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mercados consumidores vem sofrendo, desde 2020, repentinas e significativas


alterações.

Note-se que o conflito em andamento era previsível no começo de 2022. Mas


ninguém esperava que ocorresse com tamanha rapidez e intensidade. E, claro, isto
também gerou uma crise considerável.

E nem se esperava que durasse tanto: em fevereiro de 2023, chegamos a um


ano de ações bélicas sem perspectivas de término imediato.

Também cabe notar que a pandemia já vinha gerando notável repercussão nos
projetos gerenciais envolvendo recursos humanos. Não apenas pelos novos
procedimentos comportamentais, mas também por formas até então inéditas de
desenvolver as atividades mais usuais dos processos produtivos.

Em resumo: Relações com mercados; gestão de processos produtivos; novas


culturas organizacionais; novas vinculações com fornecedores; recursos humanos.
Todos estes elementos são típicos da Gestão da Qualidade.

Por isso, cabe bem a questão:

 Como o cenário estruturado a partir do advento da COVID-19 e também do


conflito no Leste Europeu tem gerando impactos na Gestão e Avaliação da
Qualidade?

UMA ANÁLISE DO CENÁRIO ATUAL


(IMPACTO DA PANDEMIA, DA PÓS PANDEMIA E DE CONFLITOS NA EUROPA)

Inicialmente, vamos analisar quatro questões que parecem gerais, mas afetam
diretamente a Gestão da Qualidade.

Questão 1.
Quais os impactos e as consequências da COVID-19?

Há dois grupos de impactos (e respectivas decorrências) da COVID-19: os


evidentes e os sutis. Saúde e economia estão no primeiro grupo e não há muito o que
acrescentar a tudo aquilo que já foi dito. O segundo grupo desdobra-se em resultantes
duradouras e implicações ocasionais.

É difícil prever efeitos perenes, por razões compreensíveis. Fazer previsões de


longo prazo traz sempre o conforto inerente à dificuldade de verificar a validade delas.

Mas para um momento de transição e volatilidade, a tentação de fazer este tipo


de prenúncio é irresistível. E, claro, este exercício depende de percepção pessoal.

Uma alteração permanente, sem dúvida, é a revolução digital. E até muito mais
do que isso: na verdade, a pandemia vai consolidar a tendência da competência
digital. Apenas organizações que detém plataformas realmente eficazes sobreviverão,
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independentemente do porte delas. Por isso, a pandemia criou uma transição


compulsória para todas as empresas.

Primeiro, migrar do modelo tradicional para o ambiente digital. Depois,


familiarizar-se com o novo contexto, criando um processo de fluência digital. Mas
esta segunda transição não diferencia as organizações e não lhes confere
posicionamento consistente no mercado. Daí que a terceira transição torna-se
obrigatória: a evolução para a competência digital.

Todos (todos, sem exceção) os setores da economia formal (e até informal) têm
observado a necessidade de investir em modelos digitais de negócios nos últimos 3
anos. E estão passando por estes cenários de transição. O comércio e agronegócio
já são os setores onde o impacto do desenvolvimento tecnológico está sendo mais
sentido. Mas outros setores vão na mesma direção. A telemedicina tem se
estabilizado de forma definitiva. A onda atingiu também, com furor e determinação, os
microempresários individuais. Serviços públicos estão apostando no atendimento à
distância e ampliar interações com o uso de recursos tecnológicos. Pessoas também
têm sentido esta mutação. Todas as profissões precisaram das novas tecnologias. E
vão precisar cada vez mais se consolidarem (o que implica atualização constante).

No meio do caminho, universidades passaram a encarar esta nova realidade e


precisaram alterar não apenas os conteúdos ministrados, mas, principalmente, os
métodos de ensino, já que utilizar os novos métodos é parte crítica do preparo de
futuros profissionais. Nunca mais ouviremos falar em uma figura conhecida como ex-
aluno (seremos eternos aprendizes). Além da educação on-line, reuniões à distância
serão mantidas. Ou seja: ampliaremos as interações, ainda que os atores do processo
estejam fisicamente distantes.

