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CURSO MÉDIO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES PRIMÁRIOS EM

EXERCÍCIO E À DISTÂNCIA

MANUAL DE EDUCAÇÃO BILINGUE


Ficha Técnica:

Consultoria :
• Rachael Elizabeth Thompson

Direcção:
• Maria da Graça Eugénio Simbine da Conceição Brás - Directora do IAP
Coordenação:
• Luís João Tumbo - Chefe do Departamento Pedagógico do IAP
Digitação:
• Fátima Nhantumbo
• Filomena Paulino Uamusse
• Hermínio Banze

Ilustração:
• Bié Artes

Maquetização:

• Hermínio Banze
• Moisés Ernesto Magacelane
Impressão :
• Carlos Mundau Cossa
• Esperança Pinto Muchine

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CURSO MÉDIO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES PRIMÁRIOS EM EXERCÍCIO E
À DISTÂNCIA
(10ª +2 )

MANUAL DE EDUCAÇÃO BILINGUE

ELABORAÇÃO:

• MOISÉS ERNESTO MAGACELANE

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Introdução
Caro cursista,

Este módulo que lhe apresentamos é de sensibilização e orientação metodológica para


Educação Bilingue. Você como professor deve ter aprendido ou lido algures que o nosso
país é um mosaico linguístico e cultural, isto é, que Moçambique tem várias línguas e
várias culturas.

No seu dia - a - dia deve ter-se deparado com situações em que numa turma há
crianças que falam a língua do distrito onde se situa a escola em que o cursista trabalha,
e, ao mesmo tempo, outras crianças da mesma turma que falam línguas diferentes da
língua falada no mesmo distrito.

Agora páre um pouco e olhe à sua volta: na escola onde você lecciona para além de
alunos há colegas seus, por exemplo, professores, director da escola, director
pedagógico e outros. Achamos que vai concordar connosco se dissermos que cada um
tem a sua língua materna, ou seja, aquela que aprendeu a falar no seio familiar; Vai
também concordar connosco se dissermos que se cada um ao se dirigir ao outro falasse
a sua língua materna a comunicação seria deficiente ou até nula: Por isso o professor
comunica em português com os colegas e com os seus alunos por se pressupor que
todos percebam a língua portuguesa.

Mas a questão que se coloca, caro cursista, é a de que será que as crianças nas nossas
escolas nos entendem facilmente quando na nossa actividade ensinamos na língua
portuguesa? Que acha o caro colega?

Você é entendido de igual maneira por todos os seus alunos? Já parou para pensar no
que está por detrás de uma criança pouco activa na sala de aulas: não fala, quando faz
um ditado escreve tudo errado, quando lhe faz uma pergunta fica calada ou então chora?
Você aborrece-se; diz que a criança é burra e manda sair da sala de aulas; o que tem
feito?

Com este manual pretendemos discutir, fazer uma troca de experiências sobre como
trabalharmos por forma a dar resposta adequada aos problemas que surgem em turmas
em que as crianças recebem aulas em português, não sendo falantes desta língua como
sua língua materna. Elas estão sujeitas (a maioria) a duas línguas: a língua materna e a
língua portuguesa. Gostaríamos de aproveitar a sua atenção, desde já e dizermos que
estas crianças estão numa situação de bilinguismo, o que significa duas línguas. Por isso
a escola devia proporcionar uma educação bilingue isto é, uma situação de ensino –
aprendizagem em que se utilizam duas línguas, para atender a limitações de natureza
linguística que possam ocorrer no processo de ensino – aprendizagem.

Pretendemos com este manual que, o prezado professor, a partir das suas experiências
se junte a nós, discutamos e partilhemos saberes que nos permitam mudar a forma
como trabalhamos com as crianças para níveis cada vez mais altos de qualidade.

o futuro do nosso país depende da qualidade do


: homem que nós formamos hoje.

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Como está organizado o nosso manual?
O nosso manual está dividido em duas partes: uma de sensibilização e outra de
orientação metodológica.

Venha então à nossa janela de temas ver as áreas que vão constituir a nossa
abordagem no manual. Sugerimos para o estudo os seguintes assuntos:

1. O poder da língua: Acha que a língua tem poder?

2. Política linguística em Moçambique: como se manifestou no período colonial e no


pós – independência?

3. posições tomadas em relação ao uso das línguas bantu no processo de ensino e


aprendizagem: Será que há consenso em relação à proposta de ensinar as
crianças nas línguas bantu?

4. Insucesso escolar: será que uso apenas da língua portuguesa como meio de
ensino fomenta ou é um factor que contribui para o insucesso escolar?

5. Línguas bantu: uma nova abordagem no ensino das crianças em Moçambique,


podemos considerar o uso das línguas bantu no processo de ensino –
aprendizagem como um factor para minimizar o insucesso escolar?

6. A comunidade e a escola: Qual deve ser atitude do professor perante a


comunidade para que esta aceite o ensino das crianças nas línguas bantu?

Estas são as seis áreas correspondentes à 1ª parte que se pretende seja de


sensibilização.

Na 2ª parte vamos rever aspectos metodológicos inerentes ao ensino a língua para o


que propomos os seguintes temas.

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A. – Língua primeira (L1) e língua segunda (L2).O que distingue uma língua da
outra?

B. - Modalidades da utilização da L1: em que momento(s) se introduz a L1

C. – O ensino da L1: O que se deve ter em conta.

D. – Abordagem de uma aula de língua: Como desenvolver a fala, a audição, a


leitura e a escrita no processo de ensino – aprendizagem?

E. – Abordagem de uma aula de matemática e ciências naturais: Como proceder ao


ensinar a matemática e as ciências naturais na L1.

F. Exiguidade de recursos de leitura na sala de aulas: Como resolver as situações de


falta do livro na sala de aulas.

Esperamos que os temas sugeridos promovam no estimado cursista a vontade de ler


este manual pois nós reconhecemos que a sua leitura é importante para o
enriquecimento também das nossas ideias.

Dê nos a sua mão e sigamos para o estudo da primeira parte. Está pronto? Então
vamos!

Se está lembrando, um dos nossos temas tem a ver com o poder da língua.

Ora bem, o que você acha? A língua tem poder? O que é a língua, afinal?

