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27/09/2023
Número: 0040603-76.2023.8.17.2810
Classe: Ação Popular
Órgão julgador: 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Jaboatão dos Guararapes
Última distribuição : 19/09/2023
Valor da causa: R$ 1.000,00
Assuntos: Dano ao Erário
Nível de Sigilo: 0 (Público)
Justiça gratuita? SIM
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? SIM
Partes Advogados
SUELEN MARILIA DE SOUZA (AUTOR)
GERALDO DE AZEVEDO NOBREGA (ADVOGADO(A))
CRISTIANE ANTUNES BOTELHO (ADVOGADO(A))
KATIA MARIA DE OLIVEIRA (AUTOR)
GERALDO DE AZEVEDO NOBREGA (ADVOGADO(A))
CRISTIANE ANTUNES BOTELHO (ADVOGADO(A))
MARIA DOS PRAZERES DOS SANTOS (AUTOR)
GERALDO DE AZEVEDO NOBREGA (ADVOGADO(A))
CRISTIANE ANTUNES BOTELHO (ADVOGADO(A))
ALLANY REBEKA MENDES DE SOUZA (AUTOR)
GERALDO DE AZEVEDO NOBREGA (ADVOGADO(A))
CRISTIANE ANTUNES BOTELHO (ADVOGADO(A))
ROBSON MENEZES DA CUNHA (AUTOR)
GERALDO DE AZEVEDO NOBREGA (ADVOGADO(A))
CRISTIANE ANTUNES BOTELHO (ADVOGADO(A))
MUNICIPIO DE JABOATAO DOS GUARARAPES (RÉU)
LUIZ JOSE INOJOSA DE MEDEIROS (RÉU)
FUNDACAO DE EDUCACAO TECNOLOGICA E CULTURAL
DA PARAIBA FUNETEC PB (RÉU)
MARIA JACINTA NASCIMENTO DA SILVA (RÉU)
Documentos
Id. Data da Documento Tipo
Assinatura
145998796 27/09/2023 Decisão Decisão
12:27
Tribunal de Justiça de Pernambuco
Poder Judiciário
2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Jaboatão dos Guararapes
Rod. BR 101 Sul - Km 80, - do km 82,003 ao km 86,005 - lado ímpar, PRAZERES, JABOATÃO DOS GUARARAPES - PE - CEP:
54335-000 - F:(81) 31826802
Processo nº 0040603-76.2023.8.17.2810
AUTOR: ALLANY REBEKA MENDES DE SOUZA, KATIA MARIA DE OLIVEIRA, MARIA DOS PRAZERES DOS SANTOS,
ROBSON MENEZES DA CUNHA, SUELEN MARILIA DE SOUZA
RÉU: MUNICIPIO DE JABOATAO DOS GUARARAPES, LUIZ JOSE INOJOSA DE MEDEIROS, FUNDACAO DE
EDUCACAO TECNOLOGICA E CULTURAL DA PARAIBA FUNETEC PB, MARIA JACINTA NASCIMENTO DA SILVA
DECISÃO
Cuida-se de ação popular ajuizada por ALLANY REBEKA MENDES DE SOUZA, KÁTIA MARIA DE OLIVEIRA, MARIA
DOS PRAZERES DOS SANTOS, ROBSON MENEZES DA CUNHA e SUELEN MARILIA DE SOUZA contra o MUNICÍPIO
DE JABOATÃO DOS GUARARAPES (primeiro réu); LUIZ JOSÉ INOJOSA DE MEDEIROS, Prefeito do Município de
Jaboatão dos Guararapes (segundo réu); MARIA JACINTA NASCIMENTO DA SILVA, Secretária Executiva de Assistência
Social do Município de Jaboatão dos Guararapes (terceira ré), e FUNDAÇÃO DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA E
CULTURAL DA PARAIBA – FUNETEC-PB (quarta ré).
Narram os autores que o segundo réu é responsável pelo contrato firmado entre o primeiro réu e a quarta ré, no valor de R$
540.510,00, que tem como objeto a realização do processo de escolha dos conselheiros tutelares do Município de Jaboatão dos
Guararapes, para o quadriênio 2024/2028.