Já as repercussões que podem ser fugazes compõem uma lista longa e talvez
comece com demonstrações de solidariedade; atenção e reconhecimento aos
motoboys e aos profissionais da saúde; relógios mais pausados; reuniões com família;
atenção a fenômenos e práticas incrivelmente usuais e que agora despertam atenção,
como o nascer do sol e a arte de cozinhar; menos poluição; mais silêncio e menos
ruído; pessoas mais calmas, mais lentas, mais atentas e mais sensíveis.

Interessante: estas foram características típicas do primeiro semestre de 2020.


Mas não foram tão visíveis ao longo de 2021 e 2022 e parecem menos ainda
perceptíveis nestes primeiros meses de 2023. Eram mesmo fugidias.

Há, ainda, situações intermediárias, como a ênfase à higiene; maior atenção


ao mundo microscópico; incentivo à universalização das medidas de saneamento;
cidades com características mais humanas. É bem possível que estas posições
migrem para posturas permanentes. Mas ainda (veja bem: ainda) não há garantias.
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Questão 2.
O que fazer no curto prazo para atenuar o impacto econômico, empresarial e
social?

As soluções mais ou menos óbvias já discutidas em diferentes contextos (tipo


redes sociais, sites ou imprensa convencional) parecem corretas. Em primeiro lugar,
pessoas e organizações economicamente ativas têm revisto o foco de sua atuação.
Um termo que tem sido muito usado para expressar esta nova situação é “reinventar-
se”. Parece adequado. Não podemos pensar que a demanda apenas tornou-se
menor. Este é uma conduta muito simplista. É preciso entender que a demanda sofreu
radicais alterações.

Vale dizer: os valores que norteiam os padrões de consumo mudaram


rapidamente e isto não se deve (apenas) à queda do poder aquisitivo. Os referenciais
mais relevantes das pessoas sofreram radical transformação. O simples fato de que
esta crise existiu deixa no ar a sensação de que outras poderão vir.

O conceito de aquisição consciente tem dominado e a relação entre custo e


benefício passou a ter papel determinante na decisão de compra. A relação entre
oferta e procura passou a ter a empatia como regra fundamental. Nenhuma empresa
sobreviverá se não exercer um processo de sintonia muito fina, aguçada, atenta e
vigilante em relação a seus clientes. Desenvolver este processo não é ação de curto
prazo: é ação para agora. Estamos chegando no quarto ano da pandemia. Agora: pós-
pandemia. É tempo mais do que suficiente para radical alteração de comportamentos,
hábitos e referenciais.

Esta transição exige planejamento; conhecimento e compreensão do mercado;


permanente análise de tendências; completa reestruturação da cadeia de suprimentos
entre outras tantas ações que configuram um modelo de gestão empresarial
caracterizado pela flexibilidade e foco no consumidor.

E aí aparece uma constatação que parece surpreendente, mas não tem nada
de inusitado ou imprevisível:

Não são esses os fundamentos da Indústria 4.0?

Questão 3:
Quais os reflexos mais imediatos do conflito no Leste Europeu para o resto do
mundo?

Está mais do que evidente que as impressionantes consequências do conflito


não vão se limitar aos dois países diretamente envolvidos. O Ocidente, e aí o Brasil
se inclui com certeza, já sentiu o impacto de todo este processo. Algumas
decorrências já sentidas e que vão se agravar nos próximos meses:

 Estagnação econômica por restrições em atividades do comércio internacional.


 Aumento efetivo da pressão inflacionária.
 Subida considerável dos preços das commodities, como o caso do trigo.
 Elevação dos custos relativos às várias formas de energia.
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 Interrupção no fluxo das cadeias de suprimentos.


 Dificuldades logísticas para acesso a mercados e a matérias-primas.
 Rotas comerciais usuais interrompidas, gerando atrasos e impacto nos custos.
 Significativo aumento dos custos de transporte, pelas dificuldades relacionadas
a obtenção de matérias-primas (tipo petróleo), e, claro, a elevação dos preços.
 Centros consumidores importantes estão em processo de recessão crescente,
como é o caso de países da Europa. Os Estados Unidos estão neste processo,
mas em escala menor.
 Os mercados estão em preocupante volatilidade e também esta situação tende
a ser agravar. Os movimentos (às vezes erráticos) das Bolsas de Valores
detectaram bem este processo.
 Perdas financeiras em empresas de grande porte, como bancos e organizações
que atuam na área de energia.
 A demanda do planeta, como um todo, está sendo reduzida.

