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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

GRAAL DA PROVA ORAL DO 29º CPR – 10/2018


Organizado por Valdir Monteiro Oliveira Júnior

Sumário
1A. Jurisdição: órgãos, princípios e limites. A jurisdição no Estado de Direito................................................4
1B. Procedimento comum e procedimentos especiais. Adaptação e flexibilidade negocial ou judicial do
procedimento.................................................................................................................................................6
1C. Execução de títulos extrajudiciais: conceito, espécies, pressupostos, partes, competência e
procedimento.................................................................................................................................................8
2A. Ação: conceito e natureza jurídica. Direito de ação na perspectiva constitucional. Direito à adequada
tutela jurisdicional. Legitimidade e interesse processual..............................................................................11
2B. Audiência de conciliação e mediação. Audiência de instrução e julgamento.........................................15
2C. Mandado de Injunção. Habeas data. Aspectos processuais do Estatuto da Criança e do Adolescente e
do Estatuto da Pessoa com Deficiência.........................................................................................................17
3A. Processo: conceito e natureza jurídica. As garantias constitucionais do processo: contraditório, juiz
natural, ampla defesa, acesso à justiça.........................................................................................................22
3B. Sentença. Conteúdo e elementos. Interpretação da sentença. Tutela inibitória....................................27
3C. Juizados Especiais Cíveis Estaduais e Federais........................................................................................40
4A. Partes. Capacidade. Legitimação. Sucessão. Substituição Processual.....................................................43
4B. Teoria geral da prova. Ônus da prova e convicção judicial. Distribuição dinâmica ou convencional de
ônus da prova. Prova Ilícita...........................................................................................................................46
4C. Meios adequados de resolução de conflitos: negociação, mediação e arbitragem. Convenções
processuais....................................................................................................................................................50
5A. Litisconsórcio. Assistência. Intervenção anômala. Amicus curiae...........................................................54
5B. Pedido: conceito e características. Interpretação dos pedidos. Cumulação de pedidos.........................57
5C. Embargos de declaração. Técnica de extensão do colegiado em caso de divergência............................60
6A. Petição inicial: função e conteúdo. Controle da admissibilidade da demanda.......................................62
6B. Ação popular. Ação de consignação em pagamento. Ações possessórias. Ação de desapropriação......67
6C. Recurso Extraordinário. Repercussão Geral............................................................................................75
7A. Formação, suspensão e extinção do processo........................................................................................80
7B. Precedentes obrigatórios: conceito, funções, efeitos. Mecanismos para controle da aplicação dos
precedentes..................................................................................................................................................82
7C. A Instrumentalidade do Processo. O Processo Civil na Dimensão dos Direitos Fundamentais...............84
8A. Comunicação processual. Prazos. Teoria das invalidades processuais. Primazia do julgamento de mérito
e aproveitamento dos atos processuais........................................................................................................87
8B. Liquidação de sentença. Cumprimento da sentença e de outros títulos judiciais. Formas de
implementação e efetivação das decisões judiciais......................................................................................90
8C. Recurso especial. Reclamação.................................................................................................................93
9A. Resposta do réu: contestação e reconvenção. Revelia...........................................................................98
9B. Procedimento probatório. Provas em espécie......................................................................................101
9C. Ação Civil Pública e Ação de Improbidade Administrativa. Aplicabilidade do CPC às ações coletivas...107
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10A. Intervenção de terceiros. Embargos de terceiro. Sujeitos auxiliares do processo..............................122
10B. Teoria Geral dos Recursos. Duplo Grau de Jurisdição. Efeitos dos Recursos. Pressupostos Recursais.
.................................................................................................................................................................... 125
10C. Cumprimento de sentença que reconhece exigibilidade de obrigação de pagar quantia certa..........137
11A. Coisa julgada sobre questões prejudiciais decididas incidentalmente. Ação declaratória incidental:
função e hipóteses de cabimento...............................................................................................................139
11B. Tutela provisória. Tutela de urgência e tutela de evidência: conceito, espécies, pressupostos..........140
11C. Embargos do executado. Impugnação ao cumprimento de sentença. Responsabilidade patrimonial e
atos praticados em fraude..........................................................................................................................142
12A. Atos processuais. Despesas processuais. Honorários. Processo eletrônico........................................146
12B. Julgamento de casos repetitivos. Incidente de resolução de demandas repetitivas e recursos especial
e extraordinário repetitivos........................................................................................................................152
12C. Cumprimento de sentença que reconhece exigibilidade de obrigação de fazer, não fazer e entregar
coisa. Tutela específica dos direitos. Execução de títulos extrajudiciais que impõem a entrega de coisa,
prestação de fazer ou de não fazer.............................................................................................................156
13A. O direito fundamental de defesa. Devido processo legal. Cognição judicial. Convicção judicial e
fundamentação das decisões......................................................................................................................160
13B. Ação de alimentos e convenções internacionais. Cumprimento de sentença que reconhece
exigibilidade de obrigação de prestar alimentos.........................................................................................172
13C. Estabilização da tutela provisória........................................................................................................173
14A. Conexão e Continência. Reunião e Separação de Causas. Agregação de Processos e Atos Conjuntos.
Cooperação entre órgãos jurisdicionais nacionais......................................................................................174
14B. Ação discriminatória, de divisão e de demarcação. Mandado de segurança individual e coletivo.....176
14C. Apelação. Recurso Ordinário Constitucional.......................................................................................180
15A. Incidente de arguição de inconstitucionalidade. Incidente de assunção da competência. Ação
monitória. Arguição incidental de inconstitucionalidade............................................................................183
15B. Ação Rescisória. Querela Nullitatis......................................................................................................187
15C. Incidente de Desconsideração de Personalidade Jurídica (IDPJ).........................................................189
16A. Sentenças e tutelas jurisdicionais dos direitos. Espécies. Ações declaratória, constitutiva,
condenatória e mandamental.....................................................................................................................191
16B. Julgamento conforme o estado do processo. Decisões parciais de mérito.........................................192
16C. Instrumentos e técnicas extraprocessuais de atuação em tutela coletiva: inquérito civil, compromisso
de ajustamento de conduta, recomendação e audiência pública...............................................................194
17A. Aspectos processuais da Lei do CADE. Aspectos processuais do Estatuto de Idoso............................198
17B. Títulos executivos judiciais e extrajudiciais.........................................................................................201
17C. Tutela jurisdicional dos direitos e interesses coletivos, difusos e individuais homogêneos. Teoria geral
do processo coletivo. Liquidação e cumprimento de ações coletivas.........................................................202
18A. O Ministério Público no processo civil................................................................................................205
18B. Saneamento e organização do processo.............................................................................................208
18C. Competência interna: classificação, divisão e modificação. Competência internacional. Homologação
de sentença estrangeira. Carta rogatória. Tratados e convenções para cumprimento de decisões
estrangeiras no Brasil..................................................................................................................................212
2
19A. Estabilidades processuais: regimes e efeitos. Coisa julgada. Preclusões. Estabilidade da sentença que
extingue o processo sem julgamento de mérito e da decisão de saneamento e organização do processo.
.................................................................................................................................................................... 216
19B. Procedimentos das ações coletivas. Competência para ações coletivas. Coisa julgada e litispendência
em ações coletivas. As relações entre os instrumentos de tutela coletiva e os incidentes para resolução de
casos repetitivos.........................................................................................................................................219
19C. Julgamento unipessoal dos recursos pelo relator: pressupostos e limites..........................................223
20A. Tutela específica dos direitos difusos e coletivos. Procedimento da ação civil pública e da ação
coletiva para direitos individuais homogêneos...........................................................................................224
20B. Agravo.................................................................................................................................................229
20C. Cumprimento de sentença que reconheça obrigação de pagar quantia certa pela Fazenda Pública.
Execução fiscal............................................................................................................................................230

1A. Jurisdição: órgãos, princípios e limites. A jurisdição no Estado de Direito.

Sidney Smith
Obra consultada: Curso de Processo Civil, de Marinoni, Arenhart e Mitidiero, volumes 1 e 2.

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Jurisdição: Se a jurisdição é manifestação do poder do Estado, é evidente que ela terá diferentes objetivos,
conforme seja o tipo de Estado e sua finalidade essencial.1 A jurisdição, em outras palavras, encarnará fins
sociais, políticos e propriamente jurídicos, conforme a essência do Estado cujo poder deva manifestar. Se o
Estado brasileiro está obrigado, segundo a própria Constituição Federal, a construir uma sociedade livre, justa
e solidária, a erradicar a pobreza e a marginalização e a reduzir as desigualdades sociais e regionais e ainda a
promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação (art. 3.º da CF), os fins da jurisdição devem refletir essas ideias. Assim, a jurisdição, ao aplicar
uma norma ou fazê-la produzir efeitos concretos, afirma a norma de direito material, a qual deve traduzir –
pois deve estar de acordo com os fins do Estado – as normas constitucionais que revelam suas preocupações
básicas. Ademais, como o Estado brasileiro tem como regime político a democracia representativa, com
temperos de princípios e institutos de participação direta dos cidadãos no poder de decisão do governo2
(democracia participativa – por exemplo, o referendo, art. 14, da CF), e existem mecanismos que viabilizam
essa participação direta por meio do processo jurisdicional, é necessário incentivar o seu uso. A participação
do cidadão via ação popular (art. 5.º, LXXIII, da CF, e lei 4.717/1965), por meio da qual é possível apontar
desvio na gestão do bem comum, assim como a participação através dos legitimados à ação de
inconstitucionalidade (art. 103, da CF) e às ações coletivas (art. 82, do CDC) e ainda mediante a participação
em determinados processos judiciais como amicus curiae (art. 138), configuram participação no processo
decisório do Estado. Nesse sentido, vê-se que a participação popular não fica limitada ao momento em que,
nas chamadas “eleições”, escolhe-se um representante para governar (democracia representativa). A
participação, além de poder ocorrer através das referidas ações no processo decisório governamental, pode
dar-se na administração da justiça, com a presença de, por exemplo, juízes leigos nos Juizados Especiais
Cíveis. A presença de leigos na administração da justiça, com efeito, representa participação direta no Estado.
Órgãos: O certo é que o Estado para exercer a função jurisdicional precisa de vários juízes, juízos e tribunais,
principalmente em um país com a dimensão territorial do Brasil, pelo que, para que a “justiça” possa ser
ordenada e efetivamente exercida, é necessário que os vários casos conflitivos concretos sejam classificados e
agrupados de acordo com pontos que têm em comum, que os processos que a eles servem de instrumento
têm em comum ou que as pessoas que neles estão envolvidas possuem em comum, organizando-se a função
jurisdicional na medida dos casos que forem agrupados. Fala-se, assim, nas justiças trabalhista (arts. 111 a
116), eleitoral (arts. 118 a 121), militar (arts. 122 a 124), e nas justiças federal (arts. 106 a 110) e estadual
(arts. 125 e 126). O que não é da competência das justiças especializadas trabalhista, eleitoral e militar é da
competência, por exclusão, da justiça comum. Dentro da chamada justiça comum, também por critério de
exclusão, o que não for da competência da justiça federal (arts. 108 e 109) é da competência da justiça
estadual. A Constituição Federal, após tratar das justiças especializadas trabalhista (arts. 111 a 116), eleitoral
(arts. 118 a 121), militar (arts. 122 a 124) e da justiça federal comum (arts. 106 a 110), afirma em seu art. 125,
caput, que “os Estados organizarão sua Justiça”, observados os princípios estabelecidos por ela própria, isto é,
pela Constituição Federal. As denominadas “justiças”, de acordo com a Constituição Federal, as Constituições
dos Estados e as leis de organização judiciária, possuem vários órgãos jurisdicionais. A Constituição Federal
também define o Supremo Tribunal Federal (arts. 101 a 103) e o Superior Tribunal de Justiça (arts. 104 e 105).
A competência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça está disciplinada,
respectivamente, nos arts. 102 e 105 da CF. No que diz respeito à competência originária desses tribunais, é
oportuno observar que a Constituição, ao atribuir-lhes competência originária, subtrai certas causas de todas
as “justiças”: é por isso que essas duas Cortes Supremas são considerados órgãos de superposição, uma vez
que não pertencem a nenhuma das “justiças”. De lado as hipóteses de competência originária desses
tribunais (arts. 102, I, e 105, I, da CF), é importante chamar a atenção para os casos em que tais órgãos
julgam mediante recurso. Afirma o art. 102, II, da CF, que compete ao Supremo Tribunal Federal “julgar, em
recurso ordinário: a) o habeas corpus, o mandado de segurança, o habeas data e o mandado de injunção
decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão; b) o crime político”. O
mesmo artigo, em seu inciso III, diz ser da competência do Supremo Tribunal Federal “julgar, mediante
recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:
a)contrariar dispositivo desta Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c)
julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição; d) julgar válida lei local
contestada em face de lei federal”. Por sua vez, estabelece o art. 105, II e III, da mesma Constituição, que
“compete ao Superior Tribunal de Justiça (...) julgar, em recurso ordinário: a) os habeas corpus decididos em
única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito
Federal e Territórios, quando a decisão for denegatória; b) os mandados de segurança decididos em única
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instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios,
quando denegatória a decisão; c) as causas em que forem partes Estado estrangeiro ou organismo
internacional, de um lado, e, do outro, Município ou pessoa residente ou domiciliada no País”, bem como
“julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais
Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida: a)
contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência; b) julgar válido ato de governo local contestado em
face de lei federal; c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal”.
Como se vê, o Supremo Tribunal Federal pode julgar, mediante recurso extraordinário, em face de decisão de
qualquer “justiça”. Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça, não considerada sua competência para julgar,
em recurso ordinário, as causas em que forem partes, de um lado, Estado estrangeiro ou organismo
internacional e, de outro, pessoa domiciliada ou residente no País (art. 105, II, c, da CF), apenas pode julgar,
mediante recurso especial, as causas decididas pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos
Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. Limites: Por razões de efetividade da decisão, o direito nacional
discrimina as causas que podem ser julgadas no território brasileiro, tendo em vista a possibilidade de dar
concreta e real efetivação à decisão tomada. Nesse sentido, e seguindo a prática adotada por outros países, o
Código de Processo Civil enumera as causas que serão julgadas pelo Poder Judiciário brasileiro, seja
exclusivamente (art. 23), em que a soberania nacional só admite a decisão tomada pela jurisdição nacional,
seja concorrentemente (arts. 21 e 22), casos em que a jurisdição nacional concorre com outras, salvo
expressa exclusão negocial da jurisdição brasileira em negócios transnacionais (art. 25). Portanto, há causas
que podem ser submetidas à jurisdição nacional ou a outra qualquer. Todavia, outras demandas somente
serão validamente decididas, na ótica do direito brasileiro, se julgadas por autoridade nacional. Da jurisdição
nacional concorrente tratam os arts. 21 e 22, estabelecendo que podem ser conhecidas pela jurisdição
nacional as causas em que: “I – o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil; II
– no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação; III – o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil”
(art. 21) e ainda as causas “I – de alimentos, quando: a) o credor tiver domicílio ou residência no Brasil; b) o
réu mantiver vínculos no Brasil, tais como posse ou propriedade de bens, recebimento de renda ou obtenção
de benefícios econômicos; II – decorrentes de relações de consumo, quando o consumidor tiver domicílio ou
residência no Brasil; III – em que as partes, expressa ou tacitamente, se submeterem à jurisdição nacional”
(art. 22). No caso de jurisdição nacional concorrente, a decisão proferida em outro país pode ter validade e
eficácia no território nacional, desde que seja devidamente homologada pelo Superior Tribunal de Justiça
(art. 105, I, alínea i, da CF). A mera propositura de demanda perante tribunal estrangeiro a respeito de causa
que poderia, por jurisdição concorrente, ser conhecida pela jurisdição brasileira, contudo, não induz
litispendência, nem impede que a autoridade brasileira conheça da mesma causa e das que lhe forem
conexas, ressalvadas as disposições em contrário de tratados internacionais e acordos bilaterais em vigor no
Brasil (art. 24). Simetricamente, a pendência de causa perante a jurisdição brasileira não impede a
homologação de sentença judicial estrangeira, quando essa for exigida para produção de efeitos da decisão
no Brasil (art. 24, parágrafo único). Refere o Código, ainda, que é possível excluir a jurisdição nacional nos
casos em que, em “contrato internacional”, houver cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro
devidamente arguido na contestação (art. 25). Obviamente, a cláusula de eleição de foro exclusivo
estrangeiro só é eficaz em se tratando de jurisdição concorrente, sendo ineficaz nos casos em que o direito
brasileiro só reconhece à jurisdição brasileira o poder de julgar (jurisdição exclusiva, art. 23). Também parece
claro que a alusão a contrato internacional, na verdade, tem por objetivo permitir a exclusão da jurisdição
nacional nos casos em que há cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro previsto em contratos
transnacionais, isto é, contratos que envolvem pessoas ou sociedades situadas em diferentes jurisdições. É
nesse sentido que deve ser lida a alusão à internacionalidade. A jurisdição no Estado de Direito: Ainda são
sustentadas, depois de aproximadamente cem anos, as teorias de que a jurisdição tem a função de atuar a
vontade concreta da lei – atribuída a Chiovenda – e de que o juiz cria a norma individual para o caso
concreto, relacionada com a tese da “justa composição da lide” – formulada por Carnelutti. E isso após a
própria concepção de direito ter sido completamente transformada. A lei, que na época do Estado legislativo
valia em razão da autoridade que a proclamava, independentemente da sua correlação com os princípios de
justiça, não existe mais. A lei, como é sabido, perdeu o seu posto de supremacia e hoje é subordinada à
Constituição. Agora é amarrada substancialmente aos direitos positivados na Constituição e, por isso, já
constitui slogan dizer que as leis devem estar em conformidade com os direitos fundamentais, contrariando o
que antes acontecia, quando os direitos fundamentais dependiam da lei. A assunção do Estado constitucional
deu novo conteúdo ao princípio da legalidade. Em primeiro lugar, esse evidenciou a necessidade de o direito
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ser trabalhado como um problema que demanda para a sua solução um empreendimento de colaboração
entre o legislador, o juiz e a doutrina. Em segundo lugar, esse princípio incorporou o qualificativo
“substancial” para evidenciar que exige a conformação da lei com a Constituição e, especialmente, com os
direitos fundamentais. Não se pense, porém, que o princípio da legalidade simplesmente sofreu um
desenvolvimento, trocando-se a lei pelas normas constitucionais, ou expressa apenas uma mera
“continuação” do princípio da legalidade formal, característico do Estado legislativo. Na verdade, o princípio
da legalidade substancial significa uma “transformação” que afeta as próprias concepções de direito e de
jurisdição e, assim, representa uma quebra de paradigma. Se as teorias da jurisdição constituem espelhos dos
valores e das ideias das épocas e, assim, não podem ser ditas equivocadas – uma vez que isso seria um erro
derivado de uma falsa compreensão de história –, certamente devem ser deixadas de lado quando não mais
revelam a função exercida pelo juiz. Isso significa que as teorias de Chiovenda e Carnelutti, se não podem ser
contestadas em sua lógica, certamente não têm – nem poderiam ter – mais relação alguma com a realidade
do Estado contemporâneo. Por isso, são importantes apenas quando se faz uma abordagem crítica do direito
atual, considerando-se a sua relação com os valores e concepções do instante em que foram construídas.
Assim, antes de constituírem teorias capazes de dar lugar à compreensão do processo civil no Estado
Constitucional, pertencem apenas à história da cultura jurídica processual civil. A transformação da
concepção de direito fez surgir um positivismo crítico, que passou a desenvolver teorias destinadas a dar ao
juiz a real possibilidade de afirmar o conteúdo da lei comprometido com a Constituição mediante adequada
interpretação e idônea aplicação da ordem jurídica. Nessa linha podem ser mencionadas a teoria das normas,
inclusive no que tange ao próprio conceito de norma e à incorporação da teorização dos princípios e dos
postulados normativos em seu âmbito, as teorias dos direitos fundamentais, a técnica da interpretação de
acordo, as novas técnicas de controle da constitucionalidade – que conferem ao juiz uma função em grande
medida “produtiva”, e não mais apenas de declaração de inconstitucionalidade – e a própria possibilidade de
controle da inconstitucionalidade por omissão no caso concreto. Ora, é pouco mais do que evidente que isso
tudo fez surgir outro modelo de jurisdição, sendo apenas necessário, agora, que o direito processual civil se
dê conta disso e proponha um conceito de jurisdição que seja capaz de abarcar a nova realidade que se criou.

1B. Procedimento comum e procedimentos especiais. Adaptação e flexibilidade negocial ou judicial do


procedimento.