Caminhemos em direcção a resposta, pelo que, antes sugerimos que o cursista faça um
pequeno exercício:

Certamente o cursista já lambeu os seus lábios e se nunca o fez faça o agora. Que
sentiu? Provavelmente o seguinte:

Você sentiu o movimento de um membro húmido de dentro para fora da boca que ao
mesmo tempo que pressionava a superfície dos lábios num movimento circular, os
humedecia. Todo o ser humano normal tem este membro, esta parte física que em
português se chama língua. Mas ao perguntarmos o que é a língua, com certeza nos
queremos referir não só a esta parte visível, física, mas também a outra que não vemos
e que constitui um bem comum e social. Para uma compreensão clara do que se disse
sobre a língua, sugerimos ao cursista que viage connosco. Vamos ao bosque:

Escute ... está a ouvir o zumbido? Há um zumbido aqui por perto, são abelhas sugando o
néctar das flores. Olhe: há uma colmeia ali: vamos ao mel! Não ... não podemos
provocar as abelhas porque não estamos equipados para a colheita do mel. E é perigoso
provocá-las e elas vivem unidas e em sociedade e comunicam-se rapidamente através
de sinais e podem matar-nos a ferroada

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Você já se deu conta de que todos os seres vivos, na sua maioria, tal como as abelhas
vivem em comunidade e que têm formas específicas de se comunicar? Estamos certos
de que sim!

Também o homem é assim. Na sua relação com outros homens realiza actividades
comuns à comunidade a que pertence, com finalidades determinadas e por conseguinte
constitui se em sociedades. As relações mantidas no seio do grupo, fundamentam-se no
acto de comunicação e manifestação em que são utilizados objectos materiais
concebidos para esse fim, por exemplo: gritos, sinais de trânsito, símbolos matemáticos,
lógicos ou químicos, formas nas artes plásticas ou na arte musical etc...
A esta faculdade humana através da qual o homem se manifesta ou manifesta algo a
outros integrantes do seu grupo chama-se linguagem.

Mas o que a linguagem tem a ver com a língua?

O cursista está correcto se questionar desta forma: relacionamos a linguagem com a


língua porque esta é a parte social da linguagem. Isto quer dizer que o indivíduo não
pode sozinho criar e falar a língua senão numa comunidade, por isso a língua é um
produto social. Sendo assim, a língua aparece como um conjunto de convenções,
normas necessárias adoptadas pelo corpo social para permitir o exercício da

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comunicação entre os indivíduos. Em outras palavras a língua é um veículo de
transmissão da identidade da cultura e da vida de um provo. A história mostra-nos
que é possível qualquer língua desenvolver-se e ser usada para qualquer fim. Todas as
línguas estão habilitadas a resolver qualquer problema ou necessidades. As línguas
desenvolvem-se e tornam se poderosas quando aplicadas para funções importantes.
Portanto a língua tem poder. O poder da língua cresce à medida que ela é usada como
meio de comunicação na escola, no parlamento, nos serviços, no comércio, na
tecnologia etc...

O inglês, o francês, o espanhol, o português são línguas com poder porque são línguas
de ensino, da tecnologia, do discurso no parlamento etc... podemos, em outras palavras,
tornarmos qualquer língua numa língua com poder se lhe dermos a oportunidade de uso
em diversas esferas sociais, políticas, económicas, de ensino etc...

Você deve ter ouvido falar do Afrikaans, a língua dos Booers na RSA que de língua da
cozinha passou à língua do uso nas universidades, ou seja, pelo uso o afrikaans ganhou
poder.

Recapitulando:

 A língua está ligada à linguagem e é um bem social


comum, ela pode atingir o estatuto de língua de poder
se usada como meio de comunicação na escola, no
parlamento, na economia e noutros domínios sociais,
económicos etc...

Para o caso de Moçambique, podemos dizer que qualquer língua bantu pode ser
revestida de poder se lhe der a oportunidade de uso nas esferas económica, política,
social, tecnológica, educacional etc...

Mas porquê as línguas bantu não são línguas com estatuto elevado ou com poder? Para
compreender esta questão sugerimos que o cursista siga connosco ao tema:

Política linguística em Moçambique: como se manifestou no período colonial e


período pós independência?

Com certeza você se lembra do que acontecia no período antes da independência, em


relação às línguas bantu. No período colonial era extremamente proibido falar estas
língua na escola. As línguas bantu eram vistas como landim, dialecto ou “língua de cão”,
ou línguas inferiores em relação ao português, por outro lado o português era “língua de
gente”.

Você, lembra-se dos assimilados? O processo de assimilação em Moçambique consistia


em os nativos(moçambicanos) abandonarem a sua língua, cultura e identidade e
adoptarem a língua do colonizador, o português, a sua cultura e identidade. Por isso nas
escolas, lado a lado, ensinava-se a aritmética, leitura e escrita do português. A educação
era principalmente baseada na doutrina religiosa e outros conteúdos estavam ligados à

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história e geografia de Portugal. O objectivo final deste tipo de educação era incutir nos
nativos a cultura europeia, crenças e valores ocidentais.

A educação básica nas zonas rurais tinha como fim educar a população indígena (os
nativos) a tornarem-se civilizados isto é brancos (mulungus, ou muzungus). Talvez esta
fosse a razão porque o uso da língua portuguesa como meio de instrução fosse
obrigatório desde o 1º ano de escolaridade. Por outro lado as escolas secundárias
estavam concentradas nas zonas urbanas e eram destinadas a um grupo de elite.
Portanto a política linguística no período colonial era fundamentalmente de exclusão das
línguas bantu, ou seja, de não valorização e uso destas línguas no ensino. A única língua
reconhecida e promovida para a comunicação era o português.

No período colonial, a política linguística era a de


exclusão das línguas bantu que eram vistas como
línguas inferiores.

Por outro lado promovia-se a língua portuguesa


como língua da escola, do comércio, de estatuto
elevado, da elite cujo acesso implicava o abandono
da cultura e identidade africanas bem como das
línguas bantu, tornando-se assimilado quem assim o
fizesse, e era visto como é branco “mulungu” ou
“muzungu”.

E depois veio a Independência...

Com certeza, depois veio a independência e certamente com uma visão diferente e
nova em relação às línguas bantu: A outra política linguística.

Dada a importância desta questão, a nossa constituição consagra o seguinte: na


República de Moçambique a língua portuguesa é a língua oficial. O Estado valoriza as
línguas nacionais e promove o seu desenvolvimento e utilização crescente como línguas
veiculares na educação dos cidadãos . O cursista pode encontrar este extracto no artigo
5 nos pontos 1 e 2 da constituição da República de Moçambique.

A nossa constituição consubstancia também a visão africana da política expressa na


declaração de Harare cujas grandes linhas de orientação são:

a) Toda a política linguística africana deve ser tal que dê oportunidade ás crianças
a ter uma visão panorâmica da África.

b) Cada país deve produzir uma política linguística clara na qual todas as línguas
faladas no país tenham lugar.

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c) As linhas de orientação da política formada devem ser sustentadas por uma
legislação.

d) A política linguística de cada país deve apresentar um quadro flexível o suficiente


para permitir que cada comunidade use a sua língua lado a lado com as outras
línguas enquanto integrada na sociedade com uma política que enriquece a
língua de forma a que esta proporcione a comunicação local, regional e
internacional a vários níveis.

