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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS


FACULDADE DE DIREITO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
PCI (Minter) UERJ/TJRO-EMERON/MPRO

A ATUAÇÃO DO SISTEMA INTERAMERICANO DE PROTEÇÃO DOS


DIREITOS HUMANOS NO CONTROLE DA SUPERPOPULAÇÃO
CARCERÁRIA

Projeto de pesquisa apresentado por


Laís Reis Teixeira

2022
RESUMO:

Os presídios brasileiros estão superlotados, não possuem estruturas física e


funcional adequadas, gerando, ao invés da promessa de garantia de segurança, integridade
e recuperação da pessoa presa, a violação de vários direitos desta. Nesse cenário, a
presente pesquisa como objetivo analisar a falência do modelo punitivo brasileiro,
principalmente quanto a aplicação da pena privativa de liberdade a partir da análise de
denúncias feitas perante o Sistema Interamericano de Direitos Humanos, envolvendo
questões como a superlotação dos presídios e casos de violações de direitos fundamentais
dos presos pelo Estado brasileiro, discutindo-se, em especial, como a Corte
Interamericana, tem agido para contribuir para o controle da população carcerária,
principalmente por meio de medidas provisórias.

Palavras-Chaves: Superlotação. Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Corte


Interamericana de Direitos Humanos. Medidas provisórias.
SUMÁRIO:

RESUMO: ..................................................................................................................................... 2
1. TEMA-PROBLEMA: ........................................................................................................... 4
2. JUSTIFICATIVA, HIPÓTESE E INOVAÇÕES PRETENDIDAS NA PESQUISA .......... 5
3. OBJETIVO GERAL ............................................................................................................. 7
4. OBJETIVOS ESPECÍFICOS ................................................................................................ 7
5. FONTES DA PESQUISA ..................................................................................................... 8
6. METODOLOGIA ................................................................................................................. 9
6.1 Pressupostos conceituais e marco teórico ............................................................................. 10
6.2 Estado da Arte ....................................................................................................................... 11
6.3 Variáveis e indicadores ......................................................................................................... 13
6.4 Tipos de pesquisa .................................................................................................................. 13
6.5 Cronograma ........................................................................................................................... 14
7. REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 15
1. TEMA-PROBLEMA:
A questão carcerária no Brasil e na América Latina apresenta diversos problemas
que se reiteram no tempo e, um deles, sem dúvida alguma é a superlotação carcerária.
Conforme pesquisa desenvolvida pela Sociedade de Criminologia Latino-Americana1,
três em cada quatro sistemas prisionais na América Latina estão superlotados, dentre eles,
o Brasil, que é o país com a terceira maior população carcerária do mundo2, registrando,
no ano de 2021, conforme dados coletados junto ao DEPEN3, um total de 679.687 pessoas
privadas de liberdade, com 490.024 vagas disponíveis, resultando, assim, um déficit de
189.663 vagas, observando que o STF, apreciando a ADPF 3474, por conta das mazelas
identificadas, declarou Estado de Coisas Inconstitucional no sistema penitenciário
brasileiro.
Conforme DIAS (2017), a superlotação leva à precarização dos estabelecimentos
prisionais, inclusive dos serviços prestados e dos produtos de primeira necessidade que o
Estado tem o dever de garantir aos custodiados. Com ela, desenvolve-se um ciclo perverso
dentro das cadeias, pois, com celas superlotadas, presos ficam amontoados e passam a
lutar por espaços, o que gera conflito permanente, em um círculo vicioso. Com isso, a
própria relação entre presos e agentes penitenciários torna-se ainda mais precária e, assim,
a simples retirada de um interno transforma-se em missão perigosa, posto que os agentes
penitenciários ficam mais expostos à ira dos prisioneiros. Isso implica, invariavelmente,
na redução de diversos direitos do apenado, como exemplo a redução de banho de sol, de
saídas para estudo e trabalho, diminuindo também o tempo destinado à visitação de
familiares. Assim, pode-se dizer que a superlotação carcerária é a mãe de quase todos os
problemas que afligem o sistema carcerário, em especial o brasileiro (Nesse sentido, ver:
TEIXEIRA, 2008).
Como bem demonstram JAPIASSÚ e FERREIRA (2020)5, além de se configurar
um quadro grave de violação de direitos fundamentais, as taxas de ocupação elevadas e a

