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Subunidade 1.

1 — Ficha de avaliação

GRUPO I
A
Leia com atenção o poema «Sou um evadido», de Fernando Pessoa.

Sou um evadido.
Logo que nasci
Fecharam-me em mim,
Ah, mas eu fugi.

5 Se a gente se cansa
Do mesmo lugar,
Do mesmo ser
Por que não se cansar?

Minha alma procura-me


10 Mas eu ando a monte,
Oxalá que ela
Nunca me encontre.

Ser um é cadeia,
Ser eu não é ser.
15 Viverei fugindo
Mas vivo a valer.

Fernando Pessoa,

5 1. Explique a metáfora presente no primeiro verso, relacionando-a com o sentido


global do poema.
2. Indique o valor expressivo da interrogação retórica que constitui a segunda estrofe.
3. Considerando os versos «Ser um é cadeia, / Ser eu é não ser.» (vv. 13-14), explicite
o modo como o sujeito poético concebe a sua existência.
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B
Leia seguinte excerto d’Os Maias, de Eça de Queirós. Consulte as notas apresentadas.

Esta existência [de Afonso da Maia] nem sempre assim correra com a
tranquilidade larga e clara dum belo rio de verão. O antepassado, cujos olhos se
enchiam agora duma luz de ternura diante das suas rosas, e que ao canto do lume
relia com gosto o seu Guisot, fora, na opinião de seu pai, algum tempo, o mais feroz
5 jacobino1 de Portugal! E todavia, o furor revolucionário do pobre moço consistira em
ler Rousseau, Volney, Helvetius2, e a Enciclopédia; em atirar foguetes de lágrimas à
Constituição; e ir, de chapéu à liberal e alta gravata azul, recitando pelas lojas
maçónicas odes abomináveis ao Supremo Arquiteto do Universo 3. Isto, porém,
bastara para indignar o pai. Caetano da Maia era um português antigo e fiel que se
10 benzia ao nome de Robespierre, e que, na sua apatia de fidalgo beato e doente, tinha
só um sentimento vivo — o horror, o ódio ao jacobino, a quem atribuía todos os
males, os da pátria e os seus, desde a perda das colónias até às crises da sua gota.
Para extirpar da nação o jacobino, dera ele o seu amor ao senhor infante D. Miguel,
messias forte e restaurador providencial... E ter justamente por filho um jacobino
15 parecia-lhe uma provação comparável só às de Job!
Ao princípio, na esperança de que o menino se emendasse, contentou-se em lhe
mostrar um carão severo e chamar-lhe com sarcasmo — cidadão! Mas quando soube
que seu filho, o seu herdeiro, se misturara à turba que, numa noite de festa cívica e
de luminárias, tinha apedrejado as vidraças apagadas do senhor legado de Áustria,
20 enviado da Santa Aliança — considerou o rapaz um Marat e toda a sua cólera
rompeu. A gota cruel, cravando-o na poltrona, não lhe deixou espancar o mação, com
a sua bengala da Índia, à lei de bom pai português: mas decidiu expulsá-lo de sua
casa, sem mesada e sem bênção, renegado como um bastardo! Que aquele pedreiro
livre não podia ser do seu sangue!
25 As lágrimas da mamã amoleceram-no; sobretudo as razões de uma cunhada de
sua mulher, que vivia com eles em Benfica, senhora irlandesa de alta instrução,
Minerva respeitada e tutelar, que ensinara inglês ao menino e o adorava como um
bebé. Caetano da Maia limitou-se a desterrar o filho para a Quinta de Santa Olávia;
mas não cessou de chorar no seio dos padres, que vinham a Benfica, a desgraça da
30 sua casa. E esses santos lá o consolavam, afirmando-lhe que Deus, o velho Deus de
Ourique, não permitiria jamais que um Maia pactuasse com Belzebu e com a
Revolução! E, à falta de Deus-Padre, lá estava Nossa Senhora da Soledade, padroeira
da casa e madrinha do menino, para fazer o bom milagre.
E o milagre fez-se. Meses depois, o jacobino, o Marat, voltava de Santa Olávia um
35 pouco contrito, enfastiado sobretudo daquela solidão, onde os chás do brigadeiro
Sena eram ainda mais tristes que o terço das primas Cunhas. Vinha pedir ao pai a
bênção, e alguns mil cruzados, para ir a Inglaterra, esse país de vivos prados e de
cabelos de ouro de que lhe falara tanto a tia Fanny. O pai beijou-o, todo em lágrimas,
acedeu a tudo fervorosamente, vendo ali a evidente, a gloriosa intercessão de Nossa
40 Senhora da Soledade!
Eça de Queirós, Os Maias — Episódios da vida romântica,
Porto, Porto Editora, 2002.

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(1) jacobino: membro do Clube dos Jacobinos, associação política revolucionária.


15 (2) Rousseau, Volney e Helvetius: autores associados às ideias e conceções que deram origem à
Revolução Francesa (1789).
(3) Supremo Arquiteto do Universo: perífrase de Deus.

4. Explicite o modo como o narrador introduz um tom humorístico na descrição dos


20 ímpetos revolucionários de Afonso da Maia.
5. Demonstre que Caetano da Maia é uma personagem cuja caracterização aponta
para traços coletivos e para uma posição ideológica associada a um período da
História de Portugal.

25 GRUPO II
Nas respostas aos itens de escolha múltipla, selecione a opção correta.
Escreva, na folha de respostas, o número do item e a letra que identifica a opção
escolhida.
30 Leia o excerto que se segue, do Diário de Miguel Toga.

