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Teoria Geral do Direito Civil I (apontamentos)

Aula 25/09

TÓPICOS INTRODUTÓRIOS (Manual pág. 17 – 62)

Aula 02/10

PARTE 1 – TEORIA GERAL DO ORDENAMENTO JURIDICO CIVIL


Capítulo 1 – Fontes do direito civil português

A inclusão por parte do Código Civil de matérias gerais, não privativas da matéria civilística,
evidenciam com clareza o lugar nuclear/central do Direito Civil no ordenamento jurídico. Esta
mesma situação advém-lhe da matéria por ele regulamentada: a personalidade no seu
desenvolvimento e a realização através das relações com outras pessoas.

Não apenas a matéria das fontes de direito é imputada ao Código Civil, também os artigos
seguintes fundamentam o lugar historicamente atribuído de centralidade ao direito civil –
continuando como tal.

Sobre a matéria das fontes de direito, dispõe o artigo 1 do Código Civil que são fontes as leis e
normas corporativas. Lei é toda a disposição imperativa e geral de criação estadual, emanada
pelos órgãos estaduais competentes. Já as normas corporativas consideram-se tb disposição
gerais e imperativas emanadas das entidades reconhecidas na Constituição de 33 com a
designação de organismos corporativos. Findos os organismos referidos supra, as normas
corporativas deixaram de ser fonte de direito.

Eram fontes de direito para além destas os assentos do Tribunal Pleno (artigo 2 do CC),
proferidos em recursos para o mesmo tribunal: além da decisão do caso concreto, era
formulado um preceito genérico que exprimia a doutrina jurídica subjacente à decisão e valia
como estatuição normativa – como verdadeira norma jurídica – para futuros casos. Na
sequência de discussões, o instituto dos assentos foi revogado sobre o entender do legislador
correspondente a tal mateira de que seria indispensável à caracterização do assento como ato
normativo de interpretação e integração autêntica na lei, criado por disposição legal, que ele
não tivesse força vinculativa geral, estando sujeito à contradita das partes e livre revisibilidade
do próprio tribunal eminente. Julgou se assim inconstitucional a norma do artigo do 2 do
Código Civil que atribui competências aos tribunais para fixar doutrina com força obrigatória
geral.

O artigo 3 refere se aos usos (conforme aos princípios de boa fé (boni mores)) como fonte de
direito. Os usos não se tratam de normas jurídicas ou de um reconhecimento do costume
como fonte do direito consuetudinário. Tratam se, sim, de práticas ou usos de facto sobre o
domínio do tráfico jurídico e ainda no comércio (exemplos artigo 218 e 234). Já o artigo 4
atribui aos tribunais a solução “ex aequo et bono” (admissão de equidade: existência de
disposição legal (exemplo artigo 72/2) ou convenção de partes).

A jurisprudência e o costume encontram-se excluídos do reconhecimento como fontes de


direito. Ainda assim, o carater constitutivo e valorativo da intervenção judicial é importante
em casos de vida com conceitos indeterminados e clausulas gerais. O julgador não tem a
competência discricionária, ainda que estes casos constituem uma acentuada dose de
valoração e apreciação. O carater constitutivo da intervenção judicial alastra se em todo o caso
para clausulas gerais, fiscalizadoras ou sindicantes da aplicação das restantes normas do
ordenamento jurídico. Refere se a princípios com que o sistema jurídico se autolimitou,
criando meios de controlo dos resultados de aplicação das restantes normas: Caso do princípio
do abuso do direito (artigo 334 CC), limitação da lei por respeito à dignidade da pessoa
humana (artigo 1 da CRP). A superação do sistema jurídico por via destas clausulas só pode ser
efetuada em casos de clamorosa e intolerável injustiça do resultado. No entanto, não se
atribui o estatuto de fonte de direito à jurisprudência, visto que o resultado do julgador só tem
força vinculativa para o caso concreto a ser decidido.

Diplomas fundamentais do direito civil português

A lei é a fonte mais importante do direito civil português, sendo o vértice do nosso
ordenamento jurídico o direito constitucional (Constituição da República Portuguesa), onde,
no entanto, o repositório fundamental do nosso direito civil se situa no Código Civil português
de 1966. Destarte, existem princípios constitucionais suscetíveis de condicionar o conteúdo
das normas de direito civil – Direitos, Liberdades e Garantias, artigo 24 e ss. CRP; ainda o caso
do artigo 36 contendo os princípios fundamentais sobre família, casamento e filiação; o artigo
61 sobre o direito à iniciativa privada e transmissão da titularidade da mesma em vida ou
morte (62), bem como o artigo 80 e ss. Sobre organização económica; acrescenta se ainda o
principio da igualdade dos cidadãos perante a lei (artigo 13); por fim o artigo 84 que elenca os
bens de domínio publico e remete para a lei a definição de quais integram outros domínios.

