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Faculdade de letras da Universidade do Porto

História de azulejaria
O azulejo de fachada da Igreja dos Congregados e de Santo Ildefonso
Joana de Matos Raínho
2022/2023
Índice
Resumo 1
Introdução 1
Metodologia e fontes 2
Azulejo em Portugal: azulejo de fachada3
Padrões e técnicas decorativas azulejares 3
Jorge Colaço 3
1. Igreja de Santo António dos Congregados 6
1.1. Contexto histórico 6
1.2. Análise artística do azulejo 6
1.3. Leitura iconográfica e iconológica 6
2. Igreja de Santo Ildefonso 6
2.1. Contexto histórico 6
2.2. Análise artística do azulejo 6
2.3. Síntese iconográfica e iconológica 6
Exemplo de obra azulejar de Colaço: Palácio Hotel Buçaco em Luso 6
Conclusão 6
Bibliografia 6
Anexos 6
Resumo
O trabalho vai incidir na comparação de duas igrejas, a Igreja dos Congregados e
a Igreja de Santo Ildefonso, no qual o foco vai ser o azulejo na fachada e a sua
importância na sociedade a nível artístico, histórico e social. O percurso do estudo e
levantamento de fontes bibliográficas como suporte para a analise e descrição da
fachada das igrejas em estudo. O programa iconográfico e iconológico de cada igreja e
o seu contexto histórico. A vida, o papel do artista, a sua perspetiva artística noutros
edifícios e a sua influência na cidade e na produção azulejar. A evolução das fábricas de
produção de azulejo nomeadamente em Lisboa. Outras obras do autor que serviam de
marco de inspiração para os edifícios em estudo. A Estação de São Bento como grande
marco de produção azulejar e o impacto que provocou nas fábricas e na sociedade. O
Palácio de Buçaco como exemplo de um painel azulejar figurativo em grandes
superfícies. As semelhanças encontradas em ambas as igrejas e as fontes de inspiração
para o seu trabalho azulejar. A passagem do azulejo de revestimento interior para o
exterior dando destaque à rua e à cidade, como afirmação de identidade. A importância
do reconhecimento da fachada no espaço publico a nível de decoração e ornamental
com presença de temáticas religiosas e alegorias. A ligação entre a arquitetura e azulejo,
marcando a evolução da cidade e a distinção de tipologias, técnicas e padrões dos
azulejos existentes na fachada. A riqueza e a qualidade da pintura e desenho no azulejo e
os métodos e estratégias encontradas para executar na composição das fachadas dos
edifícios de modo a manter o seu equilíbrio e dinamismo. O apelo à população para a
preservação e restauro de património, sensibilizando a proteger para as gerações futuras
poderem usufruir e promover para a evolução a nível artístico e histórico.

Palavras-chaves: Azulejo Jorge Colaço Congregados Santo Ildefonso Fachada


Introdução
O trabalho foi realizado no âmbito da unidade curricular de História de Azulejaria,
no qual vai incidir no estudo e comparação de duas igrejas no Porto: a Igreja de Santo
António dos Congregados e a Igreja de Santo Ildefonso. Os objetivos delineados para o
estudo consiste na procura de conhecer o contexto histórico, a análise artística dos
azulejos e a sua leitura iconográfica e iconológica. A relação que os azulejos têm na
cidade do Porto e o impacto que provocou ao revestir os edifícios de azulejo naquela
época. A importância dos artistas, neste caso de Jorge Colaço, o artista que interveio
nestas duas igrejas. As formas, técnicas de fabrico e materiais que foram usados para a
decoração das igrejas na sua fachada. A afirmação da fachada dos edifícios e o
significado das cores utilizadas no azulejo. Salientar a dependência existente entre a
arquitetura e o azulejo, destacando o papel evolutivo e construtivo com o seu uso. O
domínio e análise da descrição do azulejo e os tipos de temas pintados de acordo com o
contexto que se insere. Distinguir as diversas tipologias, motivos figurativos e padrões
no azulejo. O trabalho organiza-se em capítulos: o primeiro é a Introdução, onde se faz
um breve resumo, objetivos em estudo e a organização do índice; o segundo são as
Fontes e Metodologia, ou seja o percurso do estudo do objeto e as fontes em que se
sustentou o conhecimento; o azulejo em Portugal com o subcapítulo de azulejo de
fachada que é um dos focos principais no trabalho; os padrões e técnicas decorativas no
azulejo; uma breve informação sobre o artista de ambas as igrejas em estudo; a Igreja
dos Congregados e a Igreja de Santo Ildefonso a nível de contexto histórico, analise
artística do azulejo e leitura iconográfica e iconológica; exemplo da obra azulejar no
Palácio Hotel de Buçaco e por fim conclusão, bibliografia, fotografias e anexos.