1
Disponível em https://drive.google.com/file/d/1n8Y9R7KhRit2D7xqoj46KiS46hR1-Q__/view
2
segundos dados coletados junto ao World Prision Brief. Disponível em
https://www.prisonstudies.org/highest-to-lowest/prison-population-total?field_region_taxonomy_tid=All
Acesso em 23/02/2022
3
De acordo com o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), com dados até julho de 2021. Disponível
em
https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiYWIxYjI3MTktNDZiZi00YjVhLWFjN2EtMDM2NDdhZDM5
NjE2IiwidCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9
4
STF. ADPF 347. Processo 0003027-77.2015.1.00.00000. Rel. Min. Marco Aurélio.
5
JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano; FERREIRA, Ana Lúcia Tavares. Superpopulação carcerária e
Sistemas Internacionais de Direitos Humanos. Revista Brasileira de Ciências Criminais. vol. 164. ano 28.
p. 159-197. São Paulo: Ed. RT, fevereiro 2020.
precariedade das condições de detenção impossibilitam, via de regra, que o Estado
garanta a segurança no ambiente prisional. A falta de segurança no cárcere resulta, por
sua vez, na lesão aos bens jurídicos cuja proteção justifica e legitima o próprio direito
penal e, mais especificamente, implica na frustração das finalidades da pena.
Diante dessa situação precária nos estabelecimentos penitenciários, o Brasil foi
alvo de várias denúncias perante a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos
Humanos, que integram o Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos
(que é o sistema regional aplicável ao Estado brasileiro por força do Decreto n. 678, de 6
de novembro de 1992) e que resultaram em mais de 40 medidas provisórias que
determinaram a redução das graves violações de direitos humanos nas diversas unidades
prisionais brasileiras.
Dentre as unidades prisionais brasileiras processadas perante a Corte
Interamericana que foram alvo de medidas provisórias, posso citar: Caso Penitenciária
Urso Branco/RO; Caso do Complexo Penitenciário de Curado/PE; Caso do Complexo
Penitenciário de Pedrinhas/MA; Caso Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho/RJ; Caso
Complexo do Tatuapé da FEBEM/SP; Penitenciária “Dr. Sebastião Martins Silveira/SP;
Caso da Unidade de Internação Socioeducativa/ES
Nesse contexto, a presente pesquisa pretende discutir a precariedade do sistema
prisional brasileiro quanto à aplicação da pena privativa de liberdade, a partir do histórico
dos casos de violações dos direitos humanos contra pessoas privadas de liberdade
denunciados no Sistema Interamericano de Direitos Humanos, que resultaram em
medidas provisórias na Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Assim sendo, a pergunta de pesquisa será: como e de que forma o Sistema
Interamericano de Direitos Humanos, em especial, a Corte Interamericana de Direitos
Humanos, tem contribuído para o controle da superpopulação carcerária brasileira?

