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Brasília
2009
0
TERMO DE APROVAÇÃO
________________________________
Professora Dra. Leila Maria Da Judá Bijos
Orientador
__________________________________
Professor
__________________________________
Professor
Examinador
Brasília
2009
1
Aos meus pais Razanil e Zilma e meus irmãos,
Diego e Rafael pelo apoio, à minha família e a
todos os meus amigos por estarem perto
quando precisei.
2
AGRADECIMENTO
Agradeço primeiramente a Deus que meu deu a vida, permitiu que eu chegasse até
aqui e realizasse esse sonho.
Agradeço aos meus pais que me incentivaram sempre, não medindo esforços e,
muitas vezes deixaram de fazer coisas importantes, para que eu pudesse chegar até aqui. Meus
irmãos, que do jeito deles, estiveram caminhando ao meu lado e me dando forças.
Não posso esquecer jamais de agradecer aos meus avós Seu Zé e Dona Marieta, pela
fé e esperança em mim. Meus tios queridos, João e Zilda, que viram em mim a possibilidade
de ser uma profissional que contribui para um mundo melhor. Se todos contassem com o
apoio de pessoas como vocês, a caminhada tornar-se-ia bem mais leve. Ao tio Luiz, exemplo
de pessoa, profissional competente e pai coruja, você é muito amado. Aos outros tios e tias,
não se sintam enciumados, o meu agradecimento a vocês é de igual importância.
Meus amigos tão amados que conheci ao longo da caminhada, que passaram a fazer
parte da minha vida, escrevendo páginas na minha história e jamais serão apagados ou
esquecidos. Josileuda, que me ensinou que a vida é um campo de batalhas e que sozinho
ninguém vence uma guerra. Maíra, presente da vida, presente de Deus, a pequena de coração
imenso, você me ajudou a enxergar que somente eu poderia ser dona do meu caminho e me
ajudou a caminhar. Beatriz (irmão do coração), Joyce (minha outra metade), Vanda, Nayra,
Raquel e Viviane, vocês trazem alegria para o meu viver.
Meus queridos professores, meus mestres, obrigada por me mostrar que é possível ser
um profissional de qualidade sem deixar de ser humano. Por ensinarem não apenas conteúdos
doutrinários, mas lições que levaremos para a vida. Destaco aqui a minha orientadora de
Monografia, Leila Maria Da’Juda Bijos, que com toda a paciência e compreensão acreditou
em mim e me mostrou que eu era capaz.
Sou igualmente grata ao Profº. Paulo Bosco de Souza que me ensinou que não há êxito
sem sacrifícios e me mostrou que pensar é o melhor caminho. Ao Profº. Silvio Costa, amigo,
que gentil e pacientemente me ajudou com o trabalho de conclusão. Aos meus colegas da
turma de Sociologia Geral e Jurídica, por me tomarem como um apoio na caminhada de
vocês. Ao meu amigo “Rider” que, em muitas tardes, contribuiu com meu conhecimento
jurídico e me presenteou com lições importantes sobre a vida.
Enfim, agradeço a todos que comigo estiveram nestes longos anos de jornada
acadêmica, esta vitória também pertence a vocês. Obrigada sempre!
3
"Mais vale um juiz bom e prudente que uma
lei boa. Com um juiz mau e injusto, uma lei
boa de nada serve, porque ele a verga e a torna
injusta a seu modo"
(Código Geral da Suécia, 1734)
4
RESUMO
5
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO............................................................................. 06
2. CAPÍTULO 1 - HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO DAS
CIÊNCIAS JURÍDICAS................................................................ 10
2.1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS....................................................... 10
2.2. A INTERPRETAÇÃO JURÍDICA.................................................. 13
2.3. AS FORMAS DE INTERPRETAÇÃO........................................... 14
2.4. A DIFERENÇA ENTRE HERMENÊUTICA E
INTERPRETAÇÃO....................................................................... 16
3. CAPÍTULO 2 – A HERMENÊUTICA NA HISTORIA, NA FILOSOFIA
E NA CONTEMPORANEIDADE.............................. 18
3.1 RAÍZES FILOSÓFICAS DA HERMENÊUTICA............................ 18
3.2. HABERMAS E A ESCOLA DE FRANKFURT – A CONSTRUÇÃO
DA TEORIA CRÍTICA........................................ 19
3.3. A PRÁTICA HERMENÊUTICA NO DIREITO............................... 22
3.4. CHAÏM PERELMAN E A TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO.......... 23
3.5. A HERMENÊUTICA PARA A CONTEMPORANEIDADE............ 24
4. CAPÍTULO 3 – A APLICAÇÃO DO MÉTODO JURÍDICO E
INTERPRETAÇÃO JURISPRUDENCIAL.................................... 27
4.1. AS FONTES DO DIREITO........................................................... 27
4.2. O direito romano e o common law................................................ 28
4.2.1. O direito romano........................................................................... 28
4.2.2. O common law.............................................................................. 31
4.3. OS COSTUMES........................................................................... 32
4.3.1. As espécies de costumes............................................................. 33
4.4. A LEI – CONCEITO, FORMAÇÃO E APLICAÇÃO...................... 35
4.4.1. Os caracteres da lei...................................................................... 36
4.4.2. A classificação das leis................................................................. 37
4.4.3. O processo de formação das leis................................................. 39
4.4.4. A aplicação das leis...................................................................... 40
4.5. A DOUTRINA............................................................................... 40
4.6. PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO....................................... 42
4.1.1. As lacunas da lei.......................................................................... 42
4.2. A ANALOGIA............................................................................... 43
5. CAPÍTULO 4 – A JURISPRUDÊNCIA COMO MÉTODO
HERMENÊUTICO DE APLICAÇÃO DO DIREITO....................... 44
5.1. O CONCEITO DE JURISPRUDÊNCIA E SUA EVOLUÇÃO NO
TEMPO......................................................................................... 45
5.2. ESTUDO DE CASO – SUZANE LOUISE VON RICHTHOFEN... 46
5.2.1. A história de Suzane.................................................................... 47
5.2.2. O tipo penal.................................................................................. 51
5.2.3. A tese da defesa e acusação....................................................... 51
6. CONCLUSÃO.............................................................................. 63
7. REFERÊNCIAS............................................................................ 66
6
1. INTRODUÇÃO.
7
sem fazer com que a hermenêutica estivesse enraizada em si, mas sem torná-la
parte da filosofia.
Grandes autores foram estudados, Hans-Georg Gadamer, é sem dúvida,
um dos que apresenta o texto mais compreensivo sobre o tema e, em Verdade e
Método, ele reproduz muitas lições aprendidas com Heiddeger, outro grande filósofo
alemão que estudou e analisou cuidadosamente a ars interpretandi.
A Escola de Frankfurt é uma denominação dada ao Instituto de Pesquisa
Social, fundado em 1923, pelo economista austríaco Carl Grumberg, editor do
Arquivo para a História do Pensamento Operário – os Arquivos de Grumberg,
visavam preencher uma lacuna existente nas ciências sociais: a história do
movimento operário e do socialismo.
Esta escola fundamentava-se no pensamento Marxista, contudo o
sentimento anticomunista e o fato de seus colaboradores não terem adotado o
espírito e a letra do pensamento de Marx e o do marxismo da época.
O objetivo geral da Escola de Frankfurt era uma crítica ao pensamento
sistemático, para tanto, utilizava-se de ensaios, artigos de circunstâncias e
resenhas, que sugeria uma idéia de algo inacabado e incompleto, portanto, aberto a
sugestões e modificações nas linhas de pensamento, diferentemente do livro, que
encerrava uma direção única para suas conclusões.
Habermas traz em seus escritos muito da Escola de Frankfurt, que, à sua
época já se havia consolidado. A Teoria da ação comunicativa, que pode ser
compreendida, em linhas gerais, como uma teoria da sociedade fundamentada por
métodos sócio-filosóficos e de filosofia de linguagem.
A Ação Comunicativa é uma das principais teorias desenvolvidas por Jürgen
Habermas. Introduzida pela obra Teoria da Ação Comunicativa, publicada em 1981,
pode ser compreendida, como a teoria da sociedade moderna fundamentada por
métodos da sociologia, filosofia social e filosofia da linguagem.