Metodologia e fontes
O percurso começou pelo levantamento bibliográfico e fotográfico dos objetos em
estudo. No local em questão procedeu se ao registo fotográfico das várias perspetivas
focando essencialmente no azulejo predominante nas fachadas. Fui a um museu que
existia dentro da igreja onde encontrei partes do azulejo de fachada em estudo no qual
serviu para fundamentar mais o conteúdo a nível iconográfico. Alguns nomes que se
destacam são: Fausto Martins, Alexandrino Brochado e José Meco. A leitura de duas
teses, uma sobre o azulejo de fachada na freguesia de Santo Ildefonso e outra sobre o
artista das obras azulejares em estudo a nível da sua interpretação e técnicas realizadas
pelo mesmo. De recurso bibliográfico, a leitura do livro “Azulejaria Portuense” de
Fausto Martins para compreender a relação e a importância que a arte azulejar tem na
cidade do Porto, como também o estudo das igrejas azulejadas existentes no Porto e as
suas diferenças e semelhanças entre elas com o auxílio da obra de Alexandrino
Brochado, “O Porto e as suas igrejas azulejadas”. Para uma abordagem mais geral de
conhecimento azulejar em Portugal, o recurso do livro “O azulejo em Portugal” de José
Meco. Entre outras obras mencionadas na bibliografia que sustentam no estudo
profundo de cada igreja.

Azulejo em Portugal: azulejo de fachada


O tema dos azulejos de fachada é visível nos edifícios civis desde os finais do
século XIX até meados do século XX, por ser um dos temas mais importantes na
azulejaria portuense. O azulejo é uma peça cerâmica feita de faiança e é constituída por
uma placa quadrada de barro cozido e vidrado na parte nobre que fica visível, a
superfície é usada para desenhar e pintar. Os azulejos de fachada possuem a vantagem
de a sua conservação ser no local de origem ao contrário do revestimento azulejar dos
seculos passados que se encontrava no interior. O azulejo em tempos passados era usado
no interior dos edifícios, mas no séc. XIX há uma evolução e o azulejo passa para o
exterior. Por causa de razoes históricas, artísticas, económicas da cidade, no qual
queriam dar mais destaque no campo decorativo e ornamental às construções. A fachada
torna-se imponente com o azulejo, nomeadamente em edifícios particulares, hotéis,
cafés e em armazéns comerciais. Envolvendo a sociedade num foco de embelezamento
e requinte, tornando este movimento universal. É visível o restauro de monumentos, o
ornamento das ruas e as transformações das fachadas, levando à criação de uma nova
dinâmica na cidade. A Rua ganha destaque no séc. XIX por se transformar num local
vital à comunidade onde se partilha a expressão pessoal e a influencia cultural. Um
lugar de conhecimento e diálogo através da imagem por meio do azulejo.

Padrões e técnicas decorativas azulejares


A procura de azulejos de fachada elevou-se a partir da segunda metade do séc.
XIX por causa da expansão urbana, levando às fábricas a aumentar a produção azulejar.
As fábricas da área portuense produziram azulejos de fachada recorrendo a técnicas
frequentes de estampilhagem e de estampagem. Nas fábricas de lisboa eram executados
exemplares com a técnica da tubagem e da aerografia. Os padrões de azulejo dividem se
me em quatro grupos: padrão, relevados, biselados de figura avulsa. No exterior, o
azulejo mais usado é o de padrão, que é uma composição repetitiva de uma forma,
criando um tapete. Já os azulejos relevados são divididos em dois grupos: relevados em
quadrados concêntricos com a presença de uma flor no meio e monocromáticos pintados
de azul, rosa, amarelo e castanho, em diversos tons. Em relação à figura avulsa, a
utilização desse azulejo na cidade do Porto abrange o séc. XVIII, finais do séc. XIX e
primeira metade do séc. XX.

