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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS


DIREITO

Ronaldo Schopf

ATIVIDADE AVALIATIVA 1:
QUESTÕES RELACIONADAS A PESQUISA JURÍDICA E DIFERENTES
TIPOS DE CONHECIMENTO.

Santa Maria, RS
2022
Ronaldo Schopf

ATIVIDADE AVALIATIVA 1:
QUESTÕES RELACIONADAS A PESQUISA JURÍDICA E DIFERENTES TIPOS DE
CONHECIMENTO.

Texto único, contendo as respostas das perguntas


realizadas em sala de aula, referentes a disciplina
de Metodologia e Produção de Textos Científicos
do curso de Direito, da Universidade Federal de
Santa Maria (UFSM, RS).

Professor Dr. Rafael Santos de Oliveira


Santa Maria, RS
2022
ATIVIDADE AVALIATIVA 1

A pesquisa jurídica enfrenta uma série de barreiras dentre as já sedimentadas em estudos


relacionados às ciências sociais em nosso país, as quais acabam por agravar a quantidade e a
qualidade de textos científicos criados nesse ramo. Um desses empecilhos é a constante
confusão entre a atuação profissional, fundamentada principalmente na defesa de um ponto de
vista, da pesquisa acadêmica voltada ao direito, uma vez que a pesquisa busca submeter uma
hipótese a testagem e não somente defender ou acusar essa constatação, o que fica claro no
texto de Marcos Nobre (“O que é pesquisa em direito?”) e na leitura do arquivo “A tentação do
advogado na pesquisa científica: Defender uma hipótese ao invés de testá-la". Dessa forma, o
operador do direito, em vez de proceder com a testagem da hipótese de forma imparcial em
seus estudos, realiza a pesquisa acadêmica adequando a constatação de sua hipótese a sua
opinião pessoal e a prática jurídica. Para exemplificar tal ponto é válido pensar em um aluno
que tem relação afetiva com a tecnologia e resolve realizar uma pesquisa sobre inteligência
artificial na tomada de decisões jurídicas. Dificilmente esse aluno conseguirá se desvencilhar
do seu posicionamento sobre o fato, nesse caso concordando com o uso de inteligência artificial
na tomada de decisões, substituindo, talvez, parte da magistratura. Dessa forma, em sua
pesquisa, os argumentos favoráveis à sua afirmação inicial tendem a ser mais persuasivos e
completos em relação ao posicionamento que vai contra o seu credo, o que corrobora o
agravante quadro de pesquisas jurídicas no país.

Ademais, tem-se constantes entraves criados pelo rebuscamento excessivo da


linguagem jurídica (o popular “juridiquês”), que inviabiliza a sua compreensão por ampla base
social. Franz Victor Rudio, em seu livro “Introdução ao projeto de pesquisa científica”, tece
alguns pilares fundamentais para a manutenção de uma boa comunicação em uma pesquisa
científica, o que garante o seu entendimento e acaba por conquistar o leitor. Um desses pilares
faz menção direta à definição de termos para adequar a visão do escritor ao pensamento do
leitor. Essas definições devem ser simples, suficientes, objetivas, claras e breves, uma vez que,
como já mencionado, o rebuscamento excessivo de termos sem a devida caracterização pode
repelir o usuário do conteúdo e acabar por elitizar tal escrita. Dessa forma, a definição de um
termo deve visar deixar suas características claras e reconhecíveis, semelhante a um
microscópio, que deve ser focado (pelo autor), para que o observador (leitor), consiga aproveitar
o máximo de detalhes possíveis na imagem, evitando ruídos de comunicação. Fica evidente,
com o texto de Rudio, que a cientificidade não se encontra no rebuscamento e que esse é um
grande inimigo da compreensão, a qual afeta diretamente a qualidade das pesquisas jurídicas.

Outro fato que merece destaque na produção científica relacionada ao direito é a


aplicação de constatações não científicas em pesquisas acadêmicas. Embora em uma pessoa
coexistam diferentes formas de conhecimento, é fundamental que o pensamento seja
“selecionado” ao ser redigido, com o fito de se inserir majoritariamente o senso científico na
produção de pesquisas jurídicas. Mesmo parecendo difícil aplicar esse “filtro” de
conhecimentos, é notório ao menos diferenciar aquelas ideias transmitidas de geração para
geração, das oriundas de um esforço da razão para explicar questões humanas, das admitidas
por textos sagrados e, por fim, aquelas reveladas pelo estudo sistemático, experimental e
metodológico, que devem nortear, em sua maioria, a pesquisa acadêmica. A direção da
pesquisa, como supracitado, deve se basear no conhecimento científico, partindo da máxima de
que esse se apresenta em constante evolução. Essa ideia de “sobreposição” de saberes tende a
ficar mais clara com o seguinte exemplo. Uma bacharela em física, após se aposentar, adquire
um sítio no interior do Rio Grande do Sul e se transfere para essa localidade. A física, durante
a primeira semana de atividades, se depara com a proximidade dos arames da cerca que demarca
a sua propriedade com os fios da rede elétrica e resolve realizar um aterramento desses
condutores com o fito de evitar possíveis acidentes, mas após a exaustiva tarefa de fazer um
buraco e enterrar uma haste de ferro conectada a cerca, a mulher percebe um estresse anormal
e vai até a horta para recolher folhas de camomila. Com as folhas em mãos, ela se lembra da
proporção mencionada por sua avó e prepara o chá com a erva, água e açúcar, para amenizar a
sua situação. Antes de dormir, a mulher percebe o vazio da região em sua volta e começa a
refletir o por que se estar ali naquele exato momento e sem companheiros, até cair no sono. Pela
manhã, logo após acordar, a física abre sua bíblia e lê algumas páginas, até ser motivada pelas
“palavras de Deus”. Durante esse período a bacharela percorreu, em ordem, o conhecimento
científico, o popular, o filosófico e o teológico, evidenciando a possibilidade de ambos estarem
contidos em uma mesma pessoa, simultaneamente. Apesar disso, caso a física, após ler sua
bíblia, resolva dissertar sobre a relação entre o aterramento de sua cerca e a geração de um
campo eletromagnético pelos fios condutores de energia elétrica, idealizando uma pesquisa
acadêmica, deve se desamarrar de grande parte de suas ideias e dar foco ao conhecimento
científico, como já citado.