Luciano Peixoto Metaxa Kladis 21/09/18

I. Procedimento comum e procedimentos especiais

A doutrina clássica sustenta que o processo é um conjunto de atos concatenados objetivando um fim
específico. Logo, especificamente no que toca ao processo civil, o processo seria um conjunto de atos
concatenados objetivando a prestação da tutela jurisdicional. E o procedimento, por sua vez, se relacionaria
com a forma em que os atos processuais estão organizados. Para Fredie Didier, processo e procedimento se
diferenciam da seguinte forma: normas de processo são normas gerais e procedimento são normas
especificas. Assim, para o autor, processo seria norma geral de procedimento.
Em relação ao processo de conhecimento, o procedimento comum é previsto nos art. 318 e seguintes e o
procedimento especial é disciplinado nos art. 539 e seguintes, todos do CPC/15.
Por sua vez, o processo de execução também possui a previsão de procedimento comum (cumprimento de
sentença, execução de títulos executivos extrajudiciais que envolvam obrigação de fazer/não fazer, pagar ou
dar coisa) e de procedimento especial (execução fiscal, execução de alimentos, execução contra a Fazenda
Pública).
Luiz Guilherme Bittencourt Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart ressaltam que nos casos em que há exercício de
jurisdição diante de litígios entre as partes – jurisdição contenciosa – a tutela jurisdicional pode ser prestada
mediante procedimento comum ou mediante 14 procedimentos especiais diversos 1. Se comparado com o
CPC/73, o Código deixou de bipartir o procedimento comum em ordinário e sumário – atualmente o
procedimento comum é apenas um só.
1
Ação de consignação em pagamento, ação de exigir contas, ações possessórias, ação de divisão e da demarcação de
terras particulares, ação de dissolução parcial de sociedade, inventário e partilha, embargos de terceiro, oposição,
habilitação, ações de família, ação monitória, homologação de penhor legal, regulação de avaria grossa, restauração
de autos.
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Ademais, o NCPC não prevê mais como procedimento especial de jurisdição contenciosa as ações de
depósito (que foram "desprocedimentalizadas" e consistem em hipótese que comporta tutela de evidência -
art. 311, III); de anulação e substituição de título ao portador e de usucapião (prevendo apenas a imposição
da citação por editais nestes feitos, que passaram a ser de rito comum - art. 259); além da nunciação de obra
nova e venda a crédito com reserva de domínio.
Por fim, o NCPC ainda estabelece procedimentos especiais de jurisdição voluntária, tais como: a notificação e
a interpelação; a alienação judicial; o divórcio e a separação consensuais, a extinção consensual de união
estável e a alteração do regime de bens do matrimônio; os testamentos e os codicilos; e a herança jacente.
Deve-se atentar que, diferentemente do CPC/1973, o CPC/2015 não determina a intervenção do
representante do Ministério público em todas as causas de jurisdição voluntária, mas apenas naquelas em
que houver incapaz ou interesse público.
Oportuno ressaltar que o Princípio da Adequação Procedimental possui espacial relevância no que toca aos
procedimentos especiais, na medida em que impõe ao legislador criar procedimentos próprios e específicos
para tutelar adequadamente as diversas pretensões, adequando os ritos (o instrumental) às particularidades
da causa. Ademais, autores como Galeno Lacerda e Fredie Didier apontam três perspectivas: adequação
objetiva (o processo deve ser adequado ao direito material discutido), adequação subjetiva (o processo deve
ser adequado às partes que integram a relação processual. Ex: Intervenção do Parquet nas causas em que
haja incapazes) e adequação teleológica.
Além do mais, oportuno ressaltar que aplica-se subsidiariamente do procedimento geral do procedimento
comum aos procedimentos especiais.
Em um primeiro momento, coube ao legislador prescrever procedimentos adequados às situações postas.
Contudo, o magistrado também se tornou capaz de adequar o procedimento às particularidades do caso
concreto (art. 139, inciso VI). Quando o juiz faz, isso tem recebido o nome de princípio da adaptabilidade, é
uma dimensão jurisdicional do princípio da adequação.

II. Adaptação e flexibilidade negocial ou judicial do procedimento.

Ainda em relação princípio da adaptabilidade (este princípio se refere a atuação do magistrado ou atuação
das partes), ressalta-se sua dimensão negocial, a qual permite que as partes alterem o procedimento de
acordo com as particularidades do caso concreto (já que elas são as verdadeiras destinatárias da atividade
jurisdicional e são as mais interessadas e quem mais têm conhecimento do caso concreto). Assim sendo,
deve ser concedido a elas a possibilidade de flexibilização procedimental. Até mesmo o CPC/73 já previa a
possibilidade de negócios jurídicos processuais (v.g: inversão do ônus da prova de maneira negocial e
estabelecimento de cláusula de eleição de foro). Contudo, o CPC/15 passou a prever no art. 190 verdadeira
cláusula geral de negócios processuais.
Deve-se atentar, contudo, que até pouco tempo subsistiam vozes no sentido de que o instituto do negócio
jurídico processual não existe no ordenamento jurídico brasileiro. (Ex: Cândido Rangel Dinamarco). Ocorre
que após a entrada em vigor do CPC/15, o debate acerca da existência ou não dos negócios jurídicos
processuais perdeu fôlego, já que este autoriza que as partes celebrem acordos processuais.
Fredie Didier entende que o autorregramento decorre diretamente do direito à liberdade. Sua conformação
no processo civil permite a solução do conflito pelo sistema multiportas (mediação, conciliação ou
arbitragem), ou mesmo convencionar a forma em que a jurisdição será exercida.
Nesse contexto, o autorregamento englobaria as convenções processuais, tanto as típicas quanto as atípicas.
Assim, para Leonardo Cunha “Há no Código, uma valorização do consenso e uma preocupação em criar no
âmbito do Judiciário um espaço não apenas de julgamento, mas de resolução de conflitos.”

Apesar da crescente ampliação dos acordos processuais, entendem Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz
Arenhart e Daniel Mitidiero que os acordos processuais não poderão ter por objeto os poderes do juiz ou a
renúncia de direitos fundamentais, assim como não serão válidos acordos irrevogáveis ou aqueles que
importem renúncias sem benefício correlato proporcional.
Ademais, referidos autores ponderam que a tendência da privatização ou contratualização do processo (em
que se direciona o centro das suas preocupações resolução do litígio e, particularmente, no interesse das
partes envolvidas) pode reduzir a função jurisdicional à mera solução da controvérsia das partes.
Argumentam que “a privatização do processo civil simplesmente desconsidera todos os outros
compromissos da jurisdição com seus mais elevados fins. Ao eleger a tutela do interesse das partes como
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primordial, o Código menospreza todos os outros valores que conformam o Estado e a atividade jurisdicional.
Assim, é necessário perceber que as concessões dadas pelo Estado em favor da vontade dos litigantes não
pode ser tomada como uma permissão geral, para que elas ditem aquilo que o Estado deve ou não fazer de
modo mais amplo. Se há espaço para que as partes optem por soluções consensuais e se, eventualmente, é
admitido que as partes disponham de alguns momentos do processo, daí não decorre a conclusão de que
então todo ato de disposição deve ser admitido. Lembre -se de que mesmo países tradicionalmente ligados
ao adversarial system, em que se exaltam os poderes de disposição processual das partes, diante das
injustiças que esse sistema é capaz de produzir, optaram por outorgar maiores poderes de condução do
processo ao juiz (case management).
Em conta disso, é preciso tomar com cautela a tendência à contratualização do processo civil, a fim de que
esse não se converta em mero instrumento privado de solução de litígios. O ideal, portanto, é que se possa
prestigiar a autonomia das partes sem negar ao processo sua função de tutela dos direitos na dimensão da
Constituição.”

1C. Execução de títulos extrajudiciais: conceito, espécies, pressupostos, partes, competência e procedimento.

Nathalia Di Santo
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Curso de Processo Civil [livro eletrônico]: tutela dos direitos mediante
procedimentos diferenciados. v. 3. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017. p. 34 – 68.

Por vezes, o legislador empresta eficácia executiva a certos documentos, permitindo que os seus titulares
possam acessar a via executiva sem se submeterem ao processo de conhecimento. Em regra, a posse desses
documentos indica a existência do direito à prestação. Assim, os títulos executivos extrajudiciais nada mais
são do que atos ou documentos que invocam certa “probabilidade da existência do direito”, representam
boa dose de verossimilhança acerca da existência dos fatos constitutivos do direito.
O art. 784, do CPC, apresenta o rol de títulos executivos extrajudiciais, o qual não é exaustivo, encontrando-
se outros títulos em leis extravagantes, conforme prevê o inc. XII (“todos os demais títulos aos quais, por
disposição expressa, a lei atribuir força executiva”). Ex. TAC (art. 5º, § 6º, da Lei 7.347/1985) e contrato
escrito de honorários advocatícios (art. 24 da Lei 8.906/1994). Assim, não se cria título executivo extrajudicial
a não ser por lei, não se admitindo a interpretação extensiva ou analógica do rol positivado. Pode-se
questionar sobre a possibilidade de criação de título executivo por meio de “negócios processuais”, com base
no art. 190, do CPC. A discussão tem mais interesse teórico do que prático, na medida em que o código
prevê, como título executivo extrajudicial, qualquer documento particular assinado pelo devedor e por duas
testemunhas ou o documento público assinado pelo devedor (art. 784, incs. II e III). Porém, poder-se-ia
cogitar da outorga de força executiva a documentos particulares que não contivessem tais requisitos. A
exceção permanece não fugindo à regra: de um lado, porque seria questionável a natureza “processual”
desse acordo; de outro, porque ainda que se considerasse como “processual” esse acordo, ele teria respaldo
legal no art. 190, do CPC. Por outro lado, têm validade no território nacional os títulos extrajudiciais
produzidos no estrangeiro, independentemente de homologação pelo Poder Judiciário brasileiro, desde que
satisfaçam os requisitos de formação exigidos pela lei do país de origem e indiquem o Brasil como o lugar do
cumprimento da obrigação (art. 784, §§ 2º e 3º, do CPC). Ressalte-se que existência de título executivo
extrajudicial não impede a parte de optar pelo processo de conhecimento, a fim de obter título executivo
judicial (art. 785, CPC).
Pressupostos: a execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título de obrigação certa, líquida
e exigível (art. 783, CPC).
Partes: arts. 778 e 779, CPC. Pode promover a execução forçada o credor a quem a lei confere título
executivo. Podem, ainda, promover a execução forçada ou nela prosseguir, em sucessão ao exequente
originário: I - o Ministério Público, nos casos previstos em lei; II - o espólio, os herdeiros ou os sucessores do
credor, sempre que, por morte deste, lhes for transmitido o direito resultante do título executivo; III - o
cessionário, quando o direito resultante do título executivo lhe for transferido por ato entre vivos; IV - o sub-
rogado, nos casos de sub-rogação legal ou convencional. A sucessão acima prevista independe de
consentimento do executado. A execução pode ser promovida contra: I - o devedor, reconhecido como tal no
título executivo; II - o espólio, os herdeiros ou os sucessores do devedor; III - o novo devedor que assumiu,
com o consentimento do credor, a obrigação resultante do título executivo; IV - o fiador do débito constante
em título extrajudicial; V - o responsável titular do bem vinculado por garantia real ao pagamento do débito;
VI - o responsável tributário, assim definido em lei.
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Competência: via de regra, a demanda executiva será proposta “no foro de domicílio do executado, de
eleição constante no título ou, ainda, de situação dos bens a ela sujeitos” (art. 781, I) ou ainda no “foro do
lugar em que se praticou o ato ou em que ocorreu o fato que deu origem ao título, mesmo que nele não mais
resida o executado” (art. 781, V). Havendo vários devedores ou possuindo o devedor vários domicílios, a
execução poderá ser proposta em qualquer desses domicílios a critério do exequente. Sendo incerto o
domicílio do executado, faculta-se o ajuizamento da execução no domicílio do exequente. Regra especial foi
prevista para a execução de títulos da Fazenda Pública (execução fiscal), caso em que a demanda deve ser
“proposta no foro de domicílio do réu, no de sua residência ou no lugar onde for encontrado” (art. 46, § 5º).
Em todos os casos, trata-se de competência territorial e, portanto, relativa.
Procedimento: É necessária a formação de um processo – até então inexistente – com a convocação formal
do executado para participar, ao qual se ofereça ampla oportunidade de defesa, já que não houve o crivo
judicial anterior a deliberar sobre a existência do direito demandado. A defesa do executado, na execução de
títulos extrajudiciais, não se faz mediante simples impugnação, oferecida no seio do procedimento executivo.
Ela se realiza por meio da propositura de novo processo (embargos à execução), que veiculará uma ação de
conhecimento autônoma e incidente ao processo de execução, que objetiva discutir aspectos da execução,
do título e do próprio crédito demandado, onde as matérias alegáveis não são restritas pela lei, como
acontece com a impugnação. Este processo de conhecimento incidente ao de execução é, portanto, de
cognição plena e exauriente. Permite a discussão de qualquer tema (vinculado, obviamente, ao direito
postulado na execução) e sua sentença é apta a tornar-se imutável pela coisa julgada. Há, assim, visível
distinção entre a execução fundada em condenação e a execução fundada em título extrajudicial. Nesta,
confere-se ao devedor a possibilidade de discutir a causa do crédito, ao passo que naquela apenas são
deferidas defesas que não poderiam ser opostas na fase de conhecimento. Na execução de títulos
extrajudiciais, opera o legislador com técnicas de “sanção premiativa” (arts. 827, §1º e 916, CPC),
recompensando o devedor que cumpre com a obrigação. Já na execução da sentença condenatória,
trabalha-se com outro tipo de sanção, isto é, com uma sanção punitiva (art. 523,§1º, CPC). Os títulos
executivos que podem circular – especialmente os títulos de crédito, arrolados no inc. I do art. 784, que
normalmente são dotados dos atributos de autonomia e circularidade – devem ser exibidos no original para
ensejarem a execução. Quanto aos demais títulos, podem ser apresentados em cópia, sujeitando-se à
impugnação por falsidade. É necessário indicar na petição inicial o nome e a qualificação das partes, bem
como a existência da obrigação referida no título e o inadimplemento (mora) havido. O pedido imediato será
sempre o mesmo: a execução. No demonstrativo de débito, é obrigatório que o credor indique o índice de
correção monetária e a taxa de juros de mora utilizados, os termos inicial e final de incidência de tais índices,
a periodicidade de capitalização dos juros, quando cabível, e o desconto obrigatório realizado, também
quando for o caso (art. 798, parágrafo único). Também será necessário indicar o valor da causa (art. 319, V).
Eventualmente, o pedido do exequente poderá indicar a espécie de execução desejada, quando a lei
disciplinar mais de um modo para a satisfação do credor (art. 798, II, a, do CPC). Se o título executivo previr
obrigações alternativas, cabendo a escolha ao credor, deverá ele realizar essa eleição já na petição inicial
(art. 800, § 2º). O exequente pode formular pedido de tutela antecipada de urgência no bojo da própria
execução (art. 799, VIII). Sempre que possível, deve o credor, ainda, apresentar a relação dos bens que
podem ser penhorados (art. 798, II, c, do CPC). Também na petição inicial da execução deve o exequente
indicar se pretende ou não sujeitar a realização de seu crédito à conciliação ou à mediação (nos termos do
art. 319, VII), não havendo razão para afastar-se essa exigência também do rito executivo. Admitido o
processamento da demanda, faculta-se ao exequente realizar a averbação da propositura dessa demanda
em registro público, a fim de evitar eventual fraude à execução (arts. 799, IX e 844), bem como requerer ao
juiz a inclusão do nome do executado em cadastro de inadimplentes. Havendo o pagamento, garantida a
execução ou extinto o processo por qualquer razão, deve-se providenciar o cancelamento imediato da
inscrição (art. 828, §§ 2º e 5º). Estando em ordem a petição inicial, determinará o juiz a citação do
executado. Caso contrário, verificando o juiz que essa petição está incompleta ou que lhe faltam os
documentos indispensáveis, como já dito, será o exequente intimado a corrigir o defeito no prazo de quinze
dias, sob pena de indeferimento da petição inicial (art. 801). Recebida a petição inicial e determinada a
citação do executado, ter-se-á por interrompida a prescrição, ainda quando ordenada por juiz incompetente.
Tal como sucede no processo de conhecimento, no processo de execução admite-se a cumulação de diversas
ações executivas. É corrente o entendimento de não existir litisconsórcio necessário na execução, todavia,
pode haver situações em que, por imposição legal, devam litigar conjuntamente (no polo passivo em
especial) mais de uma pessoa. O que não se admite, na execução, é o litisconsórcio unitário, já que este
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processo não tem por objetivo uma decisão, não se cogitando de uma decisão uniforme para todos os
litisconsortes.
Espécies (peculiaridades). I. Execução por quantia certa fundada em título extrajudicial: a execução de
títulos judiciais que impõem pagamento de soma emprega regime de atipicidade dos meios executivos. Já a
efetivação de títulos extrajudiciais se dá por um modelo típico, com procedimento estritamente regrado pelo
Código. Estando em ordem a petição inicial, será recebida pelo juiz, que deverá fixar os honorários de
sucumbência a serem pagos pelo executado, no importe de dez por cento, determinando a sua citação para
pagar o valor da dívida no prazo de três dias, advertindo-o de que, em caso de integral pagamento neste
prazo, o valor dos honorários inicialmente fixados serão devidos pela metade (arts. 827 e 829, do CPC).
Havendo mais de um executado, o prazo será autônomo para cada um deles, contando-se, então, a partir da
juntada aos autos do respectivo mandado de citação, salvo no caso de cônjuges ou companheiros, quando o
prazo de ambos será contado a partir da juntada aos autos do último mandado citatório (art. 915, § 1º, do
CPC). Embora o código atual não seja tão explícito quanto o anterior, não se aceita, no processo de execução,
a citação por correio. Nos casos de citação ficta – por edital ou com hora certa – se o devedor não
comparecer no prazo que a lei lhe concede, deverá o juiz nomear curador especial (art. 72, II, do CPC).
Realizada a citação, correrá então o prazo de três dias para que o devedor realize o pagamento do débito.
Não havendo manifestação oportuna do requerido neste período, o arresto, efetivado por oficial de justiça,
será convertido em penhora, independentemente de novo termo, seguindo-se a execução em seus ulteriores
trâmites (art. 830 do CPC). A lei autoriza o devedor a, no prazo de quinze dias, reconhecer a existência do
crédito demandado pelo credor, depositando de pronto o equivalente a trinta por cento do valor executado
(aí incluídas as custas e honorários advocatícios), postulando o pagamento do restante da dívida em até seis
parcelas mensais, acrescidas de juros de um por cento ao mês e correção monetária (art. 916, caput, do
CPC). Desse pedido será o exequente intimado para manifestar-se (por isonomia, também no prazo de
quinze dias, embora a lei não o especifique). Caso o pedido seja aceito pelo juiz, poderá o credor levantar
imediatamente a quantia depositada – e, posteriormente, as parcelas que mais tarde forem depositadas (art.
916, §§ 2º e 3º) – suspendendo-se a execução até a quitação da dívida. Negado o pedido, manter-se-á o
depósito de trinta por cento realizado (que será convertido em penhora), seguindo-se os atos executivos (art.
916, § 4º). A decisão do magistrado que examina o pedido de parcelamento, admitindo-o ou não, comporta
agravo de instrumento (art. 1.015, parágrafo único, do CPC). A opção pelo parcelamento implica renúncia ao
direito de apresentar embargos à execução (art. 916, §6º, CPC). Ao invés desse pedido de parcelamento,
também poderá o executado, no prazo de quinze dias, opor-se à execução por meio de embargos à
execução. O executado também poderá defender-se por meio das chamadas exceções de pré-executividade.
Não efetuado o pagamento do débito em três dias, o processo segue para a penhora, feita pelo oficial de
justiça sobre os bens que localizar ou que lhe forem indicados pelo exequente. Poderá, ainda, o juiz
determinar, a qualquer tempo, que o executado indique seus bens penhoráveis. O procedimento da
penhora, assim como o da avaliação e o da expropriação de bens, seguirá o regime examinado utilizado na
execução dos títulos judiciais, variando apenas a reação do executado, que aqui se dá por processo
autônomo (embargos do executado). II. Execução de prestações de fazer, não fazer e entregar coisa
fundada em títulos extrajudiciais: recebida a inicial, o juiz deverá fixar, de imediato, o valor dos honorários
advocatícios a serem pagos pelo executado, para o caso de pronto adimplemento da prestação e da multa
periódica, como forma de induzir o devedor ao cumprimento imediato da obrigação (arts. 806, § 1º e 814 do
CPC), salvo se o exequente, expressamente, tiver formulado pedido na inicial de que a execução se processe
sem a multa coercitiva. Não satisfeita a prestação no prazo estipulado e diante do insucesso da multa
coercitiva ou do seu não emprego: a) tratando-se de prestação de fazer infungível: há conversão em perdas e
danos (arts. 816, in fine, e 821, parágrafo único, do CPC e 247 do CC); b) no caso de prestação de fazer
fungível: realização da prestação por terceiro ou a sua conversão em perdas e danos; c) prestação de não
fazer: o CPC não oferece remédio específico para as prestações de não fazer previstas em títulos
extrajudiciais. O regime disciplinado nos arts. 822 e 823 trata da “efetivação” das obrigações de desfazer,
que não se confundem com as obrigações de não fazer. A única técnica executiva capaz de permitir a
execução das obrigações de não fazer é a multa coercitiva prevista no art. 814 do CPC; d) prestações de
entrega de coisa certa (arts. 806 a 810: o devedor será citado para, em 15 dias, satisfazer a obrigação; o juiz
poderá fixar multa por dia de atraso no cumprimento) e incerta (art. 811: o executado será citado para
entregá-la individualizada, se lhe couber a escolha). III. Execução contra a Fazenda Pública fundada em
título extrajudicial: discutia-se a possibilidade de a execução contra a Fazenda Pública poder fundar-se em
títulos extrajudiciais. O tema foi pacificado a partir da edição da Súmula 279 do STJ, que reconheceu a
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viabilidade de sujeitar a Fazenda Pública a processos de execução fundados em tais títulos. O tema é tratado
no art. 910 do CPC, o qual prevê um prazo diferenciado, de 30 dias, para a defesa (embargos à execução) da
Fazenda Pública e a imposição da forma constitucional de realização de créditos a serem exigidos do Poder
Público (art. 100 da CF), seguindo, no mais, o procedimento da execução tradicional. Essa modalidade
própria de execução só se aplica para prestações pecuniárias. Por isso, as prestações de fazer, não fazer e
entregar coisa, devidas pela Fazenda Pública, sujeitam-se à forma comum de execução. IV. Execução de
prestação alimentícia fundada em título extrajudicial: em termos procedimentais, a execução de alimentos
fundada em título extrajudicial se assemelha à da efetivação de sentença que impõe esse tipo de prestação,
dela diferindo apenas pela necessidade de formação de um novo processo.

2A. Ação: conceito e natureza jurídica. Direito de ação na perspectiva constitucional. Direito à adequada
tutela jurisdicional. Legitimidade e interesse processual.

Daniel Medeiros Santos

I) Ação: conceito e natureza jurídica

Ação é termo plurívoco na Ciência do Direito Processual. Costuma ser utilizado para se referir ao
direito de ação, ao procedimento, à demanda e, enfim, ao direito afirmado em juízo.

