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AUTARQUIA DO ENSINO SUPERIOR DE GARANHUNS (AESGA)

FACULDADES INTEGRADAS DE GARANHUNS (FACIGA)


CURSO DE BACHARELADO EM DIREITO

RAFAEL ELIAS DE MENEZES

LIBERDADE DE IMPRENSA E DIREITOS FUNDAMENTAIS:


A ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO COMO CENSOR DA IMPRENSA

GARANHUNS
2019
RAFAEL ELIAS DE MENEZES

LIBERDADE DE IMPRENSA E DIREITOS FUNDAMENTAIS:


A ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO COMO CENSOR DA IMPRENSA

Monografia entregue à Autarquia do


Ensino Superior de Garanhuns (AESGA),
como pré-requisito para a conclusão do
curso de Bacharelado em Direito, das
Faculdades Integradas de Garanhuns
(FACIGA).

Orientador: Prof. Esp. Erick Ramos Castro


de Souza

GARANHUNS
2019
RAFAEL ELIAS DE MENEZES

LIBERDADE DE IMPRENSA E DIREITOS FUNDAMENTAIS:


A ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO COMO CENSOR DA IMPRENSA

BANCA EXAMINADORA

Monografia entregue à Autarquia do Ensino Superior de Garanhuns (AESGA),


como pré-requisito para a conclusão do curso de Bacharelado em Direito, das
Faculdades Integradas de Garanhuns (FACIGA).

Aluno aprovado em _____ de _____ de 20____.

Prof. Orientador Esp. Erick Ramos Castro de Souza

Prof.ª Examinadora PhD Bruna Maria Jacques Freire de Albuquerque

Prof.ª Examinadora Ms. Maria Izabel Pereira de Souza Correia


À minha família, especialmente, aos meus
queridos pais, Evaneide e Reginaldo, por
serem minha fonte de inspiração, do início
até aqui.
AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, ao meu bom Deus, por ter me sustentado até aqui e
ter feito grandes coisas em minha vida. Aquele que começou a boa obra é fiel para
completá-la.
À toda minha família, especialmente os meus pais, meu muito obrigado, por
todo amor, esforço e dedicação tido na minha criação, e que me fizeram ser a pessoa
que sou hoje. Sem esquecer-se das minhas irmãs, Rayanne e Raynnara, que também
fizeram parte de todo processo de minha formação pessoal e acadêmica-profissional.
Agradeço enormemente ao professor Erick Ramos, por toda orientação,
ensinamentos e interlocução tida durante a elaboração do presente trabalho, além das
valiosas aulas ministradas durante o curso.
Aos demais professores da instituição que fizeram parte deste processo de
conhecimento e aprendizagem durante esses cinco anos de percurso acadêmico e
aos meus amigos e colegas de curso, pela amizade e companheirismo durante todos
estes anos.
Agradeço, ainda, aos meus amigos pessoais, Rubem e sua esposa Alaine, por
terem sido fundamentais na minha formação, certamente, seus conselhos e apoio
foram de fundamental importância para que esse momento chegasse.
E a todos os demais amigos que, direta ou indiretamente, contribuíram de
alguma forma para minha formação, minha sincera gratidão. Sem vocês esse sonho
não seria possível.
LISTA DE ABREVIATURAS E/OU DE SIGLAS

ABI Associação Brasileira de Imprensa

ABRAJI Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo

ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade

ADPF Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental

AGU Advocacia-Geral da União

CF/88 Constituição Federal de 1988

EC Emenda Constitucional

FENAJ Federação Nacional dos Jornalistas

PGR Procuradoria-Geral da República

PUC-RIO Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

RSF Repórteres Sem Fronteiras

STF Supremo Tribunal Federal

STJ Superior Tribunal de Justiça


RESUMO

O presente trabalho aborda por tema a liberdade de imprensa em conflitos


com outros direitos fundamentais – dando-se ênfase aos direitos da personalidade -,
mais especificamente, a atuação do Poder Judiciário como instrumento de censura à
imprensa, quando a legítima e necessária livre atuação dos meios de comunicação
conflita com os direitos da personalidade das pessoas retratadas em matérias
jornalísticas e reportagens, principalmente em se tratando de autoridades públicas
e/ou políticos. Nesta perspectiva, a pesquisa foi norteada pela seguinte problemática:
De que forma, o Poder Judiciário excede os limites da sua função constitucional, para
acabar atuando como instrumento de censura da imprensa? O objetivo geral é
analisar criticamente a atuação do Judiciário brasileiro quando submetido à resolução
de conflitos entre a imprensa e pessoas ou agentes públicos e/ou políticos, decorrente
de uma suposta violação, por parte daquela, aos direitos fundamentais relacionados
à personalidade (honra, imagem, intimidade, vida privada etc), destes. No percurso
metodológico, utilizou-se, no trabalho, uma abordagem qualitativa, com método de
abordagem dedutivo, e, quanto aos fins, valeu-se do método
exploratório, cujo a técnica de coleta de dados foi a pesquisa bibliográfica. Como
principal resultado, chega-se a conclusão de que o Poder Judiciário deve ser mais
criterioso e sensível na análise destes conflitos, utilizando-se da técnica da
ponderação com racionalidade e sensatez, para somente optar por restringir a
liberdade de expressão/imprensa em casos excepcionais, que, dada as circunstâncias
e peculiaridades do caso concreto, sejam plenamente justificáveis as limitações
impostas. Deve-se buscar evitar, sempre que possível, o argumento de que a
liberdade de imprensa não pode servir de salvaguarda para violações de direitos da
personalidade dos retratados em matérias, para, com isso, praticar verdadeiros atos
de censura judicial.

Palavras-chave: Direito Constitucional. Direitos Fundamentais. Liberdade de


Imprensa. Atuação do Poder Judiciário. Censura Judicial.
SUMÁRIO

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS........................................................................ 9
2 NOÇÕES GERAIS ACERCA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS............... 11
2.1 Conceitos e características dos direitos fundamentais.......................... 11
2.2 Evolução histórica e dimensões dos direitos fundamentais.................. 14
2.3 A titularidade dos direitos fundamentais.................................................. 18
2.4 Destinatários dos direitos fundamentais e os tipos de eficácia............. 20
2.5 Resolução de conflitos entre direitos fundamentais............................... 23
2.6 Limites aos direitos fundamentais e a teoria dos limites dos limites.... 25
3 O DIREITO FUNDAMENTAL À LIBERDADE DE EXPRESSÃO NA CF/88 27
3.1 As diversas modalidades da liberdade de expressão............................. 27
3.1.1 Liberdade de manifestação de pensamento e/ou opinião............................. 28
3.1.2 Liberdade de expressão artística.................................................................. 28
3.1.3 Liberdade de ensino e pesquisa.................................................................... 29
3.1.4 Liberdade de comunicação e informação ou liberdade de imprensa............ 30
3.1.5 Liberdade de expressão religiosa.................................................................. 32
3.2 A evolução constitucional e legal do direito à liberdade de expressão 33
3.3 Amplitude da proteção atual dada a liberdade de expressão no Brasil 36
3.4 Da vedação ao anonimato e do direito de resposta................................. 38
3.5 Da vedação à censura e o controle do abuso da liberdade de
expressão..................................................................................................... 41
4 O PODER JUDICIÁRIO COMO CENSOR DA IMPRENSA........................... 43
4.1 Uma análise da liberdade de imprensa no atual cenário sociopolítico
brasileiro...................................................................................................... 43
4.2 A importância da liberdade de imprensa em um Estado Democrático
de Direito...................................................................................................... 46
4.3 O direito à crítica jornalística..................................................................... 48
4.4 As técnicas e cuidados do jornalismo profissional na elaboração de
uma matéria ou notícia............................................................................... 49
4.5 A atuação censória do Poder Judiciário com a desarrazoada
utilização da técnica da ponderação........................................................ 53
5 METODOLOGIA........................................................................................... 58
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................... 60
REFERÊNCIAS ............................................................................................ 62
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1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O presente trabalho aborda por tema a liberdade de imprensa em conflitos com


outros direitos fundamentais – dando-se ênfase aos direitos da personalidade, a
exemplo da honra, da imagem, da privacidade etc -, mais especificamente, a atuação
do poder judiciário como instrumento de censura à imprensa, quando a legítima e
necessária livre atuação dos meios de comunicação conflita com os direitos da
personalidade das pessoas retratadas em matérias jornalísticas e reportagens,
principalmente em se tratando de autoridades públicas e/ou políticos.
Por isso, o problema de pesquisa gira em torno da pergunta: De que forma, o
Poder Judiciário excede os limites da sua função constitucional, para acabar atuando
como instrumento de censura da imprensa?
Justifica-se por ser um tema relevante e de bastante evidência nos tempos
atuais, considerando o atual cenário sociopolítico, principalmente por haver recentes
e constantes decisões judiciais, inclusive do Supremo Tribunal Federal, que
impuseram ordens preventivas de não divulgação de uma notícia ou reportagem, ou
da retirada de circulação dela, após a sua divulgação, por supostamente violar os
direitos da personalidade (a honra, a imagem, a privacidade etc) dos citados ou
retratados nas referidas matérias jornalísticas. Uma análise mais crítica desses
desvirtuamentos da tutela jurisdicional mostra-se necessária para discutir os limites
da atuação do Poder Judiciário, quando se trata de liberdade de expressão e imprensa
em conflitos com outros direitos fundamentais.
Assim, o trabalho tem por objetivo geral analisar criticamente a atuação do
Judiciário brasileiro quando submetido à resolução de conflitos entre a imprensa e
pessoas ou agentes públicos e/ou políticos, decorrente de uma suposta violação, por
parte daquela, aos direitos fundamentais relacionados à personalidade (honra,
imagem, intimidade, vida privada etc), destes.
Os objetivos específicos são desenvolver uma noção básica acerca de teoria
geral dos direitos fundamentais; apresentar as diversas modalidades do direito à
liberdade de expressão no ordenamento jurídico-constitucional brasileiro; explorar o
exercício da liberdade de imprensa no atual cenário sociopolítico brasileiro; discutir a
atuação do poder judiciário brasileiro, quando submetido à resolução de possíveis
conflitos entre o exercício livre da imprensa e direitos fundamentais dos retratados ou
10

citados em notícias, matérias ou reportagens jornalísticas; por fim, criticar os


desvirtuamentos ou utilização desarrazoada da técnica da ponderação, nestes
aparentes conflitos, que acabam impondo uma verdadeira espécie de censura velada
contra a imprensa.
Para atingir os objetivos propostos, utilizou-se na pesquisa uma abordagem
qualitativa, com método de abordagem dedutivo, e, quanto aos fins, valeu-se do
método exploratório, cujo a técnica de coleta de dados foi a pesquisa bibliográfica.
O trabalho se desenvolverá, de início, apresentando algumas noções gerais
acerca da teoria dos direitos fundamentais, relacionando conceitos e apresentando
aspectos fundamentais para o desenvolvimento do tema e melhor compreensão do
assunto que será aprofundado adiante.
Logo após, apresentar-se-á o direito fundamental à liberdade de expressão (em
sentido amplo) e suas diversas modalidades no ordenamento brasileiro,
demonstrando-se a evolução e a proteção legal e constitucional dada a esse direito
no Brasil.
Mais à frente, se fará uma análise da liberdade de imprensa no atual cenário
sociopolítico brasileiro, trazendo informações importantes sobre o exercício da
profissão jornalística, para, por fim, aprofundar-se no tema propriamente dito, qual
seja, a atuação do poder judiciário como censor da imprensa, quando submetido à
análise de conflitos entre a liberdade de expressão/imprensa e direitos fundamentais
relacionados à personalidade.
No capítulo de metodologia, serão apresentadas as técnicas e métodos
utilizados no presente trabalho, trazendo os conceitos de cada um, sob o ponto de
vista de diferentes autores de metodologia científica, bem como explicando como
essas técnicas metodológicas auxiliaram na elaboração da pesquisa e do trabalho.
Finalmente, nas considerações finais, será exposto a conclusão que se tirou de
toda pesquisa e análise feita no presente trabalho, fazendo-se uma crítica à atuação
censória do Poder Judiciário à imprensa, que acaba definindo o que pode (ou não)
circular como notícia ou informação na sociedade, afetando a liberdades individuais
e, consequentemente, a própria noção de democracia.
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2 NOÇÕES GERAIS ACERCA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Neste primeiro momento, será apresentada uma noção básica acerca de teoria
geral dos direitos fundamentais, onde serão estudados os conceitos e os principais
aspectos relacionados aos direitos fundamentais, para que o desenvolvimento do
tema, que será aprofundada nos próximos capítulos, torne-se de melhor compreensão
e absorção.
Sendo assim, o trabalho iniciará expondo os conceitos doutrinários e as
classificações dos direitos e garantias fundamentais, e, em seguida, adentrará em
uma evolução histórica, explicando as chamadas “gerações” ou “dimensões” dos
direitos fundamentais.
Posteriormente, serão estudados os titulares e os destinatários destes direitos,
isto é, os sujeitos ativos, que são detentores dos direitos fundamentais, e os sujeitos
passivos, que devem observância e respeito aos mencionados direitos (eficácia
vertical e horizontal e diagonal dos direitos fundamentais).
O capítulo prosseguirá tratando acerca dos métodos de resolução de conflitos
ou colisões entre os direitos fundamentais, onde será esmiuçada a técnica da
ponderação de princípios, que utiliza a proporcionalidade e razoabilidade como
parâmetros para a busca do equilíbrio quando houver conflitos entre dois ou mais
direitos fundamentais.
Por fim, serão vistos os limites ou restrições para o exercício de direitos
fundamentais, bem como apreciada a “teoria dos limites dos limites”.

2.1 Conceitos e características dos direitos fundamentais

O movimento do constitucionalismo moderno, iniciado na Inglaterra, no século


XVII, com a Revolução Gloriosa, mas moldado, sobretudo, por teóricos e
revolucionários franceses e americanos, no século seguinte, trouxe consigo objetivos
que, indubitavelmente, constituíram uma nova ordem sem precedentes na história
da humanidade, formando aquilo que denominou-se “conceito ocidental de
Constituição”.
Nessa linha, conforme ensina Fernandes (2017), o constitucionalismo
moderno, traduz a ideia de que uma Constituição essencialmente material é aquela
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que tem como objetivo: 1) limitar o poder com a necessária organização e


estruturação do Estado (separação dos poderes e definição do
funcionamento organizacional do Estado); 2) a consecução (com o devido
reconhecimento) de direitos e garantias fundamentais (que num primeiro momento,
era limitado somente à ideia de igualdade, liberdade e propriedade de todos, mas,
posteriormente, foi ampliado para abranger outros direitos, como os sociais, políticos,
da nacionalidade etc).
Assim, percebe-se que, desde os primórdios da era do constitucionalismo
moderno, a busca pelo reconhecimento e realização de direitos e garantias
fundamentais do homem, consiste em um dos objetivos principais a ser alcançado nas
Constituições dos Estados.
Tanto o é assim, que o mesmo autor, ao explicar as novas constituições
formalizadas (formais) em um documento escrito, diz que Constituição passa a ser
entendida como “a ordenação sistemática e racional da comunidade política plasmada
em um documento escrito, no qual se fixam os limites do poder político e declaram-se
direitos e liberdades fundamentais” (FERNANDES, 2017, p. 34).
Nessa linha, qualquer Constituição moderna, que se diga democrática, há de
prever, em seu texto, as limitações ao poder do Estado com a sua respectiva
organização e estruturação, bem como os direitos e garantias fundamentais dos
indivíduos. Essas seriam as normas basilares que fazem parte da Constituição
material (ou real) do Estado e da sociedade.
Conforme ensinam Dimoulis e Martins (2008), Constituição vai exercer o papel
de regulador da relação entre o Estado e os indivíduos, declarando e garantindo
determinados direitos fundamentais, além de permitir ao indivíduo conhecer sua
esfera de atuação livre de ingerências estatais, ao mesmo tempo em que vincula o
Estado à determinadas normas que impedem o cerceamento injustificado das esferas
garantidas da liberdade individual.
Assim, é inegável a relação que existe entre o avanço do movimento
constitucionalista e a afirmação dos direitos fundamentais, visto que o reconhecimento
e a proteção destes direitos estão na essência das Constituições democráticas
modernas.
Mas o que seriam estes direitos fundamentais, que toda Constituição
democrática moderna, há de privilegiar?
Pois bem! Definir o que seja direitos fundamentais não é tarefa fácil, todavia, a
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doutrina traz algumas conceituações, como, por exemplo, Bulos (2015, p. 526), que
define:

Direitos fundamentais são o conjunto de normas, princípios, prerrogativas,


deveres e institutos, inerentes à soberania popular, que garantem a
convivência pacífica, digna, livre e igualitária, independentemente de credo,
raça, origem, cor, condição econômica ou status social.