A prática da hermenêutica no Direito é considerada aqui uma tarefa difícil,
mas não impossível, visto que o direito é um discurso e tem um peso enorme na
sociedade, sendo um discurso, precisa ser estudado em sua integridade.
O direito é um discurso, é interpretação, mas é também argumentação.
Chäim Perelman é citado no trabalho por sua Teoria da argumentação, que buscava
8
um eixo na argumentação sobre em que momento esta, envolvida do raciocínio
jurídico pode ser aplicada ao caso concreto.
Enfim, nessa parte filosófica, apresenta-se a importância da Hermenêutica
na Contemporaneidade. Buscando não somente uma compreensão positiva do
direito, mas o caráter social que reveste essa ciência.
Num terceiro momento, busca-se o entendimento acerca das fontes do
Direito. O Direito brasileiro, baseado no direito romano, apresenta-se com as
seguintes fontes materiais; a lei, a doutrina, os costumes, a analogia e a
jurisprudência. Esta última é o objeto mais importante do nosso estudo.
Neste capítulo também foi preciso buscar uma base histórica para as fontes
de direito que formam o direito material, encontrando, também, no direito romano,
tal alicerce, mas com influências de outros povos, como os ingleses e o sistema
common law, baseado, acima de tudo na prática costumeira.
Por fim, estudamos a jurisprudência e a importância dela nos dias atuais,
como ela surge, como é feita e como se aplica a casos posteriores.
O objetivo primeiro deste trabalho é fazer uma ligação intrínseca entre
hermenêutica e jurisprudência e, como a segunda pode ser utilizada como método
hermenêutico de aplicação do direito.
Indo mais fundo, o trabalho busca uma compreensão sobre o pensamento
jurídico dos juízes na hora de aplicar ou não a lei a um caso concreto, tomando
como base o precedente jurisprudencial formulado anteriormente.
O tema foi escolhido exatamente pela complexidade que há em fazer um
julgamento de uma pessoa. Partindo do princípio de que o direito é a justiça,
reiterando pensamento já formulado, buscou-se o entendimento de porque, em
alguns momentos, a lei não é aplicada ao caso concreto. Por exemplo, no caso da
jovem Suzane Von Richthofen, acusada e julgada pelo crime de duplo homicídio
cometido contra os pais em 2002. A jovem continua presa até o momento, mesmo
preenchendo requisitos legais para estar em liberdade, os julgadores do caso,
entendem que ela é dissimulada e manipuladora e, por isso a mantém em cárcere.
Pretende-se, com este trabalho, contribuir para o entendimento da
jurisprudência brasileira, tomando o caso acima citado como exemplo a ser
estudado.
9
A pesquisa foi feita a partir do método descritivo, tendo como características
fundamentais a observação dos fatos, para analisá-los e descrevê-los, bem como
fazer uma correlação entre os fatos acontecidos.
A pesquisa assume a responsabilidade de entender como a hermenêutica é
aplicada a um caso concreto através das decisões jurisprudenciais.
Por fim, apresenta-se no método descritivo utilizado na pesquisa, um estudo
de caso, tal como foi falado, o caso a ser estudado por este trabalho é a ex-
estudante de direito Suzane Louise Von Richthofen, a origem de sua família, o meio
social em que vivia a jovem, sua família, as motivações da mesma para planejar e
executar a morte dos pais.
Como a mídia enxerga o caso de Suzane, e como este é visto pelo
judiciário.
O trabalho foi organizado em capítulos, como foi dito, buscando
primeiramente, uma passagem pela história da hermenêutica, uma distinção desta
com a interpretação, um estudo explicativo sobre as fontes do direito e por fim, a
análise do caso.
10
2. CAPÍTULO 1 - HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO DAS
CIÊNCIAS JURÍDICAS.
1
FERREIRA, Nazaré do Socorro Conte. Da Interpretação à Hermenêutica Jurídica – Uma leitura de
Gadamer e Dwuorkin. Porto Alegre, Sérgio Antonio Fabris Editor, 2004. p. 17.
2
GADAMER, Hans-Georg. Verdade e método II. Tradução de ÊnioPaulo Giachini, revisão da tradução por
Márcia de Sá Calvancanti-Shuback, Petrópolis-RJ. Editora Vozes, 2004. p. 112.
3
GADAMER, Hans-Georg. op. cit p. 113.
11
interpretandi), por outra parte, para se referir à teoria estrutural, i.e, ao
ensino da conexão entre signo e significado (signum e res) e,
particularmente, na teologia, com base nesta expressão, foi elaborada uma
classificação dos possíveis significados de um texto: sentido literal, moral e
4
anagógico.
4
SILVA, Kelly Susane Alflen da. Hermenêutica e concretização judicial. Porto Alegre, 2000. Editor Sérgio
Antonio Fabris. p. 48.
5
GADAMER, Hans-Georg. op. cit p. 114.
6
GADAMER, Hans-Georg. op. cit p. 115.
7
REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. São Paulo, 2001 – Editora Saraiva. p. 261
8
SILVA, Kelly Susane Alflen da., op. cit p. 47.
12
dizer que ela pretende libertar a ciência jurídica de todos os elementos que
9
lhe são estranhos. Esse é o seu princípio metodológico fundamental.
9
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Tradução: João Baptista Machado. São Paulo, 1999 – Editora
Martins Fontes. p. 01.
10
PERELMAN, Chaïm. Nova Retórica. Tradução: Maria Ermantina Galvão, Revisão Técnica Dr. Gildo
Rios. São Paulo, 2000 – Editora Martins Fontes. p. 31
11
GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do Direito. Rio de Janeiro, 1999 – Editora Forense.
p. 217
12
PERELMAN, Chaïm. op. cit p. 31.
13
REALE, Miguel. Lições preliminares do Direito. São Paulo, 2001 – Editora Saraiva. p. 261.
13
Perelman questiona a clareza dos textos jurídicos, de que modo eles
deveriam ser para que fossem considerados textos claros, com o seguinte
Poderíamos pretender que um texto é claro quando a cada um de seus
termos corresponde a uma única idéia e a construção gramatical da frase
não dá margem a nenhuma ambigüidade, de modo que qualquer pessoa
14
sensata deveria compreender o texto do mesmo modo?
14
PERELMAN, Chaïm. op. cit p. 50.
15
BASTOS, Celso Ribeiro de. Hermenêutica e interpretação Constitucional. São Paulo, 2002 – Celso
Bastos Editora. p. 19
16
BASTOS, Celso Ribeiro de. op. cit 30.
14
Dessa forma, necessário se faz tomar partido da interpretação para que se
possa aplicar o Direito. A partir da análise parcial da letra da lei – o Direito positivado
– deve-se alcançar um discurso compreensível e organizado.
E é esse o papel da interpretação no mundo do Direito, o de trazer sentido
aos textos legais para que se possa aplicar aos casos concretos das realidades
sociais. Buscar o real significado da norma e os elementos constitutivos que serão
aplicados ao caso concreto.
17
COSTA, Dilvanir José da. Curso de hermenêutica jurídica, Rio de Janeiro, 1997 - Editora Del Rey. p. 76.
18
FRANÇA, R. Limongi., op. cit,. p. 08
15
A interpretação lógica, também chamada de teleológica, vai mais além,
buscando a intenção da lei (mens legis). Para o autor a interpretação lógica é aquela
que se leva a efeito, mediante a perquirição do sentido das diversas locuções e
orações do texto legal, bem assim através do estabelecimento da conexão entre os
mesmos.19 É somente graças à interpretação lógica e gramatical que, segundo a
Escola Exegese, o jurista cumpria o seu dever primordial de aplicador da lei, de
conformidade com a intenção original do legislador.20
A interpretação histórica leva em consideração, principalmente, todo o
contexto em que aquela lei foi criada, desde as discussões acerca do assunto em
pauta, até o momento de sua promulgação, a passagem do tempo e a
transformação da lei, e, principalmente as alterações sofridas buscando a intenção
do legislador (mens legislatoris). E, ainda quanto à natureza, tem-se a interpretação
sistemática dentro de um contexto normativo no qual ela se insere, busca-se
interpretar a norma não isoladamente mas em relação com as demais. 21 A aparência
deste tipo de interpretação se destaca dentro do ordenamento jurídico, procurando
uma visão completa e estrutural da lei.
