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Teoria das Molduras Relacionais e possíveis aplicações à educação

Article · August 2012

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Julio C. de Rose Laura Rabelo


Universidade Federal de São Carlos Universidade Federal de São Carlos
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Análise Funcional do Humor Verbal View project

Electrophysiological correlates of semantic relationships in the elderly View project

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arTigo Por Júlio César Coelho de Rose e Laura zamot Rabelo

Teoria das molduras relacionais e


possíveis aplicações à educação

P
are um momento para pensar sobre um controversa, mas tem interessantes possibilidades
conceito. Pode ser um conceito aparen- de aplicação, que abordaremos neste texto.
temente simples: o conceito de carro. As primeiras relações sensório-motoras da
Esse conceito está envolvido em uma criança se transformam quando o aparecimento
infinidade de relações e uma pequena parte des- da linguagem estabelece relações de equivalência1
sas relações é ilustrada na Figura 1. Há uma rela- entre palavras e significados. A criança pode agora
ção de equivalência (ver artigo de Deisy de Souza aprender com adultos ou crianças mais velhas a
e colaboradores neste volume) entre um carro e agir e pensar com base em um número crescente
a palavra “carro”. O carro custa dinheiro (isso de relações, como as ilustradas na Figura 1 (tendo
também implica uma relação de equivalência em mente que esta figura não esgota todos os tipos
entre o carro e o dinheiro) e, para conseguir o de relações que podem ser aprendidas).
dinheiro, você provavelmente fez um financia-
mento (implicando outra relação de equiva- Molduras relacionais e sua origeM
lência: o dinheiro para pagar o carro equivale à Para ilustrar, vamos considerar uma moldura rela-
dívida). Carros são veículos (uma relação hierár- cional específica: a relação comparativa de tamanho.
quica) maiores do que bicicletas (relação compa- Quando eu penso ou ajo com base em relações de
rativa) e também mais velozes e mais caros do tamanho, posso fazer muitas coisas diferentes. Alguém
que bicicletas (outras relações comparativas). pode me perguntar qual o maior dentre vários obje-
Carros causam poluição (relação causal), ao con- tos; posso colocar em ordem de tamanho dois ou mais
trário de bicicletas, que não poluem (relação de objetos; posso escolher o maior pedaço de bolo, se sou
oposição). Você guarda o carro dentro de uma guloso, ou o menor, se quero ingerir menos calorias;
garagem (relação espacial). Antes (relação tem- sei que uma nota de 100 reais tem maior valor do que
poral) de comprar o carro, talvez você andasse uma de 50; e sei que um cão é maior do que uma for-
de ônibus, de bicicleta ou de carona. Algumas miga e menor do que um caminhão. Vamos represen-
relações especialmente interessantes, denomina- tar muito esquematicamente essa capacidade por uma
das relações dêiticas, dependem da perspectiva de moldura que comporta dois elementos, relacionados
quem fala ou observa. Se o carro pertence a você, com base no tamanho. Para simplificar, vamos con-
você diz que ele é meu, mas, se eu falo sobre o siderar apenas relações maior que, entre apenas dois
seu carro, não posso dizer que ele é meu: digo elementos. Esses elementos podem ser os dois círcu-
que ele é seu. los apresentados na Figura 2A. Mesmo entre dois cír-
Relações permeiam nossa linguagem e pensa- culos simples como estes, pode haver muitas diferen-
mento. A Teoria das Molduras Relacionais, conhe- tes relações. Geralmente alguma pista do contexto, do
cida pela abreviatura RFT, do inglês Relational ambiente, sinaliza qual relação devo considerar. Sem
Frame Theory, enfatiza, como o nome indica, o tal pista contextual, eu não sei se devo relacionar os
pensar e agir com base em relações. Essa teoria é círculos com base em qual é maior, qual é mais escuro,
ou no fato de ambos serem círculos, ou serem diferen-
tes de retângulos etc. Em um exemplo mais óbvio, a
Júlio César Coelho de Rose é professor titular da
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e pes- 1
os teóricos da RFt usam o termo "coordenação" em
quisador do instituto nacional de Ciência e tecnologia
lugar de "equivalência" com significado bastante parecido.
sobre Comportamento, Cognição e ensino (inCt-eCCe). adotaremos equivalência aqui, para deixar clara a relação com
Laura Zamot Rabelo é doutoranda na UFsCar. o conceito tratado em outros artigos deste volume.