Jorge Colaço
Jorge Rey Colaço foi pintor, ceramista e conhecido por ser um intelectual
português. Nasceu no Consulado de Portugal na cidade de Tânger em Marrocos,
estudou arte em Lisboa, Madrid e Paris. A Fabrica de Louça de Sacavém e a Fábrica de
Cerâmica Lusitânia de Lisboa e Coimbra foram os principais locais onde o pintor
trabalhou e confecionou muitas das suas obras até ao fim dos seus dias. Destacando-se,
nomeadamente, na colaboração na Fábrica de Cerâmica Lusitânia onde trabalhou nos
painéis de ambas as igrejas em estudo, a Igreja dos Congregados (1929) e a Igreja de
Santo Ildefonso (1932). Outras obras azulejares marcantes de Colaço são: a obra na
Estação de São Bento no Porto (1903), a obra que se encontra no Palácio Hotel do
Buçaco em Luso (1907), como também as obras das estações ferroviárias de Beja e
Évora. Na sua pintura é visível que o desenho prevalece de acordo com a pincelada,
demonstrando qualidade na sua expressão artística. O artista consegue aliar o azulejo à
arquitetura criando um conjunto capaz de representar as suas composições sem abdicar
do tipo de material ou suporte utilizado. É capaz de partir do seu conhecimento e
técnicas aprendidas para aplicar com originalidade.

1. Igreja de Santo António dos Congregados


1.1 Contexto histórico
A igreja foi instalada inicialmente junto à Porta do Sol, localizada na capela de
Santo António do Penedo, que pertence ao morgado de Miguel Brandão da Silva.
Estando ainda em construção o dito espaço, em 1680 os padres do Oratório de São
Filipe de Neri chegaram à cidade do Porto, estes detinham o terreno para construir o
convento e a capela. As obras de ampliação e adaptação da igreja foram concluídas em
1703, onde os padres confraternizaram com a Confraria de Santo António. Depois da
expulsão das ordens religiosas, o Estado obteve o conjunto por existir um convento. Do
complexo arquitetónico resta somente a igreja. Segundo Carlos de Passos, é
fundamental o foco ser na fachada por ser “um barroco moderado, deselegante”. Por
outro lado, é importante também o destaque para o esquema pensado que mostra o
verticalismo e que se acentua com o ritmo das pilastras toscanas da ordem colossal no
edifício. O revestimento de azulejo nos panos do registo superior e do tímpano ocorreu
no final da década de 1900.

