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ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

ITA 2023

LITERATURA

AULA 07
Antologia Poética – Carlos Drummond de Andrade

Prof.ª Celina Gil

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 1


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Sumário
APRESENTAÇÃO 3

1 - MODERNISMO DE 30 3

2 - CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 4

2.1 - Características 5
2.2 – Obras 6

4 - ANTOLOGIA POÉTICA 19

4 – EXERCÍCIOS 37

4.1 – Exercícios 37

4.2 – Gabarito 67

4.3 – Exercícios comentados 68

CONSIDERAÇÕES FINAIS 109

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ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Apresentação
Olá,

Vamos falar hoje sobre a obra Antologia Poética, de Carlos Drummond de Andrade. Para
isso faremos uma revisão de Modernismo de 30, um aprofundamento em Carlos Drummond de
Andrade e, então, uma análise de sua Antologia. Vamos lá?

1 - Modernismo de 30
A segunda fase do modernismo brasileiro aprimora diversos aspectos da primeira e
amplia os temas sobre os quais se debruça, consolidando o modernismo no Brasil. Inquietações
filosóficas e religiosas também passam a aparecer com maior frequência. Os principais eventos
históricos que marcam esse momento da literatura são:

• A crise da bolsa de Nova York, em 1929.

• No Brasil, a Revolução de 30 promove um golpe de estado e dá início ao Estado Novo,


liderado por Getúlio Vargas.

• A Segunda Guerra Mundial, como tudo o que tem de mais marcante: desde os campos
de concentração e a perseguição às minorias étnicas, até o lançamento da bomba
atômica sobre as cidades jáponesas de Hiroshima e Nagasaki.

• A discussão política no mundo entre capitalismo e socialismo, que daria início à Guerra
Fria após o fim da guerra.

Características da poesia

Poesia
• Presença de traços de pessimismo e individualismo.
• Aparecimento de poesia com temáticas filosóficas.
• Crítica social, analisando a realidade com profundidade.
Influência da psicanálise
• Investigação do inconsciente e das razões que movem as pessoas.
Linguagem coloquial
• Aproximação com a linguagem popular, principalmente por conta da aproximação com as
temáticas cotidianas.
Liberdade formal
• Mantém-se os versos livre e brancos, ou seja, sem métrica e sem rima, sem preocupação com
formas fixas, produzindo poemas sem número de versos regular. Há também liberdade
temática, ou seja, a noção de qualquer tema pode ser tratado pela literatura.

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2 - Carlos Drummond de Andrade


Carlos Drummond de Andrade (1902 – 1987)
foi um dos autores mais populares e importantes da
segunda geração modernista. Sua poesia é marcada pela
crítica social e pela colocação do indivíduo no centro das
discussões. Ele se interroga constantemente acerca das
dificuldades da sociedade burguesa. Ele é também um dos
autores mais populares nas provas.

Drummond nasceu em Itabira do Mato Dentro,


interior de Minas Gerais. Sua família era dona de fazendas
na região que acaba entrando em decadência. Desde cedo,
ele se interessou pela literatura. Aos 14 anos ingressou em
um colégio interno em Belo Horizonte e dois anos depois
foi para Nova Friburgo. Chegou a estudar um tempo no Rio
de Janeiro, mas foi expulso após uma discussão com o
professor de português, acusado de “insubordinação
mental”.

Começa a publicar no Diário de Minas em 1921, onde também trabalharia como editor,
além de ministrar aulas de Geografia e Português na sua cidade natal. Em 1924, passa por Belo
Horizonte, “a caravana a Minas”, um viagem cultural feita por Mário de Andrade, Oswald e
Tarsila. Drummond conhece Mário, com quem trocará cartas. No ano seguinte, conclui o curso
de Farmácia e funda uma revista literária cuja finalidade é divulgar o Modernismo em Minas.

Em 1928, publica o poema que o tornaria muito conhecido ao longo de sua vida, “No
meio do caminho”, na Revista de Antropofagia: o popular “No meio do caminho tinha uma
pedra (...)”. O poema foi muito criticado por sua aparente simplicidade e pela quantidade de
repetições. O poema, encomendado em 1927 especificamente para a publicação na revista
Antropofágica, consagrou o autor imediatamente.

Em 1930 publica seu primeiro livro, Alguma poesia (1930). Em 1934, muda-se para o Rio
de Janeiro, trabalhando como chefe de Gabinete do Ministério da Educação e Saúde, na época
liderado por Gustavo Capanema. Capanema apoiou Getúlio e foi Ministro da Educação até o
fim do Estado Novo em 1945. Essa relação entre o poeta crítico e o Ministro de Vargas sempre
pareceu estranha e incompreensível.

Às vezes pareceu ser um problema para o próprio poeta que, no fim do Estado Novo,
aproximou-se do Partido Comunista. Há documentos que provam a intenção do poeta, logo
abandonada, de se candidatar a deputado pelo Partido Comunista. Durante dois anos publicou
artigos no jornal Tribuna Popular, um veículo de informação de esquerda.

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Em 1948, diante da radicalização do Congresso da ABDE (Associação Brasileira de


Escritores), Drummond toma uma posição de isenção ideológica entre os escritores. Por conta
desse fato, alguns meios impressos ligados ao Partido Comunista associavam a Drummond os
adjetivos “traidor”, “reacionário”, “escritor decadente” etc.

Drummond se via, assim como a pedra, no meio do caminho: ele não acredita na
desigualdade e exploração pelo trabalho da sociedade capitalista, sem sinal de resolver suas
crises; mas as tentativas de implantação de estados socialistas ou comunistas falharam, criando
Estados com desigualdades sociais tão profundas quanto, além de um sistema burocrático que
imobilizava os homens. O que Drummond parece sentir é que não há possibilidade de mudança
profunda no mundo.

De 1945 até 1962, ano de sua aposentadoria, foi funcionário do Serviço Histórico e
Artístico Nacional. Ele continuou escrevendo até o fim de sua vida, em 1987.

2.1 - Características
Algumas das principais temáticas de sua poesia são:

• O Indivíduo é o tema central de sua poesia. Seja o


isolamento, o indivíduo que olha para dentro de si,
seja a coletividade, a possibilidade de criação de
laços e coletividade entre os homens.

• A incomunicabilidade entre os homens. Parece cada


vez mais difícil alcançar um modo de diálogo entre os
homens, que se afastam e se compreendem cada vez
menos.

• A ironia e o humor, muitas vezes advindas da figura do indivíduo que não consegue se
adequar à sociedade e às convenções da sociedade burguesa.

• A preocupação social, ligada principalmente ao contexto histórico em que vivia: os


regimes totalitários do Nazismo e do Fascismo, a ditadura Vargas e a Segunda Guerra
Mundial. O conservadorismo e o autoritarismo são constantemente questionados pela
poesia de Drummond.

• Temas filosóficos ou metafísicos, caindo frequentemente num existencialismo. O próprio


fazer poético é fruto de investigação, o que faz com que muitos poemas caiam num lugar
metalinguístico. O papel do artista no mundo também é frequentemente questionado.

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• Homenagens a figuras que ele admira. Tanto outros escritores, como Mario de Andrade,
quanto figuras conhecidas, como Charles Chaplin, são frequentemente citados em seus
poemas. Há também poemas escritos especificamente para alguém.

• Aspectos memorialistas, pensando sobre sua infância e aspectos de sua terra natal. Itabira
e Minas Gerais são temas constantes em sua obra.

• No campo da linguagem, há uma maior liberdade linguística, usando termos coloquiais,


versos livre e brancos. A partir de temáticas nascidas no cotidiano, Drummond faz uso de
muitos jogos de palavras ou figuras de linguagem.

• O amor é um campo de tensão, tanto abordado a impossibilidade de realização do


sentimento quanto a visão erotizada do amor, para além de seus aspectos elevados.

• O eu lírico fragmentado, em descompasso com o mundo, que é eternamente gauche.

2.2 – Obras
São abordados na Antologia Poética de Drummond poemas de 12 livros. Por isso, é
importante entendermos o trajeto do poeta na construção de sua obra. Vamos ver um pouco
mais sobre cada um de seus livros. Em cada tópico, já faremos a análise de um poema presente
na antologia.

Alguma poesia (1930)

Percebe-se nessa estreia a influência da primeira geração modernista no que diz respeito
à forma: verso livre, coloquialismo, prosaísmo, poemas curtos e poema-piada. A novidade fica
por conta dos temas. Drummond traz para a poesia brasileira a gravidade dos novos tempos
que o crash da bolsa de valores provocou num mundo que caminhava para a Segunda Guerra
Mundial.

Desde o início, o poeta mineiro se coloca na posição de intermediário entre um mundo


que parecia se dissolver na sua frente e poesia. Essa visão bastante particular, que ele exagera,
produz uma série de metáforas e combinações de imagens próprias.

No primeiro livro, o autor aliviava a tensão de um existencialismo pessimista através do


humor e da ironia que ele herdou a primeira geração. Os temas que ele elabora nesse primeiro
momento vão acompanha-lo nas outras fases e outras produções. Talvez o traço que melhor
distinga o poeta seja o impasse. Um dos principais poemas desse livro é justamente aquele que
mencionamos anteriormente, No meio do caminho.

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No meio do caminho tinha uma pedra Primeiro, perceba que o poema se estrutura a
partir de um erro gramatical: não usamos, de
tinha uma pedra no meio do caminho acordo com a norma culta, “ter” no sentido de
“haver” nesse caso.
tinha uma pedra
A pedra mencionada tende a ser entendida
no meio do caminho tinha uma pedra.
como os obstáculos ou problemas que as
pessoas encontram nas suas vidas (o caminho),
que podem impedir que essa pessoa siga
Nunca me esqueci desse acontecimento avançando. A pedra também pode indicar
algum momento ou acontecimento marcante
na vida de minhas retinas tão fatigadas. para a vida de uma pessoa.
nunca me esquecerei que no meio do
caminho
Há também uma sensação de cansaço por parte
tinha uma pedra do autor.

tinha uma pedra no meio do caminho Alguns teóricos apontaram a possibilidade do


poema fazer referência a uma tragédia pessoal
no meio do caminho tinha uma pedra. da vida de Drummond: ele perdeu seu filho
recém-nascido, que viveu apenas meia hora, em
1927. Essa teoria foi reforçada pela semelhança
entre as palavras “pedra” e “perda”.

Esse poema de Drummond dialoga com o soneto Nel mezzo del camin..., escrito
pelo poeta Olavo Bilac. O poema parnasiano também se estrutura a partir de
repetições, mas é escrito de maneira calculada e pomposa, como é característico do
movimento. Drummond produz quase um deboche sobre a estética parnasiana,
criando um poema com linguagem simples e estrutura livre.
Ambos os poemas foram inspirados em uma frase do canto I da Divina Comédia e
Dante Alighieri, escrita em 1317: “No meio do caminho”.

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Brejo das Almas (1934)

O livro foi publicado no mesmo ano em que Carlos Drummond de Andrade deixa Belo
Horizonte e se muda para o Rio de Janeiro para trabalhar no Ministério da Educação. Para além
de antecipar aquele registro político e social que veremos com força em Sentimento do Mundo
e A rosa do povo, há um interesse pelo tema amoroso nessa obra. É também a primeira vez que
aparece na obra de Drummond um soneto, forma poética que normalmente os modernistas
evitam.

O tom da obra é mais decadente, niilista. Fica evidente aqui uma subjetividade
desencantada com o mundo. As engrenagens que fazem o desejo e o amor surgirem e uma
ironia diante dos relacionamentos amorosos marcam essa obra. Isso fica evidente no poema O
amor bate na aorta:

Cantiga do amor sem eira


nem beira, É importante perceber que esse poema sintetiza
vira o mundo de cabeça bem a visão do amor nessa obra; Há uma visão
para baixo, racionalizada do amor, evidenciada já no título pela
suspende a saia das mulheres, menção da “aorta”, artéria responsável por levar
tira os óculos dos homens, oxigênio para o organismo. Ela, como não poderia
o amor, seja como for, deixar de ser, sai do coração.
é o amor.
Já na primeira estrofe fica evidente o tratamento do
amor como algo que comove as pessoas,
Meu bem, não chores,
independentemente de ser ou não profundo.
hoje tem filme de Carlito!
Mesmo o amor mais superficial, quando declarado,
cantado, é capaz de trazer emoção. Ainda que o
O amor bate na porta
poeta reforce aqui o lado físico do amor.
o amor bate na aorta,
fui abrir e me constipei. Há aqui também na segunda estrofe uma referência
Cardíaco e melancólico, a Charles Chaplin, o Carlito. Seus filmes, comédias,
o amor ronca na horta seriam capazes de alegrar a figura amada,
entre pés de laranjeira consolando-a.
entre uvas meio verdes
e desejos já maduros. Na terceira estrofe vemos que o eu lírico sabe bem
que o amor dói, porque ele já teve suas próprias
Entre uvas meio verdes, experiências ruins. Quando ele tentou abrir a porta
meu amor, não te atormentes. para o amor, ele acabou ficando doente. Isso faz
Certos ácidos adoçam com que o eu lírico acabe deixando o amor
a boca murcha dos velhos adormecido fora de si. Assim como o próprio poeta,
e quando os dentes não mordem o amor é melancólico. E ao se instalar em sua aorta,
e quando os braços não prendem o deixou cardíaco.
o amor faz uma cócega
o amor desenha uma curva

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propõe uma geometria. Mesmo assim, o amor parece algo capaz de trazer
algum paz que seja. O amor não é tudo, como
Amor é bicho instruído. gostam de dizer os poetas e os apaixonados. Mas há
uma coisa ou outra que ele é capaz de fazer. Isso fica
Olha: o amor pulou o muro claro na quarta estrofe, em que o poeta faz uso de
o amor subiu na árvore alguns paradoxos para referir-se ao amor: ácidos que
em tempo de se estrepar. adoçam, dentes que não mordem, por exemplo.
Pronto, o amor se estrepou.
Daqui estou vendo o sangue Não por acaso o amor é um bicho instruído. Essa
que escorre do corpo andrógino. prosopopeia indica a capacidade de manipular do
Essa ferida, meu bem, amor, descrita na estrofe anterior. Essa
às vezes não sara nunca personificação é mais explorada nas duas últimas
às vezes sara amanhã. estrofes.

O que o eu lírico relata nas últimas estrofes é um


Daqui estou vendo o amor
coração partido. O amor quando de exalta, quando
irritado, desapontado,
deixa de lado a calma, acaba se machucando. A forte
mas também vejo outras coisas:
emotividade fere o amor – e por extensão aquele
vejo corpos, vejo almas
que ama. As dores de amor, segundo o eu lírico,
vejo beijos que se beijam
podem ou não ser superadas.
ouço mãos que se conversam
e que viajam sem mapa. Ainda assim, insistimos. Mesmo após vermos o amor
Vejo muitas outras coisas sair machucado – e todos saberem que ele está
que não ouso compreender… fadado a isso – seguimos insistindo. O eu lírico relata
pessoas juntas, tentando ainda assim relacionar-se e
encontrar um modo de relacionar-se. Algo que ele
não compreende, reforçando o caráter racional do
eu lírico em relação a amor.

Sentimento do mundo (1940)

Em 1940, Drummond publica outra grande obra, Sentimento do Mundo. Trazia 28


poemas escritos entre 1935 e 1940, portanto, tendo como pano de fundo a ascensão do
nazismo, o governo Getúlio Vargas e a Segunda Guerra Mundial.

O individualismo do poeta tinge-se de uma preocupação coletiva que o leva a procurar


dissolver-se em um nós político, como se almejasse uma solução solidária, de união entre os
homens, que redimisse o mundo e o próprio poeta. De sujeito solitário, isolado, o eu lírico aqui
é presente, que se vê no mundo com outros homens. Ainda assim, Drummond percebe o total

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distanciamento e incomunicabilidade entre os homens. Muitos poemas são tentativas de


contato – o que incorrerá no aparecimento de vocativos e de usos da primeira pessoa do plural.
A visão pessimista de Drummond segue presente aqui, contrastando com a esperança. O poeta
é descrente no presente, mas acredita no futuro.

Encontramos nessa obra temas como o sentimento do mundo, o eu indissolúvel, o outro


social e a alienação. Um dos poemas mais conhecidos da obra é Mão dadas.

Não serei o poeta de um mundo caduco Esse é um poema construído em torno de


negativas e decisões. O poeta analisa,
Também não cantarei o mundo futuro primeiro, o mundo como ele o vê e depois fala
sobre si mesmo e o que o interessa falar.
Estou preso à vida e olho meus companheiros
Percebe-se logo no início um problema: não
Estão taciturnos mas nutrem grandes
se pode falar sobre o passado – o mundo que
esperanças
já caducou – e nem se pode falar sobre o
Entre eles, considero a enorme realidade futuro – o mundo utópico que ainda não se
realizou. É preciso olhar para o presente. É
O presente é tão grande, não nos afastemos dele que não devemos nos afastar, não só
porque estamos presos a ele, mas porque ele
Não nos afastemos muito, vamos de mãos é grande e cheio de possibilidades.
dadas
Se todos os homens se encontram com o
mesmo sentimento, taciturnos, sombrios, mas
com esperança, então é preciso dar as mãos,
Não serei o cantor de uma mulher, de uma
criar uma noção de coletivo. A união é o que
história
pode manter a esperança.
Não direi os suspiros ao anoitecer, a
A segunda estrofe assume ainda um tom
paisagem vista da janela
metalinguístico, indicando o que se pode ser
Não distribuirei entorpecentes ou cartas de escrito, ou ainda, o que não pode ser escrito.
suicida O eu lírico não quer fugir de suas
responsabilidades com os outros homens. O
Não fugirei para as ilhas nem serei raptado amor clichê e disparatado não o interessa. A
por serafins poesia deve ser mais do que meio de fuga ou
escape romântico. O que interessa para sua
O tempo é a minha matéria, o tempo
poesia é seu tempo e as inquietações dos
presente, os homens presentes
homens de seu tempo.
A vida presente

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José (1942)

O quarto livro de poemas foi lançado de forma discreta. Contando com apenas 12
poemas, o livro foi lançado como o volume final de uma coletânea chamada Poesias, que reunia
os três livros anteriores de Drummond. Não foi um livro tão celebrado quanto os demais, mas
ficou conhecido pelo poema que dá título ao livro, também chamado José, mais conhecido pelo
primeiro verso: E agora José?

E agora, José?
A festa acabou, No início do poema já se coloca o verso que se
a luz apagou, repetirá ao longo do texto: “E agora, José?”.
o povo sumiu,
A escolha do nome não vem ao acaso. José é um
a noite esfriou,
dos nomes mais comuns do Brasil. O uso desse
e agora, José?
nome é metonímico, representando um sujeito
e agora, você?
coletivo, o próprio povo do Brasil. Tanto que no
você que é sem nome,
final do poema o eu lírico seguira ao verso-refrão a
que zomba dos outros,
indagação: “E agora, você?”.
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José? Na primeira estrofe, o que vemos é uma indagação:
o que resta após o fim dos bons momentos. Depois
Está sem mulher, da festa e na solidão, o que sobra? O eu lírico
está sem discurso, também se questiona sobre o fazer poético, já que
está sem carinho, aponta para alguém que faz versos. E de que serve
já não pode beber, a poesia agora?
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou, A segunda estrofe reforça o sentimento de vazio e
o dia não veio, solidão. Esse homem já não tem nada nem
o bonde não veio, ninguém. Além disso, sugere que esse homem é
o riso não veio, constantemente vigiado, não tem liberdade nem
não veio a utopia para beber, fumar ou cuspir.
e tudo acabou
e tudo fugiu Além disso, tudo o que ele ainda tinha se acabou
e tudo mofou, ou fugiu dele. O tempo e a vida que aquele homem
e agora, José? vive deterioram tudo e não deixam que as utopias
se estabeleçam.
E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre, A terceira estrofe evidencia a perda dos
sua gula e jejum, sentimentos, das coisas materiais e das sensações.
sua biblioteca,

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sua lavra de ouro, Esse homem é insatisfeito: ele não tem gula, mas
seu terno de vidro, também não tem jejum, por exemplo.
sua incoerência,
seu ódio — e agora?
O desencantamento e inadequação com o mundo
Com a chave na mão se materializa na metáfora da chave na quarta
quer abrir a porta, estrofe: a saída, o encontro com seu propósito não
não existe porta; existe, não só porque a chave em suas mãos não
quer morrer no mar, abre a porta, mas porque a porta sequer existe. A
mas o mar secou; morte não é uma possibilidade também, como se
quer ir para Minas, ele fosse obrigado a seguir. A Minas Gerais de seu
Minas não há mais. passado, que vive em sua memória, também já não
José, e agora? existe mais. O passado não pode mais ser refúgio.