2. JUSTIFICATIVA, HIPÓTESE E INOVAÇÕES PRETENDIDAS NA


PESQUISA
Mesmo diante da existência de normas protetivas, tanto a nível nacional, como
internacional, o dever de preservar os direitos humanos no âmbito do sistema prisional
brasileiro não tem sido devidamente cumprido pelo Estado. E esse fato resta evidenciado,
na seara internacional, pela atuação da Corte Interamericana de Direitos Humanos, em
decorrência das conhecidas e tão noticiadas violações a esses direitos.
A análise da atuação do Sistema Interamericano de Direitos Humanos no controle
da superlotação carcerária e, consequentemente, na proteção dos direitos das pessoas
privadas de liberdade no Brasil é relevante porque o Brasil, de acordo com dados
coletados junto ao World Prision Brief, é um dos países que mais se utiliza da prisão no
mundo, ocupando assim a 14ª posição no ranking do índice carcerário com uma taxa de
381 presos por 100 mil habitantes, destacando que apenas 16 países, dentre um universo
de 223, somam uma população carcerária acima de 100.000 presos.
Assim, aparentemente, o Brasil elegeu a pena privativa de liberdade como
principal mecanismo de punição e recuperação dos criminosos e, sendo essa a principal
forma de punição, para que ela possa ser aplicada é necessário que as instituições
encarregadas de sua execução observem a adequação aos padrões mínimos estabelecidos
pela comunidade internacional para o tratamento de pessoas privadas de liberdade, bem
como não configurem pressupostos de penas cruéis, degradantes e desumanas, em atenção
à Convenção Americana de Direitos Humanos e Constituição Federal brasileira.
Minha hipótese é que, apesar do país demonstrar internacionalmente seu interesse
em preservar e legitimar os direitos dos presos, a alta taxa de medidas provisórias
determinadas pela Corte aos presídios brasileiros demonstram a existência de um litígio
estrutural que envolve várias instituições estatais, bem como uma omissão persistente
para evitar a violação massiva e sistemática dos direitos das pessoas privadas de
liberdade.
Todavia, há de se ressaltar que, baseada na pesquisa preliminar, a atuação da Corte
por meio de medidas provisionais têm contribuído para superação das omissões e
insuficiências dos serviços de proteção dos direitos humanos, no sentido de evitar danos
irreparáveis aos indivíduos. Testarei a ideia de necessidade de se estabelecer um
monitoramento contínuo das situações de extrema gravidade e urgência, principalmente,
quando se trata de pessoas vulneráveis, como é o caso das pessoas privadas de liberdade.
Destaca-se, ainda, que muitos são os problemas que precisam ser aprofundados
para que se garanta um sistema prisional mais eficiente, tendo como desafio principal a
redução da superpopulação carcerária e, consequentemente, de melhoria do espaço
prisional, tornando-o, de fato, um sistema que assegure os direitos humanos básicos do
indivíduo encarcerado.
Vale observar que além da redução da população prisional, impõe-se também a
necessidade de adequação do espaço prisional, com estrutura física e funcional ajustados
à necessidade de recuperação do preso.
Desta forma, como a prisão, até mesmo para os mais críticos como Michael
Foucault, é considerada a odiosa medida da qual ainda não conseguimos abrir mão, a
pesquisa servirá para repensarmos o modelo prisional existente em nosso país,
identificando, por meio da análise da jurisprudência da Corte Interamericana em matéria
de violação de direitos humanos das pessoas privadas de liberdades, os principais
problemas estruturais para a correta execução da pena nos presídios brasileiros.

3. OBJETIVO GERAL

O objetivo geral da pesquisa é analisar as fragilidades do sistema punitivo


brasileiro quanto a aplicação da pena privativa de liberdade a partir da análise de
denúncias feitas perante o Sistema Interamericano de Direitos Humanos em casos
envolvendo violações de direitos fundamentais dos presos pelo Estado brasileiro, como o
caso da excedente população carcerária, com especial foco na análise da jurisprudência
da Corte Interamericana de Direitos Humanos que envolvam a determinação de medidas
provisórias.

4. OBJETIVOS ESPECÍFICOS

a) Relacionar os dados sobre criminalidade no Brasil e os índices de


encarceramento
b) Identificar os documentos internacionais e regionais de proteção dos
direitos humanos, em especial, das pessoas privadas de liberdade, bem como as
regras que dispõem sobre execução penal e os parâmetros mínimos a serem
respeitados pelos países
c) Analisar o Sistema Interamericano de Direitos Humanos, sua composição
e o iter processual
d) Tabelar as unidades prisionais brasileiras que foram alvos de denúncia na
Corte Interamericana de Direitos Humanos por violações aos direitos humanos
decorrentes, principalmente, da superpopulação carcerária
e) Verificar a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos
para entender como ela tem agido nos casos submetidos à sua jurisdição
envolvendo a violação aos direitos das pessoas privadas de liberdade.
f) Analisar a fiscalização do cumprimento das decisões da Corte
Interamericana de Direitos Humanos
g) Entender se o papel desempenhado pela referida Corte tem contribuído ou
não para a superação dos problemas carcerários, principalmente, quanto à
superlotação.

5. FONTES DA PESQUISA
As principais fontes para a pesquisa serão as Resoluções da Corte Interamericana
de Direitos Humanos em casos de denúncias de violação dos direitos das pessoas privadas
de liberdade que resultaram em medidas provisionais. Elas estão disponíveis no site
oficial da referida Corte (https://www.corteidh.or.cr/medidas_provisionales.cfm).
Utilizarei como metadados “superpopulação carcerária”; “direitos humanos”; “pessoa
privada de liberdade”; “medida provisória”, “Brasil”.
A pesquisa preliminar já apontou a existência de 689 resoluções sobre medidas
provisórias expedidas pela Corte IDH, mas ao alterar o parâmetro para “Brasil” esse
número muda para 47. Todavia, haverá a necessidade de excluir 3 deles pois não fazem
referência a unidades prisionais brasileiras. Desse modo, identifiquei 44 resoluções, assim
distribuídas:

Unidades Prisionais no Brasil Nº de Medidas Provisórias

Caso Penitenciária Urso Branco6 10

Caso do Complexo Penitenciário Curado7 6

Caso Complexo Penitenciário de Pedrinhas8 3

Questão de Determinados Centros Penitenciários9 2

Caso Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho10 3

Caso Crianças e Adolescentes privados de liberdade no 6

6
Resolução da Corte de 25 de agosto de 2011; Resolução do Presidente da Corte de 26 de julho de 2011;
Resolução da Corte de 25 de novembro de 2009; Resolução da Presidenta da Corte de 17 de agosto de 2009;
Resolução da Corte de 2 de maio de 2008; Resolução da Corte de 21 de setembro de 2005; Resolução da
Corte de 7 de julho de 2004 ;Resolução da Corte de 22 de abril de 2004; Resolução da Corte de 29 de agosto
de 2002; Resolução da Corte de 18 de junho de 2002
7
Resolução da Corte de 28 de novembro de 2018; Resolução da Corte de 15 de novembro de 2017;
Resolução da Corte de 23 de novembro de 2016; Resolução da Corte de 18 de novembro de 2015; Resolução
da Corte de 7 de outubro de 2015; Resolução da Corte de 22 de maio de 2014
8
Resolução da Corte de 14 de outubro de 2019; Resolução da Corte de 14 de março de 2018; Resolução
da Corte de 14 de novembro de 2014
9
Resolução da Corte de 13 de fevereiro de 2017; Resolução da Presidenta da Corte de 20 de abril de 2021
10
Resolução da Corte de 22 de novembro de 2018; Resolução da Corte de 31 de agosto de 2017; Resolução
da Corte de 13 de fevereiro de 2017
“Complexo do Tatuapé” da FEBEM11

Penitenciária “Dr. Sebastião Martins Silveira” em 4


Araraquara, São Paulo12

Caso da Unidade de Internação Socioeducativa13 10

6. METODOLOGIA
Metodologia é, na verdade, a reflexão sobre o caminho a ser seguido pelo cientista
em seu trabalho, nas diversas fases da pesquisa e de sua realização, promovendo, com
detalhes, a descrição do percurso, dos desvios do trajeto, dos obstáculos a superar e
superados e dos resultados a serem alcançados.
Para MARCONI e LAKATOS (2003), método é o conjunto das atividades
sistemáticas e racionais que, com maior segurança e economia, permite alcançar o
objetivo – conhecimentos válidos e verdadeiros -, traçando o caminho a ser seguido,
detectando erros e auxiliando as decisões do cientista.
No presente estudo, o método empregado será o indutivo, por intermédio do qual,
partindo de dados particulares, suficientemente constatados, serão inferidas uma verdade
geral ou universal, não contida nas partes examinadas. Chama-se a atenção para o fato de
que o argumento indutivo, da mesma forma que o dedutivo, fundamenta-se em premissas,
contudo, nos dedutivos, as premissas verdadeiras levam inevitavelmente à conclusão
verdadeira, enquanto que os indutivos conduzem apenas a conclusões prováveis.
Neste caso em particular, em se tratando de tema relacionado ao sistema prisional,
com todas as dificuldades de se promover uma pesquisa, serão utilizados dados
qualitativos, posto que serão utilizados dados numéricos que caracterizam resultados
estatísticos, impondo-se a necessidade de interpretação e compreensão, condição
fundamental para uma análise científica.
A pesquisa ainda terá caráter descritivo, revelando as características da população
carcerária brasileira e das unidades prisionais, desenvolvendo-se, ainda, a partir de