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meu carro

veículos
meu carro
equivalente

equivalente

maior que
mais veloz que
mais caro que

dívida equivalente
“carro”
causa oposto
guardado antes
“bicicleta”
dentro de andava de

Figura 1. exemplo de uma pequena parte da rede de relações envolvida no conceito, aparentemente simples, de carro.

pista contextual pode ser verbal: alguém me pergunta Segundo a RFT, portanto, a origem das moldu-
qual o maior dos dois círculos e eu relaciono os cír- ras relacionais está em nossas interações com o
culos em termos de tamanho (Figura 2A). Porém, a ambiente, particularmente com outras pessoas, que
Figura 2A mostra, também, logo abaixo, como rela- proporcionam experiências com múltiplos exempla-
ciono os círculos se alguém me pergunta qual o mais res das várias relações. Essa experiência com múlti-
escuro. As pistas contextuais podem ser muito varia- plos exemplares é ilustrada esquematicamente na
das: o tamanho do parafuso que tenho que apertar Figura 2 (partes B e C). As crianças são tipicamente
pode ser a pista contextual para a escolha de uma chave expostas a muitas oportunidades em que são solici-
de fenda menor ou maior; o meu peso pode ser a pista tadas a apontar o maior, pegar o maior, olhar para o
contextual para eu escolher o menor dentre dois peda- maior, buscar algo maior, imaginar algo maior etc.
ços de bolo. No contexto de uma fala sobre veículos, o A experiência com múltiplos exemplares de uma
meu carro faz parte da mesma categoria que uma bici- relação vai gradualmente tornando a criança capaz
cleta, mas, no contexto de uma fala sobre poluição, há de pensar ou agir de modo mais abstrato. Ela se
uma relação de oposição entre carro e bicicleta. torna capaz de identificar o maior dentre dois ou
Uma das principais afirmações da RFT é a de que mais elementos em novas situações, com novos
as crianças aprendem molduras relacionais (ou seja, objetos. Ela compreende que um objeto pode ser
aprendem a pensar e agir sobre relações) a partir da maior do que outro, mas pode ser menor do que
experiência com múltiplos exemplares dessas rela- um terceiro. A moldura da relação maior que passa
ções. Esse é um ponto particularmente importante a comportar quaisquer elementos que tenham uma
da RFT, porque a importância do pensamento rela- diferença em tamanho físico. Porém, uma caracte-
cional é enfatizada em outras abordagens da cogni- rística importante de molduras relacionais verbais é
ção. O que a RFT acrescenta é uma hipótese sobre que elas podem também ser arbitrariamente aplicá-
como aprendemos a pensar e agir relacionalmente. veis, ou seja, uma relação comparativa do tipo maior

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artigo • Teoria das molduras relacionais e possíveis aplicações à educação

que pode ser aplicada a objetos que não diferem em


A tamanho físico ou até mesmo pode ser aplicada de
modo contrário à relação de tamanho físico. Um
exemplo comum é o valor de moedas, que pode às
maioR QUe vezes não corresponder a seu tamanho físico. Moedas
de 10 centavos de Real são fisicamente menores do
que as de 5 centavos (analogamente, moedas de 10
mais esCURo QUe centavos de Dólar, os dimes, são também fisica-
mente menores do que as de 5 centavos, os nickels).
Entretanto, se pedirmos a um adulto ou a crianças já
familiarizadas com moedas para pegar a maior entre
B uma moeda de 5 e uma de 10 centavos, a moeda
escolhida será quase certamente a de 10 centavos (a
menos que seja pedido explicitamente que se pegue
maioR QUe a moeda que é maior em tamanho físico). Outros
exemplos de aplicação arbitrária de relações maior
que são ilustrados na Figura 2C. Esses exemplos
ilustram o fato de que molduras relacionais são abs-
traídas a partir da experiência com múltiplos exem-
maioR QUe plares e podem ser aplicadas arbitrariamente, engen-
drando relações puramente simbólicas.

Transferência e TransforMação
de funções
maioR QUe Ainda precisamos tratar de outra propriedade
muito importante das molduras relacionais, que é a
transferência ou transformação de funções. A transfe-
rência de funções ocorre em relações de equivalência.
Para o torcedor apaixonado de um time de futebol,
C
símbolos do time, tais como camisa, bandeira, distin-
tivo, hino etc., passarão a ser tratados como se fossem
o próprio time. Se um torcedor adversário pisar numa
maioR QUe camisa ou distintivo do time, será como se estivesse
pisando no próprio time. As funções psicológicas do
time se transferem para os símbolos que são equivalen-
tes a ele. Nesse caso, o símbolo passa a ter as mesmas
maioR QUe funções que o time: assim como o torcedor tem senti-
mentos positivos em relação ao time, terá também em
relação aos símbolos. Esse tipo de transferência, claro,
não ocorre apenas para times de futebol. Quem ama
um país mostra uma transferência análoga para sua
maioR QUe bandeira, hino, mapa, flora e fauna (como exempli-
ficado nos versos: “Minha terra tem palmeiras onde
canta o sabiá, as aves que aqui gorjeiam não gorjeiam
como lá”). Você pode identificar muitos outros exem-
plos similares desse tipo de transferência.
Figura 2. múltiplas relações entre dois itens (a). Quadros relacionais
abstraídos com base em propriedades físicas de múltiplos exemplares (b) Se, no caso de relações de equivalência, as funções
podem ser aplicados arbitrariamente (C). se transferem, outras molduras relacionais podem