Sete consequências da guerra na Ucrânia que ainda terão repercussão:

1. DURAÇÃO: Contrariando a análise de diversos analistas políticos e militares (que


avaliavam que uma incursão russa poderia cumprir seus objetivos em poucos dias
ou até horas) já se vão doze meses de batalha. A inteligência russa esperava um
término muito mais rápido. Essa demora no término do conflito pode ter
consequências bastante complicadas para ambos os lados. Um esforço de guerra é
sempre algo que envolve as populações de maneira bastante complexa em várias
áreas.

2. REPOSICIONAMENTO DO TABULEIRO GEOPOLÍTICO: A guerra complicou as


relações diplomáticas principalmente entre o bloco europeu e a Rússia. Também
gerou reações de outras nações como os Estados Unidos, China, Turquia, Belarus
entre outros. Não se esperava a união do Ocidente e apoio à Ucrânia da forma como
decorreu. Também o pedido de entrada da Finlândia e da Suécia na OTAN é algo
que a Rússia não previu.

3. CRISE ENERGÉTICA: A Europa é grande consumidora da energia fóssil


proveniente da Rússia. Há uma “dependência” a considerar. Os EUA e vários países
do Ocidente conseguiram fechar o mercado financeiro para a Rússia. Mas não
conseguiram fazer isso com a mesma velocidade com o mercado de energia. De
todo modo, a Alemanha já achou seus próprios caminhos (não se sabe se são os
melhores, como no caso da reativação do uso do carvão).

4. ZELENSKY: Um dos principais atores do conflito: o presidente da Ucrânia,


Volodymyr Zelensky. O ex-comediante interpretava um personagem que também
era um ator e que, de repente, se tornou chefe de Estado. Era alguém que não se
esperava quase nada ou muito pouca coisa e que saiu muito maior desse conflito.
Ele sai como uma figura de unidade da Ucrânia.

5. SANÇÕES E PUTIN: Putin sai enfraquecido, muito menor agora do que quando o
conflito começou. Seu erro: achar que o conflito seria muito rapidamente resolvido.
A Rússia poderia não esperar tantas sanções ao país e nem ao próprio presidente
Vladimir Putin. Não se previa uma resposta coordenada do Ocidente contra o
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governo e autoridades russas. Um fato surpreendente: a retirada da Rússia do


sistema financeiro SWIFT.

6. REFUGIADOS: Uma imagem comum: cenas de ucranianos desesperados


atravessando as fronteiras para buscar refúgio em países próximos, assim como
outros que não conseguiam deixar os cenários de batalha. Agência Para Refugiados
das Nações Unidas (ACNUR): Mais de oito milhões de pessoas deixaram a Ucrânia
devido à guerra.

7. GRÃOS: Agravamento da insegurança alimentar com o impedimento de navios


cargueiros ucranianos exportarem toneladas de grãos. Rússia e Ucrânia são
grandes fornecedores de comida para outras nações. Isto gerou pedidos da ONU
para que houvesse uma resolução célere para o impasse. O problema que pode ser
resolvido de maneira bilateral entre Rússia e Ucrânia, negociando uma maneira de
poupar esse setor e liberar o escoamento da produção de grãos. Uma questão crítica
para o Brasil refere-se aos fertilizantes.

ANÁLISE: POSSÍVEL FIM DO CONFLITO: É difícil prever por mais quanto tempo a
batalha durará, com alguns ataques podendo reaquecer o confronto. Sabe-se como
começa uma guerra, mas não se sabe como ela termina nem quanto tempo ela leva.
A incursão pode se estender por mais alguns meses, já que a Rússia emprega uma
estratégia de arrastar o conflito. Guerras longas geram desinteresse da opinião
pública e menor pressão sobre os governos. Hoje: Não há sinalização concreta de
negociações de paz. Esse conflito tende a se arrastar.

Para analisar a quarta questão, vamos considerar um aspecto mais amplo.


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1.2.
CARACTERÍSTICAS BÁSICAS DOS MERCADOS PRODUTORES E
CONSUMIDORES

Questão 4.
Que características serão observadas nos mercados produtores e
consumidores?

