Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Acervo pessoal
O objeto foi construído com o intuito de servir de castigo para escravos. A punição
consistia em prender a cabeça do indivíduo e, ao lado dela, seus braços. Para tanto, três orifícios
2
foram construídos na madeira (para cada indivíduo), sendo cortados ao meio de forma que,
abrindo-se a parte de cima do tronco, os escravos pusessem pescoço e pulsos sobre a parte de
baixo da madeira, apoiando-se na cavidade relativa a cada um de seus membros aprisionados. Em
seguida, a parte de cima era fechada e, como os orifícios fossem menores que o diâmetro da
cabeça e das mãos, o indivíduo, a partir de então, preso, estaria disponível para toda a sorte de
castigos e humilhações. Ao longo do comprimento do tronco é possível identificar conservadas
pelo menos quatro cavidades para os pescoços e, erodidas, mais duas, totalizando a capacidade
de prender pelo menos seis indivíduos simultaneamente.
É curioso pensar que, não apenas o tronco-castigo, mas nenhum dos objetos de
punição que ilustram o regime escravista, nesta sala, possuem qualquer referência espacial ou de
propriedade. Todos, absolutamente todos, limitam-se a terem revelados o nome, o material e o
século. Poder-se-ia supor que não era objetivo da instituição, nesta sala, atribuir dados mais
específicos sobre as peças expostas. Contudo, a apreciação dos demais objetos da sala revelam
que esforços foram realizados no sentido de identificar com mais precisão elementos que
compõem o outro setor da sala, dedicado à nobreza brasileira.
Na sala de exposição do museu, uma parede vermelha e seca ostenta mais de vinte
objetos metálicos de tortura. Um número razoavelmente menor que as peças do ambiente vizinho,
farto de aparatos de porcelana, mais de cinquenta peças de aparelhos de jantar diversos, cadeiras
suntuosas e estante imponente. Ao que parece, a parede de um vermelho intenso parece cumprir
a função de compensar o desequilíbrio entre a quantidade de peças de cada um dos ambientes.
Sobre o tablado, de mesma cor, duas peças maiores se apresentam. À frente, um vira-mundo com
espaço para oito pulsos e, atrás dele, o objeto desta investigação, o tronco-castigo, o único objeto
totalmente de madeira desta seção, cujas dimensões e características já foram mencionadas. Dos
objetos expostos, são identificados dois vira-mundos de ferro, do século XIX, dois libambos, três
gargalheiras de ferro, do mesmo século, marcadores de ferro e madeira, três algemas, um anjinho
e um tronco-castigo. Esta é a seção Riqueza e Escravidão do Museu Histórico Nacional.
3
imperial. (Transcrição da identificação dos objetos de castigo na exposição)
4. Considerações finais
7
do MHN. E, a partir das semelhanças, passasse a mirar nas suas diferenças – ter ou não
encosto, o tipo de madeira, ambiente externo ou interno – isto é, em outros tipos de
diferenças possíveis aos dois objetos – e não apenas aquelas que identificam na cadeira
um objeto de descanso e, no tronco, um objeto de castigo.
Referências bibliográficas
APPADURAI, Arjun. “Introdução: mercadorias e a política de valor” In: A vida social das coisas:
as mercadorias sob uma perspectiva cultural. Niterói: EdUFF, 2008. pp. 15- 88
8
KOPYTOFF, Igor. “A biografia cultural das coisas: a mercantilização como processo”. In:
APPADURAI, Arjun (org). A vida social das coisas: as mercadorias sob uma perspectiva
cultural. Niterói: EdUFF, 2008. pp.89-121
LUBAR, Steven; KINGERY, David (Ed.). History from things: essays on material culture.
Washington: Smithsonian Institution Press, 1993.
MILLER, Daniel. Trecos, troços e coisas: estudos antropológicos sobre a cultura material. Rio
de Janeiro: Zahar, 2013.
RAMOS, Francisco Régis Lopes. A danação do objeto: o museu no ensino de História. Chapecó:
Argos, 2004.
REDE, Marcelo. A história a partir das coisas: tendências recentes nos estudos da cultura material.
Anais do Museu Paulista. São Paulo. N. Sér. v.4, p.265-82 jan./dez. 1996
ROCHE, Daniel. História das coisas banais: nascimento do consumo nas sociedades
tradicionais (séculos XVII-XIX). Lisboa: Teorema, 1998.
SOUZA, Helena Vieira L. de; FAULHABER, Priscila Faulhaber. Patrimônios e museus: a criação
do Museu Histórico Nacional e sua relação com o contexto intelectual da década de 1920.
Disponível em:
<http://www.encontro2010.rj.anpuh.org/resources/anais/8/1276696974_ARQUIVO_patrimonio
emuseus_anpuh2010.pdf>. Acesso em 05 fev. 2016
VIANNA, Catarina Morawska; RIBEIRO, Magda dos Santos. Sobre pessoas e coisas: entrevista
com Daniel Miller. Revista de Antropologia, São Paulo, USP, v.52, n.1, p. 415-439, 2009.
9