Desde então temos vindo a acompanhar várias iniciativas de estudo e desenvolvimento


da ortografia, para as línguas bantu: há esforços no sentido de proporcionar o seu uso na
escola, na rádio e em outras vertentes sociais, políticas e económicas. Podemos assumir
que a política linguística do pós – independência é a de inclusão das línguas bantu no
processo de desenvolvimento do país. Para o cursista ter uma ideia da situação
linguística em Moçambique, basta dizer que 93,5% da população moçambicana tem a
língua portuguesa como língua segunda (L2) ou mesmo língua estrangeira. Isto quer
dizer que apenas 6,5% de moçambicanos têm a língua portuguesa como língua materna
(L1). O cursista sabia que há 20 línguas bantu faladas em Moçambique?

É verdade, 20 línguas! Veja o módulo 01 de linguística bantu.

No período pós – independência, a política linguística mudou . A valorização


das línguas bantu foi consagrada pela constituição; a política linguística é a

 de inclusão das línguas bantu no desenvolvimento do país através do


incentivo do seu uso na escola, na política, na economia e no comércio. Por
isso estudos estão sendo feitos no sentido de se padronizar a ortografia.

No período Colonial as línguas bantu


não eram valorizadas. No período pós –
independência elas ganham valor.

Um exemplo actual que aponta para a valorização das línguas bantu é, o novo currículo
do Ensino básico que prevê o uso das línguas nacionais (bantu), na escola, como meio
de ensino.

Mas, qual é a opinião das pessoas em relação a esta intenção?

Há várias posições tomadas em relação ao uso das línguas bantu no processo de ensino
– aprendizagem nas escolas.

De facto, há muitos comentários à volta do ensino das crianças nas línguas bantu. Se o
cursista tiver tido a oportunidade de ouvir, alguns pais, encarregados de educação, os
próprios alunos e a comunidade em geral, talvés tenha ouvido coisas como:

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Estou muito frustrado com esta coisa de ensinarem as crianças em línguas bantu ou “ o
que não consigo entender é: como é que uma criança que tem dificuldade, agora que
aprende em português, vai ter facilidades de aprender na língua bantu?; ou “ isso de
ensinar as crianças nas línguas bantu... é um projecto para atrasar as nossas crianças”; “
crianças que falam duas ou mais línguas têm grandes dificuldades em raciocinar melhor
em relação a uma criança que apenas tem uma única língua;

Queremos acreditar que o cursista em algum momento tenha sido perturbado por estas
inquietações ou outras do género. As pessoas que fazem estes questionamentos estão
cobertas de razão: Elas não estão informadas ou esclarecidas o suficiente no
concernente a esta metodologia de ensino. O ensino das crianças nas línguas bantu não
aparece por acaso, ela é o resultado de estudos feitos, experimentações realizadas e
resultados encorajadores obtidos. A questão do ensino das crianças nas suas línguas
maternas teve como seus primeiros palcos os EUA; Canadá; depois a experiência se
expandiu por Europa, África, Ásia e outras partes do globo terrestre.

Os estudos realizados asseguram-nos que numa situação de ensino em que o meio de


ensino é uma língua segunda português, no caso de Moçambique, a criança, apresenta
melhores resultados de aprendizagem se ensinada na sua própria língua (L1). Isto
significa que muitas crianças do nosso país estão numa situação de desvantagem em
relação àquelas que têm a língua portuguesa como língua materna ou 1ª, isto porque as
crianças aprendem melhor e facilmente na língua que elas dominam ou falam em casa.
Por isso o uso das línguas bantu no ensino é relevante para a maioria das crianças
moçambicanas pois elas constituem a sua língua materna, primeira, a que elas
dominam.

Por este facto o cursista é convidado a fazer todo um esforço no sentido de convencer as
comunidades, os pais, os parentes e os colegas a aceitarem o uso das línguas bantu
pois isso só ajuda em vez de prejudicar os nossos filhos, irmãos, vizinhos etc...

Outra inquietação que é normal ouvir quando se fala de ensino nas línguas bantu é: será
que é possível ensinar matemática, ciências em línguas bantu?

Os resultados da investigação asseguram que é possível ensinar qualquer disciplina nas


línguas bantu.

Se o cursista se lembra, numa passagem da nossa discussão dizíamos que não há


línguas inferiores nem superiores; as línguas podem ser poderosas se lhes dermos
oportunidade para tal.

A verdade é que o não uso das línguas bantu nas escolas faz do sistema educativo um
sistema injusto que não proporciona oportunidades equitativas em relação às crianças
pois, olhando para o sistema de educação de Moçambique em que todas as crianças
estão sujeitas a um ensino na língua portuguesa, constata-se que apenas uma minoria,
isto é, as crianças das zonas urbanas ou falantes da língua portuguesa beneficiam, com
vantagem, do sistema formal de educação, as crianças não falantes da língua
portuguesa que curiosamente representam a maioria da população escolar
moçambicana, são prejudicadas.

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Caro cursista, páre um pouco e pense nas crianças da sua escola. Quantas crianças
falam a língua portuguesa como língua materna? Faça as contas. Se calhar não há
nenhuma criança nesta situação; mas o professor fala português para comunicar com
elas. Portanto estas crianças não falantes do português como sua língua 1, estão em
desvantagem... é uma injustiça para elas, o que está acontecer!

Para ilustrar a situação em que se encontra a maioria das crianças gostaria de convidar
o cursista a ler as palavras de uma investigadora da nossa praça: o sistema educacional
moçambicana é um bom exemplo da dialéctica existente entre inclusão e exclusão;

Inclusão porque a entrada das crianças no ensino primário é obrigatória isto é todas as
crianças têm este direito salvaguardado, porém de exclusão porque por se adoptar
apenas a língua portuguesa como língua oficial de ensino isto leva a que grande parte
dessas crianças saíam do sistema pois reprovam por causa da língua.

Daqui podemos concluir que o uso exclusivo da língua portuguesa como meio de ensino,
em Moçambique, é desvantajoso e é uma forma de exclusão e de fomento de insucesso
escolar.

O uso exclusivo da Língua portuguesa como meio de ensino é uma forma de fomento de
insucesso escolar.

Posto isto, que soluções há para inverter a situação?

Vimos que foram feitos estudos que confirmaram que o uso da língua materna no
processo de ensino – aprendizagem é vantajoso. Queremos acreditar que o uso das
línguas bantu pode minimizar o problema.