Inicialmente, vamos analisar mercados produtores. A tabela abaixo resume o


que parece ser a tendência atual.

Demanda
Tendência Prazo Setores
Atual (Crise)
Ensino à distância; Entretenimento on-line;
Altíssima Manutenção Longo Ferramentas para Trabalho Remoto;
Telemedicina; Saúde
Alimentação; Recursos da Internet;
Altíssima Estabilização Longo
Limpeza e higiene; Proteção individual
Inversão Eletrodomésticos; Roupas; Calçados
Retração Médio
(Forte) Bens e serviços de beleza
Inversão Artes; Espetáculos; Eventos; Turismo
Retração Médio
(Fraca) Hotéis; Companhias aéreas; Restaurantes

Nestes primeiros meses de 2023, cabe uma análise conjunta (mercados


produtores e mercados consumidores). Vejamos:

1. Exigências para organizações

 Convivência com situações de crise.


 Crítica necessidade de criar elevada competência digital.
 Interação on-line em todos os setores (comércio principalmente).
 Os estoques just in time foram substituídos por maiores estoques de segurança.
 Prioridade: investir em tecnologia (e não cortar custos).
 Atenção aos riscos de segurança cibernética: maior vulnerabilidade de
organizações (e pessoas) pelo intenso uso da internet.
 Problemas de fluxo de caixa – baixa liquidez; acesso difícil a financiamentos;
dependência de auxílio dos governos (que estão com caixa baixo por causa de
menos impostos arrecadados).
 Pensamento resiliente nos negócios – modelos gerenciais mais flexíveis e bem
enxutos; descentralização.
 Planejamento da continuidade dos negócios. Mudança de planos sem
infraestrutura adequada (tipo home Office, por exemplo).
 Agilidade da cadeia de suprimentos (respostas às mudanças bruscas no
mercado).
 Sobrevivência e retomada são coisas diferentes.
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2. Impacto na vida das pessoas

 Interação via dispositivos ao invés de presenciais (fim das viagens de negócios?)


 Reuniões on-line.
 Alto desemprego que não será revertido ao final da crise (o comércio tradicional
demitiu forte na crise e não vem contratando na mesma velocidade no pós-crise).
 Crítica necessidade de qualificação digital.
 Turismo com menor interação entre pessoas (curtir a natureza ao invés de visitar
museus).
 Perspectivas de novas pandemias.
 Prioridade à saúde.
 Educação remota.
 Home-office cada vez mais home.
 Valorização da higiene e da limpeza.
 Conviver com situações de crise.
 Ampliar interconexões, mesmo à distância.
 Solidariedade.
 Os modelos de rastreamento de pessoas como método de controlar a pandemia
podem ser facilmente transformados em instrumentos de governo e
organizações para controlar pessoas.
 Exigência de condições seguras para trabalhar.
 Trabalho virtual em alta.
 Equilíbrio saudável entre o trabalho físico e virtual.
 As orientações e o suporte aos profissionais das organizações foram ampliados,
atingindo as suas famílias e às comunidades em que eles vivem e atuam.

3. Padrões de consumo

 Compras pela internet (comida principalmente).


 Queda na taxa de juros (boa política monetária).
 Busca de novos nichos de mercado.
 O perfil da demanda mudou radicalmente (não foi apenas um processo de
redução).

4. Governança pública

 Financiamentos de perfis mais longos e voltados para o bem-estar.


 Um estado eficiente e eficaz. Econômico e que atende necessidades.
 Recursos mais diretos e mais rápidos aos mais necessitados.
 Governos menos confusos.
 Conflitos entre poderes.
 Conflitos entre união, estados e municípios.
 Necessidade para atentar para a desigualdade social (hoje mais acentuada).
 Incertezas quanto à economia.
 Substituição do financiamento por meios privados (hoje em alta) por
financiamentos por agentes do estado.
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5. Mudanças culturais significativas

Aqui, um exemplo prático. Ter um veículo de passeio, qualquer que fosse, foi o
sonho da geração nascida nos anos 1970 e 1980. Na segunda década desde século,
ter um carro próprio deixou de ser relevante, por força dos modelos de Economia
Compartilhada, que criaram aplicativos de transportes.