Se você gritasse, A quinta estrofe levanta hipóteses sobre o que


se você gemesse, poderia ser feito. Fazendo uso de verbos no
se você tocasse subjuntivo, ou seja, indicando a ideia de
a valsa vienense, possibilidade, o eu lírico aponta para possíveis
se você dormisse, saídas. Elas, porém, não chegam a se concretizar,
se você cansasse, pois todas as orações ficam com o final em
se você morresse... suspenso, indicando que não há concretização da
Mas você não morre, expectativa. A morte não é uma solução plausível,
você é duro, José! porque a força e capacidade de sobreviver são
parte fundamental desse sujeito.
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia, Na sexta estrofe o eu lírico está totalmente isolado,
sem parede nua sem Deus, sem apoio e sem meios de fugir da
para se encostar, situação em que se encontra. Ainda assim, há uma
sem cavalo preto percepção de um sujeito que segue em frente, que
que fuja a galope, não deixa de seguir, mesmo contando apenas
você marcha, José! consigo próprio. Esse homem marcha, seguindo
José, para onde? quase no modo automático, para enfrentar suas
batalhas.

A Rosa do Povo (1945)

Ainda impactado pela guerra, Drummond escreve em 1945, A Rosa do povo. A menção
ao povo não é arbitrária. A preocupação social, com a coletividade e com os (des)caminhos da
humanidade aparecem nesse livro. O poeta reflete sobre a função da poesia: será que a rosa

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(a poesia) é para o povo ou do povo? Que tipo de poesia a época em que ele vive poderia
satisfazer um mundo em convulsão? Nesse livro, ele escreve um dos poemas mais celebrados
pela crítica “A flor e a náusea”. Nele o poeta descreve uma cena hostil a uma flor, mas mesmo
assim ela fura o asfalto.

Preso à minha classe e a algumas roupas,


vou de branco pela rua cinzenta. A flor é uma metáfora para a poesia, nascida
Melancolias, mercadorias espreitam-me. neste tempo de revolta e ódio. Sua beleza
Devo seguir até o enjoo? está em ser revolucionária. Ela traz esperança
Posso, sem armas, revoltar-me? para um mundo diante do qual o eu lírico se
sente impotente.
Olhos sujos no relógio da torre:
Já na primeira estrofe vemos a relação de
Não, o tempo não chegou de completa
classe aqui: a imobilidade ligada à posição no
justiça.
mundo.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas,
alucinações e espera. Na segunda estrofe, o relógio personifica
O tempo pobre, o poeta pobre todo o tempo que será dito a seguir. Aqui
fundem-se no mesmo impasse. vemos o uso de termos antipoéticos,
indicando a miséria do tempo em que
Em vão me tento explicar, os muros são vivemos.
surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos. Na terceira estrofe, vemos u meu lírico que
O sol consola os doentes e não os renova. sente que fala com as paredes. Tendo em
As coisas. Que tristes são as coisas, vista que isso é escrito por um poeta, não se
consideradas sem ênfase. pode excluir da análise a noção de que a
poesia não consegue se comunicar com o
Vomitar esse tédio sobre a cidade. homem, que foi reificado, coisificado pelo
Quarenta anos e nenhum problema capitalismo. A poesia não é revelação, é
resolvido, sequer colocado. enigma, cifrada.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa. Na quinta estrofe há a expressão do tédio, do
Estão menos livres mas levam jornais marasmo, do eu lírico. O próprio poeta pensa
e soletram o mundo, sabendo que o perdem. sobre si mesmo ao ver que ao quarenta anos
ainda não consegue entender-se no mundo.
Crimes da terra, como perdoá-los? Há também uma crítica à burguesia
Tomei parte em muitos, outros escondi. acomodada, que se orgulha em ser
Alguns achei belos, foram publicados. informada, mas não vive a vida. A
Crimes suaves, que ajudam a viver. comunicação, que parece essencial, não
Ração diária de erro, distribuída em casa. ocorre.
Os ferozes padeiros do mal.
A omissão dos homens diante dos males do
Os ferozes leiteiros do mal.
mundo preocupa o eu lírico. Na sexta estrofe
fica evidente o questionamento: como
Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
colocar a poesia num lugar central num

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Ao menino de 1918 chamavam anarquista. mundo como esse? O trágico nos diverte. O
Porém meu ódio é o melhor de mim. jornal (ração diária de erro) não nos informa e
Com ele me salvo nos alimentamos de injustiças (padeiros e
e dou a poucos uma esperança mínima. leiteiros).

Uma flor nasceu na rua! Drummond alude, na sétima estrofe, ao fato


Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço de ter sido expulso da escola sob a acusação
do tráfego. de ser anarquista. Ele se pergunta o que
Uma flor ainda desbotada aconteceu com seu espírito revolucionário. O
ilude a polícia, rompe o asfalto. ódio é o que prepara para o momento de
Façam completo silêncio, paralisem os virada do poema.
negócios,
A oitava estrofe apresenta uma epifania
garanto que uma flor nasceu.
inesperada. Finalmente encontrado o símbolo
poético: a arte possível de mudar o mundo é
Sua cor não se percebe.
aquela que nasce no meio do povo. É só ela
Suas pétalas não se abrem.
que pode parar o fluxo intenso do
Seu nome não está nos livros.
capitalismo. Ainda assim, há uma necessidade
É feia. Mas é realmente uma flor.
de garantir o símbolo poético, de convencer
as pessoas que a poesia vale a pena.
Sento-me no chão da capital do país às cinco
horas da tarde Na penúltima estrofe vemos que essa flor, ou
e lentamente passo a mão nessa forma seja, a poesia, rompe o silêncio imposto pela
insegura. sociedade. Ao contrariar tudo aquilo que se
Do lado das montanhas, nuvens maciças espera de uma flor, ela foge às imposições
avolumam-se. sociais. Ela nasce da necessidade de existir,
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, não da beleza.
galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, Perceba que no verso final vemos que a flor
o nojo e o ódio. nasce do ódio do poeta, mas é capaz de o
transcender: ela fura até mesmo o ódio. O
mundo ameaça se convulsionar a partir a arte.

Atenção: a referência a “galinhas” na última


estrofe é ao movimento integralista.

Novos Poemas (1948)

Um livro curto, marcado pelas convulsões que se seguiram à Segunda Guerra Mundial e
pela noção de que o mundo poderia ser destruído. O livro se volta a temas tradicionais da lírica,
com bastante espaço para a discussão amorosa. Novos Poemas não é seu livro mais expressivo.

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É formado por uma pequena reunião de poemas inéditos, que introduzia a reedição de livros
anteriores, assim como José. Dos doze poemas, o mais famoso é Canção amiga

Eu preparo uma canção


em que minha mãe se reconheça, Nesse poema, Drummond evidencia seu
todas as mães se reconheçam, desejo de criar uma poesia capaz de
e que fale como dois olhos. despertar a consciência nas pessoas,
principalmente nos adultos. Ao mesmo
Caminho por uma rua tempo, essa canção deve ser doce o
que passa em muitos países. suficiente para fazer adormecer as crianças. É
Se não me veem, eu vejo ao mesmo tempo uma canção de ninar.
e saúdo velhos amigos.
O “amiga” do título não se refere
necessariamente a alguma amizade pontual,
Eu distribuo um segredo
mas à sensação de acolhimento que
como quem ama ou sorri.
Drummond deseja que ela possa passar. Há
No jeito mais natural
aqui uma metodologia proposta: o despertar
dois carinhos se procuram.
da consciência entre os homens não se dá
pela violência, mas pela solidariedade, pela
Minha vida, nossas vidas
doçura.
formam um só diamante.
Aprendi novas palavras A referência à própria mãe reforça a
e tornei outras mais belas. necessidade de comunicação e união entre os
homens a partir de agora: mesmo aqueles
Eu preparo uma canção que nascem em Itabira, que são descritos por
que faça acordar os homens ele em “Confidência do Itabirano” como
e adormecer as crianças. donos de “alheamento do que na vida é
porosidade e comunicação”, devem se unir
nessa causa.

Claro Enigma (1951)

Claro Enigma é publicado em 1951. O nazismo não se consolidou como regime mundial,
mas tampouco uma vida social mais plena surgiu de todos os eventos que abalaram esse quartel
do século XX. As traições de Stalin ao ideário socialista durante a Segunda Guerra e o acordo
feito entre o representante do comunismo e as grandes potência deixaram claro que não havia
muita esperança na saída coletiva declamada por Carlos Drummond nos livros anteriores.

O livro parece registrar esse ressentimento. O poeta, mais pessimista, encarando a


realidade como um enigma, reflete sobre a condição humana e sobre a poesia. A esperanço
no “nós” dá lugar ao fatalismo de uma possível dissolução de sentido a qual o poeta resiste.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 15


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

No que diz respeito à forma, o poeta resgata a metrificação, vale-se inclusive escreve 8
sonetos nesse livro poético. Não é somente na forma que se percebe a influência clássica. Em
“A máquina do mundo”, o poeta dialoga com Os lusíadas de Camões.

O poema oficina irritada exemplifica a sutil mudança que revelou um Carlos Drummond
de Andrade mais realista, menos esperançoso.

Eu quero compor um soneto duro O poema revelar o retorno à forma


tradicional, o soneto (forma clássica usada
como poeta algum ousara escrever. por Camões e que consiste na organização do
tema a partir de 2 quartetos e dois tercetos),
Eu quero pintar um soneto escuro,
de métrica e rima regular.
seco, abafado, difícil de ler.
O poeta deixa claro seu ideal de ofício: fazer
um poema duro, um poema difícil, que deva
traduzir tanto essa realidade particular, mas
Quero que meu soneto, no futuro, também a realidade da poesia como um todo.

não desperte em ninguém nenhum prazer. Afinal, o que é ser poeta no século XX, em
plena modernidade? Talvez,
E que, no seu maligno ar imaturo, conscientemente, o poeta quisesse apenas
exprimir sua decepção com sua época, mas
ao mesmo tempo saiba ser, não ser.
na verdade o tipo de texto que ele produz,
adequa-se à grande Literatura que traz à tona
as questões mais importantes da Literatura no
Esse meu verbo antipático e impuro século XX.

há de pungir, há de fazer sofrer, A poesia entra na tradição e poesias


metalinguísticas de Drummond, que
tendão de Vênus sob o pedicuro.
frequentemente produz obras falando sobre o
próprio oficio de escrever.

Ninguém o lembrará: tiro no muro, O poeta deseja um poema que sobreviva no


futuro, trazendo conteúdo tanto na sua forma
cão mijando no caos, enquanto Arcturo, quanto em seu conteúdo. Não há aqui
gratuidade na escolha dos termos.
claro enigma, se deixa surpreender.
Atenção: referência à história (mitológica) de
Arcturo, que foi morto por pastores a quem
ele deu vinho.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 16


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Fazendeiro do Ar (1954)

Nessa obra, Drummond investe nos temas metafísicos volta seu olhar para o tema da
brevidade da vida. Ainda assim ele não deixa de lado os afetos e o mundo sensível. Porém, o
poeta deixa de lado a aproximação com a lírica clássica nesse momento – diferente das obras
anteriores. Um dos principais poemas dessa obra é O enterrado vivo.

É sempre no passado aquele orgasmo,


é sempre no presente aquele duplo, A principal característica do poema é a
é sempre no futuro aquele pânico. repetição. Todos os versos do poema se
iniciam da mesma maneira, denotando a ideia
É sempre no meu peito aquela garra. de um cotidiano moroso, que reflete a
É sempre no meu tédio aquele aceno. imobilidade do homem no mundo.
É sempre no meu sono aquela guerra.
Os três primeiros versos estabelecem uma
relação entre passado, presente e futuro,
É sempre no meu trato o amplo distrato.
sendo que o presente será mais aprofundado
Sempre na minha firma a antiga fúria.
ao longo do texto.
Sempre no mesmo engano outro retrato.
Há também uma sensação de angústia e
É sempre nos meus pulos o limite. sofrimento com essa repetição da vida. Isso
É sempre nos meus lábios a estampilha. pode explicar o título do poema. O enterrado
É sempre no meu não aquele trauma. vivo é alguém que está vivo, mas imóvel,
soterrado pelo mundo, como um morto que
Sempre no meu amor a noite rompe. já foi enterrado. Esse mundo já não é
Sempre dentro de mim meu inimigo. desfrutado plenamente por ele, tampouco ele
E sempre no meu sempre a mesma ausência. sente que vive de maneira plena.

Viola de Bolso (1955)

O livro foi publicado com o patrocínio do Serviço de Documentação do Ministério da


Edução e Saúde, órgão em que Drummond trabalhava, em 1952. A versão mais conhecida,
porém, foi a publicada em 1942, contendo mais páginas e republicando poemas de livros
anteriores. A obra conta com 22 poemas, mas não se tornou muito conhecida.

A Vida Passada a Limpo (1959)

Esse livro fez parte primeiro do livro Poemas, do mesmo ano, uma obra que reunia
praticamente tudo o que Drummond publicara até então. Os poemas de A vida passada a limpo

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 17


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

tratam de temas menos dedicados ao presente e mais dedicados a questões humanas


essenciais. Principalmente aparecem aqui poemas que questionam o amor, a linguagem, a
memória e os afetos.

Alguns dos principais poemas desse livro integram a Antologia Poética de Drummond:
“Especulações em torno da palavra homem”, “Prece de mineiro no Rio” e “A um hotel em
demolição”.

Lição de Coisas (1962)

Lição de coisas foi escrito no mesmo ano em que o Drummond organizou sua Antologia
poética. No livro inédito, assim como na antologia, o autor fala sobre seus grandes temas, como
o passado, a infância em Minas Gerais, a brevidade da vida e a observação do tempo. Há
também diálogo com o Concretismo nessa obra. Um dos poemas mais conhecidos desse livro
é amar-amaro:

Por que amou por que a!mou


se sabia Percebe-se inicialmente a aproximação com a
proibido passear sentimentos poesia concreta pelo uso de uma organização
ternos ou sopɐɹǝdsǝsǝp visual do poema. Letras capitais, palavras de
nesse museu do pardo indiferente cabeça para baixo, escritas sem espaçamento
me diga: mas por que ou com espaçamentos estilísticos (como no
amar sofrer talvez como se morre terceiro verso da primeira estrofe) indicam
de varíola voluntária vágula ev essa aproximação.
idente?
Há, além disso, o uso do recurso da
paronomásia: usar palavras de sons
ah PORQUEAMOU
semelhantes, mas significados diferentes.
e se queimou
todo por dentro por fora nos cantos ecos O poeta também cria neologismos,
lúgubres de você mesm(o,a) principalmente fruto da união de palavras ou
irm(ã,o) retrato espetáculo por que amou? de uma sonoridade específica.
se era para
ou era por A temática do amor é permeada por traços de
como se entretanto todavia negatividade. O amor não realizado ou
toda via mas toda vida malsucedido é o que norteia o poema. A
é indignação do achado e aguda sensação que temos do eu lírico – que tenta
espostejação aconselhar os outros – é que ele crê que o
da carne do conhecimento, ora veja amor não compensa ou que sempre se
machuca quando se apaixona. Não parece
permita cavalheir(o,a) possível para ele a realização amorosa. Ele
amig(o,a) me releve

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 18


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

este malestar compara o amor à morte, dizendo que entre


cantarino escarninho piedoso ambos, quem não consola nunca é o amor.
este querer consolar sem muita convicção
o que é inconsolável de ofício Já no título vemos a brincadeira com as
a morte é esconsolável consolatrix palavras que indicará o sentimento geral do
consoadíssima poema: o verbo “amar” é associado ao
a vida também adjetivo “amaro”, um sinônimo de “amargo”.
tudo também
mas o amor car(o,a) colega este não consola
nunca de núncaras.

Boitempo (1968)

O principal caráter dessa obra é memorialístico. O título une as palavras boi e tempo
justamente pra fazer referência á sua infância na pequena cidade de Itabira em Minas Gerais.
Ainda que seja mencionada como uma das obras da Antologia, não há poemas dessa obra na
edição recomendada.

4 - Antologia poética
Antes de entrarmos na análise da obra em si precisamos pensar sobre seu título. Afinal, o
que significa uma antologia?

Etimologicamente, a palavra antologia vem do grego anthologias. Seu significado é algo


como “coleção de flores”. O termo era inicialmente ligado à botânica. Do ponto de vista literário
uma antologia é um conjunto – ou coleção – formado a partir de diversas obras. Essas obras
podem ser de uma mesma temática, autoria ou período.

A antologia é formada a partir da coletânea de textos que podem ser em prosa ou em


verso, normalmente em volume único. Ainda que tenhamos antologias de contos e crônicas, é
na poesia que a antologia encontrou maior espaço.

Normalmente os poemas são selecionados pelo próprio autor, seguindo um critério


frequentemente arbitrário e subjetivo. Drummond fora um dos grandes precursores de uma
antologia poética de único autor.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 19


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Estrutura

Tempo: A obra foi lançada em 1962, mas reunia poemas escritos e publicados desde 1928,
tanto em revistas quanto em livros.

Na Antologia, o poeta procura rever seus quase 30 anos de carreira e 70 de vida.

Temas: A obra traz questões comuns à obra de Drummond.

• O indivíduo gauche, fragmentado, que não se adapta ao mundo.

• O memorialismo e a nostalgia do passado.

• A melancolia e desesperança diante do mundo.

• As dificuldades da realização amorosa.

• A metalinguagem, pensando no fazer poético e no papel da poesia no mundo.

• As questões sociais e o modo como o homem se relaciona com o outro, com


solidariedade.

Divisão: O livro se divide em 9 partes. O próprio Drummond coloca adjetivos ao lado das
partes.

• um eu todo retorcido (O indivíduo)

• uma província: esta (A terra natal)

• a família que me dei (A família)

• cantar de amigos (Amigos)

• na praça de convites (O choque social)

• amar-amaro (O conhecimento amoroso)

• poesia contemplada (A própria poesia)

• uma, duas argolinhas (Exercícios lúdicos)

• tentativa de exploração e de interpretação do estar-no-mundo (Uma visão, ou tentativa


de, da existência)

Vamos ver a divisão das partes e os poemas fundamentais de cada uma delas.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 20


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

um eu todo retorcido

Características dos poemas

• abertura do livro com aspecto autobiográfico

• eu lírico fragmentado, deslocado do mundo

• sentimento de melancolia e solidão

• incomunicabilidade entre os homens

Principais poemas

• Poema de sete faces

• Soneto da Perdida esperança

• José

• A mao suja

• A flor e nausea

• Consolo na praia

• Versos à boca da noite

• O enterrado vivo

Veja um exemplo de exercício a partir de um poema dessa parte.

(Estratégia Vestibulares – 2020)


Poema de Sete Faces

Quando nasci, um anjo torto


desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens


que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 21


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

O bonde passa cheio de pernas:


pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus,
pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.
(ANDRADE, C. D. Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992.)

