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O PROCESSO ADMINISTRATIVO PARA AS

CONTRATAÇÕES PÚBLICAS

V – O perfil constitucional da licitação.

V.a – Licitação como processo ou como procedimento?


O autor, indicando que para definir licitação a própria Constituição
da República usa o termo “processo” em seu inciso XXI, artigo 37,
questiona em qual sentido deve ser utilizado esse conceito.
Fazendo um constante paralelo com o “processo legislativo”, afirma
que ambos os conceitos (processo licitatório e processo legislativo) são
apresentados pela CR como “um conjunto de atos que mantém entre si uma
obrigatória relação de sucessividade temporal, até a produção de um ato
jurídico central e conclusivo”.
Justifica o uso do paradigma “processo legislativo” pois, nele, o
autor explica que a CR tratou o tema de forma mais minuciosa, trazendo
tanto os atos jurídicos conclusivos de seu processo (espécies legislativas do
artigo 59), como os atos intermediários que os antecedem (iniciativa,
discussão, emendas, votação etc.).
No processo licitatório, sequer a CR reporta-se ao seu ato conclusivo,
que é a adjudicação. Nele, a CR não trouxe tantas normas e apenas indica
tratar-se de um processo-competição já que usa termos como: “igualdade
de condições a todos os concorrentes”, “condições efetivas da proposta”
(julgamento objetivo), “exigências de qualificação técnica e econômica”
(dos proponentes = julgamento subjetivo).
Importante notar que o autor, em que pese ter ressaltado em seu texto
que a CR tratou o processo licitatório como um processo-competição, não
menciona que a competição estabelecida no texto constitucional decorre, na
verdade, do princípio maior da igualdade, razão fundamental da
necessidade do processo licitatório. Logo, trata-se de um processo-
competição para garantir a isonomia no trato com aqueles que têm interesse
em firmar relações jurídicas com a Administração.
Neste primeiro capítulo, o autor dá vários enfoques à licitação, quais
sejam: 1.) dever cujo trajeto é pré-estabelecido em lei (ou seja, a CR
traça um esboço do processo licitatório para que a lei central, bem como a
lei periférica o complemente, segundo as suas orientações); 2.) o processo
licitatório tem por fim limitar a atuação do Poder Público; 3.) é uma
forma de atuação administrativa que possui obrigatória processualidade
(ao contrário de outros atos administrativos que independem de
processualidade para validamente existirem, como por exemplo, nomeação
de cargo em comissão, onde o efeito jurídico extroverso do Estado realiza-
se imediatamente).
Porém, esta processualidade deve ser caracterizada como processo
ou como procedimento, uma vez que a CR usa o termo “processo” e a lei
8.666/93, artigo 4.º, o termo “procedimento”?
No segundo capítulo, o autor introduz a questão dizendo que a CR
refere-se em várias passagens ao termo “processo” quando estabelece o
“devido processo legal”, “processo judicial”, “processo legislativo”,
“processo administrativo”, “procedimentos em matéria processual”,
“procedimento oral e sumaríssimo” levando-nos a duas conclusões: 1. o
processo vem antes do procedimento; 2. é dentro do processo que o
procedimento tem o seu espaço de manifestação.
Partindo do processo legislativo pelas razões já expostas, o autor
apresenta, daí, várias noções de processo trazidas pelo artigo 59 da CR:
1. Processo por um prisma de “algo a ser feito” – o processo
legislativo é um conjunto de normas constitucionais que presidem
a elaboração das espécies legislativas, normas que habilitam o
Poder Legislativo a criar as espécies legislativas.
2. Processo se elementariza pelas indicações de “quem pode
fazer” e “do que pode ser feito” – cada espécie legislativa passa
por uma ordem preestabelecida, uma sequencia lógica formada
por etapas (momentos sucessivamente lógicos) para a sua
formação. Tais fases consubstanciam em atos-jurídicos-em-si1
que dão ensejo, cada qual, a relações jurídicas diferentes,
configurando-se o devido processo legislativo (produto do
exercício de competências e direitos subjetivos de múltiplos
agentes). Nisso, é possível se concluir que todo o processo é
vínculo não apenas de atos que se sucedem, mas também de
vínculo entre sujeitos jurídicos. No caso do processo legislativo,
o próprio texto constitucional indica a ordem de sucessão dos atos
parciais, bem como sob a competência de quem cada ato jurídico
em si deve ser praticado.
3. Processo por um prisma de “como se dá cada um dos atos que
o compõe” – aqui, não se discute quais atos deverão ser
praticados, nem quem os deve praticar, nem em qual ordem eles
se darão. Ao contrário, evidencia-se por este prisma o modo de
fazer de cada um dos atos do processo.
4. Concluindo o conceito, o processo legislativo é a indicação
constitucional do conjunto de atos jurídicos parciais para a
produção da lei, com os seus respectivos autores, a seqüência
em que tais atos devem se desenvolver + o modo de realização
de cada qual.