Anos atrás, adolescentes sonhavam chegar logo aos 18 anos para ter sua
carteira de habilitação e poder dirigir. A uberização do transporte também atingiu este
processo e as pessoas começaram a ver importância crescentemente menor em ter
licença legal para dirigir.

A pandemia parece que alterou novamente este quadro. Compartilhar veículos


passou a ser visto como atividade de risco. Dirigir seu próprio carro parece sinônimo
de segurança, e o carro passou a ser visto como um abrigo sobre rodas. O
distanciamento social está plenamente atendido quando se está na trincheira
resguardada que o carro próprio se transformou. Tornou-se, também, em leve antídoto
para o isolamento; passaporte para minimizar a ansiedade gerada pelo confinamento.
Ambiente protegido para rever o mundo exterior.

Além disso, este novo paradigma comportamental trouxe de volta os velhos


cinemas e espetáculos no estilo drive-in. Por sua vez, o drive-thru moveu-se das redes
de fast food para lojas, supermercados e até para festas de formatura e aniversários.
Até missas e cultos podem ser assistidos desde o interior dos veículos.

Sim, mais e quando a pandemia estiver apenas na nossa memória?


Certamente, a preocupação com segurança vai persistir. Os cuidados sanitários
também. Então, o carro próprio passará a ser visto com outros olhos. Ou melhor:
continuará a ser visto como a salvaguarda que a pandemia proporcionou. Muita gente
achava que o Uber e seus assemelhados iam acabar com o carro próprio. Mas a
pandemia trouxe um notável alento para a sua sobrevivência.

Agora, porém, nestes primeiros meses de 2023, o preço dos carros novos
assombra os consumidores. Será uma nova revolução a caminho? Veremos mais à
frente que, sim, há uma nova revolução nesta área em andamento.

Discutiremos, em seguida, como estas questões têm impacto direto na Gestão


da Qualidade.
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1.3.
O PAPEL DA QUALIDADE NA BUSCA DE OPÇÕES
PARA MINIMIZAR A CRISE
Focando na questão central desta disciplina: Como a qualidade e a gestão
podem ajudar para a saída da crise?

Como se estivesse com a tormenta aparecendo em seus radares, em passado


recente a qualidade se redefiniu. Saiu dos conceitos tradicionais, como adequação ao
uso, para uma concepção baseada em escolhas. Qualidade hoje é definida como o
conjunto de opções que organizações produtivas, instituições governamentais ou
mesmo pessoas selecionam para criar formas específicas de estruturar processos de
relacionamento com mercados e, mais em geral, com a sociedade.

Esta caracterização da qualidade trouxe uma alteração substancial nos


modelos de gestão, que passaram a ter um novo referencial: o que determina a ação
estratégica das organizações não é mais a visão da empresa, mas, sim, o foco do
negócio. Ou seja: o verbo “vender” foi substituído pelo verbo “comprar”, com a
consequente mudança no sujeito da frase: o agente da ação é o consumidor, não o
produtor ou a loja. Assim, posições consagradas anteriormente, como cortar custos,
por exemplo, foram substituídas por investir em novas tecnologias que facilitem a
interação com os mercados e, mais em geral, com o ambiente social.

Esta mudança no padrão de atuação (que começou antes da pandemia) agora,


mais que nunca, é um caminho seguro para enfrentar os novos tempos. A Gestão da
Qualidade no Processo vai guiar decisões práticas que podem ter ganhos marginais
significativos para empresas. Por exemplo: se a interação com os consumidores se
dá mais no ambiente virtual, espaços físicos amplos (como no caso de lojas ou
shoppings) serão substituídos por ambientes menores e mais simples. Já a gestão de
estoques, pela mesma razão, utilizará novos conceitos. O clássico “just in time” pode
desaparecer, cedendo lugar a maiores estoques de segurança para garantir maior
rapidez de atendimento, algo que alguns profissionais da área de qualidade passaram
a chamar de “just in case”. A troca da “atenção para a empresa” pela “ênfase ao
negócio” pode ser o primeiro passo para fixar uma saída segura da crise.