A Constituição e o Direito Civil

Ainda que com que o repositório do direito civil português seja o Código Civil, bem como
existindo legislação de direito civil avulso como o código de registo predial, registo civil e
notariado, não fica esgotada a totalidade das normas aplicáveis às relações jurídicas- privadas.
Lato sensu, problemas de direito civil podem encontrar a sua solução numa norma de direito
constitucional: A Constituição constitui uma «força geradora» de direito privado. As suas
normas não são meras diretivas programáticas de caráter indicativo, mas normas vinculativas
que devem ser acatadas pelo legislador, juiz e demais órgãos estaduais.

As normas constitucionais, designadamente as que reconhecem direitos fundamentais, têm tb


eficácia no domínio das relações entre particulares (relações jurídico-privadas), impondo -se à
vontade dos sujeitos jurídico-privados nas suas convenções/ interesses. Tal conjetura parte da
doutrina alemã (eficácia reflexa ou eficácia em relação a terceiros (Drittwirkung)), que
encontra apoio no artigo 18/1 da Constituição.

O reconhecimento e tutela destes direitos fundamentais e princípios valorativos


constitucionais em matéria de relações de direito privado processa-se mediante os meios de
proteção próprios deste ramo do direito: casos da nulidade por ser contra/ “atentado” à
ordem pública (280 CC), hostilidades praticadas que violam os direitos constitucionais
subjacentes e o direito de indemnização por violação de um direito de personalidade.

De entre este domínio é percetível o possível conflito entre os princípios constitucionais e os


princípios fundamentais de direito privado (tb eles conforme a constituição). Assim sendo, hoc
sensu, o cumprimento dos direitos constitucionais adjacentes apenas, pode não só causar
incertezas de carater genérico no paradigma jurídico-privado, como tb dataria as situações do
foro do direito privado de uma extrema rigidez, inautenticidade e irrealismo. O conflito
compreendido entre os princípios prende-se com a interpretação do sentido de atuação dos
princípios e meios do direito privado que entrariam em confronto com os princípios
constitucionais. São caso os princípios da liberdade contratual e de boa fé na execução do
contrato em ordem de cumprimento do interesse acordado. À falta de idoneidade do objeto
negocial fazem se corresponder as consequências jurídicas adjacentes, sendo necessária a
atenuação da afirmação de um ou outro princípio constitucional. É esta portanto a principal
problemática da ideia da doutrina alemã Drittwirkung.

Código Civil – Sistematização e principais características

A publicação de um novo Código Civil como substituição do Código de Seabra foi justificada
pela existência de numerosa legislação avulso (legislação extravagante) posterior a 1867, bem
como pela inadequação do Código então vigente às conceções sociais e doutrinas jurídicas de
meados do século XX.

Um Código Civil pode corresponder a modelos diversos, sob o ponto de vista do tipo de
formulação legal adotado. (Larenz) Distinguem-se 3 tipos de formulação legal: o tipo casuístico
– podemos considerar um tipo de formulação rígida, utopicamente concebido (irrealista), que
assenta na conjetura de emissão de normas jurídicas prevendo o maior número possível de
situações de vida, excluindo por completo toda a possibilidade de interpretação de normas
pelos juízes e liberdade de apreciação. O tipo dos conceitos gerais-abstratos – consiste na
elaboração de tipos de situações de vida mediante conceitos claramente definidos aos quais o
juiz deve subsumir, estabelecendo a consciência da impossibilidade de prever todos os casos/
hipóteses geradas na realidade social, reconhecendo o caráter valorativo e ativo da
intervenção do juiz. O tipo que recorre às meras diretivas sustenta que o legislador utiliza
linhas de orientação que fornece ao juiz, enunciando critérios valorativos de apreciação e
conceitos maleáveis e fluidos onde não há uma zona nuclear segura, cujos contornos se
preenchem de indeterminações.

A preferência direciona-se em torno do tipo de formulação legal dos conceitos gerais-abstratos


(adotado pelo CC português), pois supõe uma disponibilidade de um pecúlio conceitual
estabelecido previamente pelo labor doutrinal, uma sensibilidade e apego maiores à
segurança jurídica e calculabilidade das decisões jurídicas.