Por fim, a interpretação classifica-se quanto à extensão como sendo
declarativa, extensiva e restritiva.
A declarativa é aquela cujo enunciado deseja exprimir somente aquelas
expressões ali descritas, necessita de que o legislador seja claro quanto a mens
legislatoris. A extensiva, é menos ampla, está dentro de limites e é adaptada a
realidade social, sua mens legislatoris está inserida nesse contexto de redução para
adaptar-se ao meio. E a restritiva, por fim, é a interpretação cujo resultado leva a
afirmar que o legislador, ao exarar a norma, usou expressões aparentemente mais
amplas que seu pensamento.22 Significa dizer que, o legislador irá beneficiar apenas
um dos lados.
19
Idem, op. cit. p. 09
20
REALE, Miguel. Lições Preliminares do Direito. p. 263, 2001 São Paulo: Editora Saraiva.
21
BASTOS, Celso Ribeiro de. Hermenêutica e interpretação Constitucional. Rio de Janeiro, 2002 Celso
Bastos Editora. p. 61.
22
FRANÇA, R. Limongi., op. cit,. p. 12.
16
Duas correntes são adotadas pelos doutrinadores, uma é a de que a
interpretação e a hermenêutica se confundem e são atividades indissociáveis uma
da outra23 e, outra corrente é que a hermenêutica seria uma ciência, uma teoria
científica na arte de interpretar, englobando a interpretação como objeto dessa arte.
A interpretação, portanto, consiste em aplicar as regras, que a hermenêutica
perquire e ordena, para o bom entendimento dos textos legais.24
Diz Dilvanir José da Costa o seguinte:
Em princípio, hermenêutica e interpretação podem se confundir,
pois podem, num primeiro momento, parecer sinônimos, mas a
hermenêutica se difere da interpretação num ponto crucial, técnica e
juridicamente falando, se distinguem. Enquanto que a interpretação é o
próprio ato de extrair o sentido exato da lei, de traduzir a vontade social, a
25
hermenêutica é a ciência, a teoria e a doutrina da interpretação.
Neste texto, fez-se a opção pela corrente que defende a hermenêutica como
a ciência que estuda a interpretação do Direito, sendo que a segunda, é o ato de dar
sentido ao texto, trazer significado a este, e está contida na primeira.
A hermenêutica é o conjunto de regras e orientações a serem seguidas para
que possamos dar significado ao texto.
O Direito necessita de uma área de conhecimento específica para estudar e
interpretar suas leis, tendo como propósito fazer com que o aplicador do Direito
compreenda não apenas o sentido empregado pelo legislador, mas também a
essência que a lei transmite, abarcando os costumes e o juízo de valor que
necessita ser empregado para uma aplicação eficaz ao caso concreto.
23
BASTOS, Celso Ribeiro de. Hermenêutica e interpretação Constitucional. Rio de Janeiro, 2002 – Celso
Bastos Editora. p. 30.
24
FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica. São Paulo, 1999 – Editora Saraiva. p. 05.
25
COSTA, Dilvanir José da. op. cit, p. 69.
17
3. CAPÍTULO 2 – A HERMENÊUTICA NA HISTORIA, NA FILOSOFIA
E NA CONTEMPORANEIDADE.
26
PALMER, Richard. Hermeneutics. Interpretation theory in Schleiermacher, Dilthey, Heidegger and
Gadamer. Evanston: Northwestern University Press. 1985. pp. 34-45.
27
Idem, ibid
28
Idem. p. 48.
18
sentido da literalidade do texto, mas também a intenção daquele que o redigiu. É um
primeiro esforço na direção de alcançar sentidos textuais para além daquilo que está
escrito.
Embora surgida no seio da filosofia clássica, a hermenêutica só terá sua
teorização como ramo autônomo no século XIX, com Dilthey 29. Antes dele, Friedrich
Schleiermacher30 (1768-1834) já provocara uma importante ruptura com a ideia
corrente de aplicação de métodos hermenêuticos apenas quando havia dificuldades
maiores na compreensão dos textos. É com Schleiermacher que a hermenêutica
tem o seu primeiro encontro com um objeto de estudo próprio.
Com Ricoeur31 surge a noção de linguagem mais ampla que apenas uma
coletânea de signos fonológicos e lexicais alheios ao tempo. Linguagem é
construção cultural diferida no tempo. Uma construção dotada de sentido lógico e
cultural, portanto32.
29 Idem, ibid
30 Idem. p. 49
31
Idem, ibid
32
ALBERT, Verona. Existência na história: revelações e riscos da hermenêutica. Revista de Estudos
Históricos, UFRJ, Rio de Janeiro, n. 17, 1996. p.9.
19
– ensaísta e crítico literário, Herbert Marcuse – filósofo e Max Horkheimer – filósofo,
sociólogo. Em comum, tinham a crença no materialismo histórico de Marx e
esperavam poder conciliar a teoria marxista à realidade, na qual o povo e o governo
teriam uma convivência harmônica33.
A denominação Escola de Frankfurt foi dada ao Instituto de Pesquisa Social,
fundado em 1923, pelo economista austríaco Carl Grumberg, editor do Arquivo para
a História do Pensamento Operário – os Arquivos de Grumberg, que visavam
preencher uma lacuna existente nas ciências sociais: a história do movimento
operário e do socialismo. Inicialmente tinha-se cogitado a denominação “Instituto de
Marxismo”, rejeitado, porém pelo fato de reinar nos meios acadêmicos um
sentimento anticomunista e pelo fato de seus colaboradores não terem adotado o
espírito e a letra do pensamento de Marx e o do marxismo da época.
O objetivo geral da Escola de Frankfurt foi tecer uma crítica ao pensamento
sistemático, para tanto, utilizava-se de ensaios, artigos de circunstâncias e
resenhas, que sugeria uma idéia de algo inacabado e incompleto, portanto, aberto a
sugestões e modificações nas linhas de pensamento, diferentemente do livro, que
encerrava uma direção única para suas conclusões.
Habermas herda o pensamento da Escola de Frankfurt, que, à sua época já
se havia consolidado. A Ação Comunicativa é uma das principais teorias
desenvolvidas por Jürgen Habermas. Introduzida pela obra Teoria da Ação
Comunicativa, publicada em 1981, pode ser compreendida, como a teoria da
sociedade moderna fundamentada por métodos da sociologia, filosofia social e
filosofia da linguagem.
Para Habermas a linguagem serve como garantia da democracia, uma vez
que a própria democracia pressupõe a compreensão de interesses mútuos e o
alcance de um consenso. Para que isso ocorra, a linguagem deve ser clara e precisa
e, quando submetida a processos que visem a extração do seu conteúdo mais
profundo, não apresentar desvios.
Para obter resultados satisfatórios, a razão comum deve ser deixada de
lado em nome do que o autor denominou razão comunicativa. O uso correto das
palavras, entretanto, só ocorreria quando fosse abandonado o uso exclusivo da
razão instrumental – ou iluminista – a razão utilizada pelo sujeito cognoscente ao
33
Dossiê Cult Edição Especial. A Escola de Frankfurt. Teodor Adorno, Walter Benjamin, Hebert Marcuse.
Revita Cult – Ano 12, 2009.
20
conhecer a natureza com o fim de dominá-la, ou seja, a confusão do conhecimento
com a dominação, exploração e poder. Dessa maneira, a razão torna-se um
instrumento de uma ciência que, deixando de ser acesso a conhecimentos
verdadeiros, torna-se é meio de dominação e poder: da Natureza e dos próprios
seres humanos.
Dessa maneira torna-se necessária uma razão que não seja instrumento de
dominação, mas de democracia: a razão comunicativa. A razão comunicativa, além
de compreender a esfera instrumental de conhecimentos objetivos, alcança a esfera
da interação entre sujeitos, marcada por simbolismo e subjetivismo, experiências
pessoais e a contextualização dialógica de agentes lingüísticos.
Rompe-se, assim, com um diálogo baseado em conhecimentos
instrumentais resultantes da relação entre um sujeito cognoscente e um objeto
cognoscível, a partir do qual o consenso, se possível, é desprovido do caráter
democrático. Por outro lado trava-se um diálogo entre sujeitos capazes de
compartilhar, pela linguagem, de um universo simbólico comum e interagir,
buscando construir um conhecimento crítico pautado por argumentação submetida a
critérios de validade, sem, contudo, ser orientada por rígidos domínios científicos.
