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Mestrado em Estratégia

A importância estratégica das Selvagens:


Ilhas ou Rochedos.

Técnicas de Tomada de Decisão

Docente: Professor Auxiliar Doutor Carlos Gonçalves

Mestrando: Duarte Nuno Oliveira

Lisboa
2016
INTRODUÇÃO

A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), concluída em


1982, em Montego Bay, na Jamaica, é um tratado que foi celebrado com o patrocínio da
Organização das Nações Unidas (ONU) e que estabelece, entre outros, o conceito de
Mar Territorial, de Zona Económica Exclusiva e de Plataforma Continental. Define
ainda um contexto global para a exploração dos recursos naturais do mar, os vivos e os
não vivos, que se encontrem no solo e no subsolo (Graça & (Coord.), 2014, p. 195).

«Portugal ratificou a CNUDM em novembro de 1997 abrindo assim uma


nova era da sua história marítima ao possibilitar a ampliação do seu
território no tão limitado domínio espacial da esfera terrestre. Esta
extensão territorial, com direitos de exploração de recursos igualmente
regulados pelo mesmo tratado, representa um enorme desafio à
capacidade e competência técnico-jurídica nacional, da qual poderão
resultar inúmeros desafios de ordem económica e geopolítica.» (Graça &
(Coord.), 2014, p. 195).

A questão determinante das negociações da Convenção das Nações Unidas dobre o


Direito do Mar (CNUDM) foi a definição dos limites das áreas marítimas sob jurisdição
dos Estados costeiros. As grandes potências navais pretendiam limitar estas áreas a uma
ínfima faixa costeira, na ordem das 3 milhas. Os países latino-americanos, por seu
turno, pretendiam um mar territorial de 200 milhas. Das duas posições chegou-se a um
consenso: o mar territorial abrangeria 12 milhas; para além desta distância até às 200
milhas, vigoraria o estatuto de Zona Económica Exclusiva (ZEE).

As ilhas oceânicas que constituem os arquipélagos portugueses nunca estiveram ligadas


a nenhum continente e, por esta razão, padecem de um isolamento geográfico bastante
acentuado dado o facto de se encontrarem a uma enorme distância das grandes massas
continentais.

O arquipélago das Selvagens é constituído por três ilhas: Selvagem Grande, Selvagem
Pequena e Ilhéu de Fora, para além de um conjunto de afloramentos rochosos, e está
integrado na Região Autónoma da Madeira, sendo considerado o ponto mais a sul do
território português. Está localizado à distância de 163 milhas náuticas da Ilha da
Madeira e apenas a 82 milhas náuticas do arquipélago espanhol das Canárias. Por esta

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razão, no passado, Espanha levantou algumas dúvidas relativamente à soberania sobre
as Selvagens (Santana, 2016).

As dúvidas relacionadas com a soberania sobre estas ilhas terão ficado esclarecidas, a
favor de Portugal, na sequência do parecer emitido pela Comissão Permanente de
Direito Marítimo Internacional fundamentado em dois argumentos inegáveis de
caraterísticas históricas: o direito de descobrimento e a posse ininterrupta (Santana,
2016).

Apesar do parecer referido anteriormente, têm ocorrido diversas violações da soberania


portuguesa que se caraterizam por atividades de pesca ilegal e de violação do espaço
aéreo que têm sido respondidas através da intervenção dos Vigilantes da Natureza do
Parque Natural da Madeira que, recorrendo a meios da Força Aérea Portuguesa, da
Marinha Portuguesa e da Polícia Marítima, também portuguesa, têm obtido resultados
positivos na defesa da soberania daquele território. As visitas do Presidente da
República Portuguesa e de outras entidades de relevos, civis e militares, têm contribuído
também para reafirmar a soberania das Selvagens.

No entanto, existe uma questão fundamental em torno da disputa, travada entre Portugal
e Espanha, pela posse das Selvagens e que é a sua definição enquanto classificação
jurídica. Portugal afirma serem ilhas enquanto Espanha considera e defende que se
tratam de rochedos.

Tendo em consideração o que é referido na CNUDM – Convenção das Nações sobre o


Direito do Mar, «os países costeiros têm o direito de declarar uma Zona económica
Exclusiva (ZEE). (…) Por princípio a área da ZEE é delimitada por “uma linha situada
a 200 milhas marítimas da costa, mas pode ter uma extensão maior de acordo com a da
plataforma continental. A ZEE separa as águas nacionais das águas internacionais.”»
(Daehnhardt, Ferreira, Coutinho, & Vasconcelos, 2014, p. 9).