1
Bem por isso que cada fase de produção da lei pode ser questionada judicialmente, através do controle
de constitucionalidade de sua produção. Há possibilidade de haver inconstitucionalidade no próprio
andamento do processo legislativo.
No entanto, pergunta-se: de todos esses prismas do processo, qual
deles pode ser tido por “procedimento”? O procedimento é o modo de
realização de cada um dos atos do processo e, portanto, NÃO INCLUI
quantos e quais atos devem ser praticados, quem os deve praticar e em que
ordem. É apenas a indicação da maneira pela qual cada um dos atos do
processo irá ocorrer. É assim que as normas de procedimento podem ser
vistas como um conjunto das formalidades necessárias ao cabal
cumprimento de cada ato-fase processual (oral, por escrito, onde
protocolar, manuscrito, datilografado etc). O autor então conclui que este é
o sentido do artigo 24, XI da CR “competência concorrente entre União,
Estados e DF para legislar sobre “procedimentos em matéria processual”.
Trazendo este conceito maior de processo legislativo como molde
para o conceito de processo licitatório tem-se que este é um conjunto de
normas constitucionais e legais que tenham por objeto a atividade
administrativa de seleção da melhor proposta e dos atos sequencialmente
propiciadores dessa escolha final, com seus jurídicos praticantes.
Cumpre a União editar normas gerais de processo licitatório, sendo
certo, então, que aos demais entes federados cumpre a edição de normas
específicas, ou seja, normas de procedimento. Normas de processo
possuem aplicabilidade federativamente global e homogênea, por outro
lado, normas de procedimento possuem aplicabilidade federativamente
parcial e desuniforme, por ser o ângulo peculiar a cada ente político 2. Nesse
sentido, está a União impedida de legislar sobre o procedimento licitatório
por um limite material imposto pela própria CR, através do preceito
“normas gerais”. Por outro lado, os entes federados, ao estabelecerem o
procedimento, não podem contrariar as normas gerais de processo ditadas
pela União.
Em conclusão, licitação é ambivalentemente processo e
procedimento. Processo, enquanto conteúdo de normas gerais (lei
central). Procedimento, enquanto conteúdo das normas específicas (lei
periférica).
A crítica feita a esta analogia do processo administrativo com o
processo legislativo é que a CR usa o termo “procedimento” por diversas
vezes para indicar uma secessão encadeada de atos, como, por exemplo, no
procedimento de desapropriação, no procedimento de avaliação para o
estágio probatório etc. Logo, a sucessão encadeada de atos, levando em
conta diversas passagens do texto constitucional, indica procedimento, e
não processo conforme defende o autor.
Sérgio Ferraz esclarece que processo é a relação jurídica
desenvolvida por dois ou mais sujeitos que, ao longo do tempo,
exercem direitos e obrigações. Todo processo implica procedimento,
2
A lei 8.666/93 está impregnada por normas que editam o modo pelo qual os atos do processo licitatório
deve se realizar. Dúvida.
visto este como a sucessão encadeada de atos através de um rito pré-
estabelecido
No último capítulo, o autor apresenta as características centrais da
licitação enquanto processo, quais sejam: a) é processo rigorosamente
público; b) via de concreção do princípio da legalidade (lei propriamente
dita, já que o artigo 37, XXI diz “nos termos da lei”); c) que assegura o
princípio da igualdade (“assegure igualdade de condições a todos os
concorrentes); d) precedente a uma relação jurídica negocial; e) relação
esta que será onerosa (“com cláusulas que estabeleçam condições de
pagamento”), sinalagmática e comutativa 3 (mantidas as condições efetivas
da proposta”); f) visando segurança e eficiência na contratação pública
(exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia
do cumprimento das obrigações); g) garantindo economicidade nos gastos
públicos; h) ele é regra para as contratações públicas (“ressalvados os casos
especificados na legislação”), excluindo-o em caso de dispensa legal 4.
? Prestação de serviço público – SEMPRE precedente de licitação –
e o terceiro setor5?

3
E a permissão?
4
Não mencionamos inexigibilidade, já que nesta inexiste o pressuposto lógica para a realização de
licitação (ausência de competição). Portanto, inexigibilidade não é uma exceção legal ao dever de licitar.
É, na verdade, ausência de pressuposto lógico para a realização do certame.
5
Adin 1.923 – STF entende que os serviços estabelecidos na lei das organizações sociais não são serviços
exclusivos do Estado e, portanto, não dependem de delegação por parte do mesmo. Sendo uma atividade
de utilidade pública que pode ser prestada e titularizada tanto pelo Estado como pelo particular, não há
que se falar em processo licitatório para a hipótese.

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