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Psicodrama: fenomenologia

e existencialismo
MSc. Priscila Tomasi Torres
Psicodrama: fenomenologia e existencialismo

O método psicodramático é uma abordagem terapêutica fundada na


representação dramática como meio para a expressão de conflitos e emoções.
Nasceu como uma reação a métodos psicoterápicos unicamente baseados na
verbalização e une a ação à palavra.
Psicodrama: fenomenologia e existencialismo

O psicodrama foi idealizado e


desenvolvido pelo médico romeno Jacob
Levy Moreno (1889–1974) a partir dos
seus trabalhos com diferentes grupos,
incluindo uma companhia teatral que
fundou.
Psicodrama: fenomenologia e existencialismo

O psicodrama é uma das terapias psicológicas de orientação


fenomenológica-existencial, ou seja, é uma terapia vivencial. A ideia básica é
ajudar as pessoas a experimentar e a viver a vida de forma mais lúdica, por meio
de técnicas de dramatização. O psicodrama auxiliaria, assim, o indivíduo a atingir
uma existência autêntica, espontânea e criativa.
Psicodrama: fenomenologia e existencialismo

René Marineau (2013) em seu texto intitulado: “A integração da herança de


Moreno”, afirma que Moreno “trabalhou para diferenciar-se de Sigmund Freud
ou Kurt Lewin”, assim podemos inferir que não se enquadra no interpretativismo.
Na medida em que afirma que “Moreno criou uma nova forma de olhar para
a raça humana: seu foco era o relacionamento entre as pessoas, os métodos
centrados na ação eram suas principais ferramentas”.
Psicodrama: fenomenologia e existencialismo

O Psicodrama é ainda quase desconhecido na academia e do mundo científico em


geral, não obstante seu criador tenha dedicado uma vida a torná-lo amplamente conhecido.
J. L. Moreno construiu um novo olhar para os problemas a partir de seus estudos
sobre religião, teoria evolucionista de Spencer, proposição da revolução social de Marx,
influenciado pelo hassidismo e por Kierkegaard, aproximando-se filosoficamente de Buber,
Bergson, Dewey, Merleau-Ponty, Sartre, Foucault, Guattari e Deleuze e dialogando com as
idéias de Capra, Morin, Maturana-Varela e Paulo Freire (Diretoria de Ensino e Ciência
[DEC], Gestão 2002-2004).
Biografia de Moreno
J. L. Moreno

➔ Moreno nasceu em 06/05/1889 na cidade de


Bucarest - Romênia;

➔ Aos 5 anos de idade mudou-se com a família


para Viena - Austria;

➔ Até 1920 a vida de Moreno teve característica


religiosa marcante;

➔ Formou-se em medicina em 1917;

➔ Morreu em Becon (EUA) em 1974;


J. L. Moreno

Infância:

➔ Ele e várias outras crianças brincavam de “deus e anjos” e se autodenominava


“menino-deus Moreno” - Moreno refere-se a este episódio com humor dizendo
que estava aí embrião de sua idéia da espontaneidade como centelhas divinas
em cada um de nós;

➔ Sua família era de origem judaica e Moreno foi criado através das influências do
Hassidismo.
J. L. Moreno

➔ Até 1920 a vida de Moreno teve uma característica religiosa marcante.


➔ Entre 1907 e 1910, Moreno e alguns colegas formaram a “Religião do
Encontro” - expressando sua rebeldia diante dos costumes ortodoxos
estabelecidos, usavam barbas e viviam pelas ruas à maneira dos mais
pobres;
➔ Nesta época Morena já fazia jogos de improviso com as crianças;
➔ Em 1909 entra no curso de Medicina;
J. L. Moreno

➔ Em 1912 já era interno da Clínica Psiquiátrica de viena;

➔ Neste mesmo ano (1912) conhece Freud num curso de verão;

➔ Em 1914 realiza um trabalho com prostitutas vienenses utilizando-se de técnicas grupais,


conscientizando-as de sua situação e favoreceu a criação de um sindicato para elas;

➔ Em 1916 trabalhou num campo de refugiados tiroleses, observando as interações


psicológicas entre os elementos dos grupos;

➔ Em 1917 formou-se em Medicina;