É importante saber fazer a distinção entre clausulas gerais e conceitos indeterminados


aplicáveis ao caso sub judice e, noutra estância, aqueles cuja função é realizar um controlo ou
sindicância sobre os resultados da direta aplicação normativa. No emprego de clausulas gerais
ou cláusulas maleáveis diretamente aplicáveis ao caso em concreto (a boa fé, os bons
costumes, e o enriquecimento sem causa), tendo sempre como objetivo a uniformidade
jurídica deve o julgador proceder a uma análise das funções, finalidades (ratio legis), e sentido
objetivo da clausula em questão no foro social. No emprego de clausulas gerais que sindicam o
resultado da aplicação de outras normas do ordenamento jurídico, torna se necessário que o
juiz reconheça não só a clamorosa e intolerável injustiça concreta do resultado ao qual se
chegaria por aplicação da norma sindicada, bem como o caráter excecional do seu proceder.

Sistema do Código Civil de 1966 – Pág. 91 a 94

Aula 09/10

Capítulo 2 – Princípios fundamentais do direito civil português


Podem detetar se uma série de princípios fundamentais para além das normas jurídico-civis
presentes no código. Estes princípios representam a ossatura do direito civil sustentando as
normas que os desenvolvem e dando lhes um sentido e uma função.

Não obstante, tais princípios são elementos validos numa dada circunstância espacial e
temporal: tratam se de um produto histórico, em cuja gestação concorrem opções
fundamentais sobre a organização económica e social e mesmo a própria conceção do
homem. Opções que foram determinadas por dados sociológicos, culturais e históricos que
condicionaram a sociedade em todo um momento, em todo um lugar.

8 princípios ou instituições (que fazem parte do nosso sistema interno de direito civil) que
fundamentam o nosso atual direito civil:

Reconhecimento da pessoa e dos direitos de personalidade

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O direito só pode ser concebido, tendo como destinatários os seres humanos em


convivência.

Os seres humanos não são necessariamente do ponto de vista lógico pessoas em sentido
jurídico (caso de sistemas em que a escravatura era aceite). E as pessoas em sentido jurídico
não são necessariamente seres humanos (caso de organizações de pessoas, como associações
e sociedades, e certos conjuntos de bens (fundações) a quem o direito objetivo atribui
personalidade jurídica).

Ser pessoa é precisamente ter aptidão para ser sujeito de direitos e deveres; um centro de
imputação de poderes e deveres jurídicos.

O reconhecimento de personalidade jurídica perspetivado no código civil, art 66/1, define que
todo o ser humano tem personalidade. Este mesmo reconhecimento corresponde ao já
estatuído no código civil de Seabra, às leis que acabaram com a escravatura, bem como à
legislação internacional (declaração universal dos direitos do homem 1948, art 6), e resulta tb
da própria constituição. É, por conseguinte, um princípio universal disposto no plano do direito
positivo.

A personalidade de pessoas singulares é assim uma qualidade indispensável à realização dos


fins e ou interesses por cada ser humano na vida com os outros (intersubjetividade). Um
estatuto onde vaza a dignidade da pessoa humana e não apenas a máscara utilizada no palco
da vida sócio-juridica.

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Toda a pessoa pode ser titular de relações jurídicas. Ser sujeito de direito, ser pessoa,
apresenta por sinal a suscetibilidade de direitos e obrigações, hoc sensu, a titularidade real e
efetiva desses mesmo direitos e deveres.

Mesmo que no domínio patrimonial uma pessoa não aparente a titularidade de quaisquer
direitos, existem sempre um número de direitos absolutos que são dirigidos a todos: os modos
de ser físicos e morais da personalidade. Chamados de direitos de personalidade (art. 70 e ss
do código civil).

A violação de alguns destes direitos de personalidade pode incorrer em facto ilícito criminal
que desencadeia uma punição estabelecida pelo código penal. Mesmo que tal violação não
seja gravosa o suficiente para a coletividade, a mesma corresponde a facto ilícito civil (art
70/2), que desencadeia determinados efeitos jurídicos como o pagamento de uma
indemnização e outras providências não especificadas, mas que sejam relevantes ao caso em
questão.

Os direitos de personalidade são irrenunciáveis, salvo possíveis limitações voluntárias


(intervenção cirúrgica) que não sejam contrárias a princípios de ordem pública (eutanásia,
mutilação, auxílio ao suicídio) (art 81).

Autonomia privada

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O princípio da autonomia privada tem a sua mais visível dimensão na liberdade contratual
(artigo 405 CC), e na Constituição nos artigos 26/ 1 e 61.

A produção de efeitos jurídicos no quadrante das relações intersubjetivas resulta da ação


humana juridicamente relevante e conformada – atos de vontade, declarações de vontade –
com intento à produção dos referidos efeitos. Os atos jurídicos cujos os efeitos são produzidos
por estas tais declarações de vontade, manifestações de desígnio, declarativas da intenção
designam-se por negócios jurídicos.

