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O Declínio das Tabernas e Casas de

Pasto:
Uma Análise dos Fatores Socioeconómicos e Culturais

Unidade Curricular: Portugal Contemporâneo

Docentes: Prof. Miguel Castro

Discente: Bruno Bicho


Nº 11823
3º ano de Educação Básica
Portugal Contemporâneo

Índice
Introdução...........................................................................................................- 3 -
Capítulo 1: Evolução das Tabernas e Casas de Pasto................................- 4 -
Capítulo 2: Mudanças nos Hábitos Alimentares e Preferências do
Consumidor........................................................................................................- 5 -
Capítulo 3: Crescimento do Setor da Restauração......................................- 7 -
Capítulo 4: Regulamentações e Normas de Saúde....................................- 10 -
Enquadramento Legal e Normativo......................................................................- 11 -
Aplicação da Higiene Alimentar e Respetiva Segurança................................................- 12 -
Entrevista..................................................................................................................- 13 -
Capítulo 5: Mudanças Económicas e Urbanização....................................- 15 -
Conclusão.........................................................................................................- 16 -
Bibliografia.......................................................................................................- 18 -

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Introdução

Já existem muito poucas na sua essência original, e as que existem são


preservadas como tesouro urbano, as tascas, tabernas e casas de pasto com o seu
balcão de mármore, chão cheio de cascas de amendoim, o cheiro a vinho azedo
misturado com o cheiro a mofo das adegas e com a morte dos seus proprietários estas
tendem mesmo a desaparecer, aquelas casas onde íamos com os nossos avós, irão
desparecer por completo.

Rei morto, rei posto como diz a sabedoria popular e com o desaparecimento
das tabernas e casas de pasto surgiu um novo conceito associado às novas
tendências, as “tabernas gourmet” onde o conceito antigo não desaparece por
completo, continuam a existir os bancos corridos, os fados e os petiscos, no entanto
atualizado à nossa nova realidade. Os petiscos são baseados nos antigos, mas com
alterações e fusões com outros tipos de comidas.

As tabernas desde a idade medieval foram um pilar da economia e da cultura


em Portugal e nos anos 60/70 eram um local quase de culto, digamos assim, e foram
sobrevivendo ao avanço tecnológico, urbanístico e económico, até que chegaram a
um ponto de rutura em que não conseguiram acompanhar o “comboio” da evolução e
as exigências da sociedade.

Neste tema irei abordar a sua importância ao logo dos anos e o porquê do seu
quase desaparecimento. O trabalho será dividido por cinco partes, onde se aborda a
sua evolução, as mudanças de hábitos alimentares, o crescimento do setor da
restauração, regulamentação e normas de saúde e as mudanças económicas e
urbanísticas e uma conclusão.

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Capítulo 1 - Evolução das Tabernas e Casas de Pasto

Locais míticos do imaginário coletivo da população de Portugal, as tabernas,


tascas e casas de pasto, impuseram-se como espaços de sociabilidade importantes e
onde prevalecia a genuína amizade e a convivência fraternal mormente, das classes
sociais mais débeis mas que, ao cabo e ao resto, acabava por atravessar quartel
operários, empregados de diversas profissões, trabalhadores indiferenciados,
trabalhadores rurais e todos quantos se abeirassem do balcão no intuito de
acamaradar em paz e harmonia depenicando algo acompanhado de um copinho de
vinho nas beiças e paleio sem fim e onde o taberneiro, amigo e confidente,
complacente com todos os fregueses e figura central do território, controlava todo o
ambiente...(Castelhano F., 2010)

Ótimo ponto de encontro no final de um árduo dia de trabalho, onde os amigos


partilhavam alegrias e carpiam desilusões, discutiam interesses e preocupações do dia
a dia, todos os temas serviam para uma animada e amena cavaqueira encostados ao
balcão de mármore ou sentados em bancos corridos. Fumava-se sem restrições,
“definitivos” ou “Português Suave” e também os famosos e mais baratos “Kentuky´s” e
aproveitavam as tardes, noites para ouvir atentamente os relatos de futebol ou hóquei
em patins no tempo do Eusébio, Coluna, Peyroteo entre outros. A televisão, e outras
modernices do nosso dia a dia que invadiram, de modo avassalador, a nova era do
audiovisual, ainda não tinha irrompido brutalmente em cena ou encontravam-se nos
seus primórdios, fenómenos que, em larga medida, impedem o diálogo e a
convivência entre as pessoas. (Castelhano F., 2010)