A princípio pode-se dizer que a ação comunicativa é a expressão da razão
comunicativa – fonte do Direito, que para Habermas proporciona as inter-relações
entre os fatos (formas de vida) e as normas estabelecidas para os mesmos; ele
ainda acredita que a correlação validade/eficácia representa a condição essencial
para o Direito, pois além de manter a interrelação, citada, de forma descentralizada
de condições, ela também sustenta a imposição do Direito (característica básica
deste).
Para Habermas, a hermenêutica é um instrumento de realização da
democracia. As palavras expressam o sentido das normas jurídicas e garantem,
para Habermas, a democracia; podem ser analisadas sob dois aspectos: onomástico
(sentido corrente da palavra), semântico (significado normativo). A união de palavras
em torno de um verbo dá origem às frases que em consequência produz as
proposições e depois os enunciados. Os conceitos sobre estes, o próprio Habermas
fornece; a proposição consiste em uma unidade linguística, enquanto que o
enunciado é a proposição situada, ou seja, é a unidade de discurso ou fala.
21
3.3. A PRÁTICA HERMENÊUTICA NO DIREITO.
34
ATIENZA, Manuel apud. BUSTAMANTE. Thomas da Rosa. Argumentação contra legem. São Paulo,
2005 - Editora Renovar. p.45.
35
BUSTAMANTE. Op. cit
22
3.4. CHAÏM PERELMAN E A TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO.
36
BITTAR, Eduardo. Curso de filosofia do Direito. São Paulo, 2004 – Editora Atlas. p.405.
37
Idem, ibid
38
Idem, ibid
23
internos e externos do discurso das partes para constituir a “verdade” exarada pelo
juiz.
Perelman institui, com esse pensamento, uma nova retórica, voltada
exclusivamente para a força da argumentação. O acesso à consciência do julgador é
feito pelo discurso. As tecnicalidades são postas de lado em nome do livre exercício
do convencimento argumentativo. O processo argumentativo desenvolvido por
Perelman define um novo horizonte para a ars interpretandi aplicada ao Direito ao
desvencilhar definitivamente a lógica jurídica da lógica formal simples.
39
BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos no Direito constitucional brasileiro. IN:
Estudo de Direito Constitucional em homenagem a José Afonso da Silva. São Paulo: Catavento, 2006. p.
16-18.
40
BITTAR, Eduardo C. O Direito na pós-modernidade. São Paulo, 2005 - Forense Universitária. p.118.
24
referencial teórico e filosófico e não apenas histórico. Não se apegando aos modelos
de compreensão e reinterpretação dos signos linguísticos através do que Habermas
havia concebido como “consenso universal”41, mas a partir das inúmeras
possibilidades de interação entre os diversos atores linguísticos. Num certo sentido,
retoma-se aqui a noção de construção dialética do saber, reiterada nos trabalhos de
Perelman.
Com esses processos de ressignificação das realidades culturais,
econômicas e jurídicas, a hermenêutica se mostra como um elemento capaz de dar
sentido de coesão a essa multiplicidade de novos domínios. As realidades
supralegais passam a exercer um papel muito mais relevante em face dos
microssistemas jurídicos nacionais42.
Buscar referenciais cronológicos desta contemporaneidade não é tarefa das
mais simples. Os marcos sempre parecerão arbitrários. Porém, os historiadores
parecem convergir que a pós-modernidade aparece em algum momento entre a
queda do Muro de Berlim e o fim da União Soviética, portanto, entre 1989 e 199143.
A partir dos fenômenos de fragmentação vivenciados sobretudo nas duas
últimas décadas do século XX, permanecendo até os dias de hoje, tenta-se localizar
os novos papéis para o Estado e para o Direito. No ambiente pós-moderno não há
espaços para saberes autoritários e absolutos, tal como aqueles emanados pelo
positivismo. Há que se construir um saber novo, que leve em consideração as
diferentes vozes dos mais variados setores culturais e sociais. Nesse sentido, a
hermenêutica ressurge como instrumento de integração e de construção da
cidadania do novo milênio.
41
Idem, ibid
42
CASTRO, Carlos Roberto Siqueira. A Constituição aberta e os direitos fundamentais. Rio de Janeiro,
2003 - Editora Forense. p. 16-17.
43
Nesse sentido, ver HOBSBAWM, Eric J. A Era dos extremos.
25
4. CAPÍTULO 3 – A APLICAÇÃO DO MÉTODO JURÍDICO E
INTERPRETAÇÃO JURISPRUDENCIAL.
44
NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. Rio de Janeiro, 2006 – Editora Forense. p. 142.
45
Idem, ibid p. 143.
46
Idem, ibid p. 143.
26
empregados para conhecer o direito; daí ser fonte de cognição, abrangendo fontes
estatais e não estatais.47
Entretanto, nas lições de Miguel Reale, encontramos uma distinção
diferente sobre as fontes do direito. Para ele essa distinção é fonte de equívocos no
âmbito jurídico, de modo que se torna indispensável empregarmos o termo fonte do
direito para indicar apenas os processos de produção de normas jurídicas. 48
Miguel Reale vê o Direito de uma forma diferente e para ele toda lei
pressupõe uma estrutura de poder, desde o poder criador (Poder Legislativo), até
outras formas subordinadas de poder que estabelecem, de maneira objetiva,
relações que permitem seja pretendida a garantia de execução outorgada pelo
Estado.49
Enfim, entende que as fontes do direito são os processos ou caminhos
pelos quais as regras jurídicas se positivam com força de obrigatória, vigência e
eficácia no contexto de uma estrutura normativa.50
À luz desse conceito, quatro são as fontes de direito, porque quatro são as
formas de poder: o processo legislativo, expressão do Poder Legislativo; a
jurisdição, que corresponde ao Poder Judiciário; os usos e costumes
jurídicos, que exprimem o poder social, ou seja, o poder decisório anônimo
do povo; e, finalmente, a fonte negociai, expressão do poder negocial ou da
51
autonomia da vontade.
47
DINIZ, Maria Helena. Compêndio de Introdução à ciência do Direito. São Paulo, 1999 – Editora Saraiva.
p. 324.
48
REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. São Paulo, 2001 – Editora Saraiva. p.129.
49
Idem, ibid
50
Idem, ibid
51
Idem, ibid
27
Desde aproximadamente o segundo século antes de Cristo até o fim
do Império percorreremos cerca de 700 anos. Se nos mantivermos entre o
segundo século antes de Cristo e a morte do último jurista citado no
Digesto, teremos um período de aproximadamente 450 anos: se levarmos
esta história até Justiniano acrescentaremos mais quase 300 anos. São
períodos consideráveis, em que as mudanças e particularidades são
52
muitas.
52
LOPES, José Reinaldo de Lima. O direito na história – Lições introdutórias. São Paulo: Atlas, 2008. p. 29.
53
Idem, ibid
54
Os editos eram “cartas de intenções”, que os magistrados apresentavam antes de assumirem o cargo. Pelos
editos era possível saber de que modo o magistrado pretendia exercer a magistratura durante o seu mandato.
55
LOPES, José Reinaldo de Lima. op. cit p. 31.
28
interpretar os textos legais. Era cargo reservado aos patrícios 56. Além disso, é
marcado pela força das fórmulas, que seriam ressignificadas no período seguinte
O processo formular é iniciado com a Lex Aebutia. Sobre ele, declara José
Reinaldo Lima Lopes:
É no quadro do processo formular que elementos fundamentais da
jurisprudência clássica romana se formam. Os juristas, que mais tarde se
incorporam ao corpo de auxiliares diretos do imperador (príncipe), começam
como consultores particulares dos magistrados (pretores), juízes (árbitros) e
partes do processo formular. As fórmulas que criam remédios
(ações,interditos, exceções) para defesa de interesses e situações não
previstas no direito quiritário antigo são criadas pelos editos dos pretores. A
flexibilização do direito civil, em geral, dá-se dentro do processo formular,
assim como a entrada da retórica grega e dos princípios de direito natural
57
ou de direitos dos povos, em oposição ao direito civil romano tradicional.
56
Idem. Op. cit p. 32.
57
Idem, op. cit p. 36
58
AZEVEDO, Luiz Carlos de. Introdução à história do direito. São Paulo: Revista dos Tribunais. p. 54.