1.2. Análise artística do azulejo


A Estação de São Bento dos caminhos-de-ferro, foi revestida de azulejo no seu
interior, nomeadamente no átrio e isso fez com que provocasse um grande movimento
na cidade que resultou em imensas encomendas de azulejos. O mesário Constantino de
Almeida, encarregue de provedor da Confraria de Santo António, encomendou a Jorge
Colaço a obra artística de azulejos na fachada da Igreja dos Congregados, que aconteceu
entre 1917 e 1920. Segundo Fausto S. Martins, Jorge Colaço é um artista que estava
habituado a trabalhar com painéis de grandes superfícies, no qual desenvolvia cenas
com história e narrativas, mas mesmo assim aceitou a encomenda. Tinha o desafio de
aplicar o azulejo em faixas bastante estreitas, logo o primeiro problema seria na
composição e que rapidamente arranjou solução de forma a assegurar o equilíbrio.
Aplicou azulejo de padronagem com cercadura nas duas faixas laterais estreitas. Estas
estavam no enquadramento da composição central da fachada e eram divididas pelas
pilastras em três panos, intercetados pelos três janelões, criando um registo acima das
vergas e um debaixo das soleiras. A dificuldade na composição era visível por causa da
elevação do frontão que se encontrava no pano central do registo inferior. o pintor
decidiu recorrer a uma composição linear na zona inferior, distanciando o tema central
para o registo dividido em três partes no cimo, que normalmente o tema ocuparia a zona
mais próxima do observador. Já no tímpano as dificuldades aumentaram por causa dos
condicionalismos de o espaço ser triangular e da cantaria que circundava as janelas e o
nicho que continha a imagem do padroeiro, levando o artista a executar a repetição da
composição linear vigente no registo inferior. A nível da perspetiva técnica, Jorge
Colaço demonstra rigidez no desenho, nomeadamente nos motivos fitomórficos das
folhas e caulículos de acanto que contêm as alegorias do registo inferior e o tímpano.
Em todos os seus trabalhos como neste revela se um artista com talento no tratamento
da cor. As cores predominantes no azulejo são o azul, usado em várias tonalidades desde
o tom anilado da cercadura para o tom de azul forte da túnica de Santo António até a cor
se diluir, sucessivamente, confundindo se com o branco. Teve a perícia de destacar e
realçar o foco para a personagem central de Santo António com três manchas de tons
azulados, que enaltecem a técnica do sfumatto que envolve o resto das outras figuras. A
cercadura que engloba a cantaria das janelas apresenta grande originalidade na sua
composição cromática, recorrendo ao mesmo tipo de desenho das faixas laterais em três
tons da cor amarela.

1.3. Leitura iconográfica e iconológica


O programa iconográfico da fachada teria de ser alusivo ao titular da igreja, Santo
António e em comunhão com outros motivos relacionados com a prática religiosa e as
principais venerações sagradas dos crentes. Na fachada foram selecionados três
episódios da vida de Santo António, a primeira cena remete para a aparição do menino
Jesus a Santo António, contada no “Liber Miraculorum”, sem menção do lugar onde
ocorreu. Na cena Santo António está de joelhos e de braços abertos onde acolhe o
menino Jesus, que pousa sobre um livro e um lírio, na sua mão direita tem um coração e
na sua esquerda uma cruz, que invoca para a trilogia dos atributos da iconografia
antoniana. No painel central, existe duas linhas na diagonal que marcam uma zona
iluminada em que resplandece a figura do santo agarrando uma cruz e um lírio, sendo
envolvido por um coro de anjos que dão grinaldas de rosas à Virgem com o Menino, que
aparecem no canto superior direito. No terceiro painel relata a cena, narrada no “Liber
Miraculorum”, em que Santo António com um joelho em terra, em atitude humilde,
acolhe a aparição da Virgem Maria, que lhe mostra o menino Jesus. A análise resulta na
tradição iconográfica com a exceção de uma novidade que é a exibição do “coração”
pelo menino Jesus, remetendo para representações dos séculos XVI a XVIII e com o
aumento da devoção do Sagrado Coração de Jesus. Os dois panos laterais do registo
inferior são preenchidos por duas alegorias da eucaristia que estão emolduradas por
folhas de acanto e arabescos, que mostram um cálice com um coração a sangrar e uma
custódia, rodeados por anjos em posição oratória. Sendo duas imagens com grande
significado que são alusivas a outras duas devoções desta igreja. As grandes devoções
dos Congregados eram a devoção ao Sagrado Coração de Jesus e Santíssimo
Sacramento, como também a festa de Nossa Senhora das Dores.

A nível iconológico a Igreja dos Congregados relembrava alguns episódios do


santo mais popular da igreja através de representações iconográficas. Nesta igreja
existia o local de culto principal e o apoio de grupos que seguiam a devoção do Coração
de Jesus e a Eucaristia, com a imagem de anjos no tímpano que seguram as partituras
com as palavras que louvam Santo António, aproximando assim os crentes do santo.