Algumas constatações em termos de Gestão da Qualidade:

 Sem qualidade e gestão não haverá competitividade em nenhum setor da


economia, nem interna e nem externamente (isto vale para o setor público, para
o setor privado. E também para cadeias produtivas).
 Na crise (e na saída dela) é crítico evitar desperdícios.
 A prioridade de fazer certo a primeira vez passa a ser fundamental.
 É preciso ter uma gestão com alta produtividade (fazer mais com menos).
 Investir em sistemas e modelos de gestão da inovação que priorizam a
otimização dos processos produtivos.
 Torna-se fundamental investir em modelos quantitativos de Avaliação da
Qualidade. O uso de indicadores tem sido fortemente utilizado neste processo.
 Priorizam-se ações preventivas ao invés de atividades corretivas.
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1.4.
A GESTÃO DA QUALIDADE E OS NOVOS PROCESSOS DE GESTÃO
É interessante notar que os conceitos que compõem a estrutura teórica da
qualidade não são novos. De fato:

 Muitas das ferramentas que mais bem caracterizam a Gestão da Qualidade


foram desenvolvidas há mais de 50 anos.
 Conceitos hoje em uso foram estruturados e consolidados nos anos 1960.
 Muitas das técnicas quantitativas que compõem o repertório da Gestão
Estatística da Qualidade vêm dos tempos da Segunda Guerra Mundial.
 As ferramentas do Controle Estatístico de Processos começaram a ganhar vida
na década de 1920.

Isto significa dizer que a Gestão da Qualidade seria uma área desatualizada?

Não necessariamente. Há, pelo menos, duas razões para dar sustentação à
afirmação de que a Gestão da Qualidade se compõe de um suporte teórico atualizado
e de um embasamento prático de uso corrente em nossos dias.

A primeira envolve o esforço de ampliação dos conceitos. Muitos conceitos que


antes estavam restritos a um contexto bem definido e delimitado foram ampliados para
contemplar novos (e mais atuais) cenários. Exemplo: muitos conceitos da qualidade
cuja gênese sempre esteve no ambiente industrial hoje são aplicados, com frequência
crescente e perfeito ajuste, à geração de serviços.

A segunda razão é, talvez, a mais relevante. A Gestão da Qualidade precisou


adaptar-se aos novos ambientes de negócios. Em tempos de internet popularizada,
redes sociais, comunicação instantânea e globalizada, criaram-se novas modalidades
de negócios e, ao mesmo tempo, alterou-se, de forma significativa e irreversível, os
modelos tradicionais de negócios. Na indústria (modelos de interação on-line com o
mercado exigem processos produtivos cada vez mais flexíveis e funcionais) ou na
geração de serviços (aplicativos como o WhatsApp talvez sejam o meio mais utilizado
hoje para marcar e confirmar consultas em uma clínica).

Por isso, a presente disciplina (Gestão e Avaliação da Qualidade) é


desenvolvida com duas ênfases bem precisas:

1. A análise dos conceitos atuais da qualidade;


2. O modelos de Gestão da Qualidade adaptados aos novos ambientes de negócios.

Em particular, mostra-se que a principal alteração no contexto da qualidade que


se evidencia hoje é mudar o processo de gestão com foco na organização para
direcioná-lo para o negócio em si. E por exigência da importância de atualização no
rumo das decisões, é imperioso apontar a gestão de negócios para os novos cenários
que se impõem a quem quer sobreviver.
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1.5.
QUALIDADE 4.0 (A GESTÃO DA QUALIDADE E INDÚSTRIA 4.0)
Gestão da Qualidade em novos ambientes de negócios: esta é a prioridade da
Gestão da Qualidade hoje.

Adequada à noção de Indústria 4.0, esta nova, digamos, modalidade e


concepção da qualidade tem sido chamada de Qualidade 4.0.

A Qualidade 4.0 está perfeitamente definida pelo conceito visto no item anterior,
qual seja, a qualidade definida como o conjunto de opções que organizações
produtivas, instituições governamentais ou mesmo pessoas selecionam para criar
uma forma específica de estruturar processos de relacionamento com os mercados e,
mais em geral, com a sociedade.

Gestão da Qualidade em novos ambientes de negócios. Esta prioridade é nova,


mas desde que surgiu já foi modificada por uma razão muito simples: diferentemente
da situação de algum tempo atrás, o ambiente econômico atual envolve
características de nova crise e de incertezas que não se observavam há alguns
meses. Por isso, considere-se: “novos ambientes de negócios” quer dizer “ambientes
atuais”. E isto muda constantemente.