Fica claro que estes direitos, como a própria nomenclatura sugere, são
considerados essenciais e inerentes à própria condição humana, e seu
reconhecimento, nas ordens jurídicas dos Estados, é condição primordial para o
aperfeiçoamento da pessoa humana e o desenvolvimento das civilizações, estando
estes direitos intimamente relacionados com os chamados direitos humanos – numa
perspectiva de direito internacional -, havendo, inclusive, uma comunicação mútua e
recíproca entre estes e aqueles.
Nos dizeres de Dimoulis e Martins (2008), os direitos fundamentais tratam-se
direitos público-subjetivos de pessoas (físicas ou jurídicas), previstos em dispositivos
constitucionais, que têm como finalidade limitar o exercício do poder estatal em face
da liberdade individual.
Desta maneira, pode-se afirmar que os direitos fundamentais surgiram
justamente como uma forma de impor limites e restrições ao Estado sob os indivíduos,
no período pós-absolutismo, de forma a conceder aos cidadãos mais liberdade sobre
suas ações e, principalmente, sobre a propriedade privada, exigindo do Estado uma
conduta mais abstencionista (negativa), no sentido de não interferir na liberdade
individual do cidadão.
Posteriormente, foram se incorporando ao catálogo de direitos fundamentais,
não apenas direitos relacionados à liberdade individual, mas também direitos coletivos
e transindividuais ou difusos, podendo ser chamados de direitos sociais.
Por isso, diz-se que a fundamentalidade material do direito fundamental está
essencialmente ligada à noção de dignidade da pessoa humana
(MENDES; BRANCO, 2017). Esse critério aferidor justifica a existência de garantias
básicas aos indivíduos, como, por exemplo, a liberdade de expressão, o direito ao
voto, o devido processo legal, que, inclusive, acabam por influenciar na própria
formação e fundamentação de um Estado Democrático de Direito que respeite a
condição humana e garanta aos indivíduos suas liberdades públicas.
Quanto às características dos direitos fundamentais, assim como definir uma
14

conceituação é tarefa difícil, também é atividade complexa fixar características que


sejam válidas em todo lugar e que sejam consenso entre a doutrina.
Não obstante, é possível indicar algumas características que lhe são
associadas com mais frequência. Na linha do indicado por Bulos (2015), além de
fundamentais, os direitos e garantias previstos na Constituição são: 1) históricos:
pois são fruto de uma evolução histórica; 2) universais: pois transcendem aos limites
territoriais de um lugar específico, para beneficiar, de modo indistinto, todos os
indivíduos; 3) cumuláveis (ou concorrentes): um direito não anula outro, portanto
podem ser exercidos simultaneamente; 4) irrenunciáveis: podem deixar de ser
exercidos, mas nunca renunciados; 5) inalienáveis: são indisponíveis, portanto, são
inegociáveis, intransferíveis, já que seu titular não pode se despojar deles; 6)
imprescritíveis: não se exaurem com a inutilização do direito, nem com o passar do
tempo, assim, são exigíveis a qualquer momento; 7) relativos (ou limitados): o que
significa dizer que nem todo direito ou garantia fundamental, pode ser exercido de
modo absoluto e irrestrito, salvo algumas exceções.
Fernandes (2017) complementa ainda com as seguintes características: 8)
inviolabilidade: que significa dizer os preceitos fundamentais são de observância
obrigatória, não podendo ser violados nem por atos do Poder Público, nem
por particulares; 9) efetividade: teoricamente, o Poder Público, em suas ações, deve
sempre buscar o cumprimento dos direitos fundamentais; 10) interdependência: os
direitos fundamentais devem ser vistos como um todo (bloco) que
apresenta interpenetrabilidade e coligações, e não como elementos isolados.
A doutrina faz ainda uma diferenciação entre direitos e garantias fundamentais,
no sentido que os direitos seriam disposições declaratórias (direito à vida, direito à
liberdade, direito à propriedade etc), enquanto as garantias seriam disposições
assecuratórias (instrumentos para a defesa, fruição ou realização dos direitos)
(SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2018).
Os direitos e as garantias fundamentais, todavia, são intimamente interligados
e interdependentes entre si, de modo que um encontra completude em outro, e, todos,
formam uma unidade complexa de proteção no arcabouço jurídico constitucional.

2.2 Evolução histórica e dimensões dos direitos fundamentais

Os direitos fundamentais sofreram, ao longo do tempo, várias evoluções e,


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desta forma, foi-se ampliando seu catálogo para abranger direitos que antes não eram
reconhecidos como tais.
Baseado nessa evolução histórica, Bonavides (2004) traz uma classificação
que separa didaticamente os direitos fundamentais em “gerações”, ou
“dimensões”, como preferem denominar outros autores, nas quais os direitos
fundamentais passam por uma transformação quantitativa e qualitativa.
Assim, com o passar dos tempos, foram se acrescentando novos direitos ao rol
de direitos fundamentais, de forma a ocorrer um processo cumulativo de direitos, onde
novas gerações de direitos não excluem/extinguem as gerações passadas, mas, na
verdade, somam-se a elas, ampliando qualitativamente o catálogo de direitos
fundamentais.
Por esse motivo, parte da doutrina prefere classificar os direitos fundamentais
em “dimensões”, ao invés da expressão “gerações”, justamente porque essa
expressão transmite a ideia de que uma geração posterior substitui a anterior,
anulando-a, enquanto aquela terminologia indica que os novos direitos somam-se
quantitativa e qualitativamente à dimensão anterior, sem, contudo, anula-los, sendo
esta a terminologia que será adotada neste trabalho daqui em diante.
Deste modo, os direitos fundamentais, tal como se conhece hoje, objeto de
proteção de uma ordem constitucional escrita, encontraram origem nos meados do
século XVIII, durante a Revolução Francesa e Americana, sobretudo com a
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
Por coincidência, o lema da revolução francesa, “liberdade, igualdade e
fraternidade”, profetizava, em suma, o que viriam a ser os direitos de 1ª, 2ª e 3ª
dimensão, respectivamente. Posteriormente, por estarem em constante processo de
evolução, acrescentaram-se os ditos direitos fundamentais de 4ª e 5ª dimensão.
Sendo assim, conforme ensina Bonavides (2004), os direitos de 1ª
dimensão são aqueles relacionados à liberdade do indivíduo perante o
Estado, e isto diz respeito aos direitos civis e políticos.
Aqui, pode-se citar como exemplos de direitos fundamentais de 1ª dimensão, o
direto à liberdade (nas suas mais várias formas), direito à propriedade, direito à vida,
direito à participação política, entre outros.
Para o mesmo autor doutrinário, estes direitos “traduzem-se como faculdades
ou atributos da pessoa e ostentam uma subjetividade que é seu traço mais
característico; enfim são direitos de resistência e oposição perante o Estado”
16

(BONAVIDES, 2004, p. 263).


Os direitos de 1ª dimensão tiveram origem no período moderno, com o
surgimento dos Estados Liberais fundados em uma Constituição escrita, e exigiam do
Estado uma conduta mais abstencionista ou negativa perante os indivíduos, devendo
evitar interferências na esfera pessoal de cada governado, pois o ser humano é sujeito
capaz de, por si só, se autodefinir e saber o que é melhor para si.
Em um segundo momento, já no século XX, surgem os chamados direitos de
2ª dimensão, que, ao contrário da primeira, vão exigir do Estado uma postura mais
ativa, de forma a, agora, promover ações positivas que busque alcançar a ideia de
igualdade entre os cidadãos ou indivíduos.
Assim, segundo Bonavides (2004), os direitos de segunda dimensão estarão
relacionados com os direitos sociais, culturais e econômicos, assim como os direitos
coletivos. São exemplos dessa dimensão de direitos, o direito à saúde, direito à
educação, direito ao trabalho, direito à moradia, entre outros.
Os direitos de 2ª dimensão ganharam evidência e destaque nas constituições
do segundo pós-guerra, refletindo à ideia de Estado Social, de cunhos
marxista e social-democracias, de forma que o Poder Público atua com o
objetivo que promover um ideal de igualdade material ou isonomia entre os
indivíduos, em um cenário onde há inúmeras desigualdades e injustiças sociais.
Ainda no final do século XX, o mundo passou por um resgate e
supervalorização de preceitos humanísticos, decorrente da consciência de um mundo
partido entre nações desenvolvidas e subdesenvolvidas ou em fase de precário
desenvolvimento, trazendo à tona os chamados direitos de 3ª dimensão
(BONAVIDES, 2004).
Os direitos de terceira dimensão, para Vasak (1979 apud BONAVIDES,
2004) são aqueles que preconizam a fraternidade, ou, para alguns, a solidariedade
entre os povos, em uma leitura que enxerga como sujeito de direitos não apenas
o indivíduo isoladamente e coletivamente, mas o gênero humano como um todo (os
presentes e os futuros).
Assim, os direitos de 3ª dimensão abrangem o direito ao desenvolvimento, à
paz, ao meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da comunidade
(VASAK, 1979 apud BONAVIDES, 2004).
Percebe-se que esses direitos são dotados de uma natureza transindividual e
universal, e diz respeito ao próprio gênero humano, não devendo, pelo menos em
17

tese, considerando os tempos atuais de globalização, encontrar limitação de


abrangência às fronteiras territoriais de um Estado.
A doutrina fala ainda em uma 4ª dimensão de direitos fundamentais, que seriam
os relacionados ao cosmopolitismo e a democracia universal, cujo direito à
informação, direito ao pluralismo e direito à democracia estariam enquadrados nessa
categoria de direitos (BONAVIDES, 2004).
Tem razão Bonavides (2004, p. 571), ao afirmar que são desses direitos que
“depende à concretização da sociedade aberta para o futuro, em sua dimensão de
máxima universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as
relações de convivência”. Por isso é tão facilmente visível a aplicação e a importância
desses direitos no mundo complexo e globalizado atual, principalmente nas relações
intersubjetivas, ou até mesmo na relação entre Estados.
Outros autores, como Cunha Jr. (2008 apud FERNANDES, 2017), reconhecem
ainda, nessa mesma dimensão de direitos fundamentais, o direito contra
manipulações genéticas, o direito à mudança de sexo e direitos relacionados à
biotecnologia.
Parte da doutrina entende ainda haver uma quinta, e até uma sexta dimensão
de direitos fundamentais, esta última, em desenvolvimento.
Nesse sentido, o próprio Bonavides (2007 apud FERNANDES, 2017), acaba,
nas últimas edições de sua obra, visualizando a “paz” como um direito de 5ª
geração/dimensão.
Assim, já no início do século XXI, o direito à “paz” seria elevado de um direito
de terceira dimensão para um de quinta dimensão, de forma a alcançar um patamar
superior e específico de fundamentalidade (BONAVIDES, 2007 apud FERNANDES,
2017).
Frise-se, contudo, que não há, entre os doutrinadores, um consenso razoável
mínimo sobre o conteúdo dos direitos fundamentais de 5ª e 6ª dimensão, isto é, quais
direitos se enquadrariam nestas categorias.
Há autores que defendem que a quinta dimensão dos direitos fundamentais
tratam dos direitos relacionados aos desafios da sociedade tecnológica e da
informação, do ciberespaço, da internet e da realidade virtual de forma geral. Outros
entendem que esta dimensão abarca o dever de cuidado, amor e respeito para com
todas as formas de vida, assim como direitos de defesa contra as formas de
dominação biofísica geradoras de toda sorte de preconceitos (SARLET; MARINONI;
18

MITIDIERO, 2018).
Além disso, conforme pontuam Sarlet, Marinoni e Mitidiero (2018), há na
doutrina brasileira até mesmo quem defenda a existência de uma 6ª dimensão em
desenvolvimento nos dias atuais, representada pelo direito humano e fundamental de
acesso à água potável, por haver uma relevância fundamental da água potável para
a vida, saúde e até para o desenvolvimento humano.
Esta concepção, baseia-se especialmente na gradual consagração desse
direito no contexto do direito internacional dos direitos humanos e do direito
constitucional comparado.

2.3 A titularidade dos direitos fundamentais

Quando se fala em titulares ou sujeitos ativos dos direitos fundamentais, refere-


se aqueles que podem exigir, dos particulares ou do Poder Público, respeito, ou, até
mesmo, invocar uma proteção jurídica ou uma promoção do(s) seu(s) direito(s)
subjetivo(s) ou de suas liberdades e prerrogativas públicas.
A Constituição Federal (BRASIL, 1988), preconiza, em sua literalidade, que são
titulares dos direitos fundamentais, os brasileiros – tanto os natos, quanto os
naturalizados - e os estrangeiros residentes no país. Vale transcrever o caput do art.
5º da Carta Magna:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade. (grifos acrescidos)

Percebe-se, portanto, que o ser humano é, essencialmente,


o principal destinatário dos direitos e garantias fundamentais, sendo dispensada a
este uma proteção jurídica que lhe garanta as condições mínimas de dignidade
humana que lhe deve ser inata.
Contudo, na sua literalidade, a Constituição somente faz referência expressa a
essas duas categorias de sujeitos detentores dos direitos fundamentais: o brasileiro e
o estrangeiro residente no país.
É de se asseverar, entretanto, que a doutrina e a jurisprudência do STF
vem admitindo uma leitura ou interpretação sistemática, estendendo o rol de
titulares para considerar também como detentores desses direitos, os estrangeiros
19

não residentes no país (por exemplo, turistas), as pessoas jurídicas e até mesmo os
apátridas, levando em consideração a universalidade dos direitos
fundamentais (LENZA, 2019).
Há de se anotar, contudo, que alguns não serão titulares absolutos de todos os
direitos fundamentais, mas somente daqueles que guardarem compatibilidade à sua
peculiar natureza.
Nesse sentido, ensinam Dimoulis e Martins (2008, p. 81):
Com poucas exceções, a Constituição Federal garante os direitos
fundamentais a determinadas categorias de pessoas, excluindo
implicitamente os demais, isto é, não lhes oferecendo proteção em nível
constitucional. Além disso, depara-se aqui com uma situação complexa, já
que cada categoria de direitos possui titulares diferentes.

Dessa forma, por exemplo, não há como se falar em direito à liberdade de


locomoção de uma pessoa jurídica, ou mesmo, em direito ao voto a um
estrangeiro. Por outro lado, é perfeitamente possível falar-se em direito à propriedade
da pessoa jurídica e do direito à vida da pessoa não brasileira.
Especificamente no que diz respeito ao direito de participação política (direito
de votar e ser votado), este é reservado somente aos brasileiros, natos e
naturalizados, excetuando-se a hipótese prevista no art. 12, § 1º da Constituição
Federal (BRASIL, 1988), de portugueses residentes no país, em que, se houver
reciprocidade em favor dos brasileiros, poderão os lusitanos serem titulares de direitos
inerentes ao brasileiro (incluindo o direito de participação política), ressalvado os
casos específicos previstos na Constituição.
A doutrina mais moderna vai explicar ainda que, apesar de, na sua origem, os
direitos fundamentais terem como titulares, essencialmente os indivíduos, impondo
limitações ao Estado em favor daqueles, com o passar dos tempos, as ordens
constitucionais modernas passaram a reconhecer como titulares de direitos
fundamentais, inclusive, os próprios entes estatais (PAULO; ALEXANDRINO, 2017).
Neste sentido, Fernandes (2017) filia-se ao entendimento de que, embora
tradicionalmente oponíveis ao Estado, o próprio Poder Público pode ser alvo de
proteção específica pelos direitos fundamentais, e pode, por exemplo, pleitear
judicialmente uma proteção jurídica aos seus direitos, impetrando os remédios
constitucionais que lhe forem cabíveis no caso concreto.
Sobre a possibilidade de o Estado também ser titular de direitos fundamentais,
Marmelstein (2014, p. 235), outro adepto dessa teoria, explica:
20

Essa idéia – por mais estranha que seja – pode ser assimilada com mais
facilidade se se pensar que os direitos fundamentais visam não somente a
proteção da dignidade da pessoa humana, mas também a limitação do poder.
E, em determinadas hipóteses, até mesmo o Estado estará em uma situação
de sujeição ao poder.

