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COLISÕES

Discussão complementar
Prof. Diefferson Rubeni

Mesmo quando há força externa resultante, o momento linear total


pode ser conservado?
Lembre-se que a lei de conservação do momento linear estabelece que
momento linear total de um sistema é conservado quando não há força externa resul-
tante atuando sobre o sistema.
Entretanto, na primeira página das Notas de Aula 03 foi dito que
“... Quando as forças entre os corpos forem muito maiores que as forças externas,
como em geral ocorre na maior parte das colisões, podemos desprezar completa-
mente as forças externas e considerar os corpos como um sistema isolado...”
Essa informação parece contraditória com o que estudamos a respeito da conservação do momento
linear. Afinal de contas, a conservação do momento linear não depende das forças internas. Vamos
analisar essa situação cuidadosamente a seguir.
Considere, por exemplo, a colisão frontal entre dois automóveis idênticos, ilustrada na Fig. 1.

Fig. 1: Colisão frontal entre dois veículos.

Uma vez que o movimento ocorre na horizontal, podemos considerar apenas as componentes
ao longo do eixo 𝑥. O sistema considerado é formado pelos dois carros (linha tracejada vermelha).
As forças internas do sistema são as forças exercidas de um carro sobre o outro:

1
• 𝐹𝐵→𝐴,𝑥 : força que o carro 𝐵 exerce sobre o carro 𝐴;
• 𝐹𝐴→𝐵,𝑥 : força que o carro 𝐴 exerce sobre o carro 𝐵.
Lembre-se que as forças internas satisfazem à terceira lei de Newton: 𝐹𝐴→𝐵,𝑥 = −𝐹𝐵→𝐴,𝑥 .
Por outro lado, as forças externas ao sistema são as forças de atrito que atuam sobre cada carro:
• 𝑓 𝐴 = 𝜇 𝐸 𝑚 𝐴 𝑔: força de atrito sobre o carro 𝐴;
• 𝑓 𝐵 = 𝜇 𝐸 𝑚 𝐵 𝑔: força de atrito sobre o carro 𝐵;
Nas Notas de Aula 02 reescrevemos a segunda lei de Newton em termos do momento linear:
Õ 𝑑𝑝 𝑥
𝐹𝑥 =
𝑑𝑡
Í
onde 𝐹𝑥 é a força resultante que age sobre o corpo na direção do eixo 𝑥 e 𝑝 𝑥 é o momento
linear do corpo ao longo do mesmo eixo. Vamos aplicar a segunda lei de Newton para cada carro
do sistema.
• Carro 𝐴: a força resultante que atua sobre o carro 𝐴 é a soma entre a força interna 𝐹𝐵→𝐴,𝑥 e
a força externa 𝑓 𝐴 :
Õ 𝑑𝑝 𝐴,𝑥 𝑑𝑝 𝐴,𝑥
𝐹𝐴,𝑥 = ⇒ 𝐹𝐵→𝐴,𝑥 + 𝑓 𝐴 = (1)
𝑑𝑡 𝑑𝑡
Se a intensidade da força interna for muito maior que a intensidade da força externa (𝐹𝐵→𝐴,𝑥 
𝑓 𝐴 ), então a soma entre elas é aproximadamente igual à força interna:

𝐹𝐵→𝐴,𝑥 + 𝑓 𝐴 ≈ 𝐹𝐵→𝐴,𝑥 (2)

Portanto, de acordo com as equações (1) e (2), se a força interna é muito mais intensa do que
a força externa, a taxa de variação do momento linear do carro 𝐴 é aproximadamente igual
à força interna somente:
𝑑𝑝 𝐴,𝑥
𝐹𝐵→𝐴,𝑥 ≈ (3)
𝑑𝑡
• Carro 𝐵: a análise para o veículo 𝐵 é precisamente igual a realizada para o carro 𝐴. Assim,
𝑑𝑝 𝐵,𝑥
𝐹𝐴→𝐵,𝑥 ≈ (4)
𝑑𝑡

A taxa de variação do momento linear total do sistema 𝑃𝑥 é a soma das equações (3) e (4):
𝑑𝑃𝑥 𝑑𝑝 𝐴,𝑥 𝑑𝑝 𝐵,𝑥
= + ≈ 𝐹𝐵→𝐴,𝑥 + 𝐹𝐴→𝐵,𝑥 (5)
𝑑𝑡 𝑑𝑡 𝑑𝑡
Mas, de acordo com a terceira lei de Newton, 𝐹𝐴→𝐵,𝑥 = −𝐹𝐵→𝐴,𝑥 . Logo,

𝐹𝐵→𝐴,𝑥 + 𝐹𝐴→𝐵,𝑥 = 𝐹𝐵→𝐴,𝑥 + −𝐹𝐵→𝐴,𝑥 = 0

Assim, a equação (5) demonstra que


𝑑𝑃𝑥
≈ 0 ⇒ 𝑃𝑥 é constante (aproximadamente)
𝑑𝑡

2
Portanto, mesmo na presença de força resultante externa, o momento linear total de um sistema
pode ser aproximadamente constante, desde que as forças internas sejam muito mais intensas do
que as forças externas.

𝐹®internas  𝐹®externas ⇒ 𝑃®𝑖 = 𝑃® 𝑓


(6)
Em todas as colisões que vamos analisar neste curso, as forças internas são muito mais intensas
do que as forças externas. O exemplo a seguir ilustra essa situação.

Exemplo.
Suponha que, na colisão ilustrada na Fig. 1, a massa do carro 𝐵 seja 𝑚 𝐵 = 1000 kg, sua veloci-
dade imediatamente antes da colisão era 𝑣 𝐵𝑖,𝑥 = 20 m/s e após a colisão o carro 𝐵 fica em repouso
(𝑣 𝐵 𝑓 ,𝑥 = 0 m/s). A colisão demora Δ𝑡 = 0, 08 s e o coeficiente de atrito cinético entre os pneus do
carro e o asfalto é 𝜇 𝐸 = 0, 8. Compare a intensidade das forças interna e externa.

A intensidade da força de atrito cinético é


 
𝑓 𝐵 = 𝜇 𝐸 𝑚 𝐵 𝑔 = (0, 8) (1000 kg) 9, 8 m/s2 = 7840 N

Podemos calcular a intensidade da força resultante que atua sobre o carro 𝐵 utilizando o Teo-
rema do impulso:
Õ Δ 𝑝 𝐵,𝑥 𝑚𝑣 𝐵 𝑓 ,𝑥 − 𝑚𝑣 𝐵𝑖,𝑥 (1000 kg) (0 m/s) − (1000 kg) (−20 m/s)
𝐹𝐵,𝑥 = = = = 250.000 N
Δ𝑡 Δ𝑡 0, 08 s

Uma vez que a força resultante é a soma entre a força interna e a força de atrito, segue que
Õ Õ
𝐹𝐵,𝑥 = 𝐹𝐴→𝐵,𝑥 + 𝑓 𝐵 ⇒ 𝐹𝐴→𝐵,𝑥 = 𝐹𝐵,𝑥 − 𝑓 𝐵
= 250.000 N − 7840 N
= 242.160 N

Portanto, a intensidade da força interna é aproximadamente 31× maior do que a intensidade da


força externa.

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