A obra de Drummond, modernista brasileiro, é conhecida como uma das que mais se
aproxima dos pressupostos modernistas, dada a variedade de forma e temas. No poema
transcrito, a temática
a) aponta para o problema étnico encontrado na sociedade, ao descrever as cores das
pernas.
b) indica claramente a forma como as pessoas se relacionam na modernidade, como
objetos.
c) apresenta temática de grande importância para o momento entreguerras na sociedade.
d) descreve, com juízos de valor, a vida cotidiana das pessoas mais pobres e marginalizadas.
e) aponta para o cotidiano de vida das pessoas, com presença de caracterização do eu-lírico.
Comentários:
Alternativa A: incorreta. A referência à cor das pernas serve, diferente da polemização de
um problema racial, para a caracterização mais ampla dos que compõem o poema. É como
se Drummond construísse a ideia de que todos levam uma vida cotidiana como essa, sem
que sejam discutidas questões mais profundas.
Alternativa B: incorreta. O candidato, a partir da leitura da última estrofe, pode pensar que
há realmente uma crítica às relações sociais modernas, fundamentada, inclusive segundo
Drummond, como uma relação de objetificação, com o que a sociologia chama de reificação
do ser humano, uma teoria em que entende-se que o homem é um objeto utilizado pela
sociedade e pelos outros, esvaziado de sua relação humana real. No texto, por mais que essa
seja uma possibilidade que extrapola o texto, temos o cotidiano como principal indicação de
descrição.
Alternativa C: incorreta. O poema é atemporal, e, por mais que saibamos que Drummond
foi dos principais autores a discutir, em nosso Modernismo, o período entre guerras, bem
como o período da Segunda Guerra, no poema, o autor apresenta uma relação de descrição
do cotidiano das pessoas, outra temática muito importante para Drummond e para os
autores dessa estética
Alternativa D: incorreta. No trecho, realmente temos a descrição, ainda que parcial, do
cotidiano das pessoas. Contudo, não podemos perceber uma relação de denúncia da
situação social dessas pessoas, dado que não temos referências claras a esse

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 22


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

posicionamento. Não há nenhuma relação que apresente a classe social das pessoas
envolvidas no poema.
Alternativa E: Correta. O começo do poema aponta para a forma como o eu-lírico,
identificado, inclusive, como sendo o autor, pensa a vida. Ser gauche, esquerda em francês,
é ser diferente, não aceitar as situações de forma normalizada. Além disso, percebe-se uma
apresentação de momentos corriqueiros e cotidianos da vida das pessoas, marca do
Modernismo como estética literária.
Gabarito: E

Uma província: esta

Características dos poemas

• Poemas sobre sua terra natal.

• Nostalgia que se afasta do saudosismo.

• O espaço da memória também é subjetivo, projeta um passado a partir do presente.

Principais poemas

• Cidadezinha qualquer

• Confidência do itabirano

• Canção da moça fantasma de Belo Horizonte

• Prece do mineiro no Rio

Veja um exemplo de exercício a partir de um poema dessa parte.

(FAG - 2016)
Alguns anos vivi em Itabira.
Principalmente nasci em Itabira.
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.
Noventa por cento de ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 23


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,


vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem horizontes.

E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,


é doce herança itabirana.

De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:


esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil,
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;
este orgulho, esta cabeça baixa...

Tive ouro, tive gado, tive fazendas.


Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói!

Carlos Drummond de Andrade é um dos expoentes do movimento modernista brasileiro.


Com seus poemas, penetrou fundo na alma do Brasil e trabalhou poeticamente as
inquietudes e os dilemas humanos. Sua poesia é feita de uma relação tensa entre o universal
e o particular, como se percebe claramente na construção do poema Confidência do
Itabirano. Tendo em vista os procedimentos de construção do texto literário e as concepções
artísticas modernistas, conclui-se que o poema acima:
A) representa a fase heroica do modernismo, devido ao tom contestatório e a utilização de
expressões e usos linguísticos típicos da oralidade.
B) evidencia uma tensão histórica entre o “eu” e a sua comunidade, por intermédio de
imagens que representam a forma como a sociedade e o mundo colaboram para a
constituição do indivíduo.
C) apresenta uma característica importante do gênero lírico, que é a apresentação objetiva
de fatos e dados históricos.
D) critica, por meio de um discurso irônico, a posição de inutilidade do poeta e da poesia em
comparação com as prendas resgatadas de Itabira.
E) apresenta influências românticas, uma vez que trata da individualidade, da saudade da
infância e do amor pela terra natal, por meio de recursos retóricos pomposos.

Comentários:

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 24


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Alternativa A: incorreta. Esse poema representa a segunda geração modernista e,


especificamente nesse caso, não vemos o tom social ou contestatório, mas lírico e
memorialista.
Alternativa B: correta. Drummond relata traços de sua cidade natal e como essa vivência
ajudou a constituir quem ele é. Isso se evidencia na comparação que ele faz de si com o
ferro, principal metal extraído de sua cidade.
Alternativa C: incorreta. A memória é vista de maneira subjetiva, não objetiva.
Alternativa D: incorreta. O poeta não hierarquiza aqui a poesia com outros elementos ou
referenciais de sua vida na cidade de Itabira.
Alternativa E: incorreta. A linguagem é simples, informal, próxima da oralidade, não
pomposa.
Gabarito: B

A família que me dei

Características dos poemas

• Análise da memória.

• Saudade do passado a partir do olhar presente.

• Fragmentação do sujeito

• Desejo de repensar o passado e seus significados.

Principais poemas

• Retrato de família

• Os bens e o sangue

• Viagem na família

• Carta

Cantar de amigos

Características dos poemas

• Amizades no plano poético

• Não são necessariamente pessoas que se conheciam na vida.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 25


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Principais poemas

• Ode no cinquentenário do poeta brasileiro

• Mário de Andrade desce aos infernos

• Canto ao homem do povo Charlie Chaplin

Veja um exemplo de exercício a partir de um poema dessa parte.

(Albert Einstein - 2016)


Ode no Cinquentenário do Poeta Brasileiro
(...)
Certamente não sabias
que nos fazes sofrer.
É difícil de explicar
esse sofrimento seco (...)
Não é o canto da andorinha, debruçada nos telhados da Lapa,
anunciando que tua vida passou à toa, à toa.
Não é o médico mandando exclusivamente tocar um tango
argentino,
diante da escavação no pulmão esquerdo e do pulmão direito
infiltrado.
Não são os carvoeirinhos raquíticos voltando encarapitados nos
burros velhos.
Não são os mortos do Recife dormindo profundamente na noite.
Nem é tua vida, nem a vida do major veterano da guerra do
Paraguai,
a de Bentinho Jararaca
ou a de Christina Georgina Rossetti:
és tu mesmo, é tua poesia,
tua pungente, inefável poesia,
ferindo as almas, sob a aparência balsâmica,
queimando as almas, fogo celeste, ao visitá-las;
é o fenômeno poético, de que te constituíste o misterioso
portador
e que vem trazer-nos na aurora o sopro quente dos mundos,

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 26


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

das amadas exuberantes e das situações exemplares que não


suspeitávamos.

O trecho acima integra o poema “Ode no Cinquentenário do Poeta Brasileiro”, da obra


Sentimento do Mundo de Carlos Drummond de Andrade. Dele NÃO É CORRETO afirmar que
a) utiliza construção que se faz por um jogo antitético consubstanciado por significativo uso
de anáforas.
b)indicia a figura do poeta Manuel Bandeira, objeto da Ode (homenagem), pelas citações de
expressivos poemas que conformam seu universo estético.
c) revela que o que importa não são os poemas nas particularidades de seus temas, mas o
fenômeno poético mesmo em sua essência e que faz do poeta seu misterioso portador.
d) apresenta uma quebra do ritmo poético motivada pelo uso reiterado do gerúndio e pela
ausência de correlação sintática entre as orações que se mostram propositalmente
incompletas.
Comentários:
Alternativa A: correta. Há uma repetição no início dos versos, caracterizando a anáfora.
Alternativa B: correta. Ainda que não seja dito o nome, há a referência a vários poemas
muito conhecidos de Manuel Bandeira, como Profundamente ou Pneumotórax.
Alternativa C: correta. As negativas antes das referências a poemas de Manuel Bandeira
sustentam essa afirmação.
Alternativa D: incorreta. O uso repetido de gerúndios também dá ritmo aos versos. Além
disso, os versos iniciados pelas negativas fazem referência a poemas de Manuel Bandeira,
homenageado nessa obra, logo, não é uma incompletude, mas uma intertextualidade.
Gabarito: D

Na praça de convites

Características dos poemas

• Questionamento sobre a atividade poética no mundo.

• Jogos de linguagem

• A poesia entendida como uma arte da técnica.

Principais poemas

• Sentimento do mundo

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 27


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

• Lembrança do mundo antigo

• Elegia 1938

• Mãos dadas

• O elefante

• Morte do leiteiro

• Os ombros suportam o mundo

• Anúncio da rosa

• Canção amiga

Veja um exemplo de exercício a partir de um poema dessa parte.

(Estratégia Militares -2020)


Os Ombros Suportam o Mundo
Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.
Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.
Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 28


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Chegou um tempo em que não adianta morrer.


Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.
Carlos Drummond de Andrade, Poesia e Prosa, em um volume. 7ª ed. –
Aparecida, Editora Nova Aguilar, 1992., pp. 67/68.

Entre as afirmações abaixo, pode-se depreender que o poema acima pode se classificar na
fase
a) eu maior que o mundo, com consciência por parte do eu lírico, porém, distanciamento
social, bem como descaso e indiferença com a realidade.
b) social, em que o eu lírico manifesta interesse pelo seu tempo e problemas cotidianos,
buscando solidariedade diante das frustrações humanas.
c) gauche, do francês, direito, uma fase na vida do modernista Carlos Drummond de Andrade
que ele se envolveu na política.
d) eu menor que o mundo, quando o eu lírico adota uma visão pessimista e sabe que nada
pode fazer contra a força maior da sociedade.
e) eu igual ao mundo, em que o eu lírico encontra-se prostrado e resignado e desiste de
tentar convencer por meio do tom crítico.
Comentários
Questão de interpretação de texto literário/conhecimento de autor e obra do cânone.
Alternativa A: incorreta. Não é descaso tampouco indiferença. Ele revela profunda
preocupação social, falando de um tempo em que se sofria tanto que os homens não sabiam
mais como chorar; não havia mais crença. A vida era uma necessidade pura, imediata.
Alternativa B: correta – gabarito. Por meio do conectivo de adversidade “mas”, nos versos
“mas na sombra teus olhos resplandecem enormes. /És todo certeza, já não sabes sofrer”,
o eu lírico demonstra que não está representando “só um lado da moeda”, só o pessimismo.
É preciso retomar a crença na vida como direito humano universal para suportar os
sofrimentos imediatos. A vida é maior do que tudo; ela superará tudo.
Alternativa C: incorreta. É contrário: gauche do francês significa errado, torto, esquerdo.
Alternativa D: incorreta. Cuidado: embora retrate muita dor e sofrimento, a visão de mundo
final do poema não pessimista.
Alternativa E: incorreta. Não é resignado e o tom do poema é extremamente crítico.
Gabarito: B.

amar-amaro

Características dos poemas

• Desescanto amoroso

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 29


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

• Ideia da impossibilidade da realização amorosa

• Olhar racional, não idealizado sobre o amor

• Angústia que por vezes cai em um lirismo quase trágico

Principais poemas

• O amor bate na aorta

• Quadrilha

• Não se mate

• O mito

• Caso do vestido

• Escada

• Amar

• Amar-amaro

Veja um exemplo de exercício a partir de um poema dessa parte.

(UNIT - 2015)
João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Quadrilha. Alguma Poesia. Disponível em: <
http://vestibular.uol.com.br/simulado/poli8-1ve.jhtm >. Acesso em: 3 nov. 2014.

Os versos de Carlos Drummond de Andrade evidenciam um jogo de palavras que revelam


a)a desconstrução do conceito romântico de amor, que, no cotidiano, não funciona.
b) uma crítica à continuidade de um comportamento amoroso não correspondido.
c) um conceito de amor transgressor e alternativo, que é rejeitado socialmente.
d) uma ironia quanto às escolhas amorosas, que são retribuídas e vivenciadas.
e) uma aversão à postura de pessoas que não sabem amar e rejeitam o outro.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 30


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Comentários:
Alternativa A: correta. Ao mostrar que o amor nem sempre é correspondido ou que o
cotidiano e as coisas práticas, materiais, se interpõe ao sentimento, Drummond indica que
o conceito de amor romântico é uma idealização, que não ocorre na vida real.
Alternativa B: incorreta. Não há crítica, apenas identificação de um andamento amoroso
comum.
Alternativa C: incorreta. Não se propõe aqui um relacionamento poliamoroso. Aponta-se
para a frequência com que o amor não é correspondido.
Alternativa D: incorreta. A ironia aqui não é às escolhas, mas às idealizações.
Alternativa E: incorreta. Não há aversão. O poeta fala de maneira distanciada, não revelando
seus sentimentos sobre aquelas pessoas.
Gabarito: A

Poesia contemplada

Características dos poemas

• A linguagem é o objetivo final.

• Poemas metalinguísticos.

Principais poemas

• O lutador

• Procura da poesia

• Oficina irritada

• Poema-orelha

Veja um exemplo de exercício a partir de um poema dessa parte.

(Estratégia Militares - 2020)


Leve em consideração o poema abaixo para responder à questão.

OFICINA IRRITADA
Eu quero compor um soneto duro
como poeta algum ousara escrever.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 31


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Eu quero pintar um soneto escuro,


seco, abafado, difícil de ler.

Quero que meu soneto, no futuro,


não desperte em ninguém nenhum prazer.
E que, no seu maligno ar imaturo,
ao mesmo tempo saiba ser, não ser.

Esse meu verbo antipático e impuro


há de pungir, há de fazer sofrer,
tendão de Vênus sob o pedicuro.

Ninguém o lembrará: tiro no muro,


cão mijando no caos, enquanto Arcturo,
claro enigma, se deixa surpreender.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Oficina irritada. In: Claro Enigma.
São Paulo: Companhia das Letras, 2012 (p. 38).

A partir do texto acima, é correto afirmar que


a) Carlos Drummond de Andrade é da mesma geração que Mário Quintana, tendo sido
ambos tradutores.
b) a poesia da segunda geração modernista usou, entre outros elementos, resgate às formas
clássicas e metalinguagem.
c) no título do poema, emprega-se o recurso expressivo da sinestesia, ao identificar o
sentimento da irritação.
d) Carlos Drummond de Andrade lembra Machado de Assis e Clarice Lispector no
autorrebaixamento de sua obra.
e) a chave de ouro cunha expressão responsável por nomear o livro, que significa quebra-
cabeça fácil de se entender.
Comentários
Questão de interpretação de texto literário; conhecimento do movimento literário e
conhecimento de autores e obras do cânone.
Alternativa A: incorreta. Atenção: essa afirmação é verdade, mas não pode ser inferida
apenas a partir do texto. Inclusive, ambos participaram de um projeto de tradução de Em
busca do tempo perdido de Marcel Proust: Mário Quintana traduziu os volumes de 1 a 4 e
Carlos Drummond de Andrade o volume 6.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 32


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Alternativa B: correta – gabarito. Formas clássicas como o soneto, e até mesmo a mitologia
(Vênus é Afrodite, deusa do amor, e Arcturo é a estrela mais brilhante da Constelação de
Boieiro), e metalinguagem no procedimento de refletir sobre a própria feitura do poema.
Alternativa C: incorreta. Sinestesia não, mas sim personificação: atribuição de características
humanas (irritação) a seres inanimados (oficina).
Alternativa D: incorreta. Cuidado: essa afirmação é verdade, mas não pode ser inferida
apenas a partir do texto. O eu lírico de Drummond afirma o seguinte: “Quero que meu
soneto, no futuro, /não desperte em ninguém nenhum prazer.” Em várias ocasiões, o
narrador irônico machadiano fala para o leitor fechar o livro se não estiver gostando, e o
narrador Rodrigo S. M de A hora da estrela trata sua criatura como “esta coisa aí”.
Alternativa E: incorreta. Pelo contrário: claro enigma é contraditório; é como se fosse uma
esfinge, difícil de ser decifrada.
Gabarito: B.

uma, duas argolinhas

Características dos poemas

• Brincadeira com a linguagem

• Forma poética trabalhada de maneira estética

• Poemas que se aproximam de ideias concretas

• Obras que demandam atenção à posição e escolha das palavras

Principais poemas

• Áporo

• Caso pluvioso

Veja um exemplo de exercício a partir de um poema dessa parte.

(UFAM – 2015)
Leia o poema “Áporo”, de Carlos Drummond de Andrade:
Um inseto cava
cava sem alarme
perfurando a terra
sem achar escape.

Que fazer, exausto,

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 33


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

em país bloqueado,
enlace de noite
raiz e minério?

Eis que o labirinto


(oh razão, mistério)
presto se desata:

em verde, sozinha,
anteuclidiana,
uma orquídea forma-se.

Sobre o poema, afirma-se:


I. Por apresentar quatorze versos do mesmo tamanho (redondilhas menores), em dois
quartetos e dois tercetos, pode ser considerado um soneto.
II. Apresenta, na primeira estrofe, uma ideia (a tese), à qual se opõe um obstáculo na
segunda (a antítese); esse dilema se soluciona no final (a síntese).
III. O termo “antieuclidiana”, pelo contexto em que está situado, se refere a Euclides de
Alexandria, considerado o Pai da Geometria.
IV. Considerando-se o contexto brasileiro da época em que foi escrito, que era a ditadura de
Vargas, o conteúdo do poema expressa a luta de um militante político pela liberdade.
V. A palavra “Áporo” tem pelo menos três significados: inseto, problema de difícil solução e
orquídea

Assinale a alternativa correta:


a) Somente as afirmativas I, III e IV estão corretas
b) Somente as afirmativas I, IV e V estão corretas
c) Somente as afirmativas II e III estão corretas
d) Somente as afirmativas II e V estão corretas
e) Todas as afirmativas estão corretas
Comentários:
A afirmativa I está correta. De fato, a analise da forma poética é essa que foi descrita: 5
silabas poéticas e a estrutura do soneto.
A afirmativa II está correta. O que vemos aqui nesse poema é um inseto que tenta cavar a
terra mas não consegue encontrar saída. Ele se encontra em um labirinto, bloqueado. Ele
soluciona seu problema se transformando em uma flor e brotando, rasgando a terra.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 34


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

A afirmativa III está correta. É uma referência a Euclides. Indica uma ideia de que esse inseto
desafiou a lógica ao transmutar-se.
A afirmativa IV está correta. Há uma referência a Vargas e ao autoritarismo do Estado Novo.
Alguns críticos defendem que essa obra é uma referência à libertação de Luís Carlos Prestes.
A afirmativa V está correta. Há três significados possíveis para a palavra:
1 – Situação sem saída, problema difícil de ser resolvido.
2 – Inseto cavador.
3 – Planta da família das orquídeas.
Aqui no poema temos uma situação em que um áporo (inseto), vendo-se diante de um áporo
(problema de difícil solução), transforma-se num áporo (flor).
Gabarito: E

tentativa de exploração e de interpretação do estar-no-mundo

Características dos poemas

• Tentativas de entender a “máquina do mundo” em sua complexidade

• Os ideais e esperanças que nascem da arte poética encontram obstáculos na


materialidade do mundo.

• Questionamentos sobre o mundo que parece destruído.

Principais poemas

• No meio do caminho

• Cantiga de enganar

• A máquina do mundo

• Composição

• O arco

• Especulações em torno da palavra homem

• A um hotel em demolição

• Resíduo

• Elegia

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 35


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Veja um exemplo de exercício a partir de um poema dessa parte.

(UFGD – 2018)
Leia o trecho a seguir de A máquina do mundo, poema de Carlos Drummond de Andrade,
correspondente à quarta, quinta e sexta estrofes, e assinale a alternativa correta.

[...] a máquina do mundo se entreabriu


para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.

Abriu-se majestosa e circunspecta,


sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável

pelas pupilas gastas na inspeção


contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar [...]

a) As expressões “pupilas gastas”, “mente exausta de mentar” e “quem” se referem à


máquina do mundo, descrita pelo eu que fala (possivelmente o poeta), referido no poema
pela expressão “impuro”.
b) O poema espelha aspectos da forma modernista inerente à obra do poeta Drummond,
com estrofes e versos irregulares, sem rimas, livres e brancos.
c) A expressão “se entreabriu” dá a medida do quanto a máquina do mundo se revela ao eu
que fala e que a viu, isto é, de modo tímido, sem se apresentar completamente, o que pode
ser constatado ao longo do poema.
d) “Se entreabriu”, “abriu-se” e “sem emitir” são expressões que contêm verbos de ação,
que estruturam o gênero do poema que, apesar de ser uma “tentativa de explicação do estar
no mundo” feita pelo poeta, é mais narrativo que lírico.
e) A escolha do título do poema, “A máquina do mundo”, e das estrofes estruturadas com
três versos é procedimento de intertextualidade que remete o poema à tradição lírica
ocidental, relacionando-o à prosa de Camões e Dante Alighieri.
Comentários:
Alternativa A: incorreta. “Quem” não se refere à maquina do mundo, mas ao poeta ou à
pessoa que viu a máquina.
Alternativa B: incorreta. Esses aspectos não são características modernistas, ainda que o
poema seja muito regular. O modernismo é em sua maioria caracterizado pela
experimentação formal.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 36


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Alternativa C: incorreta. Posteriormente o poeta afirma que ela “Abriu-se majestosa”, ou


seja, não é sempre tímido o modo como ela se revela.
Alternativa D: correta. O eu lírico relata uma situação narrativa: o momento em que a
máquina do mundo abriu-se para aquele que a observava.
Alternativa E: incorreta. A relação aqui é com a poesia de Camões e Dante, não com a prosa.
Gabarito: D

4 – Exercícios

4.1 – Exercícios
1. (ITA/2005)

O livro “Claro Enigma“, uma das obras mais importantes de Carlos Drummond de Andrade,
foi editado em 1951. Desse livro consta o poema a seguir.
Memória
Amar o perdido
deixa confundido
este coração.
Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.
As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão.
Mas as coisas findas,
muito mais que lindas,
essas ficarão.
(ANDRADE, Carlos Drummond de. “Claro Enigma”, Rio de Janeiro: Record, 1991.)