59
PEDROSA, Ronaldo Leite. Direito em história. Rio de Janeiro, 2008 - Lumen Juris. p. 151.
60
Idem, ibid
29
O período pós-clássico marca o abandono das fórmulas e o surgimento da
cognitio extraordinária. O Direito passa a ser composto pelas constituições imperiais.
Com a divisão do Império em 395, o Direito romano na sua conformação clássica
praticamente desaparece, até ser redescoberto no período medieval como uma
espécie de “graal” da unidade jurídica em meio à fragmentação que caracteriza
aquele período.
O termo common law, do inglês, “direito comum”, surgiu no século XII, como
parte do sistema jurídico inglês, baseava-se principalmente nas decisões judiciais.
Normas e regras criadas para dizer o direito não escrito, mas que estavam presentes
nos costumes e como bem falado, nas jurisprudências.
Como o nome sugere, o common law, é utilizada principalmente, para falar
do direito comum, nascido, precipuamente, em razão dos costumes e dos hábitos de
cada comunidade.
Em países onde o sistema é adotado, segue-se o raciocínio de que os
conflitos e as questões devem ser resolvidas a partir de decisões anteriores e não
de um texto legal previamente elaborado.
O uso do common law, não deve ser confundido com o prática de costumes,
pois este sistema de Direito firma-se num princípio que obriga a existência de
precedente judicial, ou seja, é necessária que haja a existência de uma decisão
aplicada a um caso anterior.
A reunião de sentenças judiciais sobre várias situações semelhantes
permitem extrair regras gerais que geram precedentes e que se convertem em
orientações para o julgamento futuro dos juízes, em casos análogos.
4.3. OS COSTUMES.
30
O Direito consuetudinário é, na lição de Limongi França, a forma
fundamental de expressão do direito, entre os povos que desconheciam a linguagem
escrita.61
Seguindo o pensamento de Paulo Nader e, para alguns autores, haveria
uma lei natural, imanente ao Direito, pela qual os sistemas jurídicos deixariam a sua
forma consuetudinária e se transformariam, progressivamente, em Direito
codificado.62
O direito costumeiro surge a partir das normas adotadas por suas
comunidades como sendo adequadas, Paulo Nader comenta que, todos os povos
primitivos, adotaram normas de controle social, geradas pelo consenso popular e as
antigas legislações como o Código de Hamurabi e a Lei das XII Tábuas. 63 Tais
legislações eram baseadas nos costumes e nos fatos sociais acontecidos ao longo
dos anos nessas comunidades.
Ainda na lição de Paulo Nader, observa-se um direito costumeiro criado a
partir da formação da sociedade e nos processos de formação social, na vontade da
coletividade e na consolidação desses comportamentos como sendo regras a serem
observadas e seguidas. Considerando a base na autoridade patriarcal, teoria
elaborada por Edgar Bodenheimer, observa-se como princípio, o seguinte:
Se cremos na existência dessa autoridade patriarcal, temos que supor que
as regras de conduta da sociedade primitiva eram determinadas em grande
parte pelo chefe autocrático ou ao menos que só podiam desenvolver
64
aqueles usos e costumes que possuíam a sua aprovação.
61
FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica. São Paulo, Editora Saraiva – 1999. p. 61.
62
NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. Rio de Janeiro, Editora Forense – 2006. p. 155.
63
Idem.
64
BODENHEIMER, Edgar. Teoria del Derecho, Fondo de Cultura Económica, México, 1942, p.109 apud,
NADER, Paulo. op. cit p. 156.
65
DINIZ, Maria Helena. Compêndio de Introdução à Ciência do Direito. São Paulo, 1999, p. 298.
66
BARROS Monteiro. Curso de Direito Civil. Cit, v. 1, p. 20 apud DINIZ, Maria Helena, op. cit p. 303.
31
Segundo Ribas, o costume constitui um meio pelo qual o direito latente na
“consciência nacional”, num estágio anterior ao da lei e da jurisprudência.67
O Direito costumeiro vem desde a Roma antiga, sendo confirmado pelos
clássicos excertos de Gaius e de Ulpianus. Em 1769, com a promulgação da Lei da
Boa Razão, exigia-se que para um costume, para ter força de lei, necessitava
preencher três requisitos, quais fossem; não contrariar a lei, conformidade com a
boa razão e ter mais de cem anos. Na primeira Lei de Introdução ao Código Civil, o
costume era reconhecido como norma jurídica, já a nova Lei de Introdução ao
Código Civil, Decreto-Lei n. 4.657 de 1942, explicitava em seu artigo 4º que os
costumes teriam força de lei, apenas quando esta fosse omissa.68
67
RIBAS, Antônio Joaquim. Curso de Direito Civil. apud FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica.
São Paulo, 1999 – Editora Saraiva. p. 133.
68
FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica. São Paulo, Editora Saraiva – 1999. p. 135, 136.
69
FRANÇA, R. Limongi. op. cit – 1999. p. 137-138
70
DINIZ, Maria Helena. Compêndio de Introdução à Ciência do Direito. São Paulo, 1999, p. 306.
71
NADER, Paulo. Introdução ao estudo do Direito. Rio de Janeiro, Editora Forense – 2002. p. 160.
72
NADER, Paulo. op. cit p. 160.
32
aplicação da lei, em virtude de desuso, uma vez que a norma legal passa a ser letra
morta.73
Os autores divergem muito quanto da utilização dessa espécie de costume,
alguns entendem que estes são uma contrariedade ao que dizem os códigos
vigentes. François Geny, manifesta-se contrário ao costume contra legem, por
entender que se deve repelir todo costume formalmente oposto à lei escrita que, por
usa supremacia, deve prevalecer.74
Outros autores entendem que, é impossível que um juiz não considere os
costumes na hora de aplicar a lei.
Clóvis Beviláqua chega a permitir, excepcionalmente essa espécie de
costume, como se pode ver neste texto:
É bem certo que, nas relações de direito prevalecem a justiça, a
razão e a conveniência sobre quaisquer outras considerações. Tendo, por
si, estes predicados, o costume erigiu-se, muitas vezes, em direito, apesar
da lei escrita, que deixava, então, de ser a expressão verdadeira da
harmonia entre as necessidades do indivíduo e as da sociedade, de que era
órgão morto, sem função na vida social [...] Todavia, se o legislador for
imprevidente em desenvolver a legislação nacional de harmonia com as
transformações econômicas, inteligentes e morais operadas no país, casos
excepcionais haverá em que, apesar da declaração peremptória da
ineficácia ab-rogatória do costume, este prevaleça „contra legem‟, porque a
desídia ou incapacidade do Poder Legislativo determinou um regresso
parcial da sociedade à época em que o costume exercia, em sua plenitude,
a função de revelar o direito, e porque as forças vivas da nação se
75
divorciam, nesse caso, das normas estabelecidas na lei escrita.
73
DINIZ, Maria Helena. op. cit p. 306.
74
GENY, François. Método de Interpretación, cit,, em citação de Vicente Ráo. O direito. apud. DINIZ,
Maria Helena. Compêndio de Introdução à Ciência do Direito. São Paulo, 1999, p. 307.
75
BEVILÁQUA, Clóvis. Teoria geral do Direito Civil, volume 4. Ministério da Justiça, 1972, apud. DINIZ,
Maria Helena. op. cit São Paulo, 1999, p. 307.
76
DINIZ, Maria Helena. op. cit p. 308.
77
NADER, Paulo. Idem. p. 146.
33
Para Maria Helena Diniz, a legislação é a mais importante das fontes
formais estatais. Para autora, mesmo os países onde adota-se o sistema do
common law e um direito costumeiro, a lei tem ganhado cada vez mais expressão.78
Limongi França considera que devemos interpretar a lei sob dois aspectos
importantes, um interno e outro externo. Em seu conceito interno de legislação o
autor toma por base a afirmação de Rousseau que, em Contrato Social, afirma que a
lei é a expressão da vontade geral.79
O autor apresenta também a visão de Duguit, este parte do conceito de que
a lei, na verdade, “é a expressão, não da vontade geral, que não existe, não da
vontade do estado que não existe também, mas da vontade de alguns homens que
a votam.” 80
Como se pode observar, de um lado tem-se uma corrente que fala da
vontade da coletividade, de outro, a negação da existência dessa vontade.
