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Nã0 lemos dúvida algumí qúe Concitliação e
é una notável co
outas estratfui,s de ll4ichel oebrun
Íibuição para o enlendimento d0 penoso pÍocesso de aherlura t)
\
ê do prccesso polÍlico bÍasileiro.
l (;ilr A "Conciliação" é simplêsmente úm pano de lundo entre oulÍos pam lenlar
compÍeender os impasses e indicaÍ os deseÍvolvimenlos pÍováveis na coniúnlum
polílica.0 oeneÍâl Geisel, "os neolibeÍais':a social de mocÍa cia à hÍasileiÍa, a
ÍeÍoíma panidáÍia, todos os hnces do peÍiodo são desmontados e explicadG,
onde apaÍecem as Íicts venentes do pensamento de Michel oebÍun nas
direções da lilosoÍia, da leoÍia polÍtica e da mâssacrâda hislóÍia dâ popúlação
rxrHi, dominada no Brasil.
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do preÍácio de Paulo Sérgio Pínheiro
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A C0NCTLTAÇA0 A CONCIL
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E OUTRAS ESTRATEGIAS t'l'l^"t\ l;\il|1n,,

p ÉÍli' l----ll!^-
Introduçã o
Simpl€s punhado de âÍtigos escritos entre 79 e 83, e de entre-
vistas realizadar entÍe 76 e 79, est€ irÀbâlho não tem oütra pre-
tensâo sênão â de suge{ir que -os eixos dâ poh'tica brasileiÍa não
mudaram fundanentdmeÍlÊ dlsde a IndepllrdêncE. Face à gÍãnde
d"eÀdoáGÍ; j;'-t,!!ÀE ô-dõõ;tãrea girárn lãíF?o
mâo de !E nu_roerq Umilâd_9_de-qs-úttêflÂs pomicas;§empre as
mesmas. Stuaçáo essa que pennanece ainàa hóje, ernque pestm os
úranliõás que rem sofrendo de modo üesceftte. Daí a Íep€tição,
cârsativâ. de cerlos temâs: essâ monotonia temálica procura s€r
a imagem dê úmná-re traite política üsta, senâo como estagnada,
como capaz de uma auio-ÍêFodução indefinida, m€diânte o uso de
alguns mecanisÍros §€culaÍes de dominaçâo qu€, até s momento,
serevezaram no palco do poder,
-
Entre essas estratégias avulta a Conciliação. É ela sua natu-
reza, sua história e as condiçõês que ainda lhe permitem mant€r
paÍe da sua eficáci que constitui o foco do livÍo. Convém,
porém, não confundir duÃs modalidades de Conciüação, ap€sar
das inúmeÍas pontes e fusões parciais quê s€mpre existiram €ntl€
elas.
Num primeiÍo-e§! C9!9,tLa9, a9 q!d, representou um
conpÍomisso entle valores oÍiundos de hoÍizont€s diversos: de um
lado, os ligados lEera-nça européiâ, instituídos, sobÍetudo por
padroes Íelúiosos, éticos, estéticõi, econômicos ou administÍativos:
e, dê outro lado, os que traduzem â influência rndia ou âfric ra,
t6 MICIIEL DEBRUN
A "CONCILIAÇÃO" E OUTRAS ESTRATÉGIÂS tt
não s€ deve eequecer que âs €lites dislidq{esjçltetçiam em geral, e
em 78, quaído o epiúdio da cardidâturâ à PÍ€sidência do geneÍal
ainda pertencem. aos grupos drrnn'lâÍles. PoÍ isso seus pÍoieros
Eulêr Bentes paÍeceu a muitos têr suscitâdo ümâ '.rachadurâ insu-
nacionais" nâo Éodiãm deixar d€ assumir, eles também, a formâ de
perável nas foÍçâs âÍmâdas. Râchaduía que poí suâ vez iria permr-
umâ "outorga", feitâ ao "povo" ou a certos elementos. Ássim, â
tn, "dialeticâment€", à Soci€dade Civil r€cuperar â sua autonomia.
eventual vofltade de úânsformai a sociedade - de se "Íedimila"
espiritualmente, de dêsenvolú-la ou de superat as suas enormes desi-
gualdâdes sociais não podia senão surgir, aos olhos dos ssus pró-
prios promotoÍes, como uma tentativa de "ir ao povo", de "descêÍ
até êle . Veuro 4uêLdo vânlú!_Cqp{co p€la elirê_nojoder. âs
elite( disedenlÊs ,!áo de ixâvâÍn de rer pro?o;lai au roriráÍiâs. centro dâ cenâ política. Seja porque domina o tspâço pohlico
"Conciliação", auaõritarisno'desinobilizêdor", autoritârismô veÍbal". como foi durante a seg]n!3 rygllle do céculo xlx e â
'lnobilüador" nâo esgotâm, porém, o elenco das liguras políticas República Velha, o caso do hberalisro - já desâlojâdo. esle. do
brasileiras. O libeÍâlismo teve lambém sua vez. Só que s9 t atou ''espaço politico íeal pela conciliação . Seja porque domina o
quase sempre de u+ liberalisÍ.nq amb8uo. Contestava o predomínio
e§paço político real, como justâmeni€ a "conciliação" desde os
dâs éstruturas âÍcÀicas do campo sobre as NpirâçíÉs modernizartes
anos de 18_50 alé os anos 20 desre #culo. aproümadÀmente. A
das cidades. Ou advogava a necesídâde de eleições limpâs, de imti-
partir dos anos 70 (ôu mesmo dos ânoa 10, se lenbrarúõJ í presi
tuições como o ,aáeas.orpus ou o mandado dê seguÍança. Enaltecia
dência Hermes da Fonseca) e âté o momelto- 'toncd!4çqo ! qlto-
as virtudes da livl€ competição, sejâ ela econômica ou política. No
ritaÍismo i'de.s!!qiil_êdor" s€ revezarn no pâpel hegemônico efelivo,
entanto menos cúivlva a liberdade do que era o produto d€la. Ou
em qüe pese obli!rc veõal étisoAico do 1i6eÍâlismo, por exemplo
sejâ: produto de ceÍtas situações.favoÍáveis, €las pÍópÍiâs ligâdâs às
quando dâ elÂbo+açio dâTfue :+ ou ni ixzacdo . anles e pós
extremas desigualdades dâ slciedad€ bÍasileirâ. Situâçôes essâs qu€
franqueavam aos seus ocupantes, além de oportunidâdes específicas -
64 dê UDN l'!,io!4pgtj". O populisÍno, no Brasil pêlo m€nos,
nunca passou de uma modâlidade da "conciliâção". E o âutori'
de lazer e de cullurr. o crercrcio de uma crírra na imprensa. nas
taÍismo "desmobilizadoÍ" ca:,arte,jzoit tanto o Estâdo Novo como
aisembléias legislativas, ros tribunais ao mesmo tempo impie-
o r€gime oriundo da Revolução de 64. Quatto âos ensaio! d! ,}to.
dosâ e inócua €m relâçâo à estrutuÍa de auloridade ügente na socie-
Íilarismo mobilLadoa. enrre ol eó4. eL"r nó i,rera- o re-po
dade brâs enr. Mesmo porque a existéncia dos pÍópÍios liberais e,
nem de se firmar ne4_d€ pt9!-arqe9_!uto-superaçâ:o,
portanto, a condição de posibilidade da sua crítica, ass€ntavâm
autenticâment9 rev-o!19i9!árlo.
n€§sa estrutuÍa. Tal estrutura permite, portarto, quatro êstratégias
Os arquliiipqqlolitiçq-idgo!ó8icos sâo, assim, âo mesmo tempo
úÍeduríyqis elrre si e paientês píóxirnos. Isto é. indetlÍldaírenre
Daí um teÍcrng,tle{!: não só a verÍcalidade das desigual-
subslirurvêis uos aos ;uiõ§-ãe!-êndsrdo das circuníánciâs que
dades brasileiÍas fâvor€ce ês viiias políticas que revistafios, como
apontam pâra a predominância momentânea ou durável dê tal ou
êstas, por sua vez, contribuem cada umâ a sêu niodo para a mânu-
qual deles. Dâí o que se poderiâ châmaÍ de arcaísmo da políticâ
tenção d€ssâ veÍÍicalid-àde. É quase que um círculo vicioso, do qual
bÍâsileira. Ele contrasta vivâmente com as meiãrcÍ-lõSi aE-eco-
só agora está se úslumbrando a superaçeo. Superação, porém, muito
nomiã, càm o adiàiq <, r{!-r,so-'Í-o!o-ôal àtisnõ; dependente
mais difícil e complexâ do que imaginan em geÍal os lib€rais, s€jaÍr embora. E uma das contrâdições mais prementes do rnomêniõ brasi-
eles autênticos ou "estaÍrentais", e as esquerdas. A cada abetuÍa,
lêto talvez seja esta: a defavireÍien@it&agec riná. Nío que
ou esboço de aberturq, acÍeditam que está engÍenada uma "dinâ- essa contradição sêjtàêai3i-va paÍa suscÍ uÍu nova ordem social.
mica íÍeversível". É proyav€lmente o caso hoje, com o advênto de
Pois o autoritarismo soub€ daÍ impulso ao desenvolvimento, sejs
uma crise cuio caráter orgânico está cada vez mais eúdênte. Mâs
dentÍo do espírito modemizante da "conciliação" popuLjstâ, sêia
não era o caso em 74, quando se sâudou em t€rmos €xce$ivamente
em função dos propósitos Íacionalizâdorss da tecnoblrrocracia
otimistas a voltâ do Seneral ColbeÍy âos bastidorês do poder. Ou
ligada ao autoritarisÍno "dêsÍtobilizâdoÍ", a partÍ d€ 64. Mas é
(}