Essa sujeição ao poder, por parte de um ente estatal, pode acontecer, por
exemplo, na hipótese da Fazenda Pública ser litigante em um processo judicial,
quando, sujeitos ao poder do juiz, lhes deverão ser garantidos o devido processo legal,
a ampla defesa, o contraditório, e demais direitos fundamentais de cunho processual.
O Estado pode ser titular ainda do direito à propriedade. Veja-se que é
perfeitamente compatível com o direito à propriedade, a condição do sujeito ativo ser
uma pessoa jurídica de direito público, visto que, o Estado pode ser – como o é –
titular de bens e coisas. Assim, o Estado pode opor a qualquer indivíduo, ou mesmo
à outras pessoas jurídicas de direito público, o seu direito fundamental à propriedade.

2.4 Destinatários dos direitos fundamentais e os tipos de eficácia

Ao passo que os titulares são os sujeitos ativos, detentores de direitos


fundamentais, os destinatários são os sujeitos passivos da relação, os quais devem
respeito e observância aos direitos fundamentais alheios.
Conforme explica Paulo e Alexandrino (2017, p. 101), “os direitos fundamentais
regulam, precipuamente, as relações entre o Estado e o particular”.
Sendo assim, via de regra, representam direitos subjetivos conferidos ao
particular (indivíduo pessoa natural ou pessoa jurídica), que são exercidos ou
oponíveis frente ao Estado, como uma forma de impor uma conduta de índole
negativa, limitando a dominação estatal sobre governados, isto é, impondo ao Estado
uma obrigação de não fazer (de não interferir na esfera da individualidade das
pessoas), ou uma conduta de índole positiva, impondo ao Estado uma
conduta prestacionista, ou uma obrigação de fazer algo em favor do indivíduo ou da
coletividade (como na concretização dos direitos sociais, ex vi, garantia de moradia,
educação, saúde etc).
Conforme Nunes Júnior (2019), à essa relação de oponibilidade entre o
particular e o Estado é dado o nome de eficácia vertical dos direitos fundamentais.
Esta eficácia vertical vincula todos os órgãos e funções estatais aos direitos
fundamentais. Como pontuam Sarlet, Marinoni e Mitidiero (2018, p. 392):
21

Assim, se, de acordo com um critério formal e institucional, os detentores do


poder estatal formalmente considerados (os órgãos dos Poderes Legislativo,
Executivo e Judiciário) se encontram obrigados pelos direitos fundamentais,
também num sentido material e funcional todas as funções exercidas pelos
órgãos estatais o são.

Fica claro que os direitos fundamentais atuam como parâmetro de atuação e


limitação de todos os órgãos e poderes estatais, de forma que o Estado deve
conformar suas ações à concretização dos direitos fundamentais, não podendo
desconsiderá-los ou mesmo suprimi-los.
Esta vinculação à estrita observância e defesa dos direitos fundamentais
ocorre em todas as esferas do Poder Público, isto é, no Legislativo, no Executivo e
também no Judiciário, conforme se verá a seguir.
Primeiramente, no que concerne ao Poder Legislativo, este deve guardar
coerência e respeito aos direitos fundamentais no exercício da atividade legislativa.
Deve, no exercício da sua função típica, elaborar normas que visem regular os direitos
fundamentais que dependem de concretização legislativa (FERNANDES, 2017).
Ensina Canotilho (1992 apud SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2018) que a
vinculação do legislador aos direitos fundamentais se dá através de uma dupla
dimensão: a primeira é em um sentido negativo (ou proibitivo), em que ocorre uma
proibição da edição de atos legislativos que sejam contrários aos direitos
fundamentais; a outra é em um sentido positivo, em que há uma implicação de dever
de conformação de acordo com os parâmetros fornecidos pelas normas de direitos
fundamentais, isto significa um dever de concretização dos direitos fundamentais.
Quanto ao Poder Executivo, a vinculação ocorre à Administração Pública em
seu sentido mais amplo – incluindo a Administração Direta e Indireta, e as pessoas
jurídicas de direito privado que exerçam funções públicas -, devendo haver uma estrita
observância aos direitos fundamentais nas suas condutas, sob pena de nulidades dos
atos administrativos (FERNANDES, 2017).
Já no Poder Judiciário, a vinculação à defesa e observância dos direitos
fundamentais se dará através das tutelas judiciais, pois este Poder deve sempre
conhecer as situações que envolvam lesões ou ameaças de lesões a direitos
fundamentais, por força do princípio da inafastabilidade da jurisdição, insculpido no
art. 5º, XXXV, da Constituição Federal (BRASIL, 1988), promovendo e dispensando a
devida proteção jurídica aos lesados ou ameaçados de lesão de um direito
fundamental.
22

A toda esta vinculação dos Poderes Públicos à observância e respeito aos


direitos fundamentais, denominou-se de “eficácia irradiante”, como uma importante
consequência da dimensão objetiva dos direitos fundamentais (LENZA, 2019).
Mas, se por um lado, o Poder Público é o principal destinatário ou sujeito
passivo dos direitos fundamentais, visto que, historicamente, os direitos fundamentais
surgiram justamente para serem oponíveis ao Estado, os ordenamentos
constitucionais modernos passaram a reconhecer também os particulares como
sujeitos passivos dos direitos fundamentais.
Em uma relação entre iguais, isto é, entre particulares, também deve haver
observância e respeito mútuos aos direitos fundamentais do outro, não podendo haver
violações na esfera da dignidade humana alheia.
À essa vinculação entre particulares, de respeito mútuo aos direitos
fundamentais de seus iguais, a doutrina costuma denominar de eficácia horizontal,
privada ou externa dos direitos fundamentais.
Conforme ensinam Sarlet, Marinoni e Mitidiero (2018, p. 395):

Além dos órgãos estatais (na acepção ampla aqui utilizada), também os
particulares, na condição de destinatários, estão sujeitos à força vinculante
dos direitos fundamentais, temática habitualmente versada sob o rótulo da
constitucionalização do direito privado ou, de modo mais preciso, da eficácia
dos direitos fundamentais na esfera das relações privadas.

É certo, portanto, que, os particulares não podem violar os direitos e garantias


fundamentais de outros particulares, não podendo ser toleradas discriminações ou
danos às liberdades públicas de terceiros que venham atentar contra a dignidade
humana.
O indivíduo em particular, não pode, por exemplo, cercear a liberdade de
expressão de outro indivíduo, ou mesmo violar a honra, a privacidade, a imagem do
outro, sob pena de responder pelos danos que vier a causar na esfera pessoal alheia.
Contudo, na relação entre particulares, não se pode desconsiderar que vigora
o princípio da autonomia da vontade, de forma que eventual conflito entre este
princípio e os direitos fundamentais vão necessitar sempre de uma análise específica
calcada nas circunstâncias do caso concreto, devendo ser buscada uma solução
ponderada aos conflitos entre direitos fundamentais, que almeje obter-se um equilíbrio
razoável e uma concordância prática entre os direitos em conflitos, de forma à não
sacrificar por completo os direitos em pauta, bem como preservar, na medida do
possível, o seu conteúdo essencial (SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2018).
23

Existe, atualmente, uma parte da doutrina que reconhece ainda um terceiro tipo
de eficácia, denominada de eficácia diagonal dos direitos fundamentais.
Conforme pontua Contreras (2009 apud NUNES JÚNIOR, 2019), a aplicação
dos direitos fundamentais nas relações trabalhistas, por exemplo, não podem ser
consideradas uma eficácia horizontal, visto que, na prática, sob o ponto de vista
econômico e jurídico, o empregado e o empregador não estão em condições de
igualdade, pois haveria uma superioridade do empregador na relação, decorrente dos
poderes que detém sobre seus subordinados.
Por isso, a doutrina que defende a existência da eficácia diagonal dos direitos
fundamentais vai afirmar que o empregador detém direitos e deveres diretivos
e sancionatórios que podem ser comparados, guardadas as devidas proporções, ao
poder do Estado. Esses poderes, consistem em um conjunto de atribuições do
empregador, que, na relação de trabalho, acaba por desequilibrar a relação entre
empregado e empregador, extraindo-o de um plano horizontal (em igualdade de
condições) e colocando-o em plano diagonal (com o empregador acima do
empregado) (CONTRERAS, 2009 apud NUNES JUNIOR, 2019).
Outro exemplo clássico onde há uma relação desigual entre os particulares, é
a relação de consumo, onde o poderio econômico do fornecedor o coloca em uma
posição de superioridade diante o consumidor, este, parte mais vulnerável e
hipossuficiente da relação.
Neste caso, vai incidir sobre a relação de consumo, assim como na trabalhista,
uma eficácia diagonal dos direitos fundamentais, devendo a parte mais forte na
relação, dar a estrita observância e respeito aos direitos fundamentais do mais fraco,
evitando violações aos direitos deste.

2.5 Resolução de conflitos entre direitos fundamentais

A eficácia horizontal, ou até mesmo a diagonal, dos direitos fundamentais,


pode, por vezes, acabar ocasionando colisões entre os direitos fundamentais
dos particulares integrantes de uma relação jurídica, ou mesmo entre direitos
fundamentais e valores constitucionais.
Isso acontece quando estão em evidência dois direitos fundamentais distintos
de titulares diferentes, postos um fronte o outro, e um podendo se sobrepor ao outro.
Conforme ensinam Paulo e Alexandrino (2017, p. 105):
24

Ocorre conflito (ou colisão) entre direitos fundamentais quando, em um caso


concreto, uma das partes invoca um direito fundamental em sua proteção,
enquanto a outra se vê amparada por outro direito fundamental.

Esses conflitos são corriqueiros nos casos em que o exercício da liberdade de


imprensa viola o direito à intimidade de um indivíduo, em que o direito à informação
conflita com o direito à imagem, em que a liberdade de comunicação invade a esfera
de privacidade dos indivíduos, ou ainda, a livre manifestação do pensamento viola a
honra de terceiros. Estes são clássicos exemplos de conflitos ou colisões entre
direitos fundamentais de titulares distintos.
Como bem aponta Marmelstein (2014), este fenômeno de colisão entre os
direitos fundamentais, decorre da natureza principiológica e característica destes, qual
seja, a relatividade, que significa dizer que não há direitos fundamentais com caráter
absoluto, isto é, exercíveis irrestritamente, mas que todos os direitos fundamentais
vão encontrar limitações e restrições recíprocas em outros direitos tão fundamentais
quanto.
Desta forma, não raras vezes, os direitos fundamentais acabam encontrando
limitação ou resistência em outros direitos fundamentais de terceiros, ou mesmo nas
normas jurídicas (regras e princípios).
Nos conflitos entre direitos fundamentais, existe uma linha tênue que separa
um direito do outro, e impõe limites mútuos aos diferentes titulares dos direitos
fundamentais.
Paulo e Alexandrino (2017) anotam, contudo, que, entre os direitos
fundamentais não existe hierarquia, o que impossibilita de cogitar-se uma invariável
aplicação integral de um deles (o supostamente superior hierarquicamente),
resultando na total aniquilação do outro (o supostamente inferior hierarquicamente).
Por isso, em uma análise do caso concreto, sendo levados os
conflitos para serem dirimidos pelo Poder Judiciário, cabe ao julgador exercer um
juízo de bom senso e razoabilidade, de forma que, ao decidir, não acabe por suprimir
ou sacrificar por completo um direito fundamental, em privilégio do outro.
Assim, a doutrina recomenda que seja exercido um juízo utilizando como forma
de sopesamento dos interesses em conflito, a técnica da ponderação, decidindo qual
direito fundamental deve prevalecer sobre o outro no caso concreto.
Conforme ensina Lenza (2019), essa técnica leva em consideração a
razoabilidade e a proporcionalidade, de forma que deve-se buscar uma concordância
25

prática ou uma harmonização dos direitos ou interesses em conflitos. Não sendo


possível chegar-se a um ponto de equilibro ou conciliação entre eles, cabe ao julgador
avaliar qual dos direitos ou interesses em conflito deve prevalecer sobre o outro.

2.6 Limites aos direitos fundamentais e a teoria dos limites dos limites

Como visto acima, os direitos fundamentais não são absolutos, e podem


encontrar limitações ou restrições no seu exercício ou gozo. Essas limitações são
decorrentes da relatividade dos direitos fundamentais.
Da mesma forma, a doutrina atual admite a tese de que os direitos
fundamentais podem ter seu âmbito de eficácia restringido por atos normativos
infraconstitucionais (FERNANDES, 2017).
Para o melhor entendimento dessa teoria que permite o reconhecimento da
possibilidade de restrições aos direitos fundamentais, é de fundamental importância
analisar-se as bases dessa teorização.
Primeiramente, faz-se necessário diferenciar a teoria interna da teoria externa.
A teoria interna, vai preconizar que os direitos fundamentais encontram
restrições somente na sua internalidade. Na lição de Borowski (apud FERNANDES,
2017, p. 351), “existe apenas um direito com limites imanentes (inerentes) a ele”.
Desta forma, a definição do conteúdo e da existência de um direito não
dependeria de fatores externos a ele, não havendo como se falar em possibilidade
restrições externas, pois, qualquer limitação que possa existir, se dá a partir de
dentro.
Para os que defendem essa corrente, a principal tese que sustentam seu
posicionamento, é a “teoria dos limites imanentes”, a qual não admite restrições
externas à um direito fundamental.
Já a teoria externa, ao contrário da interna, trabalha com a possibilidade de
restrições externas aos direitos fundamentais e a aferição dessas limitações através
de determinados parâmetros.
Assim, conforme ensina Fernandes (2017, p. 351), “a restrição ao direito não
tem influência no conteúdo do direito, pois a restrição ao seu exercício se dará em
uma situação concreta (contextualizada)”. Para essa tese, a limitação deve surgir para
desenvolver o direito fundamental ou outros direitos fundamentais previstos na
Constituição, quando em conflitos. Por isso, a restrição deve ser moderada, de forma
26

que não pode acabar prejudicando ou amesquinhando o direito


fundamental, subtraindo-lhe o seu conteúdo essencial e sua razão de existir.
Para aferir essa limitação, a doutrina vai afirmar que o parâmetro adequado é
o da proporcionalidade da atuação do poder público (através de qualquer um dos
poderes). Desta forma, criam-se limites às restrições dos direitos fundamentais.
Assim, surge a “teoria dos limites dos limites”, que, com base em determinados
parâmetros ou critérios, impõe a forma adequada de se restringir os direitos
fundamentais, quais sejam (FERNANDES, 2017):
1) as limitações dos direitos fundamentais devem preservar o núcleo essencial
destes, o que envolve diretamente a noção de dignidade da pessoa humana,
que não deve ser amesquinhada;
2) a limitação deve ser, via de regra, estabelecida de forma clara, precisa e
explícita no texto normativo infraconstitucional, como uma forma de garantir a
segurança jurídica e evitar a instabilidade das relações. Não há, portanto, à
possibilidade de imposição de restrições implícitas;
3) as limitações devem ser abstratas e genéricas, de forma a abranger uma
infinidade de situações concretas e de indivíduos, sendo vedado a criação de
restrições casuísticas ou pessoais, que gerem discriminações absurdas e
arbitrárias (desarrazoadas);
4) deve haver proporcionalidade nas limitações, ou seja, elas devem estar em
consonância com o princípio da proporcionalidade e seus subprincípios
ou subregras, quais sejam, a adequação (meio que deve ser apto ao fim
visado), necessidade (inexistência de outro meio menos gravoso para se atingir
o objetivo) e proporcionalidade em sentido estrito (relação custo/benefício).
Dessa forma, deve-se concluir que eventuais restrições, sejam legislativas,
judiciais ou até mesmo administrativas, a direitos fundamentais, podem ocorrer, desde
que sejam para desenvolvê-los e não para prejudicá-los.
27

3 O DIREITO FUNDAMENTAL À LIBERDADE DE EXPRESSÃO NA CF/88

O presente capítulo se dedica ao estudo do direito fundamental à liberdade de


expressão no ordenamento jurídico-constitucional brasileiro, onde, de início, se
apresentarão as diversas formas ou modalidades deste direito, bem como as
respectivas previsões normativas no texto constitucional.
Após a revisão das modalidades de expressão garantidas na Constituição
Federal, explorar-se-á a evolução histórica do direito à liberdade de expressão nos
textos constitucionais pretéritos, bem como nos dispositivos infraconstitucionais.
Em seguida, será feita uma análise do âmbito de proteção dada,
hodiernamente, à liberdade de expressão no Brasil.
Sucessivamente, tratará da vedação ao anonimato e do direito de resposta,
proporcional ao agravo, além da indenização, encerrando o presente capítulo
estudando o princípio-regra da vedação à censura e das possíveis restrições ou
limitações que justificam o controle do abuso da liberdade de expressão.