11
Resolução da Corte de 25 de novembro de 2008; Resolução da Presidenta da Corte de 10 de junho de
2008; Resolução da Corte de 3 de julho de 2007; Resolução da Corte de 4 de julho de 2006; Resolução da
Corte de 30 de novembro de 2005; Resolução da Corte de 17 de novembro de 2005
12
Resolução da Corte de 25 de novembro de 2008; Resolução da Presidenta da Corte de 10 de junho de
2008; Resolução da Corte de 30 de setembro de 2006; Resolução da Corte de 28 de julho de 2006
13
Resolução da Corte de 15 de novembro de 2017; Resolução da Corte de 23 de junho de 2015; Resolução
do Presidente da Corte de 26 de setembro de 2014; Resolução da Corte de 29 de janeiro de 2014; Resolução
da Corte de 21 de agosto de 2013; Resolução da Corte de 20 de novembro de 2012; Resolução da Corte de
26 de abril de 2012; Resolução da Corte de 1 de setembro de 2011; Resolução do Presidente da Corte de
26 de julho de 2011 e Resolução da Corte de 25 de fevereiro de 2011.
pesquisa bibliográfica e coleta dos dados como Resoluções da Corte Interamericana de
Direitos Humanos.
Livros, revistas, artigos científicos, jurisprudência, dentre outros, serão também
fontes de consulta para melhor definição do estudo.

6.1 Pressupostos conceituais e marco teórico

Tratando-se de assunto relacionado à proteção dos direitos humanos das pessoas


privadas de liberdade, parte-se do entendimento de que elas são vulneráveis, segundo
posicionamento da própria Corte Interamericana de Direitos Humanos, que destaca os
efeitos que o confinamento gera no condenado, como deculturação, desidentificação,
desmoralização, bem como psicoses, neuroses e depressões (conforme apontam os
estudos de CLEMER, 1958; GOFFMAN, 1992, LIEBLING e MARUNA, 2005)
reforçando, ainda, a situação de dependência do preso com a instituição penitenciária, por
conta de não poder satisfazer suas necessidades de forma independente, sujeito que está
ao controle permanente da instituição carcerária (segundo os estudos GOFFMAN 1992
e NASH ROJAS, 2010).
Em face da identificada vulnerabilidade, parte-se também do pressuposto de que
o Estado assume o papel de garantidor do indivíduo sob sua custódia, assegurando-lhe,
além do direito fundamental à vida e à integridade corporal, um espaço seguro e adequado
de convivência com outros encarcerados ou com agentes estatais (Nesse sentido, os
trabalhos de ALISCH, 2001 e LAUBENTHAL, 2015)
No tocante a Corte Interamericana de Direitos Humanos, ao qual se conjuga o
processo de humanização do Direito Internacional, serão analisadas as formas de que
dispõe para fazer com que os regramentos internacionais sejam observados pelo estado
brasileiro, uma vez que há convergência de finalidades entre o direito internacional e o
direito interno quanto à proteção da pessoa humana (conforme apontam os estudos de
CANÇADO TRINDADE, 1991; PIOVESAN, 2000; MORAES, 2003 e JAPIASSÚ e
FERREIRA, 2020).
Serão, ainda, levados em conta os estudos de TEIXEIRA, 2008; SHIMIZU, 2011;
ALVAREZ, SALLA e DIAS, 2013; MANSO E DIAS, 2017, que apontam as fragilidades
e mazelas das unidades penitenciárias, a partir da desestruturação e violência nelas
existentes, evidenciando, assim, a crise pela qual passa o sistema penitenciário nacional.
6.2 Estado da Arte
Os mecanismos internacionais de proteção dos Direitos Humanos encontravam
obstáculos ao seu desenvolvimento devido ao conceito rígido e absoluto de soberania.
Porém, após as atrocidades da Segunda Guerra Mundial, a comunidade internacional viu
a necessidade de preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra14 e, para isso,
valeram-se de um sistema coletivo de segurança através da Organização das Nações
Unidas.
Os anos seguintes ao ano de 1945 formaram o clima propício para a produção de
um grande número de diplomas internacionais cujo objetivo era assegurar e proteger os
direitos do homem, como a Declaração Universal dos Direitos do Homem, em 1948 que
consagra a dignidade humana como princípio essencial e fundamento dos Direitos
Humanos, definindo liberdades e direitos de titularidade de todos os homens, sem
distinção. De acordo com PIOVESAN, “para a Declaração Universal, a condição de
pessoa é o requisito único e exclusivo para a titularidade de direitos.”15
Com a referida Declaração surge uma nova concepção dos Direitos Humanos,
transformando os valores nela proclamados em normas cogentes internacionais e
regionais.
E a partir dessa necessidade de assegurar ao indivíduo sua dignidade humana
surge o novo ramo do Direito Internacional: Direitos Humanos, que pode ser protegido
tanto por um sistema global quanto por sistemas regionais. Nesse sentido, foram
concebidos, por exemplo, os sistemas europeu, africano e interamericano de proteção aos
Direitos Humanos.
Estas normativas internacionais evoluíram para a construção de um arcabouço
legislativo que reconheceu e definiu direitos, criando obrigações internacionais para os
Estados e estabelecendo órgãos de monitoramento do cumprimento destas obrigações.16
De acordo com Henry Steiner, apud Flávia Piovesan (2019, p. 120):
A respeito da criação do sistema regional de proteção, explica Henry
Steiner: “Embora o Capítulo VIII da Carta da ONU faça expressa menção
aos acordos regionais com vistas à paz e segurança internacionais, ele é
silente quanto à cooperação no que tange aos direitos humanos. Todavia, o
Conselho da Europa, já em 1950, adotava a Convenção Europeia de