18 MrcHEL DESRUN A 'CONCTLhçÃO" E OUTRAS ESTRÂTÉGrÀS

verdade tâmbém que o Aotelcial dêmocratiz.âtrte, para â sociedade Brâ5il em conjurto. O int€rcssant.! nêr§âs con§tru!óç§ideológi!.§, é
em conjunto, dar transformaçÕ€s econômicas iem sido podado, que elas súentam, dê àaido comósnt€ com a úvéocia dtj'Colrçi
dêúdo às ordenações s€cular€s da política. liâção", simultanêamente a dissimetria êntre o áÉice ê/abas€ da pirâ,
PodeÍá causü esÉcie o fato de que, nos textos aqui Íeunidos, mide social, € o pat€rnalisÍro ben€volénte dos dé óiÍa, qBcísutráli.
pouco se ana.lisa autores como Oliv€ira Viannâ, Gilberto Freyre, zaria no nâscedouro os efeitos ncgalivos dcssa dissuneuiâ.
Cassiano fucerdo ou SéÍgio Buarque de Holanda, entre outros. Sêrá Existe, poÍtanto, um êDúõiginé o éntreessasialeoloSias, que
quê eles nEo lém nada r ver com â ..concüiaçáo.., ou auroÍrlarisno chamaremos d€ "s€curdáriãs", c as ideoloSias "primfti§", êngr€.
"desmobilizÀdoi', o autoíitarisÍno ..mobiluadoÍ.' e o lib€ratismo .á íâdãs estâs na práxis imêdiata dos atores, Frticulârmcntê a dos âto.
brâsileía"?
Á relação é .vidente, pelo coÍtráÍio. q[y9ira Villllc, por Mas o essencial, mesmo, é o dasvendamento das idêologiâs
êx€mplo, podê scr consideÍÃdo o t€órico do auto.itarisniã naesmãUi- ''primáriÀs , como nos propus.mos a fazeÍi Poíduas razÕ€s. Prf
lizador", como GilbeÍao Freyre e Cassiano Ricardo o sâo para a m€lo poÍque as estratégiâs dê bas€ têm sido, em geÍal, efici€ntcs
'tonciliação-, E §érgio Bú4lgUe d; Holânda um pouco pârâ todos os independentemente de uma formuhção cxplÍcita e sistêmática.
arquétipos. Pois o pÍimeiÍo enfâtiza o .,amorfismo,'ia sociedade Independentemente, portânto, da obÍa dos gÍandês ideólo8os. É
brâsileirã ('hão rêmos povo,,, ..nâo somos um povo'.) e a necessi- o que âconteceu com a "conciliârÃo". D€pois dê ter sido cnâlt.cida
d"de do esforço ÍedcntoÍ realizado de cunâ para baj\o. em que por Nabuco de fuâújo, nos primóÍdios da década dê 50 do século
con.
srsüe a polÍicâ obj.rivr''. TÍala.sê de eslÍutuÍar passado, quândo ele ofeÍêcia uma 'lonte de ouro" aos liberais
a Íeâl,dade brasr.
leiÍa, de dâr forma ao inorgáruco. peta educaçao ê. princ,Flmentê. vêncidos da Revolução Praiêia, â 'tonciliação" entrou d.pois num
pelo enquadramento dos indivüuos no serc dê ..orgáflcos'., quase silêncio por mris dc mêio sécúo. [Iavia um discuÍso da '!onci-
Srupos
tais como as associâções de cla§* e as coíporações que por suâ ve? liação", lêgív.l êntre as linh.s no coÍoncli$no ou na "política dos
as discipliían. Ferro isro. pond€ra Oüvera Vianna. poder-s€-á talvez, govemadores" dê Campos Salles. Mas cssê dis.uÍso era o mab das
num ruturo tndcletminado. insraurar uÍr, autênuco libeÍaltsmo no v€z€s implícito. Limitava{ê a úrmar, em atos mâis do quc em
Eraiil: ê quê hrvêrá cidadãos r$ponsáveis, no lugar em que só palavÍas, a 'Írdole pacífica da nossâ gente". Mesmo poÍque a
política dâ "conciliação", nío encontrando resistênciâs pond€Íáveh,
lismo entrê essa consrÍução e a ideotogia/prática elpontáneâ da êra como que verificâdâ nos fâtos. O que permitiu por suâ vez ao
"Conciliaçío '?
discuÍso libêral continuar dominando o espaço político irrbrl,
Quanto,a Cilb€rto F&Jre e Casiano Ricüdo eles não s€ can- na falta de contendores.
sam de c€lebÍar a figuÍa centlat do ideáio conciliador. a ..índole bôa
Daí a e€gunda râzâo da ênIale sobrc â idêologiâ "primáriã".
do poyo bÍâs.ilêüo",. a âceiração espontánea. po! parre dos hum - Pois a ideologia 1!Êcq!{áÍiâ", longe d€ Íepresentar a ess€ícia da
des. da protêção e da orientaçào dos podeÍosor. É essr
Íelação de
autoridadê ünorosa' que se reria yêriticâdo. a nivet À,cropotirico.
ideolo8la. úse desenvoú quando slrgem ameaças para o predo.
mínio de deteÍminada ideologia "primáÍia". É o que ocorreu na
no engêúo noÍdestino ou na bandeira pauliÍâ. Esta últimâ. em decada de 30. quando fórmulas novâs como o fas.isÍno ou o comu.
particular, é apÍês€ntada por easiano Ricardo coÍro um embrião de
nismo pâssaram a afieaçaÍ a 'tonciliação" ê, nutll menor grau, o
Esrado um pcqueno EÍÃdo anbutanre percolendo â unensrdâo próprio autorita.rbrno "tlêsmobilizadoa'. A função da ideolôEia
b,as eirâ . em que reÍia $r8rdo a colaborâçào hlrmoruosa enrre
o "sêcundáriâ" é €ntío abafa. as dúúdas qu€ começam â invadiÍ
Dranco, o mameluco e o índio. âo ,nesmo lempo que s1la tueraÍ.
os portadoÍcs dã ideologia '!Íimária". O qu€ implica que essâ
quizaçar-o,$aremente endosâda por lodos. A Íorça, é verdade, ideologia sâia do silêncio, {iâ suâ tvidência", pfia sê kansformar
pÍe§diu em ampla medida à €onstituiça:o dâ bandeira. Mas.umâ
vez numa construção mais elaboÍada. O &aço mais p€rtúelte djgsã ideo-
consüturda, cla ierÉ sido a preÍBuraçáo Je uma democíacia
ao loSia "sêcundáÍia" consiste num esforço de fundamentação: tÍata-s€,
mesÍno tempo racial, social, culruÍâl € polirica. tvlâis ou menos paÍa ela, de fund.mentai o quê se "constata" â nível primário.
o
qu€ diz Cilberto FreyÍ€, seja pâra o contexto nordestino
seja para o Invocâ por €xemplo â mistur. Íacial como fundamento dâ "cordia-
, r,1. ír
..,

