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versolivre (uma ou meis frases sôltas), seqüência dr
ímpares, versolivre (uma ou mais frases sôltas), ra
quência de ímpares:
Papel picadinho,
três quilos do malsr,
sorrs lirnas de cheito,
ttês cm cada mão, . .
Assentado gue a poeoia pode atuar dentro ou fora, Poema que é uma simples reprodução por imita'
eeima ou abairo da consciência, comecei a registrar çâo, pare eÍnpregar as velhas palavras de Aristótele*
tôdas es definições de poesia que fui encontrando ao Já o Dante acrescenta ao elemento ficçáo um nôvo
acaso de minhas leituras. Organizei assim uma peque- elemento a música, e dizz "Poesia é ficção retórica
na antologia do assunto. São numerosíssimas e o poeta -
posta em "Ínúsice". O elemento música vai aparecer
Carlos Drummond de Andrade depois de mim ainda em numerosâs outras definições. tA poesia", escrevêu
assinalou numa crônicâ uma porção deles que eu não Carlyle, "chemeremos pensamento musical". E Ruskitl
conhecia. Mas é possível redr.rzi-las a uma meie dúzia moralista, ensina que ela é "a apresentação, em forma
ile tipos, que lhes facilitam o exame. Senão vejamos: musical, à imgginação, de nobres fundarnentoe às nobrec
emoções".
Certos autores definem a poesia como ficção: '?oe-
ta", escreveu Jonson, gr,ande úamaturgo inglês, con- Não se pode negar que a música seja um elernento
temporâneo de Shakespeare e um dos homens maic da velha poesia, da poesia ao tempo em que ele foi
cultos do seu tem1rc, "é, não aquêle que Êcreve com assim definida. Hoje sebemos que pode haver poesia
rnétrica, mas o que finge e forma uma fábula, pois
sem música, e poesia da melhor. Sem mírsica, bem
entendido, no sentido de não procureÍ o poeta fazer
fábula e ficção são, por assim dizer, a forma e a alma
o v€rso cantar no Poemq.
de tôda obra poética ou poema". E' o mesmo conceito
de dois outros grandíssimos poetas inglêses seiscenti§.
Outro poete, e que poetal o grande românticp
Coleridge, definiu o poema "aquela espécie de compo'
tas: Donne, que disse "a poesia é como uma simili-
aição que se opõe às obras de ciência por yisar coao
-Criação e faz coisas que não existem, como se exir.
objeto imediato o prazer e não a verdade". O objeto
tissem", e Dryden, paÍe quem "a ficção é a essência
imediato, porque em profundidade êle é "a identidads
da poesia".
de todos os outros conhecimentoo, a ÍIor e o perfume
Pergunto eu agore: não haverá poesia quando de todo o humano conhecimentot'.
realizo em palavras uma trensposiçáo da realidade. E aqui entramos no conceito de poesia<onheci'
sem inventar nada, sem "fingir', nada ? Como nertc mento. ,IvÍuitos são os que o afirmam. Para Lautréa-
poeme: mont, ela antutcia as relaçóes existentes erntre os pri-
meiros princípios e as verdadec secrurdárias da vida.
O attanha-céu cobc ,@ at puto quc loi lavdo pcla chuta Novalis já dissera que ú'â poesia é o real absoluto".
I? desce reÍletido na poga dc lana do pátlo. E o moderno Maritain precisa: 'Poesia é o conheci'
Entrc a rcalidadc e a imeacm, tp chão úo que 4, *lr.ta, mento, incomparàvelmente: corúecimento-experiêncira
Quatrc pombas parrcianr. conhecimentÉÍnoçãg conhecimento aistencial. Ela é
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o fruto do contato do espírito com a realidade em cl cssa rhagia que consiste em despertar sensações por
mesma inefável e com a sua fonte; que acreditamoc rrreio de uma combinação de sons. . . êsse sortilégio
ser Deus". Braças ao qual idéias nos são necessàriamente comuni-
O epíteto "inefável" leva-noo a um grupo de defi' cadas, de uma maneira certa, por meio de palavras
nições, onde culmina o conceito na definição de Edwin <1ue todavia não as exprimem".
