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Até que ponto a prática esportiva é saudável?

​ 9 de julho de 2010

Estudioso avalia riscos e possibilidades da alta performance

Nesta edição, se inicia a série Por uma boa causa que abordará os impactos da prática
esportiva na saúde física e mental do atleta. Para o primeiro dos quatro capítulos, o Olhar
Vital consultou Alexandre Palma – doutor em Saúde Pública, professor da Escola de
Educação Física e Desportos (EEFD/UFRJ) e estudioso da área de treinamento de esportes
de longa duração – para avaliar até que ponto o esporte é saudável.
Questionado sobre a saúde dos atletas de alto rendimento, que são submetidos a excessivo
desgaste físico e obrigados a conviver com a dor durante a intensa rotina de treinamentos,
o estudioso avalia: “se entendermos ‘saúde’ como ausência de doenças, podemos crer que
os atletas de alto rendimento não são saudáveis, uma vez que as lesões e as dores estão
presentes. Por outro lado, se, como nos ensina o médico e filósofo francês Canguilhem,
compreendermos ‘saúde’ de uma forma mais complexa, como a capacidade de adoecer e
se recuperar, de agir e reagir, ou ainda lembrando que a possibilidade de abusar da saúde
faz parte da saúde, então, os atletas são extremamente saudáveis”.
A luta contra o cronômetro e a quebra de barreiras para se alcançar um índice olímpico, ou
mesmo, um recorde só possuem uma receita: uma rotina de disciplina e superação.
Multiplicada pelos anos do desempenho em alta performance – desde a formação do
esportista, muitas vezes durante a infância – ela acaba por tornar massacrante, física e
mentalmente, a vida do esportista. “Atletas de alto rendimento necessitam realizar elevadas
cargas de volume e intensidade para alcançarem o máximo desempenho esportivo”, avalia
Alexandre.
A aposentadoria precoce do nadador australiano Ian Thorpe aos 24 anos, ilustra esse
quadro. O torpedo, como ficou mundialmente conhecido, iniciou sua carreira internacional
em alto nível aos 15 anos, em 1997. Nos nove anos de carreira acumulou nove medalhas
olímpicas (cinco de ouro, três de prata e uma de bronze) em Sidney 2000 e Atenas 2004,
além de 18 recordes mundiais (13 individuais e cinco em revezamentos) nas provas dos
100, 200 e 400 metros livres. Já sem alcançar os mesmos resultados e sofrendo com uma
fratura na mão, febre glandular e demais pequenos problemas, Thorpe decidiu se livrar das
12 horas de treino diário, fisioterapia e dieta regrada e gastar a fortuna que conquistou.
“Possivelmente, esforços elevados e especializados levam a lesões. Contudo, a pouca
exercitação física tem sido associada a uma variedade de problemas, inclusive ortopédicos.
Talvez, para o homem comum, fosse interessante, como sugeriram os gregos na
antiguidade e muitos cientistas na atualidade, o exercício físico moderado”, analisa o
professor. E complementa: “para amenizar os problemas existem algumas alternativas. O
treinamento de força (musculação) e de flexibilidade (alongamentos) são alternativas. A
estruturação dos treinamentos, considerando ciclos de recuperação; a alimentação e
hidratação adequadas; a realização de outros tipos de treinos, como o treinamento
funcional; são algumas outras formas de tentar amenizar os problemas físicos”.
Numa comparação entre o sistema muscular esquelético de um atleta de alto rendimento e
de um indivíduo sedentário, Alexandre Palma afirma que em hipótese alguma o esportista
esteja comprometido. O professor explica que o Colégio Americano de Medicina do Esporte
(American College of Sports Medicine/ACSM) oferece sugestão para a prescrição de
exercícios físicos para não atletas, tanto para atividades aeróbias, quanto de força e
flexibilidade. “Porém, tais sugestões não funcionam com atletas de alta performance por
duas grandes razões. Cada modalidade tem sua especificidade e para tais atletas as cargas
devem ser elevadas, pois o que está em jogo é o máximo rendimento esportivo”, afirma.
Um fator importante que implica diretamente no desgaste físico dos profissionais do esporte
é o calendário das competições esportivas, cada vez mais apertado. “Atualmente, ele está
bastante atrelado aos interesses comerciais. Um patrocinador de uma equipe ou de um
atleta quer, em última instância, divulgar sua marca. Assim, quanto mais a equipe ou o
atleta estão expostos, mais a marca é divulgada. E isso tem consequências óbvias sobre o
processo de recuperação dos atletas e sobre as lesões”, conclui.

AUTOR: THIAGO ETCHATZ - AGÊNCIA UFRJ DE NOTÍCIAS - CCS

https://conexao.ufrj.br/2010/07/ate-que-ponto-a-pratica-esportiva-e-saudavel/

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