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EQUIPE MULTIDISCIPLINAR PARA A

EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS

Descolonizando o Currículo e Nossa Prática Pedagógica

Texto de Estudo – Módulo 1


Histórico Sobre a Implementação das Equipes
Multidisciplinares para a Educação das relações
Étnico-Raciais na Educação Paranaense e os Vinte
Anos da Promulgação da Lei 10.639/2003

Gizele Cristiana Carneiro

Técnica-pedagógica do Departamento de Educação


Inclusiva, Coordenação da Diversidade e Direitos
Humanos, Equipe de Educação das Relações Étnico-
Raciais e Escolar Quilombola da Secretaria de
Estado da Educação do Paraná. Professora de
Língua Portuguesa da rede Estadual de Ensino e
Mestra em Educação pela Universidade Federal do
Paraná.
Um (re)começo de conversa

Data de 27 de agosto de 2010 a normativa que estabeleceu a


composição das Equipes Multidisciplinares para a Educação
das Relações Étnico-raciais (EMERER). A Resolução de
número 3399, alterada pela Resolução N.º 807/2023 -
GS/SEED, editada pela Secretaria de Estado da Educação
(SEED) assume - junto ao movimento negro e aos demais
grupos interessados nas demandas raciais - o compromisso
de efetivar a Lei 10.639/2003 e, posteriormente, a Lei
11.645/2008, as quais modificaram a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação (LDB/1996) tornando obrigatório o ensino de
História e Cultura Afro-brasileira, Africana e Indígena nas
instituições de educação.
Configurada como uma política pública educacional de
estado, de composição e funcionamento obrigatórios em
todas as escolas da rede pública estadual, as Equipes
Multidisciplinares para a Educação das Relações Étnico-
Raciais - EMERER se constituem como espaços de reflexão,
estudo e elaboração de ações que visem minimizar as
práticas racistas do/no ambiente escolar e, mais que isso,
desconstruir narrativas colonizadoras as quais ainda
produzem o apagamento sistemático da participação dos
povos originários e dos povos africanos e seus descendentes
na constituição do país.

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Retomar o histórico de implementação desta política
pública no estado do Paraná ao mesmo tempo em que se
pondera sobre os 20 anos da Lei 10.639/2003, colabora para
que possamos nos compreender - educadoras/es,
funcionárias/os e estudantes - atores essenciais na
efetivação da mesma, visto que o palco de sua atuação é a
escola. Por esse motivo,
[...] pressupõe que a/o educadora/or apresente uma
postura ativa, comprometida, aberta para a
aprendizagem e, sobretudo que reconheça sua
importância no processo de construção de ações
pedagógicas cotidianas antirracistas, e que sua ação
pedagógica pode e deve fazer diferença na vida dos/as
estudantes com as/os quais entre em contato [...]
(COQUEIRO e col., 2013, p.17892)

Diante disso, para prosseguir esta conversa de forma


contextual, indicamos a leitura do artigo Equipe
Multidisciplinar: uma experiência da educação das relações
étnico-raciais e para o ensino da História e Cultura Afro-
brasileira, Africana e Indígena na rede estadual da Educação
Básica do Paraná, de Edna Coqueiro e colaboradores. Nele,
as/os autoras/es relatam como se deu o processo de
instauração das então Equipes Multidisciplinares no estado
do Paraná, reforçam o decisivo papel das/os profissionais da
educação para a efetivação da referida política pública e
finalizam com alguns relatos de experiências de
aplicabilidade das legislações.

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Vinte Anos da Lei n.º 10.639/2003: muito
mais do que cumprimento de conteúdos
[...] A escola me fez ver que eu me
encontrava no lugar errado. Fui “saído”
sem que me dissessem que eu deveria
sair. Um tanto mais a cada dia. A cada
olhar silencioso com que silenciavam
minha vontade de “participar” das
aulas. A cada nota vermelha que me
atribuíam nas provas de matemática,
física ou química. A cada brincadeirinha
de um que outro colega sobre o tom da
minha pele ou a textura do meu Imagem 1 - Ricardo Aleixo.
cabelo.[...]

“Saído da escola” - Ricardo Aleixo

A epígrafe foi retirada do livro de prosa memorialística "Sonhei


com o anjo da guarda o resto da noite", do escritor e performer
intermídia Ricardo Aleixo. Na narrativa "Saído da escola", Aleixo
discorre sobre sua experiência escolar de menino negro. Para
conhecer mais sobre o artista multimídia Ricardo Aleixo,
acesse: https://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa3623/ricardo-
aleixo. Acesso em: 23 mai 2023.