As tabernas, eram um mundo fascinante, exclusivo dos homens, fechado. As


únicas mulheres que entravam eram a mulher e as filhas do taberneiro que eram
tratadas com o maior do respeito. Era ali, naqueles espaços de autêntica magia, onde
se faziam honestos negócios de vinhos e petiscos tradicionais, em torno de um copo
de vinho do barril e de um petisco que o taberneiro acabou de fazer, ali, estabeleciam-
se verdadeiras amizades duradouras. Os petiscos destas casas eram variados, mas
nunca falhavam, desde a patanisca de bacalhau ao bolinho de bacalhau, os ovos
cozidos, as chouriças, as azeitonas, os torresmos, os carapauzinhos fritos, as moelas
de tomatada, o famoso caldo verde com rodelas de chouriço, os caracóis entre outras

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verdadeiras iguarias. Eram o local de encontro e também restaurante a preços bem


convidativos.

As tabernas e casas de pasto desempenharam um papel fundamental na


cultura portuguesa, sendo mais do que simples locais onde se serve comida. Elas são
verdadeiros tesouros da nossa herança gastronómica e social.

As tabernas e casas de pasto são guardiãs das tradições culinárias locais.


Nestes estabelecimentos, muitas vezes familiares, encontramos pratos que têm raízes
profundas na nossa cultura, transmitidos de geração em geração. São nesses locais
que podemos provar iguarias tradicionais como os referidos anteriormente, preparadas
com os sabores autênticos que fazem parte do nosso património.

As tabernas além de ser um local de venda de bebidas, eram também um local


de venda a retalho, vendia-se de tudo um pouco desde as azeitonas ao litro de feijão
seco, da broa cortada em quartos ao toucinho aos cubos, desde os chouriços e
queijos guardados em uma lata de azeite, vendia-se também marmelada, biscoitos,
bolachas tudo a granel. Grande parte das vezes era apontado no livro dos “calotes” e
as contas faziam-se no fim do mês quando se recebia.

Além disso, as tabernas e casas de pasto eram espaços de convívio e de


encontro. São lugares onde as pessoas se reuniam para partilhar histórias, conversas
animadas e momentos de descontração. A atmosfera acolhedora e muitas vezes
rústica destes estabelecimentos criava um ambiente único, onde a comunhão entre
amigos e familiares era valorizada.

Por último, mas não menos importante, as tabernas e casas de pasto


contribuíram para a economia local. Muitas delas utilizam ingredientes regionais e
apoiam produtores locais, promovendo assim a sustentabilidade e a preservação das
tradições culinárias da região.

Capítulo 2 - Mudanças nos Hábitos Alimentares e


Preferências do Consumidor

“A cultura alimentar até à primeira metade do século XX em Portugal é


de base vegetal, ou seja, é eminentemente vegetariana, por obrigação,
como é, de resto, a grande cultura alimentar do Sul da Europa. A lógica

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é a de aproveitar tudo o que a horta pode dar, variando em função da


estação do ano, da presença ou ausência de água, da qualidade da
terra e da dimensão do espaço a cultivar. Tudo se come, tudo se
mistura, tudo se coze. Os diferentes hortícolas misturam-se com outros
vegetais ao longo do dia. Com cereais, com leguminosas e com
tubérculos. Os hortícolas comem-se quase sempre cozinhados e
raramente crus. Apesar da abundância de vegetais frescos, as saladas
cruas são raras entre nós. É a grande tradição da comida de panela
portuguesa, mistura de sabores genial que preserva os nutrientes e
onde a diversidade e a criatividade estão presentes a cada momento”.
(Graça, P. 2020, p. 12)

Assim, até ao final da década de 60, os principais locais onde os portugueses


se abasteciam eram os mercados, as mercearias, talhos, frutarias, padarias ou as,
então em voga e hoje extintas, leitarias. Estas pequenas lojas, na sua maioria mono-
alimentares (disponibilizando apenas uma categoria de produtos) cultivavam uma
relação de proximidade com os clientes (fregueses). Estes, na sua maioria, moravam
perto e, por isso, era-lhes permitido, por exemplo, levarem produtos sem pagarem de
imediato (o chamado “fiado”), aguardando o recebimento do seu salário para reporem
o dinheiro em falta. Além disso, havia um atendimento personalizado ao balcão; as
compras eram mediadas. A pessoa pedia, e davam-lhe o que queria. Não existia “self-
service”.