Em 2013, teve lugar uma disputa, entre Portugal e Espanha, envolvendo as Selvagens e
relacionada com o facto de aquelas serem ilhas ou rochedos. Espanha pretende que se
faça a delimitação da ZEE, das 200 milhas náuticas, ignorando as Selvagens por as
considerar como simples rochedos, invocando o nº 3 do artigo 121 da CNUDM, que
refere «Os rochedos que, por si próprios, não se prestam à habitação humana ou a vida
econômica não devem ter zona econômica exclusiva nem plataforma continental.»

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Por outro lado, Portugal defende que as Selvagens devem ser classificadas como ilhas e,
em consequência disso, conseguir o alargamento a sua superfície marítima.

Esta contestação pela classificação como ilhas ou rochedos, mais não é do que o reflexo
de atos de afirmação da soberania, de cada um dos países, uma vez que ambos
pretendem o controlo efetivo e total da área onde se localiza o arquipélago devido à sua
localização geoestratégica, ao facto de, supostamente, existirem nesta zona diversos
recursos económicos (pesca) e energéticos (petróleo) e ainda por causa da sua extensa
ZEE (Daehnhardt, Ferreira, Coutinho, & Vasconcelos, 2014).

METODOLOGIA DE PESQUISA

A metodologia utilizada para a realização deste trabalho consistiu na análise de


informação documental com caraterísticas qualitativas. A informação analisada e que
serviu como base para a elaboração deste trabalho encontra-se disponível em fontes
abertas obtida através da consulta de livros ou capítulos de livros, revistas, artigos de
jornais, e outras publicações periódicas e de caráter científico, e de informação em
formato eletrónico localizada em vários sítios na internet, enquadrada na temática da
Estratégia, Relações Internacionais e Política Internacional.

Serão analisados e explicados os pontos mais relevantes do trabalho tendo em conta


dois aspetos essenciais: a relação entre os dois atores, a sua caracterização, os seus
objetivos e as suas fragilidades.

O tema escolhido, será analisado no âmbito de uma perspetiva que relacione a


Estratégia e as Relações Internacionais com o objetivo de melhor compreender o
conflito em estudo: a disputa que decorre entre Portugal e Espanha pela classificação e
posse das Selvagens considerando as diferentes teorias e perspetivas, passadas e atuais,
dos diferentes autores.

CONCEITOS OPERACIONAIS

 Soberania

Considerando a definição presente no Dicionário de Relações Internacionais, soberania


é a «Governação política sem contestação de um Estado sobre determinado território.

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O direito exclusivo do Estado de exercer todos os seus poderes sobre o território, como
o monopólio de legislação, regulamentação e jurisdição.» (Sousa & (Coord.), 2014, p.
224).

Segundo Lara (2015), «É certo que no plano meramente formal se considera a


soberania como o poder que não tem igual na ordem interna dos Estados nem superior
na ordem externa, considerando-se consequentemente aqueles como realidades
jurídicas pares a nível internacional.» (Lara, 2015, p. 265).

 Estratégia

André Beaufre refere que, de acordo com o conceito antigo militar, a estratégia consiste
na arte de utilizara as forças militares de forma a atingir objetivos fixados pela política,
mas acrescenta que na sua opinião «… esta definição é limitada, uma vez que diz
respeito Às forças militares, e eu redigi-la-ia antes da maneira: a arte de utilizar a
força para a concretização dos objectvos da política.» (Beaufre, 2004, p. 35).

Para o Almirante Silva Ribeiro, a estratégia é «… a ciência e a arte de edificar, dispor e


empregar meios de coação num dado meio e tempo, para se materializarem objectivos
fixados pela política, superando e explorando eventualidades em ambiente de
desacordo.» (Ribeiro, 2010, p. 22).

 Geopolítica

No Dicionário de Relações Internacionais, geopolítica é um «Termo usado pela


primeira vez por Kjellén em 1899 como estudo realista da história e do crescimento dos
Estados, enquanto ciência cujo objeto seria analisar o Estado como organismo
geográfico tal como se traduz no espaço e tratar o impacto dos fatores geográficos
(distribuição de terras e recursos) na política internacional. Na sua fase inicial,
constituiu uma variante do determinismo, a partir de noções de território e de situação
geográfica. Posteriormente, veio a orientar-se para a ação e a estratégia ao serviço do
Estado nacional até que o seu estudo, a sua própria linguagem e terminologia entraram
em declínio com o fim da 2ª Guerra Mundial, para renascer junto À Geografia Política,
a partir dos anos 1970, nos Estados Unidos, depois de décadas de escasso interesse em

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geral. Atualmente, e ao invés, é muito utilizada a sua “visão do mundo” no debate
internacional …» (Sousa & (Coord.), 2014).