2. Igreja de Santo Ildefonso

2.1. Contexto histórico

A igreja de Santo Ildefonso pode estar na origem de uma ermida dedicada a Santo
Alifon e da Confraria do Senhor Jesus, do início do século XVI, em que apoia o culto
do Santíssimo Sacramento. Em 1724, o Santíssimo Sacramento foi transferido para a
Capela de Nossa Senhora da Batalha, de modo a reconstruir se o edifício religioso e as
obras duraram até 18 de julho de 1739, cuja data da atual igreja e entrada do Santíssimo
Sacramento. Ao longo de mais um século, foi necessário haver uma ampliação, criando
espaços e sendo financiada pela Confraria do Santíssimo Sacramento. A sua arquitetura
é da época barroca, sendo de carater original. A fachada manteve o seu esquema
arquitetónico barroco português em harmonia com o granito conjugado com os
entrepanos caiados de branco. O revestimento pensado para a fachada e as torres da
mesma foram 11.000 azulejos.

2.2. Análise artística azulejar

Segundo Carlos de Passo, venera o desenho a nível da composição, mas, no


entanto, diz que “os seus motivos decorativos não se ajustam ao typo da fachada”. Os
azulejos na fachada demonstram a perícia do mestre Jorge Colaço, mas por outro lado
denota se a repetição de modelos, atitudes e posições de outras obras, pois os temas são
bastante idênticos. Minimiza os defeitos nas proporções das personagens, observadas
nos painéis da Estação de São Bento. A nível de composição, salienta se na cor, na luz e
no desenho. Contudo não se entende a leitura da composição azulejar por causa dos
elementos arquitetónicos existentes e que em alguns casos impedem a leitura das
legendas que representam a cena descrita no azulejo. Como também é confuso terem
usado uma decoração do tipo maneirista dos Rollwerk no enquadramento das cenas, que
se adaptaria mais facilmente à fachada dos Congregados que a de Ildefonso.