Vila Nova, 7 de novembro de 1934 — Acabou hoje tudo. Como sempre, fiquei
derrotado. Quando já não era possível ter ilusões, agarrava-me a uma ilusão ainda maior e...
esperava. É coisa que nunca pude destruir em mim: a ideia de que um ser, desde que nasce,
fica
35 logo com direito (e obrigação) de viver os sessenta anos da média. Pelo menos os
sessenta anos da média. Muitas vezes me aconteceu ir a férias e assistir a uma sementeira
de meu Pai. Depois, ver o milhão ou o linho a despontar. E, embora sabendo que aquelas
vidas eram efémeras, voltar à leira nas férias seguintes e ficar desolado ao ver lá, em vez de
linho ou milhão, um batatal espesso. E dizer a meu Pai: «— Então o linho que havia aqui? —
Colheu-se
40 em agosto, filho.» Em agosto, realmente, o linho amadurece. Nos curtos meses
que a natureza determina, tira ao sol o mais calor que pode e enche-se dele. Depois dá sinais
de cansaço, e morre.
Mas este pequenito ainda não tinha bebido nenhum sol. Ainda estava na
primeira semana. Nem o caule sobriamente fibroso, nem a flor azul e delicada, nem a
45 semente parda e madura. E foi por tudo isto que, ao chegar ao quarto, tive a sensação
mais dolorosa da minha vida. Ali estava, ainda não substituído por cevada ou centeio,
mas prestes. A mãe lavada em pranto. E ele, muito branco, muito discreto, voltado
para a parede, a renegar de costas os remédios inúteis espalhados pela mesa-
de--cabeceira.
50 Um médico nem sequer pode chorar. Só pode pegar no bracito magro e morno,
apertar a artéria inerte e ficar uns segundos a trincar os dentes. Depois sair sem dizer
nada.
Quem saberá por aí uma palavra para estes momentos? Uma palavra para um
médico dizer a esta mãe, que entregou à vida um filho vivo e recebeu da vida um filho
55 morto.

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Miguel Torga, Diário, vols. I-VIII (1941-1959),
Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1995.

1. Além da presença da data, outras características do género diarístico evidenciadas


no texto apresentado são
60 (A) o relato de um acontecimento do quotidiano e a existência de marcas de
subjetividade nessa narrativa.
(B) a descrição sucinta de um objeto e a presença de um comentário crítico acerca
do mesmo.
(C) o relato de um acontecimento do quotidiano e a preocupação de omitir juízos
65 de valor.
(D) a explicitação de um ponto de vista e a apresentação de argumentos e
exemplos.
2. Com a referência à «sementeira» (l. 6), é narrado um acontecimento anterior. O
propósito da introdução do relato deste acontecimento é
70 (A) mostrar a importância da figura paterna na vida do narrador.
(B) fazer uma referência ao tema da transitoriedade da vida.
(C) comprovar o fascínio do narrador pela Natureza.
(D) demonstrar a austeridade do pai do narrador.
3. Encontramos um exemplo de dêixis temporal na frase
75 (A) «Acabou hoje tudo.» (l. 1).
(B) «Em agosto, realmente, o linho amadurece.» (ll. 9-10).
(C) «Um médico nem sequer pode chorar.» (l. 19).
(D) «A mãe lavada em pranto.» (l. 16).
4. O constituinte «um batatal espesso» (l. 8) tem a função sintática de
80 (A) modificador apositivo do nome.
(B) vocativo.
(C) complemento direto.
(D) complemento do adjetivo.
5. O segmento textual em que palavra «que» introduz uma oração subordinada
85 substantiva completiva é
(A) «É coisa que nunca pude destruir em mim» (l. 3).
(B) «embora sabendo que aquelas vidas eram efémeras» (l. 7).
(C) «Nos curtos meses que a natureza determina, tira ao sol o mais calor que pode e
enche-se dele» (ll. 10-11).
90 (D) «Então o linho que havia aqui?» (l. 9).
6. A repetição do vocábulo «palavra» (l. 22) assegura a coesão
(A) lexical. (B) interfrásica.

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(C) referencial. 95 (D) frásica.
7. Na frase «E foi por tudo isto que, ao chegar ao quarto, tive a sensação mais dolorosa
da minha vida.» (ll. 14-15), encontramos
(A) um oximoro.
(B) uma hipálage.
100 (C) uma hipérbole.
(D) um hipérbato.
8. Identifique o antecedente da expressão anafórica «lá» (l. 8).
9. Identifique a função sintática desempenhada pela expressão «a esta mãe» (l. 23).
10. Indique o valor da oração subordinada adjetiva relativa presente nas linhas 23-24.

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GRUPO III
«Viverei fugindo / Mas vivo a valer»
Fernando Pessoa

110 Escreva um texto de opinião em que se refira à importância da autonomia na formação


da identidade de cada pessoa. Para comprovar o seu ponto de vista, apresente dois
argumentos que comprovem a validade da sua perspetiva e ilustre-os com exemplos.
Construa um texto bem estruturado (com introdução, desenvolvimento e conclusão),
com um mínimo de duzentas (200) e um máximo de trezentas (300) palavras.
115 Planifique o texto antes de o redigir e reveja-o no fim.

Observações:
1. Para efeitos de contagem, considera-se uma palavra qualquer sequência delimitada por espaços em
branco, mesmo quando esta integre elementos ligados por hífen (ex.: /opôs-se-lhe/). Qualquer número
conta como uma única palavra, independentemente dos algarismos que o constituam (ex.: /2016/).
120 2. Relativamente ao desvio dos limites de extensão indicados — entre duzentas e trezentas palavras —
há que atender ao seguinte:
— um desvio dos limites de extensão indicados implica uma desvalorização parcial (até 5 pontos) do
texto produzido;
— um texto com extensão inferior a oitenta palavras é classificado com zero pontos.

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