Direito de ação é o direito fundamental composto por um conjunto de situações jurídicas, que
garantem ao seu titular o poder de acessar os tribunais e exigir deles uma tutela jurisdicional adequada,
tempestiva e efetiva.

Já a ação é um ato jurídico. Trata-se do exercício do direito de ação – por isso, pode ser chamado
também de ação exercida. A ação também é conhecida como demanda (termo preferível, para evitar
incompreensões). Trata-se de ato jurídico importantíssimo, pois, além de ser o fato gerador do processo,
define o objeto litigioso, fixando os limites da atividade jurisdicional. O conceito de “elementos de ação”
toma por base a ação enquanto ato jurídico, de onde são extraídos o pedido, a causa de pedir e as partes,
elementos absolutamente importantes para a análise de diversos institutos jurídicos, como, i.e., a
litispendência, a coisa julgada, a conexão e a congruência.

Não se pode confundir, ainda, o direito de ação com o direito que se afirma ter quando se exercita o
direito de ação. O direito afirmado pode ser designado como direito material deduzido em juízo ou a ação
material processualizada. Direito de ação e direito afirmado são distintos e autônomos: o direito de ação não
pressupõe a titularidade do direito afirmado.

Por último, dentro da ideia de procedimento, a ação é seu primeiro ato, instaurando-o. O direito de
ação confere ao seu titular o direito a um procedimento adequado, para bem tutelar o direito afirmado na
demanda.

Adentrando em específico à análise do direito de ação, temos que se trata, como qualquer direito, de
uma situação jurídica. Esta situação jurídica possui um conteúdo complexo: trata-se de direito composto por
uma infinidade de situações jurídicas. A ação é exercida, portanto, dinamicamente.
Como exemplos dessas situações jurídicas, temos o direito de provocar a atividade jurisdicional e o
direito à escolha do procedimento. Após o exercício do direito de provocar a jurisdição, por sua vez, surge o
direito à tutela jurisdicional, com os subsequentes direito a um procedimento adequado, direito à prova e o
direito de recorrer, como corolários do direito de ação.
A visualização do conteúdo complexo do direito de ação é um dos grandes avanços da ciência jurídica
processual contemporânea. Identificando o conteúdo complexo do direito de ação, é possível conhecer os
limites da atuação do legislador infraconstitucional. Limitações ao direito de ação podem existir, como
sempre em tema de direito fundamental, mas é preciso que tais limitações tenham justificação razoável, sob
pena de inconstitucionalidade.

II) Direito de ação na perspectiva constitucional. Direito à adequada tutela jurisdicional


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O art. 5º, inciso XXXV, da CRFB/88, dispõe que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário
lesão ou ameaça a direito”. Traz, portanto, o que se conhece como inafastabilidade da tutela jurisdicional,
reconhecendo o direito de ação em sua perspectiva constitucional.
Sob esta perspectiva, o direito de ação não se vincula à efetiva procedência do quanto alegado; ele
existe independentemente da circunstância de ter o autor razão naquilo que pleiteia; é direito abstrato. O
direito à decisão judicial tout court.
Dessa forma, o direito de ação cobre a multifuncionalidade dos direitos fundamentais, ou seja, pode
ser utilizado conforme as necessidades funcionais dos direitos fundamentais (Arenhart). É que os direitos
fundamentais materiais dependem, em termos de efetividade, do direito de ação. Este direito aparece,
portanto, sempre que o Estado proíbe a tutela privada ou o uso da força privada para a realização e a
proteção de direitos. A partir daí, o Estado assume o monopólio da solução dos conflitos e da tutela dos
direitos e, por consequência lógica, dá ao privado o direito de acudir a ele.
Por essa razão, o direito de ação, além de ser abstrato e independente da efetiva existência do
direito material afirmado em juízo, também é atípico, no sentido de que se liga indistintamente a toda e
qualquer situação jurídica digna de tutela jurisdicional.

O direito fundamental de ação incide sobre o Estado, ou seja, sobre o juiz, o legislador e o
administrador. Em vista dele, o administrador tem o dever de dotar o Judiciário de orçamento que lhe
permita estruturar a administração da justiça adequadamente. O legislador deve estabelecer uma
organização adequada e técnicas processuais idôneas à concretização dos multifacetados direitos
fundamentais, que permitam ao cidadão exercer a ação de maneira efetiva. O seu maior obrigado, de toda
sorte, é o juiz, que tem o dever de prestar a adequada tutela jurisdicional aos direitos.

Sublinhe-se que, quando se fala em dever de prestar a tutela jurisdicional adequada,


não se está pensando, como antes o faziam as teorias clássicas sobre a ação, em simples resposta
jurisdicional. Direito à tutela jurisdicional adequada, do ponto de vista do autor, é o direito ao uso das
técnicas processuais idôneas à obtenção da tutela que lhe foi conferida pelo direito material. A ação,
quando interligada às técnicas processuais, permite que se fale em ação adequada.
Por essa razão, a ausência de determinada técnica processual para a tutela de direitos constitui, a um
só tempo, violação do direito fundamental de ação e obstáculo à atuação da jurisdição. Portanto, para que o
cidadão possa efetivamente exercer o direito de ação e para que a jurisdição não se apresente destituída dos
meios necessários para atuar, não há como negar ao juiz a possibilidade de suprir a ausência de lei que
inviabilize a efetiva tutela jurisdicional do direito (Arenhart).

Entendendo que a tutela jurisdicional deve ser adequada para a tutela dos direitos, temos que o
processo tem de ser capaz de promover a realização do direito material. Isso revela a necessidade de análise
do direito material posto em causa para, a partir daí, estruturar-se um processo dotado de técnicas
processuais aderentes à situação levada a juízo. A igualdade material entre as pessoas só pode ser
alcançada na medida em que se possibilite tutela jurisdicional diferenciada aos direitos (Arenhart).
Por essa razão, não é possível ao Estado, i.e., proibir a prestação de tutela antecipatória
indiscriminadamente. É ínsito ao Poder Judiciário o poder de antecipar a tutela jurisdicional. As restrições à
tutela antecipatória (i.e., contra a Fazenda Pública) são vistas, sob esta de ordem de ideias, como
inconstitucionais para significativa parcela doutrinária (Arenhart, Marinoni, Mitidiero).

Outra perspectiva do direito à tutela jurisdicional adequada é a adequação da técnica executiva, que
se mostra imprescindível para prestação da tutela efetiva. A efetiva atuabilidade da tutela do direito
depende da previsão de técnicas executivas idôneas. Nesse particular, o direito processual civil brasileiro
conta com um sistema praticamente atípico, com a ressalva da execução contra a Fazenda Pública, que conta
com a sistemática dos precatórios como técnica típica.
Para a prestação de tutela jurisdicional efetiva, se mostra imprescindível a fiel identificação da tutela
do direito pretendida pela parte. É preciso olhar para o direito material a fim de saber-se qual a situação
substancial que se pretende proteger judicialmente. Durante muito tempo foi suficiente pensar em tutelas
repressivas contra o dano para prestar tutela jurisdicional. Ocorre que o aparecimento de novos direitos,
marcados em geral pela ideia de inviolabilidade, obrigou o Estado a reconhecer o direito à tutela inibitória,
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capaz de impedir a prática, a continuação ou a reiteração de um ilícito. Um Estado realmente preocupado
com a integridade de sua ordem jurídica tem o dever de viabilizar tutela inibitória à parte que é dela
carecedora.

Ademais, não é possível ignorar que não basta um único tipo de procedimento para todas as
situações de direito material. Dessa forma, o autor tem o direito ao procedimento adequado à situação de
direito substancial carente de proteção.

Concluindo, podemos dizer que a norma constitucional que afirma que a lei não excluirá da
apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (art. 5º, XXXV, da CRFB/88) significa, de uma só vez,
que: (i) o autor tem o direito de afirmar lesão ou ameaça a direito; (ii) o autor tem o direito de ver essa
afirmação apreciada pelo juiz quando presentes os requisitos para apreciação do mérito; (iii) o autor tem o
direito de pedir a apreciação dessa afirmação, ainda que um desses requisitos esteja ausente; (iv) o autor
tem direito à técnica antecipatória; (v) as partes têm direito à adequada distribuição do ônus da prova; (vi) o
autor tem o direito à sentença e ao meio executivo capaz de dar plena efetividade à tutela jurisdicional do
direito; e (vii) o autor tem o direito ao procedimento adequado à situação de direito substancial carente de
proteção.

III) Legitimidade e interesse processual

Sob a égide do CPC de 1973, se falava em “condições da ação” como uma categoria criada pela TGP,
com o propósito de identificar uma determinada espécie de questão submetida à cognição judicial. Uma
condição da ação seria uma questão relacionada a um dos elementos da ação (partes, pedido e causa de
pedir), que estaria em uma zona intermediária entre as questões de mérito e as questões de admissibilidade.
À época, havia três condições da ação: possibilidade jurídica do pedido, legitimidade ad causam e interesse
de agir. Seriam um círculo concêntrico intermediário entre o externo, correspondente às questões
puramente formais, e o interior, representativo do mérito da causa.
Essa categoria fora desenvolvida a partir das lições de Enrico Tullio Liebman, sendo amplamente
aceita e difundida pela doutrina brasileira.

O CPC de 2015 não mais menciona a categoria “condições da ação”. O inciso VI do art. 485 autoriza a
extinção do processo sem resolução de mérito pela ausência de “legitimidade ou de interesse processual”.
Não mais se menciona, portanto, a possibilidade jurídica do pedido como hipótese que leva a uma decisão de
inadmissibilidade do processo.

Isso leva a uma cisão doutrinária acerca do tema. Uma primeira corrente entende que a categoria
“condições da ação” se mantém em nosso sistema jurídico, a exemplo de Alexandre Freitas Câmara. Uma
outra corrente, ao revés, entende que não há mais razão para o uso do conceito “condições da ação”, a
exemplo de Fredie Didier.

De toda maneira, há alguns pontos que merecem ser ressaltados com o advento do CPC de 2015.

O primeiro deles se relaciona ao silêncio do CPC/2015 quanto à possibilidade jurídica do pedido. As


críticas à possibilidade jurídica do pedido como condição da ação são antigas e conhecidas, tendo
encontrado eco no novo Código. Dessa forma, para significativa parcela doutrinária a ausência de
possibilidade jurídica do pedido constitui-se em situação atípica de improcedência liminar do pedido.

Como já dito, para a doutrina que adota este entendimento, não mais deve ser utilizada a
terminologia “condições da ação”, pela ausência do único motivo que lastreava a sua utilização: a menção
legal. Vale repisar, somente por amor ao debate, que ainda remanesce, em nossa dogmática, doutrina
sustentando a permanência das condições da ação no direito processual civil.

In fine, também para a doutrina que adota o segundo entendimento, a legitimidade ad causam e o
interesse processual passam a ser analisados quando da análise dos pressupostos processuais, compondo a
análise geral das questões de admissibilidade.
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Expostas estas questões gerais, impede seja feita sucinta análise sobre os referidos institutos. A
legitimação para agir impõe que haja vínculo entre os sujeitos da demanda e a situação jurídica afirmada,
que lhes autorize a gerir o processo em que esta situação será discutida. É a chamada “ pertinência subjetiva
da ação”. É qualidade aferida, portanto, à luz do objeto litigioso, tomando como parâmetro a relação jurídica
substancial deduzida.
A principal classificação atinente à legitimação é a que a subdivide em legitimação ordinária e
legitimação extraordinária. Há legitimação ordinária quando houver correspondência entre a situação
legitimante e as situações submetidas à apreciação do juiz – legitimado ordinário, portanto, é aquele que
defende em juízo interesse próprio. Há legitimação extraordinária quando não houver correspondência total
entre a situação legitimante e as situações jurídicas submetidas à apreciação do órgão julgador – legitimado
extraordinário é aquele que defende em nome próprio interesse de outro sujeito de direito.
Há corrente doutrinária que separa os conceitos de substituição processual e legitimação
extraordinária, mas a corrente ora dominante é aquela que vê as expressões como sinônimas (i.e., Fredie
Didier). Oportuno ressaltar que uma das características mais relevantes da legitimação extraordinária é a que
deriva da flexibilização do art. 506 do CPC: a coisa julgada porventura surgida em processo conduzido por
legitimado extraordinário estenderá os seus efeitos ao substituído.
Tendo o exposto em vista, a ausência de legitimação extraordinária não leva à resolução do mérito
da causa, tratando-se de uma análise puramente do direito de condução do processo. No tocante à ausência
de legitimação ordinária, a doutrina se divide: majoritariamente, ainda se entende que a ausência de
legitimação ordinária levaria a uma extinção sem resolução de mérito; só que, paulatinamente, vem
crescendo a posição que defende haver, in casu, verdadeira situação de improcedência do pedido veiculado
pela parte ilegítima – neste sentido, Fredie Didier.

O interesse de agir, por sua vez, é requisito processual que se subdivide em duas dimensões:
necessidade e utilidade. Haverá utilidade sempre que o processo puder propiciar ao demandante o
resultado favorável pretendido; sempre que o processo puder resultar em algum proveito ao demandante.
Haverá necessidade sempre que a jurisdição for a única ou última forma de solução de determinado conflito.
Para certa parcela doutrinária, também deve se analisar o chamado interesse-adequação (Dinamarco), ou
seja, se o pedido formulado pelo autor é apto a resolver o conflito de interesses apresentado na petição
inicial. Todavia, para significativa parcela doutrinária a adequação não é vista como integrante do interesse
processual, sendo uma questão de pura forma (Barbosa Moreira, Didier).
No tocante às chamadas ações constitutivas necessárias, que são aquelas em que se afirma um
direito que somente pode ser realizado em juízo, o exame do interesse-necessidade é dispensável, pois está
in re ipsa, havendo presunção absoluta da necessidade de ir a juízo.
Cumpre observar, in fine, que o legislador brasileiro admite haver interesse-utilidade na pretensão à
simples declaração (ações meramente declaratórias), quando o que se busca é apenas a obtenção de certeza
jurídica. O interesse de agir revela-se na existência de incerteza quanto à situação jurídica (ou à
autenticidade do documento) que se busca declarar.

O § 3º do art. 485 do CPC autoriza o juiz a controlar, ex officio e enquanto durar a litispendência, a
existência de legitimidade e de interesse de agir.
Objetivando separar a análise das condições da ação do mérito da causa, surgiu uma concepção
doutrinária que propugnava que sua análise, como questões estranhas ao mérito da causa, ficasse restrita ao
quanto afirmado pelo demandante. Essa análise seria feita à luz das afirmações do demandante contidas em
sua postulação inicial (in statu assertionis). O que importa, portanto, é a afirmação do autor, e não a
correspondência entre a afirmação e a realidade, que já seria problema de mérito.
Não se trataria de um juízo de cognição sumária (o que permitiria um reexame pelo magistrado, com
base em cognição exauriente). O juízo definitivo sobre a existência desses requisitos far-se-ia nesse
momento: se positivo, tudo o mais seria decisão de mérito, ressalvados fatos supervenientes que
determinassem a perda do requisito. Chama-se de teoria da asserção ou da prospettazione.
A verificação do preenchimento desses requisitos dispensaria a produção de provas em juízo. Essa
verificação seria feita apenas a partir da afirmação do demandante. Sob esta ótica, não seria preciso produzir
uma perícia para averiguar se há ou não “interesse de agir” ou “legitimidade ad causam”. Se, tomadas as
afirmações como verdadeiras, as condições da ação estivessem presentes, estaria decidida esta parte da
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admissibilidade do processo; futura demonstração de que não há “legitimidade ad causam” seria problema
de mérito.

2B. Audiência de conciliação e mediação. Audiência de instrução e julgamento.

Paulo Henrique Cardozo, setembro de 2018.


Fonte: Daniel Amorim Assumpção Neves, Manual de Direito Processual Civil (2016).
Legislação básica: Código de Processo Civil, arts. 334 e 358 a 368.

Audiência de conciliação e mediação.


No procedimento comum ordinário do CPC/73, o réu era citado e intimado para apresentar resposta por
escrito. No Novo CPC, não é necessariamente assim, pois o art. 334 cria uma audiência de conciliação ou de
mediação, que poderá ser realizada até mesmo por meio eletrônico. O réu somente será citado e intimado
para contestar, se o direito não admitir autocomposição. A audiência de conciliação ou de mediação será
designada com antecedência mínima de 30 dias, devendo o réu ser comunicado com pelo menos 20 dias de
antecedência. Esse último prazo deve ser atendido, sob pena de violação do contraditório. De todo modo,
somente haverá nulidade se demonstrado o prejuízo. Há doutrina criticando o fato de o legislador não ter
previsto prazo máximo para a designação do ato.
Nos termos do art. 165 do CPC, os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos,
responsáveis pela realização da audiência. Não havendo a criação dos centros, caberá ao juiz realizá-la. O art.
334, § 2º, prevê que poderá haver mais de uma sessão destinada à conciliação ou à mediação, caso isso se
mostre necessário, o que é bom para os casos em que, embora haja uma aproximação entre as partes, não
ocorra solução consensual no primeiro ato. O legislador estabeleceu, contudo, que as sessões devem
acontecer num período máximo de 2 meses, o que não obsta as partes de suspenderem o processo (art. 313,
II) para buscar a solução.
O autor será intimado, na pessoa de seu advogado, acerca da audiência (art. 334, § 3º). O fato de o autor ter
se manifestado contra a realização do ato na petição inicial não é suficiente a que não seja realizada, pois a
dispensa dependerá de manifestação do réu no mesmo sentido. Há crítica doutrinária argumentando que o
desejo de uma dar partes de não conciliar já deveria ser o bastante. O desinteresse do autor exposto na
inicial independe de motivação. Se o autor não se manifestar, mas o réu expressar sua discordância, é
prudente a intimação do primeiro para que fale sobre seu interesse. O desinteresse do réu deve ser indicado
em petição apresentada com antecedência de 10 dias da audiência (art. 334, § 5º). Havendo litisconsórcio, o
§ 6º do art. 334 dispõe que o desinteresse deve ser manifestado por todos os litisconsortes.
Acerca da não realização da audiência em razão de o direito material não admitir autocomposição, foi bem o
legislador ao não confundir o tema com os direitos indisponíveis. Isso porque mesmo esses admitem
autocomposição, como ocorre na tutela coletiva ou nas ações em que se discutem alimentos.
O § 8º do art. 334 estatui que a ausência injustificada de uma das partes é ato atentatório à dignidade da
justiça, passível de multa de até 2% do valor da causa ou da vantagem econômica pretendida, cujo credor é a
União ou o Estado. O § 9º prevê que as partes devem estar acompanhadas de seus advogados ou
defensores; no entanto, não estabelece qualquer consequência do descumprimento da regra. Daniel Amorim
entende tratar-se de mera faculdade, pois a autocomposição é ato da parte. Caso a parte não deseje
comparecer pessoalmente, pode constituir representante, mediante procuração específica (§ 10).
O conciliador ou mediador limitar-se-á a reduzir a termo a autocomposição, encaminhando ao juízo para
homologação (§ 11). A pauta de audiências respeitará o intervalo mínimo de 20 minutos entre o início de
uma e o início da seguinte (§ 12).

Audiência de instrução e julgamento.