Alegam os autores que, “dentre outras” (Id. 144855409, p. 8), o contrato firmado entre o primeiro réu e a quarta ré contém as
seguintes irregularidades: (a) valor da contratação é muito superior à realizada pelo Município de João Pessoa/PB, que contratou a
mesma instituição para realizar o processo de escolha da mesma quantidade de conselheiros tutelares por apenas R$ 77.000,00;
(b) previsão de que 400 candidatos fariam a avaliação de conhecimento, mas apenas 232 pessoas se inscreveram para participar do
processo seletivo e somente 114 foram considerados aptas para se submeter a esta fase do certame; (c) pagamento “referente à
função de Auxiliar de Serviços Gerais corresponde à exorbitante quantia de R$ 4.000,00 hr/dia (Id. 144855409, p. 7); (d)
aquisição de 30.000 unidades de panfleto ao custo de R$ 2,00, cada, que poderiam ser adquiridos a R$ 0,10, cada; (e) compra de
291 unidades de “envelope plástico com lacre tamanho e etiqueta autoadesiva para identificação” ao custo de R$ 89,35, cada, que
poderiam ser adquiridos a R$ 1,59, cada.
Reportando-se à idoneidade da quarta ré, apontam os autores que ela é investigada pelo Ministério Público do Estado da Paraíba
por supostamente ter favorecido candidatos no processo de escolha de conselheiros tutelares do Município de João Pessoa/PB e
Acrescentam os autores que, em Jaboatão dos Guararapes, alguns candidatos tiveram prazo de campanha menor que outros
porquanto somente foram considerados aprovados na avaliação de conhecimento após decisão judicial.
Afirmam os autores que os fatos narrados na petição inicial estão sendo investigados pelo Tribunal de Contas do Estado de
Pernambuco, tendo havido, inclusive, o pedido de medida cautelar para suspender a execução do contrato.
Pedem os autores que, liminarmente, independentemente da oitiva dos réus, seja determinada a suspensão do contrato em questão
e o cancelamento da votação marcada para o próximo domingo, 01/10/2023.
Ao final, pugnam os autores pela procedência da demanda, formulando os seguintes pedidos de mérito (Id. 144855409, p. 14 e
15):
“(...)
b) Que seja determinado ao Réu a contratação de empresa idônea para a realização do processo de escolha para os conselhos
tutelares do município do Jaboatão dos Guararapes, mantendo-se válidas as candidaturas deferidas e o resultado da prova de
conhecimento já realizada;
c) Que seja determinado ao réu a reabertura das inscrições para processo de escolha dos conselhos tutelares do Jaboatão dos
Guararapes, sendo oportunizado aos pretensos candidatos (as) uma aferição justa e transparente dos seus respectivos
documentos, assim como a devida submissão às provas de conhecimento;
(...)
h) a procedência dos pedidos para decretar a anulação do ato lesivo ao patrimônio público e à moralidade; (...)”.
Em cumprimento ao despacho de Id. 145263156, os autores apresentaram pedido de emenda à petição inicial, na qual
qualificaram adequadamente o segundo réu, requereram a inclusão dos demais réus no polo passivo da demanda e apresentaram a
prova de suas cidadanias (Id. 145509926).
Instado a se manifestar sobre o pedido liminar, o Ministério Público do Estado de Pernambuco pugna pelo seu deferimento, em
parte, apenas para suspender os pagamentos devidos pelo Município de Jaboatão dos Guararapes, ponderando o perigo da demora
inverso, embora entenda evidenciada a probabilidade do direito. Para a hipótese de o Juízo entender inviável a suspensão parcial
do contrato, pugna o parquet, subsidiariamente, pelo deferimento do pedido liminar, na forma requerida na petição inicial (Id.
145844288).
No presente caso, a análise técnica levada a efeito por auditor do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco confirma os fatos
narrados na petição inicial, no que se refere à existência de irregularidades na contratação em questão, “que se manifestam no
superdimensionamento do quantitativo de funcionários, horas de trabalho e itens para a realização do processo seletivo, bem como
pelo sobrepreço dos valores dos bens e itens no escopo contratual” (Id. 144863253, p. 2 e 3).
A referida análise técnica aponta, especificamente, os pontos levantados pelos autores, já descritos no relatório, quanto à (i)
estimativa de participantes; (ii) previsão de pagamento de 3 (três) horas de serviço de auxiliares de serviços gerais, ao valor de R$
4.000,00 por hora, totalizando R$ 12.000,00; (iii) discrepância entre os valores previstos para a aquisição de material de consumo
e os praticados pelo mercado e (iv) existência de contrato similar com o Município de João Pessoa pelo valor de R$ 77.000,00.
A referida análise técnica também aponta a falta de transparência quanto à destinação do valor de R$ 145.000,00 para a “logística
do processo de provas eleitoral”.