Em Portugal, o consumo alimentar fora do domicílio nunca foi uma constante a


nível económico. A última crise na economia portuguesa, antes da pandemia, entre
2010 e 2013, conduziu a uma diminuição nos rendimentos familiares e, como
consequência, fez cair o consumo geral por parte do consumidor português (FMS,
2013).

Após esse período de recessão, o país deparou-se com uma estagnação no


crescimento económico, tendo aumentado o desemprego por parte da população
jovem, contribuindo novamente para a modificação dos hábitos de consumo dos
cidadãos. Complementarmente a esse contexto, outras variáveis, como o rendimento
disponível volátil, a natalidade decrescente, o aumento da esperança média de vida, o
crescimento modesto do consumo e a massificação do acesso do uso de dispositivos

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digitais, também se demonstraram como fatores impactantes nos comportamentos dos


portugueses (P. Silva, 2017).

Esta racionalização do consumo e o cuidado na gestão dos orçamentos


familiares durante a crise de 2013 levou a que cerca de 31% dos consumidores
portugueses passasse a ir de forma menos frequente a restaurantes, constatando-se
um aumento da preparação de refeições no domicílio e da utilização de marmitas. Em
2017, cerca de 630 euros eram gastos na alimentação fora do domicílio por habitante,
representando 14% do total de refeições ingeridas pelos portugueses - uma média de
102 refeições e lanches por ano por habitante (GIRA-Foodservice, 2018b).
A estagnação económica permitiu que cada indivíduo desenvolvesse ideais
associados ao consumo alimentar fora do domicílio, esperando que fossem criadas
condições aprazíveis ao gosto do consumidor, centralizando as suas escolhas a partir
do “smart shopping “(momentos de escolha/compra planeados, racionais e menos
impulsivos), das experiências criadas nos momentos de consumo alimentar e da
conveniência que os serviços e produtos conferem (Pequeneza, 2018; P. Silva, 2017).

Nos últimos anos, temos assistido a um grande crescimento nas novas


tendências alimentares em Portugal. Cada vez mais, as pessoas estão a abandonar a
comida de taberna e casas de pasto em busca de opções mais contemporâneas e
saudáveis.

As tradicionais tabernas e casas de pasto, que por tanto tempo foram os pilares
da nossa gastronomia, estão a enfrentar desafios significativos à medida que a
procura por experiências gastronómicas mais sofisticadas e diversificadas aumenta.
Os consumidores estão a procurar alimentos mais frescos, orgânicos e nutritivos,
muitas vezes optando por restaurantes que servem pratos com ingredientes locais e
sazonais.

Além disso, as tendências alimentares internacionais também têm


desempenhado um papel importante na mudança de preferências. Pratos de outras
culturas estão a ganhar popularidade, refletindo a crescente diversidade cultural do
país. Sushi, comida tailandesa, comida vegetariana e vegan, além das cadeias de fast
food, têm sido especialmente bem-recebidos.

No entanto, é importante notar que a comida de taberna e casas de pasto


ainda mantém um lugar especial no coração dos portugueses. Muitos valorizam a
tradição e a autenticidade desses lugares, e esses estabelecimentos têm adaptado as

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suas ofertas para atrair um público mais diversificado, incluindo opções mais
saudáveis e inovadoras.

Capítulo 3 - Crescimento do Setor da Restauração

A alimentação fora do domicílio (ou food away-from-home) começou a ser um


comportamento adotado ainda durante a idade medieval com casas de repouso a
peregrinos que faziam as suas refeições nesses espaços. No século XVI, no mundo
ocidental, apareceu o conceito de “coffee houses”, onde o chá e o café, dois produtos
importados e exóticos, começaram a fazer parte dos hábitos de consumo fora do
domicílio. Foi durante a Revolução Francesa que nasceram os restaurantes modernos,
dando origem a uma variada gama de estabelecimentos e serviços de consumo
alimentar fora do domicílio, conhecidos nos tempos atuais em todo o mundo (Spang,
2000).