A audiência de instrução e julgamento é ato processual complexo, no qual são praticadas atividades pelo juiz,
por serventuários da justiça, pelas partes, pelos advogados, por terceiros e por membros do MP. Realizam-se
atividades preparatórias, conciliatórias, saneadoras, instrutórias, de discussão da causa e decisórias. Segundo
o art. 368 do CPC, trata-se de sessão pública; no entanto, pode o juiz limitar o número de pessoas e
determinar a retirada de quem se portar de modo inconveniente, ou mitigar a publicidade, nos casos de
segredo de justiça.
A audiência poderá ser integralmente gravada em imagem e áudio, podendo tal gravação ser realizada
diretamente pelas partes. O juiz exercerá poder de polícia para manter a ordem e o decoro, valendo-se de

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força policial quando necessário. Deve, contudo, tratar com urbanidade todos os que participem do
processo, bem como registrar em ata os requerimentos.
O direito pátrio adotava o sistema presidencial na condução da audiência, o que foi modificado pelo art. 456
do CPC, ao prever que as perguntas sejam feitas diretamente pelo advogado das partes. Apesar da
importância da audiência de instrução e julgamento, não se trata de ato indispensável. A audiência segue a
seguinte ordem: abertura, pregão, tentativa de conciliação, fixação dos pontos controvertidos,
esclarecimentos do perito e dos assistentes técnicos, depoimento pessoal, oitiva das testemunhas, debates
orais e prolação de sentença. Os atos praticados por ambas as partes são sempre realizados primeiro pelo
autor e depois pelo réu, embora a ordem possa ser alterada pelo juiz fundamentadamente.
No dia e hora designados, o juiz declarará aberta a audiência. O pregão consiste na comunicação oral, de
forma clara e em volume razoável, de que a audiência terá início, devendo as partes e os patronos ingressar
na sala. Tentar-se-á a conciliação das partes, ainda que anteriormente isso já tenha sido feito. A intimação
das partes para a audiência ocorre pelo patrono, sendo necessária a intimação pessoal em caso de haver
depoimento da parte. Não há obrigação de comparecimento. Não obtida a conciliação, caberá ao juiz fixar os
pontos controvertidos (malgrado não haja previsão no CPC/15). As provas serão produzidas,
preferencialmente, na seguinte ordem (art. 361): perito e assistentes técnicos; depoimento pessoal do autor
e do réu; oitiva das testemunhas do autor e do réu. Durante a produção da prova oral, advogados e MP não
podem intervir sem licença do juiz. O juiz será o primeiro a inquirir o perito, seguido do advogado que pediu
esclarecimentos e, por fim, do advogado do adversário. No caso do assistente técnico, após a arguição do
juiz, ocorre a realizada pelo advogado da parte que o indicou, seguido do procurador da parte contrária.
Tendo sido requerido pelas partes ou determinado de ofício, haverá a tomada do depoimento pessoal das
partes. Após, ocorre a oitiva das testemunhas (os procedimentos são tratados no ponto “9.b”). Os debates
orais são as alegações finais das partes; o prazo é de 20 minutos, prorrogáveis por mais 10; será de 30
minutos para litisconsortes (o tempo será dividido entre eles ou repartido igualmente em caso de não
chegarem a um acordo). O juiz pode converter os debates orais em memoriais, quando a causa apresentar
questões complexas de fato ou direito (o prazo é de 15 dias, contado sucessivamente para autor, réu e MP
como fiscal da ordem jurídica). Caso o juiz converta as alegações orais em memoriais, sentenciará em
cartório, intimando os procuradores pela imprensa oficial. Se os debates forem orais, o juiz pode proferir
sentença em audiência, intimadas as partes no ato; no entanto, pode igualmente sentenciar em cartório
dentro de 30 dias (prazo impróprio).
O art. 365 prevê que a audiência de instrução é una e contínua, mas pode ser cindida excepcionalmente no
caso de ausência de perito ou testemunha, havendo concordância das partes. A decisão deve ser
fundamentada. Não sendo possível concluir a audiência no mesmo dia, o juiz marcará prosseguimento para a
data mais próxima possível. A unidade da audiência significa que é somente uma audiência para todos os
atos previstos, enquanto a continuidade da audiência significa que ela deve começar e terminar em uma
assentada. Interrompida, não será designada uma nova, e sim o prosseguimento daquela em data próxima.
Como consequência, não há novos atos preparatórios; havendo direito superveniente, aplicam-se à
continuação as regras vigentes no início do ato; a nulidade da primeira sessão implica a da segunda; e a
ausência do advogado na segunda sessão não permite a dispensa das provas requeridas por ele na primeira.
A audiência pode ser adiada por acordo das partes; por ausência justificada de qualquer pessoa que dela
deva participar; e por atraso no início por tempo superior a 30 minutos. Quem der causa ao adiamento
responderá pelas despesas decorrentes. No caso de ausência do membro do MP, havendo motivo justificado,
a audiência será adiada. No caso de não haver justificativa, há 3 correntes: 1ª) a presença do MP é
indispensável, devendo ocorrer o adiamento em qualquer caso, sob pena de nulidade relativa; 2ª) a ausência
do MP não determinará o adiamento; 3ª) se o MP for parte, a ausência injustificada não implicará o
adiamento, enquanto se for fiscal da ordem jurídica o ato deverá ser adiado.
Havendo ausência injustificada do perito, caberá sua condução coercitiva, o que implica adiamento. No
tocante aos assistentes técnicos, apenas se adia a audiência se houver justo motivo. A ausência justificada da
parte permite o adiamento, mas, se não houver motivo, será realizada normalmente. No tocante à
testemunha, realizada a intimação e não comparecendo, cabível a condução coercitiva. Tendo a parte se
comprometido a levá-la independentemente de intimação, é possível o adiamento se houver motivo justo
para o não comparecimento; caso contrário, a ausência é entendida como desistência.
A ausência justificada do advogado gera adiamento. Sendo injustificada, ainda, além de ocorrer a audiência,
o juiz pode dispensar a prova requerida pelo advogado faltante. Segundo a doutrina, em se tratando de
direito indisponível, o juiz deverá produzir a prova. O art. 362, § 1º, prevê que o impedimento deve ser
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comunicado com antecedência, o que só é razoável se não se tratar de algum imprevisto que gere extrema
dificuldade ou impossibilidade de cumprimento do prazo. A doutrina afirma, ainda, que o rol de hipóteses de
adiamento é exemplificativo.
Fonte: Daniel Amorim Assumpção Neves, Manual de Direito Processual Civil (2016).
Legislação básica: Código de Processo Civil, arts. 334 e 358 a 368.

2C. Mandado de Injunção. Habeas data. Aspectos processuais do Estatuto da Criança e do Adolescente e do
Estatuto da Pessoa com Deficiência.

Lilian Farias de Queiroz Pierre

I. Mandado de Injunção
Trata-se, juntamente com o mandado de segurança coletivo e o habeas data, de remédio constitucional
introduzido pelo constituinte originário de 1988. (art. 5º, LXXI). Tem como requisitos: 1) Norma constitucional
de eficácia limitada prescrevendo direitos e liberdades constitucionais e prerrogativas inerentes à
nacionalidade, à soberania e à cidadania; 2) Falta de norma regulamentadora tornando inviável o exercício de
tais direitos (omissão do Poder Publico). Obs: Omissão total ou parcial (essa última novidade da Lei
13.300/2016).
Finalidade: Tornar viável o exercício dos direitos (direitos subjetivos). É controle concreto. Visa impugnar
omissões inconstitucionais (controle incidental).
Competência CR/88: STF (102, I, q, e II, a); STJ (105, I, h); TRE (121, §4º, V). Constituição Estadual pode
atribuir competência a juízes estaduais ou ao TJ.
Procedimento: O procedimento do mandado de injunção é disciplinado pela Lei nº 13.300/2016. Caso ela
não preveja solução para alguma situação, o intérprete deverá aplicar, subsidiariamente, as regras contidas
na Lei do Mandado de Segurança (Lei nº 12.016/2009) e no novo Código de Processo Civil (Lei nº
13.105/2015). A petição inicial deverá indicar, além do órgão impetrado, a pessoa jurídica que ele integra ou
aquela a que está vinculado.
Parâmetro: norma constitucional de eficácia limitada.
Espécies: a) INDIVIDUAL, b) COLETIVO: proposto por legitimados restritos previstos na Lei, em nome próprio,
mas defendendo interesses alheios. Os direitos, as liberdades e as prerrogativas pertencentes,
indistintamente, a uma coletividade indeterminada de pessoas ou determinada por grupo, classe ou
categoria (art. 12, parágrafo único, da LMI). O mandado de injunção coletivo não foi previsto expressamente
pelo texto da CF/88, mas mesmo assim sempre foi admitido pelo STF e atualmente encontra-se disciplinado
pela Lei nº 13.300/2016.
Legitimação: a)ativa -individual: titular do direito cujo exercício está obstado por falta de norma
regulamentadora; coletivo: Ministério Público, quando a tutela requerida for especialmente relevante para a
defesa da ordem jurídica, do regime democrático ou dos interesses sociais ou individuais indisponíveis;
Partido Político com representação no Congresso Nacional, para assegurar o exercício de direitos, liberdades
e prerrogativas de seus integrantes ou relacionados com a finalidade partidária; organização sindical,
entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos 1 (um) ano,
para assegurar o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas em favor da totalidade ou de parte de seus
membros ou associados, na forma de seus estatutos e desde que pertinentes a suas finalidades, dispensada,
para tanto, autorização especial; Defensoria Pública, quando a tutela requerida for especialmente relevante
para a promoção dos direitos humanos e a defesa dos direitos individuais e coletivos dos necessitados. b)
passiva - autoridade ou órgão público a que se imputa a omissão, sem incluir a parte privada ou pública
devedora da prestação (STF). Nunca pode ser o particular!
Possíveis provimentos: 4 espécies: a) Não concretista: = ADO (somente ciência); b) Concretista: concretiza a
norma. Subdivide-se em: b.1) geral: efeitos erga omnes; b.2) individual: efeitos inter partes; b.3)
intermediária: ciência + prazo para suprir, sob pena de exercício do direito.
Até meados de 2007, o efeito das decisões de MI‘s emanadas pelos tribunais se limitavam a declarar a mora
do legislador e pelo princípio da independência dos poderes, não havia como obrigar tal autoridade a legislar
e nem mesmo poderia o Judiciário agir como legislador e sanar a mora existente. Essa situação era o que
chamamos de posição não concretista do Poder Judiciário. Porém, ao julgar os Mandados de Injunção 670,
708 e 712, sobre a falta de norma regulamentadora do direito de greve dos servidores públicos, o STF
abandonou sua antiga posição, mormente diante da inefetividade até então verificada, e declarou: “enquanto
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não editada a lei especifica sobre o direito de greve dos servidores públicos, estes devem adotar a norma
aplicável aos trabalhadores da iniciativa privada”. Assim, o STF passou a adotar a teoria concretista geral. Já a
Lei nº 13.300/2016 determina, como regra, a aplicação da corrente concretista individual intermediária. Se o
juiz ou Tribunal reconhecer o estado de mora legislativa, será deferida a injunção (= ordem, imposição) para
que o impetrado edite a norma regulamentadora dentro de um prazo razoável estipulado pelo julgador. Se
esgotar o prazo fixado e o impetrado não suprir a mora legislativa, o juiz ou Tribunal deverá: estabelecer as
condições em que se dará o exercício dos direitos, das liberdades ou das prerrogativas reclamados; ou, se for
o caso, as condições em que poderá o interessado promover ação própria visando a exercê-los. O juiz ou
Tribunal não precisará adotar a primeira providência (fixar prazo) e já poderá passar direto para a segunda
etapa, estabelecendo as condições, caso fique comprovado que já houve outro(s) mandado(s) de injunção
contra o impetrado e que ele deixou de suprir a omissão no prazo que foi assinalado nas ações anteriores.
Eficácia subjetiva: A Lei n. 13.300/16 adota, em regra, a corrente individual. No mandado de injunção
individual, em regra, a decisão terá eficácia subjetiva limitada às partes (art. 9º). No mandado de injunção
coletivo, em regra, a sentença fará coisa julgada limitadamente às pessoas integrantes da coletividade, do
grupo, da classe ou da categoria substituídos pelo impetrante (art. 13). Excepcionalmente, a Lei nº
13.300/2016 afirma que poderá ser conferida eficácia ultra partes ou erga omnes à decisão, quando isso for
inerente ou indispensável ao exercício do direito, da liberdade ou da prerrogativa objeto da impetração (art.
9º, § 1º). Essa possibilidade se aplica tanto para o MI individual como para o coletivo (art. 13).
Coisa Julgada: No mandado de injunção coletivo, a sentença fará coisa julgada limitadamente às pessoas
integrantes da coletividade, do grupo, da classe ou da categoria substituídos pelo impetrante O mandado de
injunção coletivo não induz litispendência em relação aos individuais, mas os efeitos da coisa julgada não
beneficiarão o impetrante que não requerer a desistência da demanda individual no prazo de 30 (trinta)
dias a contar da ciência comprovada da impetração coletiva- right to opt out ( = MS).
Superveniência da norma regulamentadora: a) Antes de prolatada a decisão- O mandado de injunção fica
prejudicado e o processo deverá ser extinto sem resolução de mérito. b) Após prolatada a decisão- A partir
do momento em que entra em vigor, a norma regulamentadora que estava faltando passa a reger todas as
situações que ela disciplinar, mesmo que já tenha havido decisão transitada em julgado em mandado de
injunção "criando" outra solução para o caso concreto. Obs: Em regra, a lei editada não modifica os efeitos
que a decisão do MI já produziu. A norma produz efeitos apenas a partir de sua vigência. Exceção: a norma
regulamentadora superveniente produzirá efeitos ex tunc caso ela seja mais favorável ao beneficiário (autor
do MI que foi julgado procedente no passado).
Ação de Revisão: A Lei nº 13.300/2016 prevê a possibilidade de ser proposta ação de revisão da decisão
concessiva do mandado de injunção. Será competente para a ação de revisão o juízo que proferiu a decisão
no mandado de injunção.
OBS: O indeferimento do pedido por insuficiência de prova não impede a renovação da impetração, desde
que fundada em outros elementos probatórios (art. 9º, § 3º); transitada em julgado a decisão que julgou
procedente o mandado de injunção, seus efeitos poderão ser estendidos aos casos análogos por decisão
monocrática do relator (art. 9º, § 2º, da LMI).
Diferenças MI e ADO: Segundo Dirley da Cunha Junior: “o mandado de injunção é uma ação constitucional
de garantia individual, enquanto a ação direta de inconstitucionalidade por omissão é uma ação
constitucional de garantia da Constituição”. MI: A finalidade é viabilizar o exercício de um direito subjetivo.
Há, portanto, controle concreto de constitucionalidade; Cabível quando faltar norma regulamentadora de
direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania;
Legitimados ativos- MI individual: pessoas naturais ou jurídicas que se afirmam titulares dos direitos, das
liberdades ou das prerrogativas, MI coletivo: estão previstos no art. 12 da Lei nº 13.300/2016;Competência-
Dependerá da autoridade que figura no polo passivo e que possui atribuição para editar a norma; Efeitos da
decisão- Reconhecido o estado de mora legislativa, será deferida a injunção para:I - determinar prazo razoável
para que o impetrado promova a edição da norma regulamentadora; II - estabelecer as condições em que se
dará o exercício dos direitos, das liberdades ou das prerrogativas reclamados ou, se for o caso, as condições
em que poderá o interessado promover ação própria visando a exercê-los, caso não seja suprida a mora
legislativa no prazo determinado. Obs: será dispensada a determinação a que se refere o inciso I quando
comprovado que o impetrado deixou de atender, em mandado de injunção anterior, ao prazo estabelecido
para a edição da norma. ADO: A finalidade é declarar que há uma omissão, já que não existe determinada
medida necessária para tornar efetiva uma norma constitucional- controle abstrato de constitucionalidade;
cabível quando faltar norma regulamentadora relacionada com qualquer norma constitucional de eficácia
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limitada;Os legitimados da ADI por omissão estão descritos no art. 103 da CF/88;Competência: Norma da
CF/88- STF; Norma da CE- TJ; Efeitos da decisão: Declarada a inconstitucionalidade por omissão, o Judiciário
dará ciência ao Poder competente para que este adote as providências necessárias. Se for órgão
administrativo, este terá um prazo de 30 dias para adotar a medida necessária. Se for o Poder Legislativo,
não há prazo.
Quanto à legitimação da pessoa jurídica de direito público para impetrar MI, apesar de existir decisão do STF
não admitindo (MI 537/SC, DJ DE 11.09.2001), parece que houve superação de tal entendimento, porquanto
no MI 725 o STF explicitou: “não se deve negar aos municípios, peremptoriamente, a titularidade de direitos
fundamentais (...) e a eventual possibilidade das ações constitucionais cabíveis para sua proteção (...) parece
bastante razoável a hipótese em que o município, diante de omissão legislativa inconstitucional impeditiva do
exercício desse direito, se veja compelida a impetrar mandado de injunção”.

II. Habeas Data


Trata-se, juntamente com o mandado de segurança coletivo e o mandado de injunção, de remédio
constitucional introduzido pelo constituinte originário de 1988. (art. 5º, LXXII)
Disciplina: Lei 9.507/97. Objeto: art. 7º da Lei 9.507/97.
Finalidade: a) Conhecimento de informações relativas à PESSOA DO IMPETRANTE; (após ter pedido
administrativamente e ter sido negado); b) Retificar dados, caso não prefira fazer isto por meio sigiloso,
administrativo ou judicial.
Decisão: caráter mandamental, compelindo o legitimado passivo à exibição e, se for o caso, à retificação do
assento incorreto ou indevido. Essa garantia não se confunde com o direito de obter certidões (art. 5º, XXXIV,
“b”), ou informações de interesse particular, coletivo ou geral (art. 5º, XXXIII). Havendo recusa no
fornecimento de certidões (para a defesa de direitos ou esclarecimento de situações de interesse pessoal,
próprio ou de terceiro), ou informações de terceiros o remédio próprio é o mandado de segurança, e não o
habeas data.
Competência CR/88: STF (102, I, d, e II, a); STJ (105, I, b); TRF (108, I, c); JF (109, VIII); TSE (121, §4º).
Constituição Estadual pode atribuir competência a juízes estaduais ou ao TJ.
Legitimação ativa: pessoa cujos dados constam do registro indigitado (remédio personalíssimo). Interesse:
deve ser formulado requerimento na via administrativa para se tornar admissível o habeas data. Caso
inexista pretensão resistida, há carência de ação por falta de interesse processual.
Legitimado Passivo: pode ser registro ou banco de dados de entidade governamental (administração direta e
indireta) e de entidade de caráter publico (exemplo o serviço de proteção ao crédito - SPC)
Procedimento: arts. 8º a 19 da Lei 9.507/97 (é gratuito por força constitucional e deve-se ouvir o MP).
Súmulas: STJ Súmula nº 2 Cabimento - Habeas Data Não cabe o habeas data (CF, Art. 5º, LXXII, letra a) se não
houve recusa de informações por parte da autoridade administrativa.O art. 19 da Lei n. 9.507/97 determina a
prioridade do habeas data sobre todos os demais processos, ressalvados o mandado de segurança e o habeas
corpus.
DIREITO ADMINISTRATIVO, CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. INADEQUAÇÃO DE HABEAS DATA PARA
ACESSOA DADOS DO REGISTRO DE PROCEDIMENTO FISCAL. O habeas data não é via adequada para obter
acesso a dados contidos em Registro de Procedimento Fiscal (RPF). Isso porque o RPF, por definição, é
documento de uso privativo da Receita Federal; não tem caráter público, nem pode ser transmitido a
terceiros. Além disso, não contém somente informações relativas à pessoa do impetrante, mas
principalmente, informações sobre as atividades desenvolvidas pelos auditores fiscais no desempenho de
suas funções. Nessa linha, o acesso a esse documento pode, em tese, obstar o regular desempenho do poder
de polícia da Receita Federal. REsp 1.411.585-PE, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 5/8/2014
Informativo nº 0548 do STJ - Período: 22 de outubro de 2014. Segunda Turma.
O habeas data é a garantia constitucional adequada para a obtenção dos dados concernentes ao
pagamento de tributos do próprio contribuinte constantes dos sistemas informatizados de apoio à
arrecadação dos órgãos da administração fazendária dos entes estatais. No caso concreto, o STF reconheceu
que o contribuinte pode ajuizar habeas data para ter acesso às informações relacionadas consigo e que
estejam presentes no sistema SINCOR da Receita Federal.O SINCOR (Sistema de Conta Corrente de Pessoa
Jurídica) é um banco de dados da Receita Federal no qual ela armazena as informações sobre os débitos e
créditos dos contribuintes pessoas jurídicas.A decisão foi tomada com base no SINCOR, mas seu raciocínio
poderá ser aplicado para outros bancos de dados mantidos pelos órgãos fazendários.
STF. Plenário. RE 673707/MG, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 17/6/2015 (repercussão geral) (Info 790)
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III. Aspectos processuais do Estatuto da Criança e do Adolescente
O Código de Processo Civil se aplica subsidiariamente ao Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 152).
Competência - A competência no Estatuto da Criança e do Adolescente é determinada pelo domicílio dos
pais ou responsável (art. 147, I, da Lei nº 8.069/90). Somente diante da constatação da falta desses é que será
determinada pelo lugar onde se encontre o menor ou o adolescente (art. 147, II). SÚMULA N. 383-STJ. A
competência para processar e julgar as ações conexas de interesse de menor é, em princípio, do foro do
domicílio do detentor de sua guarda. Quanto ao critério de fixação de competência, sempre que se tratar de
criança ou adolescente em situação de risco (art. 98 do ECA) o pedido de tutela ou guarda é da competência
da Justiça da Infância e da Juventude. Do contrário, encontrando-se o menor em situação regular, na qual
quem pleiteia sua guarda é um ente do próprio contexto familiar, competente para processar o feito é o Juízo
de Família. Assim, apenas quando há ameaça ou privação dos direitos reconhecidos no Estatuto da Criança e
do Adolescente é que a competência para o julgamento da ação de guarda é deslocada para o juízo
especializado da infância e juventude.
O Estatuto da Criança e do Adolescente traz o princípio da concentração de atos em audiência. Haverá
debates e julgamento na mesma audiência. Se o juiz não o fizer, deverá designar uma data para a leitura da
sentença no prazo máximo de 5 dias (não há publicação da sentença).( art. 162, §2º e §3º)
Direitos processuais: Acesso à justiça.
Art. 111, I ⇒ A atribuição de ato infracional ocorre na peça processual chamada de representação, que é a
peça inicial da ação sócio-educativa. É elaborada pelo Promotor de Justiça (MP). Art. 111, II ⇒ igualdade na
relação processual. Os adolescentes têm os mesmos direitos que os adultos, inclusive na ação sócio-
educativa. Art. 111, III ⇒ Direito do adolescente autor de ato infracional a defesa técnica por advogado. Art.
111, VI ⇒ Direito do adolescente autor de ato infracional de pedir presença dos pais/responsável durante o
processo. Art. 111, V e 186 ⇒ Direito de adolescente autor de ato infracional ser ouvido pessoalmente pela
autoridade competente. Súmula 265/STJ: “É necessária a oitiva do menor infrator antes de decretar-se a
regressão da medida sócioeducativa” Art. 184, § 3º ⇒ Não há processo por ato infracional “à revelia”- se não
localizado o adolescente, será suspenso o feito e expedido mandado de busca e apreensão. Art. 124 , I ⇒
Direito do interno entrevistar-se pessoalmente com o MP. Art. 143 ⇒ E vedada a divulgação de atos judiciais,
policiais e administrativos que digam respeito a crianças e adolescentes a que se atribua autoria de ato
infracional.
Nas ações de perda ou suspensão do poder familiar, o ECA prevê expressamente que o requerido recluso
deverá ser citado pessoalmente (158, § 2º)
Arts. 202 a 205 ⇒ O Ministério Público, quando não for parte, atuará obrigatoriamente. Sua intimação será
pessoal e a falta de intervenção acarretará nulidade. As manifestações do Parquet devem ser fundamentadas.
Há previsão específica na Lei 8.069/90, em relação à colocação em família substituta, nos casos de criança ou
adolescente indígena ou proveniente de comunidade remanescente de quilombo (art. 28, §6º): Será
considerada e respeitada sua identidade social e cultural, os seus costumes e tradições; a colocação ocorrerá
prioritariamente no seio da sua comunidade ou junto a membros da mesma etnia e a intervenção de
representantes do órgão federal responsável pela política indigenista. A Lei 13509/2017 revogou a o art. 161,
§2º que previa que nos casos de perda ou suspensão do poder familiar, se os pais forem oriundos de
comunidades indígenas, intervenção de representantes do órgão federal responsável pela política
indigenista junto a equipe multidisciplinar. A única forma de se formar família substituta estrangeira é pela
adoção - a chamada “adoção internacional”, sendo vedada nas formas de guarda e tutela (artigo 31 do ECA).
Família substituta estrangeira é aquela formada por estrangeiros residentes e domiciliados fora do Brasil.
Ressalte-se que não basta ser estrangeiro, é preciso também residir fora do Brasil (o casal de alemães
residentes no Brasil, por exemplo, que adota uma criança brasileira, não é considerado família substituta
estrangeira). O critério adotado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente é o da territorialidade e não o da
nacionalidade. O Brasil é signatário da Convenção relativa à proteção das crianças e à cooperação em matéria
de adoção internacional, firmada em Haia em 20 de maio de 1993. O conteúdo dessa convenção foi trazido
para o direito interno. A convenção determina a aplicação do Princípio da Territorialidade. O processo da
adoção internacional inicia-se com o deferimento do juízo para que sejam citadas "as crianças e adolescentes
em condições de serem adotados" e as "pessoas interessadas na adoção." (art. 50 ECA). Este procedimento é
uno tanto para a adoção nacional quanto para a internacional e é partir dele que o procedimento judicial de
fato se instaurará. para a adoção internacional é condição de procedibilidade a instrução da inicial com uma
certidão de habilitação expedida pela Comissão Estadual Judiciária de Adoção – CEJA As CEJA's nos estados
20
em que foram instituídas têm o condão de preparar o interessado estrangeiro para a adoção, realizando
estudo prévio das condições sociais e psicológicas do candidato. As comissões autenticam o procedimento da
adoção internacional e avalizam a idoneidade do candidato. Ressalta-se também que, no caso de adoção
internacional, após o regular trâmite processual em que se deferirá o pedido de adoção, o casal estrangeiro é
avisado para que possa vir ao Brasil para cumprir o estágio obrigatório de convivência. Para a adoção por
pessoa ou casal residente ou domiciliado fora do país, o estágio de convivência será de, no mínimo 30 dias e,
no máximo 45, prorrogável uma única vez, mediante decisão fundamentada (art. 46, §3º ECA, modificado
pela Lei 13.509/2017). Adoção por pessoa/casal residente no País só a previsão de prazo máximo, 90 dias
(art. 46, caput, modificado pela Lei 13.509/2017). A competência para requerer a perda ou suspensão do
poder familiar é do Ministério Público ou de quem tenha legítimo interesse (familiares, representante legal
etc.). A jurisprudência admite que alguém que queira ficar com a criança possua também legítimo interesse.
Há necessidade da realização de um estudo social do caso. Esse estudo social funciona como um laudo
pericial. O Estatuto da Criança e do Adolescente determina que esse estudo seja feito por um corpo
interdisciplinar. Necessário verificar o ambiente em que o menor se encontra. A perda ou suspensão do
poder familiar deverão ser averbadas no Registro Civil.
Convenção de Haia – principais objetivos: adoção internacional realizada segundo o interesse superior da
criança; respeito aos direitos fundamentais internacionais; coibição ao tráfico de crianças.
Controvérsias: A Convenção admite que a adoção seja realizada no país de acolhida. De acordo com nosso
ordenamento jurídico interno, isso não é possível. A adoção internacional deve ser realizada e processada no
Brasil, conforme a lei pessoal da criança, qual seja a do seu domicílio. A Convenção possibilita a saída do
adotando para o país do adotante antes do trânsito em julgado da sentença. O ECA não permitia a saída do
adotando do território nacional antes de consumada a adoção (Art. 51, § 4º), todavia tal artigo foi revogado.
A Convenção admite a manutenção do vínculo de filiação entre a criança e seus pais biológicos. Conforme o
ordenamento jurídico interno, o registro original do adotado é cancelado, sendo feito outro registro em que
constam os adotantes como pais, bem como o nome de seus ascendentes como avós. Não podendo constar
na nova certidão de registro nenhuma observação sobre a origem do ato, como forma de se evitar a distinção
entre filhos naturais e adotivos. Art. 47. O consentimento da criança deve ser considerado, devendo-se
observar a idade e o grau de maturidade da criança, diferentemente do previsto no ECA, segundo o qual o
consentimento da criança só é necessário em se tratando de adotando maior de 12 anos de idade. Art. 45,
§2º. Obrigatoriedade de cada Estado Contratante designar uma Autoridade Central encarregada de dar
cumprimento às obrigações impostas pela Convenção. A criação de uma Comissão Estadual Judiciária de
Adoção é uma faculdade. Art. 52 do ECA. A Convenção não prevê a obrigatoriedade do estágio de
convivência. Entretanto, as adoções de crianças brasileiras devem seguir o preceituado no ECA
(obrigatoriedade do estágio de convivência). Art. 46
Recursos ⇒ conforme artigo 158 do ECA, são de 10 (dez) dias para a apresentação de defesa;
⇒ segundo o artigo 198 do ECA, todos os recursos serão interpostos independente de preparo;
⇒ com exceção do agravo de instrumento e de embargo de declaração, o prazo para interpor e para
responder será sempre de 10 (dez) dias.
⇒ há juízo de retratação por despacho fundamentado, mantendo ou reformando a decisão, no prazo de
05(cinco) dias.
Direitos coletivos: arts. 208 a 224.
Súmulas: STJ 108, 265, 338, 342, 383
Casuística: INFO 559 STJ (16//04/2015) No caso em que criança tenha sido supostamente retida ilicitamente
no Brasil por sua genitora, não haverá conflito de competência entre (a) o juízo federal no qual tramite ação
tão somente de busca e apreensão da criança ajuizada pelo genitor com fundamento na Convenção de Haia
sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças e (b) o juízo estadual de vara de família que
aprecie ação, ajuizada pela genitora, na qual se discuta o fundo do direito de guarda e a regulamentação de
visitas à criança; verificando-se apenas prejudicialidade externa à ação ajuizada na Justiça Estadual, a
recomendar a suspensão deste processo até a solução final da demanda ajuizada na Justiça Federal. (CC
132.100-BA, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 25/2/2015, DJe 14/4/2015.)