O negócio jurídico é uma manifestação do princípio da autonomia privada subjacente ao


direito privado. A autonomia privada passa pelo poder reconhecido aos particulares de
autorregulamentação dos seus interesse, do autogoverno da sua esfera jurídica (conjunto de
relações jurídicas de que uma pessoa é titular).

Ainda que os negócios jurídicos sejam o reflexo mais notório, a autonomia privada manifesta-
se tb no poder de livre exercício dos direitos e do gozo dos bens pelos particulares, a
denominada “soberania do querer” – o exercício do direito subjetivo.

A autonomia privada encontra, pois, os veículos da sua realização nos direitos subjetivos e
na concretização de negócios jurídicos. É uma ordenação espontânea (não autoritária)
exclusiva ao direito privado, com paradigma sobre os interesses das pessoas consideradas
iguais na sua vida de relações jurídicas

Ponto IV do manual – pág.104

(SUBTITULO) – LIBERDADE CONTRARUAL

O princípio da autonomia privada está consequentemente ligado aos negócios jurídicos por
serem estes os concretizadores deste princípio fundamental. O número e o modo de
disposição das declarações de vontade que os integram classifica o tipo de negócio jurídico e,
por sinal, qual o nível de atuação da própria autonomia e arbítrio nos mesmos.

Existem duas classes de negócios jurídicos: Negócios bilaterais e negócios unilaterais


(unilaterais constitutivos e modificadores/extintivos – pág. 105 e 106). De entre a ambiência
distintiva entre ambos, define-se que os negócios bilaterais são aqueles que concretizam de
forma mais ampla a autonomia privada, muito devido ao definido no paradigma das
obrigações – 405 Liberdade contratual. Compra e venda, sociedade, doação, empreitada, são
negócios jurídicos bilaterais pois existe neles a expressa declaração de vontade (proposta) e a
manifesta anuência (aprovação) do proposto.
Artigo 405 – Reconhecimento da liberdade de celebração e conclusão de contratos. Tal
consiste na faculdade de livremente realizar contratos ou recusar a sua celebração, sendo que
em momento algum deve ou podem ser aplicadas sanções por força de uma recusa de
celebração, ou serem impostos contratos contra vontade da pessoa.

Ainda que sobressai a uma retórica de liberdade contratual que perpetua o princípio da
autonomia privada importa realçar que em Portugal se encontram consagrados certos tramites
que restringem a liberdade de celebração de contratos: A consagração de um dever jurídico de
contratar – a recusa de tal por parte de uma das partes não impede a formação do contrato ou
sanções coercivas ao obrigado; dever de prestação de serviços que impendem sobre os
médicos em caso de urgência (v.g. “pela graça da palavra”, como disposto artigo 8 do Código
Deontológico da Ordem dos Médicos). A proibição de celebração contratual com determinadas
pessoas (art 877 e art 953 CC). Por fim, a sujeição do contrato a autorização de outrem, caso
de uma autoridade pública (art 22/3 do Regulamento sobre o fabrico, armazenagem, comércio
e emprego de produtos explosivos [decreto-lei 376/84] – Comando-Geral e comandos distritais
da PSP).

Artigo 405 – Liberdade de modelação do conteúdo contratual. Consiste na faculdade


conferida aos contraentes de fixarem livremente o conteúdo dos contratos, estipulando
contratos de conteúdo diverso dos que a lei disciplina – as partes podem assim realizar
contratos típicos ou nominados, previstos e regulados pela lei, bastando que para a produção
dos devidos efeitos se indique o nomen iuris (denominação legal de um ato); contratos típicos
ou nominados em, que se acrescentem clausulas que lhes aprouver, eventualmente
conjugando dois contratos diferentes (contratos mistos) ; contratos diferentes dos contratos
estipulados na lei (contratos atípicos ou inominados).

Tal como a modalidade de celebração contratual, a modalidade de fixação do conteúdo


contratual vê-se tb sobre tutela de certas restrições: Submete se o objeto do contrato aos
requisitos do artigo 280 que declara nulos os contratos contrários à lei, à ordem pública, boa fé
e bons costumes; sendo anuláveis tb os chamados negócios usuários (art 282); Imperativa da
conduta praticável no âmbito do principio da boa fé (art 762/2); a obediência por parte de
contratos individuais, celebrados entre pessoas pertencentes às categorias económicas e
profissionais, aos contratos-tipo reconhecidos pela lei; a sujeição por parte de certos contratos
a determinadas normas imperativas (artigo 1146 e 1025 do CC).