Tomando em consideração a percentagem de crianças que têm a língua portuguesa


como língua materna (6,5%) e o número de crianças que têm a língua bantu como língua
materna 93,5%, se tomarmos em conta, também, os resultados das investigações que
provam que:

− É melhor ensinar as crianças na língua que elas falam em casa porque os


resultados de aprendizagem são satisfatórios;
− O uso de uma língua segunda como meio de ensino coloca em desvantagem as
crianças excluindo-as do sistema. A partir destes argumentos julgamos que é
justo, portanto, que para o caso de Moçambique as crianças sejam ensinadas nas
línguas bantu. E o cursista vai concordar connosco se lhe convidarmos a aceitar
que é muito mais justo adoptar o ensino nas línguas bantu uma vez que estas
proporcionam nas crianças uma aprendizagem com resultados encorajadores.

Ma será que as pessoas envolvidas no sistema de educação: planificadores,


professores, alunos, pais, encarregados de educação e a comunidade em geral estão
suficientemente esclarecidos sobre este tipo de metodologias, as suas vantagens e
desvantagens?

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Esta questão é um convite ao cursista para a abordagem do tema a da comunidade e a
escola e aqui importa ver qual deve ser a atitude do professor perante a comunidade por
forma a que esta seja favorável ao ensino das crianças nas línguas bantu. A tendência
das pessoas, duma forma geral, é resistir às mudanças, as pessoas têm medo do novo e
dificilmente elas o aceitam. Esperamos que não seja o caso do cursista pois a si
depositamos a tarefa de ser o promotor desta nova metodologia de ensino das crianças,
tomando a língua bantu como meio de ensino.

Caro cursista sobre esta matéria, achamos que, em primeiro lugar, você, tem de fazer
um primeiro trabalho sobre si mesmo. Queremos com isto dizer que, numa 1ª etapa, o
cursista deve falar consigo mesmo, no sentido de aceitar a mudança; acreditar que esta
metodologia de facto é um factor de mudança no sentido positivo.

Mas é claro, caro cursista, que para convencermos aos outros sobre algo, primeiro
temos de nos identificarmos com tal coisa. Neste caso, é fundamental que o cursista
tenha consciência de que o ensino das crianças usando sua língua materna como meio
de ensino é um facto comprovado pelos estudos e que dá resultados positivos. Este
pressuposto é fundamental para o desempenho do papel que queremos propor ao
cursista perante a comunidade.

O facto é que o cursista é um professor esclarecido e tem perante si uma comunidade


que não entende ou não está suficientemente claro sobre a nova metodologia de ensino
– aprendizagem das crianças. Esperamos que você se esclareça o suficiente sobre esta

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matéria para poder ajudar a comunidade a aceitar o ensino das crianças na sua língua
materna.

O cursista está do nosso lado como movimento de mudança pelo que é convidado a
fazer uma campanha de sensibilização para convencer os pais, encarregados de
educação e a comunidade em geral a assumir a nova forma de ensinar as crianças,
como algo bom e vantajoso.

Nós sabemos que o que eles pensam é que as línguas bantu não proporcionam boa
aprendizagem às crianças, sabemos que eles acham que as crianças aprendendo na
sua língua materna vão sofrer um atraso em relação às outras crianças. Sabemos que os
pais ao dizerem isto revelam o desconhecimento dos estudos e experiências feitas à
volta de uma educação das crianças na sua língua; Eles ignoram as vantagens que
advêm disso. Mas o cursista não! Conhece as vantagens deste tipo de ensino para as
crianças moçambicanas, pelo menos é o que pretendemos com os conhecimentos que
lhe proporcionamos.

O nosso papel (nós e o cursista) é o de trazermos todas as partes envolvidas à razão, à


verdade. De que forma?
reunião com encarregados de educação/comunidade,
Representante da comunidade 1. Envolvendo os colegas na acção de
Encarregados de educação
Líder comunitário
sensibilização às comunidades o que significa
População partilhar esta informação com os colegas.
Professor
2. Aproveitar as reuniões com os encarregados
de educação para provocar um debate à volta
do ensino das crianças nas línguas bantu,
conduzindo o debate à conclusão de que é
melhor ensinar as crianças na língua que elas
entendem que falam em casa.
3. Envolver as estruturas do poder local na
acção de mobilização e sensibilização da
comunidade no sentido de esta aceitar o
ensino das crianças nas línguas bantu.
4. Uma forma segura de mobilização são os
resultados. Se o professor ensinar as crianças
na língua bantu e isso fizer diferença, no
sentido positivo, então isso já por si é um
motivo para que as pessoas mudem de atitude
em relação à metodologia.
O que podemos dizer é que o cursista como professor deve ser o primeiro a ter cede de
se esclarecer sobre a nova metodologia afim de ser capaz de esclarecer os outros.

O que é certo é que:

Ensinar as crianças na sua língua materna trás vantagens para elas que têm a língua
portuguesa como língua 2ª. Lembre-se de que as investigações sustentam que:

1ª As crianças desenvolvem uma boa base de raciocínio e imaginação quando os


conceitos são formados e aprendidos na sua língua materna que é a língua que elas
conhecem bem.

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2ª Aprender uma língua (2ª), como a língua portuguesa, torna-se fácil para muitas
crianças quando elas podem usar o que elas já sabem na sua língua materna na
aprendizagem da outra língua, neste caso a portuguesa.

3ª Adicionar uma outra língua à língua materna significa que as crianças têm
oportunidade de conhecer e apreciar as duas línguas: português/língua materna.

4ª Crianças que usam mais do que uma língua raciocinam e falam melhor a língua
portuguesa. Isto ajuda lhes muito na escrita e leitura.

4. Crianças que usa mais do que uma língua numa situação de aprendizagem são
muitas vezes melhores a fazer comparações, medições e a trabalhar com ideias.
Isto é uma importante base para entender matemáticas e ciências.

5. Uma criança bilingue performa melhor na escola (tem bom resultado) do que uma
criança que não usa a sua língua materna para aprender na escola.

Estes argumentos, parecem ser suficientes para que estejamos a favor de um ensino
das crianças na língua bantu.

O cursista tem a oportunidade de convencer a comunidade a ser receptiva a esta


metodologia de ensino das crianças nas línguas bantu.

Ao longo do nosso estudo temos vindo a falar da língua materna, língua segunda, língua
primeira. O que distingue uma língua da outra?
Língua materna é a língua com a qual aprendemos a falar quando nascemos e que é do
nosso domínio pleno. Esta língua pode ser da mãe ou do pai ou do local onde nascemos.
Desta definição ou conceito da língua surge o da língua primeira. Normalmente usa se
com o mesmo sentido que para a língua materna, para designar que é aquela que a
pessoa adquire em primeiro lugar em relação a outras línguas que vai adquirindo ou
aprendendo ao longo da vida. Em Moçambique e em muitos países africanos, a língua
primeira ou materna da maioria é uma língua africana.