IV. Aspectos processuais do Estatuto da Pessoa com Deficiência


A Lei 13.146/15 foi fortemente influenciada pela Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência,
realizada em Nova York, em 2007(a Convenção foi introduzida no ordenamento jurídico com status de
emenda constitucional). Conceito de pessoa com deficiência: Lei nº 8.742/93-Pessoa incapaz para o trabalho
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e para a vida independente; Convenção de Nova York- a deficiência é um conceito em evolução e que a
deficiência resulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras devidas às atitudes e ao
ambiente que impedem a plena e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de
oportunidades com as demais pessoas; Lei 13.146/15- pessoa com deficiência aquela que tem impedimento
de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as
demais pessoas.Com Estatuto, a incapacidade civil no Brasil foi reconstruída. Atualmente, a única hipótese de
incapacidade absoluta no ordenamento jurídico é o caso dos menores impúberes. Tal modificação se fez
necessária porque, na grande maioria dos casos, apesar de deficiência, a pessoa tem a sua capacidade de
entendimento plenamente reservada, podendo, livremente, expor a sua vontade. Sendo assim, não tem
qualquer impedimento para o casamento ou para constituir união estável. O Estatuto da Pessoa com
Deficiência modificou o instituto da curatela, além de instituir a tomada de decisão apoiada. Tomada de
decisão apoiada (art.1783-A CC)-Visa a manutenção da autonomia do deficiente aliada ao seu melhor
interesse. É preferencial em relação a curatela. Não pressupõe a incapacidade, mas mera necessidade de
apoio. Somente pode ser promovida pelo próprio deficiente. Natureza jurídica de procedimento especial de
jurisdição voluntária. Curatela-É medida extraordinária. Limitada a atos patrimoniais ou negociais. Pressupõe
a incapacidade relativa do deficiente. Pode ser promovida pelo próprio deficiente, bem como por outros
legitimados no art. 747 do CPC. Direitos políticos- Nos termos do artigo 76, EPD, o poder público deverá
garantir à pessoa com deficiência todos os direitos políticos e a oportunidade de exercê-los em igualdade de
condições com as demais pessoas, assegurando-lhe não só acessibilidade aos locais de votação, mas,
essencialmente, o direito de votar e de ser votada. Direito à igualdade e à não discriminação: Toda pessoa
com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades com as demais pessoas e não sofrerá nenhuma
espécie de discriminação. São considerados especialmente vulneráveis a criança, o adolescente, a mulher e o
idoso, com deficiência (art. 4). Adaptação razoável corresponde a modificações e ajustes necessários e
adequados que não acarretem ônus desproporcional ou indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de
assegurar que as pessoas com deficiência possam gozar ou exercer, em igualdade de oportunidade com as
demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais. A discriminação por recusa de
adaptação razoável surge quando tais modificações e ajustes são, injustificadamente, negados as pessoas
com deficiência. A Jurisprudência já aplicou o tema no tocante a necessidade de utilização do método Braille
nos contratos bancários firmados com pessoas portadoras de deficiência visual (Info 559 STJ). Direito a
atendimento prioritário (art.9). Direito a vida (art.11). Direito à habilitação e reabilitação (art.14). Direito à
saúde (art. 18,19, 23). A Convenção da ONU sobre o direito das pessoas com deficiência foi elaborada em
processo que contou com a efetiva participação das pessoas com deficiência, com o mote “nothing about us
without us” (“nada sobre nós sem a nossa participação”). Trata-se, basicamente, da ideia de que políticas
públicas que visam proteger determinados grupos vulneráveis não devem ser decididas sem a participação
direta e oportunidade de representação de seus beneficiários. O §1º do art. 18 da Lei 13.146/15 reflete bem
esse espírito. Direito à educação- (art.27) educação inclusiva. Recentemente, o STF declarado constitucionais
os art. 28, § 1º e o art. 30 da Lei nº 13.146/2015, que determinam que as escolas privadas ofereçam
atendimento educacional adequado e inclusivo às pessoas com deficiência sem que possam cobrar valores
adicionais de qualquer natureza em suas mensalidades, anuidades e matrículas para cumprimento dessa
obrigação. STF. Plenário. ADI 5357 MC-Referendo/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 9/6/2016 (Info 829).
Direito à moradia (art. 31 e 32). Direito à assistência social (art.34). Direito à previdência social-Os direitos
previdenciários continuam sendo regidos pela LC nº 142, de 8 de maio de 2013 (art. 41, Estatuto), sendo
garantido ainda os direitos do art. 95.Direito à cultura, lazer, turismo, esporte ( art. 42). Direito à transporte
e mobilidade (art.46, 47, 52).Acessibilidade (art. 3, I) é direito que garante à pessoa com deficiência ou com
mobilidade reduzida viver de forma independente e exercer seus direitos de cidadania e de participação
social. Se trata de um conceito amplo, englobando todo e qualquer instrumento capaz de propiciar a
inclusão do deficiente em igualdade de condições com os demais, positivando o princípio da isonomia.

3A. Processo: conceito e natureza jurídica. As garantias constitucionais do processo: contraditório, juiz
natural, ampla defesa, acesso à justiça.

Mariana Barreto
Obras Consultadas: Marinoni, Arenhart e Mitidiero. NCPC Comentado (2017).
Marinoni, Arenhart e Mitidiero. Novo curso de Processo Civil. Vol. 1.
Legislação: CF; CPC/15.

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PROCESSO: CONCEITO.
Processo é o instrumento por meio do qual o Estado exerce a jurisdição, sendo o meio pelo qual se
provoca a jurisdição e serve para realização do direito material. O CPC/15 fundamenta-se em normas
fundamentais, essenciais para a exata compreensão do novo modelo de processo civil brasileiro.
As normas fundamentais elencadas pelo legislador infraconstitucional constituem as linhas mestras do
Código: são os eixos normativos a partir dos quais o processo civil deve ser interpretado, aplicado e
estruturado. As normas fundamentais do processo civil estão obviamente na CF/88 e podem ser
integralmente reconduzidas ao direito fundamental ao processo justo (art. 5º, LIV, CF). O Código não
reproduz a título de normas fundamentais todos os direitos fundamentais processuais que compõem o
direito ao processo justo. Isso não quer dizer que esses direitos fundamentais tenham perdido esse status
normativo: o direito ao juiz natural, o direito à defesa e o direito à prova, por exemplo, permanecem como
normas fundamentais do processo civil brasileiro, nada obstante a ausência de reprodução no Código.

PROCESSO: NATUREZA JURÍDICA.


Diversas teorias já foram elaboradas com o intuito de identificar a natureza jurídica do processo.
Dentre elas, destacam-se: a) Processo = contrato – o principal fundamento dessa teoria tinha como ponto de
partida, em geral, o direito romano e, em especial, a litiscontestatio, que representava a concordância das
partes em sofrer os efeitos da demanda; b) processo = quase-contrato – de autoria do francês Arnault de
Guényvau, objetivava determinar a natureza jurídica de direito privado ao processo e, não se aceitando
tratar-se de um contrato, nem de um ilícito, a única saída viável seria tratar-se de um quase contrato; c)
processo = procedimento (rito judicial de aplicação do direito material que se tornou litigioso), na fase em
que o processo civil ainda não era autônomo – hoje entende-se que procedimento é a exteriorização do
processo, seu aspecto visível, considerando-se que a noção de processo é teleológica, voltada para a
finalidade de exercício da função jurisdicional no caso concreto; d) processo = situação jurídica
(Goldschmidt): teoria que confere bases para o reconhecimento posterior do caráter publicista ao processo.
Preconizava que diferentemente do direito material, no processo predomina o estado de incerteza, de
insegurança de direitos e obrigações entre aqueles que se encontram em conflito; o processo seria
caracterizado como um sistema de possibilidades e de ônus, ou seja, a sucessão de diferentes situações
jurídicas, capazes de gerar para os sujeitos deveres, poderes, ônus, faculdades e sujeições, com base em uma
concepção teleológica do processo; e) processo = relação jurídica processual (Oscar Von Bülow): teoria que
retirou o processo do âmbito privatista, finalmente alçando-o ao âmbito publicista, em que até hoje se
encontra. Criou a nítida distinção entre relação jurídica processual e relação jurídica material, sendo esta o
objeto de discussão no processo, enquanto a relação de direito processual é a estrutura por meio da qual
essa discussão ocorrerá. A relação jurídica pode se apresentar: (i) linear (que se desenvolve entre autor e
réu); (ii) angular (entre autor-juiz e juiz-réu); (iii) triangular (abarcando: autor-juiz; juiz-réu e autor-réu). Essa
última é a teoria predominante na doutrina brasileira, que preconiza que o processo é o procedimento que,
adequado à tutela dos direitos, confere legitimidade democrática ao exercício do poder jurisdicional.” É
frequente a utilização de processo e de relação jurídica processual como sinônimos. Há, contudo, outros
autores que veem o processo como uma entidade complexa: Dinamarco: processo = procedimento + relação
jurídica processual (isto é, processo = relação entre os atos do processo + relação entre os sujeitos do
processo); e Fazzalari: processo = procedimento + contraditório.
Importante ressaltar que o princípio fundamental do Devido Processo Legal foi concebido na CF/88
como cláusula geral, aberta, o que possibilita ao magistrado, no Estado Constitucional, realizar o seu papel de
maneira criativa, limitado pela persuasão racional ou livre convencimento motivado. Ademais, frise-se a
aproximação do nosso antigo modelo de Civil Law à Common Law inglesa, através dos institutos dos
precedentes judiciais, mormente as Súmulas Vinculantes introduzidas na CF/88, o que possibilita, na visão de
Didier, uma mistura de sistemas que pode ser caracterizado como Brazilian Law.

AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO: CONTRADITORIO, JUIZ NATURAL, AMPLA DEFESA,


ACESSO À JUSTIÇA.
A necessidade de que fique evidente a harmonia da lei ordinária em relação à CF/88 fez com que se
incluíssem no Código, expressamente, princípios constitucionais, na sua versão processual. Trata-se de uma
forma de tornar o processo mais eficiente e efetivo, o que significa, indubitavelmente, aproximá-lo da CF,
que preconiza que o processo deve assegurar o cumprimento da lei material.
23
Compromissos fundamentais: A maior visibilidade outorgada a determinados direitos fundamentais
processuais no NCPC em detrimento de outros por força da previsão como normas fundamentais do
processo civil decorre da circunstância desses constituírem compromissos fundamentais do legislador:
respeitar a liberdade e a igualdade de todos perante a ordem jurídica (arts. 1º, 2º, 3º e 8º, CPC), prestar
tutela tempestiva aos direitos (arts. 4º e 12, CPC) e administrar a justiça civil a partir de uma ideologia
democrática (o que leva a um novo equacionamento das relações entre o juiz e as partes a colaboração, do
contraditório e da fundamentação, arts. 5º, 6°, 7º, 9º, 10 e 11 CPC). Quando estiver em causa, o significado
do direito fundamental tal como reproduzido ou densificado pelo CPC, caberá recurso especial para o STJ.
Quando, porém, estiver em causa eventual questionamento sobre injusta proteção ao direito fundamental
processual pelo Código (por ausência de proteção, proteção insuficiente ou retrocesso de proteção), caberá
recurso extraordinário para o STF.
Conteúdo do direito ao processo justo: Trata-se de termo indeterminado. É uma cláusula geral - a
norma prevê um termo indeterminado no seu suporte fático e não comina consequências jurídicas à sua
violação. No entanto, é possível identificar o seu núcleo duro, sem o qual seguramente não se está diante de
um processo justo. Em primeiro lugar, do ponto de vista da divisão do trabalho processual, o processo justo é
pautado pela colaboração do juiz para com as partes (art. 6º, CPC). O juiz é paritário no diálogo e assimétrico
apenas no momento da imposição de suas decisões. Em segundo lugar, constitui processo capaz de prestar
tutela jurisdicional adequada e efetiva (art. 5º, XXXV, CF, e 3º, CPC), em que as partes participam em pé de
igualdade e com paridade de armas (art. 5º, I, CF, e 7º, CPC), em contraditório (art. 5º, LV, CF, e 7º, 9º e 10,
CPC), com ampla defesa (art. 5º, LV, CF), com direito à prova (art. 5º, LVI, a contrariosensu, CF, e 369, CPC),
perante juiz natural (arts. 5º, XXVII e LIII, CF), em que todos os seus pronunciamentos são previsíveis,
confiáveis e motivados (arts. 93, IX, CF, e 11 e 489, §1º, CPC), em procedimento público (arts. 5º, LX, e 93, IX,
CF, e 11 e 189, CPC), com duração razoável (arts. 5º, LXXVIII, CF, e 4º, CPC) e em, em sendo o caso, com
direito à assistência jurídica integral (art. 5º, LXXIV, CF, e 98 a 102, CPC) e com formação de coisa julgada (art.
5º, XXXVI, CF, e 502, CPC).
A aferição da justiça do processo mediante a verificação pontual de cada um de seus elementos é
método recorrente na jurisprudência. Trata-se de meio objetivo de controle de justiça processual. A violação
do direito ao processo justo pode ser direta ou indireta. O cabimento de RE fundado na violação do direito
ao processo justo (art. 5º, LIV, CF) só se configura quando há ofensa direta. Quando o exame da violação do
direito ao processo justo depende da simples interpretação da legislação infraconstitucional que o
concretiza, há apenas ofensa indireta. Isso não quer dizer, contudo, que o Supremo não possa controlar
mediante RE a suficiência ou a excessividade da proteção despendida pelo legislador infraconstitucional na
densificação do principio do direito ao processo justo. Nesse caso não há simples interpretação de normas
infraconstitucionais. Há controle de adequada densificação do direito ao processo justo. Quando a parte
afirma a existência de proteção insuficiente ou excessiva da legislação diante da Constituição, afirma a
existência de ofensa direta à normatividade do direito ao processo justo, desencadeando a possibilidade de
controle de constitucionalidade da legislação infraconstitucional, o que autoriza a interposição e o
conhecimento de RE. O mesmo quando se afirma a violação do direito ao processo justo pela ausência de
norma infraconstitucional que o concretize. Nesse caso há igualmente ofensa direta e cabe RE.
O direito ao processo justo goza de eficácia vertical, horizontal e vertical com repercussão lateral. O
mesmo se diga de seus elementos estruturantes. Ele obriga o Estado Constitucional a adotar condutas
concretizadoras da protetividade que dele emana (eficácia vertical), o que pode ocasionar repercussão
lateral sobre a esfera jurídica dos particulares (eficácia vertical com repercussão lateral). Ainda, obriga os
particulares, em seus processos privados tendentes a restrições e extinções de direitos, a observá-lo (eficácia
horizontal). O direito ao processo justo é multifuncional. Ele tem função integrativa interpretativa,
bloqueadora e otimizadora. Como princípio, exige a realização de um estado ideal de proteção aos direitos,
determinando a criação dos elementos necessários à promoção do ideal de protetividade, a interpretação
das normas que já preveem elementos necessários à promoção do estado ideal de tutelabilidade, o bloqueio
à eficácia de normas contrárias ou incompatíveis com a promoção do estado de proteção e a otimização do
alcance do ideal de protetividade dos direitos no Estado Constitucional. A atuação do legislador
infraconstitucional é a concretização do direito ao processo justo. Há aí dupla presunção: subjetiva, de que o
legislador realizou sua função dando adequada resposta à norma constitucional (favor legislatoris), e
objetiva, de que a lei realiza de forma justa o direito fundamental ao processo justo favor legis). O direito ao
processo justo é o fundamento da unidade na conformação do processo no Estado Constitucional. Impõe-se
não só uma leitura a partir da Constituição da legislação infraconstitucional, mas também de um diálogo das
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fontes para melhor interpretação da legislação processual e para otimização de soluções conforme ao direito
fundamental ao processo justo.