A questão dos contratos de adesão (limitação de ordem prática): Estes contratos perspetivam
uma fórmula prévia e unilateralmente estipulada às clausulas negocias da suposta empresa em
questão no âmbito da celebração contratual; destarte a outra parte aceita as condições
impostas pelo formulário ou recusa, não existindo possibilidade de modificar o ordenamento
negocial instituído. Em regra, os contratos são celebrados através da adesão (anuência) de
clausulas redigidas que se alastram a todos os contratos realizados no futuro pela empresa
(fenómeno de clausulas gerais). Isto é o que se sucede com os contratos de seguro por
exemplo. Hoc sensu, a tal preponderância hodierna desta modalidade contratual prende-se
com a própria facilidade de organização, racionalização e de normalização da atividade
contratual – atividade “mecânica”; tb facilita a transferência dos riscos para a outra parte, e
deve se em grande parte à transcrita insuficiência das modalidades contratuais legalmente
previstas – a evolução contratual no setor económico é exemplo disso com o caso da locação
financeira, ou contratos bancários.
Como tal, não acontece quanto ao contrato de adesão restrições à liberdade de contratar. Se o
consumidor do bem ou serviço se encontra descontente quanto ao formulário existente pode
recusar. No entanto, esta liberdade passa por não satisfazer as necessidades ou pretensões
importantes; sendo que muitas das vezes as empresas que seguem a via do contrato de
adesão encontram-se numa situação de monopólio ou quase monopólio. Tendo em conta
todas as formalidades estabelecidas no contrato e não podendo alterar o ordenamento
negocial estabelecido, o particular impelido pela necessidade aceita as condições elaboradas
pela contraparte ainda que sendo desfavoráveis a ele ou mesmo pouco equitativas. Muitas
das vezes o praticado por estas empresas que utilizam estes tipos de contrato assemelha-se a
um direito imperativo estadual; um abuso desta figura contratual leva mesmo a uma
«cartelização» integral de setores económicos através de impressos similares em todas as
empresas do setor, de tal modo que a rejeição dos contratos exclui os mesmos consumidores
do bem ou serviço do tráfico jurídico.

Hoc sensu, esta figura contratual e os abusos contratuais mencionados supra levaram à criação
de legislação própria. A nossa ordem jurídica dispõe desde 25 de Outubro de 1985 de um
diploma sobre «clausulas contratuais gerais»: Decreto-Lei 446-85, que foi modificado de forma
a ficar em conformidade com a Diretiva 93/13/CE do Concelho, pelo Decreto-lei 220/95 e o
Decreto-lei 249/99. Este diploma define no disposto no artigo 1/1 que as cláusulas contratuais
gerais são elaboradas sem prévia negociação individual que proponentes ou destinatários
indeterminados se limitem a subscrever.

Domínio Principal de aplicação da liberdade contratual – pág. 117/118

Boa Fé

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O princípio da boa fé consiste na retórica atributiva da consolidação de valores extralegais,


lógico-didáticos, e por sinal ético-jurídicos presentes na ordem jurídica, superando um
paradigma positivista do direito e, portanto, perpetuando a abertura destes valores e a
consequente preocupação pelas particularidades da situação concreta a regular e por uma
juricidade social materialmente fundada. Destarte se evidencia que o princípio da boa fé é
reflexo de uma visão do direito em conformidade com que subjaz ao Estado de Direito Social
hodierno, intervencionista e preocupado com a concretização de um direito reto (justo).

De entre estas linhas estipuladas, se percebe que o princípio da boa fé tem um âmbito tão
vasto que invade tidas as áreas do direito, e que por sua vez assume um diálogo e contraponto
com outro princípio já mencionado supra, o da autonomia privada. Assim se perspetiva o
princípio da boa fé como critério normativo, e, portanto, num sentido objetivo.

A plena concretização hodierna do princípio da boa fé reflete-se em sentido objetivo como


conceito extralegal que traduz o seu potencial jurisgénico e a sua dimensão de justiça social e
materialmente fundada. Não prevalece nele a solução, antes consagra o critério da solução
dado para mediação concretizadora do juiz. Em sentido subjetivo a boa fé vê-se como a
averiguação da atuação dos sujeitos como desconhecedores da plena atuação em
conformidade com o direito (caso do artigo 243/2).

O princípio da boa fé em sentido objetivo funciona como regra de conduta segundo o qual os
contraentes devem agir de modo honesto, correto, leal; sendo veículo de imposição de
deveres e impedindo comportamentos desleais (227/1); (334). Este princípio acompanha a
relação contratual desde o princípio, logo na formação do contrato intervém; é um critério a
ter em conta na interpretação, assim como no exercício dos direitos, bem como no
cumprimento das obrigações adstritas e extinção do vínculo contratual (762/2).