3.1 As diversas modalidades da liberdade de expressão

A Constituição brasileira de 1988 consagrou em seu texto, uma ampla proteção


jurídica dispensada à liberdade de expressão, em suas diversas modalidades. Essa
proteção é fruto de uma evolução histórico-constitucional, pois a tutela à esse direito
fundamental passou por diversas transformações ao longo das Constituições
brasileiras pretéritas.
Sem se aprofundar, por ora, nas características da proteção dada à liberdade
de expressão nas Constituições passadas, a atual Constituição cidadã de 1988
buscou assegurar que essa liberdade fosse realmente efetivada, e não se tornasse
apenas “letra morta” de lei, como o foi no passado, e, por esse motivo, este direito foi
objeto de uma positivação mais detalhada, estando disposto em diversos artigos da
Carta Magna e de diversas formas.
Conforme pontuam Sarlet, Marinoni e Mitidiero (2018), as liberdades de
expressão, além de serem objeto de maior detalhamento na sua positivação
constitucional, passaram a corresponder ao patamar de reconhecimento e proteção
jurídica compatível com um autêntico Estado Democrático de Direito.
28

Ensinam, estes mesmos autores, que a CF/88 tomou o termo “liberdade de


expressão” como gênero que abarca diversas modalidades específicas como
desdobramento desta. Por exemplo, a livre manifestação do pensamento, a liberdade
de consciência e de crença, a liberdade de comunicação (de forma a incluir, inclusive,
a liberdade de imprensa), a livre manifestação artística, intelectual e científica e outras
liberdades neste mesmo sentido (SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2018).
Portanto, a liberdade de expressão deve aqui ser entendida como gênero, que
se decodifica em uma série de liberdades específicas. Veja-se algumas:

3.1.1 Liberdade de manifestação de pensamento e/ou opinião

A liberdade de manifestação de pensamento e/ou opinião foi solenemente


consagrado no art. 5º, IV, da Constituição Federal. Este dispositivo constitucional
informa que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”
(BRASIL, 1988).
Para Sarlet, Marinoni e Mitidiero (2018), esta passagem estabelece uma
espécie de “cláusula geral”, que, em conjunto com outros dispositivos relacionados
com a liberdade de expressão, formam um complexo arcabouço jurídico de proteção
constitucional que reconhece a liberdade de expressão em suas diversas
modalidades.
A livre manifestação do pensamento inclui a liberdade de opinião, que pode ser
considerada a faculdade de expor seu pensamento, convicção, comentário, avaliação
ou julgamento acerca de determinado assunto ou sobre qualquer pessoa envolvendo
tema, seja ele de interesse público, ou não, de importância e de valor, ou não
(MENDES; BRANCO, 2017).
A manifestação do pensamento pode se dar de diversas formas: oralmente, por
escrito, através de gestos e expressões corporais, música, artes plásticas e por todas
as demais formas que sejam passíveis de comunicação e de exteriorização do
pensamento.

3.1.2 Liberdade de expressão artística

Prevista no art. 5º, IX, da CF/88, de acordo com o qual “é livre a expressão da
atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de
29

censura ou licença” (BRASIL, 1998), este inciso é de alta relevância para a liberdade
de expressão, especialmente por estar umbilicalmente ligado ao princípio da
dignidade da pessoa humana.
Aqui, a proteção dada a liberdade de expressão inclui várias espécies de
liberdades, tais como a liberdade intelectual (para escrever livros, artigos, colunas,
resenhas, textos dos mais diversos, independentemente de conteúdo questionável),
liberdade artística (para fazer músicas, peças, filmes, obras de arte etc), liberdade
científica (para pesquisar, estudar e fazer experimentos dos mais diversos) e liberdade
de comunicação (para se expressar em qualquer veículo de comunicação social)
(NUNES JÚNIOR, 2019).
Nesse dispositivo, a Constituição estabelece ainda expressamente a vedação
à censura prévia, seja ela administrativa ou judicial (tema que será melhor
desenvolvido em tópico próprio mais adiante), bem como à exigência de licença do
Poder Público para o exercício de qualquer um tipo de manifestação expressiva.

3.1.3 Liberdade de ensino e pesquisa

Como sabido, os direitos fundamentais não se encontram localizados apenas


no art. 5º da Constituição Federal, mas se distribuem por vários artigos esparsos da
parte dogmática da Carta Cidadã.
Nesse sentido, relacionado com as liberdades individuais, o art. 206, II da
CF/88, dispõe sobre a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o
pensamento, a arte e o saber, no âmbito das diretrizes do ensino. Assim dispõe a
Constituição Federal (BRASIL, 1988):

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
[...]
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte
e o saber;

O supramencionado artigo da Constituição dispõe sobre diversas normas e


princípios que embasam o ensino no Brasil, e o inciso II consagra justamente a
liberdade de aprendizado, de ensino, de pesquisa e de divulgação do pensamento, da
arte e do saber, que, por se tratar de autêntico direito de liberdade, gera direitos
subjetivos para os indivíduos (SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2018).
Conforme observa Silva (2005, p. 256), “trata-se do reconhecimento de
30

liberdade de uma classe de especialista na comunicação do conhecimento, que são


os professores”. Assim, a liberdade de ensino e aprendizagem, que tem como objetivo
garantir o pluralismo de ideias e concepções no campo da educação, de forma que os
professores têm autonomia didático-cientifica, desde que observada as diretrizes e
bases da educação, para expor suas próprias convicções ou pontos de vistas
diferentes, sem que haja imposição de um único critério metodológico ou didático.
Por essa razão, a sala de aula, oficina do saber, deve ser palco de livre
circulação de ideias e de produção do conhecimento, e qualquer tentativa de restrição
do pensamento deve ser combatida pelos meios legais e pelo Estado.

3.1.4 Liberdade de comunicação e informação ou liberdade de imprensa

A liberdade de comunicação, nas lições de Silva (2005, p. 243), “consiste num


conjunto de direitos, formas, processos e veículos, que possibilitam a coordenação
desembaraçada da criação, expressão e difusão do pensamento e da informação”.
Trata-se de um dos mais importantes direitos fundamentais relacionados à liberdade.
Também chamada de liberdade de imprensa, a Constituição tratou de garanti-
la e reforçá-la em vários artigos da Constituição, de maneiras diferentes, justamente
por ser, a livre circulação da informação, um dos pilares do Estado Democrático de
Direito.
Neste sentido, o art. 220, caput, dispõe que “a manifestação do pensamento, a
criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não
sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição” (BRASIL, 1988).
Este artigo, que inicia o capítulo V da CF/88 e que regula a Comunicação Social no
país, reforça o disposto no inciso IX do art. 5º, vedando expressamente, mais uma
vez, a censura ou qualquer forma de restrição prévia à liberdade de imprensa.
O § 1º do mencionado artigo informa que nenhuma lei deverá conter dispositivo
que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em
qualquer veículo de comunicação social (BRASIL, 1988).
Ainda relacionado com a liberdade de informação, o art. 5º, XIV dispõe que “é
assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando
necessário ao exercício profissional” (BRASIL, 1988). Vê-se, portanto, uma proteção
constitucional específica dada ao exercício da profissão jornalística, quando é
garantido o direito de informar, de ter resguardado o sigilo da fonte, bem como o direito
31

da população ser informada de notícias que sejam de interesse público.


Conforme esclarece Greco (1974 apud SILVA, 2005), existe uma diferença
entre o direito de se informar e o direito de ser informado. Para o referido autor, o
direito de se informar coincide com a liberdade de manifestação do pensamento, isto
é, de se expressar, seja através da palavra, por meio de escritos ou qualquer outro
meio de difusão. Já o direito de ser informado, indica o interesse da coletividade para
que, tanto os indivíduos, quanto a sociedade, estejam informados para o exercício
consciente das suas liberdades públicas.
Nunes Júnior (2019) também faz essa diferenciação, porém, sobre outro
prisma. Para ele, o direito de se informar o relaciona-se com o direito de ter
conhecimento das informações que sejam de interesse público ou mesmo particular,
através da liberdade de acesso à informação, consistente na permissão de realizar
pesquisas, buscar informações, sem sofrer qualquer tipo de interferência por parte do
Poder Público. Esse direito seria o previsto no art. 5º, XIV da Constituição.
O direito de ser informado, por sua vez, consistiria na possibilidade de qualquer
cidadão receber dos órgãos públicos informações de interesse particular, coletivo ou
geral, ressalvadas as cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do
Estado (SVALOV, 2012 apud NUNES JÚNIOR, 2019).
Este, está previsto no art. 5º, XXXIII da Constituição Federal (BRASIL,
1988), in verbis:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
[...]
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu
interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no
prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo
seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;

Nessa linha de ampla transparência em assuntos que digam respeito ao


interesse público, temos o direito de acesso à informação, regulada pela Lei da
Transparência (Lei nº 12.527/11), que regula o referido inciso constitucional
supramencionado (BRASIL, 2011).
Também chamada de Lei de Acesso à Informação, este diploma legal atribuiu
uma nova dimensão à informação, na medida em que conferiu uma grande amplitude
à publicidade dos atos e dados governamentais, estabelecendo o sigilo como exceção
e conferindo diversas ferramentas para o controle social da Administração Pública
32

(MARMELSTEIN, 2014).
Através dessa regulação legal, os órgãos públicos são obrigados a prestar
informações de interesse público ou particular, a qualquer cidadão que as requererem,
devendo estas serem prestadas no prazo estabelecido na lei, sob pena de
responsabilização da autoridade detentora das informações que se negou ou se omitiu
no fornecimento destas.
As exceções que justificam a negativa de transmissão de informações pelo
Poder Público, trata-se de quando a divulgação ou fornecimento destas, coloquem em
risco a segurança da sociedade e do Estado.
Trata-se, pois, de um direito líquido e certo, cuja violação pode dar ensejo ao
manejo de Mandado de Segurança, nos termos do art. 5º, LXIX, da CF/88.
Assim, conforme dispõe o art. 37, caput, da Carta Magna (BRASIL, 1988), a
Administração Pública deve reger-se, entre outros, pelo Princípio da Publicidade, o
que significa que o sigilo de informações de interesse público deve ser uma exceção
à regra, e que a preferência deve ser a ampla divulgação de informações de caráter
público.
Outra importante garantia constitucional para o exercício da liberdade de
imprensa, é a do sigilo da fonte para os jornalistas, previsto no art. 5º, XIV da CF/88.
Esta garantia serve para a preservação do direito à informação, do direito de
informar e ser informado, e possibilita que qualquer pessoa que seja detentora de uma
informação de relevante interesse público (que muitas vezes revela uma denúncia de
uma ilicitude de uma autoridade pública), transmita-a a um jornalista de sua confiança,
sem o receio de que sua identidade seja revelada (NUNES JÚNIOR, 2019).
Por isso, nenhum jornalista pode ser compelido, contra a sua vontade, a revelar
o nome do seu informante ou a fonte de suas informações, ou mesmo sofrer qualquer
tipo de sanção em razão da sua recusa em responder questionamentos que lhe forem
feitos no intuito de violar o sigilo da fonte.

3.1.5 Liberdade de expressão religiosa

A Constituição Federal tratou de assegurar ainda à liberdade de consciência,


crença e culto, sendo garantida a inviolabilidade desses direitos, tendo-se, inclusive,
dada a devida tutela ao livre exercício dos cultos religiosos, com a garantia, na forma
da lei, da proteção aos locais de culto e a suas liturgias.
33

Previsto no art. 5º, VI, a Constituição dispõe que “é inviolável a liberdade de


consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e
garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias” (BRASIL,
1988). Essa liberdade de expressão religiosa constitui mais uma proteção decorrente
da liberdade de manifestação do pensamento.
Disto infere-se que a liberdade de expressão religiosa possibilita vários
desdobramentos, como o ensino religioso nas escolas, a instituição dos feriados
religiosos, o casamento perante autoridades religiosas, a garantia de imunidade
tributária religiosa aos templos, a guarda sabática, e várias outras formas de
expressão religiosa.
Não obstante o Estado deva ser laico, a religiosidade está presente em grande
parte dos indivíduos, e, desta forma, é importante que a Constituição garanta uma
proteção específica a essa forma de expressão, por ser uma das mais antigas e fortes
reivindicações do gênero humano.
Ainda, o inciso VIII do art. 5º, da Constituição Federal, completa assegurando
que “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção
filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos
imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei” (BRASIL, 1988).
Tem-se, assim, que a convicção religiosa do indivíduo, não pode ser obstáculo
para o pleno gozo dos direitos dos indivíduos, sejam eles liberdades individuais,
direitos sociais, políticos, de nacionalidade ou qualquer outro, salvo quando for
invocada a escusa religiosa para eximir-se de obrigação a todos impostas, e o
indivíduo recusar-se também a prestar obrigação alternativa. Nesse caso, por não
haverem direitos fundamentais absolutos, pode haver restrições aos direitos
individuais.

3.2 A evolução constitucional e legal do direito à liberdade de expressão

A atual Constituição Federal de 1988 proporcionou, aos direitos relacionados


com a liberdade de expressão, o ambiente necessário para o efetivo desenvolvimento
e livre exercício de tais direitos.
No entanto, assente-se que a liberdade de expressão tem previsão
constitucional remota, estando presente em todas as Constituições brasileiras, desde
a primeira Constituição, ainda no período imperial, até a presente, que é mais
34

abrangente.
No entanto, cada Constituição tratou de dar proteção específica e peculiar a
esse direito, de forma a se adequar as peculiaridades históricas e políticas que
envolviam a gênese de cada uma das cartas constitucionais.
Com efeito, conforme registram Sarlet, Marinoni e Mitidiero (2018), a
Constituição Imperial de 1824, previa, em seu art. 179, IV, que todos poderiam
comunicar os seus pensamentos, fosse por palavras ou escritos, bem como publicá-
los pela imprensa, sem dependência de censura. Contudo, haveriam de responder
pelos eventuais abusos que cometessem no exercício deste direito, nos casos, e pela
forma, que a lei determinasse.
A Constituição de 1891, a primeira da República, dispunha que, em qualquer
assunto, era livre a manifestação do pensamento, seja pela imprensa ou pela tribuna,
sem dependência de censura, respondendo cada um, pelos abusos que cometessem,
nos casos e pela forma prevista em lei.
Ainda a Constituição inaugurante da República, vedou o anonimato, como
forma de se permitir a identificação do eventual violador do direito à liberdade de
expressão, possibilitando a sua respectiva responsabilização pelos danos que
eventualmente cometesse.
A Constituição de 1934, entretanto, foi mais detalhista ao prever que em
qualquer assunto, era livre a manifestação do pensamento, independente de censura,
salvo quanto a espetáculos e diversões públicas, respondendo cada um pelos abusos
que viesse a cometer, nos casos e na forma determinada em lei. Não era permitido o
anonimato. Era assegurado o direito de resposta. A publicação de livros e periódicos
independia de qualquer licença do Poder Público. O texto constitucional previa,
todavia, que não seria tolerada propaganda de guerra ou de processos violentos para
subverter a ordem política ou social.
Já a Constituição de 1937, outorgada no contexto da assim chamada ditadura
do Estado Novo, tinha uma ideologia menos liberal, pois estabelecia sérias limitações
ao livre exercício da liberdade de expressão (SARLET; MARINONI; MITIDIERO,
2018).
Eis a redação da referida Constituição, no que concerne à liberdade de
expressão, in verbis:

Art 122 - A Constituição assegura aos brasileiros e estrangeiros residentes


no País o direito à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos
35

termos seguintes:
[...]
15) todo cidadão tem o direito de manifestar o seu pensamento, oralmente,
ou por escrito, impresso ou por imagens, mediante as condições e nos limites
prescritos em lei.
A lei pode prescrever:
a) com o fim de garantir a paz, a ordem e a segurança pública, a censura
prévia da imprensa, do teatro, do cinematógrafo, da radiodifusão, facultando
à autoridade competente proibir a circulação, a difusão ou a representação;
b) medidas para impedir as manifestações contrárias à moralidade pública e
aos bons costumes, assim como as especialmente destinadas à proteção da
infância e da juventude;
c) providências destinadas à proteção do interesse público, bem-estar do
povo e segurança do Estado. (BRASIL, 1937)