Sobre esse texto, é correto dizer que


a) a passagem do tempo acaba por apagar da memória praticamente todas as lembranças
humanas; quase nada permanece.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 37


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

b) a memória de cada pessoa é marcada exclusivamente por aqueles fatos de grande


impacto emocional; tudo o mais se perde.
c) a passagem do tempo apaga muitas coisas, mas a memória afetiva registra as coisas que
emocionalmente têm importância; essas permanecem.
d) a passagem do tempo atinge as lembranças humanas da mesma forma que envelhece e
destrói o mundo material; nada permanece.
e) o homem não tem alternativa contra a passagem do tempo, pois o tempo apaga tudo; a
memória nada pode; tudo se perde.

Texto para as próximas questões:

O elefante e nuvens, alusões à procura de sítios,


a um mundo mais poético segredos, episódios
Fabrico um elefante onde o amor reagrupa não contados em livro,
de meus poucos recursos. as formas naturais. de que apenas o vento,
Um tanto de madeira as folhas, a formiga
tirado a velhos móveis Vai o meu elefante reconhecem o talhe,
talvez lhe dê apoio. pela rua povoada, mas que os homens
E o encho de algodão, mas não o querem ver ignoram,
de paina, de doçura. nem mesmo para rir pois só ousam mostrar-se
A cola vai fixar da cauda que ameaça sob a paz das cortinas
suas orelhas pensas. deixá-lo ir sozinho. à pálpebra cerrada.
A tromba se enovela,
é a parte mais feliz É todo graça, embora E já tarde da noite
de sua arquitetura. as pernas não ajudem volta meu elefante,
e seu ventre balofo mas volta fatigado,
Mas há também as presas, se arrisque a desabar as patas vacilantes
dessa matéria pura ao mais leve empurrão. se desmancham no pó.
que não sei figurar. Mostra com elegância Ele não encontrou
Tão alva essa riqueza sua mínima vida, o de que carecia,
a espojar-se nos circos e não há cidade o de que carecemos,
sem perda ou corrupção. alma que se disponha eu e meu elefante,
E há por fim os olhos, a recolher em si em que amo disfarçar-me.
onde se deposita desse corpo sensível Exausto de pesquisa,
a parte do elefante a fugitiva imagem, caiu-lhe o vasto engenho
mais fluida e permanente, o passo desastrado como simples papel.
alheia a toda fraude. mas faminto e tocante. A cola se dissolve
Mas faminto de seres e todo o seu conteúdo
Eis o meu pobre elefante e situações patéticas, de perdão, de carícia,
pronto para sair de encontros ao luar de pluma, de algodão,
à procura de amigos no mais profundo oceano, jorra sobre o tapete,
num mundo enfastiado sob a raiz das árvores qual mito desmontado.
que já não crê em bichos ou no seio das conchas, Amanhã recomeço.
e duvida das coisas. de luzes que não cegam
Ei-lo, massa imponente e brilham através

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 38


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

e frágil, que se abana dos troncos mais espessos. ANDRADE, Carlos Drummond de. O
Elefante. 9ª ed. - São Paulo: Editora
e move lentamente Esse passo que vai Record, 1983.
a pele costurada sem esmagar as plantas
onde há flores de pano no campo de batalha,

2. (IME - 2019)

No poema, considerando o elefante fabricado artesanalmente como uma alegoria para falar
da arte, mandar o elefante à rua aponta para um desejo de
a) divulgação daquilo que até então era privado e íntimo.
b) invisibilidade da coisa criada.
c) anonimato e silenciamento, já que há nas ruas um burburinho incessante que acaba por
silenciar tudo o que nela transita.
d) fuga às responsabilidades do artista, pois o poeta sucumbe diante de sua inspiração.
e) banalização dos sentimentos que inspiraram o poeta a construir seu elefante.

3. (IME - 2019)

Considere os versos 19 a 23 do poema, transcritos abaixo:


“E há por fim os olhos,
onde se deposita
a parte do elefante
mais fluida e permanente,
alheia a toda fraude.”

Abaixo, você encontrará alguns ditados populares elencados. Qual destes ditados mais se
aproxima da ideia veiculada no verso 23, “alheia a toda fraude”?
a) “Fazer o bem sem olhar a quem.”
b) “O pior cego é aquele que não quer ver.”
c) “Perto dos olhos, longe do coração.”
d) “Em terra de cego, quem tem um olho é rei.”
e) “Os olhos são a janela da alma.”

4. (IME – 2019)

O poema O elefante
a) anuncia, por meio da alegoria do animal, que o tamanho dos problemas dos adultos é
inversamente proporcional ao tamanho do elefante, sendo, ao mesmo tempo, um poema
direcionado às crianças.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 39


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

b) estabelece uma relação criador/criatura e, metaforicamente, é possível falar de um


paralelo entre arte/artista: o conteúdo produzido pelo artista é causa e consequência, ao
mesmo tempo, do trabalho do poeta com as palavras.
c) desconecta o elefante (criação) de seu criador, retirando deste toda a sua capacidade
criativa.
d) mostra a criatura, o elefante, como algo definido e único: criá-lo é tão trabalhoso que não
há possibilidade de criar outros elefantes.
e) revela, metaforicamente, um descuido com o fazer poético ao descrever a deselegância
do elefante mal construído, que segue pelas ruas de modo desequilibrado.

5. (FUVEST – 2020)
Cantiga de enganar
(...)
O mundo não tem sentido.
O mundo e suas canções
de timbre mais comovido
estão calados, e a fala
que de uma para outra sala
ouvimos em certo instante
é silêncio que faz eco
e que volta a ser silêncio
no negrume circundante.
Silêncio: que quer dizer?
Que diz a boca do mundo?
Meu bem, o mundo é fechado,
se não for antes vazio.
O mundo é talvez: e é só.

Talvez nem seja talvez.


O mundo não vale a pena,
mas a pena não existe.
Meu bem, façamos de conta.
De sofrer e de olvidar,
de lembrar e de fruir,

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 40


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

de escolher nossas lembranças


e revertê-las, acaso
se lembrem demais em nós.
Façamos, meu bem, de conta
– mas a conta não existe –
que é tudo como se fosse,
ou que, se fora, não era.
(...)
Carlos Drummond de Andrade, Claro Enigma.

Em Claro Enigma, a ideia de engano surge sob a perspectiva do sujeito maduro, já afastado
das ilusões, como se lê no verso-síntese “Tu não me enganas, mundo, e não te engano a ti.”
(“Legado”). O excerto de “Cantiga de enganar” apresenta a relação do eu com o mundo
mediada
a) pela música, que ressoa em canções líricas.
b) pela cor, brilhante na claridade solar.
c) pela afirmação de valores sólidos.
d) pela memória, que corre fluida no tempo.
e) pelo despropósito de um faz-de-conta.

6. (USF - 2019)
Texto I
Cantiga de enganar.
O mundo não vale o mundo,
meu bem.
Eu plantei um pé-de-sono,
brotaram vinte roseiras.
Se me cortei nelas todas
e se todas se tingiram
de um vago sangue jorrado
ao capricho dos espinhos,
não foi culpa de ninguém.
O mundo,
meu bem,
não vale
a pena e a face serena
vale a face torturada.
[...]

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 41


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Andrade, Carlos Drummond de.


Claro enigma – 1.ed. – São Paulo:
Companhia da Letras, 2012. p. 35-7.
Texto II
Amar
Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados amar?
[...]

Amar solenemente as palmas do deserto,


o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,


distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medroso, paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa


amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.
Andrade, Carlos Drummond de.
Claro enigma – 1.ed. – São Paulo:
Companhia da Letras, 2012. p.43.

Os textos, em consonância com a leitura da obra na íntegra, e tendo por base os parâmetros
ideológicos de Claro enigma, nos permitem afirmar corretamente que
a) o texto 1 mostra a ironia de um eu lírico desencantado com a existência, ou com o que
sobrou dela, num diálogo com A máquina do mundo, enquanto o texto 2 evoca o amor como
elemento de conexão do homem com seu passado, como ocorre em A mesa.
b) o texto 1 retoma o tom introspectivo de poemas que reverberam a angústia do homem
na busca de um sentido para a vida, como em Perguntas em forma de cavalo marinho,
enquanto o texto 2 simplifica a existência ao condicioná-la ao amor, fonte máxima de prazer
e dor.
c) o texto 1 registra um eu lírico desencantado com a vida, repercutindo o tom melancólico
que se observa em textos como Dissolução; já o eu lírico do texto 2 fala da experiência
amorosa de caráter compulsório, pois considera o amor uma espécie de condenação
involuntária.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 42


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

d) o texto 1 reforça o tom niilista que acompanha os demais poemas do livro, como vemos
no poema Oficina Irritada, enquanto que o texto 2 retoma a necessidade de espalhar o amor
como única maneira de reagir à destruição imanente ao ser humano.
e) o texto 1 tem caráter social, pois promove uma reflexão acerca do estar em um mundo
desfigurado no período pós Segunda Guerra, enquanto que o texto 2 retoma a busca pelo
equilíbrio por meio do amor, individual e coletivo, como também se observa em Memória.

7. (FUVEST - 2018)
Os bens e o sangue
VIII
(...)
Ó filho pobre, e descorçoado*, e finito
ó inapto para as cavalhadas e os trabalhos brutais
com a faca, o formão, o couro... Ó tal como quiséramos
para tristeza nossa e consumação das eras,
para o fim de tudo que foi grande!
Ó desejado,
ó poeta de uma poesia que se furta e se expande
à maneira de um lago de pez** e resíduos letais...
És nosso fim natural e somos teu adubo,
tua explicação e tua mais singela virtude...
Pois carecia que um de nós nos recusasse
para melhor servir-nos. Face a face
te contemplamos, e é teu esse primeiro
e úmido beijo em nossa boca de barro e de sarro.
Carlos Drummond de Andrade, Claro enigma.

Glossário
*descorçoado: assim como “desacorçoado”, é uma variante de uso popular da palavra “desacoroçoado”, que
significa “desanimado”.
**pez: piche
Considere as seguintes afirmações:
I. Os familiares, que falam no poema, ironizam a condição frágil do poeta.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 43


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

II. O passado é uma maldição da qual o poeta, como revela o título do poema, não consegue
se desvencilhar.
III. O trecho “o fim de tudo que foi grande” remete à ruína das oligarquias, das quais
Drummond é tributário.
IV. A imagem de uma “poesia que se furta e se expande/à maneira de um lago de pez e
resíduos letais...” sintetiza o pessimismo dos poemas de Claro enigma.

Estão corretas:
a) I e II, apenas.
b) I, II e III, apenas.
c) II e IV, apenas.
d) I, III e IV, apenas.
e) I, II, III e IV.

8. (UFGD - 2018)

Leia o trecho a seguir de A máquina do mundo, poema de Carlos Drummond de Andrade,


correspondente à quarta, quinta e sexta estrofes, e assinale a alternativa correta.

[...] a máquina do mundo se entreabriu


para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.

Abriu-se majestosa e circunspecta,


sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável

pelas pupilas gastas na inspeção


contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar [...]

a) As expressões “pupilas gastas”, “mente exausta de mentar” e “quem” se referem à


máquina do mundo, descrita pelo eu que fala (possivelmente o poeta), referido no poema
pela expressão “impuro”.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 44


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

b) O poema espelha aspectos da forma modernista inerente à obra do poeta Drummond,


com estrofes e versos irregulares, sem rimas, livres e brancos.
c) A expressão “se entreabriu” dá a medida do quanto a máquina do mundo se revela ao eu
que fala e que a viu, isto é, de modo tímido, sem se apresentar completamente, o que pode
ser constatado ao longo do poema.
d) “Se entreabriu”, “abriu-se” e “sem emitir” são expressões que contêm verbos de ação,
que estruturam o gênero do poema que, apesar de ser uma “tentativa de explicação do estar
no mundo” feita pelo poeta, é mais narrativo que lírico.
e) A escolha do título do poema, “A máquina do mundo”, e das estrofes estruturadas com
três versos é procedimento de intertextualidade que remete o poema à tradição lírica
ocidental, relacionando-o à prosa de Camões e Dante Alighieri.

9. (UNIVESP - 2017)

Amar
Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer, amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,


sozinho, em rotação universal,
senão rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,


o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o cru,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e
uma ave de rapina.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 45


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Este o nosso destino: amor sem conta,


distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor,


e na secura nossa amar a água implícita,
e o beijo tácito, e a sede infinita.
– Carlos Drummond de Andrade, em “Claro enigma”. 1951.

A obra de Carlos Drummond de Andrade apresenta características que a filiam ao


movimento literário conhecido como Modernismo.
Assinale a alternativa que apresenta corretamente a descrição de algumas características
que podem ser notadas no poema Amar.
a) O chamado Mal do Século, marcado pelo pessimismo extremo com relação tanto ao
passado como ao futuro, tal qual apresentado na obra de Álvares de Azevedo,
contemporâneo de Drummond.
b) Os conflitos dualistas entre o terreno e o celestial, o homem (Antropocentrismo) e Deus
(Teocentrismo), o pecado e o perdão.
c) Aurea mediocritas, ou o equilíbrio de ouro, partindo do pressuposto de que a simplicidade
deveria ser o elemento preponderante, e o luxo e a ostentação deveriam ser tratados como
algo inconcebível e o pastoralismo.
d) A preocupação em apresentar uma realidade mais voltada a contemporaneidade de
acordo com a veracidade dos fatos, a partir de temas relacionados com a realidade, focados
nos aspectos sociais e cotidianos.
e) A presença de um simbolismo abstrato, tendo como pano de fundo os sentimentos e as
angústias do homem diante das transformações sociais da primeira metade do século XX.

10. (FACULDADE DE MEDICINA ALBERT EINSTEIN/2017)

Oficina Irritada
Eu quero compor um soneto duro
como poeta algum ousara escrever.
Eu quero pintar um soneto escuro,
seco, abafado, difícil de ler.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 46


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Quero que meu soneto, no futuro,


não desperte em ninguém nenhum prazer.
E que, no seu maligno ar imaturo,
ao mesmo tempo saiba ser, não ser.
Esse meu verbo antipático e impuro
há de pungir, há de fazer sofrer,
tendão de Vênus sob o pedicuro.
Ninguém o lembrará: tiro no muro,
cão mijando no caos, enquanto Arcturo,
claro enigma, se deixa surpreender.

O texto acima é de Claro Enigma, obra de Carlos Drummond de Andrade. De sua leitura se
pode depreender que
a) é um poema que segue rigorosamente os procedimentos de construção do soneto
clássico e tradicional, particularmente quanto à disposição e ao valor das rimas e ao uso da
chave de ouro como fecho conclusivo do texto.
b) é um metapoema e revela que o soneto que o autor deseja fazer é o mesmo que o leitor
está lendo, como a evidenciar na prática a junção do querer e do fazer.
c) utiliza-se de expressões como “tiro no muro” e “cão mijando no caos”, que, além de
provocar mau gosto e o estranhamento do leitor, rigorosamente, nada têm a ver com a
proposta de elaboração do poema.
d) faz da repetição anafórica e do paralelismo dos versos, um recurso de composição do
poema que o torna enfadonho e antiestético e revela um poeta de produção duvidosa e
menor.

Texto para as próximas questões


Confidência do Itabirano
Alguns anos vivi em Itabira.
Principalmente nasci em Itabira.
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.
Noventa por cento de ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.
A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 47


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem


[horizontes.
E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,
é doce herança itabirana.
De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil;
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;
este orgulho, esta cabeça baixa...
Tive ouro, tive gado, tive fazendas.
Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói!
Carlos Drummond de Andrade, Sentimento do mundo.

11. (2016/FUVEST/1ª fase)

No texto de Drummond, o eu lírico


a) considera sua origem itabirana como causadora de deficiências que ele almeja superar.
b) revela-se incapaz de efetivamente comunicar-se, dado o caráter férreo de sua gente.
c) ironiza a si mesmo e satiriza a rusticidade de seu passado semirrural mineiro.
d) dirige-se diretamente ao leitor, tornando assim patente o caráter confidencial do poema.
e) critica, em chave modernista, o bucolismo da poesia árcade mineira.

12. (2016/FUVEST/1ª fase)

Tendo em vista que o poema de Drummond contém referências a aspectos geográficos e


históricos determinados, considere as seguintes afirmações:

I. O poeta é “de ferro” na medida em que é nativo de região caracterizada pela existência
de importantes jazidas de minério de ferro, intensamente exploradas.
II. O poeta revela conceber sua identidade como tributária não só de uma geografia, mas
também de uma história, que é, igualmente, a da linhagem familiar a que pertence.
III. A ausência de mulheres de que fala o poeta refere-se à ampla predominância de
população masculina, na zona de mineração intensiva de que ele é originário.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 48


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Está correto o que se afirma em


a) I, somente.
b) III, somente.
c) I e II, somente.
d) II e III, somente.
e) I, II e III.

13. (2016/FUVEST/1ª fase)

Na última estrofe, a expressão que justifica o uso da conjunção sublinhada no verso “Mas
como dói!” é:
a) “Hoje”.
b) “funcionário público”.
c) “apenas”.
d) “fotografia”.
e) “parede”.

14. (UFPR/2016)

Leia, atentamente, o seguinte poema:


Amar
Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
e o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 49


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Amar solenemente as palmas do deserto,


o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero, um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.
Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.

O poema “Amar” integra a segunda parte, “Notícias Amorosas”, do livro Claro Enigma, de
Carlos Drummond de Andrade. Sobre esse poema, assinale a alternativa correta.
a) As indagações repetitivas, nas duas primeiras estrofes, reiteram a inviabilidade do amor
diante de um mundo em que tudo é perecível.
b) O poeta estabelece uma intensidade da manifestação do amor com relação ao belo
diferente da intensidade do amor dispensado ao grotesco.
c) Para acentuar a condição inexorável de amar, o poema enumera coisas que, por sua
concretude e delicadeza naturais, justificam o amor que já recebem.
d) O poema postula uma condição universal, na qual se fundem o sujeito, a ação praticada
e os objetos a que essa ação se dirige.
e) A última estrofe é a chave explicativa desse soneto e reitera a ineficácia do amor diante
de um mundo caótico e insensível.

15. (ENEM – 2014)

Mãos dadas
Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 50


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Não serei o cantor de uma mulher, de uma história.


Não direi suspiros ao anoitecer, a paisagem vista na janela.
Não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida.
Não fugirei para ilhas nem serei raptado por serafins.

O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os


homens presentes,
a vida presente.
ANDRADE, C. D. Sentimento do mundo. São Paulo: Cia. das Letras, 2012.

Escrito em 1940, o poema Mãos dadas revela um eu lírico marcado pelo contexto de
opressão política no Brasil e da Segunda Guerra Mundial. Em face dessa realidade, o eu lírico.
a) considera que em sua época o mais importante é a independência dos indivíduos.
b)desvaloriza a importância dos planos pessoais na vida em sociedade.
c) reconhece a tendência à autodestruição em uma sociedade oprimida.
d) escolhe a realidade social e seu alcance individual como matéria poética.
e) critica o individualismo comum aos românticos e aos excêntricos.

16.(ENEM - 2009)

Canção amiga
Eu preparo uma canção.
em que minha mãe se reconheça
todas as mães se reconheçam
e que fale como dois olhos.

[..]

Aprendi novas palavras


E tornei outras mais belas.

Eu preparo uma canção

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 51


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

que faça acordar os homens


e adormecer as crianças.
ANDRADE, C.D. Novos Poemas Rio de Janeiro: José Olympio 1948 .(fragmento)

A linguagem do fragmento acima foi empregada pelo autor com objetivo principal de
a) transmitir informações, fazer referência aos acontecimentos observados no mundo
exterior.
b) envolver, persuadir o interlocutor, nesse caso, leitor, em um forte apelo à sua
sensibilidade.
c) realçar os sentimentos do eu lírico, suas sensações, reflexões opiniões frente ao mundo
real.
d) destacar o processo de construção de seu poema, ao falar sobre o papel da própria
linguagem do poeta.
e) manter eficiente contato comunicativo entre emissor da mensagem de um lado, receptor,
de outro.