A violação da boa fé pode incorrer em responsabilidade pré-contratual, responsabilidade


contratual ou responsabilidade pós-contratual, dependendo da fase em que ocorra a violação.
Importa salientar que o princípio da boa fé vem a adquirir especial densidade e identificação
com o princípio da confiança – em certos casos é revelada juridicamente uma confiança
justificada entre as partes, sendo que pode levar à atribuição de efeitos jurídicos em situações
tão-só aparentes como se cria a obrigação de indemnização pela frustração das legitimas
expectativas em caso de violação.

Responsabilidade civil

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A noção de responsabilidade civil prende-se com a obrigação de reparar os danos causados a


outrem. Este princípio jurídico atua através da figura da indemnização, que visa tornar
indemne, ou seja sem prejuízo, a vítima da situação em que estaria sem a ocorrência do facto
danoso. Trata-se da necessidade imposta pela lei a quem causa prejuízos a outrem de colocar
o ofendido na situação em que estaria sem a lesão (artigo 483 e 562).

Resto no livro – pág. 128 – 131

Concessão de personalidade jurídica a pessoas coletivas

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As pessoas coletivas são coletividades de pessoas ou complexos patrimoniais organizados em


vista de um fim comum ou coletivo a que o ordenamento jurídico atribui a qualidade de
sujeitos de direitos. Tornam-se centros de uma esfera jurídica própria, autónoma em relação
ao conjunto de direitos e deveres encabeçados pessoalmente nos seus membros. Possuem
património próprio, separado do das pessoas singulares ligadas à pessoa coletiva; são titulares
de direitos e deveres jurídicos, assumem obrigações através da prática de atos jurídicos
realizados em seu nome pelos seus órgãos.

A terminologia abrange todas as entidades referidas supra, sendo que muitas vezes se verifica
na doutrina o uso da expressão pessoas jurídicas e pessoas morais. Hodiernamente o CC fala
de pessoas coletivas abrangendo todas as entidades mencionadas, outras num sentido mais
restrito não abrangendo as sociedades e corresponde às então ditas pessoas morais.

É possível a identificação de 3 modalidades dentro das pessoas coletivas presente no artigo


157 do CC: Associações (coletividades que não tem por objetivo o lucro económico dos
associados); fundações (complexos patrimoniais cujo o foro de ação assenta perante a
harmonia ou diretrizes do fundador); e as sociedades (conjunto de pessoas que contribuem
com bens e serviços para o exercício de uma atividade económica dirigida à obtenção de lucros
e à sua distribuição pelos sócios).
Natureza da personalidade jurídica – A existência de pessoas coletivas resulta de interesses
duradouros e de carater comum/ coletivo. A personalidade coletiva é, pois, um mecanismo
técnica-jurídico justificado pela ideia de maior eficiência e comodidade de organizar os
interesses coletivos e duradouros. Exprime, portanto, uma técnica organizatória julgada
vantajosa. Assim, o direito civil não carece de fingir estar perante uma pessoa singular. A
personalidade jurídica tanto das pessoas singulares como das pessoas coletivas, é um conceito
jurídico, uma realidade situada no mundo jurídico, nessa particular zona da camada cultural da
realidade ou do ser, em ordem à realização dos fins jurídicos.

O reconhecimento de personalidade jurídica aos seres humanos e a personalidade jurídica às


pessoas coletivas são duas realidades distintas: A primeira é imposta pelas conceções ético-
jurídicas de tipo humanista hoje vigentes, como uma exigência forçosa da dignidade da pessoa
humana e do direito ao respeito inerente a todo o ser humano. A segunda perpetua um
mecanismo técnico-jurídico de foro operatório da organização das relações jurídicas ligadas à
realização da certo fim coletivo. As pessoas coletivas são uma realidade sociológica, no
entanto a personalidade coletiva não é algo forçosamente inerente a essa realidade
sociológica, fundamentalmente distinta da realidade do homem singular, tal como não foi
inerente ao próprio homem singular.

O essencial e dominante das pessoas coletivas reside no elemento jurídico, obra da lei, e no
elemento factual, ou seja, nos pressupostos reais, na entidade social sobre que a
personalidade assenta como veste ou figuração jurídica. Como criação do Direito, a
personalidade coletiva não deixa de ter quaisquer atinências na realidade extrajurídica. Trata-
se de uma terminologia que perpetua não uma invenção dos legisladores/ juristas, mas um
conceito transplantado da vida social para o direito no modo de representar estas
organizações juntamente com as relações jurídicas que lhes são adstritas.