GESTÃO DA QUALIDADE E A INDÚSTRIA 4.0

Meguy Prado - http://www.blogdaqualidade.com.br/qualidade-e-industria-4-0/

Nos últimos anos, mais intensamente na Alemanha, surgiu a chamada Indústria


4.0 (ou também conhecida como 4ª revolução industrial). Em geral, sua origem se
determinou devido à demanda dos clientes por produtos personalizados e esse
movimento é caracterizado por novas configurações tecnológicas aplicadas ao
processo produtivo.

Essa incorporação proporciona comunicação e cooperação entre as pessoas e


o processo produtivo em tempo real. Além disso, integra o cliente à linha de produção
por meio das plataformas digitais, tornando possível que a concepção do produto seja
feita em uma espécie de cocriação.

Esse movimento prega que o cliente, ao adquirir um produto, poderá customizá-


lo durante o processo de produção, obtendo, por exemplo, um porta-celular do
tamanho do seu aparelho e de sua cor preferida, além de acompanhar as fases de
produção em tempo real, por meio de sites ou aplicativos.
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BENEFÍCIOS DA INDÚSTRIA 4.0 PARA AS EMPRESAS

As mudanças foram várias e a conectividade entre homem e máquina irá


proporcionar vários benefícios. Abaixo, alguns deles.

Conexão dos dados

Com a interconexão dos sistemas, a produção pode oferecer informações em


tempo real, que auxiliam o reajuste dos processos ou dos recursos sem atraso. Isso
vai possibilitar o acompanhamento dos indicadores do processo em tempo real,
permitindo identificar rapidamente as falhas, otimizar a produção e melhorar a tomada
de decisão.

Teste virtual de processo

Na fase de concepção do processo, é possível simular em salas virtuais o layout


do processo produtivo e verificar atividades realizadas pelos colaboradores para
identificar o melhor fluxo antes da implantação definitiva, diminuindo custos e o tempo
de criação.

Rastreabilidade do produto e processo

Teremos armazenadas todas as informações referentes aquele produto e


processo. Os produtos serão identificados por um código (QR code) por exemplo, que
armazenará todo o histórico do produto (hora, dia, mês e ano de fabricação, por
exemplo). Com as informações contidas neste código é possível certificar que o
produto percorreu corretamente todas as fases do processo.

O FUTURO COM A INDÚSTRIA 4.0

Essa 4ª revolução chegou com tudo e trouxe muitas mudanças significativas


para os processos produtivos, que irão possibilitar maior produtividade, flexibilidade,
qualidade, eficiência e competitividade.

Para quem acha que a indústria 4.0 é ficção cientifica, alguns exemplos reais,
que já existem e estão ajudando a melhorar processos mundo afora, mostram o
contrário:

 Já existem máquinas em que é possível programar zonas de risco do processo.


Quando elas identificam os limites pré-programados pelo gestor, param a
execução do processo e mandam uma mensagem para o celular do
responsável. Por exemplo, suponhamos que um processo não possa sofrer
pausas, e que a máquina que o executa consuma 3 litros de combustível por
processo rodado. O gestor pode programar o sistema para só reiniciar um
processo se a máquina tiver combustível acima da área de risco (4 litros de
combustível, por exemplo). Se a máquina não tiver mais de 4 litros de
combustível, ela para automaticamente e envia uma mensagem para o celular
do responsável.
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 Em determinados processos produtivos, é preciso seguir rigorosamente as fases


de execução, e o produto só é liberado para o estágio seguinte se estiver
devidamente validado. Já existem sistemas que tornam essa validação muito
mais rápida e precisa, garantindo a qualidade do produto. Se, por exemplo,
determinado produto precisa que 4 parafusos sejam rosqueados a ele em uma
sequência específica, o próprio sistema identifica essa sequência e, se o
colaborador tentar alterá-la, não libera a ferramenta utilizada para a execução da
tarefa, garantindo que o processo seja seguido à risca.