Acreditamos, assim como o autor que, há um meio termo entre as posições
adotadas pelos autores citados.
Limongi França diz o seguinte:
Se abandonarmos os sistemas preconcebidos e dermos lugar ao bom
senso, logo veremos que, enquanto de um lado não deixa de constituir uma
engenhosa ficção a teoria da vontade geral, do outro, negar a existência do
Estado, como personalização jurídico-política da nação, é o mesmo que
afirmar a obscuridade da luz do sol.
No conceito externo de lei, Limongi França ele explica que a lei é, em suma,
um preceito jurídico emanado do poder estatal competente, com caráter de
generalidade e obrigatoriedade.81
Dessa forma veremos que a lei está entre a vontade do povo, vontade do
Estado e o conselho legislativo criador da norma escrita.
78
DINIZ, Maria Helena. op. cit p. 283.
79
ROUSSEAU, Jean Jacques. Contrato Social. Cit., p. 103, apud, FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica
Jurídica. São Paulo, Editora Saraiva – 1999. p. 62.
80
DUGUIT, Le droit social, apud, FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica. São Paulo, Editora
Saraiva – 1999. p. 63.
81
FRANÇA, R. Limongi. op. cit p. 66-67.
34
Segundo Limongi França, a lei é um preceito jurídico escrito, de origem
estatal competente, de caráter geral e obrigatório É um preceito porque é um
mandamento que surge a partir da vontade humana, jurídico, por estar relacionado
àquilo que é justo, à justiça, dando a cada um aquilo que lhe pertence e escrito,
porque precisa estar impresso para ter validade, precisa ser publicado.82
Quando dizemos que é de origem estatal competente, estamos afirmando
que a lei surge a partir do Poder Legislativo que é o poder competente para redigir e
votar a norma escrita.
Tem caráter geral, pois, a maior parte da legislação é escrita para toda uma
sociedade. Entretanto, algumas legislações são bem específicas, tendo força
apenas no território onde foram promulgadas, o exemplo são as leis municipais.
A norma jurídica tem que ter efeito coercitivo, para que possa ser
considerada como tal, o caráter obrigatório é exatamente essa característica.
Limongi França ensina que essa obrigatoriedade pode ser direta ou indireta. Ele dá
como exemplos de obrigatoriedade direta o dever de prestação de serviço militar e,
obrigatoriedade indireta, o pagamento do aluguel em dia.83 Isso significa que, a
punição desta se dá através da cobrança de juros, e aquela por meio de prisão.
82
FRANÇA, R. Limongi. op. cit p. 67.
83
FRANÇA, R. Limongi. op. cit p. 71.
84
Nesse sentido, ver FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica Jurídica.
35
O critério que classifica as leis quanto à natureza jurídica, serve para definir
a subjetividade do direito aplicado e definir os meios quais serão utilizados para a
aplicação dessas leis.
A forma técnica define as leis como sendo códigos, consolidações e leis
extravagantes. Os códigos são leis orgânicas que não precisam de precedentes
normativos para ter força. As consolidações são preceitos que também dispõe de
autonomia jurídica. A diferença entre os códigos e as consolidações é bem simples,
os códigos são leis elaboradas em primeira mão e as consolidações são um
agrupamento sistemático de disposições legais previgorantes.85 Por fim, as leis
extravagantes são ou especiais são leis que surgem posteriormente aos códigos,
com a finalidade de explicá-los ou complementá-los.
O processo de elaboração das leis, não se trata da elaboração histórica
como ensina Limongi França, mas tão-somente dos processos legais, dos trâmites
previstos no próprio direito positivo, para a confecção das leis.86
A amplitude do respectivo preceito divide as leis em gerais, especiais e
individuais. As primeiras dizem respeito aos códigos, as segundas são as que não
abrangem todo um ramo da ciência jurídica87 e as individuais são as leis que são
aplicadas somente a uma pessoa. Neste critério, as leis podem ainda se caracterizar
como estaduais; aplicáveis aos estados onde foram criadas; federais; aplicáveis a
todo o território nacional e as municipais; aplicáveis ao município de origem.
Temos ainda o critério das relações de direito que dominam, utilizado para
entender como a norma pode ser aplicada. Ribas apresenta uma classificação que
mais se entenderia como o modo de usar ou a finalidade da norma jurídica.88
Sobre a duração, as leis podem ser permanentes ou temporárias. Sendo as
leis temporárias aquelas cuja vigência tem tempo determinado.
A lei ainda passa pelo critério da finalidade que, seria o ato de proibir,
permitir, preceituar e punir. Alguns autores divergem dessa classificação e
consideram não haver distinção entre as leis quanto à sua finalidade.
Quanto ao objeto, poder-se-ia dizer que este critério buscar separar as leis
segundo a matéria que é versada, seja ela o Direito Civil, Constitucional, Penal e
outros.
85
FRANÇA, R. Limongi. op. cit p. 77.
86
Idem.
87
Idem.
88
RIBAS, Antonio Joaquim. Curso de Direito Civil. apud, FRANÇA, R. Limongi. op. cit p. 81.
36
O modo de atuar das leis pode ser direto ou indireto, proibindo ou
ordenando os atos que devem ser realizados ou não.
A legalidade entende-se por legalidade, aquilo que está em conformidade
com a lei, neste caso entende-se que não há lei que não seja legal.
A justiça, este critério classifica as leis como justas ou injustas. Segue-se o
pensamento de Limongi França que diz o seguinte; ora, sendo a justiça o próprio
objeto do direito, daí se segue que uma lei injusta não é lei.89
Por fim, temos o critério que classifica as leis quanto da forma de expressão
do direito, separando, enfim, as leis escritas das não escritas, neste caso, os
costumes que não podem ser considerados como lei e sim, também, uma forma de
expressão do direito.
89
Idem, ibid
90
NADER, Paulo. Introdução ao estudo do Direito. Rio de Janeiro, Editora Forense – 2002. p. 149.
91
NADER, Paulo. Introdução ao estudo do Direito. Rio de Janeiro, Editora Forense – 2002. p. 153.
37
Compõe-se de estudos e teorias, desenvolvidas pelos juristas, com o
objetivo de sistematizar e interpretar as normas vigentes e de conceber novos
institutos jurídicos, reclamados pelo momento histórico.92
É a obra dos juristas que tecem comentários acerca das leis, das decisões
jurisprudenciais.
A doutrina enquanto fonte do direito encontra-se numa questão bastante
controvertida93, alguns autores entendem que a doutrina não é uma fonte do direito,
Miguel Reale é um deles ao afirmar que
92
Idem. p. 181.
93
DINIZ, Maria Helena. Compêndio de Introdução à Ciência do Direito. São Paulo, 1999. p. 311.
94
TORRÉ, Abelardo. Introdución al derecho, cit. p. 342, apud DINIZ, Maria Helena. op. cit p. 311.
95
COSTA, Dilvanir José da. Curso de hermenêutica jurídica, Rio de Janeiro, 1997 - Editora Del Rey. p.
177.
38
exatamente um comentário sobre quando a Lei não fizer menção sobre o caso
concreto.
Nos dias atuais, o direito científico, como é chamada a doutrina, proporciona
resultados práticos no setor da legislação, dos costumes, na atividade judicial e no
ensino do Direito.96
O caráter positivo do Direito brasileiro, necessita, muitas vezes de um
subsídio teórico, como bem ensina Paulo Nader e, a doutrina oferece esse subsídio
por parte dos juristas ao legislador que confecciona a lei.
A atividade doutrinária de sistematização e interpretação das
normas jurídicas beneficia o trabalho dos advogados e juízes. Tanto a arte
de postular em juízo quanto de julgar requerem o conhecimento do Direito.
A lição dos juristas, apresentada em seus tratados e monografias, é uma
fonte valiosa de orientação, capaz de propiciar embasamento científico ao
97
raciocínio jurídico.
96
NADER, Paulo. Introdução ao estudo do Direito. Rio de Janeiro, Editora Forense – 2002. p. 183.
97
Idem.
98
NADER, Paulo. Introdução ao estudo do Direito. Rio de Janeiro, Editora Forense – 2002. p. 191.