É certo que, após a análise técnica levada a efeito pelo Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, datada de 29/08/2023, o
primeiro réu e a quarta ré firmaram termo aditivo ao contrato em questão em 12/03/2023, acordando a revisão de valores, bem
como a supressão e a inclusão de itens, em decorrência do fornecimento de urnas eletrônicas pelo TRE-PE, para a realização da
votação, o que levou à redução do valor a ser despendido pelo Poder Público, de R$ 540.510,00 para R$ 398.297,06.
O valor destinado à aplicação e correção das provas foi reduzido de R$ 65.000,00 para R$ 45.892,40, o destinado à “logística do
processo de provas eleitoral”, de R$ 145.000,00, para R$ 88.658,86 e os itens referentes a material de consumo foram suprimidos,
assim como a previsão de pagamento de 3 (três) horas de serviço de auxiliares de serviços gerais.
Entretanto, em boa verdade, ainda que tenha melhorado a situação do Poder Público, o termo aditivo firmado entre o primeiro réu
e a quarta ré só reforça a conclusão de que, realmente, houve superdimensionamento e sobrepreço, tal qual indicado pela análise
técnica do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco.
Nesse mesmo sentido se manifestou o Ministério Público de Contas, ao analisar o contrato em questão após o termo aditivo
firmado entre o primeiro réu e a quarta ré (Id. 144863254, p. 5, grifos do original):
“In casu, podemos perceber que a alteração contratual não decorreu unicamente de fatos supervenientes relacionados à cessão
das urnas eletrônicas, não obstante este fato novo ensejar o acréscimo de consubstanciadas despesas à avença firmada, mas sim
de uma falta de comprometimento da Municipalidade com o Princípio do Planejamento, previsto no art. 5º e ao
normativo contante no art.18 da Lei nº 14.133/21, que dispõe que a fase preparatória da contratação é caracterizada
pelo planejamento, que deve abordar todas as considerações técnicas, mercadológicas e de gestão que podem interferir na
contratação”.
Além disso, ainda persiste a falta de transparência na destinação de valores para a “logística do processo de provas eleitoral”.
No que se refere especificamente à suspensão da execução do contrato, tenho que esta deve ser analisada à luz do quanto disposto
no artigo 147 da Lei 14.133/2021, vazado nos seguintes termos:
Art. 147. Constatada irregularidade no procedimento licitatório ou na execução contratual, caso não seja possível o
saneamento, a decisão sobre a suspensão da execução ou sobre a declaração de nulidade do contrato somente será adotada na
hipótese em que se revelar medida de interesse público, com avaliação, entre outros, dos seguintes aspectos:
I - impactos econômicos e financeiros decorrentes do atraso na fruição dos benefícios do objeto do contrato;
II - riscos sociais, ambientais e à segurança da população local decorrentes do atraso na fruição dos benefícios do objeto do
contrato;
III - motivação social e ambiental do contrato;
IV - custo da deterioração ou da perda das parcelas executadas;
V - despesa necessária à preservação das instalações e dos serviços já executados;
VI - despesa inerente à desmobilização e ao posterior retorno às atividades;
VII - medidas efetivamente adotadas pelo titular do órgão ou entidade para o saneamento dos indícios de irregularidades
apontados;
VIII - custo total e estágio de execução física e financeira dos contratos, dos convênios, das obras ou das parcelas envolvidas;
IX - fechamento de postos de trabalho diretos e indiretos em razão da paralisação;
X - custo para realização de nova licitação ou celebração de novo contrato;
XI - custo de oportunidade do capital durante o período de paralisação.
Parágrafo único. Caso a paralisação ou anulação não se revele medida de interesse público, o poder público deverá optar pela
continuidade do contrato e pela solução da irregularidade por meio de indenização por perdas e danos, sem prejuízo da
apuração de responsabilidade e da aplicação de penalidades cabíveis.
À vista destes critérios, tenho que a suspensão da execução do contrato, neste momento, atenta contra o interesse público.
Com efeito, hoje é quarta-feira, 27/09/2023, e a votação para a escolha dos conselheiros tutelares está marcada para o próximo
domingo, 01/10/2023.
