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CURSO DE MEMBRESIA

A CEIA DO SENHOR – AULA 06


Pr. Judiclay Santos

Enquanto comiam, tomou Jesus um pão, e, abençoando-o, o partiu, e o deu aos discípulos,
dizendo: Tomai, comei; isto é o meu corpo. A seguir, tomou um cálice e, tendo dado graças,
o deu aos discípulos, dizendo: Bebei dele todos; porque isto é o meu sangue, o sangue da
[nova] aliança, derramado em favor de muitos, para remissão de pecados.
Mateus 26. 26-28

Jesus Cristo instituiu duas ordenanças a serem observadas pela igreja: o batismo e a
ceia do Senhor. Nesses estudos introdutórios, buscamos apresentar um panorama
geral, mas o nosso foco é a perspectiva batista. No estudo anterior, vimos que o
batismo é um rito de iniciação na vida cristã, um símbolo da união com Cristo em sua
morte e ressurreição. Enfatizamos que o batismo bíblico é precedido por uma pública
profissão de fé, razão pela qual os batistas batizam somente aqueles que podem
professar a sua fé em Jesus Cristo.

No que diz respeito a ceia do Senhor, as divergências são relacionadas a cinco pontos:
1) A presença de Cristo 2) A eficácia do rito. 3) O ministrante adequado. 4) Os
receptores adequados. 5) Os elementos usados. Católicos e Protestantes tem visões
diametralmente opostas quanto a esses assuntos. Mesmo entre os Protestantes, há
bastante controvérsia quanto a natureza e os efeitos da ceia do Senhor. Vamos fazer
um panorama geral, considerando a perspectiva batista sobre o assunto.

QUATROS PERSPECTIVAS ACERCA DA CEIA DO SENHOR


Em linhas gerais, existem quatro perspectivas sobre a ceia do Senhor. No decurso da
história, podemos identificar quatro posições distintas que têm sido adotadas.

Transubstanciação. A doutrina da transubstanciação é a posição oficial da Igreja


Católica. Segundo essa perspectiva, a ceia do Senhor é uma representação do sacrifício
de Cristo, pois o pão e vinho tornam-se realmente o corpo e o sangue de Cristo. Na
celebração da eucaristia (do grego eucharistein, que significa dar graças), a substancia
do pão se transforma no corpo físico de Cristo e a substância do vinho, no sangue físico
de Cristo. A pessoa pode se perguntar: Por que o pão e o vinho não mudam de
aparência? A resposta a essa pergunta foi oferecida pelo teólogo medieval Tomás de
Aquino. Herdeiro da filosofia de Aristóteles, Aquino usou a distinção filosófica entre
substancia (essência) e acidente (forma exterior) para explicar o fenômeno. Segundo
ele, embora a aparência seja a mesma, a substancia muda. Daí o nome
transubstanciação. A doutrina da transubstanciação foi formulada por Aquino e
aprovada pela Igreja Católica no Concílio de Latrão (1215).

1
Consubstanciação. Os luteranos advogam a posição apresentada por Martinho Lutero.
Para o reformador alemão, não existe uma transformação literal e substancial do pão
e do vinho. Os elementos não são transubstanciados, afirma Lutero. Ele propõe que
acontece uma união entre o corpo e o sangue de Cristo, a substância do pão e do
vinho na mesa do Senhor. “O que é o sacramento do altar? É o verdadeiro corpo e
sangue do nosso Senhor Jesus Cristo, instituídos pelo próprio Cristo sob o pão e o
vinho, para nós, cristãos, comermos e bebermos” (Catecismo de Lutero). Assim sendo,
Lutero buscou manter a reverência para com os elementos e se distanciar da
perspectiva católica que prega uma transubstanciação dos elementos. A posição
teológica dos luteranos pode ser ilustrada da seguinte maneira: assim como a água
está presente em uma esponja – a água não é a esponja, mas está presente “em, com,
sob” a esponja - “O pão que partimos não é a comunhão do corpo de Cristo?” 1 Co
10.16

Presença espiritual. Os reformados seguem a posição defendida por João Calvino.


Segundo o teólogo de Genebra, Cristo está espiritualmente presente na Ceia. Na
contramão do ensino católico e luterano, os reformados rejeitaram a ideia de presença
física. O pão e o vinho simbolizam o corpo e o sangue de Cristo, e servem de sinais
visíveis da presença espiritual de Cristo. A Confissão de Fé de Westminster define bem
a perspectiva dos reformados sobre a presença de Cristo na Ceia.