A língua segunda ou simplesmente L2 é a língua que um indivíduo adquire ou


aprende em segundo lugar e na qual consegue comunicar razoavelmente. Em
Moçambique a L2 (português) aprende-se de duas maneiras: informalmente, na
comunidade ou em casa e, formalmente na escola. Em ambos os casos a língua é de
pouca cobertura no sentido de nº de pessoas que a aprendem e falam e, embora língua
oficial não é conhecida pela maioria de moçambicanos.

Ao uso alterando de duas línguas numa comunidade L1 e L2 dá-se o nome de


Bilinguismo.
No nosso manual ao nos referirmos ao ensino bilingue queremos dizer que é um
processo de ensino em que duas línguas são usadas duma forma alternada como meio
de ensino.

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Depois de apresentarmos ao cursista alguns conceitos gostaríamos de partilhar consigo
alguns exemplos que achamos serem úteis para que a questão de L1, L2, língua
materna seja ainda mais clara.

Em relação à língua materna pensamos que a sua própria experiência ou do colega é


muito útil, veja: você não nasceu a falar português e certamente antes de frequentar uma
escola você falava uma língua, a dos seus pais ou da sua comunidade: foi a primeira
língua que você falou. Essa língua é uma das línguas bantu e, portanto, a língua materna
ou abreviadamente L1; depois, provavelmente na escola, você aprendeu a falar a língua
portuguesa, isto é, a língua 2ª, abreviada L2.

Ao leccionar as crianças na língua bantu, pretende se que numa primeira etapa a língua
bantu seja meio de instrução, e a língua portuguesa uma disciplina. Na etapa seguinte o
português passa a ser meio de instrução e a língua bantu disciplina. Como deve estar a
perceber, uma mesma criança começa a aprender na língua bantu e mais tarde passa a
aprender na língua portuguesa. A este processo dá-se o nome de Educação bilingue que
no caso de Moçambique é caracterizado pelas seguintes modalidades de introdução das
línguas moçambicanas no ensino:

Modalidades de introdução
A introdução das línguas moçambicanas no ensino vai observar três modalidades
segundo o novo programa do ensino básico.

a) Programa de educação bilingue; Línguas moçambicanas (L1) Vs Português (L2)


b) Programa de ensino monolingue em português – L2 e línguas locais como
disciplina.
c) Programa de ensino monolingue português – L2 e língua locais como disciplina.

Das três alíneas aqui apresentadas, está claro para o cursista, pensamos, que a que diz
respeito directamente ao tema do nosso manual é a alínea a) programa de educação
bilingue: Línguas moçambicanas(L1) Vs Português (L2).

Uma das inovações do novo currículo do Ensino básico, é a estruturação do ensino


primário por ciclos de aprendizagens. O desenvolvimento do modelo bilingue tem
também em conta este aspecto.

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Há vários modelos bilingue existentes no mundo mas o que se acha adequado para
Moçambique é o tradicional que será desenvolvido da seguinte forma:

Descrição do quadro:

Se o cursista prestar atenção ao quadro vai verificar que a parte escura vai decrescendo
à medida que avançamos da 1ª à 5ª classes e, a partir da 5ª classe para 7ª classe a
parte escura não aumenta nem diminuiu: Ela mantém-se. A parte escura representa a
língua materna ou L1.

Pensamos que o cursista está a perceber que a criança, na 1ª e 2ª classes (1º ciclo), tem
como meio de ensino, ou seja, a língua com que aprende na escola, a sua língua
materna (L1).

Ao mesmo tempo, a língua portuguesa (L2) e a língua materna, são ensinados como
disciplinas. A criança aprende o português como disciplina a fim de desenvolver
habilidades de oralidade para preparar a aprendizagem da leitura e da escrita nesta
língua (portuguesa), no 2º ciclo. Por outro lado, a língua materna aparece como
disciplina para habilitar a criança a escrever e a ler na sua própria língua.

Caro cursista, volte a observar o quadro.

Certamente verifica que a parte banca do quadro cresce à


medida que avançamos para as classes superiores
enquanto a escura decresce. Isto tem outro significado:

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Significa que numa fase inicial, a criança, na sua
aprendizagem faz muito uso da sua língua materna que do
português; à medida que for prosseguindo de uma classe
para a outra, passa a fazer mais uso da língua portuguesa
do que da língua materna. A uma dada altura, a língua
portuguesa evolui como meio de ensino.

É por isso que se chama a este modelo de transição e de manutenção: transição da língua
materna para a língua portuguesa e manutenção da língua materna como disciplina.

Você como professor vai ensinar as crianças na sua língua materna no primeiro ciclo; no
segundo ciclo vai iniciar o processo de transição gradual; o 2º ciclo compreende a 3ª, 4ª e 5ª
classes.

O que acontece, na verdade, é que os alunos passam gradualmente do meio de ensino (L1)
para o meio de ensino (L2).

Deste modo, no início da 3ª classe, os alunos iniciam a aprendizagem da leitura e escrita em


português, através de um processo de transferência de habilidades adquiridas na L1.

Assim como no 1º e no 2º ciclos a L1 e a L2 (língua materna e língua portuguesa) são


leccionadas como disciplinas. Neste ciclo (2º) a língua materna continua a ser meio de ensino
no processo de ensino – aprendizagem, até à 3ª classe.

A partir da 4ª classe a L2 passa a ser o meio de ensino – aprendizagem. Assim como no 1º, no
2º ciclo, a L1 e a L2 são leccionadas como disciplinas.

A L1 continua a ser um meio auxiliar do processo de ensino – aprendizagem, principalmente


em disciplinas como ciências Naturais, matemática, ciências sociais para explicar e clarificar
conceitos difíceis.

No 3º ciclo, a língua portuguesa passa a ser o único meio de ensino – aprendizagem. Espera-
se que nesta fase os alunos possuam um bom nível de desempenho na língua portuguesa,
bem como na língua materna.

O professor vai continuar a leccionar a língua materna como disciplina, somente. Mas isto não
impede que o professor use esta língua como auxiliar do processo de ensino – aprendizagem,
à semelhança do que acontece nos ciclos anteriores (1º e 2º ciclos).

Recapitulando:

− O cursista vai trabalhar com as crianças leccionando-as na sua língua materna na


1ª e 2ª classes (1º ciclo);
− Neste ciclo a língua materna e a língua portuguesa também serão leccionadas
como disciplinas;
− No 3º ciclo vai leccionar na língua portuguesa sendo que o português e língua
materna continuam a ser leccionadas como disciplinas.

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O modelo bilingue adoptado é de transição e manutenção. Os ciclos de aprendizagem
segundo o novo currículo do Ensino Básico são:

a) 1º (1ª, 2ª classes)
b) 2º (3ª, 4ª, 5ª classes)
c) 3º (6ª, 7ª classes)

para além desta modalidade há outras modalidades previstas.