Ademais, as provas carreadas aos autos até o momento não são suficientes para evidenciar a responsabilidade da quarta ré pelas
irregularidades em sua contratação, de modo que, ainda que, ao final, seja declarada a nulidade do pacto, o primeiro réu terá de
indenizar os valores despendidos por ela com a execução do contrato, sem prejuízo, é claro, da responsabilidade dos agentes
públicos pelos prejuízos a que deram causa, tudo conforme o parágrafo único do artigo 147 da Lei 14.133/2021, transcrito acima,
e a jurisprudência dos tribunais pátrios, espelhada nos seguintes precedentes do e. Tribunal de Justiça de São Paulo (grifos
acrescidos):
Patente, portanto, o impacto financeiro da suspensão do contrato, que levará à perda do trabalho já desenvolvido com a preparação
da votação e não afastará a responsabilidade do Município de Jaboatão dos Guararapes de indenizar o que houver sido despendido
de boa-fé.
Nos estritos termos do artigo 131 do Estatuto da Criança e do Adolescente, o Conselho Tutelar é o órgão “encarregado pela
sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente”.
Para além da perda de tempo e recursos públicos, a suspensão da eleição traria prejuízos, também, aos candidatos ao cargo de
conselheiro tutelar, que fizeram campanha nos últimos 2 (dois) meses.
Importa consignar que não foi apontada qualquer circunstância que indique a atuação de qualquer agente do Município de
Jaboatão dos Guararapes ou da empresa contratada no sentido de favorecer qualquer candidato. Há, apenas, referência a situação
que teria ocorrido com mesma empresa, mas no Município de João Pessoa, e que não foi objeto de qualquer aprofundamento.
Em relação à alegação dos autores, no sentido de que teria havido o indeferimento de candidaturas “sem justificativa plausível,
sem uma aferição justa e sem transparência na análise dos documentos apresentados” (Id. 144855409, p. 6), não foi apresentada a
comprovação da ocorrência destes fatos, conforme apontado pelo Ministério Público do Estado de Pernambuco, e foi noticiado
pelos próprios autores que o interesse desses candidatos foi resguardado com o ajuizamento de ações judiciais.
Por outro lado, à vista das irregularidades apontadas, como medida necessária à garantia do resultado útil do processo,
assegurando que o Município de Jaboatão dos Guararapes somente venha a despender o valor efetivamente necessário à realização
do processo de escolha de conselheiros tutelares, de rigor a suspensão do pagamento das 3ª e 4ª parcelas previstas na cláusula
quinta do contrato em questão, na forma requerida pelo Ministério Público do Estado de Pernambuco.
A medida não traz prejuízo imediato à quarta ré, já que os valores, que representam 30% do valor contratado, somente seriam
pagos após a votação marcada para o próximo domingo, com “a finalização de todas as etapas” e “a entrega dos relatórios e dados
gerais garantida a completude integralidade das informações disponibilizadas” (Id. 144861098, p. 4).
Outrossim, o pagamento de 70% do valor contratado, ou seja, correspondente às 1ª e 2ª parcelas, no total de R$ 278.807,94, é
apenas 6,35% superior ao despendido pelo Município de Jaboatão dos Guararapes no último processo de escolha de conselheiros
tutelares, realizado em 2019, o que indica a ausência de prejuízo, também, ao Poder Público.
Neste particular, importa consignar que o contrato firmado pelo Município de João Pessoa, no valor de R$ 77.000,00, mencionado
pelos autores e na análise técnica levada a efeito por auditor do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, conforme
reconhecido por este último, tinha objeto diverso, já que não incluiu a organização da votação, sendo certo que, quanto à inclusão
de itens em decorrência da utilização de urnas eletrônicas, não foi apresentado qualquer elemento que demonstre a existência de
sobrepreço ou superdimensionamento.
Ante o exposto, DEFIRO, EM PARTE, o pedido liminar, apenas para SUSPENDER o pagamento das 3ª e 4ª parcelas previstas
na cláusula quinta do Contrato 015/2023 – SAS e DETERMINAR ao MUNICÍPIO DE JABOATÃO DOS GUARARAPES que,
no prazo de 5 (cinco) dias, contado da data em que a FUNETEC-PB comprovar o cumprimento dos requisitos para o pagamento
destas parcelas, PROCEDA ao depósito judicial dos valores devidos.
3. Decorrido o prazo fixado no item 1, ABRA-SE vista aos autores, pelo prazo de 15 (quinze) dias, para que se manifestem sobre
contestações e documentos que tenham sido apresentados;
4. Após, INTIMEM-SE as partes, para que, no prazo de 5 (cinco) dias, especifiquem as provas que ainda pretendem produzir,
justificando-as, sob pena de preclusão e julgamento antecipado do mérito;
5. Caso não haja interesse na produção de outras provas, INTIME-SE o Ministério Público, para que, no prazo de 30 (trinta) dias,
se manifeste;
Juiz de Direito