20 MICHEL DEBRUN

lidade" bÍasileira. Ou então a composição éiÍricâ da sociedade brasi-


leira, coÍno fator principêl dâ sua ..fraqueza,,. Ou, ainda, a situação
coloniâI. como princípio de uma alienação coletiva quê ú poderia
ser §uperada pela emergência de um pÍojeto !.saÍtreano,,d€ liber-
tâção naciona.l.
Seja como for, essâs_váias rÂcionalizâções ou legjtimaçÕes
nos remetem a um solo originário iia ideologia política. Neste nivel
a ideologiâ não é feita parâ fundâmedtar ou €ncobrir i§so ou aouito.
Não obed€ce a neúumâ finâlidadc, subcons€iênte ou i
Coístitui, antes, a
domúação, quândo essâ pÍalica Àtcansa o êyrro. tordl ou parclÂl.
Brasil:
raeolõÀiiirinráriã,t-rconsriênck
Mais exatamente a rde o-iõEra-:rit do,êi,,trâdô
dessâ prática. É assim, no caso bÍasileiro, que os atores rlominantes.
ao êxerceÍem vitoÍiosamente a práticâ da..concilíação,'ou do
A "Conciliação"
autoritaÍismo "desmobilizadoÍ,, - ou mesmo, num grâu menor. a do
autoÍilariÍno "mobilüâdor', na:o podem deixar de ver o outro e outras estraúé gras
Élo como "dúctil", ou .,fraco,', ou ..mobilizávê1". E esre póio, por
srâ irz. acaba convencêndo-se de que âs coisâs sáo âs9im mesmo.
sêm que hâjâ sernpre nêcessidade de umâ propa8âÍda, de uma inot-
cação idêológica est se situa a níwl da ideologia .,secundária,,_
Finalfiente . a 'constatação,, dâ ..ductilidâde',, da ..fraqueza,,
etc. - . . reforça a confiança do ator dominante na srra própria prá,
ticâ: esta passa a s€Í p€rcebida não apênas como .txêqüível,, mas
como "indispensável". E, ai, já estamos nas frontenas da ideologia
"secundária", da ideologia como pincÍpio de l€girimação. Só quê a
legitiminâçío, ao m\,€l ..primrfuio", deve ser encarada como um
momento da prdxis, e nâo como uma justificariva que yiria carim-

Tais consid€rações não podiam, evidentemenre, ser âprofun-


-
dadas em curtos artigos e ensaios, ou êm entreüstas. O pr;pósito
destâ publicaçÃo é apenas estimular a discussío em torno de evên-
tuais traços permanentes da política brasileirâ. remetendo-sê â análisê
â€adêmica dessa problemática para um futuro rrabalho. Também não
podiam s€r êútadâs ceúas contradições entrc esses trabalhos_ Elas s€
dev€m ao caráter movediço da conjuntura política, o qüal, sê nâo se
mostrou até hoje câpaz de d€salojar os arquétipos, Irustrâ freqüen-
t€mentê a previsão que eu fiz do rriunfo próximo de dererm;ado
aÍquétipo. Foi outÍo que !€nceu, porém, e não âté o momento.
repitamos a liberdade dos aSentes fustóricos.
,1,

50 MICHELDEBRUN

ilimitados. Identifica-se com o desabÍochar suave do cüáteÍ nâcio_


nâI.
Entrê as Ínanú.3laçõcs desla ÍloÍa{io enconrrü-se-lá
, p.r coi!&r.como cârnavaJ, futebol e varapá _
ao tado
::_"q..i" a simparia
8erar por uma libêÍdadc polÍtica cücunscrira. Mais
crosa <te se con-
Eraçar c-om o interlocutor do qu€ de lutar com el€ _ ou
contra ele,
paÍa definir os têÍmos de um novo
contrato sociat,