17.(ENEM - 2009)

Confidência do Itabirano
Alguns anos vivi em Itabira.
Principalmente nasci em Itabira.
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.
Noventa por cento de ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e
[comunicação.

A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,


vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e
[sem horizontes.
E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,
é doce herança itabirana.

De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 52


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil,


este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;
este orgulho, esta cabeça baixa...

Tive ouro, tive gado, tive fazendas.


Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói!
ANDRADE, C. D. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2003.

Carlos Drummond de Andrade é um dos expoentes do movimento modernista brasileiro.


Com seus poemas, penetrou fundo na alma do Brasil e trabalhou poeticamente as
inquietudes e os dilemas humanos. Sua poesia é feita de uma relação tensa entre o universal
e o particular, como se percebe claramente na construção do poema Confidência do
Itabirano. Tendo em vista os procedimentos de construção do texto literário e as concepções
artísticas modernistas, conclui-se que o poema acima
a) representa a fase heroica do modernismo, devido ao tom contestatório e à utilização de
expressões e usos linguísticos típicos da oralidade.
b) apresenta uma característica importante do gênero lírico, que é a apresentação objetiva
de fatos e dados históricos.
c) evidencia uma tensão histórica entre o “eu” e a sua comunidade, por intermédio de
imagens que representam a forma como a sociedade e o mundo colaboram para a
constituição do indivíduo.
d) critica, por meio de um discurso irônico, a posição de inutilidade do poeta e da poesia em
comparação com as prendas resgatadas de Itabira.
e) apresenta influências românticas, uma vez que trata da individualidade, da saudade da
infância e do amor pela terra natal, por meio de recursos retóricos pomposos.

18. (Estratégia Vestibulares – 2021)

Leia o texto a seguir, do poeta modernista Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), para
responder à próxima questão.
Congresso Internacional do Medo
Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços,
não cantaremos o ódio porque esse não existe,

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 53


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro,


o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das
[igrejas,
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos
[democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da
[morte,
depois morreremos de medo
e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e
[medrosas.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Sentimento do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012 (p. 20).

Sobre os aspectos formais e temáticos do poema, pode-se dizer:


a) O texto apresenta métrica única e exalta o sentimento de impotência do eu lírico diante
das transformações de sua realidade.
b) O texto é composto por versos livres e retrata uma mudança de posição do eu lírico em
relação ao que sua poesia deve tematizar: não mais o amor, e sim o medo.
c) O texto não possui versos brancos em sua forma e, além disso, opta por expressar aquilo
que se sente em um fluxo de consciência, registro em conformidade com os ideais da poesia
contemporânea.
d) O texto retrata a dor do eu lírico, cujo início se dá na constatação de que o mundo é brutal
e que, portanto, não se deve cantar o amor. Está em conformidade com o Romantismo
tardio.
e) O texto reforça os neologismos da terceira geração modernista que, sendo
predominantemente regionalista, faz com que o eu lírico se volte para o memorialismo de
sua cidade natal.

Texto para as próximas questões:


Mãos Dadas
Carlos Drummond de Andrade

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 54


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

(Carlos Drummond de Andrade. Sentimento do Mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012)

19. (Estratégia Vestibulares – 2020)

A poesia Mãos dadas pode ser considera como representativa do estilo do autor, Carlos
Drummond de Andrade, pois
a) demonstra preocupação social, muitas vezes aliada a temas filosóficos ou metafísicos.
b) se constrói a parti de ironias e humor como forma de crítica à sociedade.
c) é muito introspectiva e filosófica, alternando entre a religiosidade e o erotismo.
d) apresenta aspectos memorialistas, além de jogos de som e musicalidade.
e) apresenta menor importância literária do que suas crônicas.

20. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Sobre o poema em questão é possível afirmar que


a) pertence à Primeira Geração Modernista, que tem como uma de suas características a
poesia espiritualista, com temas filosóficos.
b) pertence à Segunda Geração Modernista, que tem como uma de suas características a
poesia voltada para a crítica social.
c) pertence à Terceira Geração Modernista, cujo traço mais marcante é uma poesia de cunho
regionalista.
d) pertence à Literatura Marginal, o que se comprova pelos temas pouco elevados e a forma
poética livre.
e) pertence à literatura contemporânea, tendo como traço marcante os versos brancos e
livres, ou seja, sem métrica ou rima.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 55


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

21. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Sobre o poema Mãos Dadas, é correto afirmar que


a) nele, o eu-lírico desiste de sua atuação social ao afirmar que não cantará mais esse
mundo.
b) ainda que aparente um ar melancólico, é possível compreender laivos de esperança.
c) o eu-lírico nega o amor, ao afirmar que não é possível ter bons sentimentos no presente.
d) o eu-lírico busca uma fuga à realidade penosa do presente através da produção artística.
e) há um elogio à solidariedade, pois é ela que permite o surgimento do sentimento
amoroso.

Leia a seguir o poema “Morte do leiteiro”, do poeta modernista Carlos Drummond de


Andrade (1902-1987) para responder às próximas questões
MORTE DO LEITEIRO

Há pouco leite no país,


é preciso entregá-lo cedo.
Há muita sede no país,
é preciso entregá-lo cedo.
Há no país uma legenda,
que ladrão se mata com tiro.
Então o moço que é leiteiro
de madrugada com sua lata
sai correndo e distribuindo
leite bom para gente ruim.
Sua lata, suas garrafa
se seus sapatos de borracha
vão dizendo aos homens no sono
que alguém acordou cedinho
e veio do último subúrbio
trazer o leite mais frio
e mais alvo da melhor vaca
para todos criarem força

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 56


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

na luta brava da cidade.

Na mão a garrafa branca


não tem tempo de dizer
as coisas que lhe atribuo
nem o moço leiteiro ignaro,
morados na Rua Namur,
empregado no entreposto,
com 21 anos de idade,
sabe lá o que seja impulso
de humana compreensão.
E já que tem pressa, o corpo
vai deixando à beira das casas
uma apenas mercadoria.

E como a porta dos fundos


também escondesse gente
que aspira ao pouco de leite
disponível em nosso tempo,
avancemos por esse beco,
peguemos o corredor,
depositemos o litro...
Sem fazer barulho, é claro,
que barulho nada resolve.

Meu leiteiro tão sutil


de passo maneiro e leve,
antes desliza que marcha.
É certo que algum rumor
sempre se faz: passo errado,
vaso de flor no caminho,
cão latindo por princípio,

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 57


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

ou um gato quizilento.
E há sempre um senhor que acorda,
resmunga e torna a dormir.

Mas este acordou em pânico


(ladrões infestam o bairro),
não quis saber de mais nada.
O revólver da gaveta
saltou para sua mão.
Ladrão? se pega com tiro.
Os tiros na madrugada
liquidaram meu leiteiro.
Se era noivo, se era virgem,
se era alegre, se era bom,
não sei,
é tarde para saber.

Mas o homem perdeu o sono


de todo, e foge pra rua.
Meu Deus, matei um inocente.
Bala que mata gatuno
também serve pra furtara vida de nosso irmão.
Quem quiser que chame médico,
polícia não bota a mão
neste filho de meu pai.
Está salva a propriedade.
A noite geral prossegue,
a manhã custa a chegar,
mas o leiteiro
estatelado, ao relento,
perdeu a pressa que tinha.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 58


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Da garrafa estilhaçada,
no ladrilho já sereno
escorre uma coisa espessa
que é leite, sangue... não sei.
Por entre objetos confusos,
mal redimidos da noite,
duas cores se procuram,
suavemente se tocam,
amorosamente se enlaçam,
formando um terceiro tom
a que chamamos aurora.
DRUMMOND, Carlos Andrade de. Morte do leiteiro. In: A rosa do povo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012 (p. 84).

22. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Acerca da técnica utilizada no poema, é INCORRETO inferir que


a) mais para o fim do verso, depois de já introduzida a personagem do leiteiro, o eu lírico
demonstra empatia com ele, em uma tentativa de aproximação.
b) é observado o emprego do prosaísmo, no sentido que se descreve uma situação do
cotidiano e uma personagem comum: o leiteiro.
c) no verso “Meu Deus, matei um inocente”, o eu lírico confessa seu crime e tenta se redimir
com o leiteiro.
o eu lírico frequentemente mostra-se intrometido, opinando quanto aos fatos que narra,
mediante expressões como: “é claro”, “é certo” e “sempre”.
no verso “Está salva a propriedade” há, ao menos, duas figuras de linguagem: o hipérbato e
a ironia.

23. (Estratégia Vestibulares – 2020)

A prosopopeia é um recurso expressivo que ocorre quando se atribuem características


humanas a seres inanimados ou irracionais. Os versos nos quais ela é verificada são:
a) “Há no país uma legenda,
que ladrão se mata com tiro.”
b) “Então o moço que é leiteiro
de madrugada com sua lata
sai correndo e distribuindo

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 59


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

leite bom para gente ruim.”


c) “Sua lata, suas garrafa
se seus sapatos de borracha
vão dizendo aos homens no sono
que alguém acordou cedinho”
d) “E já que tem pressa, o corpo
vai deixando à beira das casas
uma apenas mercadoria.”
e) “Ladrão? se pega com tiro.
Os tiros na madrugada
liquidaram meu leiteiro.”

24. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Nesse poema, o tom predominante do eu lírico é


a) trabalhador
b) denunciante
c) sedento
d) vingativo
e) parcimonioso

Textos para as próximas questões:


Texto I
(...)
Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 60


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

É feia. Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde


e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
(“A flor e as Náusea” poema do livro Rosa do Povo, publicado em 1945)

Texto II
oficina irritada
Eu quero compor um soneto duro
como poeta algum ousara escrever.
Eu quero pintar um soneto escuro,
seco, abafado, difícil de ler.

Quero que meu soneto, no futuro,


não desperte em ninguém nenhum prazer.
E que, no seu maligno ar imaturo,
ao mesmo tempo saiba ser, não ser.

Esse meu verbo antipático e impuro


há de pungir, há de fazer sofrer,
tendão de Vênus sob o pedicuro.

Ninguém o lembrará: tiro no muro,


cão mijando no caos, enquanto Arcturo,
claro enigma, se deixa surpreender.

25. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Comparando a estilística e o aspecto formal dos poemas, assinale a alternativa correta.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 61


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

a) Os dois poemas se valem do mesmo recurso de construção poética, diferem somente no


uso de figuras de linguagem, pois o “a flor e a náusea” se estrutura em torno de apenas uma
metáfora.
b) Percebe-se, nos dois poemas, o uso frequente do paralelismo sintático como elemento
mais importante do estilo de Carlos Drummond de Andrade.
c) No que diz respeito à forma, em “oficina irritada”, o poeta retorna à influência clássica,
enquanto, em “A flor e a náusea”, ele manifesta sua ligação forte com a primeira geração
modernista.
d) Nos dois poemas, o eu lírico se vale do mesmo procedimento: escolhe uma figura
alegórica e, em torno dela, constrói uma ambientação.
e) Os dois poemas expressam com clareza uma das características da poesia da primeira
geração modernista: fragmentação caótica de imagens.

26. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Os poemas foram escritos em momentos diferentes da história do Brasil e da trajetória de


Carlos Drummond de Andrade. O primeiro foi publicado em 1945; o segundo, 1951.
A partir da leitura dos dois poemas, são feitas as seguintes observações.

I. O pessimismo do autor, expresso na feiura da flor, altera-se muito pouco se considerarmos


o reconhecimento do eu lírico de que seu verso é antipático.
II. Mesmo tomando como recorte da obra de Carlos Drummond somente os dois poemas, é
possível perceber uma mudança radical de objeto poético; no primeiro poema, o eu lírico
manifesta preocupação social; no segundo, demonstra sua obsessão em Claro Enigma, a
própria poesia.
III. O poema “oficina irritada” sintetiza um duplo movimento do eu lírico, uma poesia voltada
para si, que toma como matéria prima a própria angústia do poeta e o desafio de se fazer
uma poesia com um material tão antilírico.

Assinale a alternativa correta.


a) Somente as afirmações I e II são corretas.
b) Somente a afirmação II é correta.
c) Todas as afirmações são corretas
d) Somente a afirmação III é correta.
e) As afirmações I e III são corretas.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 62


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

27. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Os ombros suportam o mundo

Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.

Tempo de absoluta depuração.


Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.


Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?


Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Os ombros suportam o mundo. Disponível em: https://tinyurl.com/y29zsn6z. Acesso
em: 23 out. 2020.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 63


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Drummond é um complexo poeta conhecido contraditoriamente tanto pelo seu pessimismo


quanto pela sua esperança. Em todo caso, seus poemas frequentemente lidam com forças
em choque. Então, nesse poema, o eu lírico:
a) acredita que o fato de proferir verbalmente certos mantras ajuda a superar situações
difíceis.
b) valoriza a divisão social do trabalho, exaltando-a como solução possível contra a opressão.
c) honra a memória da abolição da escravidão, quando resgata ideais revolucionários.
d) acusa aqueles que não acolhem pessoas vulneráveis, como mulheres e crianças.
e) cerceia uma concepção de vida limitada às fantasias sem conexão com a realidade.

28. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Canção da moça-fantasma de Belo Horizonte


Eu sou a Moça-Fantasma
que espera na Rua do Chumbo
o carro da madrugada.
Eu sou branca e longa e fria,
a minha carne é um suspiro
na madrugada da serra.
Eu sou a Moça-Fantasma.
O meu nome era Maria,
Maria-Que-Morreu-Antes.

Sou a vossa namorada


que morreu de apendicite,
no desastre de automóvel
ou suicidou-se na praia
e seus cabelos ficaram
longos na vossa lembrança.
Eu nunca fui deste mundo:
Se beijava, minha boca
dizia de outros planetas
em que os amantes se queimam

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 64


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

num fogo casto e se tornam


estrelas, sem ironia.

(...)
ANDRADE, Carlos Drummond de. Sentimento de mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012 (p. 12)

O regionalismo foi uma vertente que impregnou não só a prosa modernista desse período,
como também a poesia. Esse traço pode ser verificado no(a):
a) relação amorosa entre os jovens namorados.
b) desaparecimento do traço idealista romântico.
c) assunção de um ponto de vista feminino pelo escritor.
d) superstição acerca de certas lendas locais.
e) morbidez ultrarromântica no tratamento da morte.

29. (Estratégia Vestibulares – 2020)

O lutador
Lutar com palavras
é a luta mais vã.
Entanto lutamos
mal rompe a manhã.
São muitas, eu pouco.
Algumas, tão fortes
como o javali.
Não me julgo louco.
Se o fosse, teria
poder de encantá-las.
Mas lúcido e frio,
apareço e tento
apanhar algumas
para meu sustento
num dia de vida. (...)
ANDRADE, Carlos Drummond de. O lutador. Disponível em: https://tinyurl.com/y857297q. Acesso em: 19 jun. 2020

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 65


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Esse fragmento poético revela uma construção baseada no jogo de


a) simetria entre o esporte e a vida.
b) equiparação das palavras a seres humanos.
c) resiliência no esforço metalinguístico.
d) abatimento do poeta que apanha da vida.
e) loucura e caos provocados pela arte.

30.(Estratégia Vestibulares – 2020)

Quadrilha
João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili,
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia completa. São Paulo: Nova Aguilar, 2002.

A poesia de Drummond, representante do Modernismo brasileiro, é caracterizada pela


variedade. No poema Quadrilha, percebe-se, como característica
a) temática amorosa, marca principal do Modernismo.
b) sintaxe rebuscada, marca principal da segunda geração.
c) temática filosófica, característica da primeira geração.
d) sintaxe oralizada, principal marca do Modernismo.
e) temática corriqueira, marca do Modernismo.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 66


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

4.2 – Gabarito
1. C
2. A
3. E
4. B
5. E
6. C
7. E
8. D
9. E
10. B
11. D
12. C
13. C
14. D
15. D
16. D
17. C
18. B
19. A
20. B
21. B
22. C
23. C
24. B
25. C
26. D
27. D
28. D
29. C
30. E

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 67


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

4.3 – Exercícios comentados


1. (ITA/2005)

O livro “Claro Enigma“, uma das obras mais importantes de Carlos Drummond de Andrade,
foi editado em 1951. Desse livro consta o poema a seguir.
Memória
Amar o perdido
deixa confundido
este coração.
Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.
As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão.
Mas as coisas findas,
muito mais que lindas,
essas ficarão.
(ANDRADE, Carlos Drummond de. “Claro Enigma”, Rio de Janeiro: Record, 1991.)

Sobre esse texto, é correto dizer que


a) a passagem do tempo acaba por apagar da memória praticamente todas as lembranças
humanas; quase nada permanece.
b) a memória de cada pessoa é marcada exclusivamente por aqueles fatos de grande
impacto emocional; tudo o mais se perde.
c) a passagem do tempo apaga muitas coisas, mas a memória afetiva registra as coisas que
emocionalmente têm importância; essas permanecem.
d) a passagem do tempo atinge as lembranças humanas da mesma forma que envelhece e
destrói o mundo material; nada permanece.
e) o homem não tem alternativa contra a passagem do tempo, pois o tempo apaga tudo; a
memória nada pode; tudo se perde.
Comentário.
Alternativa "A" está incorreta. O poeta não menciona a proporção do que será apagado, ou seja, ele
não afirma que o “tempo acaba por apagar da memória praticamente todas as lembranças” .

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 68


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Alternativa "B" está incorreta. O eu lírico fala do esquecimento, mas não menciona se os eventos que
não são esquecidos são os de grande impacto; ele não define o que será lembrado.
Alternativa "C" está correta. O poema destaca que várias coisas sensíveis não serão lembradas (“a
passagem do tempo apaga muitas coisas), mas algumas que já são findas, já se foram, provavelmente as
mais importantes sob a perspectiva afetiva, ficarão na memória.
Alternativa "D" está incorreta. O tema da velhice não foi tematizado no poema.
Alternativa "E" está incorreta. O poema afirma que algo fica na memória, o tempo não apaga tudo.
Gabarito: C
Texto para as próximas questões:

O elefante e nuvens, alusões à procura de sítios,


a um mundo mais poético segredos, episódios
Fabrico um elefante onde o amor reagrupa não contados em livro,
de meus poucos recursos. as formas naturais. de que apenas o vento,
Um tanto de madeira as folhas, a formiga
tirado a velhos móveis Vai o meu elefante reconhecem o talhe,
talvez lhe dê apoio. pela rua povoada, mas que os homens
E o encho de algodão, mas não o querem ver ignoram,
de paina, de doçura. nem mesmo para rir pois só ousam mostrar-se
A cola vai fixar da cauda que ameaça sob a paz das cortinas
suas orelhas pensas. deixá-lo ir sozinho. à pálpebra cerrada.
A tromba se enovela,
é a parte mais feliz É todo graça, embora E já tarde da noite
de sua arquitetura. as pernas não ajudem volta meu elefante,
e seu ventre balofo mas volta fatigado,
Mas há também as presas, se arrisque a desabar as patas vacilantes
dessa matéria pura ao mais leve empurrão. se desmancham no pó.
que não sei figurar. Mostra com elegância Ele não encontrou
Tão alva essa riqueza sua mínima vida, o de que carecia,
a espojar-se nos circos e não há cidade o de que carecemos,
sem perda ou corrupção. alma que se disponha eu e meu elefante,
E há por fim os olhos, a recolher em si em que amo disfarçar-me.
onde se deposita desse corpo sensível Exausto de pesquisa,
a parte do elefante a fugitiva imagem, caiu-lhe o vasto engenho
mais fluida e permanente, o passo desastrado como simples papel.
alheia a toda fraude. mas faminto e tocante. A cola se dissolve
Mas faminto de seres e todo o seu conteúdo
Eis o meu pobre elefante e situações patéticas, de perdão, de carícia,
pronto para sair de encontros ao luar de pluma, de algodão,
à procura de amigos no mais profundo oceano, jorra sobre o tapete,
num mundo enfastiado sob a raiz das árvores qual mito desmontado.
que já não crê em bichos ou no seio das conchas, Amanhã recomeço.
e duvida das coisas. de luzes que não cegam
Ei-lo, massa imponente e brilham através ANDRADE, Carlos Drummond de. O
Elefante. 9ª ed. - São Paulo: Editora
e frágil, que se abana dos troncos mais espessos. Record, 1983.
e move lentamente Esse passo que vai
a pele costurada sem esmagar as plantas

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 69


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

onde há flores de pano no campo de batalha,

2. (IME - 2019)

No poema, considerando o elefante fabricado artesanalmente como uma alegoria para falar
da arte, mandar o elefante à rua aponta para um desejo de
a) divulgação daquilo que até então era privado e íntimo.
b) invisibilidade da coisa criada.
c) anonimato e silenciamento, já que há nas ruas um burburinho incessante que acaba por
silenciar tudo o que nela transita.
d) fuga às responsabilidades do artista, pois o poeta sucumbe diante de sua inspiração.
e) banalização dos sentimentos que inspiraram o poeta a construir seu elefante.
Comentários: O elefante do poema alegoriza a própria ideia de obra de arte. O artista cia sua obra no
seu ateliê, isolado do mundo, sem contato com outras pessoas. Até o momento em que uma obra de
arte é vista pelo público, ela não diz nada. Para que ela comunique sua mensagem, deve se encontrar
com as pessoas. Por isso, quando manda seu elefante para as ruas, o poeta está tentando levar à rua
aquilo que antes era só seu, íntimo. Portanto, a alternativa correta é alternativa A.
A alternativa B está incorreta, pois quem manda uma obra para a rua quer que ela seja conhecida, não
inviabilizada.
A alternativa C está incorreta, pois a incomunicabilidade nasce da falta de capacidade de se conectar
com o próximo e à alienação do homem contemporâneo, não ao barulho das ruas.
A alternativa D está incorreta, pois a responsabilidade do artista é criar arte e comunicar sua mensagem.
Mandar o elefante para a rua é cumprir com sua responsabilidade.
A alternativa E está incorreta, pois mandar a obra para a rua não banaliza o sentimento. O que prejudica
a intenção do poeta é o fato de não ser possível a comunicação entre as pessoas e a arte.
Gabarito: A
3. (IME - 2019)

Considere os versos 19 a 23 do poema, transcritos abaixo:


“E há por fim os olhos,
onde se deposita
a parte do elefante
mais fluida e permanente,
alheia a toda fraude.”