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produzir uma transformação das funções. Por exem-
plo, para muitos torcedores do Corinthians, o time a tomada de perspectiva é o
está relacionado com o Palmeiras numa moldura de
oposição, de modo que as funções dos times (e tudo primeiro passo para que o
o que for equivalente a eles) serão opostas. Ao gosto
por um time corresponde a aversão pelo outro, aos
indivíduo aprenda a se comportar
sentimentos positivos relacionados a um time cor- de uma maneira empática
respondem sentimentos negativos produzidos pelo
outro, um gol contra o Palmeiras será comemo-
rado quase como se fosse um gol do Corinthians um amigo que lhe dissesse “vão-se os anéis, ficam
(mesmo que o gol tenha sido feito por outro time). os dedos”. Mães e avós, em geral, adoram dizer às
Assim, do mesmo modo que funções positivas se crianças que “saco vazio não para em pé” ao ten-
transferem aos símbolos do próprio time, essas fun- tarem fazê-las se alimentar direito. “Quem semeia
ções são transformadas em negativas em relação aos ventos colhe tempestades” pode ser dito na situa-
símbolos do time oponente. ção em que o dinheiro de uma pessoa acabou por
Não podemos subestimar a importância des- ela não ter se preocupado em poupar para o futuro.
ses processos. Torcedores exaltados chegam mui- O povo brasileiro ama provérbios. Quem nunca
tas vezes a agredir fisicamente portadores dos sím- utilizou algum desses ditos populares que atire a
bolos dos times oponentes. Símbolos de nações, primeira pedra! O que não nos damos conta é da
religiões, etnias e grupos diversos são carregados complexidade do raciocínio que está por trás deles.
de significados, de funções, com base nas relações Muitos dos provérbios são baseados em analogia,
com as entidades simbolizadas e nas relações dessas uma vez que são utilizados para descrever inúmeras
entidades com outras. Um exemplo é o dinheiro, situações cotidianas que, em uma análise superficial,
que fisicamente não passa de papel pintado. No em nada se assemelham às palavras que as descrevem.
entanto, o valor que damos ao dinheiro nem se Na verdade, o provérbio serve como uma forma de se
compara com o valor que damos a outros pedaços estabelecer um paralelo para explicar/comentar o que
de papel que contêm desenhos ou efígies. É essa aconteceu, sendo que o único componente idêntico
atribuição de funções aos símbolos que permite é a relação entre pares de elementos (veja a Figura
que a leitura de um livro, por exemplo, nos leve a 3). Na perspectiva da RFT, dizemos que a analogia é
imaginar as situações descritas e sentir as emoções uma relação de equivalência entre relações.
sugeridas pela estória. Um orador habilidoso pode A capacidade de realizar analogias é incrivel-
manipular símbolos de modo a produzir emoções mente útil a todos nós. Mesmo que não perceba-
e ações correspondentes (comprar um produto, mos, certamente utilizamos essa capacidade nos
votar em um candidato, apoiar uma causa etc.). mais variados contextos. Em muitos casos, áreas da
Redes complexas de relações permitem não ape- ciência se valem de analogias para exemplificarem
nas derivar novas relações como também possibili- suas descobertas — um exemplo bastante conhe-
tam a transferência e transformação de funções entre cido é a analogia das funções do cérebro com as fun-
os elementos relacionados, conferindo significados a ções de um computador, extensivamente usada nas
símbolos abstratos. Talvez o aspecto mais importante neurociências e ciências cognitivas. Tendo em vista a
da RFT seja a maneira como explica o desenvolvi- importância do raciocínio analógico para a cognição
mento dessas redes a partir da experiência com múl- e sua complexidade, parece importante que pessoas
tiplos exemplares. Planejando e sistematizando essas com déficits nessa habilidade possam aprendê-la.
experiências, podemos aplicar a RFT ao desenvolvi- No entanto, essa parece uma tarefa bastante com-
mento intelectual, como veremos a seguir. plicada — como fazer isso? Justamente por conta de
descrever as analogias em termos de relações entre
analogia: relações enTre relações relações, a RFT torna mais fácil delimitar o que é
Um homem que perdeu muito dinheiro em importante de ser ensinado: primeiro se ensinam
uma transação financeira poderia ser consolado por relações entre elementos e depois as relações entre