Refletindo o regime autoritário vigente à época, a Constituição de 1937,


estabeleceu várias limitações e restrições ao exercício da liberdade de expressão,
vigorando durante 9 (nove) anos, até o advento da Constituição de 1946.
Esta, por sua vez, foi fruto de uma derrocada do regime autoritário instaurado
por Vargas, contudo, ainda veio a estabelecer algumas restrições à liberdade de
expressão, no tocante a espetáculos e diversões públicas, que poderiam estar sujeitas
à censura.
Já Constituição de 1967 não trouxe profundas mudanças no tocante à
Constituição anterior, pois previa que era livre a manifestação de pensamento, de
convicção política ou filosófica e a prestação de informação, sem sujeição à censura,
exceto quanto a espetáculos e diversões públicas, respondendo cada um pelos
abusos que cometessem, nos termos da lei. O direito de resposta era assegurado. A
publicação de livros, jornais e periódicos independia de licença do Poder Público. Não
eram, porém, tolerada propaganda de guerra, de subversão da ordem ou de
preconceitos de raça ou de classe.
Por fim, a alteração promovida pela EC nº 1/1969, alterou o texto
Constitucional, passando a informar que, além das propagandas de guerra, de
subversão à ordem ou de preconceitos de raça ou de classe, não seriam toleradas
ainda preconceitos de religião, bem como publicações e exteriorizações que fossem
contrárias à moral e aos bons costumes.
No âmbito infralegal, sob a égide do regime militar, foi instituída a Lei nº
5.250/67, conhecida como Lei da Imprensa, que regulava a liberdade de manifestação
do pensamento e de informação.
A dita lei veio para consolidar o regime autoritário instaurado, pois impunha
graves limites à liberdade de expressão e à imprensa, inclusive, prescrevendo crimes
36

de imprensa.
No mesmo período foi editado o Decreto-lei nº 314/67 (Lei de Segurança
Nacional), que também abarcou alguns temas referentes à imprensa. Este diploma
passou a criminalizar, por exemplo, a divulgação de notícias falsas, tendenciosas ou
deturpadas, capazes de por em perigo o nome, a autoridade e crédito ou prestígio do
Brasil, ou qualquer tentativa de indispor o povo com as autoridades constituídas.
Criminalizou também a ofensa à honra do presidente de qualquer dos poderes da
União, entre outras tipificações penais.
No ano seguinte (1968), a imprensa sofreu mais um duro golpe. O Ato
Institucional nº 05, conferiu amplos poderes ao presidente da República, de forma que
a este era facultado impor censura prévia sobre os meios de comunicação, sendo-lhe
necessário somente que julgasse ou considerasse tal ato como necessário à defesa
da Revolução.
Essa prerrogativa foi ampla e largamente utilizada indiscriminadamente nos
anos seguintes, e todos os órgãos de imprensa e de comunicação foram atentamente
fiscalizados e censurados pelo governo, naquilo que desagradavam as autoridades.
Durante algum tempo, a imprensa viu-se ainda sujeita à uma nova e incômoda
legislação sobre Segurança Nacional. A Lei nº 6.620, de 17 de dezembro de 1978,
além de definir alguns crimes de imprensa, também conferiu ao Ministro da Justiça a
prerrogativa de apreender impressos, suspender sua impressão e proibir-lhes a
distribuição, caso estes contivessem crimes contra a segurança nacional.

3.3 Amplitude da proteção atual dada a liberdade de expressão no Brasil

Com a derrocada do regime militar e a restauração da democracia, a nova


ordem constitucional inaugurada com a Constituição de 1988, o Brasil passou a
reestabelecer os direitos e garantias referentes à liberdade de expressão.
Além dos dispositivos já vistos neste capítulo, a Carta Magna de 1988 inovou
em alguns aspectos: conferiu ao Poder Legislativo a prerrogativa de decidir sobre as
concessões de rádio e televisão; autorizou a propriedade dos veículos de
comunicação, além de aos brasileiros natos, também aos naturalizados há mais de
dez anos; extinguiu a censura aos espetáculos e diversões públicas, autorizando
apenas medidas de aconselhamento quanto a faixas etárias e locais de exibição; e
deu um tratamento homogêneo à liberdade jornalística para os veículos impressos e
37

eletrônicos.
Definitivamente, foi sob a égide da atual Constituição que a liberdade de
expressão e imprensa, alcançou sua mais ampla e justa proteção jurídica. Com
propriedade afirmam Sarlet, Marinoni e Mitidiero (2018, p. 517):

No âmbito da Constituição Federal de 1988, as liberdades de expressão


foram não apenas objeto de mais detalhada positivação, mas também
passaram a corresponder, pelo menos de acordo com texto constitucional, ao
patamar de reconhecimento e proteção compatível com um autêntico Estado
Democrático de Direito.

Não há dúvida que a Constituição promoveu diversos enunciados, espalhados


em vários artigos do corpo constitucional, e elaborados de modo a garantir
expressamente direitos relacionados com a liberdade da pessoa humana, dentre os
quais se incluem a liberdade de expressão.
Nesse contexto, já se pode perceber o lugar de destaque e o alto nível de
proteção que estas liberdades alcançaram na atual Constituição Federal.
A Constituição Federal ampara as mais diversas faculdades relacionadas com
liberdade de expressão, tais como a exteriorização de pensamentos, de ideias, de
informações, de críticas, inclusive, as que possam ser transmitidas de modo não
verbal (sinais, música, imagem etc). O grau de proteção que cada uma dessas
formas de expressão recebe pode variar, não obstante, todas encontram o devido
amparo na Lei Maior (MENDES; BRANCO, 2017).
Assinalam Sarlet, Marinoni e Mitidiero (2018, p. 521) que:

Para assegurar a sua máxima proteção e sua posição de destaque no âmbito


das liberdades fundamentais, o âmbito de proteção da liberdade de
expressão deve ser interpretado como o mais extenso possível, englobando
tanto a manifestação de opiniões, quanto de ideias, pontos de vista,
convicções, críticas, juízos de valor sobre qualquer matéria ou assunto e
mesmo proposições a respeito de fatos.

Assim, pode-se dizer o objeto de proteção da liberdade de expressão deve ser


considerado em uma noção aberta, isto é, inclusiva de novas modalidades, de modo
que possa abarcar todas as novas formas de manifestação do pensamento ou de
expressão, como é o caso da comunicação digital ou virtual.
Desse modo, a priori, todas as modalidades de expressão do pensamento
estariam protegidas juridicamente. Todavia, conforme assenta parte da doutrina e da
jurisprudência brasileira, não se pode permitir que, sob o manto da liberdade de
expressão, sejam exteriorizadas manifestações violentas, racistas e preconceituosas
38

ou incitações ao crime.
Estas manifestações costumam não estar protegidas pelo direito constitucional
brasileiro, por justamente entrarem em conflito com outros direitos ou valores, que
colocados em ponderação, são mais relevantes, como a dignidade da pessoa
humana, a ordem e a segurança pública.
A princípio, a liberdade de expressão assume uma função de direito de defesa
(direito negativo), operando contra o Estado – mas também contra os particulares, em
razão da eficácia horizontal e diagonal dos direitos fundamentais – no sentido de
garantir ao indivíduo a sua livre manifestação de pensamento, expressão de ideias e
opiniões, sem dependência de censura. Todavia, a liberdade de expressão abrange
também o direito de não se expressar ou direito ao silêncio, de forma que ninguém
pode ser obrigado a se expressar ou a se informar contra a sua vontade.

3.4 Da vedação ao anonimato e do direito de resposta

Como já visto, não existem direitos fundamentais absolutos, e com o direito à


liberdade de expressão não é diferente. Embora a livre manifestação e exteriorização
do pensamento devam ser amparadas pelo Direito, essa garantia não pode ser
invocada como salvaguarda para a prática de ilicitudes, tais como a apologia à prática
de crimes, a ofensa à honra, imagem ou integridade de outros, condutas antissemitas
etc.
É por essa razão que a Constituição Federal (BRASIL, 1988), em seu art. 5º,
IV, tratou de garantir a liberdade de expressão, mas vedou o anonimato, uma vez que
é justamente através da identificação da pessoa, que é possível à sua
responsabilização pelas ilicitudes que eventualmente venha a cometer ao pretexto de
liberdade de expressão, bem como se faz possível uso do direito de resposta.
Assim, “quem manifesta o seu pensamento através da imprensa escrita ou
falada, deve começar pela sua identificação. Se não o faz, a responsável por ele é a
direção da empresa que o publicou ou transmitiu” (MIRANDA, 1995, p. 128 apud STF,
2002, p. 1). Isto evidencia que, a vedação ao anonimato tem um único propósito, qual
seja, o de permitir que o autor do escrito ou da publicação possa sujeitar-se às
consequências jurídicas decorrentes de seu comportamento abusivo.
Entretanto, conforme bem pontua Nunes Júnior (2019), a doutrina e a
jurisprudência, tanto do STF, quanto do STJ, admitem uma exceção, qual seja, a
39

denúncia anônima. Esta é considerada perfeitamente possível do ponto de vista


jurídico, desde que o Estado atue de forma a verificar a procedência da denúncia, se
precavendo de denúncias falsas. Com a coleta de novos elementos que possam, por
si só, comprovar a materialidade de um delito é possível, aí sim, promover a eventual
responsabilização do autor.
O direito de resposta, por sua vez, vem previsto no art. 5º, V, da CF/88 (BRASIL,
1988), que prevê que “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo,
além da indenização por dano material, moral ou à imagem”. Desta forma, além da
possível responsabilização do eventual autor de abusos da liberdade de expressão
que possam acarretar danos à honra, imagem, intimidade, vida privada, dignidade da
pessoa humana de terceiro, é possível que este exerça ainda seu direito de defesa,
isto é, a sua resposta à notícia ou informação que lhe possa ser prejudicial.
Segundo Canotilho e Moreira (2007 apud SARLET; MARINONI; MITIDIERO,
2018, p. 527) o direito de resposta consiste no:

[...] instrumento de defesa das pessoas contra qualquer opinião ou imputação


de caráter pessoal ofensiva ou prejudicial, ou contra qualquer notícia ou
referência pessoal inverídica ou inexacta e é independente, quer do possível
direito à indemnização dos danos sofridos (…), quer da eventual
responsabilidade envolvida.

Assim, o direito de resposta atua como garantia do contraditório na


comunicação pública e pode ser exercida através dos mesmos meios de comunicação
pelo qual foi transmitida a notícia ou informação e na mesma amplitude e proporção
pela qual foi transmitido o agravo.
Frise-se, inclusive, que o Brasil editou lei para regular esse direito de resposta.
Trata-se da Lei nº 13.188/15 (BRASIL, 2015). Este diploma legal disciplina sobre o
exercício do direito de resposta ou retificação do ofendido em matéria divulgada,
publicada ou transmitida por veículo de comunicação social.
Prevê o art. 2º da referida lei:
Art. 2º Ao ofendido em matéria divulgada, publicada ou transmitida por veículo
de comunicação social é assegurado o direito de resposta ou retificação,
gratuito e proporcional ao agravo.
§ 1º Para os efeitos desta Lei, considera-se matéria qualquer reportagem,
nota ou notícia divulgada por veículo de comunicação social,
independentemente do meio ou da plataforma de distribuição, publicação ou
transmissão que utilize, cujo conteúdo atente, ainda que por equívoco de
informação, contra a honra, a intimidade, a reputação, o conceito, o nome, a
marca ou a imagem de pessoa física ou jurídica identificada ou passível de
identificação.
§ 2º São excluídos da definição de matéria estabelecida no § 1º deste artigo
os comentários realizados por usuários da internet nas páginas eletrônicas
40

dos veículos de comunicação social.


§ 3º A retratação ou retificação espontânea, ainda que a elas sejam
conferidos os mesmos destaque, publicidade, periodicidade e dimensão do
agravo, não impedem o exercício do direito de resposta pelo ofendido nem
prejudicam a ação de reparação por dano moral. (BRASIL, 2015)

Assim, o direito de resposta pode ser considerada uma reação à uma injusta
ofensa sofrida, através do uso indevido ou abusos dos meios de comunicação,
assumindo, verdadeiramente, uma perspectiva de desagravo. Essa reação pode se
dar, por exemplo, através de uma réplica à uma nota, da justificação ou explicações
acerca de possíveis denúncias retratadas em reportagens jornalísticas ou da
solicitação de correção/retificação de uma informação contida em uma matéria.
Hodiernamente, os meios de comunicação social assumem a forma não
somente jornais ou telejornais, mas também de revistas, sites, blogs e qualquer outro
meio hábil à transmissão da informação, Todavia, segundo o § 2º do art. 2º,
comentários realizados por usuários da internet nas páginas eletrônicas dos veículos
de comunicação social não pode ser considerado matéria, para fins de desagravo.
Observa-se ainda que, a retratação ou retificação espontânea acerca da
matéria divulgada, pelo veículo de comunicação social, ainda que a elas sejam
conferidos os mesmos destaque, publicidade, periodicidade e dimensão do agravo,
não impedem o exercício do direito de resposta pelo ofendido, nem prejudicam a
propositura de eventual ação de reparação por danos morais.
Tem-se, ademais, que o direito de resposta ou retificação deve ser exercido no
prazo decadencial de 60 (sessenta) dias, contados da data de cada divulgação,
publicação ou transmissão da matéria ofensiva, através de correspondência com
aviso de recebimento encaminhada diretamente ao veículo de comunicação social ou,
inexistindo pessoa jurídica constituída, a quem por ele responda, independentemente
de quem seja o autor da ofensa, conforme prevê o art. 3º, caput (BRASIL, 2015).
Entretanto, na hipótese de divulgação, publicação ou transmissão continuada e
ininterrupta da mesma matéria ofensiva, o prazo será contado da data em que se
iniciou o agravo (art. 3º, § 3º).
O direito de resposta ou retificação poderá ser exercido, de forma
individualizada, em face de todos os veículos de comunicação social que tenham
divulgado, publicado, republicado, transmitido ou retransmitido o agravo original (art.
3º, § 1º).
Ainda segundo a normativa, a resposta ou retificação deverá atender, quanto
41

à forma e à duração, ao seguinte: a) se o agravo for praticado em mídia escrita ou na


internet, terá a resposta ou retificação o destaque, a publicidade, a periodicidade e a
dimensão da mesma matéria que a ensejou; b) se o agravo for praticado em mídia
televisiva, deverá ter a resposta ou retificação o destaque, a publicidade, a
periodicidade e a duração da matéria que a ensejou; c) se o agravo for praticado em
mídia radiofônica, a resposta ou retificação deverá ter o mesmo destaque, publicidade,
periodicidade e a duração da matéria que a ensejou (art. 4º).
Por isso, é muito observado nos meios de comunicação sérios e consolidados,
que, antes da divulgação de uma matéria ou reportagem jornalista, o citado ou
retratado geralmente é procurado para exercer o seu direito de resposta previamente,
dando suas explicações ou explanações sobre o conteúdo da matéria, prevenindo-se,
com isso, equívocos que possam ensejar à eventuais reparações cíveis, por danos na
esfera da personalidade do indivíduo.