A "Conciliação"*
A 'tonciliação" lêm d.s.mpeúado um papêl consideÍável na
históÍiã política do kasil. Mas sêÍia ilusóÍio interpÍ€tá-la através dc
estereótipos sobrê a "índole da nossâ gente". o "caráteÍ mineÍo"
etc. ou vé-la como um processo suÃv€ de ajüte de contas entÍe
atoÍês dotados d€ força ou iÍúluêncía mais ou m€nos iguat. furanjos
dêss€ iipo foÍam raro§. O único ex€mplo impoÍtante, acÍedito, foi
o rcordo d€ 6l entre os sêtoÍes inconformados com í possê de
Coulut e os lêgalistas.
No mais, t€mos dê pâíí do gÍande hiato econômico, social,
cultur ê políüco que, dêsd. os primúdios, sep.Íou os grupos domi
nàntes e as carnadas suba.ltemâs. Essa clivãgem pêÍmitiu que ele-
m€ntos intermediários, Ínâs situâdos mais perto da base da pirámide,
dificilrnente pudessem Í€cusâÍ a troca dâ sua l€aldade aos gÍupos
dominÂnt€s contÍâ favorês melhores ou maiores. De um lado viam ÍIa
§)â cooptaçiÍo umâ oportunidade de mobilidade vertiCal, sobre um
pano de fundo cuja tôoica erâ â escÍaüdão. D€ outÍo lâdo, e tso valê
também pâra as elites di§d.ntes, sêu eventual inconformismo não
podia ir muito longe. Pois, em virtude do hiato acima, erâ-lhes difícil
mobilizar duravelrnente ao m€Íros as camadas Ínais despo§suí-
-
dâs € orgânizar com elas movimeítos nacional-popular€s.

' Pubüedo originatn.ntc ío lor@l da Rêpúbli@, dc 19.\0.L919.


()

53
52 MICHELDEBRUN A'CONCILIAçÃO* E OUTRÀS ESTRATÉGIÀS

formas mais controladas dâ tolêráncis, a diíânci'


podê'sê toÍnar
Nessâs condiçíres  "conciliâtão" foi para muitos umà sÃídâ
Dequenâ. O que fa.ilita a ü3ão da cooptâção Polú
mab ou meno3 foÍçâda. M€smo quando os conciliâdos não cram el.- "..""t.."",.
mênt$ misêÍávêis, mas os lib.rais integÍados à órbita consêrvadoÍa ii." .oro t raà ,* "tp"cto da mistuÍâ §ócro{ultural ênlre vslores
heterocénêos. Tcrctiro, a parÚ dcssâ id€ntificâçâo, o
que há de
dêpob da d€rÍota da Praia, ou os consütucionalistis paulfti§ "p€r.
doados" por Vargâs mcdiante o abandono dãs preten§aies de São coâtor-na cooDtação che8s â ser peÍcebido sob novo PrinnÃ' como
Pâulo à heSemonia polític.. r"*f-ao pi"íai*t. do pâi, do pâdÍiího ou do Pod€r Mode'
"
Como então â "conciliação" pôd€ ter aparecido, a nível idco-
No limite, e aqui bÍotã a id€ologia PÍopÍiam€nte diti' o fosso
lógico, como um compÍomis$ equübrado ê coÍdiai? Não bastâ Cedc lugaÍ'
o tooo e a bu.c ,ln piÍâmidê social tendeÀ §ê esvaiÍ
r.sponder qu. uma d⧠funçõ$ da idêologia é pÍccisaÍn€nte ma§cariu "ntr.
a reúdade. É veÍdade, mas s. dêve ir âlém: como isso foi pdsível sôbretudo na mente do§ que mandam, à idéi' de umacomplementa'
€ funções d€ execução'
e aindâ o é eln ampla m€didr? O enigmâ Íedobra, sê observarmd qu€ Íidaale hâÍmoniosa entÍe funções de dir€ção
forâm sobÍctudo os gupos dominantês a! vítimas da ilusão ideoló-
p*, ," o.un"itu.rtul" pr;destinÀdos certot estâÍrentos cujã üde'
gica. Como consêguiÍam autonaÍcotiar-se? Como o mecanisÍro da ."n"" teria o coÍ$nllncnlo alivo do! outíos elem'ntos Como

na'epoplia trasllelra dê Cãssiano Ricârdo' prÍã quem a


âceitaçno
"concüiação" não s.ltou aos olhos menos clâriüdcntes? É que int€r-
fêriu outÍo êl.mentoi a concilisção (desta vcz sem aspas) no árnbito àa'ot au ni"tutqui, ontoló8ica dos bÍanco3 mâmêlucos € Índio§
"..
;;;,i, ""t bandeirantes o tÍimeüo "imPâcto": a conquilta da
úcio-cultuÍal, que sêrviu pale disfarçaÍ o que ocorriâ no ánbito
imensideo, gr4as à pârliciPaçáo gerEÍosa dos PróPÍios
con-quis'
úcio-polÍlico.
peÍcêb€r qu€ a realidade
O qu. se deu nâquele ámbito foi Uln compromhso flexr'v€I, üà... r"iaJ-ra"ao -i§âs? como não
a" ""
p.'drrÍâ mcsmo que à ideologiã da conciliaçâo
mole, êntre valores, inrtituiçGs ou técnicrs que chegaÍam com os
colonüador.s (ê forrm depois coruitantemente Íênovados, de fora) ê,
'oiiil., ur"'ptoiit ão de fé "liberal' que mâl lh' di§faÍçà os
La" tug"t "ooo,"qeo
por oulro lãdo, as resisGncias da todr natuÍeza quê criãrâ.,n emPe-
"
trâços fundamentais?
cilhos à eÍicáci dcases pâdÍõá no conlexto bnsileiÍo. Como mos-
tÍou FloÍêstm Fernrndes, o @mportamento concÍ€to co espondeu
só muito püciâlm€nte a normas de qüe ninguém, poÍém, queria db-
pen§iü o caímbo. M€slno porque não hãviâ outras disponívei§. A§
Íêgtai eÍam ao mêsmo têmpo d€tuÍpâdãs e cultuâdas. Tinhün dê
autcnticâr aüúdâdês reliSiosas, morais, econômic⧠ctc. . . qüe
d€stoavam d€lri. AnÍsio Teixeirâ d€wendou €se oscilação, cntÍc
vílores 'broclünâdos" ê vâlorcs "reais", no ensino bÍâiileÍo. E
Antônio CâÍrdido mostloü os etores das rl{emórfu, de um Wento
d. Mílícbs lio €nvoMdor pêlâ dialéticâ confusâ da ordcm e dâ
diltiÍgür o lícito do
désordcm que sê lhes toÍnâva basturte di.fícil
ilíêito.
Podê.sê veÍ, cnüÍo, como a concüação úcio{ultural invêstiu
id€ologicamcnte r "concilirçío" f,oh'tica, emborâ esta constituísse
um mecmisÍno d€ disciplinamento ê aqu€la uma manifêstâção dê
Íelaxamênto. PrimciÍo, os âtorcs dominântca pnticavam - e prâti.