99
Idem. p. 192
39
4.6.1. As lacunas da lei.
4.7. A ANALOGIA.
100
Idem. p. 191.
101
BASTOS, Celso Ribeiro de. Hermenêutica e interpretação Constitucional. São Paulo, 2002 – Celso
Bastos Editora.
102
Idem, ibid
103
Idem.
40
A analogia fundamenta-se, principalmente, em princípios basilares do
direito, conforme dito anteriormente, pois preconiza igual tratamento para situações
em que haja identidade de motivos ou razões.104
O procedimento analógico se dá através de um conjunto de eventos, a ética
profissional do intérprete, o uso contínuo de juízos de valor, mais hipotéticos ou
suposições, há a possibilidade maior de variáveis a serem concebidas. Esperasse
de um caso e outro o maior número de semelhanças entre si e, ainda assim, não se
tornar possível o uso da analogia, diz Maximiliano Carlos o seguinte:
Pode ocorrer que dois casos comparados, o previsto e o não-
previsto pelo legislador, tenham quatro características idênticas e se
desassemelhem em apenas uma; ainda assim, a analogia não estará
garantida, porque a razão que determinou a norma jurídica pode estar
105
localizada nessa característica ímpar.
104
Idem.
105
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro, 2003 – Editora Forense.
p.169.
106
REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. São Paulo, 2001 – Editora Saraiva. p. 279.
41
5. CAPÍTULO 4 – A JURISPRUDÊNCIA COMO MÉTODO
HERMENÊUTICO DE APLICAÇÃO DO DIREITO.
110
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro, 2003 – Editora Forense.
p.144.
111
Idem.
112
Idem.
113
Idem. p. 145
114
Idem. p. 146.
115
FRANÇA, R. Limongi. op. cit p. 147
43
5.2.1. A história de Suzane.
44
como combinado e, juntos, foram à casa dos von Richthofen. Passava de meia noite
de 31 de outubro de 2002 quando o trio chegou na casa da família Richthofen.
O primeiro a ser atingido foi Manfred, que morreu quase imediatamente por
trauma crânio-encefálico, segundo dados da perícia. Marísia sofreu mais: foi
golpeada impiedosamente na cabeça por Christian, sofreu vazamento de massa
encefálica, todavia, não morreu na hora. Para apressar a morte da mãe de Suzane,
Christian a estrangulou. A casa foi mais tarde revirada e alguns dólares foram
levados, para forjar latrocínio (roubo seguido de morte).
45
fato de o alarme da casa não ter funcionado. Se tivesse sido um latrocínio,
acreditavam os policiais, deveria haver sinais de arrombamento. 'Percebemos várias
coisas estranhas no local do crime. Isso fez com que desde o início suspeitássemos
de que não se tratava de latrocínio', diz o delegado Daniel Cohen, um dos primeiros
policiais a entrar na residência. Entre outras coisas, a disposição dos papéis no chão
da biblioteca sugeria que a papelada tinha sido colocada propositadamente ali.
46
Na quinta-feira, a polícia procurou Cristian em casa, dizendo que
precisavam de sua ajuda para o reconhecimento de um suspeito. O rapaz foi até a
delegacia, quando lhe foi revelada a verdadeira razão de ele ali se encontrar.
Passou cerca de seis horas dando respostas contraditórias e confusas às perguntas
dos delegados, cada vez mais se enrolando em suas mentiras. Chegou a dar três
versões sobre a compra da moto até admitir que era dele o dinheiro. Nessa hora,
seu pai, Astrogildo Cravinhos de Paula e Silva, saiu da sala, bastante nervoso,
sentindo que o filho havia sido apanhado. Em outra sala, já se encontravam Daniel e
Suzane, que, segundo a polícia, confessaram depois de Cristian.
Suzane Von Richthofen foi acusada, condenada e julgada pela morte dos
pais, sob a incidência do disposto nos artigos 121, § 2º, 121, § 2º, incisos I, III e IV
(por duas vezes), e 347, parágrafo único, c/c 69, todos do Código Penal, condena a
39 (trinta e nove) anos de reclusão, em regime, inicialmente, fechado.
116
Disponível em: http://www.abril.com.br/suzane_richthofen. Acesso em 22/10/2009.
47
regime fechado para o semi-aberto, entre os pedidos feitos pela defesa, estaria o de
que Suzane não gozava de perfeita capacidade mental.
A defesa apresentou a tese de que a jovem teria crescido em família bem
estruturada, que tivera boa educação todos os anos de sua vida e que os
antecedentes criminais também eram bons.
De fato Suzane apresenta os requisitos necessários para a progressão de
regime, poderia estar em liberdade.
Mas todos os pedidos de progressão de Regime para Suzane foram
negados até o momento, sob a alegação de que Suzane seria uma pessoa
manipuladora e dissimulada, que estas características aliadas a uma liberdade
poderia ser prejudicial à sociedade.
A título de informação, segue abaixo uma das decisões apresentadas ao
caso de Suzane Von Richthofen, alguns recursos não reconhecidos pelos Ministros
do Superior Tribunal de Justiça – STJ:
DECISÃO
Foi o agravo de Suzane por mim provido: o que nele se pede é que o
Superior Tribunal examine os dois recursos atinentes à sentença de
pronúncia.
Por outro lado, insta registrar que a matéria ventilada no reclamo de fls.
1.864/1.876, bem como a referente à atipicidade da conduta pelo direito de
defesa, sustentada no recurso de fls. 1.878/1.885, não restaram
prequestionadas, como se exigia ao caso. Vale dizer, o prequestionamento
implica em debate a respeito da norma em testilha, isto é, torna-se
imperioso que a matéria reste 'suficientemente discutida a ponto de se
construir tese sobre ela'.
.................................................................................................................
especial'.
de detenção, como incursa nos artigos 121, § 2º, incisos I, III e IV (por
duas vezes), e 347, parágrafo único, c/c 69, todos do Código Penal, diante
do que, esvaziado o pedido, restou prejudicado o presente recurso especial.
Decido.
49
Quando converti o agravo, fi-lo porque pretendia examinar o mérito do
segundo especial; em outras palavras, queria discutir a existência da fraude
processual (art. 347 do Cód. Penal). Entretanto o Tribunal de Justiça de São
Paulo, ao julgar recurso de apelação apresentado pela defesa, declarou
extinta a punibilidade de tal crime em razão da prescrição. Diante disso,
perdeu o objeto o recurso.
"No mais, quanto aos recursos de fls. 1.878/1.885 (interposto por Suzane) e
de fls. 1.888/1.893 (interposto por Cristian e Daniel), analisando-se as
razões apresentadas, verifica-se o interesse dos recorrentes quanto ao
reexame da prova, o que é inadmissível na esfera extraordinária. Nesse
passo, cabe reproduzir a Súmula 07 do STJ: 'A pretensão de simples exame
de prova não enseja recurso especial'.
Regimento).
Publique-se.
Relator.
50
HABEAS CORPUS Nº 98.313 - SP (2008/0003792-2)
RELATOR : MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO
IMPETRANTE : DENIVALDO BARNI E OUTROS
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO
PAULO
PACIENTE : SUZANE LOUISE VON RICHTHOFEN (PRESA)
DESPACHO
Vamos aos fatos.
Irresignada com a sentença que a condenara, Suzane Richthofen interpôs
recurso de apelação, alegando, em síntese, isto:
(I) ocorrência da prescrição da pena imposta, porquanto menor de 21
anos à época do fato; (II) nulidade do julgamento, porque ainda não
transitada a sentença de pronúncia em razão de recursos interpostos;
(III) necessidade de ser anulado o julgamento pelo Tribunal do Júri, uma vez
que não deferida a separação do julgamentos e porque a decisão dos
jurados discrepou da sentença do Juiz-Presidente; e (IV) existência de
prejuízo decorrente dos quesitos referentes à inexigibilidade de conduta
diversa. No mérito, buscou a absolvição e, subsidiariamente, a existência de
decisão contrária à prova dos autos; a redução da pena e o reconhecimento
de crime continuado ou de concurso formal.
A 5ª Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, então, por unanimidade,
deu parcial provimento aos apelos dos acusados para fixar o regime inicial
fechado de cumprimento da pena privativa de liberdade. A tal acórdão foram
interpostos recurso especial e recurso extraordinário.
Pois bem.