14
Carta das Nações Unidas. Junho de 1945. Disponível em https://brasil.un.org/sites/default/files/2021-
08/A-Carta-das-Nacoes-Unidas.pdf
15
PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e direito constitucional. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 118
16
Disponível em
https://midia.mpf.mp.br/pfdc/hotsites/sistema_protecao_direitos_humanos/interamericano.htm
Direitos Humanos. Em 1969, a Convenção Americana era adotada. (...) Em
1977, as Nações Unidas formalmente endossaram uma nova concepção,
encorajando ‘os Estados, em áreas em que acordos regionais de direitos
humanos ainda não existissem, a considerar a possibilidade de firmar tais
acordos, com vista a estabelecer em sua respectiva região um sólido aparato
regional para a promoção e proteção dos direitos humanos (Assembleia
Geral, resolução 32/127, 1977)’”17
Em relação à proteção dos direitos das pessoas privadas de liberdades, foco deste
estudo, pontua-se que a maior parte dos tratados internacionais e regionais de direitos
humanos contém dispositivos relacionados à esses direitos, tanto de forma direta quanto
indireta, proibindo a tortura e os tratamentos desumanos, degradentes e cruéis, dentre eles,
podemos destacar: a) Declaração Universal dos Direitos Humanos; b) Pacto Internacional
sobre Direitos Civis e Políticos; Convenção Americana sobre Direitos Humanos. c)
Declaração sobre a Proteção de Todas as Pessoas contra a Tortura e Outras Penas ou
Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes d) Regras Mínimas para o Tratamento
dos Presos, também conhecidas como Regras de Mandela.
Desse modo, nos últimos 50 anos, a Corte Interamericana de Direitos Humanos,
que faz parte do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, tomou conhecimento de
mais de 40 casos de violação de direitos dentro de uma prisão ou local de detenção. O
conhecimento e julgamento desses casos permitiu ao Tribunal construir um conjunto de
normas para a proteção dos direitos humanos dos presos. Esses padrões jurisprudenciais
fixados pela Corte foram elevados como mínimos que os Estados devem respeitar.
Nesse sentido, o dizer de Cançado Trindade18: “O futuro da proteção internacional
dos direitos humanos depende em grande parte da adoção e do aperfeiçoamento das
medidas nacionais de implementação”. Demonstra-se, assim, a necessidade de adoção de
medidas nacionais para a implementação dos tratados internacionais de proteção dos
direitos humanos, bem como das decisões proferidas pelos organismos internacionais de

17
Henry Steiner, Regional arrangements: general introduction, material do Curso International Law and
Human Rights, Harvard Law School, 1994. Sobre o contexto no qual se delineia o sistema regional,
comenta Henry Steiner: “A Carta das Nações Unidas inclui obrigações legais concernentes aos direitos
humanos e quase todos os Estados hoje são partes da Carta. A Declaração Universal alcançou
reconhecimento universal e seus dois principais Pactos Internacionais, um de direitos civis e políticos e
outro de direitos sociais, econômicos e culturais, entraram em vigor. Há outras Convenções que consagram
direitos particulares, que receberam grande adesão. (...) Iniciativas semelhantes têm internacionalizado os
direitos humanos em uma base regional na Europa e na América Latina”.
18
Antônio Augusto Cançado Trindade e Manuel E. Ventura Robles, El futuro de la Corte Interamericana
de Derechos Humanos, p. 27
proteção, de modo a conferir-lhes aplicabilidade imediata e direta no âmbito interno dos
Estados.
Mas a atuação dos órgãos que exercem jurisdição na região — refiro-me à
Comissão e a Corte, não foi isenta de conflitos, pois há polêmica em torno da
incorporação dos tratados internacionais à ordem interna, pois há um corrente (monista)
para a qual não existem limites entre a ordem jurídica internacional e a ordem jurídica
interna e há um corrente (dualista) para a qual existe uma dualidade de ordens jurídicas,
uma interna e outra externa, sendo então necessário e indispensável um ato de recepção
para introduzir as regras. Há também críticas quanto à duração excessiva dos processos,
que podem chegar a durar, entre a ocorrência dos fatos e a decisão, 14 anos e a pouca
efetividade no cumprimento das sentenças.
Nesse cenário, diante da dificuldade estrutural prisional do Estado brasileiro
tentarei analisar a atuação da Corte Interamericana de Direitos Humanos na proteção dos
Direitos Humanos, em especial, das pessoas privadas de liberdade e a implementação de
suas decisões em âmbito doméstico.