A personalidade coletiva é a “tradução jurídica de um fenómeno empírico”.

Propriedade privada

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As pessoas são «fins em si mesmas»; as coisas são meios ao serviço dos fins das pessoas, meios
desprovidos de valor autónomo, isto é, de um valor que abstraia da sua aptidão para satisfazer
necessidades ou interesses humanos. O homem tem necessidade de se servir das coisas como
condição da sua sobrevivência e do seu progresso. Em suma, o domínio e o uso das coisas
permite ao homem talhar para si um espaço maior ou menor de liberdade. O domínio e o uso
das coisas não pode traduzir-se, porém, numa mera sujeição de factos dos bens ao poder do
homem, numa simples relação de posse.

O poder de facto sobre as coisas submete-as materialmente à vontade do homem. Por sinal tal
sujeição ao poder de facto de nada serve à imposição de respeito a outras pessoas. Como tal,
se não existisse a influencia do direito e sua regulamentação, tornar-se-ia inseguro e suscetível
à força de proteção do próprio titular, e como tal seria matéria de agressão pela luta à
apropriação da res, sendo que já se sabe o problema da insuficiência de bens à prossecução
das necessidades humanas, sendo por tal impossível a vida em comum.
Constitui assim finalidade do direito de, em prol do sistema político, social e económico e do
tipo de civilização vigente na sociedade, organizar os poderes dos homens sobre as coisas e o
conteúdo das relações entre homens a respeitos das coisas.

Características do direito de propriedade no nosso sistema jurídico: a tutela constitucional da


propriedade privada está presente no artigo 62 da Constituição (… 61, 82 e 86); sendo que só
mediante justa indemnização pode ser efetuada a expropriação por utilidade pública (artigo
88). O artigo 82 define a existência de 3 setores de propriedade dos meios de produção: Setor
público (Estado), setor privado (pessoas singulares ou coletivas) e setor corporativo e social
(cooperativas, comunidades locais, exploração coletiva por trabalhadores e pessoas coletivas
sem caráter lucrativo).

Face ao descrito, parecesse-se entender que não existem figuras limitativas ao princípio da
propriedade privada, tendo em conta tb que o artigo 1305 do CC não define quanto à
caracterização do direito de propriedade, qualquer função social adjacente que limite este
princípio e como tal encontram-se subjacentes princípios individualistas e extemos. Ainda
assim, existe a possibilidade de nos socorrermos tanto a clausulas legais avulsas que
estabeleçam restrições de direto público e restrições de direito privado à propriedade, bem
como cláusulas gerais como o caso da figura do abuso de direito consignada no artigo 334.

Notas caracterizadoras face à noção dada: 1 – o proprietário tem poderes indeterminados (jus
utendi, fruendi et abutendi – direito de usar, fruir e dispor). Não se limitam os poderes do
proprietário senão nas concretas restrições impostas na lei. 2 – o direito de propriedade é
elástico – é dotado de uma elasticidade / força expansiva: extinto um direito real limitador da
propriedade da coisa, reconstitui-se a plenitude da propriedade sobre ela 3 – qualificação
como um direito perpétuo, hoc sensu, não poder extinguir-se pelo não uso; não usar a
propriedade é ainda uma forma de a usar. Importa ainda salientar os regimes de
compropriedade (1403) e de propriedade horizontal (1414).

A propriedade é o direito real máximo, o de conteúdo pleno e polimórfico. (Direitos reais


limitados – pág. 155 – 157)

Relevância jurídica da família

36

Págs. 158 – 167

O fenómeno sucessório

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O fenómeno sucessório, isto é, o chamamento de uma ou mais pessoas à titularidade das


relações patrimoniais de uma pessoa falecida e a consequente devolução dos bens que a esta
pertenciam. Excluídas destas relações encontram -se as relações pessoais, caso daquelas que a
por força da lei são consideradas intuitu personae (1476/1/a CC).

O Código Civil estabelece uma sucessão legitimária e uma sucessão testamentária.

Os títulos de vocação sucessória admitidos no nosso sistema são a lei, o testamento e o


contrato (art. 2026): Quer tal dizer que o chamamento dos sucessores à titularidade das
relações e a devolução dos bens far-se-á segundo o determinado na lei, em testamento ou por
contrato.
Existem pois uma sucessão legal e uma sucessão voluntária: A sucessão legal pode ser legitima
ou legitimária consoante ou não ser afasta pela vontade da pessoa falecida, o chamado autor
da sucessão ou de cujus; as normas reguladoras da sucessão legitima são assim normas
supletivas, as da sucessão legitimária são normas imperativas. No que toca à sucessão
voluntária pode resultar de um testamento ou de um contrato, sendo que a sucessão
contratual está prevista para casos excecionais na matéria como o caso da proibição dos
pactos sucessórios (2028/2).