O aparecimento e o desenvolvimento do setor da restauração devem-se a uma


série de fatores externos provocados pelas próprias vivências do consumidor ao longo
dos anos. O papel determinante da mulher no mercado de trabalho, o aumento da
distância entre os locais de residência e os locais de trabalho, o aumento da idade da
reforma, o aumento de núcleos familiares monoparentais e a diminuição do número
médio de elementos do agregado familiar, foram determinantes para o crescimento do
setor da restauração. Em Portugal, (Marques 2009) demonstrou que, entre 1990 e
2000, a frequência de consumo fora do domicílio pelos consumidores portugueses
também sofreu um aumento, passando de uma regularidade média geral de 5 a 7,6
vezes por mês. Especificamente foi observado o aumento médio per capita de 4 a 5,8
vezes por mês para estabelecimentos como restaurantes, bares, cafés e similares e,
de 1 a 1,8 vezes por mês para cantinas e refeitórios (Marques, 2009).

Nas últimas décadas, os locais de consumo de refeições fora do domicílio


tiveram uma grande expansão e, atualmente, os estabelecimentos de preparação,
confeção e venda de produtos alimentares para consumo fora do domicílio estão
presentes em todo o mundo, as grandes cadeias de alimentação, gerando grandes
volumes de negócios.
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O setor alimentar experimentou um notável crescimento nas últimas décadas,


impulsionado por uma série de fatores, incluindo a globalização, a mudança nas
preferências do consumidor e o impacto do turismo. Este crescimento tem levado a
uma grande competição entre diferentes tipos de alimentos, refletindo-se na
diversidade de opções disponíveis nos mercados em todo o mundo.

A globalização desempenhou um papel significativo no aumento da competição


no setor alimentar. A abertura de fronteiras e a expansão do comércio internacional
permitiram que produtos alimentares de diferentes regiões do mundo chegassem aos
consumidores, criando uma ampla variedade de escolhas. Como resultado, os
consumidores agora têm acesso a uma gama diversificada de alimentos exóticos e
culturas culinárias que antes eram inacessíveis.

O autor Michael Pollan, em seu livro "O Dilema do Onívoro", aborda a


complexidade da escolha alimentar na sociedade moderna, destacando como a
competição entre alimentos processados e alimentos frescos, bem como entre
diferentes sistemas alimentares, e o impacto que traz à nossa saúde e meio ambiente.

Além disso, o turismo desempenha um papel crucial nessa competição


alimentar. Os viajantes agora procuram experiências gastronómicas autênticas como
parte de suas viagens, impulsionando a procura desenfreada por alimentos locais e
tradicionais. Anthony Bourdain, um famoso chef e autor, explorou essa conexão entre
comida e cultura em seu programa de televisão "Parts Unknown", que explorou a
diversidade culinária em todo o mundo. De salientar que Bourdain numa entrevista que
deu meses antes de morrer, disse que fazia sempre questão de ir comer às tascas
e/ou casas de pasto, “era ali que se encontrava a essência da comida tradicional”

A competição no setor alimentar também levou a inovações na indústria


alimentícia, com empresas buscando constantemente desenvolver novos produtos e
estratégias de marketing para atrair os consumidores. Autores como Eric Schlosser,
em seu livro "Fast Food Nation", analisaram as complexidades do mercado de fast
food e suas implicações para a sociedade contemporânea.

O crescimento do setor alimentar e a competição entre diferentes tipos


alimentares são fenómenos que têm raízes profundas na globalização, nas
preferências do consumidor e no turismo. Essa competição está a moldar a forma
como comemos e como a indústria alimentar se adapta às demandas em constante
evolução. Autores reconhecidos como Michael Pollan, Anthony Bourdain, Eric
Schlosser entre outros têm explorado essas questões em profundidade.
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Nos últimos anos, temos observado uma mudança de preferências nos lugares
de convívio em Portugal. As tabernas e casas de pasto, que durante muito tempo
foram pontos de encontro tradicionais, parecem estar a perder terreno para cafés e
bares. Esta mudança é influenciada pelo facto de que os jovens agora preferem e têm
a oportunidade de desfrutar de uma variedade mais ampla de bebidas além do vinho e
bagaço, que eram comuns nas tabernas.