− Programa de ensino monolingue em português – L2 como recurso às línguas


locais.
− Programa de ensino monolongue em português – L2 e línguas locais como
disciplina.

− Línguas moçambicanas como recurso

São essencialmente, duas razões porque se introduz esta modalidade:

− O modelo de educação bilingue adoptado prevê a utilização da L1 como auxiliar


do processo de ensino – aprendizagem, principalmente a partir da 4ª classe em
que o meio principal é a língua portuguesa.
− O ideal seria fazer a aprendizagem inicial/ensino da leitura e escrita, na língua
materna mas os programas de educação bilingue não poderão a curto e médio
prazos cobrir todo o país.

Enquanto tal não for possível, há que encontrar uma estratégia em que se possa recorrer
às línguas locais como auxiliares do processo de ensino aprendizagem. É assim que as
línguas bantu aparecem. como recurso, com metodologias apropriadas.

Como vê, caro cursista, se na sua escola não houver um programa de educação
bilingue, tem que fazer o uso da(s) língua(s) bantu falada(s) na zona circunscrita à sua
escola para auxiliar a aprendizagem das crianças.

Por outro lado, temos a modalidade

Línguas moçambicanas como disciplina.


Esta modalidade, também, tem a sua pertinência pois é uma forma de dar uma
oportunidade de ter acesso às línguas locais como forma de estabelecer ou manter
contacto com a cultura moçambicana. Outra razão que justifica esta opção é que se
aumenta a eficácia da comunicação num contexto multilingue (de muitas línguas),
contribuindo para o reforço da unidade nacional.

Abordada a questão das modalidades de introdução vamos agora tratar do tema


abordagem de uma aula de língua: como desenvolver a fala a audição; a leitura e a
escrita no processo de ensino – aprendizagem.

Para começar achamos que é importante partirmos de si, caro cursista, como professor.
Mas porquê por mim? Deve estar a perguntar. Por uma razão muito simples é que do

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professor depende a maior parte do comportamento dos alunos na sala de aulas. As
crianças sente-se mais à vontade com o tipo de professor que demonstra paixão ,
entusiasmo, pelo que faz; empatia pelos seus alunos; o professor deve ter um bom
domínio da teoria e da prática. Um professor assim, para além de cativar as crianças faz
com que elas atinjam bons resultados de aprendizagem diferentemente, professores
desleixados ou que ensinam de uma forma deselegante; professores que abertamente
não gostam da sua actividade e acham que as crianças são um incómodo e estúpidas,
esses, quando mais só “assassinam” as crianças: com este tipo de professores as
crianças não aprendem.

A paixão pelo trabalho é a grande linha de força na alfabetização das crianças. Caro
cursista, isto é mais importante do que os livros ou métodos, recursos ou o tamanho das
turmas. A paixão é a chave mágica do processo de ensino – aprendizagem.

Outro requisito que o professor deve ter é o de saber o que efectivamente vai fazer; no
caso do desenvolvimento da leitura, por exemplo, saber o que é efectivamente a leitura e
ser capaz de definir isto claramente. Só assim pode ensinar efectivamente.

As crianças que aprendem língua, sente-se mais confortáveis com um professor que
conta histórias ou que tem o hábito de ler texto em voz alta. Se as crianças ouvem
repetidas vezes histórias, podem compreender como é que as histórias funcionam, por
exemplo, como a história começa e termina, como é que as coisas são ditas ao contar
uma história etc...

As crianças gostam de tocar, ver (são curiosas). Por isso, você, deve ser criativo no
sentido de criar um ambiente em que as crianças se sintam expostas ao melhor material
escrito sempre que possível.

Como pode constatar, prezado cursista, as características apresentadas são


importantes para o professor, na hora de ensinar as crianças a ler e a escrever.

Ao ensinar as crianças a ler, o professor deve ter em conta que a escrita e a leitura
andam juntas por isso nós preparamos para si as seguintes dicas para ensino de leitura
e escrita.

− Primeiro, você deve entender profundamente o que a leitura significa.


− Saber que na leitura dos textos as crianças apreciam a repetição e muito ritmo as
crianças gostam de cantar.
− Contar histórias e ler textos em voz alta é recomendável numa aula de leitura.
− Criar situações em que as crianças lêem textos
− Criar um ambiente de escrita sempre que possível. Isto vale dizer que quanto
mais exposta ao material escrito a criança estiver, mais facilmente ela lê e
escreve. O professor deve procurar sempre que possível combater as salas
”nuas”. As salas devem ter cartazes, imagens uma mini biblioteca que o professor
pode organizar a partir do material escrito que for recolhendo: jornais, revistas
educativas; variedades de livros que reflictam o dia a dia do aluno etc...o mais
importante caro cursista é: usando da sua criatividade, criar e proporcionar às
crianças um mundo de leitura e escrita.

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Para desenvolver a escrita, ponha as crianças a copiar textos que elas gostem de ler.
Peça-as para escreverem histórias ou descreverem a sua aldeia, casa etc... Mas é
importante que este acto de escrita tenha algum significado para as crianças senão elas
em vez de escrever vão cantar. Quando a criança escreve coisas ligadas ao seu mundo
ela encontra na escrita um prazer. Deve ter em conta a classe do aluno pois não vai por
uma criança da 1ª a escrever textos longos, mas pode exercitá-la na caligrafia, pode
iniciá-la na escrita de frases simples etc...

Algumas vezes os professores queixam-se de falta de material mas eles mesmos podem
criar esses materiais. A propósito disto, no tema: produção de material didáctico vamos
ver como é possível ter-se esses materiais na sala de aulas.

− Todo o material de leitura que facultarmos às crianças deve na medida do


possível, reflectir a sua vivência. Se assim for, elas vão aprender facilmente a ler.
Mesmo consigo Caro cursista, tem acontecido ser difícil ler um material não
familiar, com coisas novas que não dizem muito respeito ao seu quotidiano. Por
exemplo se dissermos ao cursista que “para a extracção de um electrão de um
núcleo é preciso bombardear o corpo com uma energia superior a que
mantém o electrão no núcleo por forma a que este saia das camadas mais
baixas para as mais altas. Quando a energia é suficiente o electrão atinge a
camada limite no infinito e daí ele passa a movimentar-se com base na
energia cinética”.

É provável que a leitura deste texto tenha sido difícil para o cursista porque alguns
termos não lhe são familiares; porque o que o texto reporta não faz parte do seu dia - a-
dia. Mas se lhe dissermos: “um automóvel que ia a uma velocidade de 240km por hora
saiu da estrada e foi embater num embondeiro”, facilmente o cursista vai deduzir que os
ocupantes do automóvel morreram e que o carro ficou completamente danificado. É fácil
ler o texto quando o que ele reporta nos é familiar.