3.5 Da vedação à censura e o controle do abuso da liberdade de expressão

A CF/88, no seu art. 5º, IX, expressamente proíbe a instauração de qualquer


tipo de censura às manifestações expressivas da atividade intelectual, artística,
científica e de comunicação. Esta vedação, conforme pontuam Sarlet, Marinoni e
Mitidiero (2018), constituem uma reação ao passado recente, e às ordens jurídico-
constitucionais pretéritas, especialmente a instaurada durante o regime militar, que foi
palco de arbitrariedade e excessos do Estado, principalmente sobre a imprensa.
Pontue-se, contudo, que o Regime Militar não foi o único a praticar censura
contra a manifestação do pensamento na história do Brasil. Do mesmo modo, apesar
de prevista proibição constitucional à censura, a assim chamada ditadura do Estado
Novo também violou preceitos fundamentais previstos na Constituição à época,
tornando efetivamente morta a letra da lei.
Por isso, os traumas e as experiências já vividas no passado, fizeram o
constituinte de 1988 dar muito mais ênfase quanto à necessidade de se preservar a
livre circulação de ideias, vedando, assim, qualquer tipo de embaraço a esse ideal
fundamental no Estado de Direito.
Neste cenário, a Constituição de 1988 reestabeleceu, pelo menos em tese, a
livre manifestação do pensamento em suas mais variadas modalidades.
A doutrina busca definir qual seja a censura vedada pela CF/88, de forma que
42

seja possível diferenciar as situações concretas à luz do ordenamento jurídico-


constitucional. Assim, para Machado (2002 apud SARLET; MARINONI; MITIDIERO,
2018), esta consiste na restrição prévia à liberdade de expressão realizada pela
autoridade administrativa, resultante na proibição da divulgação ou veiculação de
determinado conteúdo.
Para Mendes e Branco (2017, p. 281):

[...] censura, no texto constitucional, significa ação inibitória realizada pelos


Poderes Públicos, centrada sobre o conteúdo de uma mensagem. Proibir a
censura significa impedir que as ideias e fatos que o indivíduo pretende
divulgar tenham de passar, antes, pela aprovação de um agente estatal

Sobre a abrangência deste conceito de censura, muito se discute o quanto


outras intervenções ou restrições, como por exemplo, a judicial, podem se enquadrar
na noção de censura proibida pela Constituição, e o quanto elas podem ser
consideradas legítimas constitucionalmente.
Prevalece o entendimento de que a proibição à censura deve ser compreendida
de modo amplo, de forma a abranger não somente a censura administrativa, mas
também a judicial e até mesmo a privada, na tentativa de assegurar uma larga
proteção à liberdade de expressão (SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2018).
De todo modo, é consenso que restrições prévias à liberdade de expressão só
podem ser justificadas em situações absolutamente excepcionais, em que a liberdade
de expressão esteja em conflito com outros direitos fundamentais, e, num juízo de
ponderação, esses se mostrem mais relevantes no caso concreto.
A Constituição busca privilegiar, todavia, a regra de que os eventuais abusos e
lesões à direitos fundamentais, praticados no exercício da liberdade de expressão,
devam ser compensados ou sancionados a posteriori, e não previamente.
Neste caso, por exemplo, quando a imprensa cogita publicar uma matéria que
possa macular a honra, a imagem ou a dignidade de uma pessoa, o ideal não é que
se proíba previamente a publicação, mas que, se caso publicada, esta venha
ocasionar lesões à direitos fundamentais, que sejam aplicadas as medidas
reparatórias ao dano, medidas estas que podem ser através do exercício do direito de
resposta, ou mesmo com a reparação na esfera cível (indenização pelo dano material
ou moral decorrente da violação dos direitos fundamentais), e eventual
responsabilização penal pelos ilícitos penais que possam ser cometidos (injuria,
calúnia, difamação etc) no exercício da liberdade de expressão.
43

4 O PODER JUDICIÁRIO COMO CENSOR DA IMPRENSA

Neste capítulo, analisar-se-á a liberdade de imprensa no atual cenário


sociopolítico brasileiro, buscando compreender como se dá a atuação do Poder
Judiciário, quando submetido a resolução de conflitos entre o direito à liberdade de
imprensa e os direitos fundamentais relacionados à personalidade.
Será apresentado, de forma sucinta, a importância de uma imprensa livre para
o Estado Democrático de Direito e a fundamentalidade do direito à crítica para o
exercício da profissão jornalística.
Logo depois, serão comentadas as técnicas e os cuidados que a função
jornalística profissional dispõe e que deve se utilizar na elaboração de uma
reportagem ou matéria jornalística, a fim de evitar conflitos e violações a direitos de
terceiros.
Por fim, serão apresentados casos concretos de colisões entre o direito à
liberdade de imprensa e os direitos da personalidade (honra, privacidade, imagem
etc), em que a solução dada aos conflitos pelo Poder Judiciário, inclusive pelo STF,
através do juízo de ponderação, mostrou-se criticável e levantou discussões acerca
da utilização desarrazoada da técnica da ponderação, que acaba levando a uma
verdadeira espécie censura judicial velada aos meios de comunicação e imprensa.

4.1 Uma análise da liberdade de imprensa no atual cenário sociopolítico


brasileiro

A imprensa exerce, indubitavelmente, um papel importantíssimo em qualquer


democracia do mundo. A transmissão da notícia, a denúncia de irregularidades na
sociedade e no Estado e, principalmente, a investigação e divulgação de indícios e
suspeitas da prática de crimes ou de fatos desabonadores, que possam caracterizar
desvio de condutas ou ilicitudes envolvendo, sobretudo, autoridades públicas,
políticos e poderosos, tem sido uma das principais funções sociais da imprensa.
Olhando sob outro prisma, há quem diga que a imprensa é apenas um meio de
alienação e instrumento de manipulação de massas, por supostamente defender
interesses escusos e somente divulgar matérias e notícias tendenciosas para
satisfazer os interesses da “grande mídia”. Esta, por vezes, estaria disposta a tudo,
44

até a macular a honra e imagem daqueles que são retratados em suas matérias
jornalísticas ou reportagens.
Entretanto, a sociedade brasileira vivencia, nos tempos atuais, uma era de pós-
verdade e de extrema divulgação de notícias falsas (“fake news”), principalmente
pelas redes sociais, onde há uma incontrolável proliferação de (des)informação, que
acabam gerando uma crise na sociedade e, por conseguinte, um múltiplo ataque à
imprensa, tanto do Poder Público, seja através do Executivo ou do Judiciário, quanto
de parcela da população desacreditada com os veículos de comunicação.
Desta forma, se torna cada dia mais importante discutir o papel do jornalismo
feito com qualidade, seriedade e respeitando procedimentos rigorosos de apuração,
que transmitam a informação de modo independente, imparcial e incensurável, dando
à notícia, a função social que ela efetivamente deve ter, qual seja, o de atender o
interesse público.
Acontece que, o atual cenário sociopolítico nacional – e também o internacional
– vem apostando nessa desinformação como tática para tentar desqualificar o
jornalismo tradicional e, assim, acabar se blindando de críticas e análises que podem
ser desconcertantes para os citados ou investigados pela imprensa.
Além disso, o livre exercício do jornalismo vem passando por uma crise de
amparo, especialmente, em decorrência de uma série de medidas judiciais que
acabam, na prática, instaurando uma espécie de censura velada contra a imprensa.
O que se vê, nos tempos de crises atuais, é que, quando a imprensa divulga
notícias de interesse social, denunciando possíveis ilicitudes ou desvios de conduta
por autoridades públicas e políticos, ou mesmo quando apenas relata fatos sobre
determinado agente público, sem realizar qualquer comentário ou juízo de valor sobre
o fato, realizando o jornalismo puramente informativo, calcado apenas em fatos, sofre
ela brutais ataques, tanto do campo político, quanto do jurídico.
Em conjunto, estas forças políticas e jurídicas acabam por verdadeiramente
ameaçar a liberdade de imprensa, e, por conseguinte, acabam cerceando a própria
democracia.
Para se ter uma noção do grave cenário que vivencia o Brasil, no ano de 2019,
o país figurou na 105ª posição no Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa,
elaborado pela Repórteres Sem Fronteiras (RSF). Esse ranking, publicado
anualmente desde 2002 pela RSF, é uma ferramenta de advocacy que se baseia nos
princípios da emulação entre os Estados (REPÓRTERES SEM FRONTEIRAS, 2019).
45

O objetivo do ranking é avaliar a situação da liberdade de informação nos 180


países listados e, assim, dar um panorama acerca da situação atual da liberdade de
imprensa baseada na apreciação do pluralismo, na independência dos meios de
comunicação, no ambiente midiático e autocensura, na qualidade do quadro
legislativo que regula o setor, na transparência e qualidade da infraestrutura que
sustenta a produção e na segurança dos jornalistas (REPÓRTERES SEM
FRONTEIRAS, 2019).
Entre os países da América do Sul, o Brasil fica atrás de países como o Uruguai
(19º), Chile (46º), Guiana (51º), Argentina (57º), Peru (85º), Equador (97º) e Paraguai
(99º). Isso evidencia a sensível situação que vive a imprensa brasileira, e mostra que
é preciso uma mudança deste paradigma, para que a imprensa possa exercer sua
função essencial no Estado Democrático, de forma independente, sem restrições,
nem ameaças.
Neste panorama, saliente-se, que o Poder Judiciário também tem participação
e responsabilidade, visto que, conforme demonstram os dados levantados pela
Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), através do projeto CTRL-
X, de 2006 a 2017, foram identificados 355 casos de pedidos de censura judicial prévia
à imprensa brasileira. Destes, em 96 casos – isto é, um total de 26% - a justiça
determinou que um veículo de imprensa não publicasse uma reportagem ou imagem,
ou a retirasse de circulação, ao fundamento de conflitar com direitos da personalidade
de terceiros (LUPION, 2017).
Estes dados demonstram que valores fundamentais da República e da
Constituição estão em jogo. Para Leite (2017), a legislação brasileira não define limites
claros entre a liberdade de imprensa e o direito à honra e à intimidade. Assim, cabe
aos magistrados, individualmente, decidirem sobre quais valores devem prevalecer
em caso de conflitos, e isso pode, por vezes, abrir espaço para arbitrariedades.
Pondera o professor de Direito Constitucional da PUC-RIO e coordenador do
Grupo de Pesquisa em Liberdade de Expressão no Brasil, que a liberdade de
expressão não é absoluta e que, em situações excepcionalíssimas, pode e deve haver
um controle judicial prévio e adequado, como, por exemplo, na hipóteses de um
veículo querer publicar fotos de pornografia infantil (LEITE, 2017).
Entretanto, para Leite (2017), em 99% dos casos, o Judiciário não deveria
interferir proibindo a veiculação de matérias, mas que, para reparação de eventuais
danos, existem as medidas judiciais adequadas, como a indenização por perdas e
46

danos e o direito de resposta.


Registre-se, ademais, que o Brasil apresenta uma péssima imagem em relação
a como a imprensa é sido tratada. Conforme mostra o relatório Democracy Index
2017: Free speech under attack (Ranking da Democracia 2017: Liberdade de
expressão sob ataque), elaborado pela Unidade de Inteligência e Pesquisas do
grupo The Economist (apud CAMARGO, 2018), o país se apresenta como um dos
mais perigosos para os jornalistas, onde poucos dos crimes cometidos contra os
profissionais da imprensa são investigados ou os culpados presos e processados.
Aliado à isto, os meios de comunicação denunciam sofrer pressões e ataques
pelo governo, bem como tentativas de obstrução do trabalho dos jornalistas.

4.2 A importância da liberdade de imprensa em um Estado Democrático de


Direito

Já se mencionou, a importância que a liberdade de expressão tem na


democracia. Trata-se de um instrumento essencial, pois é a livre circulação de idéias
que vai permitir que a opinião pública e a vontade popular sejam formadas.
A esse respeito, Mill (2006 apud MARMELSTEIN, 2014), um dos principais
expoentes da liberdade de expressão, defende que a verdade tem maior probabilidade
de vir à tona, quando há um livre mercado de ideais divulgadas e debatidas, de forma
que os indivíduos podem tomar decisões mais acertadas se as diversas opiniões
políticas puderem circular sem interferências.
Nesse mesmo sentido. Sarlet, Marinoni e Mitidiero (2018, p. 520) afirmam que:

[...] a relação entre democracia e liberdade de expressão é de um recíproco


condicionamento e assume um caráter complementar, dialético e dinâmico,
de modo que, embora mais democracia possa muitas vezes significar mais
liberdade de expressão e vice-versa (mais liberdade de expressão indica
mais democracia), também é correto que a liberdade de expressão pode
acarretar riscos para a democracia e esta para a liberdade de expressão.

Além do mais, uma imprensa livre e independente, também constitui uma das
pilastras da democracia, tendo em vista a importância que a imprensa exerce,
sobretudo o jornalismo investigativo, na apuração e denúncia de irregularidades e
ilicitudes, por parte das autoridades públicas.
Por essas razões, a imposição de limites ou restrições desarrazoadas à
imprensa, tais como a proibição de divulgação de matérias jornalísticas e reportagens,
47

certamente não contribui para o engrandecimento a democracia.


É que uma das maneiras mais eficientes de controle político é feita justamente
através da crítica jornalística, esta, garantida implicitamente no direito à liberdade de
expressão e de imprensa. Essa liberdade fundamental, assegurada pela Constituição,
deve ser constantemente protegida pela sociedade e pelo Estado, de forma que, por
a imprensa exercer um papel de guardiã da sociedade, investigando e informando
assuntos de interesse coletivo, os regimes democráticos não podem se desassociar
dessa garantia (BRANCO, 2018).
Assim, é latente a importância que a liberdade de imprensa tem para o
adequado funcionamento das instituições do Estado Democrático de Direito. Os
americanos, por exemplo, conforme pontua Branco (2018), consideram a liberdade de
expressão e imprensa, antes de tudo, uma das armas do cidadão em face dos abusos
do Estado e dos governantes.
A jurisprudência americana, inclusive, concede à liberdade de expressão um
status de “posição de preferência”, quando em possíveis conflitos com outros direitos
fundamentais. Para os tribunais americanos, se o ato expressivo levanta uma questão
de interesse social e promove o debate público – e, por essas razões, a própria
democracia – então ele deve ser protegido pela liberdade de expressão (BRANCO,
2018).
Existem, entre os americanos, um grande enaltecimento da liberdade de
expressão e imprensa, e, lá, é garantido a livre circulação de qualquer ideia e/ou
pensamento, ainda que algumas possam ser consideradas reprováveis socialmente,
como a divulgação de ideias racistas e preconceituosas ou mesmo incitações ao
nazismo e a outros crimes. Nesse caso, cabe a sociedade, e não ao Estado, fazer a
filtragem das ideias consideradas moralmente aceitáveis, e reprovar socialmente, as
que sejam inaceitáveis na sociedade moderna.
Ao contrário dos Estados Unidos, o Brasil não compartilha do mesmo espírito
americano, de modo que, tem-se, aqui, uma cultura pautada muito mais na restrição
da liberdade de expressão e/ou imprensa, quando esta entra em conflito com outros
direitos fundamentais - especialmente os da personalidade -, do que na livre
circulação de ideias e pensamentos.
48

4.3 O direito à crítica jornalística

Inato ao papel fundamental que exerce a imprensa na democracia, encontra-


se o direito à crítica jornalística, que deve ser assegurada, juntamente com o sigilo da
fonte, aos profissionais da imprensa.
As análises e críticas feitas pela imprensa, especialmente à governantes,
podem muitas vezes ser desconcertantes e revelar até mesmo ilicitudes à sociedade.
Por esse motivo, é comum que políticos citados em matérias jornalísticas tentem se
socorrer do Poder Judiciário para evitar a publicação de matérias, ou até mesmo se
utilizar da desinformação ou da “fake news” para tentar desqualificar ou desprestigiar
o trabalho da imprensa.
Acontece que a crítica jornalística é baseada no interesse social, e, por esse
motivo, não deve se revelar suscetível de restrição, ainda que esta seja despendida
em tom áspero, contundente, sarcástico, irreverente ou irônico, principalmente se
contra autoridades públicas e políticos.
Os políticos e qualquer um que exerça cargo ou função pública público, “devem
mesmo se sujeitar a uma exposição mais severa da mídia, inclusive para serem
criticados com mais liberdade” (MARMELSTEIN, p. 135). Não poderia ser
diferente, pois aquele se propõe a ser uma pessoa ou agente público, deve também
suportar o ônus que tal status lhe confere, dentre os quais, está a sujeição à críticas.
Por isso, defende Dworkin (2006, p. 324 apud MARMELSTEIN, 2014, p. 135)
que “o objeto de ajudar o mercado de ideias a gerar a melhor escolha de governantes
e cursos de ação política fica ainda mais longínquo quando é quase impossível criticar
os ocupantes de cargos públicos”.
Sobre o tema, o STF decidiu, na ADI 4.451/DF, ser inconstitucional, parte da
Lei nº 9.504/07, que proibia o uso de humor sarcástico (tais como o uso de charges)
no processo eleitoral, por parte da imprensa. Veja-se os fundamentos da decisão:

LIBERDADE DE EXPRESSÃO E PLURALISMO DE IDEIAS. VALORES


ESTRUTURANTES DO SISTEMA DEMOCRÁTICO.
INCONSTITUCIONALIDADE DE DISPOSITIVOS NORMATIVOS QUE
ESTABELECEM PREVIA INGERÊNCIA ESTATAL NO DIREITO DE
CRITICAR DURANTE O PROCESSO ELEITORAL. PROTEÇÃO
CONSTITUCIONAL AS MANIFESTAÇÕES DE OPINIÕES DOS MEIOS DE
COMUNICAÇÃO E A LIBERDADE DE CRIAÇÃO HUMORISTICA.
1. A Democracia não existirá e a livre participação política não florescerá onde
a liberdade de expressão for ceifada, pois esta constitui condição essencial
ao pluralismo de ideias, que por sua vez é um valor estruturante para o salutar
funcionamento do sistema democrático.
49

2. A livre discussão, a ampla participação política e o princípio democrático


estão interligados com a liberdade de expressão, tendo por objeto não
somente a proteção de pensamentos e ideias, mas também opiniões,
crenças, realização de juízo de valor e críticas a agentes públicos, no sentido
de garantir a real participação dos cidadãos na vida coletiva.
3. São inconstitucionais os dispositivos legais que tenham a nítida finalidade
de controlar ou mesmo aniquilar a força do pensamento crítico, indispensável
ao regime democrático. Impossibilidade de restrição, subordinação ou
forçosa adequação programática da liberdade de expressão a mandamentos
normativos cerceadores durante o período eleitoral.
4. Tanto a liberdade de expressão quanto a participação política em uma
Democracia representativa somente se fortalecem em um ambiente de total
visibilidade e possibilidade de exposição crítica das mais variadas opiniões
sobre os governantes.
5. O direito fundamental à liberdade de expressão não se direciona somente
a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou
convencionais, mas também aquelas que são duvidosas, exageradas,
condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas
maiorias. Ressalte-se que, mesmo as declarações errôneas, estão sob a
guarda dessa garantia constitucional.
6. Ação procedente para declarar a inconstitucionalidade dos incisos II e III
(na parte impugnada) do artigo 45 da Lei 9.504/1997, bem como, por
arrastamento, dos parágrafos 4º e 5º do referido artigo. (STF, 2018)

A crítica traduz, portanto, uma característica impregnada na função jornalística,


e é oponível aos qualquer um que exerça qualquer atividade que seja de interesse
coletivo, tendo em vista que, o interesse social, que legitima o direito de criticar, deve
se sobrepor a eventuais suscetibilidades que possam revelar as figuras públicas.
Assim, na linha do que defende Pereira (2002 apud NAPOLITANO, 2015), as
pessoas públicas, pelo simples fato de se disporem a ostentarem essa condição,
devem ter ciência e encarar os ônus e bônus da condição que ocupam, e por isso,
devem ser fortes o suficiente para suportarem as críticas que lhes são dirigidas, seja
pela imprensa ou pela sociedade.