Geopolítica é também entendida como sendo uma ciência que tem como objetivo o
estudo das relações que se estabelecem entre a política e o espaço (Balão, 2014). Esta
autora, citando Baud et al (1999, p. 150), refere que pode ser entendida ainda «a várias
escalas: à escala de um grupo (por exemplo, unido por uma mesma religião), de um
Estado, de um espaço em particular (um oceano, por exemplo) ou à escala mundial.»
(Balão, 2014, p. 137). Acrescenta que esta ciência ajuda a Política a estabelecer
«objetivos e contribui para o método estratégico, nomeadamente na construção de
cenários credíveis e sustentáveis, e a que a prospectiva hoje recorre com frequência.»
(Balão, 2014, p. 137).

Segundo o General Câmara Pina, «… é a doutrina que rege a expansão de um Estado


em confronto com os outros Estados organizados no mundo…» (Pina, 1965/1966, p.
18).

 Geoestratégia

Segundo a definição contida no Dicionário de Relações Internacionais, geoestratégia «É


o estudo das relações entre os problemas estratégicos e os fatores geográficos, à escala
das grandes regiões ou mesmo à escala mundial, procurando deduzir a influência dos
factos geográficos (económicos, demográficos, sociais, etc) nas situações estratégicas,
bem como as possíveis consequências, nesses factos geográficos, da aplicação das
manobras estratégicas e da consecução dos respetivos objetivos. Constitui um método
de interpretação da fenomenologia política vocacionado para a perceção e análise dos
conflitos (expressos ou potenciais) bem como dos comportamentos possíveis nesses
conflitos.» (Sousa & (Coord.), 2014, p. 107).

• Relações Internacionais

O Dicionário de Relações Internacionais refere que o termo “internacional” surgiu nos


finais do século XVIII usado pelo filósofo inglês John Bentham, mas as relações
internacionais entendidas como as relações entre Estados ou nações já eram estudadas
desde a Grécia Antiga. Os autores do Dicionário de Relações Internacionais citam Max

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Gounelle para definir relações internacionais como sendo «as relações e os fluxos
sociais de toda a natureza que atravessam as fronteiras, escapando deste modo ao
domínio de um poder estatal. Segundo o autor, é um critério de localização política que
permite determinar se, em presença de uma dada relação social, ela pertence ou não ao
campo das Relações Internacionais.» (Sousa & (Coord.), 2014, p. 207)

O Professor Adriano Moreira refere que alguns autores definem, do ponto de vista dos
conceitos, a disciplina de relações internacionais como sendo a que se dedica às relações
internacionais. Esta explicação é contrariada por outros autores que consideram não
estarem incluídas as «relações por cima das fronteiras dos Estados, entre grupos
ideológicos ou de interesses que condicionam as relações interestaduais» (Moreira,
2002, p. 38). De forma a reforçar a definição anterior, este autor cita Hoffman, referindo
que «Há quem a defina como a disciplina que estuda os factores e actividades que
afectam a política exterior e o poder das unidades básicas, por exemplo, Estados e
grandes espaços.» (Moreira, 2002, p. 38).

RESUMO HISTÓRICO

O grupo das ilhas Selvagens enquadra-se no mundo insular atlântico, não se verificando
qualquer protagonismo, devido ao facto de não oferecer condições à fixação humana. A
costa é quase inacessível e a água doce potável é escassa ou mesmo inexistente.

As Selvagens terão sido descobertas, oficialmente, por Diogo Gomes em 1438, tendo
sido propriedade privada de diversas famílias portuguesas ao longo dos séculos até
serem adquiridas pelo Estado português em 1971 devido ao interesse que estavam a
suscitar a nível internacional (Graça & (Coord.), 2014, p. 270).

No entanto, as Ilhas Selvagens pertencem a Portugal através do direito de descoberta e


da posse ininterrupta, resultantes da descoberta da Ilha da Madeira pelos navegadores
portugueses no século XV. Desde a colonização da Madeira que as Selvagens, bem
como as Desertas, têm sido, secularmente, incorporadas no governo da Ilha da Madeira
e, atualmente, integradas no distrito administrativo do Funchal (Daehnhardt, Ferreira,
Coutinho, & Vasconcelos, 2014, pp. 16-17).

A constituição geológica destas ilhas é vulcânica e, em alguns locais, o solo permite a


implementação de culturas agrícolas, apesar da escassez de água.

