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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

(UNIRIO)

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS (CCHS)

DEPARTAMENTO DE ESTUDOS E PROCESSOS MUSEAIS (DEPM)

CURSO DE MUSEOLOGIA (NOTURNO)

Disciplina: Antropologia e Museus

Professora: Regina Abreu

Experiências antropológicas em museus estadunidenses

João Pedro Palmieri Ramos

Rio de Janeiro
2021
Os Estados Unidos da América são um país que teve, no passado, uma grande população
indígena e estes indígenas foram por muito tempo combatidos e massacrados. A caça aos índios é
um evento marcante da história americana e até nos dias de hoje existem marcas deste evento.
Como vemos segundo a Wikipédia (2021):

Estimam-se mais de 25 milhões de índios na América do Norte e cerca


de 2 mil idiomas diferentes. Ao fim das chamadas "guerras indígenas",
restavam 2 milhões, menos de 10% do total. Para o etnólogo americano
Ward Churchill, da Universidade do Colorado, esse mais de um século de
extermínio e, particularmente, o ritmo com que isso ocorreu no século
XIX, caracterizaram-se "como um enorme genocídio, o mais prolongado
que a humanidade registra". O genocídio nos EUA foi um processo com
apoio declarado dos setores que deslumbravam a possibilidade de lucros
com o extermínio generalizado dos índios e sua substituição por áreas
integradas ao sistema de comércio, que renderia dividendos a banqueiros,
fazendeiros, industriais das ferrovias e implementos agrícolas

Temos, pois, como esse genocídio um marco que não pode ser ignorado para a
compreensão histórica dos EUA e de seus museus. Laura Browarny (2010) trata da questão da
museologia e antropologia indígena em diversos museus nos EUA e também trata de
possibilidades para melhorias:

Meu objetivo é usar pesquisas realizadas em e em museus combinadas


com teoria antropológica para formular e apresentar uma série de
diretrizes para cada um dos gêneros de museus - arte, história natural,
antropologia - para utilizar para que eles possam aderir às suas missões
enquanto ainda interpretando a cultura material indiana de uma forma
que promove a relatividade cultural e incentiva os visitantes a terem a
mente aberta para diversos perspectivas. p. 3

A antropologia americana, diz a mesma Laura, possui uma história bem diferente daquela
nascida na Europa. Com dificuldade de diferenciar o conteúdo artístico do científico, a
antropologia nos EUA acabou muito conectada à paleontologia e arqueologia e muito ligada a
uma ciência focada em objetos. Assim, tem-se como marca a dificuldade americana de separar
"antropologia de história natural" (p. 7)

O texto de Browarny prossegue com a história desta situação da antropologia e museus


nos Estados Unidos, citando a experiências em Chicago, por exemplo. Além disso, o trabalho de
Franz Boas é mencionado pois ele é tido como o "pai" da antropologia americana.

Tratando de exemplos de museus atuais e suas experiências antropológicas o artigo cita o


grande e conhecido Museu metropolitano de arte. Neste museu existe um grande acervo de peças
indígenas, assim como também de outras áreas, como história de diversos povos e civilizações.
Ainda que tenha um acervo muito grande, a mesma pesquisadora supracitada critica o museu na
forma como a arte indígena foi posta:

O Met cometeu o erro de combinar todo o material não ocidental em um


único, embora muito grande, espaço da galeria que recebeu o nome de
ala de "Arte Africana, Oceânica e Nativo Americana." Embora seja uma
exposição deslumbrante com uma grande variedade de belas, e em
muitos casos bastante grandes, objetos, A maioria do espaço de exibição
principal é preenchido com monumentais figuras de madeira da África e
da Nova Guiné p. 31

O mesmo é feito com outros museus pelo país, com a citação de pontos positivos e
negativos de cada um deles. Por fim, o texto é conluido dizendo que as muitas das dificuldades
existentes ao se tratar dos museus indígenas resultam das circunstâncias históricas dos indígenas
na sociedade americana. Além disso um erro pontuado pela pesquisadora é a tentativa de museus
de enquadrar os artefatos numa perspectiva esteticista levando em conta a oportunidade material
e distribuição do museu. No caso do museu histórico nacional, o artigo também não pouca
críticas:

No Museu Americano de História Natural, a cultura material é


descontextualizado de uma maneira diferente. Aqui, é despojado de
importância cultural e colocados ao lado de espécimes naturais, como
rochas e fósseis, criando a implicação que as pessoas que criaram esses
objetos não são mais do que antigos primatas que deveriam ser apenas
categorizado e classificado e não estudado como culturas únicas. p. 59

Por fim o artigo fala de como a "Ênfase curatorial não deveria ser mais sobre como os
índios são diferentes, mas como eles são iguais a muitos Americanos, e como eles evoluíram
para se tornarem parte da sociedade americana enquanto ainda mantendo sua rica herança
cultural".(p. 61)

Ainda nos Estados Unidos, podemos citar outra experiência museológica na região
próxima a Portland, no estado de Oregon. Esta obra gira em torno da ideia de museus como
locais de contato entre diferentes culturas/povos e usa como exemplo o povo tlingit. Estes
indígenas habitavam regiões litorâneas e viviam da pesca e são pertencentes à etnia já citada
tlingit, que habita aquela região há séculos e . Objetos pertencentes à etnia, hora mostrados a
seus membros, produzem reações notáveis entre eles. O artigo nota que:

A experiência de “consulta” deixou a equipe do Museu de Arte de


Portland com dilemas difíceis. Ficou claro que do ponto de vista dos
velhos tlingit os objetos colecionados não eram essencialmente “arte”.
Eles se referiam aos objetos como “registros”, “história” e “lei”,
inseparáveis dos mitos e histórias, expressando lições de moral atuais
com força política atual. O museu ficou claramente convencido de que as
vozes dos velhos tlingit deviam ser apresentadas ao público quando os
objetos fossem expostos. Essa exigência pressupunha um genuíno grau
de confiança, uma vez que muitas daquelas histórias e canções eram
propriedade daqueles tlingit. p.4

Nesse sentido acabou que o museu tornou-se, de certa maneira, um lugar de troca de
conhecimentos, que não poderia ser reduzido apenas à coleção. O artigo prossegue até chegar
tratando dessa questão dos museus como um espaço de zonas de contato e também fala da
desigualdade entre as condições de apresentação das culturas e como isso poderá ser visto neste
processo de contato proporcionado pelos museus. Por fim, o artigo é finalizado tratando da
proliferação de museus e como existirá uma zona de contato neles, em diversos locais do mundo.

Tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos os povos vivendo ligado às tradições
indígenas não passam de uma baixa porcentagem da população. De forma similar, a cultura
material do passado não é muito conhecida e nos museus muitas vezes são "esquecidas". Por
tanto, não penso haver algo completamente diferente entre os dois países do continente
americano. Práticas similares, para ambos os países, neste quesito, de conservação cultural,
podem ajudar na preservação da existência dessas culturas.

____

Referências:

BROWARNY, Laura. Art, Artifact, Anthropology: The Display and Interpretation of Native American
Material Culture in North American Museums. Seton Hall University, South Orange, NJ August 2010.

CLIFFORD, James. Museus como zonas de contato. Periódico Permanente. Nº 6 fev 2016.

GENOCÍDIO INDÍGENA NOS ESTADOS UNIDOS. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida:
Wikimedia Foundation, 2021. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Genoc
%C3%ADdio_ind%C3%ADgena_nos_Estados_Unidos&oldid=61856949>. Acesso em: 17 ago. 2021.

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