CONTRADITÓRIO:
A realização plena do contraditório que faz surgir cognição exauriente.
Paridade de tratamento e efetivo contraditório: O direito à igualdade processual - formal e material - é
o suporte do direito à paridade de annas no processo civil (Waffengleichheit, parità delle armi, égalité des
armes). O processo só pode ser considerado justo se as partes dispõem das mesmas oportunidades e dos
mesmos meios para dele participar. Vale dizer: se dispõem das mesmas armas, se dispõem de paridade de
tratamento. Trata-se de exigência que obviamente se projeta sobre o legislador e sobre o juiz: há dever de
estruturação e condução do processo de acordo com o direito à igualdade e à paridade de tratamento. Como
facilmente se percebe, a igualdade - e a paridade de tratamento e de armas nela implicada-constitui
pressuposto para efetiva participação das partes no processo e, portanto, é requisito básico para plena
realização do direito ao contraditório (art. 7.0, in fine, CPC).
A dignidade da pessoa humana veda a transformação das partes em objeto da atividade jurisdicional. E
por essa razão que a dignidade da pessoa humana tem estreita ligação com o direito de participação das
partes na construção dos provimentos jurisdicionais, isto é, na previsão do direito ao contraditório como
direito de influência (arts. 9 e 10, CPC) e o dever de fundamentação como dever de debate (arts. 11 e 489, §§
1.0 e 2. 0, CPC). O juiz ao aplicar o ordenamento jurídico e ao conduzir o processo deve resguardar promover
a dignidade da pessoa humana, o que significa encarar o processo como um meio para tutela dos direitos,
respeitar a liberdade das partes nos seus espaços de autodeterminação e adotar o contraditório como
método de trabalho.
O erro de forma do processo só não possibilita o aproveitamento dos atos praticados se dele resultar
violação do direito fundamental a ampla defesa e do direito fundamental ao contraditório (art. 5.º, LV, CF).
Trata-se de evidente concretização da economia processual e da regra instrumentalidade das formas
processuais para o STJ.

JUIZ NATURAL:
O direito fundamental ao juiz natural implica juiz imparcial e investido de competência absoluta (art.
S.º, XXXVII e LIII, CF), daí a razão pela qual não há processo justo diante de juiz absolutamente incompetente
(art. 5. º, LIV, CF). A competência absoluta é um requisito de validade do processo, razão pela qual decisão
proferida por órgão jurisdicional absolutamente incompetente é passível de ação rescisória (art. 966, II, CPC).
Ressalte que atos concertados implicam o prévio ajuste, entre juízes, para a pratica de atos que interessem a
vários processos. Podem consistir em qualquer ato, não estando habilitado aqueles indicados nos incisos Ia
VII, do art. 69, § 2.0, CPC. Não se pode, porém, delegar atividades que possuam caráter decisório, sob pena
de violação do princípio do juiz natural (art. 5.0, XXXVII e LIII, CF).
A Constituição não determina o juiz natural recursal. O CPC, no entanto, define o juiz natural recursal
como sendo o órgão colegiado do tribunal a que compete o conhecimento do recurso. Nesse sentido, o
relator, alçando mão do art. 932, CPC, apenas representa o órgão fracionário - a possibilidade de decisão
monocrática representa simples delegação de poder do colegiado ao relator. O relator tem o dever de julgar
o recurso monocraticamente, preenchidos os requisitos inerentes à espécie, porque aí estará prestigiando a
autoridade do precedente (arts. 926 e 927, CPC) e patrocinando sensível economia processual. Pode o
relator julgar monocraticamente qualquer espécie recursal a partir do art. 932, CPC, podendo inclusive
invocá-lo para decidir a remessa necessária (Súmula 253, STJ: "o art. 557 do CPC, que autoriza o relator a
decidir o recurso, alcança o reexame necessário") e para, em sendo o caso, decidir questões concernentes a
processos de competência originária. O relator deve exercer seus poderes de ofício, independentemente de
requerimento de quaisquer das partes.

AMPLA DEFESA:
A palavra “ampla” qualifica a defesa garantida pela CF/88. É o conteúdo de defesa necessário para que
o réu possa se opor ao pedido de tutela jurisdicional do direito e à utilização de meio executivo inadequado
ou excessivamente gravoso. A intenção da norma é evitar que a lei ou o juiz limitem a defesa, restringindo a
possibilidade de o réu alegar, provar etc. Mas isso é verdade no sentido de que a defesa não pode ser
limitada irracionalmente. Há situações em que a limitação da defesa é necessária para permitir a efetividade
da tutela do direito. Assim, por exemplo, diante da necessidade de tutela antecipada fundada na urgência, é
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possível postecipar a realização da defesa para momento posterior ao da produção de efeitos sobre a esfera
jurídica do réu (assim, o art. 9.º, parágrafo único, II, autoriza nesses casos a realização do direito ao
contraditório de forma diferida ou postecipada). Por outro lado, quando, no procedimento da ação
expropriatória (art. 20 do Dec. -lei 3.365/1941), afirma -se que a contestação só poderá versar sobre vício do
processo judicial ou impugnação do preço oferecido pelo bem objeto da desapropriação, isto é, justificado
pela necessidade de se dar tutela ao direito de desapropriar do Poder Público. Porém, se tal limitação é
legítima para viabilizar a desapropriação, é evidente que qualquer outra questão que poderia impedir a
tutela do direito deve poder ser apresentada pelo réu em ação autônoma, proposta em face do autor da
ação de desapropriação (o contraditório sobre a questão cuja cognição é vedada realiza -se de forma
eventual). Importa evitar que a restrição da defesa redunde em “prejuízo definitivo”, retirando do réu a
oportunidade de exercer a defesa em fase posterior à decisão proferida no curso do processo ou mesmo
através do exercício de ação autônoma.
A citação é uma densificação do direito fundamental à ampla defesa (art. 5º, LV, CF) e visa a outorgar
ao demandado ciência efetiva dos termos em que proposta a ação, a integrá-lo como parte no processo e
possibilitar a sua adequada reação em juízo. Constitui um dos elementos centrais de nosso processo justo.
No que se refere à citação por edital, à vista do direito fundamental à ampla defesa (art. 5.0, LV, CF), este
deve indicar a finalidade para a qual é citado o demandado e sucinta descrição da causa de pedir e do
pedido, conforme já decidiu o STJ. Fora daí pode ser decretada a sua invalidade. A ampla defesa (art. 5, LV,
CF) também é exercida pelo demandado por meio da contestação. A contestação é o meio de defesa por
excelência do réu. No direito brasileiro, a contestação tem três características básicas: é total (arts. 336 e
342, CPC), formal (art. 337, CPC) e especificada (art. 341, CPC). Não há dever de contestar. Contestar é um
direito e é um ônus do réu.

ACESSO À JUSTIÇA:
O direito de ação como direito de acesso à justiça: O direito de ação, no Estado liberal, era indiferente
às necessidades sociais, as quais são à base da conformação atual do acesso à justiça. Na época dos Estados
liberais burgueses, por direito de ação entendia-se apenas o direito formal de propor uma ação. Estaria em
juízo quem pudesse suportar os custos de uma demanda. Porém, quando as liberdades públicas passaram a
ser vistas como privilégios de alguns (burgueses), o Estado deu uma nova roupagem e dimensão aos antigos
direitos e instituiu direitos pensados como fundamentais para uma organização justa e igualitária da
sociedade, agregando ao direito de ação outros conteúdos. As Constituições do século XX procuraram
integrar as liberdades clássicas, inclusive as de natureza processual, com os direitos sociais, inclusive o direito
de ação, que passou a ser focalizado como “direito de acesso à justiça”, tornando -se objeto da preocupação
dos mais modernos sistemas jurídicos do século passado.
O problema da “efetividade” do direito de ação tornou-se mais nítido quando da consagração
constitucional dos chamados “novos direitos”. Como adverte Boaventura de Souza Santos, os novos direitos
sociais e econômicos, caso ficassem destituídos de mecanismos que fizessem impor o seu respeito,
assumiriam a configuração de meras declarações políticas. Logo percebeu-se que a administração da justiça
civil e os processos judiciais não mais poderiam ficar reduzidos a uma dimensão meramente técnica e
socialmente neutra, devendo investigar-se as funções sociais por eles desempenhadas e, em especial, o
modo como as opções técnicas veiculavam opções a favor ou contra interesses sociais divergentes ou mesmo
antagônicos. Percebeu-se que o exercício da ação poderia ser comprometido por obstáculos sociais e
econômicos, e que os direitos voltados a garantir uma nova forma de sociedade, identificados nas
Constituições modernas, apenas poderiam ser concretizados se garantido um real acesso à justiça. Assim, o
direito de ação passou a ser pensado sob o slogan de “direito de acesso à justiça”, perdendo a característica
de instituto indiferente à realidade social. O acesso à justiça foi o tema-ponte que fez a ligação do processo
civil – antes compreendido exclusivamente na sua dimensão técnica – com a “justiça social”. A realização do
direito de acesso à justiça é indispensável à própria configuração de Estado, uma vez que não há como
pensar em proibição da tutela privada e, assim, em Estado, sem se viabilizar a todos a possibilidade de
efetivo acesso ao Poder Judiciário. Por outro lado, para se garantir a participação dos cidadãos na sociedade,
e dessa forma a igualdade, é imprescindível que o exercício da ação não seja obstaculizado, até porque ter
direitos e não poder tutelá-los certamente é o mesmo do que não os ter.
Merecem cuidado as normas que obstaculizam ou dificultam o acesso à justiça, as normas que são
insuficientes para permitir a efetividade da tutela jurisdicional e, ainda, a falta de norma processual que
impede a adequada tutela do direito. Todas as regras processuais relacionadas com o direito de ação
26
devem ser compreendidas à luz do direito fundamental de ação, devendo-se ter em consideração a
imprescindibilidade de se outorgar plena oportunidade de acesso à justiça, mas também as necessidades de
direito material e a espécie de tutela do direito material objetivada pela ação. Além de contornar os
obstáculos de natureza social ao acesso à justiça, é preciso oportunizar uma adequada participação em juízo
e instituir as técnicas processuais capazes de permitir a adequada, efetiva e tempestiva tutela do direito
material. O art. 319, §3º, CPC preconiza que não dispondo o autor de informações que permitam a citação do
réu, tem o juiz o dever de auxiliá-lo na obtenção dessas informações (art. 319, § 1.0, CPC), inclusive a fim de
não tornar impossível ou excessivamente oneroso o acesso à justiça (art. 319, §3.0, CPC). Trata-se de regra
inerente à colaboração judicial no processo civil.
O acesso à justiça também se refere ao direito de defesa do réu. O direito de acesso à jurisdição –
tanto do autor quanto do réu – é um direito à utilização de uma prestação estatal imprescindível para a
efetiva participação do cidadão na vida social e assim não pode ser visto como um direito formal e abstrato –
ou como um simples direito de propor a ação e de apresentar defesa–, indiferente aos obstáculos sociais que
possam inviabilizar o seu efetivo exercício. O acesso à justiça, portanto, propõe a problematização do direito
de ir a juízo – seja para pedir a tutela do direito, seja para se defender – a partir da ideia de que obstáculos
econômicos e sociais não podem impedir o acesso à jurisdição, já que isso negaria o direito de usufruir de
uma prestação social indispensável para o cidadão viver harmonicamente na sociedade. O direito à
assistência judiciária gratuita, isto é, o direito a advogado, o direito à isenção de custas e despesas
processuais, assim como o direito à produção de provas de forma gratuita, importa não apenas ao autor, mas
também ao réu. Tais garantias objetivam dar às partes a possibilidade de efetivamente participarem do
processo. O exercício do poder jurisdicional somente é legítimo quando os interessados no ato de
positivação do poder (na decisão) podem efetiva e adequadamente participar do processo, controlando a
racionalidade do exercício do poder estatal. Um processo que não garante a todos, independentemente das
suas posições financeiras, o acesso à justiça possui um déficit de legitimidade. No CPC, há regra que
instrumentaliza este direito: A contestação é apresentada ao juiz da causa (art. 217, CPC). Mas, havendo
alegação de incompetência relativa ou absoluta a fim de facilitar o acesso à justiça do réu, a contestação
poderá ser protocolada no foro do seu domicílio (art. 340, CPC). É uma inovação do NCPC, inspirada na então
exceção de incompetência fundada na alegação de nulidade de cláusula de eleição de foro, que poderia ser
oposta no juízo do foro do réu. Nesse caso, a contestação será submetida à livre distribuição ou, se o réu
houver sido citado por meio de carta precatória, juntada aos autos dessa carta, com remessa para o juízo da
causa (art. 340, § 1.0, CPC). Seguindo-se a regra de que o juiz da causa é o primeiro juiz da sua própria
competência (Kompetenz-Kompetenz), dele é a decisão. Reconhecida a competência do foro indicado pelo
réu, o juízo para o qual fora distribuída a contestação ou a carta precatória será considerado prevento (art.
340, §2.0, CPC).
Outra regra do CPC que concretiza o acesso à justiça: Não ocorre o efeito material da revelia nas
hipóteses do art. 345, CPC. Além desses casos, uma análise sociológica do perfil do demandado pode
conduzir à conclusão que, em nome da igualdade substancial entre os litigantes (arts. 5.0, I, CF, e 7, CPC),
cuja observância deve o juiz patrocinar (art. 139, I, CPC), tem o juiz de elidir o efeito material da revelia e
considerar fictamente contestadas as alegações fáticas do autor em determinadas situações. Levando em
consideração o grau de esclarecimento do demandado, a extensão do território nacional e a sua eventual
dificuldade de acesso à Justiça, pode o juiz excepcionalmente deixar de aplicar o efeito material da revelia.
Naturalmente, a decisão tem de ser fundamentada. O livro do Arenhart trata ainda de outras situações
acerca do acesso à justiça: a) Pessoa com Deficiência e Acesso à Justiça: De acordo com o art. 6 da Lei
13.146/2015, a deficiência não afeta a plena capacidade civil. Apenas haverá incapacidade - no plano do
direito material e no plano do direito processual - se houver avaliação biopsicossocial idônea que aponte
nesse sentido (art. 2, §1º, Lei 13.146/2015). Fora daí há capacidade; b) Revisão do valor da multa por
embargos protelatórios: Excepcionalmente, o STJ admite a revisão do valor da multa fixada, em atenção à
garantia de acesso à justiça, "(...) uma vez que sua preservação inviabiliza o direito de recorrer, o qual se
encontra condicionado ao depósito da multa" (STJ, 2016); c) Ponderação: As limitações à concessão de tutela
provisória contra a Fazenda Pública sujeitam-se a juízo de ponderação no caso concreto. Afinal, diante de
efetiva urgência na medida antecipatória ou cautelar, não se justifica a vedação apriorística e absoluta à
outorga da proteção liminar, sob pena de se violar a garantia de acesso à Justiça {art. 5.0, XXXV, CF) e da
duração razoável do processo (art. 5.0, LXXVIII, CF).

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3B. Sentença. Conteúdo e elementos. Interpretação da sentença. Tutela inibitória

Rafael Rodrigues Veloso

01) CONCEITO DE SENTENÇA:


01.1) UM CONCEITO DE SENTENÇA PREOCUPADO COM A SISTEMATIZAÇÃO DO PROCESSO CIVIL A PARTIR
DO EIXO DA TUTELA DOS DIREITOS: deve levar em consideração a necessidade de coordenação das
atividades processuais necessárias para prestação da tutela jurisdicional como um todo – isto é, desde a
demanda até a concretização dos direitos. Nessa perspectiva teórica, a sentença deve ser vista como um ato
processual que assinala o momento em que o perfil da técnica processual se altera: abandonam -se as
técnicas voltadas à cognição e adotam -se as técnicas pré -ordenadas à execução dos direitos. Aliás, tivesse o
legislador aproveitado a oportunidade do novo Código para adotar a regra da execução imediata da
sentença, isto é, da previsão de apelação sem efeito suspensivo, seria ainda mais nítida essa divisão de
atividades que a sentença marca no procedimento comum no juízo de primeiro grau.

01.2) A PRINCIPAL PREOCUPAÇÃO DO CÓDIGO BUZAID NESSE TERRENO: estava em relacionar atos
decisórios com determinadas espécies recursais – das decisões interlocutórias cabem agravos, das sentenças,
apelações. A solução conceitual encontrada por Alfredo Buzaid, porém, aos poucos se mostrou insuficiente
para compreensão do conceito de sentença em toda a sua extensão, ao mesmo tempo em que acabou sendo
paulatinamente incapaz de abarcar decisões definitivas sobre o mérito da causa que não punham fim ao
processo – mas apenas à sua fase de conhecimento – e aquelas que decidiam apenas parcela do mérito da
causa. Isso por duas razões: a primeira, porque o Código Buzaid estava comprometido com uma
compreensão processualmente fragmentada da atividade processual (para cada atividade uma espécie de
processo); a segunda, porque estava alicerçado no princípio da unidade e unicidade da sentença (a sentença
era apenas uma só ao longo do procedimento e necessariamente estava voltada a extingui-lo).

01.3) VISTO NA PERSPECTIVA DA TUTELA JURISDICIONAL DOS DIREITOS, PORÉM, O PROCESSO DEVE SER
ENCARADO UMA UNIDADE EM QUE SE MISTURAM AS ATIVIDADES DE COGNIÇÃO E EXECUÇÃO: O processo
– como está pré-ordenado à obtenção de um resultado no plano material – só termina com a consecução
dessa tutela prometida pelo direito material. Não por acaso o procedimento comum engloba uma fase de
conhecimento e outra de cumprimento de sentença, tendo o legislador expressamente referido que a tutela
jurisdicional do direito só é ultimada efetivamente com a execução do julgado (art. 4.º do CPC – em atenção
ao art. 5.º, LXXVIII, da CF). Em outras palavras, o processo não termina com a sentença – ou com qualquer
outra espécie de decisão judicial que a substitua, como os acórdãos dos tribunais. Tendencialmente, o
processo termina apenas com a obtenção da concretização do direito da parte.

02) CONTEÚDO E ELEMENTOS DA SENTENÇA:

02.1) ELEMENTOS ESSENCIAIS DA SENTENÇA (ART. 489, DO NCPC): I – o relatório, que conterá os nomes das
partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, bem como o registro das principais
ocorrências havidas no andamento do processo; II – os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de
fato e de direito; III – o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões principais que as partes lhe
submeterem. Não são simples requisitos, como no direito anterior: são verdadeiros elementos sem os quais
não se pode reconhecer a própria existência da sentença como ato decisório interpretativo e voltado à
aplicação normativa. Sem um caso bem delineado, sem razões que suportem as decisões interpretativas e
sem um comando normativo aplicável às partes não há que se falar em sentença diante do direito brasileiro.

02.1.1) Sobre o relatório: O relatório tem uma dupla finalidade. Em primeiro lugar, o relatório objetiva
permitir que o juiz demonstre para as partes e para a sociedade em geral que conhece o processo que vai
28
julgar. No relatório, o juiz faz uma caracterização do processo, delineando o caso que será julgado em todos
os seus aspectos fático -jurídicos e apontando o que nele se verificou de mais importante. Com o relatório, o
juiz demonstra o que aconteceu no processo, o que o obriga a estudar a totalidade daquilo que está nos
autos. Isso quer dizer que o relatório permite que se verifique se o magistrado conhece o “processo”. Em
segundo lugar, o relatório visa a permitir que seja possível comparar o caso que foi julgado com outros que
ainda o serão – a fim de que casos iguais ou semelhantes recebam igualmente o mesmo tratamento (“treat
like cases alike”, como observa a doutrina,30 constitui um princípio básico de qualquer administração não
arbitrária da justiça). Como um sistema de precedentes exige a comparação entre casos, em especial, sobre
os fatos a partir dos quais os problemas jurídicos surgem e são resolvidos, o relatório serve para identificação
do caso para aplicação de eventual precedente existente e para a elaboração de eventuais distinções que
impeçam semelhante aplicação. Daí a razão pela qual o relatório deve ser o mais completo possível.

02.1.2) Sobre a fundamentação: A fundamentação é a parte da decisão em que o juiz analisa as questões
fático -jurídicas trazidas pelas partes ao processo, o que inclui obviamente a análise da prova produzida nos
autos. Com a fundamentação, o juiz exprime as razões jurídicas que o levaram a decidir as questões
processuais e as questões materiais da causa da maneira como decidiu. É na fundamentação que aparecem
as razões que devem sustentar a convicção judicial sobre o caso. Tal a sua importância para o sistema do
novo Código que o legislador resolveu disciplinar aquilo que entende por decisão carente de fundamentação
(art. 489, §§ 1.º e 2.º). A propósito, devido à importância do tema, seu enfrentamento dar -se -á em tópico
próprio adiante.

02.1.3) Sobre o dispositivo: é o local em que o juiz afirma se acolhe ou não o pedido do autor e, em caso de
acolhimento, o que deve ser feito para que o direito material seja efetivamente realizado. Assim, por
exemplo, o juiz pode, na parte dispositiva da sentença, ao acolher o pedido formulado, condenar o réu a
pagar certa soma em dinheiro ou ordenar o réu a fazer ou a não fazer ou mesmo determinar a entrega de
determinada coisa. Como a parte dispositiva é aquela que dá resposta ao pedido do autor, ela também é
chamada de conclusão da sentença. O dispositivo é o comando que rege a vida das partes e exprime como
essas devem se comportar diante do caso concreto.

02.2) EM ESPECIAL: A FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA (VIDE TÓPICO 13.A)

03) INTERPRETAÇÃO DA SENTENÇA:

03.1) FUNÇÃO:

I) O REFLEXO DESSA PREOCUPAÇÃO NO CAMPO DA SENTENÇA É MUITO CLARO: O SEU CONCEITO PASSA A
SER DADO A PARTIR DA FUNÇÃO QUE ELA OCUPA NA VIDA DO PROCEDIMENTO: Não se trata, portanto, de
um conceito determinado pela estrutura do procedimento – como aquele que é alimentado pelo critério
topológico ou topográfico. A sentença é o ato do juiz que, resolvendo ou não o mérito da causa (arts. 203,
485 e 487), define -a, gerando em regra preclusão para o juiz (art. 507, ressalvadas as hipóteses do art. 494),
assinalando ainda o fim da atividade de conhecimento no primeiro grau de jurisdição.