Abaixo, você encontrará alguns ditados populares elencados. Qual destes ditados mais se
aproxima da ideia veiculada no verso 23, “alheia a toda fraude”?
a) “Fazer o bem sem olhar a quem.”
b) “O pior cego é aquele que não quer ver.”

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 70


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

c) “Perto dos olhos, longe do coração.”


d) “Em terra de cego, quem tem um olho é rei.”
e) “Os olhos são a janela da alma.”
Comentários: É nos olhos do elefante que se encontra a parte mais sincera. “alheia a toda fraude”
significa “que não engana”, “afastada das enganações”. O dito “Os olhos são a janela da alma” significa
que os olhos são a parte do corpo incapaz de mentir. A partir dos olhos se pode perceber o que passa no
íntimo de alguém. Por isso, a alternativa correta é alternativa C.
A alternativa A está incorreta, pois “Fazer o bem sem olhar a quem” significa que se deve fazer aquilo
que se crê ser certo independente de qualquer expectativa de recompensa ou escolha, fazendo o bem a
qualquer um, não só a quem interessa.
A alternativa B está incorreta, pois “O pior cego é aquele que não quer ver” significa que nós mesmos
nos enganamos, optando por não enxergar aquilo que não queremos. E o autoengano é o pior tipo de
engano que há.
A alternativa C está incorreta, pois “Perto dos olhos, longe do coração” significa que muitas vezes algo
ou alguém que está distante de nós, continua sendo objeto de nosso afeto e, por isso, está próximo do
nosso coração.
A alternativa D está incorreta, pois “Em terra de cego, quem tem um olho é rei” significa que
dependendo da situação se encontra em maior ou menor vantagem. É comparação com os outros e o
ambiente nos torna melhores ou piores. Alguém bom em uma situação, poderia ser considerado ruim
em outra.
Gabarito: E
4. (IME – 2019)

O poema O elefante
a) anuncia, por meio da alegoria do animal, que o tamanho dos problemas dos adultos é
inversamente proporcional ao tamanho do elefante, sendo, ao mesmo tempo, um poema
direcionado às crianças.
b) estabelece uma relação criador/criatura e, metaforicamente, é possível falar de um
paralelo entre arte/artista: o conteúdo produzido pelo artista é causa e consequência, ao
mesmo tempo, do trabalho do poeta com as palavras.
c) desconecta o elefante (criação) de seu criador, retirando deste toda a sua capacidade
criativa.
d) mostra a criatura, o elefante, como algo definido e único: criá-lo é tão trabalhoso que não
há possibilidade de criar outros elefantes.
e) revela, metaforicamente, um descuido com o fazer poético ao descrever a deselegância
do elefante mal construído, que segue pelas ruas de modo desequilibrado.
Comentários: O elefante do poema é uma alegoria para a obra de arte. As referências à manufatura da
obra são um dos índices mais explícitos dessa associação. Ao mesmo tempo, o poema é escrito na
primeira pessoa, dando a entender que poderia também ser uma fala do próprio poeta, cuja obra de
arte é o poema. O poeta escreve para comunicar-se com os outros, mas a impossibilidade de se

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 71


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

comunicar é aquilo que o impulsiona, por fim, a seguir tentado criar sua obra. Assim, a alternativa
correta é alternativa B.
A alternativa A está incorreta, pois o poema discute questões profundas como o papel da arte e a
alienação do homem. Não é possível dizer que tal conteúdo é mais adequado para crianças apenas por
se basear numa proposta lúdica.
A alternativa C está incorreta, pois criatura e criador estão absolutamente conectados. O problema é
que o ser humano não consegue se conectar com a obra de arte e, por isso, sua mensagem não chega a
ser passada.
A alternativa D está incorreta, pois o poema finaliza com a ideia de que o elefante volta destruído para
casa, mas no dia seguinte o criador recomeçará seu trabalho, seja consertando esse elefante ou criado
outro.
A alternativa E está incorreta, pois o no início do poema, ao descrever a manufatura do animal, revela o
extremo cuidado do artista para com sua obra.
Gabarito: B
5. (FUVEST – 2020)
Cantiga de enganar
(...)
O mundo não tem sentido.
O mundo e suas canções
de timbre mais comovido
estão calados, e a fala
que de uma para outra sala
ouvimos em certo instante
é silêncio que faz eco
e que volta a ser silêncio
no negrume circundante.
Silêncio: que quer dizer?
Que diz a boca do mundo?
Meu bem, o mundo é fechado,
se não for antes vazio.
O mundo é talvez: e é só.

Talvez nem seja talvez.


O mundo não vale a pena,
mas a pena não existe.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 72


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Meu bem, façamos de conta.


De sofrer e de olvidar,
de lembrar e de fruir,
de escolher nossas lembranças
e revertê-las, acaso
se lembrem demais em nós.
Façamos, meu bem, de conta
– mas a conta não existe –
que é tudo como se fosse,
ou que, se fora, não era.
(...)
Carlos Drummond de Andrade, Claro Enigma.

Em Claro Enigma, a ideia de engano surge sob a perspectiva do sujeito maduro, já afastado
das ilusões, como se lê no verso-síntese “Tu não me enganas, mundo, e não te engano a ti.”
(“Legado”). O excerto de “Cantiga de enganar” apresenta a relação do eu com o mundo
mediada
a) pela música, que ressoa em canções líricas.
b) pela cor, brilhante na claridade solar.
c) pela afirmação de valores sólidos.
d) pela memória, que corre fluida no tempo.
e) pelo despropósito de um faz-de-conta.

Comentários:

Alternativa A, incorreta: O eu lírico faz referência à cantiga, mas diz que “o mundo e suas
canções/ estão calados...”, ou seja, a música não poderia servir como mediação.

Alternativa B, incorreta: O texto não fala de brilho, mas de “negrume circundante”.

Alternativa C, incorreta: O eu lírico diz que “o mundo é talvez: e é só”, ou seja, não há certezas
sólidas.

Alternativa D, incorreta: “Fazer de conta” tem a ver com a imaginação e não com a memória.

Alternativa E, correta: O próprio título se refere ao engano, e, em um dos versos, o eu lírico


afirma “Façamos, meu bem, de conta/-mas a conta não existe-“, ou seja, o eu lírico mostra que
a ilusão é desproposital.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 73


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Gabarito: E
6. (USF - 2019)
Texto I
Cantiga de enganar.
O mundo não vale o mundo,
meu bem.
Eu plantei um pé-de-sono,
brotaram vinte roseiras.
Se me cortei nelas todas
e se todas se tingiram
de um vago sangue jorrado
ao capricho dos espinhos,
não foi culpa de ninguém.
O mundo,
meu bem,
não vale
a pena e a face serena
vale a face torturada.
[...]
Andrade, Carlos Drummond de.
Claro enigma – 1.ed. – São Paulo:
Companhia da Letras, 2012. p. 35-7.
Texto II
Amar
Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados amar?
[...]

Amar solenemente as palmas do deserto,


o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,


distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medroso, paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 74


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.


Andrade, Carlos Drummond de.
Claro enigma – 1.ed. – São Paulo:
Companhia da Letras, 2012. p.43.

Os textos, em consonância com a leitura da obra na íntegra, e tendo por base os parâmetros
ideológicos de Claro enigma, nos permitem afirmar corretamente que
a) o texto 1 mostra a ironia de um eu lírico desencantado com a existência, ou com o que
sobrou dela, num diálogo com A máquina do mundo, enquanto o texto 2 evoca o amor como
elemento de conexão do homem com seu passado, como ocorre em A mesa.
b) o texto 1 retoma o tom introspectivo de poemas que reverberam a angústia do homem
na busca de um sentido para a vida, como em Perguntas em forma de cavalo marinho,
enquanto o texto 2 simplifica a existência ao condicioná-la ao amor, fonte máxima de prazer
e dor.
c) o texto 1 registra um eu lírico desencantado com a vida, repercutindo o tom melancólico
que se observa em textos como Dissolução; já o eu lírico do texto 2 fala da experiência
amorosa de caráter compulsório, pois considera o amor uma espécie de condenação
involuntária.
d) o texto 1 reforça o tom niilista que acompanha os demais poemas do livro, como vemos
no poema Oficina Irritada, enquanto que o texto 2 retoma a necessidade de espalhar o amor
como única maneira de reagir à destruição imanente ao ser humano.
e) o texto 1 tem caráter social, pois promove uma reflexão acerca do estar em um mundo
desfigurado no período pós Segunda Guerra, enquanto que o texto 2 retoma a busca pelo
equilíbrio por meio do amor, individual e coletivo, como também se observa em Memória.
Comentários:
A alternativa A está incorreta, pois o eu lírico não se utiliza da ironia no texto 1 para retratar seu
desencanto com o mundo.
A alternativa B está incorreta, pois o eu lírico não constrói o poema 1 de forma introspectiva.
A alternativa C está correta, pois percebe-se o tom melancólico na forma como o desencanto é trazido
no texto 1. Além disso, o amor é de fato visto como uma ação involuntária do individual, da qual ele não
consegue escapar.
A alternativa D está incorreta, pois o texto 2 não retrata o amor como solução para a destruição do
homem.
A alternativa E está incorreta, pois o texto 2 trata de desequilíbrio pelo amor, visto como uma
compulsão.
Gabarito: C
7. (FUVEST - 2018)
Os bens e o sangue
VIII
(...)

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 75


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Ó filho pobre, e descorçoado*, e finito


ó inapto para as cavalhadas e os trabalhos brutais
com a faca, o formão, o couro... Ó tal como quiséramos
para tristeza nossa e consumação das eras,
para o fim de tudo que foi grande!
Ó desejado,
ó poeta de uma poesia que se furta e se expande
à maneira de um lago de pez** e resíduos letais...
És nosso fim natural e somos teu adubo,
tua explicação e tua mais singela virtude...
Pois carecia que um de nós nos recusasse
para melhor servir-nos. Face a face
te contemplamos, e é teu esse primeiro
e úmido beijo em nossa boca de barro e de sarro.
Carlos Drummond de Andrade, Claro enigma.

Glossário
*descorçoado: assim como “desacorçoado”, é uma variante de uso popular da palavra “desacoroçoado”, que
significa “desanimado”.
**pez: piche
Considere as seguintes afirmações:
I. Os familiares, que falam no poema, ironizam a condição frágil do poeta.
II. O passado é uma maldição da qual o poeta, como revela o título do poema, não consegue
se desvencilhar.
III. O trecho “o fim de tudo que foi grande” remete à ruína das oligarquias, das quais
Drummond é tributário.
IV. A imagem de uma “poesia que se furta e se expande/à maneira de um lago de pez e
resíduos letais...” sintetiza o pessimismo dos poemas de Claro enigma.
Estão corretas:
a) I e II, apenas.
b) I, II e III, apenas.
c) II e IV, apenas.
d) I, III e IV, apenas.
e) I, II, III e IV.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 76


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Comentários
Nesse excerto do poema “Os bens e o sangue”, a família do eu lírico deserda o seu descendente
de todos os bens materiais. Tal atitude permite deduzir a tensão entre o poeta e a família,
principalmente por expressar o sentimento de desconforto e não pertencimento ao olhar para o
“vasto mundo” que o rodeia e também pela relação com sua cidade natal, já que se trata de um
descendente de fazendeiros (o que pode ser considerada uma oligarquia, governo de poucos) que
abandona o universo rural e parte para a grande cidade.
Isso contribui para o sentimento de pessimismo do eu lírico que se transmite também ao fazer
poético: “poesia que se furta e se expande/à maneira de um lago de pez e resíduos letais...”.
Logo, todas estão corretas e o gabarito é a letra E.
Gabarito: E.
8. (UFGD - 2018)

Leia o trecho a seguir de A máquina do mundo, poema de Carlos Drummond de Andrade,


correspondente à quarta, quinta e sexta estrofes, e assinale a alternativa correta.

[...] a máquina do mundo se entreabriu


para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.

Abriu-se majestosa e circunspecta,


sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável

pelas pupilas gastas na inspeção


contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar [...]

a) As expressões “pupilas gastas”, “mente exausta de mentar” e “quem” se referem à


máquina do mundo, descrita pelo eu que fala (possivelmente o poeta), referido no poema
pela expressão “impuro”.
b) O poema espelha aspectos da forma modernista inerente à obra do poeta Drummond,
com estrofes e versos irregulares, sem rimas, livres e brancos.
c) A expressão “se entreabriu” dá a medida do quanto a máquina do mundo se revela ao eu
que fala e que a viu, isto é, de modo tímido, sem se apresentar completamente, o que pode
ser constatado ao longo do poema.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 77


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

d) “Se entreabriu”, “abriu-se” e “sem emitir” são expressões que contêm verbos de ação,
que estruturam o gênero do poema que, apesar de ser uma “tentativa de explicação do estar
no mundo” feita pelo poeta, é mais narrativo que lírico.
e) A escolha do título do poema, “A máquina do mundo”, e das estrofes estruturadas com
três versos é procedimento de intertextualidade que remete o poema à tradição lírica
ocidental, relacionando-o à prosa de Camões e Dante Alighieri.

Comentários:

Alternativa A, incorreta: Eu lírico nem sempre se confunde com o poeta. “Impuro” se refere a
“som”, e não ao eu lírico.

Alternativa B, incorreta: Pelo contrário: a obra Claro enigma é um retorno às fontes clássicas.

Alternativa C, incorreta: Não é exatamente timidez. O poeta está em busca de algo que no final
a ele se lhe revela.

Alternativa D, correta: No caso, os dois primeiros verbos ainda são pronominais (reflexivos).

Alternativa E, incorreta: No caso, apenas de Dante, por meio da forma de terzzinas (estrofes com
3 versos).

Gabarito: D
9. (UNIVESP - 2017)

Amar
Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer, amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,


sozinho, em rotação universal,
senão rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 78


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Amar solenemente as palmas do deserto,


o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o cru,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e
uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,


distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor,


e na secura nossa amar a água implícita,
e o beijo tácito, e a sede infinita.
– Carlos Drummond de Andrade, em “Claro enigma”. 1951.

A obra de Carlos Drummond de Andrade apresenta características que a filiam ao


movimento literário conhecido como Modernismo.
Assinale a alternativa que apresenta corretamente a descrição de algumas características
que podem ser notadas no poema Amar.
a) O chamado Mal do Século, marcado pelo pessimismo extremo com relação tanto ao
passado como ao futuro, tal qual apresentado na obra de Álvares de Azevedo,
contemporâneo de Drummond.
b) Os conflitos dualistas entre o terreno e o celestial, o homem (Antropocentrismo) e Deus
(Teocentrismo), o pecado e o perdão.
c) Aurea mediocritas, ou o equilíbrio de ouro, partindo do pressuposto de que a simplicidade
deveria ser o elemento preponderante, e o luxo e a ostentação deveriam ser tratados como
algo inconcebível e o pastoralismo.
d) A preocupação em apresentar uma realidade mais voltada a contemporaneidade de
acordo com a veracidade dos fatos, a partir de temas relacionados com a realidade, focados
nos aspectos sociais e cotidianos.
e) A presença de um simbolismo abstrato, tendo como pano de fundo os sentimentos e as
angústias do homem diante das transformações sociais da primeira metade do século XX.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 79


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Comentários:

Alternativa A, incorreta: São características da segunda geração romântica.

Alternativa B, Incorreta: São características do Barroco.

Alternativa C, incorreta: O termo significa medida de ouro e se refere ao princípio de equilíbrio


no uso das figuras de linguagem e no efeito provocado na leitura. O poeta deve ser comedido,
não ser sentimental demais nem ser apático.

Alternativa D, incorreta: O realismo se destacou pelo psicologismo e a denúncia social.

Alternativa E, correta: O realismo se destacou pelo psicologismo e a denúncia social.

Gabarito: E
10. (FACULDADE DE MEDICINA ALBERT EINSTEIN/2017)

Oficina Irritada
Eu quero compor um soneto duro
como poeta algum ousara escrever.
Eu quero pintar um soneto escuro,
seco, abafado, difícil de ler.
Quero que meu soneto, no futuro,
não desperte em ninguém nenhum prazer.
E que, no seu maligno ar imaturo,
ao mesmo tempo saiba ser, não ser.
Esse meu verbo antipático e impuro
há de pungir, há de fazer sofrer,
tendão de Vênus sob o pedicuro.
Ninguém o lembrará: tiro no muro,
cão mijando no caos, enquanto Arcturo,
claro enigma, se deixa surpreender.

O texto acima é de Claro Enigma, obra de Carlos Drummond de Andrade. De sua leitura se
pode depreender que
a) é um poema que segue rigorosamente os procedimentos de construção do soneto
clássico e tradicional, particularmente quanto à disposição e ao valor das rimas e ao uso da
chave de ouro como fecho conclusivo do texto.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 80


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

b) é um metapoema e revela que o soneto que o autor deseja fazer é o mesmo que o leitor
está lendo, como a evidenciar na prática a junção do querer e do fazer.
c) utiliza-se de expressões como “tiro no muro” e “cão mijando no caos”, que, além de
provocar mau gosto e o estranhamento do leitor, rigorosamente, nada têm a ver com a
proposta de elaboração do poema.
d) faz da repetição anafórica e do paralelismo dos versos, um recurso de composição do
poema que o torna enfadonho e antiestético e revela um poeta de produção duvidosa e
menor.
Comentário.
Alternativa "A" está incorreta. As regras do soneto são: um poema organizado em dois quartetos e dois
tercetos; deve ser decassílabo; a rimas devem ser cruzadas; e o último terceto deve agradar. Nos último
terceto, as rimas não são cruzadas e ele contém imagens grotescas que não agradam.
Alternativa "B" está correta. Metapoema significa que o poeta faz um poema sobre o próprio poema,
que ele diz que vai fazer um poema duro e o leitor o sente como duro. É o que acontece nesse poema,
principalmente no último terceto quando o poeta apresenta imagens obscuras.
Alternativa "C" está incorreta. As imagens realmente provocam estranhamento, mas são exemplos do
que seria um poema duro, ou seja, tem a ver com “a proposta de elaboração do poema”.
Alternativa "D" está incorreta. Há anáfora e paralelismo, mas ao contrário do que diz a alternativa isso
torno o poema estético, belo.
Gabarito: B
Texto para as próximas questões
Confidência do Itabirano
Alguns anos vivi em Itabira.
Principalmente nasci em Itabira.
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.
Noventa por cento de ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.
A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,
vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem
[horizontes.
E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,
é doce herança itabirana.
De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil;
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 81


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

este orgulho, esta cabeça baixa...