2.3. Síntese iconográfica e iconológica

Jorge Colaço conseguiu estabelecer a ligação de dois temas do programa


iconográfico principal, pertencentes à história do edifício religioso. No nicho, que coroa
o corpo central, encontra se o líder da igreja, Santo Ildefonso e a Eucaristia, unida à
génese da capela antiga e da nova igreja por meio da atividade executada pela Confraria
do Santíssimo Sacramento. Na parte frontal da fachada, nos dois panos laterais
encontram se duas cenas que marcam a dualidade de todo o programa iconográfico. Do
lado direito, segundo as leis de São Carlos Borromeu, está representada uma cena da
vida de Santo Ildefonso e no lado esquerdo uma cena que envolve a Eucaristia. Estas
cenas estavam situadas num plano alto da igreja e por isso aproveitaram a boa vista que
havia nas paredes laterais e nas torres para prolongar o programa e assim mantendo
alternado os temas da zona frontal da fachada. Jorge Colaço teve a colaboração do padre
Joaquim Correia para a orientação dos temas religiosos e que tipos de fontes literárias se
deveria debruçar para ter inspiração na iconografia de Santo Ildefonso. Entre as obras
destacam se: o “Elogium” de São Julião e a “Vita Sancti Ildefonsi”, de Cixila. Segundo
informações bibliográficas, o nascimento de Santo Ildefonso foi em Toledo e estudou
possivelmente com Santo Isidoro de Sevilha. Em meados de 632, entrou no mosteiro de
Agali e foi ordenado diácono, já em 653 esteve presente no Concílio de Toledo como
abade. Foi escritor de várias obras como livros, sermões, missae, entre outros. A obra
em que mais se destacou e inspirou a sua iconografia foi a “Libellum de Virginitate
Sanctae Mariae Contra Infideles”. Faleceu em 23 de janeiro de 667 aquando da sua
ocupação na sede de Toledo e foi enterrado na igreja de Santa Leocádia. A vida de Santo
Ildefonso está relacionada com as imagens representadas no azulejo. O começo do seu
ciclo iconográfico é com a cena mais conhecida, “A imposição da casula a Santo
Ildefonso”, narrada por Cixila. Jorge Colaço segue o texto, mas também se inspira na
fonte gráfica de Murillo, que existe no Museu do Prado. Usa o mesmo esquema de
composição que utilizou na Capela de Nossa Senhora da Boa Hora. Portanto, recorre a
um enquadramento piramidal onde se insere as duas figuras da Virgem e do santo, que
se encontram em diagonal e ligadas por pontos de fuga em toda a composição, ou seja, a
casula. O Santo Ildefonso está de joelhos vestido com vestes episcopais, que recebe e
segura a casula enquanto é ajudado por um anjo, o santo entrega a casula à Virgem, cuja
posição não segue a citação de Cixila nem mesmo a obra de Murillo (1650-1655). O
painel contêm uma legenda em latim, “Virginem ipsam vidit”, sendo ocultado pelo
frontão que está no remate da verga da janela. Do lado norte da torre, no pano lateral,
que forma angulo reto com o painel da “Entregada casula”, está pintada a cena da
“Aparição de Santa Leocádia a Santo Ildefonso”, narrada por Cixila. A cena passa se
diante do sepulcro de Santa Leocádia, onde Ildefonso junto do rei e da sua corte se
dirigem para rezar. De acordo com o texto, observa-se a santa a aparecer no tumulo
envolvida por um véu branco que a cobre toda, simbolizando a sua imagem de Virgem.
Santo Ildefonso está de joelhos e serve se da espada que o rei lhe deu para cortar a ponta
do véu da virgem, enquanto ouve o seguinte louvor: “Ildefonse per te vivit Domina
Mea”. Um enaltecer que marca a devoção mariana como também a defesa dos direitos
de Maria contra os hereges, pela obra “De Virginatate Sanctae Mariae”. No segundo
esquema, atrás de uma balaustrada, um grande grupo agarrando cruzes, estandartes e
velas, que observam a aparição milagrosa que ficaria eternizada nas relíquias da espada
e do fragmento do véu da Santa Leocádia. Na terceira década do século XX, é possível
verificar nesta fachada um programa do tipo da contrarreforma, demonstrando a
intensidade da devoção. É evidenciada no terceiro painel de Santo Ildefonso, localizado
no entrepano da torre do lado sul, com o nome de: “A disputa de Santo Ildefonso contra
os hereges”. Nesta cena há grande choque a nível devocional para os crentes trazendo
emoções e fortalecendo a ligação com a veneração do Santo, sendo um programa