E cün as duâs, pa3sârldo r câd instrnt€ do rigoÍ global qu. .e8e o


-

I
cnquadram€nto dos grupos subaltemos paÍa a tolcÍáncia em Íêlaçáo
a inÉÍneÍos aspectos do dia-âdiâ a rcciprocàmente. O que favoÍece as
confusõcs. Sêgundo, ent c as formas mais brandas do ÍigoÍ € a!
A'CONCILI^çÂO" E OUTRA§ ESIRATÊGIAS 55

ensaiaÍ váÍios tipos, ayançando e recuando, como vêm ocorr€ndo

Eú Íelação a muitos pârcÊiÍos, é vcÍdâde, IIão hí pÍoblêmas.


É fácil compor ceÍtas dis§dências dêntro da ár€a situÃcionistâ, ou
suscitar êdeísnos nos elos mais fÍacos da Oposição. O éxito d.3sa
iática decorÍe, €m pârte, do simples fâto de qu€ o podêr é poder,
tem algo a ofereceÍ e pode negar muito. Mas, por outra pâde, Íeflete
a capacidadê dê coâção secular, ê que ú começa a dêÍinhar, dãs
elites brâsileirâs. D€vido à magritude do hiâto cconômico, socia.l .
cultuíal qu€ existiu desde ss origens entre elas e as outras camÂdas,
s€mprê houv€ possibilidãde de reproduzir esse mesmo hiato. Apro-
veitou-se a organizãção epenas incipiente das class€s $balternas paÍa

As três "Conciliações"* esÍnagâr os incônformhmos, ou prêv€nilos pelo âIiciâmênto de


certos elementos. Ou seus '?prês€otantes", Châguiríno e mâlu-
fismo se €nquadram num arquétipo que vem d€ 1on8€. Exprimcm
e espremem os Íesquícios do passâdo brâsileio, A primeiÍa 'tonci-
O .tual poder não pode dispen$r a .,conciliaçáo". liação" se destina, pois, a encher os cuÍÊis elcitoÍâis dâ República
Mâ!
também nío pode ir muito além d€la, s.m lügar a! rédeas. VoltaÍ ao Novíssima.
autoÍitâÍismo brutal seÍiâ p€rder üedibilidade, €m viÍtudê do com, A s.8unda "conciliaçío" é um snho de sÍti3tâ. TÍâtar.s€-i.
promisso rêiteÍado com a democrâcia. E ta.h€z nem fossr mais de tornaÍ o Sist€ma plural, difeÍenciado. D. ÍecrutaÍ paÍcctos
possívêI, devido à rêlaüva abertura que já sê deu. Mas enverealar tendo uma peÍsp€ctiv. pÍópÍia, ê todÃvia "confiávcis". O que, sobre
pêla democÍâ.ia plena ou simpleso€nte p€lo überaüsxno genuíno, desfâzeÍ a imagêm d€ monolitisrno, alseguÍaÍia também uma maior
s€Íi. render-s. ao adyêrfio. Há, pois, que ficar no meio.têrmo. Ou flexibilidade interna, facilitando a âdaptâção do Si.tcmr às muden-
sêja, numa "conciliaçito" vislâ como cooptação de patcêiros cuida, ças in€yitávêis. Mar não dá. É râÍísiimo €ncontÍar percciros dotâdos
dosamertê escolhidos, mediante uma combinação de êstímulos e de igual vocação paÍ. iídependência € submissâo. Prevalec€ndo os
pressõ€s câpazês de Í€têlos nà óÍbitâ do podeÍ. Essa combinaçÃo pruridos d€ libeÍdade, eles levdão d€ Íoldão a fid€lidade, como já
devê ser tal qüê seu êxito independa tsnto dos humor€s vajiáveis sê vidumbrà no comportarnento dê alguns "biônico3"- Predomi.
dos cmptados como dos desdobramentos $rcessivos da conjunturâ n.ndo o 'sim, senhor", seus adeptos * desmoraliz.ÍIo mris Íapida.
políticÃ. mente do que os âdesistas da Eemâ, que nem . idcolog.i da ãuto-
Mas âqui suÍge uma dificuldade. pois, se certas colÍ€ntês _ nomia advoSâm. Só pod€ fraçassff uma "linha auxiliar", poÍ mais
ind€pendentês ou que os ârticulâdoÍês oficiais sê esforcem por estimular a imaginação
"social-d€mocratas,, - enciuam a eventua-
lidâd€ de uma conciliâçâ-o futura com o podeÍ, é dentro de outÍa e exijsm dela o quê, sÊgundo Rous3.âu, â Vontadc
pcÍspecüvâ. Quâl §.ja. a d€ âlianças dc ripo clássico. quê sê Íazêm ê GeÍâl deve engÍ do cidadão Íecalciuânt ao exercício dâ $a pÍópriÂ
dêsfaz€m ao sâboÍ das conjunruÍas. E, parâ tanto. procuram rlcançar libeídade: 'forçaÍêm.no a sêÍ liwê". E par€ce mêlrno que a sgunda
uma posiçío tâl, que possaÍr negociat sem sêrêm coagidas. O poder, "conciliação" foi sepultada.
poÍ suâ vez, sê não podê igroaaÍ essâ alpiÍaçÀo, não quer abriÍ mão Dâí a idéia de umâ terceiÍa "conciliação", quê sÊ aproximaria
do sêu poúsito fundaúe,ltal. Daí a neccssialâd€ que se lhe impõe, das âIiançãs clássicas sem todavia se confudiÍ com êlâ§. Dêstr vcz
d. diversifica! a "conciliação" dc âcoÍdo com os inteÍlocutores. De sumiÍia ã coação, ÍÍrêsmo implícila. TrataÍ-se-iâ rp€nas d. montar um
quadro político, p€rmanent€, tal qu€ ãs velêidades de secessão dos
"cooptados de luxo" §€ tornassem allâmente improváveis. Que nem
' Pubücado oiieinarrnenrê r. FoUe dc s. rhub,ô. t4_ro_1979. houvesse, por müito tempo, alêsejo de$a recessão.
56 MICHEL DEBRUN

