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A banalidade do mal de Hannah Arendt

Há quem associe o mal com uma ordem espiritual de caráter divino e até mesmo enquanto
algo perverso e brutal exterior aos indivíduos. Entretanto, seria tão difícil assim proferir o mal
em um mundo que endossa a bondade? Não estaria o mal entre nós por sermos nós, seres
humanos em sociedade, que o criamos? A partir do pensamento arendtiano, poderíamos
responder positivamente a essas perguntas.

Hannah Arendt, filósofa e teórica política do século XX, elabora a noção de banalidade do
mal. Nasceu em 14 de outubro de 1906, em Hannover, Alemanha, em uma família judia. Seu
trabalho se destaca em um contexto histórico marcado pela Segunda Guerra Mundial e pela
ascensão do nazismo, que resultou em casos de migração e deportação de judeus. Em julho
de 1933, devido à sua origem judaica e posição política antinazista, Arendt foi detida durante
oito dias pela Gestapo e forçada a fugir da Alemanha, estabelecendo-se nos Estados Unidos,
onde se tornou professora universitária.

Um dos eventos cruciais que moldou o pensamento de Hannah Arendt foi o julgamento de
Karl Adolf Eichmann. Eichmann era um oficial da SS e coordenador da Seção de Assuntos
Judaicos do Departamento de Segurança de Berlim. Ele havia sido encarregado de ocultar os
rastros dos crimes nazistas, que incluíam a exterminação de judeus na Alemanha e em
territórios ocupados e por isso foi acusado de cometer crimes contra a humanidade.

No julgamento de Eichmann, ele negou reiteradamente ser culpado pelos crimes dos quais era
acusado, alegando que estava apenas seguindo ordens. A filósofa assistiu a esse julgamento e
posteriormente escreveu a obra "Eichmann em Jerusalém", na qual elaborou a ideia da
"banalidade do mal". Para Arendt, o mal praticado por Eichmann e outros nazistas não era
resultado de uma maldade extrema, mas sim de uma aceitação cega das normas e ordens de
seu ambiente. O mal tornou-se um instrumento de trabalho compartilhado em seu meio,
sendo banal e rotineiro. A banalização do mal, conforme proposto por Arendt, refere-se ao
fenômeno em que atos prejudiciais se tornam comuns e desprovidos de reflexão crítica.
Eichmann negou sua culpa não porque fosse irracional, mas porque buscava poder e estava
alinhado com uma racionalidade que não priorizava o bem coletivo.

Portanto, ao encarar Eichmann enquanto um sujeito comum sem uma mente “doentia” mas,
sim, com uma mente irreflexiva, a filósofa foi criticada pela comunidade intelectual que
acreditava que sua análise era benevolente demais. Não obstante, também foi criticada por
parte de seus pares e da população judaica, que interpretaram que ela não respeitava sua
origem. Afinal, a autora também chama atenção para o fato de que parte da própria
comunidade judaica poderia ser vista como cúmplice dos horrores do Holocausto Nazista,
uma vez que alguns indivíduos colaboraram com a Gestapo ou foram coniventes com suas
ações.

Em sua conclusão, a filósofa argumentou que a banalidade do mal poderia levar à formação
de regimes totalitários, porque quando indivíduos aceitam irrefletidamente a autoridade e
seguem ordens sem questionar a moralidade de suas ações, abre-se espaço para a perpetuação
de sistemas opressivos que podem destruir a liberdade, a dignidade humana e a ética em prol
de objetivos políticos extremos. Assim, considera-se necessário a reflexão crítica e da
responsabilidade individual em resistir a pressões sociais e políticas que podem levar a atos
prejudiciais e desumanos. Sua obra continua a ser uma referência importante para a
compreensão da natureza do mal e da responsabilidade moral em um mundo complexo e em
constante mudança.

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