J. L. Moreno

➔ De 1917 até 1920 colaborou nos escritos da revista existencialista Daimon Maganzine,
juntamente com Martin Buber, Max Scheller, Jakob Wasserman, Kafka e outros;

➔ Em 1918 tem contato direto com o filósofo Martin Buber, outro grande autor das teorias
fenomenológicas-existenciais;

➔ Em 1920 publicou “O testamento do Pai”, onde trabalha a ideia das “possibilidades


ilimitadas para a investigação da espontaneidade no plano experimental”;

➔ Em 1921 fundou o Teatro Vienense da Espontaneidade, onde desenvolveu suas ideias da


Psicoterapia de Grupo e do Psicodrama;
J. L. Moreno

➔ A primeira sessão Psicodramática oficial aconteceu em 1º de abril de 1921.

➔ Moreno considera que é nesta fase que se dedicou ao teatro que houve uma transição entre
sua fase religiosa para a científica;

◆ Moreno refere: “superada a fase religiosa, em vez de fundar uma seita, ingressar num
mosteiro, ou criar uma teologia, aproveitou sua idéia da “espontaneidade como
natureza primordial, que é imortal e reaparece em cada nova geração” para se rebelar
contra o falseamento das instituições sociais (família e igreja) e à robotização do ser
humano.
J. L. Moreno

Caso Bárbara:

1922 - uma das atrizes do grupo teatral de que o autor participava, que se propunha a representar temas
do cotidiano. Bárbara era sempre escalada para papéis ingênuos e românticos. Conheceu o seu marido
nesse contexto e, após o casamento, ele reclamava do quanto ela se transformava em família, assumindo
um caráter muito difícil e raivoso. Moreno, então, convidou o casal a encenar papéis diferentes, Bárbara
assumindo o de uma prostituta e o marido contracenando com ela. Assim, o casal conseguiu aproximar-se
dos conflitos e resolver as discordâncias. A partir das encenações, eles desenvolveram espontaneidade e
personificaram conteúdos significativos dos seus conflitos, conseguindo encontrar soluções para eles. O
teatro da espontaneidade tornou-se, assim, teatro terapêutico (SEMINOTTI, 1997).
J. L. Moreno

➔ No período vienense, Moreno conviveu com a


ascensão da psicanálise freudiana, forte corrente
teórica da psicologia e método psicoterapêutico.
Moreno criticava as abordagens individuais de
psicoterapia e há, inclusive, registros de uma
divergência pessoal com Sigmund Freud.
J. L. Moreno

➔ Em 1925, transferiu-se para Beacon, nos Estados Unidos, onde continuou trabalhando e
desenvolvendo as suas teorias e práticas psicoterápicas grupais.

➔ 1931 - introduz o termo Psicoterapia de Grupo e este fica sendo o ano verdadeiro do início da
Psicoterapia de Grupo Científica;

➔ Em 1932, Moreno lançou as bases da sociometria científica e do sociodrama. O método


socionômico é composto (MARINEAU, 1996):

◆ pela sociodinâmica, que é a teoria dos papéis;

◆ pela sociometria, mapeamentos sociais, por meio do teste sociométrico;

◆ pela sociatria, que envolve sociodrama, jogo dramático e psicodrama.


J. L. Moreno

➔ Moreno considerava o advento da Psicoterapia de Grupo, do Psicodrama e da


Sociometria como a terceira revolução psiquiátrica, após a primeira com Philippe
Pinel em 1772, e a segunda com a Psicanálise de Freud;

➔ A última etapa de sua vida foi marcada pelo diálogo com terapeutas de outras linhas,
visando esclarecer os fundamentos de sua proposta como pesquisador e
psicoterapeuta;

➔ Moreno morre em Beacon em 14 de maio de 1974, aos 85 anos de idade.