Passados 20 anos da aprovação da Lei n.º 10.639/2003, a qual


tornou obrigatório o ensino de História e Cultura Afro-
brasileira e Africana nas escolas públicas e privadas de ensino
Fundamental e Médio, há que se retomar seus objetivos na
intenção de refletir se em nosso espaço de atuação
pedagógica - seja como professora/professor, como
funcionária/funcionário ou como estudante, tais objetivos
estão sendo, em alguma medida, considerados.

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É importante destacar que o acesso à educação para a população
negra é uma das principais demandas do Movimento Negro
brasileiro. Para saber um pouco mais sobre isso, recomendamos a
escuta de uma fala proferida pela professora Nilma Lino Gomes
para o programa "Polêmicas Contemporâneas".
Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=ZUKhznRgDm4&t=1040s.
Acesso em: 13 de mar de 2023

Para tanto, atenta às possíveis


leituras equivocadas sobre políticas
públicas de reparação histórica -
geralmente advindas de senso
comum, a escola não pode se
furtar a desconstruir tal leitura por
caracterizar-se ela, a escola, como
espaço formativo e de promoção
do conhecimento. O que queremos
dizer é: em se tratando de lei
Imagem 2 - Diretrizes Curriculares federal e demanda de urgência
Nacionais para a Educação das
Relações Étnico-Raciais e para o social, é imprescindível que a
Ensino de História e Cultura Afro-
Brasileira e Africana.
comunidade escolar cumpra-a.

Petronília Beatriz Gonçalves e Silva (2004) no parecer sobre a


instituição das Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de
História e Cultura Afro-Brasileira e Africana , ao afirmar que:

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Mais um equívoco a superar é a crença de que a
discussão sobre a questão racial se limita ao
Movimento Negro e a estudiosos do tema e não
à escola. A escola, enquanto instituição social
responsável por assegurar o direito da
educação a todo e qualquer cidadão, deverá se
posicionar politicamente, como já vimos,
contra toda e qualquer forma de discriminação.
A luta pela superação do racismo e da
discriminação racial é, pois, tarefa de todo e
qualquer educador, independentemente do
seu pertencimento étnico-racial, crença
religiosa ou posição política. O racismo,
Imagem 3 - Petronília B,
segundo o Artigo 5 º da Constituição Brasileira, G. e Silva.
é crime inafiançável e isso se aplica a todos os
cidadãos e instituições, inclusive, à escola.
(SILVA, 2004, p 16, grifo nosso).

Para conhecer mais sobre a intelectual Petronília B. G e Silva,


acesse: http://petronilha.com.br/. Acesso em: 23 mai 2023.

Ainda sobre isso, reforçamos veementemente: a escola não


pode seguir conformando o apagamento de algumas
identidades raciais em detrimento de outras, sabidamente
pela composição multicultural de nosso país. Em que pese a
presença ou não de estudantes e profissionais negras/negros
nas instituições de ensino, salienta-se que as reflexões sobre
questões raciais continuam sendo uma urgência coletiva,
visto os índices ainda altos de violência contra a população
negra, especialmente no ambiente escolar.

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Nesse sentido, não se trata de um tema a ser discutido
somente pelas pessoas atingidas pelo crime de racismo, mas
por todo o componente social brasileiro interessado em
construir, junto à escola, um ambiente de convívio
humanizado dentro e fora do espaço educacional.

Clique aqui para ampliar


a imagem

Para saber mais sobre os números, visite a página do Fórum


Brasileiro de Segurança Pública e acesse o infográfico por ele
produzido.
Disponível em: https://forumseguranca.org.br/publicacoes_posts/a-
violencia-contra-pessoas-negras-no-brasil-2022/. Acesso em: 13 de
mar de 2023.

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Para reeducar as relações étnico-raciais, no Brasil, é
necessário fazer emergir as dores e medos que têm sido
gerados. É preciso entender que o sucesso de uns tem o
preço da marginalização e da desigualdade impostas a
outros. E então decidir que sociedade queremos construir
daqui para frente. (SILVA, 2004, p. 14, grifo nosso )