Os que comungam dignamente, participando exteriormente dos elementos


visíveis deste sacramento, também recebem intimamente, pela fé, a Cristo
Crucificado e todos os benefícios da sua morte, e nele se alimentam, não
carnal ou corporalmente, mas real, verdadeira e espiritualmente, não estando
o corpo e o sangue de Cristo, corporal ou carnalmente nos elementos pão e
vinho, nem com eles ou sob eles, mas espiritual e realmente presentes à fé
dos crentes nessa ordenança, como estão os próprios elementos aos seus
sentidos corporais.1

Memorial. A ceia do Senhor como um memorial simbólico que aponta para a obra de
Cristo foi ensinada pelo reformador suíço Ulrich Zwinglio. O texto de Paulo aos
coríntios tem sido usado pelos herdeiros da perspectiva zwuingliana para defender a
posição memorial. Os batistas, em linhas gerais, adotam essa perspectiva. De fato, a
ceia do Senhor é um memorial perpétuo, ordenado por Cristo, para ser praticado por
seus discípulos em sua memória até o seu retorno triunfal. Bruce Milne resume essa
perspectiva: “a Ceia é simplesmente simbólica, lembrando vivamente ao comungante
aquilo que Cristo fez a seu favor na cruz e apelando para uma nova dedicação de sua
vida a Deus, à luz do Calvário”.2

1
Confissão de Fé de Westminster, Capítulo XXIX, Art. VII. Disponível em:
http://www.monergismo.com/textos/credos/cfw.htm Acesso em: 09 dez.2020
2
MILNE, Bruce. Estudando as Doutrinas da Bíblia. São Paulo: ABU, 1998, p. 246

2
O SIGNIFICADO DA CEIA DO SENHOR PARA OS BATISTAS
Existem vários aspectos simbolizados e afirmados na ceia do Senhor. Os batistas
ingleses, na monumental Confissão de Fé de 1689, apresentaram muito bem o ensino
bíblico sobre esse rico símbolo da nossa redenção.

A ceia do Senhor Jesus foi instituída por Ele, na mesma noite em que foi traído, para
ser observada nas igrejas até o fim do mundo; a fim de lembrar perpetuamente e ser
um testemunho do sacrifício de sua morte; para confirmar os crentes na fé e em todos
os benefícios dela decorrentes; para promover a nutrição espiritual e o crescimento
deles, em Cristo; para encorajar o maior engajamento deles em todos os seus deveres
para com Cristo; e para ser um elo e um penhor da comunhão com Ele e de uns com
os outros.3

Os batistas reconhecem que a ceia do Senhor é uma expressa ordem de Jesus Cristo.
Celebramos a Ceia do Senhor como expressão de nossa obediência e fé, pois cremos
que o Cristo crucificado ressuscitou. Aguardamos o retorno triunfal do Senhor Jesus.

Porque eu recebi do Senhor o que também vos entreguei: que o Senhor Jesus, na
noite em que foi traído, tomou o pão; e, tendo dado graças, o partiu e disse: Isto é o
meu corpo, que é dado por vós; fazei isto em memória de mim.
Por semelhante modo, depois de haver ceado, tomou também o cálice, dizendo: Este
cálice é a nova aliança no meu sangue; fazei isto, todas as vezes que o beberdes, em
memória de mim. Porque, todas as vezes que comerdes este pão e beberdes o cálice,
anunciais a morte do Senhor, até que ele venha. 1 Co 11.23-26

Celebramos a ceia do Senhor em memória de Cristo, nosso Salvador. No entanto, não


se trata de uma lembrança vazia de significado. A ceia do Senhor é memorial da
redenção dos filhos de Deus e existem propósitos pelos quais nos reunimos em torno
da mesa do Senhor. O Dr. Wayne Gruden4, renomado teólogo batista, apresenta
quatro aspectos simbolizados na ceia do Senhor.

1. A MORTE DE CRISTO.
A ceia do Senhor é evangelho exposto visualmente. O pão e o vinho são elementos
simbólicos que apontam para o sacrifício redentivo de Cristo. Quando partido, o pão
simboliza o corpo de Cristo, e, quando derramado, o cálice simboliza o derramar do
sangue de Cristo em nosso favor. A ceia do Senhor é uma proclamação do evangelho.
O cristão é alguém que estava morto em seus pecados e recebeu vida na morte de
Cristo. “Cristo morreu por nossos pecados de uma vez por todas (1 Pe 3.18). ”Cristo
morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras (1 Co 15.3).

3
Confissão de Fé Batista de 1689. Acessado ....
4
GRUDEN, Wayne. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 1999

3
2. NOSSA PARTICIPAÇÃO NOS BENEFÍCIOS DA MORTE DE CRISTO.

Ao comer do pão e beber do cálice, os discípulos de Jesus estão confirmando sua


participação nos benefícios de sua morte na cruz. Dr. Lloyd Jones é preciso em seu
comentário:

Quando tomamos a Ceia, não apenas nos lembramos de algo, estamos não só nos
dedicando a um ato memorial ou comemorativo, nem estamos meramente colocando
os nossos distintivos de membros da igreja, ainda que estejamos fazendo isso. Mas,
muito mais que isso, quando recebemos o pão e o vinho, Deus está nos dizendo que
somos participantes dos benefícios desse novo pacto5.

