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Entendemos porém que não poderá ser esta a taxa de juros em vigor no país, por duas ordens
de razão.
A primeira, prende-se com o facto de ser manifestamente usurário aplicar-se, nos dias que
correm, uma taxa de juros de 75% ao ano. Na verdade, como se disse supra, para a fixação da
taxa de juros de 75% ao ano, nos termos do Despacho conjunto 36/03, foram tomados em
consideração alguns critérios específicos, que visavam acautelar a constante depreciação da
moeda nacional, o Kwanza.
Tanto assim é que nesse mesmo Despacho conjunto é publicado um quadro de onde se pode
ver o factor de actualização monetária. Por outro lado, uma análise das taxas de câmbio de
referência, praticadas pelo Banco Nacional de Angola (www.bna.ao) nos últimos anos, leva-nos à
seguinte conclusão: em 2002, de Janeiro a Dezembro, a moeda nacional sofreu uma depreciação
na ordem dos 75%; em 2003 (data da publicação do referido Despacho conjunto), de Janeiro a
Dezembro, a moeda nacional sofreu uma depreciação de cerca de 52%; em 2004, no período
homólogo, a depreciação da moeda nacional já foi de cerca de 7,5%; no período homólogo de
2008 nota-se que a moeda nacional manteve-se sempre constante.
Assim sendo, parece claro que a taxa de juros fixada pelo Despacho conjunto 36/03 incluía um
valor de correcção monetária, ou seja, o indicado valor de 75% não representava todo ele a taxa
de juros, mas sim previa um mecanismo que visava corrigir a depreciação da moeda nacional.
Portanto, face ao contexto actual, de manifesta estabilidade da moeda nacional, não faz qualquer
sentido falar-se em taxas de juros na ordem dos 75%.
A segunda razão para afastar a aplicação da taxa de juro fixada pelo Decreto conjunto em causa
tem a ver com a simples interpretação jurídica dos comandos emanados desse diploma legal. Na
verdade, o referido instrumento legal diz expressamente que "Fica estabelecido para os juros
legais do trimestre Abril-Junho de 2003 a taxa de 75% ao ano". Ou seja, inequivocamente, aquela
taxa de juros foi fixada apenas e só para aquele trimestre, pelo que a partir de 1 de Julho de 2003
essa taxa passou a ser ilegal.
Por tudo o que se deixa dito, necessário parece concluir-se que existe um vazio legal no que diz
respeito à taxa de juros legal em Angola, tal como vem previsto no artigo 559.º do Código Civil.
Temos vindo a defender, ao longo dos últimos anos, que este vazio legal deve ser colmatado
circunstancialmente pela prudente aplicação da média das taxas de juros normalmente
praticadas pelos bancos comerciais que operam em Angola.
Uma decisão recente proferida pelo Tribunal Provincial de Luanda (Secção do Cível e
Administrativo), no processo n.º 0985/09-B, de Março de 2013, determinou que o Despacho n.º
36/03 estabelece uma norma de carácter temporário, que já não se encontra em vigor.
Considerando que o tribunal estava vinculado à determinação de uma taxa de juro aplicável ao
caso sub iudice, este decidiu aplicar uma taxa de juro de 10%, que foi encontrada tendo em
conta a média das taxas de juro aplicadas pelos bancos comerciais a operar em Angola.
Em nosso entender, esta foi uma boa decisão. Não obstante, é premente que os Ministros do
Planeamento, das Finanças e da Justiça emitam um novo despacho conjunto, nos termos do
artigo 559º do Código Civil, e fixem a taxa de juros legal a vigorar no país. Só deste modo
poderá o sistema jurídico angolano assegurar um maior grau de confiança e de segurança
jurídica a todas as pessoas e entidades que desenvolvem a sua actividade ao abrigo da lei
angolana.
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