Arlington Robinson, grande poeta norte'americano: Comentando largamente a definição de Banville,
"Poesia é a linguagem que nos diz, em virtude duma
conreça Gide pelos vocábulos "magia" e "sortilégio"
reação mais ou menos emocional, alguma coisa que
(sorcellerie) : "Valéry, de maneira voluntàriamente
náo pode ser dita".
rrn'rbígua, dirâ charme. . . O verdadeiro poeta é um
Devo esclal.ecer que tôdas essas definições ê
,nago. Não se trata tanto para êle de ser comovido,
muitas outras que coligi, aparecem em contextos onde rnas de induzir o leitor a comover-se: "por meio de
se procr.rra apreender a essência do fenômeno poético: rrma combinação de sons", que são palavras. Que a
não foram apresentadas isoladamente como definição significação dessas palavras importa, não será preciso
no sentido lógico da palawa, e de isoláJas como fiz, tlizer; não, porém, independentemente da sonoridade
resulta uma certa mutilaçáo do pensamento de seus
rleias. O verso delicioso d,e Racine, tão freqüente.
autores. Nad,a obstante, cada uma contém uma parcela
nrente citado como exemplo de encantaçáo harmoniosa:
de verdade, ilumina um ângulo do probiema, que é
Vous mourúfes au bord oú yous íúÍes Íaissée. Mudai
talvez insolúvel . Tôdas me parecem falar em têrmos
irs palavras, dizei: Tous éfes morte sur /e rivase oü
de poesia, com o seu vago' o seu mistério. Nenhuma
se refere ao que é a ínatéria-prima da poesia na arts
Ihéseé vous avait abandonnée. O significado continua
literária as palavrasr e tanto se podem aplicar à o mesmo, maso t'encantot' desaparece"
-
arte literária como à música e às artes plásticas. Paul Mallarmé tinha razão: "Náo é com idéias quei
Valéry menciona-as numa definição que é um peque- se fazem versos: é com palavras". Não que o sentido
nino poema: "Poesia é a tentativa de representar ou <lelas não importe. Importa, rnas não como advertiu
de restituir por meio da linguagem articulada aquelas Gide, independentemente da sonoridade delas. Natu-
coisas ou aquela coisa que os gestos, as lágrimas, as ralmente o sentimento está subentendido, é êle que faz
carícias, os beijos, os suspiros pÍocuram obscuramente achar as combinações de palavras suscitadoras da
exprimir". E André Gide foi desenterrar de um pre' cmoção poética.
fácio esquecido de Banville esta definição, que espanta
tenha saído da cabeça de um daqueles mestres quc A grande dificuldade, porém, está em que uns se
(:omovem diante de certos versos e outros não. Há pes-
Thibaudet chamou * T"TI:"s do Parnaso: "Poesia' "
soas guc acham intenra poeria nor verós de Mpril*
Mendes; outras não a acham nenhumã, encontram.na á
I podla rcrvír pâm a nolm língua e mais algumer outru
mar ró até o adrrento do verso-livre, Que deflniçlo
nos sonetos de Emílio de Menecês, onde os admiradores re pode der do verso, de modo que ela se apliquc a
de Murilo não vêem s€quer a combra dela. E tú aa qualquer idioma, vivo ou morto, e em qualquer tempo?
que não suportaÍn nem um nem outro; gostam é da Pedro Henríquez-Ureôa, o grande mestre dominicano,
suave música de'Olegário Mariano. Afinsl em poesia há pouco fatecido, têntou, a meu ver com êxito, ersa
tudo é relaüvo: a poesia não existe em si: eerá ume definição rnínims. Poesia, poesia no sentido formal,
relação êntre o mrurdo interior do poeta, com a Bua. ensinou êle, é linguagem dividida em unidadee rítmi-
mnsibilidade, a suâ cultura, âs suas vivências, e o muÍr. cas; prosâ é linguagem continuada. Sem dúvida, ng
do interior daquele que o lê. linguagem continuada da prosa há parágrafoo. Mar
Se passamos da definição de poesia para a defi-
o corte da prosa em parágrafos atende táo-sômmte
niçâo do verso, eB dificuldades diminuem, mas não
à necessidade de ordenação das idéias. O verco é a
unidade rítmica do poema. Ritmo, em suâ fórmula
decaparecem. Abri um tretado de versificação qual-
elementar, é repetição, O verso, em sua essência, é
quer, o de Bilac e Guimaraens Passos, por exemplq e
unidade rítmica porque sí repete c forma séries. Pare
ali vereic definido o verso como "o ajuntamento de formqr series podem'as unidades ser semelhantes ou
palavras, ou aindq uma ró palavra, com pausas obriga-
dessemelhentes. Podem ser unidades flutuantes. Mas
das e detetrminado núrnero de sílabas, que redundem em é necesúrio que cada verso seja uma como gue enti-
música". Em nota traduzem os dois autores o francêc dade, ou como disse Valéry "ume palavra total, vasta,
Quitard: "A etimologia latina das palavres "prosa" nativa, perfeita, nove e eetranha à língua".