Os cafés e bares oferecem uma seleção diversificada de bebidas, incluindo


cocktails, cervejas artesanais, cafés especiais e uma variedade de refrigerantes e
sumos. Isso atrai um público mais jovem que procura experiências diferentes e uma
atmosfera mais moderna. As tascas, por outro lado, muitas vezes mantêm um foco
nas bebidas tradicionais alcoólicas, o que pode não ser tão atraente para a nova
geração.

Capítulo 4 - Regulamentações e Normas de Saúde


Hoje, mais do que nunca, a segurança dos produtos alimentares constitui uma
preocupação central aos olhos dos cidadãos e das entidades responsáveis, bem como
uma condição necessária ao reforço da proteção dos consumidores. Um dos sectores
de atividade económica com maior impacto junto do consumidor é, sem dúvida, o
alimentar. É um sector em que a oferta não pára de crescer, à medida que as trocas
comerciais se intensificam e em que a qualidade é, também aqui, reclamada por quem
compra. Empresas que produzem, manuseiam, fornecem ou distribuem géneros
alimentícios reconhecem uma necessidade cada vez maior de demonstrar e
documentar as condições de controlo, com impacte na segurança alimentar, de modo
a garantir a imprescindível qualidade alimentar.

As doenças provocadas pelos alimentos podem ter um peso socioeconómico


considerável, pois as pessoas atingidas podem ficar incapacitadas para o trabalho e
até morrer e, por outro lado, as consequências económicas podem ser muito graves
para a empresa ou estabelecimento responsável pela doença transmitida.

A Higiene Alimentar tem como objetivo estudar os métodos de produzir,


preparar e apresentar alimentos sãos e de boa qualidade. Qualquer alimento pode ser
contaminado com microrganismos durante a sua produção, preparação,
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armazenamento, exposição e venda. Os microrganismos que contaminam os


alimentos podem provocar alterações superficiais ou profundas dos produtos,
diminuindo a sua qualidade e o seu tempo de conservação.

No caso dos microrganismos patogénicos (ou agentes etiológicos todos os que


causam patologia ao Homem), podem provocar alterações na saúde dos
consumidores e manipuladores de alimentos, transmitindo doenças graves,
nomeadamente as intoxicações alimentares (intoxicações e infeções alimentares).

O Homem é portador de bactérias na boca, nariz, mãos, intestinos e pode


contaminar os alimentos quando os manipula, quando tosse ou espirra sobre os
alimentos. Os alimentos crus podem ser veículos de contaminação, especialmente as
carnes, os mariscos e vegetais. Os insetos e roedores podem transportar bactérias
perigosas e pelos seus hábitos de vida facilmente contaminam os alimentos. No pelo
dos animais domésticos e nas penas das aves podem existir bactérias perigosas. Não
deve ser permitida a sua entrada ou permanência nos locais onde se manuseiam
alimentos. São considerados alimentos de alto risco alimentos que pela sua
composição permitem o desenvolvimento rápido das bactérias as carnes de animais
de talho e carne de aves, ovos, produtos de pastelaria, especialmente bolos com
creme e, alguns molhos e maionese.

Enquadramento Legal e Normativo

Com a livre circulação de produtos no espaço comum europeu e, de forma a


reforçar a proteção da saúde pública e, consequentemente, o grau de confiança dos
consumidores, a União Europeia procedeu à harmonização de um conjunto de normas
através da Diretiva Comunitária de 14 de Junho de 1993 (Diretiva nº 93/43/CEE),
estabelecendo as normas gerais de higiene dos alimentos, em todas as fases do seu
processamento, bem como os modos de verificação do cumprimento dessas normas.
Como qualquer Diretiva, havia que transpô-la para a ordem jurídica nacional, o que
veio a acontecer a 18 de Março de 1998 com a publicação do Decreto-Lei nº 67/98.

Atualmente, o Regulamento (CE) n.° 852/2004 (obrigatório a partir de 1 de


Janeiro de 2006) define que os operadores das empresas do sector alimentar devem
criar, aplicar e manter um processo ou processos permanentes baseados nos
princípios HACCP. Este é aplicável em todas as fases da produção, transformação e

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distribuição de alimentos, sem prejuízo de requisitos mais específicos em matéria de


higiene dos géneros alimentícios.