A sucessão legitima consiste no chamamento dos herdeiros legítimos à sucessão por o autor
da sucessão não ter disposto validamente e eficazmente, no todo ou em parte, dos seus bens.
A chamada é feita por ordem de classes de sucessíveis, preferindo dentro de cada classe os
parentes de grau mais próximo aos de grau mais afastado.

A sucessão legitimária consiste no chamamento dos herdeiros legitimários à sucessão na


chamada legitima, isto é numa porção de bens de que o testador não pode dispor, por se
destinar por lei aos referidos herdeiros. Aparte da legitima prevalece ainda a chamada quota
disponível que pode ser alvo de testamento ou doação; em caso de não estar redigida, a quota
legitima é devolvida aos herdeiros legítimos, sendo as duas primeiras duas classes de herdeiros
legítimos as mesmas que as dos herdeiros legitimários.

Existe ainda a figura da deserdação, praticável apenas e só segundo os moldes consignados no


artigo 2166 sobre privação do herdeiro legitimário da legitima em testamento e com expressa
declaração da causa.

A sucessão testamentária consiste no chamamento à sucessão dos herdeiros designados em


testamento, isto é, num ato unilateral e revogável pelo qual um individuo dispões de todos os
seus bem ou parte deles para depois da morte (testamento publico e cerrado, e testamento
militar – 2205, 2206 e 2210).

PARTE II – TEORIA GERAL DAS RELAÇÕES JURIDICAS

Teoria geral dos sujeitos de RJ - Capítulo 1: Generalidades

A personalidade jurídica consiste na aptidão para ser sujeito de relações jurídicas. A fórmula de
Manuel de Andrade compreende assim: A idoneidade para receber – para ser centro de
imputação deles, efeitos jurídicos (constituição, modificação ou extinção de relações jurídicas).
Inerente à capacidade jurídica ou capacidade de gozo de direitos (a pessoa é um ente capaz de
direitos e obrigações).

Capacidade jurídica (67) para exprimir a aptidão para ser titular de um círculo, com mais ou
menos restrições, de relações jurídicas. Capacidade de exercício de direitos (130) que consiste
na atuação autónoma, não necessitando do consentimento, anterior ou posterior ao ato, de
outra pessoa. A pessoa com incapacidade de exercícios de direitos pode ser suprida pela
representação legal ou assistência, como exposto na doutrina germânica da capacidade de
exercício ou capacidade de agir – idoneidade para atuar juridicamente, exercendo direitos e
deveres adquirindo direitos e assumindo obrigações por ato próprio e exclusivo, ou mediante
representante voluntário ou procurador escolhido pelo próprio representado.

Problemas dos direitos sem sujeito pág. 196 -197


Incapacidade de gozo de direitos – nulidade (Capacidade de gozo de direitos):

▪ Trata-se das exceções à capacidade de gozo das pessoas singulares

– há exceções ao princípio da plenitude da capacidade de gozo das

pessoas singulares.

▪ Estão taxativamente previstas no CC.

▪ Incapacidade para casar (1601);

▪ Incapacidade para perfilhar (1850);

▪ Incapacidade para testar (2189).

A incapacidade negocial de exercício (capacidade de exercício de direitos) provoca a


anulabilidade dos negócios – maiores acompanhados art. 145.º; menores art. 125.º.

ATOS ANULÁVEIS E ATOS NULOS: A anulabilidade e nulidade são duas formas diferentes de
invalidade. Os atos inválidos podem ser nulos ou anuláveis. ▪ A nulidade é mais grave do que a
anulabilidade e essa maior gravidade da nulidade vai, depois, traduzir-se num regime
diferente.

Prazo: ▪ A nulidade pode ser invocada a todo tempo: art. 286.º do CC. ▪ Enquanto a
anulabilidade só pode ser invocada dentro de um determinado prazo, podendo este ser um
prazo-regra, previsto no artigo 287º do CC, sendo ele de um ano a contar da cessação do vício.
Contudo, este prazo-regra só se aplica se o legislador não tiver previsto um prazo especial.
Portanto, quando um ato é anulável, temos de ir ver se o legislador previu um prazo especial –
e, se sim, é esse que se aplica – ou não – e, se não, aplica-se o prazo-regra

▪ A nulidade pode ser invocada por qualquer interessado. ▪ Enquanto a anulabilidade só pode
ser invocada pelas pessoas no interesse das quais foi estabelecida.

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