É importante ressaltar que, anteriormente, também inconformada com a
sentença que a pronunciara, a defesa de Suzane interpôs recurso em
sentido estrito, postulando, em síntese, o afastamento da qualificadora do
motivo torpe.
Ocorre, porém, que a mesma 5ª Câmara do Tribunal de Justiça de São
Paulo, por maioria, negou provimento ao recurso. Contra tal acórdão, foram
opostos embargos de declaração e interpostos embargos infringentes. Os
embargos de declaração foram rejeitados, decorrendo daí a interposição do
primeiro recurso especial, por alegada ofensa ao art. 384 do Cód. de Pr.
Penal. Por seu turno, também os embargos infringentes foram rejeitados,
donde o segundo recurso especial, em que se alegou ofensa aos arts. 408
do Cód. de Pr. Penal e 347, parágrafo único, do Cód. Penal.
São, pois, esses temas – o afastamento, na sentença de pronúncia, da
qualificadora do meio cruel e a exclusão, também na pronúncia, da
imputação do delito de fraude processual – os objetos em exame tanto no
REsp-871.493, de que sou Relator, quanto no HC-96.066, do qual aceitei a
relatoria.
Da leitura da inicial deste habeas corpus, verifico que o inconformismo da
paciente tem a ver com o julgamento da apelação interposta no Tribunal de
origem, porquanto, conforme aduzem os impetrantes, este acórdão é o "alvo
do presente writ".
Três são as matérias abordadas. Ei-las: (I) a imposição da necessidade de
realização de exame criminológico para que a paciente possa, no momento
oportuno, alcançar o regime semi-aberto; (II) a nulidade do julgamento do
Tribunal do Júri "por causa do quesito da inexigibilidade de conduta
diversa"; e (III) o reconhecimento da continuidade delitiva em relação à
morte do pai e da mãe da paciente.
Tal o contexto, a mim me parece não haver a prevenção argüida, razão pela
qual este habeas corpus foi, acertadamente, distribuído por prevenção do
HC-62.316, de relatoria do Ministro Hamilton Carvalhido.
51
Além disso, o HC-96.066 foi a mim distribuído por prevenção do REsp-
871.493, que, aliás, chegou ao Superior Tribunal antes do julgamento pela
6ª Turma do HC-58.813, de minha relatoria e no qual fiquei vencido.
Devolvam-se, pois, os autos a S. Exa.
Publique-se.
Brasília, 12 de março de 2008.
Ministro Nilson Naves
Vistos, etc.
Publique-se. Intime-se.
EMENTA
52
Júri (pronúncia). Qualificadora do meio cruel (consideração).
Violação do art. 416 do Cód. de Pr. Penal (alegação nova não objeto do
recurso especial). Análise (inviabilidade).
2. Não se pode apreciar matéria nova – violação do art. 416 do Cód. de pr.
Penal –, apenas suscitada quando da interposição do agravo regimental.
ACÓRDÃO
Relator
Da decisão que não os admitiu recolho estes tópicos: 'Não estão presentes
os requisitos necessários ao conhecimento dos recursos interpostos.
Por outro lado, insta registrar que a matéria ventilada no reclamo de fls.
1.864/1.876, bem como a referente à atipicidade da conduta pelo direito de
defesa, sustentada no recurso de fls. 1.878/1.885, não restaram
prequestionadas, como se exigia ao caso. Vale dizer, o prequestionamento
implica em debate a respeito da norma em testilha, isto é, torna-se
imperioso que a matéria reste 'suficientemente discutida a ponto de se
construir tese sobre ela'.
.................................................................................................................
de detenção, como incursa nos artigos 121, § 2º, incisos I, III e IV (por
duas vezes), e 347, parágrafo único, c/c 69, todos do Código Penal, diante
do que, esvaziado o pedido, restou prejudicado o presente recurso especial.
Decido.
'No mais, quanto aos recursos de fls. 1.878/1.885 (interposto por Suzane) e
de fls. 1.888/1.893 (interposto por Cristian e Daniel), analisando-se as
razões apresentadas, verifica-se o interesse dos recorrentes quanto ao
reexame da prova, o que é inadmissível na esfera extraordinária. Nesse
passo, cabe reproduzir a Súmula 07 do STJ: 'A pretensão de simples exame
de prova não enseja recurso especial'.
2002.
É o relatório.
55
AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 871.493 - SP (2006/0174142-9)
VOTO
ERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEXTA TURMA
AgRg no
MATÉRIA CRIMINAL
Relator
Presidente da Sessão
Subprocuradora-Geral da República
Secretário
AUTUAÇÃO
Qualificado
56
AGRAVO REGIMENTAL
CERTIDÃO
Secretário
57
6. CONCLUSÃO
117
TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. A jurisprudência como fonte do Direito e o aprimoramento da
magistratura. Revista Brasileira de Direito Processual, volume 28, p. 107-120, jul/ago. 1981.
Disponível eletronicamente em http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/1916. Acesso em 21/10/2009.
58
A hermenêutica se realiza modernamente no âmbito da
jurisprudência. As reiteradas decisões das cortes de justiça traduzem as
peculiaridades na percepção da lei e no modo de efetivação da letra legal, levando
em conta diversos elementos externos à lei, sem jamais perdê-la de vista.
Novamente lembrando a lição do eminente ex-ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira,
que, reproduzindo Ulpiano, traz à baila a noção de que jurisprudência é o
conhecimento das coisas divinas e humanas118. A jurisprudência, em Roma,
representa e se confunde com a própria justiça. Hoje, tem-se que a jurisprudência
atua no sentido de orientar e de dar forma às decisões das cortes, que, tomadas em
conjunto, formam um repositório de saber jurídico e um exemplo de como os
processos hermenêuticos se realizam na prática forense.
O caso tomado como exemplo é bastante relevante nesse sentido. A
princípio, os requisitos legais que fundamentam o pedido da ré estão presentes e
são bastantes para assegurar o benefício. Porém, houve-se por bem levar em
consideração circunstâncias externas à letra da lei. Diante de uma situação em que
a lei não parece fornecer a resposta adequada, de acordo com o desejo da
sociedade, processos de filtragem hermenêutica serviram para adaptar a lei à
realidade social, garantindo assim a sua máxima efetividade.
A produção intelectual sobre a hermenêutica e sobre o seu papel na
construção e na evolução da ciência jurídica ainda não desenvolveu seu pleno
potencial. Faltam estudos que aprofundem as contribuições da linguística com as
ciências jurídicas, embora já existam alguns juristas modernos que já tenham-se
atentado para essa conexão.
A hermenêutica atua no campo da integração das fontes do direito
de modo a assegurar a máxima efetividade do Direito no plano social. Não apenas
isso, mas também atua como um modo de tirar do Direito uma parcela do ranço
positivista que apregoa o apego à norma sem levar em conta outros elementos.
Nesse sentido, a hermenêutica atua como um instrumento de modernização do
Direito, de modo que o processo de atualização da ciência diante das novas
demandas sociais se processe com a velocidade exigida pela pós-modernidade.
118
Idem, ibid.
59
REFERÊNCIAS
AZEVEDO, Luiz Carlos de. Introdução à história do direito. São Paulo: Revista dos
Tribunais.
BARROS Monteiro. Curso de Direito Civil. Cit, v. 1, p. 20 apud DINIZ, Maria Helena,
op. cit p. 303.
BITTAR, Eduardo. Curso de filosofia do Direito. São Paulo, 2004 – Editora Atlas.
60
COSTA, Dilvanir José da. Curso de hermenêutica jurídica, Rio de Janeiro, 1997 -
Editora Del Rey.
GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do Direito. Rio de Janeiro, 1999
– Editora Forense.
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Tradução: João Baptista Machado. São
Paulo, 1999 – Editora Martins Fontes.
PEDROSA, Ronaldo Leite. Direito em história. Rio de Janeiro, 2008 - Lumen Juris.
61
NADER, Paulo. Introdução ao estudo do Direito. Rio de Janeiro, Editora Forense –
2002.
REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. São Paulo, 2001 – Editora Saraiva.
SILVA, Kelly Susane Alflen da. Hermenêutica e concretização judicial. Porto Alegre,
2000. Editor Sérgio Antonio Fabris.
www.wikipedia.org.br
www.g1.com.br
www.jus.uol.com.br
62