A International Organization for Standadization (ISO) criou, em Setembro de


2005, a ISO 22000, que define os requisitos para a implementação de Sistemas de
Gestão da Segurança Alimentar, segundo a Metodologia HACCP. A implementação
desta Norma permite a definição de um Sistema de Gestão de Segurança Alimentar
que possibilitará, além do reconhecimento da empresa como "Empresa Certificada", o
cumprimento dos requisitos legais, nomeadamente do Regulamento (CE) n.°
852/2004.

Aplicação da Higiene Alimentar e Respetiva Segurança

As empresas portuguesas do sector agroalimentar ficam, assim, obrigadas a


cumprir regras que cobrem os géneros alimentícios em todas as suas fases de
produção, desde a matéria-prima até à distribuição. Para tal, devem começar por
identificar as fases do processo, de forma a garantirem a segurança dos alimentos e o
cumprimento dos procedimentos adequados, desenvolvendo ações de autocontrolo,
ações estas que deverão sustentar-se nos princípios que estão na base do sistema
HACCP (Hazard Analysis Critical Control Point) Análise dos Perigos e Pontos Críticos
de Controlo.

O HACCP vem complementar o conceito tradicional de controlo da qualidade,


realizado, fundamentalmente, através de colheitas de amostra de matérias-primas,
produtos intermédios e finais e, da posterior análise para confirmação dos parâmetros
fixados legalmente. É um sistema preventivo de controlo da qualidade higiénica dos
géneros alimentares (em qualquer área da cadeia alimentar), cujo principal objetivo é
prevenir a ocorrência de acidentes causados por intoxicações alimentares e, garantir a
segurança dos alimentos através da identificação dos perigos (físicos, químicos e
microbiológicos) associados ao seu manuseamento e das medidas adequadas ao seu
controlo.

Deste modo, exemplos de atividades que devem implementar ações de


autocontrolo da segurança alimentar são: indústrias, restauração, hotelaria, atividades
de comércio (hipermercados/supermercados/mercados/bares/restaurantes), ou seja,
qualquer empresa que por imperativo profissional intervém na preparação dos
alimentos, nas suas diversas fases, confeção, conservação, distribuição, entre outras.

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Com a entrada em vigor desta diretiva muitas tabernas e casas de pasto não
tiveram outra alternativa, se não, fechar. “A ASAE fechou a tasca do Sr. Zé das
Sardinhas”, como este titulo, apareceram outros parecidos nos jornais regionais e não
só, eram tabernas e casas de pasto muito antigas sem as condições que são exigidas
hoje, sitio onde a mesma colher de pau mistura as carnes de um cozido à portuguesa
ou ajeita os carapaus fritos, todos que frequentam estas casas estão cientes do que se
passa na cozinha, ou porque conhecem o dono ou a cozinheira, no entanto quando
chega a hora de comer nada disso é problema. No entanto nos dias de hoje nada disto
é permitido.

Não foi notícia no jornal local, Ecos do Sor, mas foi muito sentida pelos
habitantes da aldeia de Fazenda com cerca de 60 habitantes que viram a única
taberna ser fechada pela ASAE por falta de condições sanitárias.

O Sr. Fernando Russo teve a amabilidade de me receber e contou a sua


aventura com a ASAE, o Sr. Russo como é conhecido, é uma pessoa de trato fácil,
sempre sorridente e tinha uma particularidade, engraçada, de andar sempre com um
copinho no bolso, para beber com os clientes quando ia levar a conta à mesa dos
clientes e para a mulher não ver, confidenciou entre risos.

Entrevista

Eu: Olá, Sr. Fernando Russo antigo proprietário de uma taberna tradicional que
infelizmente teve de fechar devido a questões relacionadas com a ASAE. Sr. Russo,
pode-nos contar um pouco sobre a sua taberna e a sua história?

Sr. Russo: Olá, é um prazer estar a falar com a juventude. A minha taberna, chamada
"Russo da Fazenda", era um local que servia comida tradicional portuguesa há mais
de trinta anos. Era um espaço acolhedor, conhecido pelas suas especialidades
caseiras, tais como o cozido à portuguesa, sopa da pedra, migas de espargos com
carne do alguidar, verdes e mais alguns, e como sabes também tínhamos excelentes
petiscos.

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Eu: Pode explicar-nos o que levou ao encerramento da sua taberna?