 Já existem impressoras 3D capazes de imprimir diversos objetos, que vão desde


chaveiros e brinquedos a itens mais complexos, como próteses e até mesmo a
estrutura externa de um veículo. Por “imprimir” um componente, ou parte dele,
pouco tempo antes da sua utilização no processo, é possível produzi-lo mais
próximo do uso, de acordo com a demanda, sem gerar desperdícios e estoque.

COMPETÊNCIA: O SEGREDO DA NOVA ERA!

Devido a esse nível de integração e otimização, cada vez mais as organizações


devem se preocupar em atualizar e capacitar seu potencial humano. As pessoas
precisarão de habilidades para compreender e trabalhar com estes sistemas
tecnológicos, para executar os processos.

A interação entre homem e máquina acontecerá de forma nunca vista


anteriormente. Novas demandas irão surgir e o profissional que continuar a ser o
mesmo “cara das metodologias consagradas”, em uma fase de interação e
digitalização, contribuirá para tornar o processo obsoleto, mais lento e mais caro. E
não será mais útil para a organização.

1.6.
QUALIDADE 5.0 (A GESTÃO DA QUALIDADE E A INDÚSTRIA 5.0)
Edson Pacheco Paladini
UFSC / Academia Brasileira da Qualidade

Erra feio quem considera que o movimento chamado Indústria 4.0 significa
automatização das atividades produtivas em larga escala.

Comete equívoco mais vigoroso quem associa a Indústria 5.0 com fábricas sem
recursos humanos, operadas apenas por máquinas e robôs.

O próprio nome Indústria 4.0 decorre da ideia que se trata da Quarta Revolução
Industrial. E a automação já era elemento marcante da Terceira Revolução Industrial,
consolidada nas últimas décadas do século passado.
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A essência da Indústria 4.0 está na concepção de um novo modelo de


negócios, seja para empresas do setor industrial ou de serviços. Este modelo de
negócio, claro, é fortemente apoiado em recursos tecnológicos, mas não
necessariamente direcionado apenas para processos produtivos e, sim, para formas
de interação com mercados consumidores.

Isto incluiria, por exemplo, a ferramenta WhatsApp? A resposta é simples: hoje,


40% das vendas de uma tradicional loja de sapatos são feitas por meio do WhatsApp.

Esta constatação também descarta outro mito que parece agregado


implicitamente à Indústria 4.0: sua viabilização recorreria a mecanismos e estratégias
de complexo rigor teórico e sofisticado aparato computacional e apenas a eles. A
Indústria 4.0 é um conjunto de técnicas para estruturar um ambiente de interações?
Sim.

E a Indústria 5.0?

Também. Mas em outro contexto. Se no primeiro caso trata-se de uma nova


relação entre a empresa e seus mercados consumidores, no segundo trata-se de um
vínculo homem-máquina, ou seja, o desenvolvimento de atividades nas quais o
encadeamento de robôs e recursos humanos fica claramente caracterizado.

Assim, talvez na direção contrária do que o senso comum parece sugerir, as


fábricas inseridas no âmbito da Indústria 5.0 priorizam a ação integrada entre homens
e máquinas. Não se pensa em eliminar recursos humanos, mas, ao contrário, conferir
a eles um papel de elevado destaque nas operações produtivas.

Os resultados mais visíveis da Indústria 4.0 são a customização de bens


tangíveis e serviços, já que o direcionamento para mercados específicos está sendo
o referencial para a governança corporativa. A flexibilização de processos produtivos
(e aí a automação tem papel de destaque – não como fim, mas como meio) é um dos
requisitos críticos para tanto.

Mas outra exigência se impõe, e, aí, nota-se claramente o ponto comum entre
a Indústria 4.0 e Indústria 5.0: a qualificação dos recursos humanos.

No primeiro caso, sobretudo em esferas gerenciais mais elevadas, que


precisam exibir perfeito entendimento das características de mercado.

No segundo, em todos os setores da organização, que precisam criar posturas


técnicas adaptáveis às novas realidades de produção.

Em ambos os casos, requer-se pleno domínio de todos os métodos e


dispositivos para todas as formas de comunicação. Pelo que eu conheço da realidade
produtiva brasileira, Santa Catarina possui um parque produtivo altamente apto e
motivado para a Indústria 5.0. Nem por isso, contudo, o esforço de qualificação dos
recursos humanos, notável em nosso país nos últimos anos, deve esmorecer...

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