Isso posto, é fundamental destacar que a normatização não


traz para a esfera educacional tão somente a determinação
do trabalho com um rol de conteúdos. Mais que isso, a
legislação tem efeito sobre o modo como os diferentes
sujeitos irão construir suas relações a partir da diversidade
que os compõem, o modo como irão reeducar-se nas
relações étnico-raciais.
É preciso ter clareza que o Art. 26A acrescido à Lei
9.394/1996 provoca bem mais do que inclusão de novos
conteúdos, exige que se repensem relações étnico-raciais,
sociais, pedagógicas, procedimentos de ensino, condições
oferecidas para aprendizagem, objetivos tácitos e
explícitos da educação oferecida pelas escolas. (SILVA,
2004, p. 17, grifo nosso )

Ou seja, ainda que não se diga expressamente, trata-se de


um novo projeto de sociedade o qual exige um outro
projeto curricular, tendo em vista a alteração trazida para a
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Dito isso, para o contínuo da reflexão proposta, trazemos


neste primeiro módulo, o episódio de número 4 do podcast
Educação e Relações Étnico-Raciais, uma produção da
Fundação Santillana.

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Nele, a apresentadora Carolina Marcelino conversa com a
estudiosa e palestrante das relações étnico-raciais, a
professora Rosa Margarida de Carvalho Rocha.

Intitulado Relações étnico-raciais e


formação de professoras e
professores da Educação Básica, o
diálogo percorre, de forma sucinta,
pelas situações que levaram o
Movimento Negro - no pós-abolição
- a atuar de forma mais contundente
na exigência de educação escolar
para o povo preto.
Imagem 4 - Rosa Margarida de
Carvalho Rocha.

Na sequência, propomos a leitura da entrevista 20 anos da


Lei 10.639: por mais avanços rumo à uma educação
antirracista, concedida por Lara Santos Rocha, assessora de
educação do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e
Desigualdades – CEERT, ao CENPEC.

Imagem 5 - Lara Santos Rocha.

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Para saber mais sobre a professora e estudiosa das questões
raciais, Lara Santos Rocha, acesse:
https://br.linkedin.com/in/larasantosrochaaa42b0100?originalrefer
er=https%3A%2F%2Fwww.google.com%2F. Acesso em: 23 mai 2023.
Para saber mais sobre a professora Rosa Margarida, acesse:
https://rosamargaridacarva.wixsite.com/rosamargarida/rosa-
margarida. Acesso em: 23 mai 2023.

E, para finalizar este primeiro módulo, lançamos mão do


artigo Relações étnico-raciais, educação e descolonização
dos currículos de Nilma Lino Gomes. Nesse texto, a
intelectual propõe reflexão substancial sobre o currículo,
partindo do pressuposto de que, para a efetiva constituição
da legislação aqui tratada como uma política de ação
afirmativa, é urgente a revisão curricular na intenção de
garantir que as demandas epistemológicas no que se
referem às narrativas colonialistas construídas em torno do
continente africano e de seus descendentes sejam
efetivamente desfeitas.

Imagem 6 - Nilma Lino Gomes.

Para saber mais sobre a intelectual Nilma Lino Gomes, acesse:


http://www.letras.ufmg.br/literafro/autoras/368-nilma-lino-gomes.
Acesso em> 23 mai 2023.

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Fontes das Imagens

Imagem 1 - Ricardo Aleixo


Fonte: https://quatrocincoum.folha.uol.com.br/br/resenhas/literatura-brasileira/corpo-
sonoro.
Acesso: 22 mai 2023.

Imagem 2 - Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações


Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana
Fonte: https://www.gov.br/inep/pt-br/centrais-de-conteudo /acervo-linha-
editorial/publicacoes-diversas/temas-interdisciplinares/diretrizes-curriculares-nacionais-
para-a-educacao-das-relacoes-etnico-raciais-e-para-o-ensino-de-historia-e-cultura-afro-
brasileira-e-africana.
Acesso em: 22 mai 2023.

Imagem 3 - Petronilha B, G. e Silva


Fonte: http://unisinos.br/blogs/neabi/2015/01/27/profa-dra-petronilha-beatriz-goncalves-
e-silva-fara-parte-do-corpo-docente-em-universidade-dos-estados-unidos/)
Acesso: 22 mai. 2023.

Imagem 4 - Rosa Margarida de Carvalho Rocha


Fonte: https://rosamargaridacarva.wixsite.com/rosamargarida/rosa-margarida.
Acesso: 22 mai 2023.

Imagem 5 - Lara dos Santos Rocha


Fonte: https://twitter.com/cenpec?lang=ar-x-fm.
Acesso em: 22 mai 2023.

Imagem 6 - Nilma Lino Gomes


Fonte: http://www.letras.ufmg.br/literafro/autoras/368-nilma-lino-gomes.
Acesso em: 22 mai 2023.

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