J. L. Moreno

Os biógrafos, especialmente René Marineau (1996), e os seguidores de


Moreno concordam que ele era uma figura controversa, inquieta e dissidente,
mas, ao mesmo tempo, criativa e revolucionária.
Inclusive, a sua tumba recebeu a epígrafe “Aqui jaz aquele que abriu as
portas da psiquiatria à alegria”.
Psicodrama: teoria
PSICODRAMA

O psicodrama nasceu como uma abordagem sócio-psicoterápica


construída por Jacob Levy Moreno (1889-1974) na primeira metade do
século passado.
Apesar de ser médico, Moreno sempre foi muito implicado com as
questões referentes às relações sociais e, ao mesmo tempo, envolvido com
a arte.
PSICODRAMA

Podemos afirmar que o psicodrama é uma abordagem que se situa na interface


entre a arte e a ciência, mantendo os benefícios de ambas.
Foi definido pelo seu criador como:

“o método que estuda as verdades existenciais através da ação, pois


em grego, etimologicamente, a palavra “drama” significa “ação”.
PSICODRAMA

Surgiu como uma reação aos


métodos individualistas e
racionalistas predominantes e
privilegiou o estudo do homem em
relação, como um ser bio - psico -
social e cósmico.
BASES FILOSÓFICAS

As bases filosóficas do psicodrama encontram-se na filosofia


existencial-fenomenológica, pois Moreno recebeu influência de Henri
Bérgson, Martin Buber, E. Husserl e F. Nietzsche, entre outros.
Mas, também teve forte influência da religião e do teatro na sua vida e
obra.
BASES FILOSÓFICAS

O psicodrama é uma das terapias de base fenomenológico-existenciais,


tanto quanto outras terapias vivenciais, como é exemplo também a
gestalt-terapia.
Estas abordagens vivenciais têm como base ajudar o cliente a experienciar
a sua existência, buscando a compreensão fenomenológica do ser existente.
Partem do princípio de que o homem é construtor de si próprio e do seu mundo.
BASES FILOSÓFICAS

O psicodrama busca fazer o


indivíduo alcançar uma existência
autêntica, espontânea e criativa.
Nas abordagens vivenciais, a
técnica e a teoria são secundárias em
relação à pessoa e à importância da
relação terapeuta e cliente.
BASES FILOSÓFICAS

Nas abordagens fenomenológico-existenciais busca-se o


desenvolvimento da intuição, da liberdade e da sensibilidade; não se utilizam
enquadramentos diagnósticos psicopatológicos.
Vê-se o “neurótico” como alguém que ainda não encontrou seu caminho
de crescimento, ou seja, que se submeteu às conservas culturais, cristalizou
papéis e deixou de ser espontâneo criativo, perdeu o sentido da sua vida.
BASES FILOSÓFICAS

Para o psicodrama, o “neurótico” tem dificuldade de viver o aqui - e –


agora, o momento, pois falsifica o fluxo das suas vivências.
Os existencialistas e psicodramatistas concebem o homem como um
ser inacabado, em eterno devir.
BASES FILOSÓFICAS

Segundo Gonçalves et ali (1988:39):

As psicoterapias de base fenomenológico-existenciais procuram, a partir da


análise existencial de Ludwig Binswanger (1881-1966), que por sua vez
inspirou-se em Freud e Heidegger, o sentido da vida e da luta do homem (...).
Pretendem ter uma dimensão maior, além dos níveis psicológico e
psicopatológico, estabelecendo como meta a busca de referências éticas,
espirituais, filosóficas e axiológicas. Surgiram como oposição ao
determinismo das terapias chamadas científico-naturalistas ou
explicativo-causais.
BASES FILOSÓFICAS

Moreno pretendeu que cada sessão psicodramática fosse uma experiência


existencial.
Através do discurso Moreniano, podemos encontrar os conceitos básicos
da fenomenologia existencial, tais como: existência, ser, temporalidade (o aqui -
e - agora), espaço, encontro, liberdade, projeto, percepção, corpo, imaginário,
linguagem, sonhos, vivência, etc.
PSICODRAMA

Para Moreno, "uma resposta


provoca cem perguntas".
Por ser um método aberto, não se
conclui que o método psicodramático seja
caótico e desordenado, mas pelo contrário,
ele permite acompanhar um mundo em
constante movimento de criação
(GONÇALVES et ali, 1988, p.28).
PSICODRAMA
Segundo Gonçalves et al (1988), a história da obra de Moreno é marcada por quatro
momentos criativos:

1) religioso-filosófico;

2) teatral e terapêutico;

3) sociológico-grupal;

4) momento de organização-consolidação.
PSICODRAMA

Momento religioso-filosófico:

É quando, inspirado pela sua religião (o hassidismo) lança a teoria do ser


(o seinismo ou existencialismo heroico); desenvolve nessa época o teatro
infantil (1911), encenações infantis (1910-1914), o trabalho com prostitutas
vienenses e assiste aos refugiados tiroleses da primeira guerra.
PSICODRAMA
Momento religioso-filosófico:

Moreno (1974, p. 21) cita Espinosa como o iniciador do processo de "desendeusamento" do mundo, seguido
por outros filósofos como Nietzsche e Marx. Entende-se "desendeusamento" como o processo de descrença do
Deus criado pelo desejo humano de um Pai doador e punitivo. Assim como Deus criou o homem, este cria "deuses"
segundo suas próprias projeções. Vale lembrar as concepções divinas das cinco grandes religiões, originadas com
base em substratos socioculturais existentes em diferentes períodos históricos: judaísmo, cristianismo, islamismo,
budismo e hinduísmo.
Em outro momento, Moreno (1991, p. 57) elogia o filósofo Bergson, que se inspirou em muitos conceitos
espinoseanos, pelo fato de:

(...) introduzir na filosofia o princípio da espontaneidade [embora raramente empregasse a palavra],


numa época em que os mais destacados cientistas sustentavam teimosamente que tal coisa não existia na
ciência objetiva.
PSICODRAMA

Momento teatral terapêutico:

O segundo momento da produção moreniana caracteriza-se pela


criação do psicodrama, em abril de 1921 e a publicação do livro “O Teatro
da Espontaneidade”.
Neste período ele estava envolvido com as experiências teatrais.
PSICODRAMA
Em seu livro, Moreno apresenta uma
visão completa e multifacetada do teatro da
espontaneidade. Além de oferecer ao leitor
aspectos teóricos e práticos, traz comentários
de contemporâneos de Moreno e aponta suas
principais contribuições para a psicoterapia
moderna. Fundamental para todos os
psicodramatistas que desejam conhecer a
fundo as ideias do mestre.
PSICODRAMA

Momento sociológico-grupal:

Já o terceiro momento criativo é marcado pela preocupação social e


com os grupos.
PSICODRAMA

Momento organização-consolidação

Por fim, em seu quarto momento, Moreno cria e consolida a teoria da


socionomia, pois assim denomina todo o seu conjunto de contribuições
(GONÇALVES, et ali, 1988).
PSICODRAMA
Os quatro períodos criativos vividos pelo fundador do psicodrama podem ser descritos da
seguinte forma:

● Primeiramente, Moreno buscava através da fé uma relação harmoniosa com Deus,


identificando a espontaneidade e a potência criativa como formas de superação de doenças.
● Com o momento teatral, ele trará a catarse como importante veículo de re-significação.
● A terceira fase, é marcada pela necessidade de Moreno submeter-se aos padrões métricos
pragmáticos, buscando ser reconhecido no campo da psicologia social.
● No quarto e último momento ele estava preocupado em consolidar um corpo doutrinário e
dialogava com outras abordagens psicoterápicas (op.cit.).
PSICODRAMA

A teoria socionômica de Moreno:

Os principais ramos da teoria


socionômica são: a socionomia, a
sociodinâmica, a sociometria e a
sociatria.
PSICODRAMA

Socionomia: Sociodinâmica:
como a totalidade da obra é a parte da socionomia que
Moreniana, significa o estudo das estuda o funcionamento das
leis que regem as relações humanas; relações interpessoais (seu principal
método é o role playing);
PSICODRAMA

Sociometria: Sociatria:
estuda a estrutura destas que é a terapêutica das

relações e a mensuração de relação relações sociais, onde encontramos


o psicodrama, a psicoterapia de
entre as pessoas (seu principal
grupo e o sociodrama.
método é o teste sociométrico).
Psicodrama: fenomenologia e existencialismo

Próxima aula:

➔ Principais conceitos:
◆ espontaneidade, criatividade e sensibilidade;
◆ teoria dos papéis;
◆ matriz de identidade;
◆ a prática psicodramática
Referências bibliográficas

➔ BERNARDES, Márcia Pereira; SILVA, Narbal. Episteme do Sociodrama na Revista Brasileira de


Psicodrama. Rev. bras. psicodrama, São Paulo , v. 24, n. 2, p. 47-57, dez. 2016 . Disponível em
<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-53932016000200006&lng=
pt&nrm=iso>. http://dx.doi.org/10.15329/2318-0498.20160019.

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