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As imagens de Jesus Cristo

(Agamenon Magalhães Júnior)

Q
uando se fala em Jesus Cristo, as mais diversas imagens e definições de comportamento
se apresentam. Em geral, as pessoas costumam pensar no Filho de Deus conforme a
tradição lhes transmite: um homem alto, bonito, louro, de barba bem-feita e com
proporções faciais simétricas. Um verdadeiro galã de filme americano.
Outras opiniões a respeito de Jesus também têm espaço garantido no imaginário
popular. No Novo Testamento,
Testamento, só pra começar, a forma com que os quatro evangelistas
(Mateus, Marcos, Lucas e João) O descrevem é bastante diferente e diverge em alguns
pontos. Num determinado Evangelho,
Evangelho, o autor expõe o Salvador como um homem simples,
com a pobreza subentendida (e enfatizada) do nascimento à crucificação. De pés e roupas
sujos – coisa comum à época e à região. Essa imagem dEle serve de modelo para que a
imensa população pobre do mundo se identifique com Jesus no sofrimento, na perseverança
ou na recompensa natural dada aos miseráveis.
Noutro Evangelho,
Evangelho, com toda pompa do mundo, Jesus tem características de rei. A
ostentação atribuída ao biografado torna-se visível. As palavras do evangelista O relatam com
a altivez majestática digna de quem sabe que é o rei do mundo e tem poderes infinitos.
Quando penso neste Cristo, vejo-O com uma roupa de tecido nobre, com uma áurea
indicadora de Sua santidade, de pés limpíssimos, e quase flutuando de tanto poder. Uma
imagem para a aristocracia poderosa do mundo.
Agora, diga-se: esses perfis biográficos de Cristo feitos pelos evangelistas têm aspectos
distintos, mas não se anulam, até acho que as palavras convergem para a harmonia da
história da cristandade.
Os historiadores já deram a Cristo faces bastante diferentes daquelas que estamos
acostumados a ver em pinturas, livros, quadros ou filmes. Os literatos, entretanto, são os
“críticos” mais ferrenhos das convenções cristãs. Os dois livros que mais irritaram o Vaticano
foram A Última Tentação de Cristo,
Cristo, do pensador grego Nikos Kazantzakis, e O Evangelho
Segundo Jesus Cristo,
Cristo, do ateu português José Saramago.
Em ambos os livros é mostrado um Jesus mais “humano” do que “divino”, mais
próximo de uma pessoa comum do que daquela figura onipresente escrita nos livros
sagrados, tal qual o Filho do Todo-Poderoso! A ênfase no aspecto humano do Galileu é o
objetivo dos livros; neles se vê um Jesus pecador, duvidando da própria missão terrena ou de
Sua capacidade de executá-la da forma correta. Kazantzakis descreve com propriedade
literária a paixão de Jesus por Maria Madalena, as relações sexuais tórridas e, por
consequência, a Sua felicidade por ter sido pai. O ápice da narração acontece quando Jesus
amaldiçoa a Deus (Seu Pai) por Ele ter permitido que Seu filho com Madalena morresse.
Não preciso dizer que insurreições por causa dessa visão “mundana” de Cristo
pipocaram em todo o mundo. Saramago, no que diz respeito à provocação, também não ficou
atrás; o autor ganhou prestígio literário com o livro sobre a vida de Jesus na mesma
proporção da repulsa que lhe atribuíram os religiosos do mundo.
Ao me lembrar de Cristo, não consigo formular uma imagem fixa ou tradicional, em
parte por causa de um filme, o clássico eterno Ben-Hur – produção cinematográfica de 1959,
com Charlton Heston no papel principal de um judeu que se encontra algumas vezes com
Jesus Cristo.
Eu me recordo de ter assistido ao filme pela primeira vez com meu pai. O curioso é que
ele me disse: “Olha, filho, esse filme é muito bom. Nele aparece Jesus”. Fiquei o filme todinho
esperando ver a “face” de Cristo – que nunca aparece. Uma cena marcante da película se
passa quando Judah Ben-Hur está sendo levado às galés. Aprisionado como escrevo em pleno
deserto, ele é proibido de beber água. Ao tentar saciar a sede de qualquer jeito, o centurião
logo faz gesto para chicoteá-lo, e é impedido apenas pela “presença” silenciosa de Jesus. A
cena é muito bem-feita. E é nela que eu penso quando me vem à mente a imagem do
Redentor.
“Jesus como personalidade histórica concreta continua a ser um estranho à nossa
época, mas o seu espírito oculto em suas palavras é conhecido pela sua simplicidade e a sua
influência é direta”, escreveu o teólogo Albert Schweitzer, em A procura do Jesus Histórico.
Histórico.
Mais importante do que ir à procura da fisionomia de Cristo, coisa praticamente
impossível de a ciência conhecê-la, cabe ao homem se conscientizar da “presença” do
Salvador. Tê-Lo pendurado num quadro no canto mais nobre da sala talvez seja algo bom,
isso nos inspira segurança; sentir Sua presença em cada minuto da vida, mesmo sem
sabermos como seria Seu semblante, é melhor ainda.

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