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«Ao contrário do que é por vezes referido, o grupo das Selvagens não foi
reconhecido por João Gonçalves Zarco, mas sim por outros navegadores
ao serviço do Infante D. Henrique, empenhados nas viagens de
exploração da costa africana. Valentim Fernandes, em 1508, refere que
“E he uma ilha pequena e despouada. Ha nesta ilha alguas cabras e
muytas aues do mar. E no te agoa nenhua. Anno de 1438 acharao as
carauellas do Iffate Do Anrique esta ilha (...)”. Diogo Gomes relata o
encontro que fez:

“Em certo dia, vindo eu, Diogo Gomes, pela última vez da Guiné
a Maio das ilhas Canárias e a da Madeira, vi uma ilha e estive
nela, chamada Selvagem...as caravelas do senhor infante
descobriram esta ilha.” (Vieira, 2014, p. 3)

CENÁRIO ATUAL

O território de Portugal compreende algumas pequenas ilhas onde é necessário afirmar a


soberania portuguesa, entre as quais se encontram as chamadas Ilhas Selvagens, que
ficam localizadas entre o Arquipélago das Canárias, pertencente a Espanha, e o
Arquipélago da Madeira, pertencente a Portugal. O facto de as Selvagens se
encontrarem mais próximas das Canárias, poderia levar a supor que se trata de território
espanhol, razão pela qual é ainda mais necessário acentuar uma posição de domínio por
parte de Portugal. A construção de um farol para assistência e apoio à navegação que
circula na zona ou a instalação de uma unidade da Marinha portuguesa ou ainda da
Polícia Marítima poderiam ser atos de reforço da autoridade e soberania portuguesa.

Não será a dimensão das Ilhas Selvagens o fator mais importante, mas sim o seu
potencial estratégico que resulta da possibilidade de prospeção, exploração, conservação
e gestão de todos os recursos naturais vivos e não vivos, que se encontram no fundo do
mar, no seu subsolo ou nas águas subjacentes (Carvalho & Leitão, 2005, p. 269).

Estas ilhas foram a primeira Reserva Natural portuguesas a ser classificada, em 1971 e
em 2007 passaram a fazer parte da Rede ecológica Europeia “Nature 2000”.

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Presentemente, a questão da nacionalidade das Selvagens não parece estar em disputa,
uma vez que o parecer emitido pela Comissão Permanente de Direito Marítimo
Internacional em 1938, que assentava em dois argumentos históricos, o direito de
descobrimento e a posse ininterrupta, não mereceu contestação por parte de Espanha
(Santana, 2016, p. 7).

O que está na origem do diferendo que opõe Portugal e Espanha é a classificação


jurídica destas ilhas. Tal como mencionado anteriormente, Portugal defende que devem
ser classificadas como ilhas enquanto Espanha considera que devem ser classificadas
como rochedos (Santana, 2016, p. 8).

Consideradas como ilhas, as Selvagens passam a beneficiar de diversos espaços


marítimos: «…Zona Económica Exclusiva, a qual compreende o leito e subsolo das
áreas submarinas, que se estende desde os limites exteriores do Mar Territorial até à
distância de 200 milhas marítimas; (…) a Plataforma Continental que compreende o
leito e o subsolo das áreas submarinas que se estendem além do seu Mar Territorial,
em toda a extensão do prolongamento natural do seu território terrestre, até ao bordo
exterior da margem continental, ou até uma distância de 200 milhas marítimas das
linhas de base a partir das quais se mede a largura do Mar Territorial, nos caos em
que o bordo exterior da margem continental não atinja essa distância.» (Graça, n.d., p.
192).

Para os rochedos foi criado um regime jurídico diferenciado do de outras formações


naturais sendo assim classificados como formações naturais que não apresentam
condições que se prestem à habitação ou à vida económica própria. No entanto, esta
classificação presta-se a diferentes interpretações pois alguns autores consideram que
aquelas condições não são cumulativas, mas sim alternativas., que, de acordo com a
letra deste artigo, as formações terrestres não tem de ser habitadas, mas apenas
prestarem-se à habitação (Graça, n.d., p. 193).

Uma das condições considerada necessária para que estes espaço seja habitados ou
habitáveis é a existência de água potável. No entanto, são referidas outras ilhas que só
são habitáveis porque foram criadas condições para tal pelo homem, como é o exemplo
da Gran Canária onde a água doce que abastece a população existente resulta de um
processo de dessalinização da água do mar (Graça, n.d., p. 193).

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Espanha argumenta, referindo que, tanto a ZEE como a plataforma continental deveriam
ser demarcadas segundo critérios de imparcialidade, não reconhecendo às Selvagens o
estatuto de ilhas, mas considerando-as apenas rochedos e, deste modo, impossibilitar a
atribuição de uma ZEE e de uma plataforma continental. De acordo com as autoridades
espanholas, a delimitação daquela zona deveria ser estabelecida tendo em conta a linha
mediana entre a Ilha da Madeira e as Ilhas Canárias (Santana, 2016, p. 9).