3. ALIMENTO ESPIRITUAL
A presença espiritual de Cristo na ceia é uma realidade ensinada na Bíblia e
reconhecida pelos mais antigos batistas. Participamos da ceia do Senhor crendo que o
Senhor está presente no meio do seu povo (Mt 18.20). Assim como o corpo recebe
nutrição através da alimentação, nossa alma também é nutrida espiritualmente. Pela fé
recebemos graça ao participar da ceia do Senhor em obediência. Uma parte
significativa dos batistas brasileiros não reconhece a presença de Cristo na ceia do
Senhor nem tampouco a nutrição espiritual, mas desde o início os batistas celebraram
a ceia “para promover a nutrição espiritual e o crescimento deles, em Cristo”.

4. A UNIDADE DOS CRISTÃOS.


A igreja é a comunidade dos remidos. Somos o povo salvo pela perfeita obra de Cristo
na cruz. Nos reunimos como irmãos para celebrar a nossa unidade em Cristo, que de
muitos fez um só povo. “Porque nós, embora muitos, somos unicamente um pão, um
só corpo; porque todos participamos do único pão” (1 Co 10.17). A unidade cristã
simbolizada na Ceia do Senhor pode ser vista no hino Um só rebanho (HCC, 574)

Um só rebanho, um só pastor
Uma só fé em um só salvador
É Teu amor que nos une aqui
E num só espírito adoramos a Ti
E num só espírito adoramos a Ti

Um só rebanho, um só pastor
Fruto, ó Senhor, desse Teu grande amor
Só nos gloriamos na Tua cruz
Oh! Louvado sejas, bendito Jesus
Louvado sejas, bendito Jesus

5
JONES, Martyn Lloyd. A Igreja e as Últimas coisas. PES: São Paulo, 1999, p. 73

4
Um só rebanho, um só pastor
Sim, esperamos por Ti, ó Senhor
É face a face que vamos ver
Quem nos amou e por nós quis morrer

QUEM PODE PARTICIPAR DA CEIA DO SENHOR?

Somente os que creem em Cristo devem participar da ceia do Senhor, pois trata-se de
um sinal de conversão e permanência na vida cristã. Somos advertidos quanto ao
perigo de participar da ceia sem estarmos habilitados. Comer e beber indignamente é
um perigo (1 Co 11.29-30).

Somente os que foram batizados devem participar da ceia do Senhor. Tendo em vista
que o batismo é um rito de iniciação na vida cristã, e a ceia do Senhor simboliza
permanência no evangelho, não seria coerente participar de algo que simboliza
permanência se a pessoa ainda não passou pelo rito de entrada.

Crentes em Cristo, devidamente batizados e em comunhão com a igreja local, devem


considerar uma terceira qualificação: o autoexame (1 Co 11.27-29). O bispo John Ryle
fez duas pertinentes observações sobre a Ceia do Senhor que devem ser objeto de
nossa reflexão. “É algo terrível o crente achar-se incapacitado de receber essa
ordenança, porque isto equivale a estar despreparado para morrer. Também não é
menos terrível receber os elementos da ceia do Senhor de modo indigno, porquanto
isso equivale a provocar a Deus”. Portanto, a recomendação de Paulo é vital para saúde
espiritual da igreja como um todo e de cada membro em particular. “Examine-se, pois,
o homem a si mesmo, e, assim, coma do pão e beba do cálice” (1 Coríntios 11.26)

Os batistas têm discordado quanto ao que significa fidelidade à exortação de Paulo


(1 Co 11.27-31). De fato, tem havido uma grande variedade entre cristãos batistas
sobre quem são os participantes apropriados à Ceia do Senhor [...] A primeira
posição é chamada de comunhão restrita ou fechada [...] Comunhão próxima... que
diz que todos os crentes que foram batizados como crentes são bem-vindos à mesa
do Senhor. Comunhão aberta, ... sustenta que todos que reconhecem a si mesmos
como pessoas que creem em Cristo para salvação, embora não tenham sido
batizados como crentes, são bem-vindos à mesa do Senhor. 6

A Igreja Batista do Jardim Botânico está em processo de transição de Ceia próxima


para Ceia restrita à membresia. À luz do ensino bíblico e da nossa herança mais ampla,
entendemos que o mais adequado é celebrar a ceia do Senhor como família da fé,
pactuada como membresia da igreja local. A ceia do Senhor é símbolo muito precioso
e devemos celebrá-la com profundo senso de maravilha, alegria, temor e júbilo no
evangelho. Seja Deus gracioso e nos abençoe na comunhão do corpo de Cristo.

6
DEVER, Mark. Igreja: o evangelho visível, p. 160

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