Tive ouro, tive gado, tive fazendas.
Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói!
Carlos Drummond de Andrade, Sentimento do mundo.

11. (2016/FUVEST/1ª fase)

No texto de Drummond, o eu lírico


a) considera sua origem itabirana como causadora de deficiências que ele almeja superar.
b) revela-se incapaz de efetivamente comunicar-se, dado o caráter férreo de sua gente.
c) ironiza a si mesmo e satiriza a rusticidade de seu passado semirrural mineiro.
d) dirige-se diretamente ao leitor, tornando assim patente o caráter confidencial do poema.
e) critica, em chave modernista, o bucolismo da poesia árcade mineira.

Comentários:

Alternativa A, incorreta: Não deficiências; o eu lírico reflete sobre sua passagem de sua cidade
natal para a vida burocrática e profissional na cidade.

Alternativa B, incorreta: O caráter férreo é modernista, mas não há tal incapacidade.

Alternativa C, incorreta: Pelo contrário: considera essa rusticidade também como parte de sua
trajetória.

Alternativa D, correta: No verso “De Itabira trouxe prendas diversas que te ofereço”, o pronome
oblíquo “te” é um recurso estratégico de aproximação do eu lírico com o leitor, tornando assim
patente o caráter confidencial do poema.

Alternativa E, incorreta: Não existe essa crítica no poema.

Gabarito: D
12. (2016/FUVEST/1ª fase)

Tendo em vista que o poema de Drummond contém referências a aspectos geográficos e


históricos determinados, considere as seguintes afirmações:

I. O poeta é “de ferro” na medida em que é nativo de região caracterizada pela existência
de importantes jazidas de minério de ferro, intensamente exploradas.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 82


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

II. O poeta revela conceber sua identidade como tributária não só de uma geografia, mas
também de uma história, que é, igualmente, a da linhagem familiar a que pertence.
III. A ausência de mulheres de que fala o poeta refere-se à ampla predominância de
população masculina, na zona de mineração intensiva de que ele é originário.

Está correto o que se afirma em


a) I, somente.
b) III, somente.
c) I e II, somente.
d) II e III, somente.
e) I, II e III.

Comentários:

O poema “Confidências do Itabirano” tem um tom memorialista, retornado à terra natal onde
o poeta nascera. Ele declara que sua identidade é fruto do local em que nasceu, Itabira (atual
Itabirito, Minas Gerais). A cidade se destacou pela sua produção de ferro, o que é aludido no
poema. Atenção: essa questão poderia cobrar uma interface interdisciplinar com a geografia.
Nesse sentido, “de ferro” passa do plano metafórico, conotativo, para o literal, denotativo.

Ademais, no poema também há alusão à história da família de Drummond. O poema no fundo


alia as disciplinas da História e da Geografia.

Apenas o item III não é comprovado historicamente.

Gabarito: C
13. (2016/FUVEST/1ª fase)

Na última estrofe, a expressão que justifica o uso da conjunção sublinhada no verso “Mas
como dói!” é:
a) “Hoje”.
b) “funcionário público”.
c) “apenas”.
d) “fotografia”.
e) “parede”.
Comentários
Essa questão aqui é para demonstrar a correlação de ideias em progressão no texto, bem como o fato
de que não é só verbo que transmite ideia temporal: os objetos aqui são impregnados de tempo e de
lembrança neste poema saudosista do Drummond.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 83


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Alternativa “a”: incorreta. Apesar de este ser um advérbio de tempo, o que dói não é o presente, mas
sim o passado.
Alternativa “b”: incorreta. O cargo de funcionário público é uma função que o eu lírico ocupa no
presente, e o que dói é o passado.
Alternativa “c”: correta – gabarito. Existe um contraponto entre o “apenas”, Itabira é apenas uma
lembrança e nada mais que isso, não é mais uma presença física, real, que é isso o que provoca o fato de
doer.
Alternativa “d”: incorreta. “Fotografia” pode se referir ao passado, mas ela ainda serve de lembrança
pelo menos, ao passo que a cidade real de Itabira não está mais lá.
Alternativa “e”: incorreta. “Parede” é um elemento neutro: não dói nem faz doer.
Gabarito: C
14. (UFPR/2016)

Leia, atentamente, o seguinte poema:


Amar
Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
e o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero, um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.
Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 84


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa


amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.

O poema “Amar” integra a segunda parte, “Notícias Amorosas”, do livro Claro Enigma, de
Carlos Drummond de Andrade. Sobre esse poema, assinale a alternativa correta.
a) As indagações repetitivas, nas duas primeiras estrofes, reiteram a inviabilidade do amor
diante de um mundo em que tudo é perecível.
b) O poeta estabelece uma intensidade da manifestação do amor com relação ao belo
diferente da intensidade do amor dispensado ao grotesco.
c) Para acentuar a condição inexorável de amar, o poema enumera coisas que, por sua
concretude e delicadeza naturais, justificam o amor que já recebem.
d) O poema postula uma condição universal, na qual se fundem o sujeito, a ação praticada
e os objetos a que essa ação se dirige.
e) A última estrofe é a chave explicativa desse soneto e reitera a ineficácia do amor diante
de um mundo caótico e insensível.
Comentário.
Alternativa "A" está incorreta. Reiteram que o indivíduo não pode “não amar”, não reiteram o “mundo
perecível”.
Alternativa "B" está incorreta. O eu lírico coloca no mesmo patamar amar o belo e o grotesco, pois
menciona a ave de rápida e aquilo que traz o mar (imagens do grotesco ou do inesperado).
Alternativa "C" está incorreta. Justamente nisto está o sacrifício de amar: deve-se amar aquilo que não
deve ser justificado e a justificativa não está no objeto.
Alternativa "D" está correta. Essa alternativa tem problemas, mas é a “menos pior”. É verdade que o
amor é elevado à condição universal, mas o objeto permanece reticente à ação do sujeito. É o sujeito
que tenta se fundir nos objetos.
Alternativa "E" está incorreta. O último verso não expressa ineficácia do amor, mas a nossa condição de
seres que devem amar, não há outra alternativa.
Gabarito. D
15. (ENEM – 2014)

Mãos dadas
Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 85


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Não serei o cantor de uma mulher, de uma história.


Não direi suspiros ao anoitecer, a paisagem vista na janela.
Não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida.
Não fugirei para ilhas nem serei raptado por serafins.

O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os


homens presentes,
a vida presente.
ANDRADE, C. D. Sentimento do mundo. São Paulo: Cia. das Letras, 2012.

Escrito em 1940, o poema Mãos dadas revela um eu lírico marcado pelo contexto de
opressão política no Brasil e da Segunda Guerra Mundial. Em face dessa realidade, o eu lírico.
a) considera que em sua época o mais importante é a independência dos indivíduos.
b)desvaloriza a importância dos planos pessoais na vida em sociedade.
c) reconhece a tendência à autodestruição em uma sociedade oprimida.
d) escolhe a realidade social e seu alcance individual como matéria poética.
e) critica o individualismo comum aos românticos e aos excêntricos.

Comentários:

Alternativa A, incorreta: Pelo contrário: já desde o título o poema indica solidariedade.

Alternativa B, incorreta: O poeta tem responsabilidade social que é ainda mais amplificada
quando encontra apoio em grupo.

Alternativa C, incorreta: Trata-se de um poema esperançoso, ainda que pragmático.

Alternativa D, incorreta: O eu lírico escolhe a realidade disponível: a de seu tempo e tenta dela
atirar a matéria para sua poesia, embora a Segunda Guerra já assolasse a Europa e seus efeitos
fossem sentidos no Brasil.

Alternativa E, incorreta: Em seu modernismo, fala de um tempo duro que não deve ser evitado,
mas sim enfrentado.

Gabarito: D
16.(ENEM - 2009)

Canção amiga

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 86


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Eu preparo uma canção.


em que minha mãe se reconheça
todas as mães se reconheçam
e que fale como dois olhos.

[..]

Aprendi novas palavras


E tornei outras mais belas.

Eu preparo uma canção


que faça acordar os homens
e adormecer as crianças.
ANDRADE, C.D. Novos Poemas Rio de Janeiro: José Olympio 1948 .(fragmento)

A linguagem do fragmento acima foi empregada pelo autor com objetivo principal de
a) transmitir informações, fazer referência aos acontecimentos observados no mundo
exterior.
b) envolver, persuadir o interlocutor, nesse caso, leitor, em um forte apelo à sua
sensibilidade.
c) realçar os sentimentos do eu lírico, suas sensações, reflexões opiniões frente ao mundo
real.
d) destacar o processo de construção de seu poema, ao falar sobre o papel da própria
linguagem do poeta.
e) manter eficiente contato comunicativo entre emissor da mensagem de um lado, receptor,
de outro.

Comentários:

Alternativa A, incorreta: A função da linguagem predominante é a metalinguística e não a


referencial.

Alternativa B, incorreta: A função da linguagem não é a conativa ou apelativa.

Alternativa C, incorreta: Cuidado: por mais que o eu lírico fale a partir da perspectiva do ponto
de vista em primeira pessoa do singular, o foco não é em seu egocentrismo, mas sim no tipo de
escrita que pretende produzir.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 87


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Alternativa D, correta: A função metalinguística prevalece no poema. O eu lírico explica o


processo de criação do próprio texto: “Eu preparo uma canção, / em que minha mãe se
reconheça / todas as mães se reconheçam”. O sujeito poético mostra a forma de expressão a
ser utilizada no poema: “e que fale como dois olhos”; os subsídios para escrever e modos para
essa realização: “Aprendi novas palavras / E tornei outras mais belas”. Finalmente, o eu lírico
aponta o objetivo do fazer poético: “Eu preparo uma canção / que faça acordar os homens / e
adormecer as crianças”.

Alternativa E, incorreta: Não há foco no interlocutor.

Gabarito: D
17.(ENEM - 2009)

Confidência do Itabirano
Alguns anos vivi em Itabira.
Principalmente nasci em Itabira.
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.
Noventa por cento de ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e
[comunicação.

A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,


vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e
[sem horizontes.
E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,
é doce herança itabirana.

De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:


esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil,
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;
este orgulho, esta cabeça baixa...

Tive ouro, tive gado, tive fazendas.


Hoje sou funcionário público.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 88


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Itabira é apenas uma fotografia na parede.


Mas como dói!
ANDRADE, C. D. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2003.

Carlos Drummond de Andrade é um dos expoentes do movimento modernista brasileiro.


Com seus poemas, penetrou fundo na alma do Brasil e trabalhou poeticamente as
inquietudes e os dilemas humanos. Sua poesia é feita de uma relação tensa entre o universal
e o particular, como se percebe claramente na construção do poema Confidência do
Itabirano. Tendo em vista os procedimentos de construção do texto literário e as concepções
artísticas modernistas, conclui-se que o poema acima
a) representa a fase heroica do modernismo, devido ao tom contestatório e à utilização de
expressões e usos linguísticos típicos da oralidade.
b) apresenta uma característica importante do gênero lírico, que é a apresentação objetiva
de fatos e dados históricos.
c) evidencia uma tensão histórica entre o “eu” e a sua comunidade, por intermédio de
imagens que representam a forma como a sociedade e o mundo colaboram para a
constituição do indivíduo.
d) critica, por meio de um discurso irônico, a posição de inutilidade do poeta e da poesia em
comparação com as prendas resgatadas de Itabira.
e) apresenta influências românticas, uma vez que trata da individualidade, da saudade da
infância e do amor pela terra natal, por meio de recursos retóricos pomposos.

Comentários:

Alternativa A, incorreta: É um poema da segunda geração modernista, marcadamente mais


crítica e social.

Alternativa B, incorreta: A apresentação dos fatos passa pelo filtro subjetivo da memória do eu
lírico.

Alternativa C, correta: Carlos Drummond, no texto, prioriza a temática conflituosa entre o ser
em relação com o mundo que o cerca.

Alternativa D, incorreta: Pelo contrário: situa a poesia como parte de seu trabalho.

Alternativa E, incorreta: Não há traços românticos, pois o idealismo é abandonado.

Gabarito: C

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 89


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

18. (Estratégia Vestibulares – 2021)

Leia o texto a seguir, do poeta modernista Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), para
responder à próxima questão.

Congresso Internacional do Medo


Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços,
não cantaremos o ódio porque esse não existe,
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro,
o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das
[igrejas,
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos
[democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da
[morte,
depois morreremos de medo
e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e
[medrosas.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Sentimento do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012 (p. 20).

Sobre os aspectos formais e temáticos do poema, pode-se dizer:


a) O texto apresenta métrica única e exalta o sentimento de impotência do eu lírico diante
das transformações de sua realidade.
b) O texto é composto por versos livres e retrata uma mudança de posição do eu lírico em
relação ao que sua poesia deve tematizar: não mais o amor, e sim o medo.
c) O texto não possui versos brancos em sua forma e, além disso, opta por expressar aquilo
que se sente em um fluxo de consciência, registro em conformidade com os ideais da poesia
contemporânea.
d) O texto retrata a dor do eu lírico, cujo início se dá na constatação de que o mundo é brutal
e que, portanto, não se deve cantar o amor. Está em conformidade com o Romantismo
tardio.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 90


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

e) O texto reforça os neologismos da terceira geração modernista que, sendo


predominantemente regionalista, faz com que o eu lírico se volte para o memorialismo de
sua cidade natal.

Comentários:

Alternativa A: incorreta. O texto não apresenta métrica única ao longo dos versos. Há variação.

Alternativa B: correta – gabarito. O texto é composto por versos livres (sem métrica definida) e
retrata uma mudança de perspectiva do eu lírico. Não será cantado mais o amor, cantar-se-á o
medo. Isso porque se trata de um poema modernista, movimento artístico-literário que tende a
abandonar o idealismo amoroso romântico.

Alternativa C: incorreta. O texto possui versos brancos (sem rima) e, além disso, pertence ao
movimento literário modernista, não à poesia contemporânea.

Alternativa D: incorreta. O texto, como dito na alternativa C, pertence ao Modernismo e não ao


Romantismo.

Alternativa E: incorreta. Carlos Drummond de Andrade é um poeta da transição da segunda


para a terceira geração modernista. Além disso, tecnicamente, os neologismos (construções de
palavras novas) são um procedimento utilizado predominantemente por Guimarães Rosa,
escritor da terceira geração modernista, que caiu tanto na 1ª quanto na 2ª aplicação do vestibular
UNESP 2021.

Gabarito: B
Texto para as próximas questões:
Mãos Dadas
Carlos Drummond de Andrade

(Carlos Drummond de Andrade. Sentimento do Mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012)

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 91


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

19. (Estratégia Vestibulares – 2020)

A poesia Mãos dadas pode ser considera como representativa do estilo do autor, Carlos
Drummond de Andrade, pois
a) demonstra preocupação social, muitas vezes aliada a temas filosóficos ou metafísicos.
b) se constrói a parti de ironias e humor como forma de crítica à sociedade.
c) é muito introspectiva e filosófica, alternando entre a religiosidade e o erotismo.
d) apresenta aspectos memorialistas, além de jogos de som e musicalidade.
e) apresenta menor importância literária do que suas crônicas.

Comentários:

Alternativa A, correta: Pois esses são alguns dos traços mais importantes da poesia de
Drummond.

Alternativa B, incorreta: Pois não há ironia tampouco humor no poema em questão.

Alternativa C, incorreta: Pois isso seria uma característica de Vinícius de Moraes, não Drummond.

Alternativa D, incorreta: Pois jogos de som e musicalidade não são traços tão representativos
do autor.

Alternativa E, incorreta: Pois a produção poética de Drummond é considerada tão importante


quanto ou mais que sua produção de crônicas.

Gabarito: A
20. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Sobre o poema em questão é possível afirmar que


a) pertence à Primeira Geração Modernista, que tem como uma de suas características a
poesia espiritualista, com temas filosóficos.
b) pertence à Segunda Geração Modernista, que tem como uma de suas características a
poesia voltada para a crítica social.
c) pertence à Terceira Geração Modernista, cujo traço mais marcante é uma poesia de cunho
regionalista.
d) pertence à Literatura Marginal, o que se comprova pelos temas pouco elevados e a forma
poética livre.
e) pertence à literatura contemporânea, tendo como traço marcante os versos brancos e
livres, ou seja, sem métrica ou rima.

Comentários:

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 92


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Alternativa A, incorreta: Pois Drummond é um autor da Segunda Geração Modernista e a poesia


da Primeira Geração não é espiritualista.

Alternativa B, correta: Pois Drummond é um autor da Segunda Geração Modernista e uma das
características desse movimento é a poesia de cunho social.

Alternativa C, incorreta: Pois Drummond é um autor da Segunda Geração Modernista, cuja


poesia não se classifica como regionalista.

Alternativa D, incorreta: Pois Drummond é um autor da Segunda Geração Modernista e os temas


de sua poesia alternam entre o cotidiano e questões filosóficas/existenciais.

Alternativa E, incorreta: Pois ainda que essas características se apliquem, a poesia de Drummond
não é parte da literatura contemporânea.

Gabarito: B
21. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Sobre o poema Mãos Dadas, é correto afirmar que


a) nele, o eu-lírico desiste de sua atuação social ao afirmar que não cantará mais esse
mundo.
b) ainda que aparente um ar melancólico, é possível compreender laivos de esperança.
c) o eu-lírico nega o amor, ao afirmar que não é possível ter bons sentimentos no presente.
d) o eu-lírico busca uma fuga à realidade penosa do presente através da produção artística.
e) há um elogio à solidariedade, pois é ela que permite o surgimento do sentimento
amoroso.

Comentários:

Alternativa A, incorreta: Pois o poema aponta para a importância de olhar para o presente, mais
do que o passado e o futuro, o que não significa que o poeta não fará críticas.

Alternativa B, correta: Pois o poeta diz que mesmo taciturnos, os homens nutrem grandes
esperanças e é para eles que olhará em sua poesia.

Alternativa C, incorreta: Pois o poeta não aponta para a inexistência de bons sentimentos–já que
há esperanças –mas sim que não quer cantar as idealizações românticas, mas sim os homens do
presente.

Alternativa D, incorreta: Pois o eu-lírico usa a arte para compreender a realidade, não fugir dela.

Alternativa E, incorreta: Pois o poeta em nenhum momento aponta para o desejo de sentimentos
amorosos.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 93


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Gabarito: B
Leia a seguir o poema “Morte do leiteiro”, do poeta modernista Carlos Drummond de
Andrade (1902-1987) para responder às próximas questões

MORTE DO LEITEIRO

Há pouco leite no país,


é preciso entregá-lo cedo.
Há muita sede no país,
é preciso entregá-lo cedo.
Há no país uma legenda,
que ladrão se mata com tiro.
Então o moço que é leiteiro
de madrugada com sua lata
sai correndo e distribuindo
leite bom para gente ruim.
Sua lata, suas garrafa
se seus sapatos de borracha
vão dizendo aos homens no sono
que alguém acordou cedinho
e veio do último subúrbio
trazer o leite mais frio
e mais alvo da melhor vaca
para todos criarem força
na luta brava da cidade.

Na mão a garrafa branca


não tem tempo de dizer
as coisas que lhe atribuo
nem o moço leiteiro ignaro,
morados na Rua Namur,
empregado no entreposto,

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 94


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

com 21 anos de idade,


sabe lá o que seja impulso
de humana compreensão.
E já que tem pressa, o corpo
vai deixando à beira das casas
uma apenas mercadoria.

E como a porta dos fundos


também escondesse gente
que aspira ao pouco de leite
disponível em nosso tempo,
avancemos por esse beco,
peguemos o corredor,
depositemos o litro...
Sem fazer barulho, é claro,
que barulho nada resolve.

Meu leiteiro tão sutil


de passo maneiro e leve,
antes desliza que marcha.
É certo que algum rumor
sempre se faz: passo errado,
vaso de flor no caminho,
cão latindo por princípio,
ou um gato quizilento.
E há sempre um senhor que acorda,
resmunga e torna a dormir.

Mas este acordou em pânico


(ladrões infestam o bairro),
não quis saber de mais nada.
O revólver da gaveta

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 95


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

saltou para sua mão.