Sr. Russo: Claro. O encerramento da minha taberna ocorreu após uma inspeção da
ASAE. Eles identificaram algumas infrações relacionadas com a higiene e segurança
alimentar, bem como problemas documentais relacionados com as licenças. E
também apenas dispunha apenas de uma casa de banho para os clientes, é uma casa
muito antiga, contruída em 1950 mais coisa menos coisa, só depois é que foi adaptada
para a taberna.

Eu: Essa situação deve ter sido difícil. Como é que essa decisão afetou a sua vida e a
da sua família?

Sr. Russo: Foi devastador, para ser sincero. A taberna era parte do nosso sustento,
como já sou reformado ia buscar mais algum e um lugar onde tantas memórias foram
criadas. O encerramento deixou um vazio na comunidade local, que perdeu um
espaço de convívio importante e único aqui na aldeia, de momento não há outro sítio
onde as pessoas possam ir, para beber um café ou uma cerveja tem de ir à Ponte de
Sor que fica a mais de 5km.

Eu: Entendo a importância da sua taberna na comunidade. Houve alguma tentativa de


resolver as questões com a ASAE ou de reabrir o estabelecimento?

Sr. Russo: Sim, fizemos esforços para resolver as questões, mas a burocracia e os
custos associados eram muito grandes. Além disso, com a pandemia que ocorreu logo
após o encerramento, a situação tornou-se ainda mais complicada. Infelizmente, já
não sou novo nem a minha esposa, tínhamos a taberna para ajudar o meu filho e o
meu netinho e também nos ajudava a passar o tempo.

Eu: É uma história triste. Quais são os seus planos para o futuro?

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Sr. Russo: Com esta situação toda e depois da pandemia tenho pena dos meus
clientes pois era um sítio onde vinham ver a bola e passavam as tardes de sábado e
domingo a jogar uma cartada, traziam os miúdos que passavam essas tardes a jogar à
bola nas traseiras da taberna. Eu já não caminho para novo (risos) já tenho a minha
reforma e a minha horta e vou-me entretendo, dificilmente abrirei outra taberna ou café
é preciso muita papelada e eu já não tenho cabeça para isso, nem a minha esposa.
Vamos fazendo uns petiscos sempre é uma forma de nos reunirmos, mas não se pode
saber (risos)

Eu: Obrigado, Sr. Russo, por partilhar a sua história connosco. Desejamos-lhe o
melhor para o futuro, e esperamos que as tradições culinárias locais continuem a ser
valorizadas.

Sr. Russo: Muito obrigado pelo apoio. É importante lembrar a importância das
pequenas tabernas e da nossa cultura gastronómica.

Capítulo 5 - Mudanças Económicas e Urbanização

A urbanização e o crescimento económico têm sido forças motrizes na


transformação das áreas urbanas e nos estilos de vida das pessoas. À medida que as
áreas urbanas se expandem e modernizam, o cenário de negócios é profundamente
afetado, muitas vezes tornando as tabernas e casas de pasto menos atraentes ou
viáveis como modelos de negócios tradicionais.

Um dos principais motivos dessa mudança é o aumento dos custos associados


à urbanização. A economista Jacobs, J. (1961) argumenta que o crescimento urbano
pode levar a pressões de custo, como aluguéis mais altos, tornando difícil para os
negócios de menor escala sobreviverem em áreas urbanas em expansão.

Além disso, o crescimento económico muitas vezes traz consigo uma escolha
por opções de refeições mais diversificadas e modernas. Isso pode deixar as tabernas
e casas de pasto, que tradicionalmente oferecem uma experiência mais simples e
tradicional, em desvantagem competitiva. Como destacado por Schlosser, E. (2001) as

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mudanças nos estilos de vida das pessoas nas áreas urbanas está a impulsionar a
escolha por uma variedade de opções gastronômicas.

A redução no número de tabernas e casas de pasto ao longo do tempo


também pode ser atribuída a uma série de fatores socioeconômicos e culturais. À
medida que as áreas urbanas se tornam centros de crescimento económico, há uma
evolução nos estilos de vida das pessoas. Isso se reflete na mudança de preferências
gastronômicas e de entretenimento.