II) COMO DECORRÊNCIA DA NECESSIDADE DE RELATIVIZAR O BINÔMIO DIREITO E PROCESSO, O QUE IMPLICA
VIABILIZAR ÀS PARTES SEMPRE QUE POSSÍVEL A SANAÇÃO DE VÍCIOS CAPAZES DE OBSTAR AO EXAME DO
MÉRITO (ARTS. 317 E 488): evitando assim o formalismo excessivo e pernicioso na condução do processo, o
ideal é que o juiz analise o mérito da causa e resolva efetivamente o conflito existente entre as partes. É por
essa razão que o art. 488 refere que, desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for
favorável à parte a quem aproveitaria o pronunciamento que não a resolve. Trata -se de inequívoca
manifestação da matriz cooperativa do novo processo civil brasileiro e da necessidade de racionalização da
tutela jurisdicional.

29
III) CONTUDO, NÃO SENDO POSSÍVEL SANAR O VÍCIO OU ULTRAPASSAR O ÓBICE À PRESTAÇÃO DA TUTELA
JURISDICIONAL DO DIREITO, O JUIZ NÃO RESOLVERÁ O MÉRITO (ARTS. 330 E 485): Nesse caso, prolatada a
sentença, a parte poderá apelar e o juiz poderá retratar -se no prazo de cinco dias (art. 331, § 7.º). Em todos
os casos em que o juiz não resolver o mérito fundado nos motivos do art. 330 poderá o juiz retratar-se à vista
da apelação. A possibilidade de ampla retratação nesses casos constitui saudável inovação do novo Código,
na esteira do prestígio ao diálogo como pedra de toque do novo processo civil brasileiro (arts. 7.º, 9.º e 10).
Quando o juiz não resolve o mérito da causa, o seu pronunciamento limita -se ao conhecimento de questões
processuais concernentes aos requisitos para a prestação da tutela jurisdicional. Em outras palavras, o juiz
não conhece de questões atinentes ao plano do direito material.

IV) A PRINCIPAL DISTINÇÃO ENTRE AS HIPÓTESES EM QUE O JUIZ EXAMINA E AQUELAS EM QUE NÃO
EXAMINA O MÉRITO DA CAUSA: está na eficácia do seu pronunciamento em relação ao direito da parte de
propor ou não nova ação para obtenção da tutela jurisdicional do direito. Isso porque, conforme o art. 486,
“o pronunciamento judicial que não resolve o mérito não obsta a que a parte proponha de novo a ação”. Na
verdade, nem mesmo o pronunciamento judicial que resolve o mérito da causa obsta a que a parte proponha
de novo a ação. O que o pronunciamento judicial que resolve o mérito da causa obsta, por força da coisa
julgada (art. 502), é que a parte proponha nova ação e obtenha nova tutela jurisdicional do direito, isto é,
obtenha um novo exame de uma controvérsia já analisada pelo Poder Judiciário. É sempre possível exercer o
direito de ação, dada a sua abstração, ainda que seja para o juiz extinguir o processo sem resolução de
mérito justamente pela existência de coisa julgada (art. 485, V). A fim de que a nova ação seja capaz de
proporcionar um pronunciamento de mérito, porém, é imprescindível que o “vício” que deu origem à
anterior extinção do processo sem resolução de mérito tenha sido corrigido (art. 486, § 1.º). Para que a
petição inicial da nova ação seja despachada é necessário que o autor acoste a prova do pagamento ou do
depósito das despesas processuais, aí incluídas as verbas concernentes aos honorários advocatícios (art. 486,
§ 2.º).

V) A RESOLUÇÃO DO MÉRITO DA CAUSA PODE SE DAR: V.a) POR ATO DAS PARTES: no primeiro caso, o ato
das partes tem de ser homologado para que surta o efeito de extinguir processualmente a controvérsia
existente entre as partes. Homologar significa verificar a concordância do ato praticado com as suas
condições legais de existência, validade e eficácia a fim de lhe outorgar autoridade judicial; V.b) POR ATO DO
JUIZ: No segundo caso, a resolução do mérito ocorre mediante julgamento, isto é, mediante uma valoração
judicial a respeito da procedência ou improcedência do pedido formulado pela parte. Seja quando a
resolução do mérito ocorre por ato das partes, seja quando ocorre por ato do juiz, diz –se tradicionalmente
que há “sentença definitiva”.

VI) HÁ JULGAMENTO DE MÉRITO QUANDO: o juiz acolhe ou rejeita o pedido formulado na ação ou na
reconvenção, assim como quando decide, de ofício ou a requerimento das partes, sobre a ocorrência da
prescrição da pretensão ou da decadência do direito (art. 487, I e II). Quando há o julgamento do mérito, o
juiz não fica apenas no plano do processo: a sua cognição a respeito da causa entra no plano do direito
material, isto é, enfrenta as questões que compõem a causa de pedir e o pedido do autor e as defesas diretas
e as defesas indiretas eventualmente formuladas pelo réu. Vale dizer: enfrenta especificamente o objeto
litigioso do processo (o Streitgegenstand, como dizem nossos colegas alemães).

VI) O MÉRITO DA CAUSA PODE SER RESOLVIDO PELAS PRÓPRIAS PARTES UNILATERAL OU BILATERALMENTE:
Se o réu reconhece a procedência do pedido formulado na ação ou o autor reconhece a procedência do
pedido formulado na reconvenção e se há renúncia ao direito ou à pretensão em que se funda a ação ou a
reconvenção, há resolução do mérito por força de ato unilateral da parte. Se há transação (arts. 840 a 850 do
CC), por ato bilateral (como refere a legislação civil, “é lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o
litígio mediante concessões mútuas”). Em todos esses casos, porém, o juiz não pode sindicar o conteúdo da
manifestação de vontade das partes: deve apenas indagar se estão presentes os requisitos legais necessários
para a prática do ato jurídico em geral (capacidade das partes, licitude ou possibilidade do objeto e finalidade
não defesa em lei). Estando presentes, deve homologar o ato.

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VII) COM A PROLAÇÃO DA SENTENÇA, A ATIVIDADE DE CONHECIMENTO DA CAUSA EXAURE -SE PARA O JUIZ
DE PRIMEIRO GRAU (ART. 494). VALE DIZER: ENCERRA -SE A FUNÇÃO DE CONHECIMENTO : VII.a) SE A
SENTENÇA i) é terminativa, ii) se é definitiva de improcedência ou iii) definitiva de procedência e independe
de cumprimento para realização do direito da parte (autossuficiente), a sentença determina igualmente a
extinção do processo – ou melhor, do procedimento comum em primeiro grau. Nenhuma outra atividade é
necessária pelo juízo de primeiro grau. VII.b) SE, PORÉM, A SENTENÇA É DEFINITIVA DE PROCEDÊNCIA E
DEPENDE DE CUMPRIMENTO (NÃO AUTOSSUFICIENTE), então o procedimento comum em primeiro grau
deve oportunamente seguir rumo ao cumprimento da sentença. Vale dizer: à prolação da sentença não se
segue a extinção do processo. Nesse caso, o juiz de primeiro grau tem apenas o perfil da sua atividade
alterado: a sua função não é mais conhecer das alegações das partes para dar razão a uma delas, mas de
executar o comando emergente da sentença.

03.2) SENTENÇA, DECISÃO E JUSTIFICAÇÃO. CONTEXT OF DISCOVERY E CONTEXT OF JUSTIFICATION:

I) CONCEITO: A sentença é o momento em que ocorre a interpretação e a aplicação do direito no processo


judicial. O juiz, a partir do diálogo com as partes, interpreta e aplica o direito a fim de resolver a controvérsia
apresentada em juízo.

II) A NECESSÁRIA INTERPRETAÇÃO DOS FATOS E DO DIREITO: o material com que trabalha o juiz no processo
é o resultado de uma operação interpretativa. Dada a dupla indeterminação do direito (oriunda da
equivocidade dos textos e da vagueza das normas), o juiz para sentenciar tem que primeiro decidir-se a
respeito de como dissipará a indeterminação inerente ao problema jurídico. Daí que a sentença depende de
decisões interpretativas, sem as quais não há ainda norma a ser aplicada para solução do caso concreto.

III) O EXEMPLO DA INVIOLABILIDADE DOMICILIAR: saber, por exemplo, se a inviolabilidade domiciliar (“a casa
é o asilo inviolável do indivíduo”, art. 5.º, XI, da CF) protege igualmente o escritório profissional privativo de
determinada pessoa é uma questão que depende da outorga de sentido a um termo equívoco: casa. Apenas
depois de sabermos qual o significado constitucional apropriado do termo casa para efeitos de proteção da
pessoa é que poderemos pensar em resolver o problema ligado à extensão da inviolabilidade domiciliar no
direito brasileiro.

IV) MAS NÃO INTERESSAM AS RAZÕES PSICOLÓGICAS QUE LEVARAM O JUIZ A DECIDIR: em termos jurídicos
pouco importa saber quais foram os motivos reais que determinaram a decisão judicial nesse ou naquele
sentido. O que interessa é saber se existem ou não razões jurídicas que suportam validamente dentro da
ordem jurídica a tomada de decisão. Em outras palavras, interessa a justificativa da decisão judicial –
importam as razões oriundas do sistema jurídico capazes de justificar a decisão.

V) ASSIM, A SENTENÇA É UMA DECISÃO QUE DEVE SER APOIADA EM RAZÕES QUE A JUSTIFIQUEM: aliás,
bem pode ocorrer – e amiúde ocorre – de a sentença ser composta de várias decisões interpretativas, sendo
que cada uma das quais deve encontrar a respectiva justificativa no ordenamento jurídico.

VI) POUCO IMPORTA, PORÉM, O CONTEXTO DA DECISÃO (OS MOTIVOS REAIS QUE LEVARAM O JUIZ A
DECIDIR NESSE OU NAQUELE SENTIDO – O CONTEXT OF DISCOVERY): o que interessa para aferição da sua
validade e para permitir o seu controle do ponto de vista da ordem jurídica é o contexto da justificativa (as
razões que foram invocadas para sua justificação – o context of justification). É a partir das razões
justificadoras da decisão que é possível controlá -la intersubjetivamente.

03.3) SENTENÇA, DECISÃO E RACIONALIDADE. O DUPLO DISCURSO

I) A NECESSIDADE DE A DECISÃO ESTAR APOIADA EM RAZÕES JURÍDICAS  RESPONDE À NECESSIDADE DE


RACIONALIDADE DO DISCURSO JURÍDICO E DE CONTROLE INTERSUBJETIVO DO EXERCÍCIO DO PODER
ESTATAL PELAS PARTES E PELA SOCIEDADE EM GERAL: e, portanto, para que exista uma administração
31
democrática da Justiça Civil. Em um Estado Constitucional, a atividade interpretativa e o resultado da
interpretação que têm lugar na sentença devem ser racionais. A racionalidade da sentença, porque permite o
seu controle intersubjetivo, é uma das mais fundas garantias de uma Justiça Civil preocupada em fazer valer
para além do simples discurso valores genuinamente democráticos e fundados na necessidade de fidelidade
ao Direito. A atividade interpretativa é racional se é justificada. O resultado interpretativo é racional se é
coerente e universalizável. A atividade interpretativa que conduz à decisão é fruto de um processo lógico –
argumentativo justificado que conta com justificação interna e justificação externa.

II) DO PONTO DE VISTA DA ATIVIDADE, A RACIONALIDADE DA INTERPRETAÇÃO EXIGE QUE O INTÉRPRETE


TRILHE UMA LINHA LÓGICA (JUSTIFICAÇÃO INTERNA) E OUTRA LINHA ARGUMENTATIVA (JUSTIFICAÇÃO
EXTERNA): II.a) JUSTIFICAÇÃO INTERNA: a primeira recobre o campo da lógica e atine à ausência de
contradição e à completude da justificação; II.b) JUSTIFICAÇÃO EXTERNA: ao passo que a segunda concerne
ao campo da argumentação, do oferecimento de razões que sustentem as individualizações, valorações e
escolhas realizadas pelo intérprete para composição dos enunciados jurídicos e das proposições fáticas que
integram o silogismo judicial, com destaque para utilização de modelos metodológicos para argumentação;

III) DO PONTO DE VISTA DO RESULTADO, A RACIONALIDADE DA INTERPRETAÇÃO EXIGE COERÊNCIA E


UNIVERSABILIDADE: O produto da interpretação tem de ser coerente. A interpretação tem de ser capaz de
ser reconduzida a “um conjunto, internamente consistente, formal e materialmente, de princípios e regras”
amalgamadas por “princípios fundamentais” comuns. Tem ser ainda universalizável (“universalization in
justification”). Como enfaticamente observa a doutrina, “there is no justification without universalization”.
Em outras palavras, a justificação tem que ter condições de ser replicável para os casos futuros idênticos ou
semelhantes.

IV) A SENTENÇA, COMO SE PERCEBE FACILMENTE, CONTÉM DECISÕES FUNDADAS EM RAZÕES  ESSAS
RAZÕES CONSTAM DA SUA JUSTIFICAÇÃO  QUE DÁ LUGAR A UM DUPLO DISCURSO QUE O PROCESSO
CIVIL É CHAMADO A DESEMPENHAR NO ESTADO CONSTITUCIONAL: IV.a) UM DISCURSO PARA O CASO
CONCRETO (tradicionalmente chamado de fundamentação da sentença), direcionado às partes. O primeiro
discurso sempre se realiza. IV.b) E UM DISCURSO PARA A ORDEM JURÍDICA (tradicionalmente chamado de
precedente), direcionado à administração da Justiça Civil e à sociedade como um todo. O segundo discurso
depende de determinados requisitos para ocorrer.

V) É ESSENCIAL A UM PROJETO CONSISTENTE PARA A JUSTIÇA CIVIL QUE O PROCESSO CIVIL DÊ TUTELA AOS
DIREITOS NÃO APENAS NA DIMENSÃO DO CASO CONCRETO, MAS TAMBÉM NA DIMENSÃO DA ORDEM
JURÍDICA: E não é por outra razão que o novo Código – se adequadamente lido – dá lugar a um sistema de
expressivo diálogo institucional no processo (contraditório forte e fundamentação analítica) e a um sistema
de precedentes obrigatórios.

VI) EM SUMA: a sentença tem de ser racional, o que significa que tem de ser justificada interna e
externamente, coerente e universalizável. Com isso, a sentença dará lugar não só a um discurso para o caso
concreto, mas também um discurso capaz de enriquecer a ordem jurídica e torná -la mais segura – com
evidente ganho para o princípio da liberdade e da igualdade de todos perante o direito. Os elementos
essenciais da sentença visam a espelhar a racionalidade da decisão judicial.

04) TUTELA INIBITÓRIA:

04.1) A QUESTÃO DA TUTELA ESPECÍFICA DOS DIREITOS:

I) DESTAQUE DA TUTELA ESPECÍFICA x SENTENÇAS NÃO AUTOSSUFICIENTES: A questão da tutela específica –


que se contrapõe à chamada tutela pelo equivalente –naturalmente aflora quando se está diante das
sentenças não autossuficientes.

32
II) TUTELA ESPECÍFICA x OBRIGAÇÃO CONTRATUAL: em se tratando de obrigação contratual, a tutela
específica, a princípio, é aquela que confere ao autor o cumprimento da obrigação inadimplida, seja a
obrigação de entregar coisa, pagar soma em dinheiro, fazer ou não fazer.

III) EXEMPLOS DE TUTELAS ESPECÍFICAS: A tutela que confere ao autor o desfazimento daquilo que não
deveria ter sido feito é tutela específica da obrigação de não fazer. Quando se teme a reiteração do
descumprimento de uma obrigação de fazer ou não fazer, a tutela que se destina a impedir o devedor de
voltar a inadimplir também é tutela específica.

IV) HÁ, AO CONTRÁRIO, TUTELA PELO EQUIVALENTE (E NÃO TUTELA ESPECÍFICA): quando impossível o
cumprimento da obrigação na forma específica, ou quando seu cumprimento, na forma específica, não é de
interesse do credor. Além disso, e como é óbvio, no caso de violação de obrigação instantânea, não sendo
mais possível a outorga da prestação, torna -se necessária a tutela pelo equivalente.

V) A TUTELA ESPECÍFICA INIBITÓRIA: no caso de ato contrário ao direito, é possível inibir sua prática,
repetição ou continuação (art. 497, parágrafo único), eliminar o estado contrário ao direito com a
consequente reconstituição da situação jurídica que lhe era anterior, ou ainda obter, independentemente da
vontade do réu, a situação que existiria caso a norma houvesse sido observada (art. 497, parágrafo único).
Nesses casos, não havendo tutela contra o dano que pode ter sido acarretado pelo ato contrário ao direito,
mas apenas tutela destinada a inibir o ilícito (tutela inibitória) ou a reintegrar o direito que foi violado (tutela
reintegratória de remoção do ilícito), há evidentemente tutela específica.

VI) ENTRETANTO, MESMO NO CASO DE DANO PATRIMONIAL OU NÃO PATRIMONIAL, É POSSÍVEL A TUTELA
ESPECÍFICA: a tutela que confere ao lesado a reparação do dano patrimonial in natura, ou a tutela dirigida a
reparar o dano não patrimonial na forma específica, como aquela que repara in natura o dano estético ou a
que se expressa na publicação de comunicado que retifica anterior notícia lesiva à honra, constituem tutelas
específicas.

VII) COMO SE VÊ, TUTELA RESSARCITÓRIA NÃO É SINÔNIMO DE TUTELA PELO EQUIVALENTE (SENTENÇA
CONDENATÓRIA): há tutela ressarcitória na forma específica quando é possível, ainda que parcialmente,
reparar o dano independentemente da outorga ao lesado de um montante em pecúnia, correspondente ao
valor da lesão.

VIII) COMO ESTÁ CLARO, TUTELA PELO EQUIVALENTE AO VALOR DO DANO É O CONTRÁRIO DE TUTELA
RESSARCITÓRIA NA FORMA ESPECÍFICA.

IX) DISCUTE-SE, ENTRETANTO, SE A TUTELA QUE CONCEDE AO AUTOR O EQUIVALENTE EM PECÚNIA PARA A
REPARAÇÃO IN NATURA PODE SER CLASSIFICADA COMO ESPECÍFICA. IX.a) CONSTITUEM-SE FORMAS DE
TUTELA NA FORMA ESPECÍFICA: A tutela que obriga o demandado a reparar o dano na forma específica ou a
tutela que confere ao autor a reparação específica, mediante a atividade de um terceiro custeada pelo
demandado; IX.b) TODAVIA NÃO HÁ TUTELA ESPECÍFICA: se o autor postula a soma necessária para a
reparação in natura, ou se o dano é reparado e é pedida a soma correspondente ao valor que foi gasto para a
reparação in natura. Ainda que o dano seja reparável na forma específica, a entrega da soma em dinheiro
para a reparação na forma específica não constitui tutela ressarcitória na forma específica, mas sim tutela
ressarcitória pelo equivalente ao valor do custo necessário para a reparação na forma específica.

X) A TUTELA REINTEGRATÓRIA DE REMOÇÃO DO ILÍCITO – QUE PERMITE O RESTABELECIMENTO DA


SITUAÇÃO QUE ERA ANTERIOR AO ATO CONTRÁRIO AO DIREITO, OU MESMO QUE SEJA ESTABELECIDA A
SITUAÇÃO QUE DEVERIA ESTAR VIGORANDO CASO A NORMA HOUVESSE SIDO OBSERVADA – NÃO SE
CONFUNDE COM A TUTELA RESSARCITÓRIA NA FORMA ESPECÍFICA: nesta última, que se volta contra o dano
(e não contra o ato contrário ao direito, uma vez que o dano é sua consequência eventual), é necessário que
a tutela jurisdicional estabeleça a situação que existiria caso o dano não houvesse sido praticado. Assim, por
exemplo, como é impossível plantar árvores equivalentes àquelas que existiriam caso o dano não houvesse
ocorrido, é necessário cumular o ressarcimento na forma específica com o ressarcimento pelo equivalente.

33
XI) TUTELA REINTEGRATÓRIA x TUTELA RESSARCITÓRIA NA FORMA ESPECÍFICA:

XI.a) CONTEXTO: estabelecimento da situação que existiria caso o dano não tivesse sido produzido e o
estabelecimento da situação que existiria caso a norma houvesse sido observada;

IX.b) CONDUTA CONTRÁRIA AO DIREITO: no caso de ato contrário ao direito, pode haver conduta comissiva
ou omissiva (ex: violação de norma deixando de instalar tecnologia necessária à preservação do ambiente).

IX.c) OMISSÃO  SENTENÇA PRESTA TUTELA REINTEGRATÓRIA: Na hipótese de conduta comissiva, que
gerou uma alteração do mundo físico, é preciso o restabelecimento da situação anterior. Nesse caso, a
sentença que determina a instalação do equipamento, conforme determina a norma, presta tutela
reintegratória.

IX.d) A TUTELA REINTEGRATÓRIA (NÃO SE DIRIGE CONTRA O DANO, MAS É VOLTADA CONTRA O ILÍCITO)
NÃO SE CONFUNDE COM A RESSARCITÓRIA NA FORMA ESPECÍFICA (SUPÕE E É VOLTADA CONTRA O DANO):
a tutela destinada a fazer surgir a situação que deveria estar vigorando, caso não houvesse ocorrido conduta
omissiva que gerou apenas um ilícito, e não um dano, não se confunde com a tutela ressarcitória na forma
específica, precisamente porque esta supõe um dano, e o necessário estabelecimento da situação que
existiria caso o dano não houvesse ocorrido. Na hipótese de conduta omissiva geradora de ilícito, a tutela
que supre a omissão, eliminando a situação de ilicitude, não se dirige contra o dano.

XII) ESTABELECENDO DISTINÇÕES: se não há como confundir tutela ressarcitória na forma específica com
tutela ressarcitória pelo equivalente em pecúnia, também não há razão para confusão entre tutela prestada
em pecúnia com tutela pelo equivalente. É que a tutela do adimplemento da obrigação de pagamento de
soma em dinheiro constitui tutela específica prestada em pecúnia.