Aqui é importante esclarecer que quando falamos da leitura não falamos do mero acto de
produzir sons do que está escrito (erro comum entre educadores). Isto não é leitura . A
leitura deve ser vista como um processo cognitivo de interpretação compreensão e
construção de uma dada realidade. Ler significa ser capaz de dar sentido ao que está
escrito. Uma leitura assim feita é construída sobre três pilares fundamentais:
− O nosso conhecimento da língua
− O nosso conhecimento do mundo onde vivemos
− E o conhecimento da escrita.

Prezado cursista, tal como dissemos no início a abordagem de uma aula de língua
pressupõe também o desenvolvimento da fala e da audição. Sobre este assunto,
recomendamos ao professor a evitar todos os factores que possam inibir as crianças,
principalmente da fala. Por exemplo a forma como o professor aborda o erro na sala de
aula pode determinar muito o tipo de alunos da sua turma. Quando o erro é visto como
algo nocivo, todas as crianças vão ter medo de errar. E aqui começa o problema.
Também é normal o professor incutir nos alunos consciente ou inconscientemente que
aquele que erra é “burro”, ou que “não vale nada” e outras expressões similares. Este
tipo de atitude só prejudica o desenvolvimento desta habilidade nas crianças. Elas
passam a ter simplesmente medo de falar, tornam-se crianças acanhadas, retraídas e

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desenvolvem em si o complexo de inferioridade. A sua auto – estima é posta em causa.
Estes aspectos negativos fazem com que as crianças sejam introvertidas.

O que achamos que o professor deve fazer é a criação de um ambiente em que o erro
faças parte das coisas positivas. Para isso o professor deve ser criativo por forma a que
a criança assuma o erro como uma oportunidade de aprendizagem e não de fracasso ou
castigo. Este é um dos factores fundamentais para a criação de um ambiente de fala e
audição ou escuta; outro factor é que o professor deve criar situações que interessem ou
cativem os alunos a falar e a ouvir.

Aqui estão algumas coisas que o professor pode fazer para desenvolver a fala e a
audição:

− Pôr os alunos a contar as suas próprias histórias enquanto um conta outros


escutam
− Pôr os alunos a recontarem histórias: que leram ou que um colega contou;
− Pedir aos alunos para escutarem a rádio e dizerem cada um o que constituiu
matéria de grande interesse para si;
− Criar peças teatrais em que os actores dialogam e os outros alunos escutam para
depois darem o seu comentário, o seu ponto de vista.
− Pôr os alunos a descreverem oralmente situações várias etc...

O mais importante é que estas actividades devem ser planificadas. Elas não podem
aparecer na aula por um mero acaso, elas devem fazer sentido no processo de ensino –
aprendizagem das crianças.

Não esqueça, que para você desenvolver este tipo de aulas, você mesmo deve ser
criativo; deve ter paixão, deve ser interessante para os alunos, você deve ser empático.

Caro cursista, passemos agora à abordagem de aula de matemática de ciências na L1.


Preferimos juntar as duas áreas pois neste tema trataremos de apresentar formas de
contornar alguns problemas de natureza linguística que poderão ocorrer durante o
processo do ensino de matemática ou das ciências na L1. Uma das inquietações
ventiladas em relação ao ensino de ciências ou matemática na L1 é o facto de as línguas
bantu não terem todos os termos científicos ou técnicos.

Mas é importante também que o cursista saiba que esta lacuna não existe apenas nas
línguas bantu. A língua portuguesa, inglesa, francesa (para mencionar as mais usadas
no domínio da ciência e tecnologia) também tiveram este problema de não terem todos
os termos referentes à ciência e tecnologia. Por exemplo na língua portuguesa temos as
seguintes palavras:

Palavras Origem
Agricultura Do latim agricultũra
Célula Do latim cellũla
Carbono Do latim carbõne
Alumínio Do latim alũmen

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Petróleo Do latim petrolēu
Gás Do grego Kháos e depois pelo francês gaz
Meridiano Do latim meridiãnu
Triângulo Do latim triangũlu
Oxigénio Do grego oxýs

Como pode ver, no quadro, a língua portuguesa recorreu às palavras do latim e do


grego para formar palavras como. Agricultura, célula carbono, alumínio, petróleo, gás,
meridiano, triângulo, oxigénio.

Leia outra vez, as palavras do quadro seguinte:

Alumínium Do latim alũmen (alumínio)


Petroleum Do latim petrolēu (petróleo)
Gas Do gredo Kháos e depois pelo francês gaz

Da mesma forma, caro cursista, aqui temos o inglês que também recorreu ao latim e ao
grego para a formação de palavras Alumínium petroleum, gas.

Estudos mostram que há problemas no ensino e aprendizagem da ciência, primeiro


porque os professores encaram dificuldades em escolher a língua que vai ser meio de
ensino se a 1ª, neste caso, bantu ou se a segunda neste caso, ainda, o Português.
Segundo, a ciência usa termos e ideias especiais, muitas das vezes esses termos e
ideias não existem nas línguas locais. Por causa desta particularidade das ciências
achamos que: primeiro, o professor deve privilegiar a língua bantu como meio de ensino,
sempre que possível porque as crianças vão entender melhor a ciência se o professor as
ensinar na sua língua; segundo algumas vezes, como se disse, não será possível
exprimir esta ideia científica ou aquela palavra específica na língua bantu. Neste caso o
professor recorre ao termo científico existente na língua segunda. Tomemos como
exemplo a palavra oxigénio. Na maioria das línguas bantu senão em todas, só existe um
termo específico que se refere ao “ar” mas esse termo não vai servir para se referir ao
oxigénio.

O cursista sabe que ar é um conjunto de gazes mas o oxigénio é apenas um elemento


gasoso e é o nº8 na classificação da tabela periódica. Então supomos que o
correspondente a oxigénio não existe na língua bantu que o cursista usa para ensinar as
crianças. Que fazer? Introduza a partir dum contexto o termo oxigénio; mostre aos
alunos o seu símbolo e a partir da experiência que o aluno tem do dia-a-dia explique na
sua língua o que é oxigénio. Recorra a comparações, a experiências, encontre uma
forma criativa de explicar de modo que as crianças entendam . Por exemplo, pode fazer
uma experiência: acender uma vela e perguntar aos alunos o que está a acontecer.

Eles vão certamente dizer que a vela está a arder, ou que está a queimar ou que está
em chamas; Depois tape a vela com um copo transparente e volte a perguntar o que
aconteceu.

23
Certamente os alunos vão dizer que a vela se apagou e libertou um fumo. E você vai
dizer Isto significa que quando acendemos a vela, ela arde porque à sua volta circula lhe
ar que contém oxigénio. Ao taparmos a vela há uma quantidade de ar com oxigénio que
entra no copo. A vela continua a arder mas depois se apaga porque embora no copo
continue a existir “ar” já não há oxigénio que é necessário para que a combustão
continue a ocorrer.