4.4 As técnicas e cuidados do jornalismo profissional na elaboração de uma


matéria ou notícia

Buscando assegurar a dignidade da pessoa humana, o constituinte de 1988,


tratou de proteger a integridade moral do indivíduo enquanto pessoa. Assim pois, a
CF/88 prevê, em seu art. 5º, X, que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a
honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material
ou moral decorrente de sua violação” (BRASIL, 1988).
Com isso, a ordem constitucional visa proteger a individualidade-subjetiva de
cada ser humano, buscando evitar intromissões indevidas, tanto por parte do Estado,
50

quanto pela sociedade, na esfera pessoal do indivíduo.


Inserem-se nesse contexto também a imprensa, pois, devido ao amplo poder
de difusão da mídia, esta tem uma capacidade indubitável de manchar reputações e
macular a honra e a imagem das pessoas.
É por isso que, a imprensa também teus seus ônus, e deve, no exercício da
sua função, tomar alguns acautelamentos, e isto significa seguir os rigorosos padrões
técnicos de apuração da informação - resguardado, obviamente, o direito de sigilo da
fonte, conforme assegura a Constituição Federal – e divulgar a informação de maneira
a não violar a esfera subjetiva das pessoas retratadas em suas matérias jornalísticas.
Dessa forma, a maneira como é divulgada a notícia pode, por vezes, levar à
imprecisões, induções, e a violações na intimidade, privacidade, da honra e/ou da
imagem dos indivíduos.
Nessa esteira, é preciso que se diga, que os veículos de imprensa consagrados
consagrados ou queiram se consolidar, buscam seguir uma ética profissional na
elaboração e divulgação de suas matérias.
A esse despeito, não obstante o STF já ter decidido na ADPF 130, sobre a
inexigibilidade do diploma jornalístico para o exercício da profissão (STF, 2009), os
bons profissionais pautam-se por padrões técnicos do exercício da função e não pelo
amadorismo ou sensacionalismo.
Por isso, o código de ética dos jornalistas brasileiros, publicado pela Federação
Nacional dos Jornalistas (FENAJ) preconiza alguns deveres aos profissionais da
imprensa. Veja-se o art. 6º do diploma:

Art. 6º É dever do jornalista:


I - opor-se ao arbítrio, ao autoritarismo e à opressão, bem como defender os
princípios expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos;
II - divulgar os fatos e as informações de interesse público;
III - lutar pela liberdade de pensamento e de expressão;
IV - defender o livre exercício da profissão;
V - valorizar, honrar e dignificar a profissão;
VI - não colocar em risco a integridade das fontes e dos profissionais com
quem trabalha;
VII - combater e denunciar todas as formas de corrupção, em especial quando
exercidas com o objetivo de controlar a informação;
VIII - respeitar o direito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem do
cidadão;
IX - respeitar o direito autoral e intelectual do jornalista em todas as suas
formas;
X - defender os princípios constitucionais e legais, base do estado
democrático de direito;
XI - defender os direitos do cidadão, contribuindo para a promoção das
garantias individuais e coletivas, em especial as das crianças, dos
adolescentes, das mulheres, dos idosos, dos negros e das minorias;
51

XII - respeitar as entidades representativas e democráticas da categoria;


XIII - denunciar as práticas de assédio moral no trabalho às autoridades e,
quando for o caso, à comissão de ética competente;
XIV - combater a prática de perseguição ou discriminação por motivos sociais,
econômicos, políticos, religiosos, de gênero, raciais, de orientação sexual,
condição física ou mental, ou de qualquer outra natureza. (FENAJ, 2007)

Vê-se, portanto, que é exigido do jornalista uma postura ética e séria no


exercício do seu mister, de forma à não denegrir a honra e imagem das pessoas,
procurando ser o mais fidedigno e pontual quanto a descrição dos fatos, evitando que
sejam divulgadas notícias falsas, ou mesmo tendenciosas.
Assim, a imprensa dispõe de algumas técnicas jornalísticas que lhe servem
inclusive para evitar responsabilizações judiciais com pedidos
reparatórios/indenizatórios, ou até mesmo pedidos judiciais de restrição ou proibição
prévia a divulgação da reportagem, por parte dos retratados ou citados em
reportagens, em notícias e matérias que lhe podem ser comprometedoras ou que
possam ser consideradas atentatórias a honra, dignidade ou imagem e aos direitos
da personalidade.
Desta forma, os profissionais de imprensa devem sempre ouvir o maior número
de pessoas e instituições envolvidas em uma cobertura jornalística, sobretudo,
aquelas retratadas que são objetos de acusações ou denúncias não suficientemente
demonstradas ou comprovadas (FENAJ, 2007).
Além do mais, sempre que possível, as informações de interesse público,
principalmente denúncias e acusações, devem ser sempre pautadas em provas, ou
ao menos indícios, a fim de que a notícia não se mostre descreditada.
É essencial ainda que as pessoas mencionadas nas matérias jornalísticas ou
reportagens, sem tratadas com respeito pelos meios de comunicação. Isso se aplica
aos criminosos e até mesmo às autoridades públicas e políticos.
Frise-se ainda que é dever dos profissionais da imprensa e dos meios de
comunicação, “promover a retificação das informações que se revelem falsas ou
inexatas e defender o direito de resposta às pessoas ou organizações envolvidas ou
mencionadas em matérias de sua autoria ou por cuja publicação foi o responsável”
(FENAJ, 2007).
É verdade que, por ser atividade humana, e por o homem ser errôneo por
natureza, o jornalismo não está isento ao erro, todavia, repousa sobre a função uma
presunção de inocência, que deve afastar, a priori, responsabilizações por fatos
errôneos ou desvirtuados.
52

Conforme argumenta Pereira (apud NAPOLITANO, 2015), a culpabilização dos


meios de comunicação, por divulgação de notícias ou fatos inverídicos ou
desvirtuados, só deve acontecer quando restar claramente comprovado que as
ilações foram feitas com actual malice, ou seja, com notório ‘conhecimento da sua
falsidade’ ou com evidente desprezo e desconsideração pela sua veracidade ou
falsidade.
Por isso, na apuração das informações, fontes podem ser mais ou menos
confiáveis, por isso, a imprensa jornalística deve ter cuidado redobrado na hora de
checar e apurar informações verdadeiras (XAVIER; RODRIGUES, 2013).
Ademais, a opinião manifestada em meios de informação, sobretudo no
jornalismo opinativo, deve ser exercida com máxima responsabilidade.
Os jornalistas devem zelar para que a informação veiculada seja correta e
precisa, devendo o profissional da imprensa divulgar fatos que sejam de interesse
social, respeitando-se o direito à privacidade de terceiros.
O jornalismo objetivo deve ser imparcial, verdadeiro e preciso, buscando
sempre respeitar os direitos dos envolvidos nas matérias, sob pena de responder, o
meio de comunicação responsável pela divulgação, bem como o respectivo jornalista
autor da matéria, pelos danos que, por imprudência, negligência ou imperícia, vierem
a causar na esfera íntima ou moral de outrem.
A propósito, transcreva-se o teor da súmula nº 221 do STJ: “São civilmente
responsáveis pelo ressarcimento de dano, decorrente de publicação pela imprensa,
tanto o autor do escrito quanto o proprietário do veículo de divulgação” (STJ, 1999).
O fato é que, infelizmente, retratados em matérias jornalísticas, sobretudo
políticos, tentam se utilizar, além do bombardeamento à imprensa para tentar
desqualificá-la, do Poder Judiciário para tentar evitar publicações de notícias sobre si,
quando estas não lhes são agradáveis.
E esse acionamento do Poder Judiciário para tentar impedir a publicação de
uma matéria jornalística, pode, muitas vezes quando deferido, chegar a caracterizar
uma verdadeira espécie de censura velada, mesmo quando não há violações de
ordem pessoal na esfera do indivíduo.
É certo que há uma linha muito tênue entre a razoabilidade e a arbitrariedade
quando se refere a atuação do Poder Judiciário na análise de conflitos entre a
liberdade de imprensa e os direitos fundamentais, todavia, em muitos casos
concretos, é escandalosa a extrapolação dos limites razoáveis na utilização da técnica
53

da ponderação.
No tópico a seguir serão analisados alguns casos, onde o Poder Judiciário
deferiu pedidos de retirada de publicações ou matérias jornalística de circulação e/ou
determinou a sua não divulgação, buscando analisar a atuação do judiciário e
utilização da técnica da ponderação nos casos de conflitos entre a imprensa e os
direitos da personalidade.

4.5 A atuação censória do Poder Judiciário com a desarrazoada utilização da


técnica da ponderação

A censura administrativa à imprensa foi formalmente abolida pela Constituição


de 1988, que em seu artigo 5º, IX, combinado com o art. 220, caput e § 2º, vedaram
expressamente qualquer tipo de restrição prévia pelo governo aos meios de
comunicação social.
A censura governamental, adotada rotineiramente pelo Regime Militar (1964 –
1985), consistia na existência de censores do governo instalados nas redações
jornalísticas, para avaliar o que poderia ou não ser publicado, ocorrendo ainda de
acontecer de os veículos de comunicação enviarem suas matérias para o governo
aprovar a publicação ou não (LUPION, 2017).
Com a CF/88, e a vedação expressa a esse tipo de conduta, começaram a
surgir novas artimanhas para restrição à liberdade de expressão e imprensa, seja
através da falta de incentivo ou aporte financeiro, para subsidiar as artes, ou, ainda,
através do Poder Judiciário atuando como censor do que pode ou não ser divulgado
ou exposto ao público.
O acionamento do Judiciário tornou-se algo corriqueiro para tentar alcançar
decisões favoráveis que ordenem a retirada de determinado conteúdo de circulação
ou a proibição de colocada em circulação dele.
Um exemplo na literatura, trata-se da tentativa de proibir-se a publicação de
biografias não autorizadas pelo retratado ou pela família, onde, felizmente, o STF
decidiu, na ADI 4.815, pela inexigibilidade de autorização prévia para divulgação de
biografias, dando interpretação conforme a Constituição aos arts. 20 e 21 do Código
Civil, ressalvada, contudo, a possibilidade de reparação na esfera cível ou penal, em
caso de uso abusivo da liberdade de expressão que conflite com outros direitos
fundamentais, observada as circunstâncias do caso concreto (SARLET; MARINONI;
54

MITIDIERO, 2018).
Ainda, na esfera jornalística, a imprensa também passa pela censura judicial.
Esse tipo de censura ocorre quando um magistrado proíbe a divulgação de uma
reportagem, antes mesmo de sua publicação, podendo esta ocorrer por diversos
fundamentos ou argumentos, como suposta violação à honra ou à privacidade de
alguém.
Sob este argumento, o Poder Judiciário já proibiu a divulgação de várias
matérias jornalísticas. Veja-se algumas:
1) Em fevereiro de 2017, a ex-primeira-dama Marcela Temer, juntamente com
Palácio do Planalto, ingressaram na justiça para tentar impedir a publicação de uma
matéria dos jornais O GLOBO e da “A Folha de S. Paulo”, que relatava sobre uma
troca de mensagens entre a primeira-dama, e um hacker, que teve acesso ao aparelho
celular daquela, e através de chantagem, tentava extorquir dinheiro da primeira-dama.
Frise-se, contudo, que a reportagem não revelava o conteúdo das mensagens
(tampouco a intimidade ou vida privada da primeira-dama), ou sequer insinuava que
o suposto hacker teve acesso a informações que pudessem revelar cometimentos de
crimes. Apenas retratava um fato, qual seja, o de que a primeira-dama estava sendo
vítima de um crime.
O magistrado de primeiro grau, acolhendo o pedido do Palácio do Planalto,
deferiu ordem para que a reportagem fosse retirada do ar, ao fundamento de que “a
inviolabilidade da intimidade tem resguardo legal claro", e, com isso, proibiu a
divulgação de qualquer conteúdo do celular de Marcela Temer (O GLOBO, 2017).
A decisão foi reiteradamente criticada pelos órgãos de imprensa e entidades
públicas que a consideraram um verdadeiro cerceamento a liberdade de expressão e
de imprensa, e afronta a democracia, por impedir que os órgãos de imprensa
divulgassem notícias sobre pessoas públicas, e consequentemente, de interesse
social.
A Associação Brasileira de Imprensa (ABI), por exemplo, afirmou em nota que
a decisão amparada no direito à privacidade não é coerente com os direitos à
Liberdade de Imprensa e Livre Acesso à Informação (apud O GLOBO, 2017).
Felizmente, a decisão foi reformada em segunda instância, através de liminar,
e a reportagem foi publicada normalmente, mas não antes sem uma enorme
repercussão acerca da tentativa de restrição à liberdade de imprensa, considerando,
sobretudo, o período turbulento e de bastante agitação que vive a democracia
55

brasileira.
2) Outro caso conhecido, ocorreu, no presente ano de 2019, onde o ministro do
STF, Alexandre de Moraes, determinou a retirada do ar de uma matéria do site O
Antagonista e da revista Crusoé, a qual faziam citações ao presidente da Côrte, Dias
Toffoli.
A matéria intitulada “O amigo do amigo de meu pai”, fazia referência às
investigações da operação Lava-Jato, em que a defesa do empresário Marcelo Odebrecht
teria juntado em um dos processos judiciais que corre contra ele na Justiça Federal, um
documento no qual esclareceu que um indivíduo mencionado em email como o "amigo do
amigo do meu pai", seria Dias Toffoli.
Relata a reportagem que, no e-mail, Marcelo Odebrecht dialogava com um
advogado e com um executivo da construtora Odebrecht, a respeito se há haviam
"fechado" com o "amigo do amigo". Frise-se que, não havia nenhuma menção a dinheiro
ou a pagamentos de nenhuma espécie no referido e-mail, tampouco algo que indicasse
uma possível conduta desabonadora do atual ministro-presidente do STF.
O e-mail, segundo o empresário, referia-se à tratativas que tinha o advogado da
empreiteira a Advocacia-Geral da União (AGU) sobre assuntos que envolviam as usinas
hidrelétricas do Rio Madeira.
Analisando minuciosamente a matéria, nota-se que não havia nenhuma ilicitude,
por parte do site ‘O Antagonista’ e da revista ‘Crusoé’, na reportagem censurada, pois ela
apenas noticiava um fato, que frise-se, era verídico.
Não era falsa a matéria de que o empresário já condenado pela Lava-Jato, Marcelo
Odebrecht, havia dado esclarecimentos à força-tarefa da Lava Jato sobre o e-mail e citado
o nome do referido ministro, e estava, inclusive, baseada em documentos.
Todavia, a notícia foi censurada judicialmente, pelo ministro do STF, Alexandre de
Moraes, que considerou que a matéria era injuriosa e difamatória à integrante da Corte,
supostamente tendenciosa e ilegal, classificando-a como “fake news”. (G1, 2019)
Assim, a decisão também foi alvo de críticas, sobretudo em razão dos fundamentos
que levaram a ordem de retirada da matéria de circulação, tendo em vista que, para avaliar
que a notícia era injuriosa e difamatória, o ministro relator, apenas levou em consideração
uma nota da Procuradoria-Geral da República (PGR) de que não teria recebido qualquer
informação da força tarefa da Lava-Jato sobre a menção ao nome do ministro, para que
aquele órgão decidisse pela investigação ou não do fato, aspecto este considerado lateral
das investigações.
56