iconográfico ausente em Espanha, mas de grande exaltação. O libelo “De Virginitate”
de Santo Ildefonso ataca diretamente as teorias heréticas de Helvídio, como também de
Joviniano e dos Judeus e realça a Virgem Maria. Santo Ildefonso comunica pelo seu
libelo aos hereges, que por um lado estão referenciados, mas ausentes da cena e a sua
referência está presente na legenda do painel. Jorge colaço recorre à composição da
linha diagonal, representando a Virgem Maria sentada a segurar o menino Jesus com a
mão esquerda e na mão direita a folhear um livro e o menino está com um globo
coroado com uma cruz. Santo Ildefonso está vestido com vestes episcopais, no qual é
guiado por um anjo em direção ao trono de Maria. No canto direito do painel é visível
dois anjos a segurar os atributos do bispo toledano que são o báculo e a mitra. No canto
esquerdo, o artista inova introduzindo dois elementos que alteram o sentido
iconográfico do painel: um tinteiro com uma pena e dois livros fechados, um livro que
está aberto e folhas soltas escritas que remetem para a figura de Santo Ildefonso, na
vocação de defensor da Virgem, com a representação dos lírios brancos pousados sobre
os livros e na vocação de escritor. Realçando assim o tratamento destes pequenos
elementos que conseguem alterar em “naturezas-mortas”.O segundo tema importante
nos painéis da fachada de Santo Ildefonso remete para a Eucaristia. No pano central da
fachada foi selecionado um motivo clássico presente desde a era paleocristã que serviu
para simbolizar o tema da Eucaristia: “a multiplicação dos pães e dos peixes” (Mateus,
14, 13-21;15, 32-39). Jorge colaço optou por escolher um cenário que se comtempla os
dois textos. O cenário é junto ao mar, que está visível na barca que Cristo acaba de sair.
No “sitio deserto” está representado uma grande multidão, no qual ressalta à vista um
grupo de “coxos, aleijados, cegos e outros”. Envolvendo a multidão com Cristo com
sentimentos de compaixão, já Cristo encontra se no centro da composição, “ergueu
olhos para o céu, pronunciou a bênção” e o milagre aconteceu, salientando a imagem da
simbologia que o alimento eucarístico pode ter, como matar a fome e a sede e curar
doenças. No lado superior do lado norte da torre é visível a cena da cura da hemorroíssa,
onde Jorge Colaço cria uma sequência de cenas, nomeadamente da liturgia da
solenidade do Corpo de Deus, onde une o campo literário onde se debruçou com a
exaltação da imagem que transmite a fé. E por isso, o artista menciona uma frase do
excerto: “se eu, ao menos tocar na sua capa, ficarei curada”, mas com o conhecimento
do excerto de Marcos (5, 21-42), recorrendo a algumas citações como a presença de três
apóstolos, Pedro, Tiago e João. Contudo, a cura da hemorroíssa está enquadrada na
ressurreição da filha de Jairo, o chefe da sinagoga, sendo assim duas cenas
independentes da Eucaristia, no qual fundamentam a virtude da fé, um dos principais
conceitos que sustentam a teologia da Eucaristia. O milagre da ressurreição da filha de
Jairo equipara se com a cura da hemorroíssa. A fé dos fiéis a acreditar que o pão e o
vinho simboliza o corpo e o sangue de Cristo remete para a comunhão da vida e a
ressurreição no futuro. A sequência do tema da Eucaristia continua do lado sul da torre
onde está representada a figura de Cristo em exaltação ladeado de um coro de anjos que
seguram um sacrário de influência neogótica, parecendo os sacrários feitos em madeira
e cobre, muito frequentes naquela época e sendo um tema desenquadrado do todo. A
legenda (Mateus, 28, 20) é citada de maneira estranha do contexto evangélico de
Mateus, que liga o texto com a prometido da representação de Cristo na obra da
evangelização da igreja depois da sua ressurreição e não de maneira a realçar a
representação da eucaristia. Entre os panos, que envolvem o janelão central, que estão
enquadrados entre o portal da entrada e o nicho, que contém o titular da igreja, está
presente todo o programa iconográfico. A mensagem central confere um relevo diferente
das restantes. Estão inscritas as palavras “UNUS-DEUS-TRINUS-CHARITAS” e que
inclui “FIDES.SPES”. Sendo seis vocábulos independentes que dão origem a dois
conjuntos: a evocação do mistério da Santíssima Trindade: UNUS-DEUS-TRINUS,
associado às três virtudes da teologia: FIDES-SPES-CHARITAS.