A ascensão de restaurantes de fast food e redes de franquias, por exemplo, é


um fenómeno diretamente relacionado a mudanças nos hábitos alimentares e de
consumo. O autor Schlosser, E. (2001) explora como as transformações culturais e
económicas afetam a paisagem urbana, incluindo a ascensão de opções de refeições
rápidas em detrimento das tabernas tradicionais.

Além disso, os estilos de vida modernos muitas vezes levam as pessoas a


procurar experiências de entretenimento diferentes das oferecidas pelas tabernas e
casas de pasto. Os bares temáticos, lounges e espaços de entretenimento
contemporâneos atendem a essa demanda em evolução.

Em resumo, a redução no número de tabernas e casas de pasto ao longo do


tempo é resultado de uma interação complexa entre urbanização, crescimento
económico e mudanças culturais e sociais. Esses fatores combinados moldam o
cenário de negócios e a preferência do consumidor nas áreas urbanas em constante
transformação.

Conclusão

A análise do declínio das tabernas e casas de pasto, considerando os fatores


socioeconómicos e culturais, é de extrema importância para compreendermos as
mudanças que ocorreram ao longo do tempo na sociedade e na indústria da
restauração. As tabernas e casas de pasto têm uma significativa importância histórica,
pois desempenharam papéis fundamentais na vida social e cultural de muitas
comunidades ao longo dos séculos. Eram locais de encontro, troca de ideias,
celebração e convívio, sendo um reflexo das tradições e hábitos alimentares de
diferentes épocas.

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Apesar de ainda ser possível uns vislumbres delas, à conta de gente que
resiste na idade e no ofício, talvez já não por necessidade, mas por mera ocupação e
distração dos longos dias de quem vive só, e porque há sempre um ou outro cliente
desocupados em que a pretexto de um copo de vinho se trocam dois dedos de
conversa, as antigas tascas, tabernas ou mercearias das nossas aldeias, que na maior
parte dos casos eram a mesma coisa, estão fatalmente condenadas ao
desaparecimento. (www.freguesiadeguisande.com)

A intervenção da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE)


também desempenhou um papel importante no declínio das tabernas e casas de
pasto, uma vez que impôs regulamentos mais rigorosos para garantir a qualidade dos
alimentos e a segurança dos consumidores. Isso pode ter dificultado a operação de
estabelecimentos informais e de menor escala. Nas aldeias mais remotas, onde ainda
não chegou do pessoal da ASAE, e fica longe para compras regulares no centro das
vilas, ainda escapam algumas pequenas mercearias e tabernas à moda antiga, mas
mesmo aí são raridades porque de um modo geral por ali não há moradores, quanto
mais clientes.

É importante ressaltar que o declínio das tabernas não significa


necessariamente a sua extinção completa. Algumas ainda resistem e mantêm viva a
tradição, enquanto outras foram adaptadas para atender às exigências
contemporâneas. No entanto, a sua importância histórica e cultural não pode ser
subestimada, pois esses estabelecimentos desempenharam um papel fundamental na
formação da identidade culinária e social de muitas regiões. A análise desses fatores
socioeconômicos e culturais nos permite compreender a dinâmica em constante
evolução do setor da restauração e sua relação com a sociedade ao longo do tempo.

Embora ainda existam algumas, muitas delas estão condenadas à extinção


devido a mudanças nos hábitos de consumo, novas formas de socialização e a
concorrência de espaços mais modernos. Além disso, as autoridades têm aplicado
regulamentações rigorosas relacionadas à higiene e segurança alimentar, o que
também afeta esses estabelecimentos tradicionais.

Na década de 80, surgiram cafés e snack-bares modernos que competiram


com as tascas e tabernas. No entanto, em alguns centros históricos de cidades,
algumas dessas tabernas antigas sobrevivem como atrações turísticas, mas estão
ameaçadas devido à pressão imobiliária nas áreas históricas das cidades. Outra

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Portugal Contemporâneo

dificuldade que os proprietários encontram é a pressão do mercado imobiliário, onde


qualquer lugar pode ser restaurado e transformado em alojamento local.

A época dourada das mercearias, tascas e tabernas das nossas aldeias,


pertence já a um passado, se não distante, pelo menos a passos largos do
esquecimento. Os mais velhos delas já só têm lembranças, mas os mais novos nem
sabem o que isso é... (www.freguesiadeguisande.com)

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