6.3 Variáveis e indicadores

Inicialmente, trabalharei com três variáveis da pesquisa: Sistema Interamericano


de Direitos Humanos, Corte Interamericana de Direitos Humanos e Medidas Provisórias.
Ainda não está claro, com o material pesquisado preliminarmente, se outras variáveis
podem se tornar significativas. De qualquer forma, estarei atenta para verificar uma
possível alteração nas variáveis iniciais da pesquisa.

6.4 Tipos de pesquisa

Escolherei um caso submetido à jurisdição da Corte Interamericana de Direitos


Humanos onde houve determinação de medidas provisórias em unidades prisionais
brasileiras. Ainda não decidi se farei o estudo de um único caso ou de vários. Será uma
pesquisa baseada nas Resoluções da Corte Interamericana, na literatura jurídica, nas
publicações da imprensa e nos documentos oficiais das entidades competentes e relatórios
de organizações da sociedade civil que foram parte ou interessadas no processamento do
caso.
Desse modo, pretendo realizar uma pesquisa empírica19 com análise de
Resoluções para compreender melhor como a Corte Interamericana de Direitos Humanos
têm contribuído para coibir as violações de direitos humanos da pessoa privada de
liberdade, decorrentes, em especial, da superlotação nos presídios brasileiros.

6.5 Cronograma
FASES Atividades 2022.1 2022.2 2023.1 2023.2

Preparação da Pesquisa X
Escolha do Tema X
PLANEJAMENTO
Formulação do problema X
Definição da Metodologia X
Pesquisar Resoluções da Corte IDH
COLETA DE
x
DADOS Tabelar as Resoluções contra o X
Estado brasileiro

Analisar os casos de violações dos X


direitos humanos nos presídios
ANÁLISE
Analisar as Medidas Provisórias X
determinadas

Redação Provisória X
REDAÇÃO
Correção da Redação X
ENTREGA DO ARTIGO X

19
Adoto no presente projeto de pesquisa a concepção de pesquisa empírica defendida por Gustavo Silveira
Siqueira: “Não pretendo discutir os diversos conceitos aqui; portanto, a pesquisa empírica, resumidamente,
tenta entender como o direito existe na realidade. É uma discussão não do “dever ser” ou da norma jurídica,
mas do que ela é. É o direito no dia a dia, nos tribunais, nas salas de aula, nos documentos históricos. É o
impacto do direito na vida das pessoas. Trata-se de uso, por exemplo, de métodos sociológicos ou
antropológicos de entrevista para conhecer os sujeitos que praticam ou que vivenciam o direito; do uso de
métodos históricos para fazer uma história do direito; de estatísticas na análise de sentenças e padrões
decisões.” (SIQUEIRA, Gustavo Silveira. Pequeno Manual de Metodologia da Pesquisa Jurídica. 2ª ed.,
Belo Horizonte, 2021, p. 105).
7. REFERÊNCIAS
ALISCH, JÖRG. Sicherheit als Steuerungsproblem. En Christoph Flügge,
Bernd Maelicke y Harald Preusker (editores), Das Gefängnis als lernende Organization.
Baden-Baden: Nomos, 2001.
ALVAREZ, Marcos César. SALLA, Fernando. DIAS, Camila Nunes. Das
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Social, Revista de Sociologia da USP, V. 25, n 1. 2013. Disponível em . Acesso em
08.11.2013.
CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. A proteção internacional dos
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