«A demarcação da ZEE pretendida por Espanha iria isolar


completamente as Selvagens e os eu mar Territorial, que assim ficariam
inseridas na ZEE espanhola originada pelas Ilhas Canárias.» (Santana,
2016, p. 10).

Sobre os recursos existentes no solo e subsolos martinhos desta zona, pouco se sabe, no
entanto, existem informações que levam a supor existirem hidrocarbonetos tendo em
conta vestígios encontrados nas ilhas próximas e que têm a mesma origem (Graça, n.d.).

Portugal propõe a extensão da sua plataforma continental para além das 200 milhas
marítimas, o que, caso seja aprovado, irá permitir o alargamento da jurisdição marítima
de Portugal para cerca de 4.000.000 Km2. Isto constitui uma oportunidade de conquistar
novos territórios marítimos, de forma pacífica, sobre os quais Portugal irá fazer uso dos
seus direitos de soberania, «transformando o o potencial estratégico da plataforma
continental portuguesa em poder nacional.» (Santana, 2016, p. 14).

Esta extensão da plataforma continental não inclui as Selvagens. A proposta que foi
apresentada por Portugal, nas zonas a sul e a oeste da Ilha da Madeira não incorpora o
prolongamento do território das Selvagens em resultado da sua localização geográfica e
tal resulta simplesmente do prolongamento natural da Ilha da Madeira e do território
continental. Espanha contestou sempre este argumento e apenas em 2015 retirou as
objeções que tinham colocado à proposta de extensão da plataforma continental
portuguesa. (Santana, 2016, p. 14).

Por outro lado, se as pretensões espanholas foram consideradas e as Selvagens forem


classificadas como rochedos, o resultado será a criação de uma “bolha” de águas
territoriais portuguesas à volta deste subarquipélago o que traria vantagens enormes
para Espanha que veria a área da sua ZEE alargada gerada pelas Ilhas Canárias (Reis,
2016, p. s.n.)

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Em dezembro de 2014, a Espanha tinha apresentado na ONU uma proposta de
alargamento da sua Plataforma Continental, que colide com a de Portugal, reclamando a
jurisdição sobre uma área marítima e respetivo subsolo ao largo das Selvagens. Em
2015 recua na sua posição e permite a expansão do mar português.

«A pretensão territorial de Espanha relativamente às ilhas Selvagens é


oficialmente datada de 1911, ano em que foi enviada uma nota
diplomática espanhola a Portugal precisamente nesse sentido. Espanha,
na mesma, considera que as Selvagens fazem parte do arquipélago das
Canárias. Portugal, refutando tal tese, e também em documento oficial,
informou a Espanha da sua soberania sobre as ilhas.

A importância das Ilhas Selvagens é grande para os dois países ibéricos


em sede de qualificação jurídica internacional do arquipélago, da
delimitação dos espaços marinhos de soberania económica,
particularmente a questão da actual Zona Económica Exclusiva de 200
milhas e das riquezas existentes nas referidas águas. Mas, também, ao
longo da história, em questões de defesa militar, dos compromissos da
NATO, entre outros.» (Graça, n.d.).

Esta é uma matéria relativamente à qual não foi encontrada, até ao momento, uma
solução uma vez que, por causa das Selvagens, persistem problemas de harmonização
de Direito Internacional relativamente à ZEE de Portugal e à ZEE de Espanha.

Apesar de todas as vantagens, para Portugal, já mencionadas anteriormente, importa


referir uma questão, também ela de grande importância nacional. Trata-se de assegurar a
vigilância e proteção de uma área marítima com uma extensão tão grande.

Portugal é um país de pequenas dimensões, cujo estado da economia e finanças não


permite o investimento necessário em meios, humanos e materiais, para efetuar uma
vigilância marinha conveniente. A ZEE portuguesa é atravessada, diariamente, por um
número elevado de navios mercantes, com origem e destino no Norte da Europa, o que
atribui a Portugal uma elevada responsabilidade na segurança, prevenção e combate à
poluição marítima.

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TEIA MÓRFICA

CNUDM
SELVAGENS

PORTUGAL ESPANHA

ROCHEDOS
AUMENTO PLAT. MAR. CONT.
PORTUGUESA
ILHAS

SEM ZEE
ALARGAMENTO ZEE EXPLORAÇÃO DE PRÓPRIA
ZEE DE 200 MILHAS
PORTUGAL A SUL RECURSOS

ALARGAMENTO DA ZEE
DAS CANÁRIAS
ENGLOBA ESTA ZONA

DELIMITAÇÃO DOS ESPAÇOS


MARÍTIMOS DE SOBERANIA
ECONÓMICA

ANÁLISE SISTÉMICA

 Contextualização

Nesta disputa, político-diplomática, que separa Portugal e Espanha relativamente à


classificação que deverá ser atribuída às Selvagens, ilhas ou rochedos, verificam-se
diversos aspetos a ter em consideração.