Ao fragmentar o senso científico encontra-se uma série de características que explicam


a sua utilização em pesquisas acadêmicas. De antemão, ressalta-se que a investigação científica
é extremamente dependente de sistematicidade e método, uma vez que para atingi-la, deve-se
seguir regras lógicas e procedimentos técnicos, como pontua Lakatos (1992). Essa organização
de ideias permite o acúmulo de teorias que, segundo o autor, continuam a se somar, mantendo
um constante ciclo de informações que se renovam e atualizam em decorrência de novos
estudos ou da invalidação de concepções já adquiridas, enfatizando a acumulação de
conhecimentos e diferentes percepções de mundo. Ademais, menciona-se a falibilidade como
outro importante pilar do conhecimento científico, evidenciando que esse não é definitivo,
absoluto ou final e sim que está em constante transformação e que teorias mais precisas e com
maior grau de aceitação podem desabrochar a qualquer momento. A título de exemplo dessa
constatação menciona-se a Teoria do Uso e Desuso, proposta pelo biólogo Jean-Baptiste
Lamarck, que revolucionou, até certo ponto, o debate evolucionista, mas que foi substituída
pela Teoria da Seleção Natural, proposta por Charles Darwin, uma vez que a teoria darwiniana
possui maior embasamento e objetividade, menor número de falhas e foi constatada
experimentalmente na observação de Tentilhões na ilha de Galápagos, ressaltando, mais uma
vez, a ciclicidade do conhecimento.

Mesmo contendo particularidades, o conhecimento científico tende a ser confundido


com o senso comum, uma vez que, em determinados casos, os dois chegam a conclusões
equivalentes, mas que, em outros, são radicalmente opostos (a mistura de manga com leite
sendo um desses). Assim, de grosso modo, pode-se compreender o conhecimento popular como
um estágio prematuro do conhecimento científico, limitado por uma racionalidade e
objetividade que se restringe a observação e que necessita, como menciona Lakatos (1992),
“abandonar o ponto de vista antropocêntrico” e fundamentar-se em elementos como a
sistematização de suas ideias e a adoção da objetividade para se aproximar do conhecimento
científico. Um agricultor, por exemplo, entende que o repouso de suas áreas plantadas é
essencial para a revitalização do solo, mas sabe que pode otimizar esse processo plantando
vegetais que realizar ativamente o ciclo do nitrogênio (como o feijão ou a soja) ou adicionando
fertilizantes que contenham esse elemento em sua composição. Já um cientista, para chegar à
mesma conclusão, parte de estudos que varrem desde a base celular das plantas até a
estruturação do ciclo do nitrogênio, compreendendo cada etapa, sistematizando ideias
verdadeiras e impessoais e realizando experimentos para constatar tal fato. Desse modo, os dois
conhecimentos chegam a mesma constatação, mas por “caminhos” e bases teóricas diferentes.
Assim, enquanto o agricultor se contenta com o conhecimento transferido por gerações
passadas ou conquistados por sua experiência no campo, o cientista parte da dúvida (duvidando
até mesmo do obvio), para formalizar um saber estruturado e, principalmente, crítico em relação
a sua realidade e aos fatos observados.
REFERÊNCIAS

LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Metodologia Científica. São Paulo,
SP: Atlas S.A., 1992.

RUDIO, Franz Victor. Introdução ao projeto de pesquisa científica. Petrópolis, RJ: Editora
Vozes, 2002.

NOBRE, Marcos et al. O que é pesquisa em direito?. [S. l.]: Editora Quartier Latin, 2005

PRADO, Daniel Nicory. A tentação do advogado na pesquisa científica: defender uma


hipótese ao invés de testá-la. [S. l.], 2011. Disponível em:
https://metodologiaufba.wordpress.com/2011/06/29/a-tentacao-do-advogado-na-pesquisa-
cientifica-defender-uma-hipotese-ao-inves-de-testa-la. Acesso em: 22 de abril. 2022

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