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Emprego x Empregabilidade

Carlos Stempniewski*

No contexto atual, os negócios e as oportunidades precisam de ser repensados,


bem como cada país, cada sociedade, cada economia

Em setembro de 2008, os paradigmas do mercado financeiro desmoronaram-se e a imposição de um


novo paradigma tornou-se a determinante que definirá as economias vencedoras deste século. O
desafio que se coloca é o de esquecer o passado recente, caso estejamos dispostos a agir proativamente
perante o atual cenário. Deixem de lado as estatísticas dos “últimos doze meses”. Foquem-se nos novos
produtos e nos segmentos de clientes. A necessidade de mudança é o grande desafio em cada manhã.
Os negócios e as oportunidades precisam de ser repensados, bem como cada país, cada sociedade, cada
economia. Precisamos de reencontrar as nossas raízes e de recriar uma identidade, preparando-nos
para um futuro diferente. Precisamos de lançar as bases de algo inusitado, diferente de como
imaginávamos que seria este e os próximos anos das nossas vidas.

O emprego é a maior preocupação. A sua existência está vinculada à de um mercado que consuma o
que se produz. A mercadoria parada passa a stock e tem um custo financeiro médio próximo de 60% ao
ano. Sobre os bens produzidos, comercializados ou não, recaem quase 40% de impostos. Portanto, se
produzir para além do consumo, o banco e o governo apropriam-se do “capital de giro” da empresa. Por
isso, juntamente com os sindicatos, eles não querem que pare de produzir.

Existe uma falsa percepção de que o empresário demite trabalhadores como consequência de um
oportunismo predador; é preciso lembrar que, ao dispensar um trabalhador, a empresa perde os
investimentos em formação e recua na finalidade de criar uma cultura organizacional e desenvolver o
espírito de equipa, que custa muito tempo e dinheiro. Os ex-funcionários levam conhecimentos de
processos de produção, detalhes de negociação, estratégias de mercado, políticas de preços, redes de
relacionamento com clientes. Há, ainda, os custos trabalhistas. Ou seja, a ninguém interessa desfazer-
se do seu quadro funcional.

O BNDES está a oferecer R$ 166 bilhões às empresas que criem empregos. Dois pontos precisam de ser
esclarecidos. Em primeiro lugar, o dinheiro vem do governo, mas o risco é do banco que avaliza a
operação. O agente financeiro só aceita projetos de empresas que não oferecem riscos. As exigências
afastam a maioria das pequenas e médias empresas. Esta linha tem destino certo para as grandes
empresas dos setores mineiro, do petróleo e das infraestruturas. Fazendo um paralelo, o plano de
Barack Obama prevê criar três milhões de empregos com investimentos em saúde, educação, energia e
infraestruturas. Será que nos Estados Unidos os setores geradores de empregos são diferentes dos do
Hemisfério Sul?

O segundo ponto a ser lembrado é que 80% do desemprego, recente, ocorreu no interior do Estado de
São Paulo. Os setores priorizados pelo BNDES não têm atuação destacada na região. As áreas que
tinham impacto positivo no PIB agora lideram as demissões, a saber, química, calçados, mobiliário,
material de transporte, têxtil, vestuário, agricultura, comércio, alimentos e bebidas, entre outras.
Desconhece-se o que o governo pensa em fazer para corrigir as distorções que se acumulam nestes
setores.

A popularidade de um governo sustenta-se através de resultados concretos. Alimentar o marketing


económico é estimular os sonhos e, a longo prazo, não conduz a maior empregabilidade. O cenário
económico degrada-se diariamente, o que tem levado governo, sindicatos e empresas ao enfrentamento
crescente. Em dezembro de 2008, foram eliminadas 655 mil vagas formais, mais do que no pico da
crise da maior economia do planeta, no mês de novembro, quando foram fechadas 584 mil vagas.

Empregabilidade representa a capacidade de um país manter a sua população ocupada e produtiva.


Nos últimos 20 anos não exercitamos de modo sistemático o planeamento de longo prazo. Ao invés
disto, os nossos governantes acreditaram que os planos económicos, os programas de privatização e de
aceleração e a capacidade criativa e negocial de nossa classe empresarial pudessem substituir essa
prática. Falta-nos um projeto de futuro. Na crise, os ministros da área económica viajam. O governo e
os sindicatos restringem a discussão a dogmas ideológicos, tais como a luta de classes e a posse do
capital.

Precisamos deixar de lado a nossa retórica de buscar culpados imaginários. Antes era o Bush; agora é o
Obama. Imaginar que alguém acumule stock para preservar empregos é uma utopia. A afirmação de
que no passado a produção cresceu e se trabalhou loucamente neste país não quer dizer que a ordem
das coisas não se possa inverter. O lucro do passado já foi distribuído pelos acionistas, pagou juros do
capital de giro, foi recolhido pelo governo como impostos, foi reinvestido no negócio, está retido como
reservas obrigatórias da lei e outras ações. É ausência de cultura administrativa imaginar que o
dinheiro oriundo do resultado operacional das empresas ficou parado e que agora pode sustentar um
quadro de pessoal inerte.

Enquanto discursamos e procuramos culpados, nos Estados Unidos não se fala de classes, procura-se a
soma dos atores e não a sua divisão e as equipas do governo são multipartidárias. Sabemos que
qualquer equipa que esteja na origem de uma crise dificilmente encontrará a saída. Precisa de ser
mesclada com novas cabeças, ideais e competências. As equipas devem ser constituídas com base na
meritocracia e não por congruência ideológica.

O clientelismo político e social tem atrasado o desenvolvimento do Brasil. Precisamos de introduzir o


DNA da competência na gestão pública. Só assim conseguimos mudar esse jogo. O País só poderá sair
da crise quando começar realmente a atacar a origem dos seus problemas e deixar de fazer apenas
marketing económico. A criação de um ambiente de empregabilidade exige lideranças com o domínio
de conceitos básicos de contabilidade, custos, capital de giro, investimentos, formação de stocks,
retorno do capital, planeamento e orçamento, entre outros aspectos. Chega de improviso e palpite!

*Carlos Stempniewski, mestre pela FGV, administrador e consultor, é professor das Faculdades
Integradas Rio Branco.

Disponível em:
http://www.dicasprofissionais.com.br/dicas/default4.asp?s=artigos2.asp&id=48&titulo=Emprego
%20x%20Empregabilidade

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