Como mencionado anteriormente, Portugal defende a atribuição da classificação de


ilhas às Selvagens o que lhes permite atribuir uma ZEE de 200 milhas marítimas com
vantagens evidentes na pretensão portuguesa de alargamento da plataforma continental.

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Portugal poderá passar a ter uma área de jurisdição marítima com cerca de 4.000.000
Km2. Este alargamento irá possibilitar a exploração de eventuais recursos marinhos
vivos e não vivos no solo e subsolo marítimos que ainda permanecem por conhecer,
pelo menos no domínio público.

As questões relacionadas com a exploração de recursos e o reconhecimento da sua


jurisdição, caem no âmbito da CNUDM que tem permanecido atenta às reivindicações
apresentadas por ambos os Estados. Mas a grande questão que divide estes dois países
é, conforme mencionado anteriormente, a possibilidade de as Selvagens poderem ser, ou
não, classificadas como ilhas, ou um conjunto de ilhas. Caso assim aconteça, poderão
vir a gerar uma ZEE portuguesa de consideráveis dimensões e consequentes vantagens
económicas (Graça & (Coord.), 2014, p. 271).

No lado oposto encontra-se a Espanha cuja pretensão é a de que as Selvagens sejam


classificadas como rochedos (ou ilhéus) de que resultaria a criação de uma “bolha” de
águas territoriais portuguesas em volta deste sub-arquipélago. Daqui resultaria ainda o
alargamento da ZEE espanhola, gerada pelas Ilhas Canárias., o que permitiria uma
expansão marítima de Espanha decorrente da delimitação dos mares territoriais, do
estabelecimento de uma ZEE ou da extensão da sua plataforma continental, em qualquer
caso, mais limitada que no caso de Portugal (Graça & (Coord.), 2014, p. 271).

«Estará, pois, em causa, uma sorte de jogo de soma nula, o que


explicará quer o impasse de definição de jurisdições, quer a virulência
com que, nos últimos anos, têm ocorrido alguns incidentes.» (Graça &
(Coord.), 2014, p. 271).

 Caraterização dos Agentes

Neste diferendo estão presentes apenas dois intervenientes: Portugal e Espanha.

Apesar das tensões existentes em torno deste diferendo, nunca esteve iminente um
conflito sério entre ambos que implique a necessidade de Portugal recorrer às armas
para fazer prevalecer a sua soberania sobre esta parte do seu território. Ambos os países
são membros da União Europeia e da NATO e verifica-se a existência de boas relações
a nível político, económico, militar, social, cultural e diplomático. Apesar disto,

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verifica-se um desequilíbrio crescente ao nível do poder militar existente nestes países,
favorável a Espanha.

«Portugal, como país detentor de vários tipos de jurisdições sobre vastas


massas oceânicas, é simultaneamente uma “superpotência” e objeto de
cobiça, sobretudo pelas potências mais próximas, como Espanha.» (Reis,
2016, p. n.d.)

Espanha nunca disputou a propriedade ou soberania das Selvagens pois o que considera
estar em causa são interesses de ordem jurisdicional marítima e de ordem
geoeconómica. Assim, tem vindo a adotar diversas atitudes, entre as quais algumas
manobras com características ofensivas com o, provável, objetivo de testar as
capacidades de reação das autoridades portuguesas e, ao mesmo tempo, demonstrar as
suas próprias capacidades de vigilância e avaliação da situação existente nas Selvagens
(Reis, 2016, p. n.d.).

OBJETIVOS ESTRATÉGICOS

Em 1929, o Vice-Almirante Gago Coutinho, num relatório enviado ao governo central,


alertava para a tentativa espanhola de se apoderar das Ilhas Selvagens. Nesse
manuscrito, Gago Coutinho referia as constantes visitas de pescadores espanhóis
provenientes da Ilha de Lanzarote, nas Canárias, que desembarcavam nestas ilhas
portuguesas como se de território espanhol se tratasse. Neste relatório, Gago Coutinho
refere ainda que em 1911 Espanha comunicou a Portugal a intenção de montar um farol
nas Selvagens. Em consequência deste relatório, que Gago Coutinho classificou como
“Muito Reservado”, Portugal decidiu instalar nas Ilhas Selvagens.

«A maior proximidade geográficas das Ilhas Selvagens com as Ilhas


Canárias do que com a Ilha da Madeira suscitou no passado algumas
dúvidas por parte de Espanha quanto à titularidade da soberania sobre
este arquipélago.» (Santana, 2016, p. 14).