Por outro lado, a opção pelo uso desta ou daquela língua visa criar uma situação de
comunicação. Portanto para explicar uma ideia ou um conceito use a língua que as
crianças facilmente vão entender.

Se você explicar o que é oxigénio em português à crianças não falantes da língua


portuguesa é provável que no fim da aula descubra que durante os 45 minutos de aula
esteve a falar para as paredes ou se não, a falar sozinho e em voz alta!

O professor explica um conceito ao aluno na língua portuguesa. O aluno é falante de copi”chope”.


Por isso tem dificuldade de reconhecer o referente,chegando a pensaar que se trata de um cão.

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Se não há um termo correspondente na sua
língua bantu use o termo existente na língua
portuguesa e recorra a vários recursos para
explicar o termo na língua que as crianças
falam e dominam porque elas facilmente
compreendem e aprendem.

Prezado cursista,

Um dos temas do nosso manual refere-se aos recursos de leitura que são exíguos na
sala de aulas. Muitos professores queixam-se de falta de materiais. Como resolver a
situação da falta do livro na sala de aulas?

Muitas das vezes o que acontece é o professor ficar à espera de receitas ou de obras
feitas como se diz por aí “de papinha feita”. Caro cursista, você também pode produzir,
pode fazer acontecer o livro, o texto, mas antes de tudo você tem que assumir que pode
criar o mundo que não existe na sua sala de aulas.

Páre e olhe à volta

O mundo está cheio de material escrito: jornais, revistas, material que você mesmo
escreve, material publicitário há uma data de coisas escritas pelo mundo fora. O que falta
na verdade é você ir ao mundo buscar esses materiais escritos; Seleccionar desses
materiais os que podem interessar aos seus alunos em termos de temas, apresentação
etc... Recolhido esse material pode ser organizado de diversas maneiras: Através de
técnicas simples pode fazer um caderno de textos por si seleccionados ; pode colar os
textos em material restante, por exemplo, com os alunos pode fazer o recorte de caixas
de papelão na medida de cada texto seleccionado e depois fazer a colagem do texto;
isto proporciona não só o fácil manuseio do texto, como também a sua conservação; O
professor pode recorrer a textos escritos pelos próprios alunos, organizá-los em forma de
cadernos para que os textos não se espalhem, o professor pode escrever textos e
colocá-los à disposição dos alunos. Como vê há várias maneiras de trazer o material de
leitura à sala de aulas. O ponto essencial é que esses materiais devem ter significado
para os alunos; devem ser atractivos ou pela sua apresentação ou pelos seus temas ou
pela forma como esses temas são abordados. Você como cursista não tem por que se
queixar da falta do livro pois já sabe o que pode fazer para promover material de leitura.

Agora que chegamos a este ponto podemos dizer que cumprimos com a nossa missão
em termos de conteúdos, mas, começa uma nova etapa, a de arregaçar as mangas e ir
à luta ou seja implementar, pôr em prática tudo o que aprendemos.

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Agradecemos pelo esforço que empreendeu na leitura deste manual pois sabemos que
com isso o cursista sai premiado , nós também saímos honrados, ganham as nossas
crianças e acima de tudo contribuímos para o desenvolvimento do nosso belo e
glorioso país.

Somente não esqueça duma coisa, você é capaz, então use


a sua criatividade, o seu conhecimento para melhorar a
qualidade de ensino na sua sala de aulas!!!

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BIBLIOGRAFIA

Bloch, Carol - Literaly in the Early Years: Teaching and Learning in Multilingual
Early Childhood Classroom

Peter Plü ddemann, yola Mati


and Babazile Ma Walela -

Thusi: Problems and Possibilities in Multilingual Classrooms in the


Western Cape

Wolff, A. Ek Kehard -
Pré - School Child Multilingualism and its Educational Implications
in the African Context

Vasely, Rina -
Mutilingual Envirouments for survival, the Impact of English ou
Xhosa – Speaking Students in Cape town.

Baker, Colin -
the care and Education of Young Bilinguals, an introdution for
professionals

Young, B. L. -
Teaching Primary Science, Longman Education texts

Bloch, Carol and


Mahlalela, Babazile -
Languages in our Schools, A family Guide to Multilingual Education.

Herbert, Robert K. -
Language And Society in Africa, the theory and practice of
Sociolinguistics

Diniz, Maria João e outros -


Uma experiência de Ensino – Aprendizagem da oralidade, Leitura e
Escrita da Língua portuguesa(L2).

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CURRÍCULO DO CURSO DE 10ª + 2

Formação Geral----------------------- 30 módulos

DISCIPLINA Nº. DE MÓDULOS

1. Português ( 5 módulos )
2. Inglês ( 3 módulos )
3. Linguística Bantu ( 3 módulos )
4. Matemática ( 2 módulos )
5. História ( 2 módulos )
6. Geografia ( 2 módulos )
7. Ciências Naturais ( 4 módulos )
8. Educação Moral e Cívica ( 3 módulos )
9. Educação Visual e Tecnológica ( 2 módulos )
10. Educação Musical ( 2 módulos )
11. Metodologia de Investigação Científica ( 2 módulos )

Formação Profissional ----------------35 módulos e 2 guiões

DISCIPLINA Nº. DE MÓDULOS

12. Pedagogia (4 módulos )


13. Psicologia (3 módulos )
14. Organização e Gestão Escolar (3 módulos )
15. Sociologia de Educação (3 módulos )
16. Metodologia do Ensino de Português (3 módulos )
17. Metodologia do Ensino de Inglês (3 módulos )
18. Metodologia do Ensino de Matemática (4 módulos )
19. Metodologia do Ensino de Ciências Sociais (2 módulos )
20. Metodologia do Ensino de Ciências Naturais (3 módulos )
21. Metodologia do Ensino de Educação Moral e Cívica (1 módulo )
22. Metodologia do Ensino de Ofícios (1 módulo )
23. Metodologia do Ensino de Educação Física (3 módulos )
24. Metodologia do Ensino de Educação Musical (2 módulos )
25. Educação Bilingue (1 guião )
26. Estágio Supervisionado (1 guião )

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PRO PRIEDADE DO IAP – AUTORIZADA A REPRODUÇÃO OU CÓPIA APENAS AO NUFORPE
COPYRIGHT: REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

IAP – INSTITUTO DE APERFEIÇOAMENTO DE PROFESSORES

FORMATADO E IMPRESSO NO CENTRO DE PROCESSAMENTO DE DADOS E GRÁFICA


DO INSTITUTO DE APERFEIÇOAMENTO DE PROFESSORES
TIRAGEM: 70 000 EXEMPLARES – 1ª EDIÇÃO -2003

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