O que pod€ní scÍ tentado atÍavés de dois instÍumentos. PÍi-


mêiro, fazendo Íendêr ao máximo â'toociliâção" tndicionrl,
gÍaças a um disüibütivisno dirigido às catcgoÍiãr meis dêfavo-
rccidas ê à difusão corrclativa d€ "mitos do João", supostam€nte
dê fácil pên€tÍâção. Islo para têr uma Íetâguüdâ ma.iça de 'toop-
tâdos dc lixo", parâ qu queÍ fim e, êsÍ,€cificamente, para aumênta,
o cacife do poder em Íelaçlio Ãos novos patc€iÍos. Segundo, p€rmi-
tindo que estes di§?oúam, nr slâ inlêração com o Sbtcma, de
áÍêas cm que os conflitos podeÍiâm se expandiÍ além dós limitêg
íixâdos pelas ideoloúia! da 'toÍdiâIidâde dâ nossâ gente" e do
übêtalisÍro 'hosso". Essa§ &êas pêrmanec€riâm todavia contÍo-
lávôis, por duas razões. De um lado poÍque o d€senvolvim€nto
'txtÍa-sistêmica" não sê faÍia às ccga§. Mas a.om.
dessâ conciliÂção
O autoritarismo
par)hando pâsso a pásso os pÍogresos da conciliação tosce, 'lntra-
sistêmica". Crcsceriam simultrneamente o p.so e o contÍapeso. "mobilizador"*
D€ outÍo lÂdo, pÍocuÍar{ê-ie a maioÍ estânqueidâde Í€cíproca
- 3êm compÍomêteÍ em excesso a ideologia da abertuÍa - €ntre âs
opcritir
diveÍsas áreas dê libeÍd6d€. Por exêmplo, pelo tÍâtâm€nto dif.Íêncial A ilêsconfiançâ dos elements mais atuantB da clalse
qu€ s€ria dispemado s setoÍes pÍivilegiâdos dâ clâss€ operáÍiâ, do face aos intel.ctuâis - ê não âP€nâs fac, âot políticos populi§tas
empresrÍiâdo e da clôssê polÍtica. Podendo inclusivê sÊr bene- eüd.ncia o dêsÍnoronefiento dê um aÍquéúpo qu€' duÍante müito
íiciâdos alguns elementos d€sta, com a altamánciâ no poder. tempo, imPrêgnou as relações entÍe a§ êüt€s di§sidcntês c o "povo"'
TÍata$e-ia, mâis uma vê2, de transformaÍ a liberdade em pÍoprie- O qu€ trúsparcce, atÍâvés dâs Íeticências dê Lula e outÍo'
dâde de cêrtos 'estsmcntos". Dê condicionâr as meiores frâhqui.j líd€Í€s sindicais. ante ar t€ntâtiva§ dê aÍÍ€Simentá'los em torno dc
fropo",u. ,rti*ud"" Por socióloSos economist 3 ou
d€ ceÍtas categorias ao isolam€nto recíproco dessá! categodas, e poüÚólo8o3
também à maior subjügaçÂo dê ôutÍas categoÍias. Dc impcdir, êm c r"cus" dos setoÍ€§ populâÍes meis csclârecido§ cm
sumr! qua â sociedâd€ s€ Íeúna êm tomo dela pÍópÍia -e não maia "
seÍviÍêm dc €§cola d. âpücação paÍa conc€pçõe3 .lh'i㧠Bcm_intco_
êm tomo d€ um ccntro trürs.€ndente - € se fsçâ tlanspâÍ€nte pãÍa cionadas, admitem, mas forjada§ foÍa dã práxis opêrfuis, se bêm
o corÚünto dos §eu3 membros. que os int€lectuais Pretcndam apenâs êxplicitaÍ os obj€tivos de!§À
Eis, acÍedito, um dos pÍoictos do poder. Meno3 Íüncísico do pÍíis,Ievála até o máximo de cons.iênciâ po&sívêl'
quê o soúo dc Pigmalião. Mas poderá ele exorcizsr â impreüsi Àcusa por isso âs lid€ranças populaÍ€s de obÍeiri§no é uma
que r
bilidadc dâ libeÍdâde, scm mrta. a Fópria, ou scÍ poÍ ela morto? aritudc fiícil,;ue iSnoÍã a§ emargur.§ da história brâ§iena É
à sÔciêdadt cm con'
"outorgâ" de algo aos humildes ou mesmo - elilca
iunto foi . continua sendo o denomi^ãdoÍ comum
- áÉ con_

servadoÍÃs ou proSÍcssiíl5. A
doação" Pode Ícsidn nâ ProtcçIo
DatêrnÀl e na càpacldâde d€ diilogo do Poder ModeradoÍ. como
àuere'n os aacptos dâ "concitiâ§ão' ou do lbeíali!Íno 'à bÍâti'
tiira'. Ou na 'oÍ8arizâção dâ nâ§ão . pelE imPlantação tecnocÍá'
ticã dos dircitos ciú§, êconômicos, sociai., cultuÍais e,lá pats os lin!

* Publiqdo oi8iúlí.ntê no tonal ita R.úbl,a' nê 3 t r '1919 '