Isto serve para reforçar o facto de que a disputa luso-espanhola pelas Selvagens já tem
um extenso caminho percorrido. Ao longo deste trabalho, foi referido que Espanha não
pretende tomar posse ou exercer qualquer tipo de autoridade ou de soberania sobre as
Selvagens pois pretende, simplesmente, que sejam classificadas juridicamente como

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rochedos ou ilhéus para, deste modo, recolher benefícios resultantes da extensão da sua
ZEE gerada pelas Ilhas Canárias. Uma das justificações para esta tomada de posição
espanhola prende-se com o facto de se presumir a existência, no solo e subsolo
marinhos desta zona, de recursos energéticos importantes.

Para além deste, um outro objetivo de Espanha, para ganhar vantagem estratégica, é «a
elevação do país a potência predominante no sector Sul do Atlântico Norte.» para o
qual deverá ser importante a opção adicional de compra de três submarinos pela
Marinha espanhola ou o desenvolvimento de um sistema de monitorização por satélite
que permitirá efetuar vigilância numa zona compreendida entre Portugal e a Guiné-
Bissau (Reis, 2016, p. n.d.).

Assim, a tomada de decisão por parte de Espanha deverá ser no sentido de adotar um
ataque à capacidade de Portugal exercer plenamente a soberania nas suas águas
territoriais sem recorrer à capacidade militar (Reis, 2016, p. n.d.).

Do lado oposto encontra-se Portugal que continua a defender que as Selvagens devem
ser classificadas como Ilhas. No caso de a decisão ser favorável a Portugal, isto
implicaria a criação de uma ZEE de 200 milhas marítimas gerada por estas ilhas.

Relativamente à tomada de decisão de Portugal, a modalidade de ação estratégica


deverá ser no sentido de reforçar as capacidades de vigilância e segurança próprias. A
investigação científica e o desenvolvimento tecnológico, que possibilitem o
conhecimento, o acesso e a exploração de recursos existentes, poderão ser um
contributo importante no reforço da posse útil das águas jurisdicionais ao largo das
Selvagens, evitando, deste modo, atividades predatórias de recursos por parte de
Espanha (Reis, 2016, p. n.d.).

Recentemente e tal como noticiado em diversos orgãos de comunicação social, a


Autoridade Marítima Nacional deverá instalar, em agosto de 2016, na Selvagem Grande
uma extensão permanente, funcionando 365 dias por amo e 24 horas por dia, cujo
objetivo é o de demonstrar as condições favoráveis de habitabilidade das ilhas, as
potencialidades de desenvolvimento de atividades económicas e reforçar a autoridade
do Estado português exercendo os direitos de soberania.

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CONCLUSÕES

Considerando as leituras exploratórias efetuadas na sequência da pesquisa de


informação que foi realizada par a elaboração deste trabalho, é possível chegar à
conclusão que as Selvagens têm uma importância geoestratégica elevada,
desempenhando um papel fundamental nos interesses económicos e políticos de dois
Estados; Portugal e Espanha.

O fator determinante desta disputa é a classificação jurídica que venha a ser atribuída às
Selvagens, ilhas ou rochedos/ilhéus. O resultado final poderá implicar grandes
alterações na estabilidade luso-espanhola a vários níveis: políticos, económicos,
diplomáticos, etc.

No entanto, a resolução concertada desta disputa não deverá estar para breve, prevendo-
se que este problema tenha de ser submetido à apreciação do Tribunal Internacional do
Direito do Mar, do Tribunal Internacional de Justiça ou dos Tribunais arbitrais, de
acordo com os termos da ratificação da CNUDM, por parte de Portugal. Isto poderá
acontecer em resultado do parecer da Comissão de Limites da Plataforma Continental
(CLPC), das Nações Unidas, sobre a proposta portuguesa de alargamento da Plataforma
continental, estimando-se que possa ocorrer ainda este ano ou apenas em 2017 (Santana,
2016, p. 15).

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BIBLIOGRAFIA

Recomendada:

 Sun Tzu’s Art of War (孫子兵法), In: The Seven Military Classics of Ancient
China,
 Sawyer, Ralph D., 1993, Basic Books (145-186).
 T’ai Kung’s Six Secret Teachings (太公六韜), In: The Seven Military Classics
of Ancient China, Sawyer, Ralph D., 1993, Basic Books (19-105).
 A Arte da Guerra, Maquiavel (Dell'arte della guerra), N., 2010, Edições Sílabo.
 A Systems Theoretical Formal Logic for Category Theory, Gonçalves, C.P. and
Madeira, M.O., 2009, SSRN WPS
http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1396841.
 Contributos para os fundamentos categoriais da matemática do risco, Gonçalves,
C.P., 2010, Tese de Doutoramento, ISCTE-IUL. https://repositorio.iscte-
iul.pt/bitstream/10071/2842/1/TeseCPG.pdf.
 Risk Governance - A Framework for Risk Science-Based Decision Support
Systems, Gonçalves, C.P., 2012, SSRN WPS
http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2085482.
 As Quatro Fases da Cibernética e a Ciência da Tomada de Decisão, Gonçalves,
C.P., 2013, Working Paper
http://www.academia.edu/4820997/As_Quatro_Fases_da_Cibernetica_e_a_Cien
cia_da_Tomada_de_Decisao
 Ciência Geral do Risco e Ciência dos Sistemas – Risco, Sistema e
Sustentabilidade, Gonçalves, C.P., 2013, Working Paper
http://www.academia.edu/5011205/Ciencia_Geral_do_Risco_e_Ciencia
_dos_Sistemas_-_Risco_Sistema_e_Sustentabilidade

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Outras obras consultadas:

 (Coord.), M. C. (2014). Fiscalização do Espaço Marítimo: O Sistema da


Autoridade Marítima. 20 Anos da Entradfa em Vigor da CNUDM: Portugal e os
Recentes Desenvolvimentos no Direito do Mar (p. José Manoel Silva Carreira).
Porto: CIMAR; Faculdade de Direito da Universidade do Porto.

 Balão, S. M. (2014). Globalização, Geopolítica do MAr Português e o Ártico.


Perspectivas para o Século XXI. In C. M. Dias, J. S. Paulo, J. M. Sequeira, S. M.
Balão, & J. L. Leal, Geopolítica e o Mar (pp. 133-216). Lisboa: MGI (Portugal),
Lda.

 Beaufre, A. (2004). Introdução à Estratégia. Lisboa: Edições Sílabo, Lda.

 Carvalho, L., & Leitão, N. (2005). A noção "estratégica" das Ilhas Selvagens.
Lisboa: n. d.

 Cunha, T. P., & Antunes, N. M. (n.d. de n.d. de 2004). Portugal e os Oceanso:


importância estratégica e definição espacial. Janus on-LIne, pp. 2-7.

 Daehnhardt, R., Ferreira, J. J., Coutinho, A. G., & Vasconcelos, E. (2014). As


Nossas Ilhas Selvagens Disputadas no Jogo Geoestratégico. Portimão: Projecto
Apeiron, Lda.

 Graça, P. B. (12 de Maio de 2015). Estudos Estratégicos do Atlântico: A


Experiência de um Projecto Mulridisciplinar. Obtido de Academia.edu:
www.academia.edu

 Graça, P. B., & (Coord.), T. M. (2014). O Mar no Futuro de Portugal - Ciência


e Visão Estratégiuca. Lisboa: Centro de Estudos Estratégicos do Atlântico.

 Graça, P. Q. (n.d.). As Noções de Ilha e de Rochedo - Da Fundamentação


Doutyrinária no Quadro da Convenção de MOntego Bau«y ao seu Papel no
Âmbito do Desenvolvimento da Economia Mundial. I Congresso online sobre
Los MOdelos Latinoamericanos de Desarrollo (pp. 186-202). n.d.: n.d.

 Lara, A. d. (2015). Ciência Política - Estudo da Ordem e da Subversão - 8ª


Edição. Lisboa: ISCSP - Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas.

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 Moreira, A. (2002). Teoria das Relações Internacionais - 4ª Edição. Livraria
Almedina: Coimbra.

 Pina, L. M. (1965/1966). Ideia Geral do Valor Estratégico do Conjunto Guiná-


Cabo Verrde e da Ilha de São Tomé. LIsboa: Instituto Superior de Ciências
Sociais e Política Ultramarina.

 Reis, S. M. (28 de Junho de 2016). As Ilhas Selvagens: Manobras Espanholas,


Ameaças e Oportunidades. Lisboa, Lisboa, Portugal.

 Ribeiro, A. S. (2010). Teoria Geral da Estratégia. Coimbra: edições Almedina,


S.A.

 Santana, J. (Março de 2016). A importância das Ilhas Selvagens. IDN Brief, pp.
1-18.

 Sousa, F. d., & (Coord.), P. M. (2014). Dicionário de Relações Internacionais.


Porto: Edições Afrontamento/CEPESE - Centro de Estudos da População,
Economia e Sociedade.

 Vieira, A. (2014). O ARQUIPÉLAGO DAS SELVAGENS. UM MUNDO DE


ILHAS PORTUGUESAS COM HISTÓRIA. Lisboa: Anuário de Estudos
Atlânticos, Nº 61. Obtido de Anuário de Estudos Atlânticos, Nº 61.

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