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artigo • teoRia Das moLDURas ReLaCionais e PossÍveis aPLiCaÇÕes À eDUCaÇÃo

uma pessoa precisa ter alguns “pré-requisitos”, tais


Anéis perdidos Dedos
como compreender que cada pessoa fala de sua pró-
Dinheiro perdido O essencial pria perspectiva (as relações dêiticas mencionadas
acima) e comportar-se de forma condizente ao que
Relação causal
a outra pessoa demonstra estar sentindo (empatia).
Saco vazio Não para em pé O primeiro “pré-requisito” é chamado de tomada
de perspectiva e é ensinado por meio da explicita-
Criança sem comer Não tem energia
ção das relações “eu-você”, “aqui-aí” e “antes/depois
Relação causal -agora”. Como o ensino é progressivo, o profes-
sor pode iniciar o ensino com uma frase seguida
Semear vento Colher tempestade de uma pergunta simples, como “Eu tenho uma
Não poupar Passar necessidade bola laranja e você tem uma bola azul. Qual bola
Relação causal
eu tenho? Qual bola você tem?”. Para responder
corretamente à pergunta, o aluno deve considerar
Figura 3. analogias são relações entre relações. que eu, na frase dita, refere-se a quem faz a per-
gunta (professor) e você refere-se a quem o profes-
sor se dirige (o aluno). Em um momento posterior,
as relações ensinadas. Isso é feito utilizando-se ele- ensina-se o aluno a reverter as relações aprendidas.
mentos sem um significado conhecido pelo apren- Considerando o exemplo anterior, o professor pode
diz — geralmente se utilizam figuras abstratas, por dizer: “Eu tenho uma bola laranja e você tem uma
exemplo — e o motivo para isso é facilitar que o bola azul. Se eu fosse você e você fosse eu, qual bola
indivíduo aprenda não apenas a relação entre obje- eu teria? Qual bola você teria?”. Nesse momento,
tos determinados, mas, principalmente, desenvolva o aluno tem que responder que o professor teria a
a capacidade geral de fazer relações. Somente em um bola azul e ele, a laranja. Finalmente, o último passo
momento posterior ensina-se a pessoa a fazer ana- seria ensinar o aprendiz a reverter duas relações ao
logias com coisas conhecidas. O método de ensino mesmo tempo (isto é, deixar tudo da maneira como
ainda não foi aplicado a indivíduos com Deficiência era inicialmente!): “Eu estou aqui e tenho uma bola
Intelectual, mas já foi aplicado a crianças de até laranja e você está aí e tem uma bola azul. Se eu
cinco anos de idade de forma muito bem sucedida. fosse você e aqui fosse aí, qual bola eu teria? Qual
Como abordado em outros artigos deste volume bola você teria?”.
(ver os artigos de Camila Domeniconi e João dos A tomada de perspectiva é o primeiro passo
Santos Carmo), o ensino é realizado de forma gra- para que o indivíduo aprenda a se comportar
dual, com habilidades mais simples servindo de pla- de uma maneira empática. Para a RFT, a empa-
taforma para outras mais complexas. Além disso, tia é subdividida em várias relações. Um indiví-
o aprendiz somente prossegue para um próximo duo pode não demonstrar empatia por ter défi-
passo de ensino quando ele já aprendeu muito bem cits em diferentes habilidades relacionais. Uma das
o anterior. Com isso, evitam-se erros e respeita-se o possibilidades é que a pessoa não consiga relacio-
tempo de aprendizagem de cada pessoa. Tais carac- nar eventos ambientais com o sentimento produ-
terísticas do processo educativo são utilizadas para zido por eles, ou porque nunca passou por uma
qualquer habilidade a ser ensinada. experiência semelhante, ou por não ter apren-
dido essa relação (por exemplo, uma pessoa que
ToMada de PersPecTiVa e eMPaTia nunca teve seu carro roubado não consegue ima-
É sabido que pessoas com autismo ou ginar como a outra está se sentindo ou simples-
Deficiência Intelectual podem sofrer com falta de mente não aprendeu que sentimentos de tristeza,
habilidades envolvidas com o mundo social. Em raiva ou frustração podem advir dessa situação).
muitos casos, a aprendizagem desse tipo de habili- A segunda possibilidade é que a pessoa até já
dades é ainda mais desafiadora do que adquirir apti- tenha passado por uma circunstância semelhante,
dões cognitivas. Para operar bem no mundo social, mas não conseguiu identificar em si mesma o