Â
..ONCILIÂçÁO- E OUTRÀS E§TRÀTÉGIAS 59
5rJ MICHEL DEBRUN

dos tempos, dos dirêitos políticos. PÍetende-s€, ness€s dois cÍtsos PoÍtúto, o ap€lo à idcologiâ € o êspiritualisnno
Entende-s€,
pârtiorlarmente no s€gundo, qu€ dein€ o autoÍitari$no desÍnobÍ oue úaz; r.boqu;. Poi§ o qu. é artificial é Por dcfÚWão fÍágil E
lizadoÍ promoveÍ o povo sêm a srâ p,uticipação efetiyâ, através
- o simoles Íato de desvêndá'lo e a Pârlií di§o dc congrê8ar os
lsetores dinámlcos" em rcÍno de um proj'to de nova socÉdade'
de politicas "objêtivas". Mas, embora tenlu sido o casr menos
siÊnilEa meio caminho P€rcoÍndo À fagulha tdeoló8ica opên
a
fÍêqücnte, existe uma terceira outorga possíveli a de ideoloSias, ou
por
mclhor, d€ pÍojetos polílicos vazados em termos idêológico§. cãnversao ouast mrstica das consciências celebrada oulÍora
CaÍacteÍizam-se, pÍimeiro, pêlâ foÍmülação de objêtivos com irrâIo vi.i" Pinto. E umâ vez iniciada a Íedençáo ê§Piriluâl a
História podeíá tomaÍ um rumo acelerado- a dificuldadê
reside
fortes conotações €spiritualistâs, mesmo quândo inspiados na reali
ideo'
dâde brasileia. Como a recÍistian2ação do BrÃsil, pregada nos aíos menos nós obstáculos exterioÍes do que nâ próPÍia arrârcadâ
20 por Jackson de FigueÍedo. Ou a "auto-âfimâçÃo nacionâl lógica, no despêíaÍ dos gÍüpos e indivíduos Àté agora merBulhado3
mas d'
pelo dêsenvolvimento" (sendo este, pois, o meio dâquelÀ, e não um nnl" t."ras. oài a nêces§dade, não apenâs da ideologia'
fim em si) dos pensadores do Insrituto SupêrioÍ de Estudos Brasi- rúá doacdo" Dor c€r(os int.lectuait ao resto dâ sociedâde êm parti
da edu'
lcnos (ISEB), nos anos 50. Ou a con§.ientização e a desâlienação c'naÍ aos el€m;nlos mârs humildes' A mobilização dêp€nde
das massâs, pêrsêguidas pelos CentÍos de CultuÍa PopüÀr do peÍíodo .âcão. ou dâ cat€quese.
GoúaÍt. Ou Àind., na p€rp€ctivr de Olivetos FerreirÃ, ã "alforria ' Nao cab€ aqui um debate em toÍno dà {íãquêzâ" da
sociê'
é ou foi Íeal
da soci€dâde civil" à a suâ libertação das peias do Sistemâ consti. darle brasileira, tlo seu carátêÍ Íeal ou iluúrio E, s' êla '
Podemc dâr de balato' sem
tuído pela aliança e§ausa da burocracia estatal, do imposto súdical alÀ sua naturalialâde ou dtiíicialidade
e dos inteÍesses aÍcâicos do campo ê da cidade. i".o"t", a. q"" houYe pêlo m€nos algumas apÜ'ícias dc
Em segundo lu8âr, os arautos desses projêtos visam.semprê à ""r*",
fraoueza. FoÍam elai que embasaram os arquétipos autoritúios
pÃrticipação ativâ, e mobilizâçâb em toÍno deles, da coletividade, .*'. ai"u-* a" p"t -int.t"*.
nun." foÍam Plivilégio exclusivo dâs
ou, pelo menos, dos elementos üstos como 'dinâmicos". Est€s ã."i.^-".to. ""r" "gi., as plêdis?usêssem a n€les'
'ntrar
têm sido, alt€Ínâtiva ou concomitantemente, as clâsses módias, a aoa ,olúpir. A8ora, porém. a3 pÍópÍias apaÍenci⧠começam â s'
apenâs
burguesia "íâcional", o pÍolêtaÍiâdo, os míitâÍes. Gramscianamente dêsfâzer. Àssim sefldo, é compÍeensivel qu€ a§ massa! e não
catequizâdos pelos intelectuais (a outorSa §eria, portanto, de dois hla. DrefÍam dcspêrtâÍ poÍ conra pÍóPna' E nâo mais aceitem
nív€is), êl€s t€Íiam de a§sumir a h€gemonia da sociêdade civil. Para uln" aefinicao alocirla dos seus veÍdadeiÍos interes§rs' Rej€itam
que' pâra
conquistn o podeÍ, que Íuncr, âliís, cons€guilam âbocanhar. até o auto;ilarisno mâh brando. o mobilizadoÍ Mêsmo
i-to, t"nt num PÍimeiÍo t€mPo de §êguiÍ câminhos "cconomi
Nem m€sÍro nos idos dc 69, quândo o "nass€Íisno" do E€nerâl
AlbuqueÍque Lima pareceu a ponto de triunf&.
",
chtas;' e corporativos, pouco do âgÍado dos intelecbrâis'
O important€ é v€r que, apcsâI dâ énfãsê sobre â ideologia, o
"mobilizacionismo" encampa o postulado fundamentâl dos outros
autoritariínos: s 3oci€dade brasil€iÍa, ou parl€ dela, é "fÍâca" e devc
s€r redimida. A única diI€r€nça, srbstancial embora, é quc â 'tonci-
liâção" e o .utoritaísmo desmobilizador coftideraIn €ssa fraquezâ
natural, ao passo quê o autoritarismo mobilizador a vê como mais
ou menos artificial. Os pÍimeiÍor dêstacam fator€s, raciais princi
palrnente, que teriün estÍutuÍâdo a história bÍasileiÍa e cujo peso
n€Sativo ú pod.ria sêr supendo nâ muito longa duraçâo. Fâlãm
em "âmoÍfisno", que âs elites têm â &úIâ missão de coÍri8ir. Os
ütimos falâm mais em 'âlienatão", por veÍ a fÍaqueza bras ena
detaÍmimda, ao menos oÍigúifiamênte, pelo impêÍia.lismo estran-
geiro, pelo "Sistema 'etc . . .
A 'coNctuaçÃo" E ourRAs EsTRÀTÉcIÀs 61

esquerdisà (qu€ todâs ãs soÍdagêns davam como wncedora), caso


€la v€nc€sse, r€flete uma êvolução múto recente. Ambígu., aliár,
poÍqu€ â meÍxâgem advêÍtiu tâmMm sobÍe o caos econômico e
social quê ÍesultâÍia do triunfo esqueÍdistâ, a de8Íií8ol.da do frenco,
os impa$es do comércio exteÍioÍ etc . .. Ficou implícito que âs
cois⧠podeÍiam torna.se tiÍo catastÍófica3 que um Í€dentor teriâ
inêvitâvelmente de surgir, mais cedo ou mais tarde, pâra rccoloaâr

Isso sigrlil'icâ que a alEÍnáncia no poder é problemá!rca Íiâs


§ociedades como as latinâs, €m que êxittem pÍivilégios acentuados
que elâ poderia am€açar, Mâs, sobre essê pano de fundo, o ca3o bÍasi-
lêiÍo âprts€nta agrâvantês. Primeirc, porque o fosso entÍê grupos
A alternância no poder* dominmtes e dominados aqui é maior, em todos os planos. Segundo,
a profündidâde dê$ê fosso fâcilita ar políticas autoÍitária3,quê
vfuam suâ manutençiio p€rpétua. Terceiro, o êxito contínuo desas
políticas tem cÍistaljzado, e nío apefis s mentes dos dominaítes,
ideologias pouco favoráveis à rotatiüdade dos governantes. PoÍ
.Tl, discussô€! sobre o número
, Á"pârüdos e âs tendências dos exemplo. o rêIna da fíaqueza' dà sociedãde brÃsileirâ. aa incapa-
"lutuÍos sio importânrês, mas não devem €slender
umà coÍ. cidade atual da mâioÍia dos brasileiros em escollprem sêus repÍe-
ünâ dê lumaça sobre o pÍoblema essencil
aa aemocracia: como sentântes. Eles pÍecirariafl, ant€s, s€Í €ducados. O que legitimâ de
lornaÍ confiável a fóÍmula que seÍá
fina]mente adotadâ? Havendo antemão a possibiüdad€ de uma inteÍver4ão que anulaÍia os resul-
dors, três ou Ínâis paÍtidos, como
alcancer I tados de uma ê1e4âo danosa ou maíteÍiâ sob tutêla militar seus
possuiaaae aa suJJrirnã;il ffil;Jü:I#ff 11,il::
1.1;.lr' '. "",{*,. arrünenre pr;váv€r ranro aos olhos da ctasse Foi isso que se pÍ€t€ndeu êÍr 1961, quândo a diÍeita anuiu
Í,otrrra como da opinjâo em coniunto? Con
à por§€ d€ Jango. Foi burlada, no câso. Daí a extÍêma cautela €
o axr.," i;;;;,ài:"qJin",:,i.HlT;
geral que arinse aq,i
que se preze _..quem gania casuístlca dos atuais donos do poder. Mas êles não contaÍr apenâs
ieva,.? com as afimanhâs poÍt€llistas p.Ia peÍpetuarem. CoNciente ou
se

nao ,f_:"ll!: :." :.