Decisões como estas mostram-se extremamente graves, e argumentos como os de


que a suposta extrapolação dos limites à liberdade de expressão que causem uma violação
à honra, imagem, privacidade das pessoas, justificam a restrição judicial à uma imprensa
livre, apresenta-se como perigosos à democracia.
Não se pode censurar a imprensa, ou mesmo qualquer cidadão que manifeste seu
pensamento, com fundamentos tão frágeis. A estratégia de adjetivar qualquer notícia
que desagrade aos poderosos de turno como “fake news” vem se espalhando de
maneira deletéria, ferindo cada vez mais nossa combalida democracia brasileira.
Essa tese não pode prevalecer, sob risco de vermos calados os críticos ao humor
dos juízes. É um absurdo que deve ser combatido (THE INTERCEPT BRASIL,
2019).
A utilização da técnica da ponderação, em casos como estes, mostra-se
extremamente desarrazoada, pois, quando em conflito, o interesse público de uma notícia,
decorrente da liberdade de imprensa, com direitos da personalidade de autoridades públicas
e políticos poderoso, deve aquele prevalecer.
O debate público enriquece a democracia, e à sociedade cabe fazer a análise da
credibilidade de uma notícia, ou ainda da sua veracidade. O Poder Público falha nesta
análise, e por vezes acaba retrocedendo em nossa democracia, para praticar atos de
censura, de maneira camuflada, seja propositalmente ou não.
Ao Poder Judiciário cabe a restauração ou reparação do status quo ante do
prejudicado em eventuais abusos da liberdade de expressão que verdadeiramente
caracterizem em danos para a honra, imagem, privacidade/intimidade ou qualquer direito da
personalidade. Essa reparação, diga-se a propósito, deve ser a posteriori.
Fala-se muito no Brasil, na prevenção do dano, com instrumentos judiciais como a
tutela inibitória, ou acautelamento, para camuflar os novos meios de censura. A interpretação
dada à lei processual é distorcida, para satisfazer o desejo daqueles que não querem ser
delatados em matérias jornalísticas, e com isso restringir a liberdade pública, principalmente
a liberdade de expressão.
Ao que parece, nosso ordenamento deve ser muito mais calcado na tutela reparatória
e não na inibitória, e com isso a livre circulação de informações, ideias, notícias, e
pensamentos deve ser o mais amplo possível.
Portanto, deve se ter em mente que o espírito da Constituição Federal é o de não
restringir a liberdade de expressão, mas de reparar a posteriori os abusos no exercício deste
direito. Até porque o princípio da dignidade da pessoa humana possui múltiplas dimensões,
57

e entre elas inclui-se a liberdade de expressão e de imprensa.


58

5 METODOLOGIA

O presente trabalho buscou trazer uma análise crítica-reflexiva acerca da


atuação do Poder Judiciário no controle de conflitos entre o direito à liberdade de
imprensa e outros direitos fundamentais, e, para a consecução dos fins e objetivos
propostos, utilizou-se na pesquisa uma abordagem qualitativa.
A utilização desse tipo de abordagem diferencia-se da abordagem quantitativa
pelo fato de não utilizar dados estatísticos como o centro do processo de análise de
um problema, não tendo, dessa maneira, a prioridade de numerar ou medir unidades.
Nos ensinamentos de Mezzaroba e Monteiro (2017, p. 138):

A pesquisa qualitativa também pode possuir um conteúdo altamente


descritivo e pode até lançar mão de dados quantitativos incorporados em
suas análises, mas o que vai preponderar sempre é o exame rigoroso da
natureza, do alcance e das interpretações possíveis para o fenômeno
estudado e (re)interpretado de acordo com as hipóteses estrategicamente
estabelecidas pelo pesquisador.

Nesse sentido, os dados coletados na pesquisa são mais descritivos,


retratando o maior número possível de elementos existentes na realidade estudada.
A utilização da abordagem qualitativa não impede, todavia, a apresentação de
dados estatísticos, como foi feito quanto aos dados da ABRAJI, acerca da quantidade
e percentual de casos de pedidos de censura judicial deferidos pela Justiça, e dos
dados da RSF, acerca da posição do Brasil no ranking mundial de liberdade de
imprensa
A apresentação e análise destes dados foi meramente para se ter uma
referência acerca da situação da liberdade de imprensa no Brasil, não sendo o foco e
nem a prioridade medir ou numerar estatísticas, posto que a maioria do trabalho
pautou-se no estudo das informações descritivas apresentadas.
Quanto aos fins da pesquisa, utilizou-se do método exploratório, tendo como
técnica de coleta de dados, o levantamento bibliográfico.
As pesquisas exploratórias, nos dizeres de Gil (2017, p. 27):

[...] têm como propósito proporcionar maior familiaridade com o problema,


com vistas a torna-lo mais explícito ou a construir hipóteses. Seu
planejamento tende a ser bastante flexível, pois interessa considerar os mais
variados aspectos relativos ao fato ou fenômeno estudado.

Assim, método exploratório tem o fim de proporcionar o levantamento de


59

informações sobre tema estudado, possibilitando a definição e delineamento do tema


de pesquisa.
Quanto à técnica de coleta de dados, Marconi e Lakatos (2017, p. 33) ensinam
que o levantamento bibliográfico “é um tipo específico de produção científica: é feita
com base em textos como livros, artigos científicos, ensaios críticos, dicionários,
enciclopédias, jornais, revistas, resenhas, resumos”. Assim, essa técnica consiste em
uma sondagem de toda a bibliografia já publicada sobre o tema, incluindo livros
doutrinários, revistas jurídicas, publicações avulsas, documentos eletrônicos, artigos
científicos e outros documentos, refletindo em um contato direto com tudo o que foi
escrito sobre este determinado assunto.
Para a produção do presente trabalho, utilizou-se bastante do estudo de obras
doutrinárias e artigos científicos acerca de Direito Constitucional, Direitos
Fundamentais, Liberdades em geral, Liberdades de expressão, Liberdade de
Imprensa, entre outros, conforme referências.
Por fim, o trabalho utilizou-se, quanto à abordagem, do método dedutivo. O
método de abordagem, difere dos métodos de procedimento, por se situarem em
níveis claramente distintos, na medida que o método de abordagem se caracteriza por
ter uma abordagem mais ampla, com nível de abstração mais elevado, dos fenômenos
da natureza e da sociedade (MARCONI; LAKATOS, 2017).
Pelo método dedutivo, nas lições de Mezzaroba e Monteiro (2017), parte-se de
argumentos abstratos ou gerais (premissas maiores) para argumentos particulares ou
específicos (premissas menores), de forma à levar a uma conclusão lógica entre as
premissas estabelecidas.
Vê-se a utilização deste método no desenvolvimento dos capítulos, pois,
iniciou-se trazendo um estudo mais amplo, apresentando a teoria geral dos direitos
fundamentais, e foi-se afunilando-se acerca do tema, aprofundando-se nas
especificidades da liberdade de expressão e imprensa, para, fim, adentrar-se, ainda
mais especificamente, no cerne do tema proposto, qual seja a atuação do poder
judiciário como censor da imprensa.
60

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por todo o exposto, vê-se que, no Brasil, a liberdade de imprensa é algo ainda
a ser aprimorado e trabalhado para que a democracia alcance melhores níveis de
excelência.
Não restam dúvidas da importância da tutela constitucional dada aos direitos
da personalidade, por serem estes a incorporação do princípio da dignidade humana.
Todavia da mesma forma, a liberdade de expressão e imprensa também constituem
expressão da dignidade humana, de forma que não há como se pensar em uma
sociedade moderna, pautada por padrões que valorizem à democracia, sem que haja
uma verdadeira garantia de as pessoas manifestarem seu pensamento, de fazerem
críticas, de transmitir informações livremente.
Por isso, o presente trabalho buscou avaliar a atuação censória do poder
judiciário brasileiro, quando submetida à resolução de conflitos entre a liberdade de
imprensa e outros direitos fundamentais da personalidade.
Os objetivos propostos foram devidamente alcançados através dos
desenvolvimentos dos capítulos.
No capítulo 2 foi desenvolvida uma noção básica acerca de teoria geral dos
direitos fundamentais, relacionando conceitos e apresentando os aspectos
fundamentais para a compreensão do tema.
No terceiro capítulo, foram apresentadas as diversas modalidades do direito à
liberdade de expressão no ordenamento jurídico brasileiro, onde foi demonstrada a
evolução histórico-constitucional é legal, bem como o âmbito de proteção dada a esse
direito no Brasil.
Por fim, no capítulo 4 foi analisado como se o Poder Judiciário acaba fazendo
as vezes de censor da imprensa. Neste capítulo foi teve-se um panorama da liberdade
de imprensa no atual cenário sociopolítico brasileiro, e trouxe-se informações
relevantes sobre o exercício da profissão jornalística.
Discutiu-se ainda a atuação do Poder judiciário, quando submetido a resolução
de conflitos entre o exercício livre da imprensa e direitos fundamentais dos retratados
ou citados em notícias, matérias ou reportagens jornalísticas.
Para tanto foram vistos dois casos concretos, onde analisou-se essa atuação
na prática, argumentando sobre como se desenvolve a resolução de conflitos entre os
61

direitos fundamentais utilizando a técnica da ponderação.


Criticou-se os excessos e arbitrariedades praticados pelo Poder Judiciário na
utilização desta técnica que acabou se caracterizando em verdadeira censura judicial
contra os meios de imprensa.
Quanto a resposta a pergunta-problema (De que forma, o Poder Judiciário
excede os limites da sua função constitucional, para acabar atuando como
instrumento de censura da imprensa?), tem-se que, esta acontece quando o Judiciário
faz uma utilização desarrazoada do princípio da ponderação, ordenando a não
publicação de matérias e reportagens jornalísticas, ou a sua retirada de circulação,
por supostamente violar os direitos da personalidade dos retratados.
Viu-se que estes que se socorrem ao Judiciário, geralmente são autoridades
públicas e/ou políticos (que pelo status que ocupam devem ser constantemente
fiscalizados, inclusive pela imprensa) descontentes com o teor da informação
divulgada pela imprensa.
Fica a conclusão de que o Poder Judiciário deve ser mais criterioso na
análise desses possíveis conflitos, e somente restringir a liberdade de
expressão/imprensa em casos extremos, que sejam plausivelmente justificáveis,
evitando, sempre que possível, o argumento de que a liberdade de imprensa não deve
servir de salvaguarda para as violações de direitos da personalidade dos retratados
em matérias – principalmente em se tratando de autoridades públicas e políticos -,
para, com isso, praticar verdadeiros atos de censura judicial.
Outrossim, é preciso uma mudança comportamental por parte dos agentes
políticos, que, sem muita razão, acionam o Judiciário para que ele satisfaça os seus
interesses pessoais de não ver divulgada uma notícia que lhes desagradam, mesmo
que está não viole concretamente sua honra, sua imagem, ou invada a intimidade ou
vida privada destes.
Certamente, sem uma mudança desse quadro caótico que vive a liberdade de
imprensa no Brasil, a democracia brasileira se encontrará em sensível estado de
alerta.
62

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STF. Supremo Tribunal Federal. Ementa: Delação anônima. Comunicação de fatos


graves que teriam sido praticados no âmbito da administração pública. Situações
que se revestem, em tese, de ilicitude (procedimentos licitatórios supostamente
direcionados e alegado pagamento de diárias exorbitantes). A questão da vedação
constitucional do anonimato (cf, art. 5º, IV, "in fine"), em face da necessidade ético-
jurídica de investigação de condutas funcionais desviantes. Obrigação estatal, que,
imposta pelo dever de observância dos postulados da legalidade, da impessoalidade
e da moralidade administrativa (cf, art. 37, "caput"), torna inderrogável o encargo de
apurar comportamentos eventualmente lesivos ao interesse público. Razões de
interesse social em possível conflito com a exigência de proteção à incolumidade
moral das pessoas (cf, art. 5º, X). O direito público subjetivo do cidadão ao fiel
desempenho, pelos agentes estatais, do dever de probidade constituiria uma
limitação externa aos direitos da personalidade? Liberdades em antagonismo.
Situação de tensão dialética entre princípios estruturantes da ordem constitucional.
Colisão de direitos que se resolve, em cada caso ocorrente, mediante ponderação
dos valores e interesses em conflito. Considerações doutrinárias. Liminar indeferida.
Decisão em Mandado de Segurança nº 24.369-DF. Conselho Federal de Farmácia –
CFF, Antônio César Cavalcanti Júnior e outro(a/s), Tribunal de Contas da União –
65

TCU e Relator da representação nº 014.784/2002-1 do Tribunal de Contas da União.


Relator: Ministro Celso de Mello. Data de julgamento: 10/10/2002, Data de
publicação: DJ 16/10/2002 PP-00024. Informativo STF 286. STF, 2002. Disponível
em:
<http://www.stf.jus.br/portal/informativo/verInformativo.asp?s1=lei+imprensa&pagina
=123&base=INFO>. Acesso em: 10 nov. 2019.

STF. Supremo Tribunal Federal. Ementa: Liberdade de expressão e pluralismo de


ideias. Valores estruturantes do sistema democrático. Inconstitucionalidade de
dispositivos normativos que estabelecem previa ingerência estatal no direito de
criticar durante o processo eleitoral. Proteção constitucional as manifestações de
opiniões dos meios de comunicação e a liberdade de criação humoristica. Ação
Direta de Inconstitucionalidade nº 4.451-DF. Associação Brasileira de Emissoras De
Rádio e Televisão – ABERT, Congresso Nacional e Presidente da República.
Relator: Ministro Alexandre de Moraes. Data de julgamento: 21/06/2018, Data de
publicação: DJE 06/03/2019 - ATA Nº 22/2019. Disponível em:
<http://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15339639568&ext=.pdf>.
Acesso em: 12 nov. 2019.

STF. Supremo Tribunal Federal. Ementa: Arguição de descumprimento de preceito


fundamental (ADPF). Lei de imprensa. Adequação da ação. Regime constitucional
da "liberdade de informação jornalística", expressão sinônima de liberdade de
imprensa. A "plena" liberdade de imprensa como categoria jurídica proibitiva de
qualquer tipo de censura prévia. A plenitude da liberdade de imprensa como reforço
ou sobretutela das liberdades de manifestação do pensamento, de informação e de
expressão artística, científica, intelectual e comunicacional. Liberdades que dão
conteúdo às relações de imprensa e que se põem como superiores bens de
personalidade e mais direta emanação do princípio da dignidade da pessoa humana.
O capítulo constitucional da comunicação social como segmento prolongador das
liberdades de manifestação do pensamento, de informação e de expressão artística,
científica, intelectual e comunicacional. Transpasse da fundamentalidade dos
direitos prolongados ao capítulo prolongador. Ponderação diretamente constitucional
entre blocos de bens de personalidade: o bloco dos direitos que dão conteúdo à
liberdade de imprensa e o bloco dos direitos à imagem, honra, intimidade e vida
privada. Precedência do primeiro bloco. Incidência a posteriori do segundo bloco de
direitos, para o efeito de assegurar o direito de resposta e assentar
responsabilidades penal, civil e administrativa, entre outras consequências do pleno
gozo da liberdade de imprensa. Peculiar fórmula constitucional de proteção a
interesses privados que, mesmo incidindo a posteriori, atua sobre as causas para
inibir abusos por parte da imprensa. Proporcionalidade entre liberdade de imprensa
e responsabilidade civil por danos morais e materiais a terceiros. Relação de mútua
causalidade entre liberdade de imprensa e democracia. Relação de inerência entre
pensamento crítico e imprensa livre. A imprensa como instância natural de formação
da opinião pública e como alternativa à versão oficial dos fatos. Proibição de
monopolizar ou oligopolizar órgãos de imprensa como novo e autônomo fator de
inibição de abusos. Núcleo da liberdade de imprensa e matérias apenas
perifericamente de imprensa. Autorregulação e regulação social da atividade de
imprensa. Não recepção em bloco da Lei nº 5.250/1967 pela nova ordem
constitucional. Efeitos jurídicos da decisão. Procedência da ação. Arguição de
Descumprimento nº 130-DF. Partido Democrático Trabalhista – PDT, Presidente da
66

República e Congresso Nacional. Relator: Ministro Ayres Brito. Data de julgamento:


30/04/2009, Data de publicação: DJe-208 06/11/2009 EMENT VOL-02381-01 PP-
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