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sentimento produzido. Outra hipótese é que o
indivíduo consiga identificar como ele próprio se
a RFt oferece perspectivas de lidar
sente, entretanto, ainda falhe em fazer isso com os com alguns dos mais desafiadores
outros. Finalmente, a última hipótese é de que a
pessoa consiga perceber o sentimento do outro e
problemas que indivíduos com
somente não saiba como agir na situação. Assim, necessidades especiais encontram
para agir frente às outras de forma empática, uma
pessoa precisa aprender essas quatro formas de rela-
ção. O ensino da empatia é bastante complexo e as ensinaram crianças de 10 a 12 anos a estabelecer
orientações oferecidas ainda são preliminares. Elas relações de equivalência, igualdade, oposição e
ofereceriam um suporte inicial a professores que comparação (maior que e menor que) entre estí-
queiram avaliar e realizar intervenções nos déficits mulos abstratos, durante um ano. Ao final desse
das habilidades envolvidas. Sendo assim, é preciso período, seus escores de QI obtidos em um teste
desenvolver mais pesquisas que possam sustentar de inteligência aumentaram em média 2 desvios
um projeto de intervenção mais substancial. -padrão (cerca de 20 pontos) em comparação com
seus próprios escores de um ano antes, o que não
flexibilidade relacional e inTeligência aconteceu com outras crianças da mesma faixa etá-
Anteriormente, no texto, já foi discutido o ria que não receberam a intervenção.
papel do raciocínio analógico na inteligência ou Resultados animadores também foram obti-
em habilidades cognitivas. No entanto, a inte- dos quando a mesma pesquisa foi realizada com
ligência vai além do raciocínio analógico para a participantes de 11 a 12 anos que apresentavam
RFT. Para ela, o cerne do comportamento e pensa- dificuldades de aprendizagem e QIs ligeiramente
mento inteligentes é a flexibilidade relacional. De mais baixos do que o considerado normal. Ao
forma simplificada, pode-se dizer que a flexibili- final da intervenção, 88% das crianças tiveram um
dade relacional é a facilidade e rapidez com que aumento de mais ou menos 1 desvio-padrão nos
as pessoas conseguem estabelecer/aprender rela- seus escores no teste de inteligência e alguns deles
ções novas ou modificar antigas. Por outro lado, a atingiram escores normais de inteligência.
rigidez relacional é um problema sério enfrentado Assim, a RFT oferece perspectivas de lidar
pelos profissionais e familiares envolvidos com com alguns dos mais desafiadores problemas que
pessoas com Deficiência Intelectual e autismo. De indivíduos com necessidades especiais encon-
modo geral, padrões rígidos de pensamento/com- tram. Embora ainda haja a necessidade de apri-
portamento limitam as oportunidades de aprendi- morar várias das metodologias de ensino acima
zagem para o indivíduo. mencionadas, resultados extremamente positivos
Fornecendo mais evidências a favor do papel da para uma série de aplicações indicam que as novas
flexibilidade relacional na inteligência, altos esco- alternativas são promissoras. Para finalizar, uma
res em uma tarefa relacional se mostraram predi- analogia: as possibilidades de aplicação estão para
tores de altos valores de QI em uma pesquisa reali- a teoria dos quadros relacionais como uma longa
zada alguns anos atrás. A descoberta do papel dos jornada está para o primeiro passo.
quadros relacionais na inteligência ampliou hori-
zontes. Até pouco tempo atrás, a inteligência era
somente abordada como objeto de avaliação e não leiTura recoMendada
HaYes, s.C.; baRnes-HoLmes, D.; RoCHe, b. (orgs.).
de intervenção; entretanto, além de avaliada, ela Relational Frame Theory: a post-skinnerian account of
pode ser desenvolvida. Mais especificamente, estu- human language and cognition. new York: Plenum, 2001.
dos mostram que a aprendizagem e a realização ReHFeLDt, R.a.; baRnes-HoLmes, Y. (orgs.). Derived
Relational Responding: applications for learners with
de atividades que envolvem o pensamento relacio- autism and other developmental disabilities. oakland,
nal têm um impacto na inteligência, uma vez que California: new Harbinger, 2009.
elas podem melhorar tanto a capacidade de racio- tÖRneKe, n. Learning RFT. oakland, California: new
Harbinger, 2010.
cínio quanto sua rapidez. Pesquisadores ingleses

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