Ladrão? se pega com tiro.
Os tiros na madrugada
liquidaram meu leiteiro.
Se era noivo, se era virgem,
se era alegre, se era bom,
não sei,
é tarde para saber.

Mas o homem perdeu o sono


de todo, e foge pra rua.
Meu Deus, matei um inocente.
Bala que mata gatuno
também serve pra furtara vida de nosso irmão.
Quem quiser que chame médico,
polícia não bota a mão
neste filho de meu pai.
Está salva a propriedade.
A noite geral prossegue,
a manhã custa a chegar,
mas o leiteiro
estatelado, ao relento,
perdeu a pressa que tinha.

Da garrafa estilhaçada,
no ladrilho já sereno
escorre uma coisa espessa
que é leite, sangue... não sei.
Por entre objetos confusos,
mal redimidos da noite,
duas cores se procuram,
suavemente se tocam,

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 96


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

amorosamente se enlaçam,
formando um terceiro tom
a que chamamos aurora.
DRUMMOND, Carlos Andrade de. Morte do leiteiro. In: A rosa do povo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012 (p. 84).

22. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Acerca da técnica utilizada no poema, é INCORRETO inferir que


a) mais para o fim do verso, depois de já introduzida a personagem do leiteiro, o eu lírico
demonstra empatia com ele, em uma tentativa de aproximação.
b) é observado o emprego do prosaísmo, no sentido que se descreve uma situação do
cotidiano e uma personagem comum: o leiteiro.
c) no verso “Meu Deus, matei um inocente”, o eu lírico confessa seu crime e tenta se redimir
com o leiteiro.
o eu lírico frequentemente mostra-se intrometido, opinando quanto aos fatos que narra,
mediante expressões como: “é claro”, “é certo” e “sempre”.
no verso “Está salva a propriedade” há, ao menos, duas figuras de linguagem: o hipérbato e
a ironia.

Comentários:

Alternativa A, correta: Essa tentativa é estabelecida mediante o uso do termo: “meu leiteiro”. À
medida que vai narrando a história do leiteiro, o eu lírico vai compadecendo-se dele, pintando
todo um cenário para que sigamos o mesmo caminho de simpatia. No fim, a aproximação
também é lançada ao leitor, quando o eu lírico emprega a primeira pessoa do plural: “a que
chamamos aurora”.

Alternativa B, correta: Ao longo do poema, por mais que sejam nobres as ações do leiteiro e
sua postura trabalhadora, ele não é heroicizado, no sentido de que não é idealizado. Trata-se
de uma pessoa comum, um jovem tentando ganhar a vida.

Alternativa C, incorreta: Nesse verso, o eu lírico reproduz a fala de quem teria cometido o crime;
porém, ele em si não é o criminoso.

Alternativa D, correta: Expressões que se encontram nestes versos: “Sem fazer barulho, é claro
/que barulho nada resolve” e “É certo que algum rumor / sempre se faz”. Com isso, o eu lírico
revela-se subjetivo e parcial.

Alternativa E, correta: Hipérbato, pois há inversão na ordem direta (“A propriedade está salva”
→ “Está salva a propriedade”), a fim de enfatizar a importância do adjetivo “salva”. Ironia,
porque a propriedade parece ser mais valorizada do que a vida humana.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 97


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Gabarito: C
23. (Estratégia Vestibulares – 2020)

A prosopopeia é um recurso expressivo que ocorre quando se atribuem características


humanas a seres inanimados ou irracionais. Os versos nos quais ela é verificada são:
a) “Há no país uma legenda,
que ladrão se mata com tiro.”
b) “Então o moço que é leiteiro
de madrugada com sua lata
sai correndo e distribuindo
leite bom para gente ruim.”
c) “Sua lata, suas garrafa
se seus sapatos de borracha
vão dizendo aos homens no sono
que alguém acordou cedinho”
d) “E já que tem pressa, o corpo
vai deixando à beira das casas
uma apenas mercadoria.”
e) “Ladrão? se pega com tiro.
Os tiros na madrugada
liquidaram meu leiteiro.”

Comentários:

Alternativa A, incorreta: Legenda no caso é sinônimo de senso comum. Consiste em uma das
ironias drummondianas: como se todos os ladrões fossem necessariamente, invariavelmente,
pessoas más e a questão justiceira fosse um lema a ser seguido

Alternativa B, incorreta: Trecho narrativo, em que o eu lírico mostra um juízo de valor: as pessoas
que recebem o produto não são tão dignas assim da qualidade dele.

Alternativa C, correta: Também chamada de personificação. No caso, o barulho de latas, de


garrafas e até mesmo da galocha anunciam a presença do leiteiro. “Dizer” é uma ação humana
que está sendo atribuída a esses objetos.

Alternativa D, incorreta: A inversão entre “uma mercadoria apenas” e “uma apenas mercadoria”
no último verso dessa alternativa alerta para o fato de que o trabalho do leiteiro corresponde a
uma mercadoria, a um serviço pago. Ele paga seu trabalho com a própria vida, para que a
mercadoria, o leite, possa ser entregue confortavelmente nas casas. Embora nobre, pois propicia

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 98


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

alimento para pessoas antes que elas acordem, seu trabalho nem sempre é reconhecido. Não é
nem mesmo visto (invisivelmente, na calada da noite, o leite é entregue).

Alternativa E, incorreta: Repetição da tragédia já anunciada na primeira estrofe. Consiste em


uma ironia trágica.

Gabarito: C
24. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Nesse poema, o tom predominante do eu lírico é


a) trabalhador
b) denunciante
c) sedento
d) vingativo
e) parcimonioso

Comentários:

Alternativa A, incorreta: O trabalhador é o leiteiro, não o eu lírico.

Alternativa B, correta: Ou denunciador; o eu lírico começa o poema em tom de denúncia,


contando várias situações sociais do país: “Há pouco leite no país” e “Há muita sede no país”.
São constatações de necessidades que justificam as ações do leiteiro: acordar cedo, sofrer na
labuta do seu trabalho, inclusive correndo riscos. No fundo, narra-se como o leiteiro foi vítima
de um acidente no qual acaba perdendo a vida.

Alternativa C, incorreta: Cuidado: o eu lírico diz no poema que há sede no país, mas não
necessariamente se inclui entre aqueles que passam sede.

Alternativa D, incorreta: O poema termina com a imagem do sangue derramado pelo crime e
do leite carregado na profissão unindo-se no asfalto para formar um terceiro tom, o que não
representa necessariamente vingança. Pelo contrário, uma possibilidade vai se formando: “duas
cores se procuram / suavemente se tocam /amorosamente se enlaçam”.

Alternativa E, incorreta: Essa palavra significa “parco”, “econômico”, o que não vem ao caso.

Gabarito: B
Textos para as próximas questões:
Texto I
(...)
Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 99


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Uma flor ainda desbotada


ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde


e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
(“A flor e as Náusea” poema do livro Rosa do Povo, publicado em 1945)

Texto II
oficina irritada
Eu quero compor um soneto duro
como poeta algum ousara escrever.
Eu quero pintar um soneto escuro,
seco, abafado, difícil de ler.

Quero que meu soneto, no futuro,


não desperte em ninguém nenhum prazer.
E que, no seu maligno ar imaturo,
ao mesmo tempo saiba ser, não ser.

Esse meu verbo antipático e impuro


há de pungir, há de fazer sofrer,
tendão de Vênus sob o pedicuro.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 100


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Ninguém o lembrará: tiro no muro,


cão mijando no caos, enquanto Arcturo,
claro enigma, se deixa surpreender.

25. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Comparando a estilística e o aspecto formal dos poemas, assinale a alternativa correta.


a) Os dois poemas se valem do mesmo recurso de construção poética, diferem somente no
uso de figuras de linguagem, pois o “a flor e a náusea” se estrutura em torno de apenas uma
metáfora.
b) Percebe-se, nos dois poemas, o uso frequente do paralelismo sintático como elemento
mais importante do estilo de Carlos Drummond de Andrade.
c) No que diz respeito à forma, em “oficina irritada”, o poeta retorna à influência clássica,
enquanto, em “A flor e a náusea”, ele manifesta sua ligação forte com a primeira geração
modernista.
d) Nos dois poemas, o eu lírico se vale do mesmo procedimento: escolhe uma figura
alegórica e, em torno dela, constrói uma ambientação.
e) Os dois poemas expressam com clareza uma das características da poesia da primeira
geração modernista: fragmentação caótica de imagens.

Comentários:

Alternativa A, incorreta: O primeiro poema foi construído em verso livre, o segundo é um soneto

Alternativa B, incorreta: Nos dois, o poeta se vale de paralelismo, que se traduz por repetir um
mesmo verbo e mudar o objeto direto ou o sujeito, contudo, esse não é o elemento mais
importante dos poemas.

Alternativa C, correta: Em “oficina irritada”, o poeta se vale do soneto, forma clássica por
excelência; já a “Flor e a náusea” é um poema escrito em versos livres, traço próprio da primeira
geração modernista.

Alternativa D, incorreta: Em “A flor e a náusea”, a afirmação é verdadeira, pois o poema é


construído em torno da metáfora “flor”; no caso de “oficina irritada”, o poema se desenvolve
em torno do sujeito “soneto duro”, soneto não é uma metáfora.

Alternativa E, incorreta: No primeiro poema, a ambientação da flor é bem coerente, não há


fragmentação como se observa no segundo, no qual as imagens da última estrofe são
fragmentadas.

Gabarito: C
26. (Estratégia Vestibulares – 2020)

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 101


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Os poemas foram escritos em momentos diferentes da história do Brasil e da trajetória de


Carlos Drummond de Andrade. O primeiro foi publicado em 1945; o segundo, 1951.
A partir da leitura dos dois poemas, são feitas as seguintes observações.

I. O pessimismo do autor, expresso na feiura da flor, altera-se muito pouco se considerarmos


o reconhecimento do eu lírico de que seu verso é antipático.
II. Mesmo tomando como recorte da obra de Carlos Drummond somente os dois poemas, é
possível perceber uma mudança radical de objeto poético; no primeiro poema, o eu lírico
manifesta preocupação social; no segundo, demonstra sua obsessão em Claro Enigma, a
própria poesia.
III. O poema “oficina irritada” sintetiza um duplo movimento do eu lírico, uma poesia voltada
para si, que toma como matéria prima a própria angústia do poeta e o desafio de se fazer
uma poesia com um material tão antilírico.

Assinale a alternativa correta.


a) Somente as afirmações I e II são corretas.
b) Somente a afirmação II é correta.
c) Todas as afirmações são corretas
d) Somente a afirmação III é correta.
e) As afirmações I e III são corretas.

Comentários:

A afirmação I está incorreta. De 1945 para 1951, Carlos Drummond de Andrade abandona uma
perspectiva esperançosa, vinda da esperança de uma integração com o social. Em Enigma, o eu
lírico mergulha em suas angústias sem remissão. Isso se observa nos poemas. No primeiro, a flor
é metáfora da esperança; no segundo, o poema deve ser duro, sem esperança.

A afirmação II está incorreta. A poesia metalinguística sempre foi um tema de Carlos Drummond
e não é uma obsessão de Claro Enigma. Há vários temas no livro.

A afirmação III está correta. O poema difícil está expresso nos primeiros versos. O poeta quer
escrever algo difícil, antipoético. O motivo dessa opção é verificado pela leitura da obra.
Drummond utiliza seu balanço de vida como matéria angustiante da poesia.

Gabarito: D
27. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Os ombros suportam o mundo

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 102


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.

Tempo de absoluta depuração.


Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.


Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?


Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Os ombros suportam o mundo. Disponível em: https://tinyurl.com/y29zsn6z. Acesso
em: 23 out. 2020.

Drummond é um complexo poeta conhecido contraditoriamente tanto pelo seu pessimismo


quanto pela sua esperança. Em todo caso, seus poemas frequentemente lidam com forças
em choque. Então, nesse poema, o eu lírico:
a) acredita que o fato de proferir verbalmente certos mantras ajuda a superar situações
difíceis.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 103


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

b) valoriza a divisão social do trabalho, exaltando-a como solução possível contra a opressão.
c) honra a memória da abolição da escravidão, quando resgata ideais revolucionários.
d) acusa aqueles que não acolhem pessoas vulneráveis, como mulheres e crianças.
e) cerceia uma concepção de vida limitada às fantasias sem conexão com a realidade.

Comentários:

Alternativa A, incorreta: Pelo contrário: nem mesmo mais falar resulta em algum poder. Falar
“meu amor” não vai fazer o amor significar mais; pelo contrário, o eu lírico denuncia a inutilidade
desse sentimento em tempos que a humanidade parece ter se esquecido dele.

Alternativa B, incorreta: As mãos que tecem um rude trabalho representam a realidade


imponente que contrasta com olhos que não sabem mais chorar. Algum trabalho precisa ser
feito, ainda que sem emoção e sentimentalismo.

Alternativa C, incorreta: A liberdade não é tratada de maneira honrada. Pelo contrário, o eu lírico
impactado quando diz que nem mesmo na modernidade todos se libertaram. Isso porque há
muitas outras formas de escravidão para além da física.

Alternativa D, correta: Acusa o leitor (“não abrirás”) de recusar ajuda a vulneráveis, mas o texto
menciona “mulheres”; e também o mundo como pesa, como a mão de uma criança que pede
ajuda, que toca em ombros, nem sempre neles encontrando apoio. De que adianta envelhecer
em um mundo que não se importa com crianças?

Alternativa E, incorreta: “Cercear” significa impedir, no caso, uma vida limitada. A vida não é
limitada, ela é desmistificada; portanto, urgente, real, bruta.

Gabarito: D
28. (Estratégia Vestibulares – 2020)

Canção da moça-fantasma de Belo Horizonte


Eu sou a Moça-Fantasma
que espera na Rua do Chumbo
o carro da madrugada.
Eu sou branca e longa e fria,
a minha carne é um suspiro
na madrugada da serra.
Eu sou a Moça-Fantasma.
O meu nome era Maria,
Maria-Que-Morreu-Antes.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 104


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Sou a vossa namorada


que morreu de apendicite,
no desastre de automóvel
ou suicidou-se na praia
e seus cabelos ficaram
longos na vossa lembrança.
Eu nunca fui deste mundo:
Se beijava, minha boca
dizia de outros planetas
em que os amantes se queimam
num fogo casto e se tornam
estrelas, sem ironia.

(...)
ANDRADE, Carlos Drummond de. Sentimento de mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012 (p. 12)

O regionalismo foi uma vertente que impregnou não só a prosa modernista desse período,
como também a poesia. Esse traço pode ser verificado no(a):
a) relação amorosa entre os jovens namorados.
b) desaparecimento do traço idealista romântico.
c) assunção de um ponto de vista feminino pelo escritor.
d) superstição acerca de certas lendas locais.
e) morbidez ultrarromântica no tratamento da morte.

Comentários:

Alternativa A, incorreta: Não sabemos se são jovens. E, em todo caso, a moça é uma
assombração; não que ela seja, de fato, uma namorada, mas ela diz isso como se pudesse
assumir a forma de qualquer pessoa.

Alternativa B, incorreta: Cuidado: de fato, o último verso se propõe a expressar uma situação
“sem ironia”, o que seria um traço modernista típico; porém, não é ele que atesta o
regionalismo.

Alternativa C, incorreta: Atenção: esse procedimento também ocorre no poema, mas não é ele
o responsável por retratar o regionalismo.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 105


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Alternativa D, correta: Como é o caso de uma moça que morrera e volta para assombrar a
cidade, especificada já no título do poema.

Alternativa E, incorreta: A descrição cadavérica da mulher é para ressaltar seu caráter


supersticioso.

Gabarito: D
29. (Estratégia Vestibulares – 2020)

O lutador
Lutar com palavras
é a luta mais vã.
Entanto lutamos
mal rompe a manhã.
São muitas, eu pouco.
Algumas, tão fortes
como o javali.
Não me julgo louco.
Se o fosse, teria
poder de encantá-las.
Mas lúcido e frio,
apareço e tento
apanhar algumas
para meu sustento
num dia de vida. (...)
ANDRADE, Carlos Drummond de. O lutador. Disponível em: https://tinyurl.com/y857297q. Acesso em: 19 jun. 2020

Esse fragmento poético revela uma construção baseada no jogo de


a) simetria entre o esporte e a vida.
b) equiparação das palavras a seres humanos.
c) resiliência no esforço metalinguístico.
d) abatimento do poeta que apanha da vida.
e) loucura e caos provocados pela arte.

Comentários:

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 106


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Alternativa A, incorreta: A luta aqui não é entendida no sentido do esporte, mas sim da labuta
diária, do trabalho o qual representa a poesia para o poeta.

Alternativa B, incorreta: elo contrário: em sua selvageria indomável, as palavras são comparadas
a javalis.

Alternativa C, correta: Ainda há um jogo entre encarar a luta como substantivo concreto e
abstrato, pois geralmente se luta com algo físico e não com palavras. Na realidade, ainda pode-
se perceber a preposição “com” em sua ambiguidade, já que não se sabe ao certo se as palavras
são inimigas, oponentes, ou apenas um material. Em todo caso, o poema é metalinguístico,
porque fala do fazer poético, inclusive enquanto trabalho.

Alternativa D, incorreta: Isso até ocorre, mas é justamente o contrário: o poeta não se deixa
abater; levanta-se, luta para manter uma atitude série e compenetrada para continuar
trabalhando.

Alternativa E, incorreta: A loucura é um risco, mas o eu lírico se nega a se render a ela, o que
pode ser verificado no verso: “Não me julgo louco.”

Gabarito: C
30.(Estratégia Vestibulares – 2020)

Quadrilha
João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili,
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia completa. São Paulo: Nova Aguilar, 2002.

A poesia de Drummond, representante do Modernismo brasileiro, é caracterizada pela


variedade. No poema Quadrilha, percebe-se, como característica
a) temática amorosa, marca principal do Modernismo.
b) sintaxe rebuscada, marca principal da segunda geração.
c) temática filosófica, característica da primeira geração.
d) sintaxe oralizada, principal marca do Modernismo.
e) temática corriqueira, marca do Modernismo.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 107


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Comentários:

Alternativa A, incorreta: A temática amorosa não é a principal marca do Modernismo, uma vez
que a temática dessa estética é variada e tenta se ocupar dos processos menos sublimes. A
Literatura, durante muito tempo, se ocupou de temas mais sublimes, como os sentimentos e as
percepções dos seres humanos sobre a vida, e temas filosóficos. No Modernismo, por sua vez,
esses temas passam a não ser exclusivos.

Alternativa B, incorreta: Não há rebuscamento na linguagem no caso em questão. O


Modernismo, por pregar a liberdade em todos os sentidos literários, também permitia, como na
obra de Vinícius de Moraes, a utilização de formas mais fixas de poesia, com uma linguagem
rebuscada. O fato em questão é que essa não era uma obrigatoriedade da construção poética
da época.

Alternativa C, incorreta: A temática filosófica foi aquela com que, durante a maior parte de nossa
história literária, nossos autores se prenderam. No caso da poesia em questão, não temos uma
temática filosófica, senão um tema do cotidiano, propondo uma análise nada ortodoxa do amor.
Além disso, o item peca por apresentar a ideia de que a primeira geração do Modernismo se
prendia a essa temática.

Alternativa D, incorreta: É interessante notar que, no texto em questão, a linguagem não é


extremamente rebuscada, mas também não pode ser entendida como uma linguagem
oralizada. É uma linguagem comum, mas que respeita as normas da gramática da língua
portuguesa. Entenda que, em outros casos, Drummond claramente coloca uma linguagem
oralizada.

Alternativa E, correta: Uma das marcas mais importantes do Modernismo, em especial aquele
produzido por Drummond, é a utilização de uma temática menos literária, no sentido de que,
durante muito tempo, a Literatura se ocupou dos temas filosóficos e sentimentais, considerados
sublimes. Quando há o advento do Modernismo, uma de suas principais quebras, em
concomintância com a linguagem mais popular, é a temática. Podemos afirmar, sem medo
algum, que Drummond construiu uma obra extremamente variada quanto à temática, ainda que,
em muitos momentos, ligada ao pensamento mais clássico.

Gabarito: E

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 108


ESTRATÉGIA MILITARES – LITERATURA

Considerações finais
Qualquer dúvida estou à disposição no fórum ou Instagram!

Prof.ª Celina Gil


Professora Celina Gil @professoracelinagil

Versão Data Modificações


1 05/04/2022 Primeira versão do texto.

AULA 07 – ANTOLOGIA POÉTICA DE CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE 109

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