".^ ê.rao ftâçâo a esse âxioma. a §tuaçÀo b,âsireira
ex(epcional assim. Áfmal. ÍoÍa dos parses
inconsciênt€m€nte, el€s descâísam sobÍêtudo no p€so das s1ra5 ideo-
anglo.eiónicos logias. E isso r
esqu€rdâ não quêr péÍcebêt.
e nordrcod, umâ sombra continua pairando-
noi Pois todo o fogo do seu âtaque sê concenua sobr€ r obs€s§:io
::..y:T.:1.1",
!!$as
ri,,""
erêrç/oes c:rso a
*i,ãl qil' ll",i.l,l'::':"Hl:#;: governâmental de cnaÍ uma siíração tal qu€ uma vit&iâ €leitoÍâl
esqu€rda lriunfassê. tiso é parücul;rmenle das esqueÍdas sê tornê pÍâticamente impossívcl. Dênunciâm-s€ À
vlvrer,nos !âísês lârinos _ Iráliâ.
França. fuanfra. portugâf. À camisâ-de-foÍça imposta aos aÍ€nistÃs ÍefÍâtários ao "AÍ€não", a§
e propasania. como À risrra ai pr€ssõ€s €xeÍcidas sobre os awtant€s à tÍabalhistas ou indêpen-
ill]".,11"::*T,-r:"-*.nsa
p, EriíE!çcs. Íao coÍresponde poÍ igual a pro.
poderrâ empalmâr o poder.
cerreza d. qr" fránt. rr* dentes, Ío sentido d€ daÍ um câÍáteÍ caudatário a suas futuÍas agre'
lopuâr na !ésperâ Á declsração do presid€nle miâções ctc. Isso nEo deveria fazêÍ esquec€Í qu€ a força de§sas
rÍ4ft€s, das eteiçôes legistativas d€ leie.
Ienà condiçôes dê recusa.r a êntrêga a. q,i. .i" ,a. pÍe$ões é apênas denvâda. E quê 03 que cedêm à chantagem rão o
do poder ão lder da coÀlizão fazem exclusivamênte com ústas a beness$, ÍÍtas a partir da s€flsação
de que â atuâl configuração de poder ou algo parecido s€ mâÍr-
-
i Publiedo ori8inêtD€nte teÍá poÍ muito tempo ainda, mesmo quê t€íhà dê ceder em ques-
nã Eüsta 1sIOd, .lê 14.11, t 9?9,
tões sêcundárias. Nío quê âcÍedilem oa onipotênciâ dos militares,
62 MICHELDEBRTjN

como em 1964. No brâço armado, simplesmênte por s€r


armado.
Ap€nar, e_como muitos outrost vislumbÍan, na sociedade
ciúI,
uma diliculdad€ em sê autoorgantar. E a necessidâde, pelo
meno;
em dgum gÍau. de umâ organização dê cimâ para baixo.
E. nêssa
base. descÍéem também qu€ a orgadzâçâo que
ai esrd possa ser
lacilmênÉ desbâncadâ. euê uma âtlernâliva de poder.
mismo que
ganlrc nas ünas, possa leval.
É^essa srnsaçâo difusâ o pÍincipal obslácuto a superar. se
sr
qurseÍ lbrlalecêr as chances de uma Íotatividade dos gàvemanres.
Porque, quando ela d€ixd de coÍrstituir uma êüdéncia,
como já é
o caso para algun§ setores (comunidades de base, sindicalj§n; de
ponta, entre oulÍo§). não haveÍi mais naía n€m njnguém
capaz de
fechâr sobre sj o casrêto do ..Arenão... I;smoronaÍd.
Á tura potí.
tica_não pode, portanto, cingir-§e ao teÍeno da reformulaç6o
partidáriâ, no sentido de gâÍantiÍ futuÍas ütóÍias
elêitorais da o;o-
siçào. Dcve ser também rdeológica. F não apenâs em termos
Um sonho hegemônico*
de pro.
posrÀs de uma nova sociedade. mâs de ânális€
cllica da produçito e
rêp.odução das idêologiâs autoritárias no BÍâsil. E qu", À aif"àrç"
do que ocorÍ€ na Europa, onde o golpismo entÍa, enve4onnado, As ameâças, muito reais, de fechêmênto político não devem
peia
poíâ dos fundos, ele está, aqui, instalaalo no coÍação da pÍópria obnubilar o fundamentat: o Sbt€ma, desde o fim do período Geisel,
ideologia- Pontiíjcãndo. togo. é êssr coracão que se deve visa a hegemoniê, a "dirêção intêlectual e moÍal" sobre a sociedade
atingrr, brasilêha. Não que invoque um projoto de sociedade bem definido-
mosllando a Lodos, incluíve aos delenloÍes dessâs ideologas. q"ue.
mesmo quando nilo congtrtuem engodo§ consqenlemênre Oscila entre vúias sugestões, poÍ Íefletir as contÍadições dà socie.
desLi-
nados a legtiÍnâr privilégios, elas ndo pâssarn do rasrro dade civil e suá própriâ contrâdiçãô com a soci€dade civil. Estâmos
de práticas longe dos tempos de Médici, da opção clara pelo desenvolvimento
secularês de dominaçáo. Sâo estâs que lõÍnâJam ptausíveis.
ieto seu
êxito, as idéia3 da natuÍêza infantil ou aitolescente ilâ cego. Mas, embora âpelándo parâ vâlores e obj€tivos confusos, o
sociedade pod€r tem a pretensão, novâ, de oÍientar e convenc€r, Irgo, busca
bÍasÍeirâ e da nec€ssidâde de sua promo{âo tenta. graduat e
segura. a compÍeensão e o con3engo dos governados e náo a p€Ímanéncta
Sob controle. . .
da simples dominaçáo. aÍavés da coaçâo e da Íepressa-o.
_ _A desmistificação das ideologias conservadoras
tlaro..o anrrAoro
só. é
ÍÍio é por si Pode s€r que a nrpturâ dos equilíbrios €conômicos básicos e.
mlalivêl aos golpes. MÂs é a condiçao de
base de.qualquer trabâlho politico #rio. Enquaíto vigoÍarem no rastro, o recrudescimento da inflÀção, a êxasp€ração dos descon-
essâs tentamentos, a impossibilidade de Íespondêr às exigênciâs de ceÍos
rdêras. dentro e fora dos grupos dominantes.
o gotpe csrâra nâ grupos etc... ch€guem â configurar, como únicar altemativas
esqrlina e não havêÍá fórmula úNituciona] capaz de gaÍantir
de talo possíveis, o "caos" ou o endurecimento. Mas este desfecho, se ocor-
a altemáÍlcia no podêr.
ÍeÍ, será debitado pelos donos do podeÍ â um acúmulo de circuns.
tánciâs desfavoráveis. À má soÍte que cêIcou um pÍojeto de êntÍosâ-
merto d€firitivo entre o Estado e a sociedade civil. O auroritarismo
puro é visto agorâ como um acidente, ou como uma etapa que foi
necessíÍia à consolidação do resime, mâs não como sua essênciÃ.

* Publicado oriúnal,lenle narevista/§?Oá, de 9.?.1980.

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