
GHSURFHVVRVSVtTXLFRVTXHFRUUHVSRQGHPDSURFHVVRVQHXUR¿- indispensável ao segundo passo inferencial, se bem que o
VLROyJLFRVHQWmRHVVHVSURFHVVRVQHXUR¿VLROyJLFRVGHYHPSRGHU torne mais natural. É preciso, entretanto, que os processos não
dar conta da complexidade dos processos psíquicos percebidos FRQVFLHQWHVDRVTXDLVFKHJDPRVVHMDPSHQVDGRVHPWHUPRVGH
pela consciência. Isso quer dizer que categorias psicológicas de- VHXVXEVWUDWRQHXUDOSDUDSRGHUDFHGHUDRWHUFHLURSDVVR3DUD
ULYDGDVGDFRQVFLrQFLDGHVLPHVPRGHVHMRDIHWRSHQVDPHQWR essa terceira etapa lógica, assim como para a primeira, essa
etc.) devem ser, numa certa medida, aceitas e não consideradas concepção será fundamental. É a possibilidade de pensar os
FRPRSXUDPHQWHLOXVyULDVHTXHVHGHYHVXSRUTXHRVSURFHV- processos psíquicos em termos de algo que não é puramente
VRV QHXUR¿VLROyJLFRV TXH VmR VHX IXQGDPHQWRGHYDPSRVVXLU SVtTXLFRPDVWDPEpP¿VLROyJLFRTXHGDUiD)UHXGDOLEHUGDGH
PHFDQLVPRVGHXPDFRPSOH[LGDGHVX¿FLHQWHSDUDMXVWL¿FiODV de pensar a possibilidade de processos psíquicos que, além do
mesmo se essa complexidade ultrapassa largamente o que é fato de não serem conscientes, não têm todas as características
FRQKHFLGRSHODQHXUR¿VLRORJLDGHVHXWHPSR3ULPHLURSDVVR GRVIHQ{PHQRVSVtTXLFRVDRVTXDLVHVWDPRVKDELWXDGRV3URFHV-
inferencial descrito acima). sos que, ao contrário, têm propriedades bem diferentes, mesmo
Como a consciência não é uma qualidade inerente aos pro- FRQVHUYDQGRDFDUDFWHUtVWLFDGHVHUHPSVtTXLFRVRXVHMDQmRVH
cessos psíquicos que são conscientes, mas sim uma percepção UHGX]LQGRDRVVLPSOHVPHFDQLVPRVUHÀH[RVGDQHXUR¿VLRORJLD
desses processos, torna-se natural imaginar que os processos GHVXDpSRFD2IDWRGHTXHHVWDHUDLQVX¿FLHQWHSDUDVXDVQH-
percebidos pela consciência possam também ocorrer sem serem FHVVLGDGHVRREULJRXDLQYHQWDUXPDQHXUR¿VLRORJLDRProjeto)
6
percebidos. A consciência torna-se, assim, contingente, e será TXHPXLWRVSRGHPTXDOL¿FDUFRPR¿FFLRQDO0DVDGLVWkQFLD
Conceito freudiano de inconsciente 35
Notas
1
$VSDVVDJHQVUHOHYDQWHVWUDGX]LGDVHQFRQWUDPVHHP*RPHV1RSUHVHQWHDUWLJRDVUHIHUrQFLDVD)UHXGIRUDP
feitas pela fonte utilizada em cada caso, dando-se preferência à referência ao original quando este foi confrontado com
as traduções disponíveis. Em alguns casos, em que nem todas as citações foram confrontadas ao original, ou quando foi
IHLWDUHIHUrQFLDDXPDQRWDGRWUDGXWRUWDQWRDWUDGXomRTXDQWRRRULJLQDOIRUDPOLVWDGRVVHQGRDUHIHUrQFLDHVSHFt¿FD
à fonte utilizada no caso. As citações literais foram traduzidas para o português pelo autor. Adotamos a convenção de
indicar a obra pelo ano da publicação original seguido pelo da publicação consultada.
2
$ HVVHV IDWRUHV SRGHUtDPRV DLQGD DFUHVFHQWDU D FRQVLGHUiYHO DWHQomR GDGD SRU DXWRUHV GR VpFXOR ;,; j H[SOLFDomR
SVLFROyJLFDRXQHXUR¿VLROyJLFDGRVVRQKRV9HMDVHDHVWHUHVSHLWRRVQXPHURVRVWUDEDOKRVSXEOLFDGRVQRSHUtRGRGH
DTXHVmRFLWDGRVSRU)UHXGDQRSULPHLURFDStWXORRXVyQDELEOLRJUD¿DGH$,QWHUSUHWDomR
dos Sonhos.
3
A ausência de negação lógica, de contradição, de temporalidade e de consideração da realidade, nos processos do in-
consciente propriamente dito, é discutida na parte 5 de 2,QFRQVFLHQWH (Freud, 1915/1982c).
0HVPRDVVLPQRTXHGL]UHVSHLWRD0H\QHUWREVHUYHPRVTXHRFRQFHLWRGHUHSUHVHQWDomRDOYRTXHWHUiXPLPSRUWDQWH
SDSHOQDWHRULDIUHXGLDQD)UHXGDFDStWXORSDUWH(MiHVWiSUHVHQWHQHVVHDXWRUFLWDGRSRU$PDFKHU
1965, p. 39).
5
(VWHWUDEDOKRSXEOLFDGRSHODSULPHLUDYH]HPRQ]HDQRVDSyVDPRUWHGRDXWRUIRLUHGLJLGRHP
6
8PSURFHVVRFRQVFLHQWHSDUD)UHXGpXPSURFHVVRSVtTXLFRTXHpSHUFHELGRSHODFRQVFLrQFLD(VWDQmRpSRUWDQWR
algo inerente ao próprio processo, mas algo que se acrescenta a ele.
Lembremos que o autor usa Seele e 3V\FKH, e seelischer e SV\FKLVFKHU, respectivamente, como sinônimos (podendo ser
traduzidos como alma e psique, e anímico e psíquico, respectivamente).