A nível iconológico, não se sabe responder porque inseriu-se a Santíssima


Trindade no programa talvez, por se enquadra no tema central de fachada e com a
intenção de exaltar a figura defensora da virgindade de Maria contra os discípulos
arianos. O arianismo ao rejeitar a devoção cristã punha em causa o mistério da
Santíssima Trindade, no qual pretendia compreender a relação que existe entre três
pessoas divinas como um só. Desta maneira, o dogma da Trindade é visto como a
revelação da verdade da fé. Em relação as três virtudes teológicas: FIDES-SPES-
CHARITAS, a fé é acompanhada da esperança e da caridade. Salienta-se a palavra
CHARITAS que se encontra no centro do programa, por causa de ser a terceira virtude
que se baseia na simbologia da “casula”, sendo o atributo principal de Santo Ildefonso.
As casulas tinham dois cordões que eram usados para fixar ao corpo, ou seja, “os
vetores da caridade, para com deus e para com os homens” e por ser composta por uma
só peça “simboliza a unidade e a integridade da fé”, FIDES, segundo “Rationale
Divinorum Offiorum” de Guilherme Durando.

Exemplo azulejar da obra de Colaço: Palácio Hotel Buçaco em Luso

Jorge colaço realizou a sua obra no Palácio Hotel Buçaco em meados de 1904 e de
1906, tendo sido produzida na Fábrica de Sacavém. A galeria do palacete é coberta por
um teto apainelado sobre friso de azulejos com policromia e o muro é revestido por
painéis de azulejos figurativos de temas históricos. No interior junto à escada tem uma
parede revestida com painéis de azulejos figurativos azuis e brancos também de
temática histórica. Por exemplo painéis figurativos com a representação de episódios de
“Os Lusíadas” de Gil Vicente ou no interior do vestíbulo painéis em monocromia de
azul em fundo branco com cercadura de friso azul escuro com motivos ornamentais e
vegetalistas de tons dourados.
Conclusão

Em suma, as igrejas em estudo são bastante semelhantes pelo facto de ter sido o
mesmo artista, Jorge Colaço que interveio e deu um novo dinamismo às suas fachadas.
A presença do azulejo azul com fundo branco, inspirado num dos seus primeiros
trabalhos, o revestimento azulejar da Estação de São Bento que foi o sucesso para a
evolução da produção azulejar. O recurso à cercadura como elemento para delimitar e
dar destaque às cenas apresentadas com singularidade cromática e tons de amarelo para
apelar ao observador. A própria localização de ambas as igrejas se situarem em Santo
Ildefonso. Jorge Colaço nas duas igrejas teve o desafio de trabalhar em faixas muito
estreitas da fachada e estava mais habituado a executar painéis de grande superfícies,
como o caso do Palácio de Buçaco ou mesmo a Estação de São Bento com temas
históricos. O desafio de representar temas religiosos e alegorias à eucaristia, sendo
obrigado a estudar e a ter conhecimento das obras religiosas de cada santo de cada
igreja.

O azulejo de fachada é um dos mais importantes patrimónios do final do séc. XIX


e inícios do séc. XX, principalmente em Santo Ildefonso. O revestimento azulejar
destaca-se na identidade e na afirmação desta arquitetura. É necessário aplicar medidas
de preservação e restauro dos edificados, protegendo o seu valor histórico e artístico
senão pode acabar por desaparecer.

Bibliografia levantada

BROCHADO, Alexandrino - O Porto e as suas igrejas azulejadas. Porto, Edição do


Banco Comercial Português, 1990

CABEÇAS, Maria da Conceição; D'Ara, Concha; Porto Monumental e Artístico:


Património da Humanidade, Porto Editora, 2001

GUERRA, Alexandre Fernando Medeiros. O azulejo de fachada na freguesia de Santo


Ildefonso. Séculos XIX e XX. Faculdade de Letras da Universidade do Porto,
2009/2010

MARTINS, Fausto Sanches - Azulejaria portuense: história e iconografia. Lisboa:


Inapa, 2001
MECO, José; O Azulejo em Portugal, Lisboa: Publicações Alfa, 1989

Bibliografia consultada

PASSOS, Carlos de - Guia Histórica e Artística do Porto. Porto: Casa Editora de A.


Figueirinhas, Lda., 1935

SANTOS, António; Santos, Eugénio; Igreja dos Congregados: Tricentenário, Porto:


Irmandade de Santo António dos Congregados, 1995

Webgrafia: SIPA

Fotografias

Igreja de Santo António dos Congregados


Igreja de Santo Ildefonso
Evocação do Mistério da Santíssima Trindade: Unus-Deus-Trinus, relacionado
às três virtudes teologais: Fides-Spes-Charitas

Santo Ildefonso a receber a casula para a celebração da missa


Multiplicação dos pães e dos peixes

Esperança/fé
Portal da igreja
Obras em exposição no museu dentro da Igreja de Santo Ildefonso
Amostra de azulejos com representações alusivas a Santo Ildefonso
Amostra de azulejos com representações alusivas a Santo Ildefonso
Amostra de azulejos com representações alusivas a Santo Ildefonso
Amostra de azulejos com representações alusivas a Santo Ildefonso
Exposição de amostras de azulejos da fachada da Igreja de Santo Ildefonso
Anexos

Azulejos do Palácio Hotel de Buçaco

Interior: painel de azulejos 2003 Fonte: SIPA


Interior: painel de azulejos 2003 Fonte: SIPA

Interior: painel de azulejos 2003 Fonte: SIPA

Interior: hall com painéis de azulejo 2003 Fonte: SIPA

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