e "verso" claramente indica a diferenga essencial da
sua significação: "prose" vem do adjetivo latino prooa
O gue diferencia os diversos tipos de versifioa-
ção através de todoc os idiomas e de todos os temp6
(aubentendendo-se o substantivo otatio, disctuso, ora-
são os expedientes de que se valeram os poctes para
ção) - otatio proea, discurso contínuo, seguido, e pôr em maior evidência o ritmo, Expedienter como:
reepeitando a ordern gramatical direta; "Verso" é de-
vatôres de sílabas (quantidade), aoentos de intenrida-
rivado de versuo, do verbo vottete, tornar ou voltar, de bem marcados, regulação dos tons ou diferenças de
porque, uma vêz esgotado um certo número de síla-
-bag a oração se interrompe e volta de nóvo ao ponto
altura musical entre as sílabas, número fixo de sílabar,
rirna, aliteraçãq encadeamento, paralelismo, acrórtico.
de partida, a fim de começaÍ outra evolução silábica". Na versificação portuguêsa os apoios rítmicos de que
A definiçáo de Bilac e Guimaraens Passos, gue t€mo! exemplos são o número fixo de sílabas, a Gclura,
é mais ou menoo a de todoe ú outros tratadistas, a rima, a alitcração, o encadeamento, o paralelirrno c
o acróstico. Talvez muitos de meus ouvintes não este.
jarn a par do significado de Lôclas essas palavras. Do Ondat do mat lctado,
Sc visáee tzlcu *rado!
encadeamento do paraleiismo, por exemplo. O enca-,
E ai, Deuo, se taná cedo!
deanrento consiste em repetir de ver--o a verso, ou de
estrofe a estrofe, fonemas, palavras e Írases. Foi, corn Se visÍes rrrcu aÍri&,
o paralelismo, muito usado na poesia hebraica, e dêle O por que eu euspiro!
se serve quase infàlivelmente em seus pcelnas o nosso E ai, Deus, so vertá cedo!
algo bíblico Augusto Frederico Schmidt:
I So virúcs olcu anado,
Potque clrolar ge o céu está tóseo, O por que ei lpan addedo!
Se as Í/ôres esÍão nas trepadeiras balançando, ao sôpro leve do E ai, Dcttt, o vetrá cedo!
Ívenco?
Porque chorat se IÁ íelicidaCs nos carnraÁos, I
Essa cantiga é paralelística porque as estrofes
Se áá ,ginos batendo nes aldaias da Partusal ?
pares repetem a idéja das estrofes ímpares com ligei-
l
ras alteraçóes de palavras para variar o timbre da
Nesse poema do CanÍo da Noite o poeta só aban- I
À ndiaa guc o vazio no ftreu cotpo o@a, Por isso erâ sempre com delícia que eu lia as
Ctçcrr no mat apídto o sentido dat vidat acontccidrrt, t'títicas de Eloi Pontes no G/obo e é sempre com prazer
Balatryndo nos ,trc,tt or*idol. o pcnr*lrtTcnto qua aptuaoa rlue leio as de Berilo Neves no Jomal do Comércio,
Ot loh4g c a solidão daa dmrrç inbtilmcntc pttarldrr,. ,'ríticos sem contemplação para com a poesia que não
se exprime em versos medidos e rimados. O que me
Mas verso.livre cem por cento é aquêle que não cntristece é ver que êles nunca tenham tido influência
se socorre de nenhum sinat exterior senão a da volta lrastante para pôr um paradeiro nesse "babaréu de
ao ponto de partida à esquerda da fôlha do papel: rnedíocres", como costumava dizer o primeiro no seu
ver,ro derivado de vertere, voltar. A primeira vista,
curioso estilo.
t34 I35
Por isso tenho às vêzes uma grande tentação de
esquecer tudo o que aprendi com mestre
tlreffa e dizer
e jurar para tôda a gente que ,terso é
o ajuntamento
de palavras, ou ainda uma só palavra, com pausa§
obrigadas e determina.do número de sílabas,,,
como
ensinavam Bilac e Guirnaraens passos.
Isto g talvez
substituísse a palavra ,,ajuntamento',, que
me soa vaga-
mente a coisa ilícita. e acrescentasse a
obrigação da
rima e do duplo acróstico! Concordais ?