 CONCLUSÕES - PARA RESUMIR, É IMPORTANTE DEIXAR ESTABELECIDO O SEGUINTE:

I) A TUTELA ESPECÍFICA É O GÊNERO: do qual fazem parte várias espécies de tutelas, como a inibitória;

II) TUTELA # TÉCNICA: tais tutelas não se confundem com as técnicas processuais instituídas para sua
adequada prestação (ou seja, com as sentenças);

III) TUTELA ESPECÍFICA # TUTELA PELO EQUIVALENTE (DO DANO OU DA OBRIGAÇÃO INADIMPLIDA): a tutela
específica tem como oposto a tutela pelo equivalente, que pode ser tutela pelo equivalente ao valor do dano
ou tutela pelo equivalente ao valor da obrigação inadimplida;

IV) TUTELA PELO EQUIVALENTE # TUTELA PRESTADA EM DINHEIRO: a tutela pelo equivalente não se
confunde com a tutela prestada em dinheiro, uma vez que a tutela da obrigação de pagar inadimplida,
embora prestada em dinheiro, é específica;

V) TUTELA ANTECIPADA x TUTELA FINAL: a antecipação da tutela se contrapõe à tutela final, assim como o
contrário de decisão interlocutória é sentença;

VI) DO MESMO MODO QUE A TUTELA FINAL, A TUTELA ANTECIPADA PODE SER ESPECÍFICA OU PELO
EQUIVALENTE;

VII) COMO A TUTELA FINAL, A TUTELA ANTECIPADA PODE SER, POR EXEMPLO, RESSARCITÓRIA OU
INIBITÓRIA (portanto, é um equívoco supor que toda tutela antecipada é preventiva – a tutela antecipada é
relacionada com a necessidade de adequação, efetividade e tempestividade e não com a preventividade).

VIII) A IMPORTÂNCIA DE CADA TIPO DE TUTELA: VIII.a) TUTELA ESPECÍFICA: não há dúvida de que a tutela
específica protege de modo mais adequado o direito material. VII.b) A TUTELA DIRIGIDA A EVITAR O ILÍCITO:
é, evidentemente, muito mais importante do que a tutela ressarcitória; VII.c) A TUTELA RESSARCITÓRIA: por
outro lado, no caso de dano não patrimonial, o ressarcimento na forma específica é o único remédio que
permite que o dano não seja monetizado e que o direito, assim, encontre uma forma efetiva de reparação.

34
04.2) SENTENÇAS NÃO AUTOSSUFICIENTES E AS VÁRIAS ESPÉCIES DE TUTELA

04.2.1) PRIMEIRAS CONSIDERAÇÕES

I) PARA QUE POSSAM SER BEM COMPREENDIDAS AS VÁRIAS TUTELAS QUE PODEM SER PRESTADAS PELAS
SENTENÇAS NÃO AUTOSSUFICIENTES, É IMPORTANTE CONSIDERAR DOIS PONTOS: I.a) A DIFERENÇA ENTRE
SENTENÇA E TUTELA DO DIREITO: I.a.1) SENTENÇA: compreendida como um meio processual preordenado
para prestar a tutela; I.a.2) TUTELA DO DIREITO: compreendida como o resultado que o processo
proporciona ao autor no plano do direito material; I.b) A DIFERENÇA ENTRE ILÍCITO E DANO: I.b.1) ILÍCITO:
compreendido como ato contrário ao direito; I.b.2) DANO: que é apenas a sua consequência eventual.

II) A FALTA DE DISTINÇÃO ENTRE ATO CONTRÁRIO AO DIREITO E DANO LEVOU A DOUTRINA A UNIFICAR AS
CATEGORIAS DA ILICITUDE E DA RESPONSABILIDADE CIVIL: supondo que a tutela contra o ilícito já praticado
sempre seria a tutela de reparação de dano, enquanto a tutela preventiva sempre configuraria uma tutela
que apenas poderia ser concedida quando demonstrada a probabilidade do dano, pouco importando a
evidência do ato contrário ao direito.

III) POR OUTRO LADO, A ALUSÃO À CATEGORIA DO ILÍCITO CONTRATUAL: acabou por obscurecer a distinção
entre a tutela contra o ilícito (compreendido como ato contrário ao direito) e a tutela que pressupõe o
inadimplemento contratual.

IV) É FUNDAMENTAL, ENTRETANTO, A DISTINÇÃO ENTRE TAIS TUTELAS: uma vez que cada uma delas tem
seus próprios pressupostos. O estabelecimento do perfil de cada uma dessas tutelas é imprescindível, não só
para a compreensão da repercussão da tutela final sobre o plano do direito material, mas também para que
fiquem dissipadas as dúvidas em torno das diferentes relações da tutela sumária com o direito substancial.
Daí a razão pela qual a alusão no novo Código à tutela inibitória e à tutela de remoção do ilícito no art. 497,
pu, constitui um avanço substancial para o adequado funcionamento da Justiça Civil.

04.2.2) TUTELA INIBITÓRIA

I) PREMISSAS:

I.a) IMPORTÂNCIA DA MATÉRIA: Em vista de sua importância, a tutela inibitória é a que requer maior estudo.
Se é imprescindível uma tutela dirigida unicamente contra a probabilidade da prática do ato contrário ao
direito, é também necessária a construção de um procedimento autônomo e bastante para a prestação
dessa modalidade de tutela.

I.b) PROCEDIMENTO ESPECÍFICO: É preciso que se tenha, em outras palavras, um procedimento que culmine
em uma sentença que ordene sob pena de multa ou de outro meio de indução ou sub-rogação e que admita
uma antecipação da tutela da mesma natureza. Tal procedimento está delineado pelos arts. 139, IV, 497,
498, 536, 537 e 538 do CPC, e 84 do CDC.

I.c) A NECESSÁRIA RECONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE ILÍCITO: Além disso, como é necessário isolar uma
tutela contra o ilícito (compreendido como ato contrário ao direito), requer -se a reconstrução do conceito
de ilícito, que não pode mais ser compreendido como sinônimo de fato danoso.

I.d) A TUTELA INIBITÓRIA É ESSENCIALMENTE PREVENTIVA: pois é sempre voltada para o futuro, destinando
–se a impedir a prática de um ilícito, sua repetição ou continuação.

I.e) A TUTELA INIBITÓRIA, EM OUTRAS PALAVRAS, É ABSOLUTAMENTE NECESSÁRIA PARA A PROTEÇÃO DOS
CHAMADOS NOVOS DIREITOS: trata-se de uma forma de tutela jurisdicional do direito imprescindível dentro
da sociedade contemporânea, em que se multiplicam os exemplos de direitos que não podem ser
adequadamente tutelados pela velha fórmula do equivalente pecuniário.

II) PRESSUPOSTOS:

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II.a) O DANO: não é pressuposto (art. 497, parágrafo único), mas é consequência meramente eventual do ato
contrário ao direito. É requisito indispensável para a configuração da obrigação ressarcitória, mas não para a
constituição do ilícito;

II.b) O SEU ALVO, COMO JÁ FOI DITO, É O ATO ILÍCITO: se o ilícito independe do dano, deve haver uma tutela
contra o ilícito em si, e assim uma tutela preventiva que tenha como pressuposto apenas a probabilidade de
ilícito, compreendido como ato contrário ao direito.

II.c) BASTANDO A PROBABILIDADE DO ILÍCITO (DOUTRINA MODERNA): a doutrina mais moderna entende
que a inibitória prescinde dos possíveis efeitos concretos do ilícito ou, mais precisamente, que tal espécie de
tutela deve tomar em consideração apenas a probabilidade do ilícito.

II.d) RELAÇÃO ILÍCITO x DANO: A inibitória, portanto, em grande número de casos, ainda que pensada como
uma tutela voltada contra o ilícito, acaba por impedir a prática de um dano. Não há dúvida de que o ilícito,
na maioria das vezes, torna -se visível em face de um dano, que é a sua consequência concreta. Isso não quer
dizer, porém, que não seja possível uma tutela inibitória dirigida apenas contra o ilícito, ou que seja
necessário demonstrar culpa ou dolo para sua prestação.

II.e) DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE DOLO OU CULPA: quando se pensa no ilícito olhando-se para o
dano, exige-se o elemento subjetivo – culpa ou dolo – para sua própria configuração. O ilícito, se
compreendido na perspectiva da responsabilidade civil, não apenas requer a presença do dano, como
também exige – ao menos em regra – a presença do elemento subjetivo. Contudo, compreendendo-se o
ilícito como ato contrário ao direito, não há razão para se exigir o elemento subjetivo para sua constituição:
essa é a razão da dispensa constante do art. 497, parágrafo único. Tratando-se de tutela inibitória, forma de
tutela jurisdicional do direito que nada tem a ver com o dano, mas apenas com a probabilidade da prática de
um ilícito, não há razão para se pensar em culpa. Note-se que a culpa é critério para a imputação de
consequências jurídicas ligadas ao dano, sendo totalmente descartável quando se pensa em impedir a
prática, a continuação ou a repetição de ato contrário ao direito. Se alguém está na iminência de praticar um
ilícito, cabe a ação inibitória, pouco importando se a culpa está presente.

II.f) É CORRETO CONCLUIR, ASSIM, QUE A TUTELA INIBITÓRIA NÃO TEM ENTRE SEUS PRESSUPOSTOS O DANO
E A CULPA;

II.g) LIMITANDO-SE A EXIGIR: II.g.1) a probabilidade da prática de um ilícito, ou de sua repetição ou


continuação; II.g.2) E a demonstração da imputação desse comportamento a alguém.

III) TUTELA INIBITÓRIA COMO COROLÁRIO DO DIREITO FUNDAMENTAL À TUTELA ADEQUADA E EFETIVA:
Afirma o art. 5.º, XXXV, da da CF que a lei excluirá da apreciação do Poder Judiciário nenhuma lesão ou
ameaça a direito. Tal norma, segundo a doutrina, outorga a todos direito fundamental à tutela jurisdicional
adequada e efetiva. Daí que é correto dizer que essa norma constitucional também garante a tutela
jurisdicional inibitória. Aliás, se a única consequência do ato ilícito fosse a tutela ressarcitória, o próprio
conceito de norma jurídica estaria comprometido, já que o direito não estaria sendo garantido
adequadamente pela sanção presente na própria norma jurídica.

IV) TUTELA INIBITÓRIA NEGATIVA E TUTELA INIBITÓRIA POSITIVA: Em alguns ordenamentos, como no
italiano, em que a tutela inibitória não existe na dimensão em que proposta e acolhida no direito brasileiro
(art. 497, parágrafo único), costuma -se associar a tutela inibitória a uma ordem de não fazer. A tutela
inibitória, contudo, não visa apenas a impedir um fazer, ou seja, um ilícito comissivo, mas destina -se a
combater qualquer espécie de ilícito, seja ele comissivo ou omissivo. O ato ilícito, conforme a espécie de
obrigação violada, pode ser comissivo ou omissivo, o que abre oportunidade, por consequência, a uma tutela
inibitória negativa – que imponha um não fazer – ou a uma tutela inibitória positiva – que imponha um fazer.

36
Semelhante se passa no direito angloestadunidense, que conhece as chamadas prohibitory injunction e
mandatory injunction, a primeira consistindo em uma ordem que impõe um não fazer e a segunda, em uma
ordem que impõe um fazer. Como é sabido, o sucesso da injunction decorre da flexibilidade que a
caracteriza, permitindo sua adaptação aos mais diversos casos carentes de tutela.

V) TUTELA INIBITÓRIA INDIVIDUAL E TUTELA INIBITÓRIA COLETIVA: V.a) A TUTELA INIBITÓRIA INDIVIDUAL:
De acordo com o art. 497, “na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou não fazer, o juiz, se
procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção
de tutela pelo resultado prático equivalente”. No parágrafo único está dito que “para a concessão da tutela
específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é
irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo”. Segundo o art. 537, o
juiz poderá, na sentença ou na antecipação da tutela, impor multa ao réu, independentemente de pedido do
autor, desde que seja suficiente e compatível com a tutela do direito que se pretende concretizar. E, ainda,
segundo o art. 536, pode o juiz empregar qualquer “medida necessária” que se mostre apta a obter a
prestação ou a abstenção necessária à tutela do direito. Como está claro, tais dispositivos permitem que o
juiz ordene, sob pena de multa ou de outro meio de indução ou de sub -rogação, na sentença ou na
antecipação da tutela. Essas regras, em outras palavras, abrem oportunidade para um procedimento que
desemboca em uma sentença que ordena sob pena de multa, por nós chamada de mandamental, e que
viabiliza uma antecipação da tutela da mesma natureza. Como a tutela inibitória, para ser prestada, necessita
de procedimento desse tipo, é correto afirmar que os arts. 497, 536 e 537 constituem o fundamento – em
termos de instrumentos de tutela – da tutela inibitória individual; V.b) A TUTELA INIBITÓRIA COLETIVA: O art.
84 do CDC tem redação praticamente idêntica à desses preceitos do CPC. Essa norma do CDC é aplicável à
tutela de todos os interesses difusos e coletivos, e não apenas – como uma interpretação apressada poderia
levar a supor – à tutela dos direitos dos consumidores, uma vez que o art. 84 do CDC está integrado em um
sistema organizado para dar tutela aos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos (formado pela Lei
da Ação Civil Pública e pelo Título III do CDC); V.c) CONCLUSÃO: há no direito brasileiro meios processuais
idôneos para a construção de procedimentos capazes de viabilizar a tutela inibitória dos direitos individuais e
transindividuais. Assim, para facilitar a comunicação, é possível falar em “ação inibitória individual”
(tecnicamente, ação que visa à prestação da tutela inibitória individual) e em “ação inibitória coletiva” (ação
que visa à prestação da tutela inibitória coletiva).

VI) TUTELA INIBITÓRIA E REGRA DA ADSTRIÇÃO AO PEDIDO:

VI.a) ADMITE -SE EXPRESSAMENTE QUE, ALÉM DE A SENTENÇA PODER IMPOR A MULTA DE OFÍCIO, O JUIZ
DEIXE DE ATENDER AO PEDIDO FORMULADO PELO AUTOR PARA DETERMINAR PROVIDÊNCIA DIVERSA,
DESDE QUE VOLTADA À EFETIVA TUTELA DO DIREITO MATERIAL: de acordo com o art. 492, é vedado ao juiz
proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em
objeto diverso do que lhe foi demandado. Contudo, o art. 537, CPC – assim como o art. 84, § 4.º, do CDC –
permite que o juiz imponha a multa, na sentença ou na antecipação da tutela, de ofício, ou seja, sem
requerimento da parte. Além disso, os arts. 497 do CPC e 84 do CDC, afirmam que o juiz pode conceder a
tutela específica ou determinar providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático
equivalente.

VI.b) EXEMPLO: Nesse sentido, é possível ao juiz, ao invés de ordenar, sob pena de multa, a paralisação das
atividades de uma fábrica que está poluindo o meio ambiente, ordenar a instalação de uma tecnologia capaz
de evitar o prosseguimento da poluição. Vice -versa, e quando não for suficiente o uso de tecnologias
capazes de conter a poluição, pode o juiz determinar a paralisação das atividades sob pena de multa, ainda
que esta providência não tenha sido pedida.

VII) TUTELA INIBITÓRIA, SENTENÇA MANDAMENTAL E SENTENÇA EXECUTIVA:


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VII.a) A TUTELA INIBITÓRIA: A tutela inibitória normalmente é prestada mediante sentença mandamental. No
entanto, é possível admitir, em determinados casos, o emprego de meios de execução direta para evitar a
prática, a repetição e a continuação do ilícito – ou para evitar a ocorrência ou a repetição de um
inadimplemento contratual com eficácia instantânea. Com efeito, há meios que, independentemente da
vontade do réu (e, portanto, independentemente de a multa ter ou não convencido o demandado), podem
evitar a prática, a repetição do ilícito, ou sua continuação.

VII.b) EXEMPLOS: Assim, por exemplo, a nomeação de administrador provisório para, atuando no seio da
administração de uma empresa, impedir a ilicitude. Ou mesmo a designação de oficial de justiça para, com
auxílio de força policial, impedir que determinada empresa ou pessoa adentre dado local, para exercer
atividade que seja da incumbência exclusiva de outrem.

VII.c) A DISTINÇÃO ENTRE A COERÇÃO DIRETA x COERÇÃO INDIRETA: Não há dúvida de que, em uma
perspectiva unicamente de funcionalidade técnica desses meios, é difícil pensar em admitir tutela inibitória
que tenha conteúdo executivo, porque atrelada a meios que prescindem da vontade do demandado (e,
portanto, de seu convencimento através da coerção indireta). O problema, porém, é o de que tal forma de
tutela, em vista de seu modo de atuação, merece mais cuidados do que aquela que se realiza mediante o uso
da coerção indireta. Evitar um ato através de coerção indireta é conferir àquele que pode praticá -lo a
oportunidade de, voluntariamente, não praticá -lo. Entretanto, quando se designa um interventor ou
administrador provisório para, no seio de uma empresa, evitar a prática de um ato, não se toma em
consideração a vontade do réu. O mesmo ocorre quando um oficial de justiça é designado para impedir que
alguém entre em determinado local para exercer atividade que é da incumbência exclusiva de outrem.

VII.d) A MAIOR ADEQUAÇÃO DA COERÇÃO INDIRETA PARA CONVENCER O RÉU A NÃO PRATICAR O ILÍCITO:
notadamente nos casos em que o cidadão ainda não praticou algum ilícito, mas está apenas em vias de
praticá -lo, parece ser mais adequado o uso da coerção indireta para convencer o réu a não praticar o ilícito,
uma vez que desse modo confere -se a ele a possibilidade de, voluntariamente, não praticar o ato que se
deseja evitar.

VII.e) ISSO NÃO QUER DIZER, ENTRETANTO, QUE NÃO SEJA LEGÍTIMA, QUANDO NECESSÁRIA, A
INTERVENÇÃO JUDICIAL NA FORMA EXECUTIVA, EVITANDO -SE A PRÁTICA, A REPETIÇÃO OU A
CONTINUAÇÃO DO ILÍCITO, INDEPENDENTEMENTE DA VONTADE DAQUELE QUE PODE PRATICÁ-LO.

VII.f) A DIFERENÇA ENTRE AS ESPÉCIES DE TUTELA:

VII.f.1) SEMELHANÇA ENTRE OS MEIOS DE EXECUÇÃO INDIRETA (DEPENDEM DA VONTADE DO RÉU) E


DIRETA (INDEPENDEM DA VONTADE DO RÉU): ambas técnicas são destinadas a evitar o ilícito
(preventivas);

VII.f.2) A TUTELA INIBITÓRIA EXCEUTIVA, QUE PRESCINDE DA VONTADE DO DEMANDADO: é


chamada de inibitória mediante técnica executiva (ou simplesmente tutela inibitória “executiva”),
exatamente para deixar claro que o seu significado, ou o impacto que provoca sobre a esfera jurídica
do réu, é distinto. É mais agressiva, pois atua através de meios executivos que não levam em
consideração a vontade do réu.

04.3) OUTRAS ESPÉCIES DE TUTELA TRABALHADAS PELO EXAMINADOR NESSE PONTO:

I) TUTELA INIBITÓRIA DO INADIMPLEMENTO: No caso de obrigação que pode ser violada por ato de eficácia
instantânea, é possível pensar em obrigação que se exaure em um único momento e obrigação que pode ser
violada por atos de eficácia instantânea, suscetíveis de repetição no tempo. A ação inibitória, nestes casos,
pode ser utilizada em face de uma obrigação positiva (ex: diante da obrigação de inserir em suas
propagandas determinadas informações aos consumidores) ou de uma obrigação negativ (ex: alguém se
38
obrigou a não veicular determinado programa esportivo ou determinados jogos de futebol). Nestes casos, é
certo, não há propriamente ilícito, compreendido como ato contrário ao direito, mas sim inadimplemento.
Contudo, se a tutela objetiva evitar o inadimplemento ou sua repetição, não há razão para não se pensar em
ação inibitória. Não há racionalidade em não admitir a tutela jurisdicional anterior ao inadimplemento,
entendendo que o contratante apenas pode agir depois da violação da obrigação. Isso seria o mesmo que
supor que o contrato é suficiente para impedir a violação.

II) TUTELA DE REMOÇÃO DO ILÍCITO: II.a) A NECESSÁRIA DIFERENCIAÇÃO ENTRE DANO E O ILÍCITO: de fato, o
dano não é elemento constitutivo da fattispecie do ilícito. Relaciona -se ele com a obrigação de indenizar, e
não propriamente com o ilícito, do qual é consequência meramente eventual; II.b) O PROCESSO CIVIL
TAMBÉM DEVE SE PREOCUPAR COM O ILÍCITO: Ao contrário, em face das situações de direito substancial
próprias da sociedade contemporânea, constitui grande absurdo pensar que o processo civil deve estar
preocupado unicamente com o dano, deixando o ato contrário ao direito aos cuidados do processo penal. É
que, dentro da sociedade atual, determinados bens são imprescindíveis para uma organização social mais
justa. Tais bens necessitam ser efetivamente garantidos, e para tanto são instituídas normas. Essas normas,
que proíbem determinados atos, obviamente devem ser respeitadas, pois de outra forma os bens que visam
proteger serão irremediavelmente prejudicados. Como se vê, as normas que, visando garantir determinados
bens, vedam certos atos, têm função preventiva. Portanto, se essas normas objetivam garantir bens
imprescindíveis à vida social, é claro que sua violação, por si só, implica em transgressão que deve ser
imediatamente corrigida. Com isso, deixa -se claro que é fundamental uma tutela voltada exclusivamente
contra o ato contrário ao direito, e não contra o dano, por ser ela imprescindível para a efetiva tutela de
direitos absolutamente relevantes. Daí a razão pela qual o art. 497, parágrafo único, consagra a distinção
entre ato ilícito e fato danoso justamente para evidenciar o conteúdo da causa petendi da ação que visa à
tutela inibitória e da ação que visa à tutela de remoção do ilícito.

III) TUTELA ESPECÍFICA DA OBRIGAÇÃO INADIMPLIDA OU CUMPRIDA DE MODO IMPERFEITO: tutela inibitória
do inadimplemento e tutela específica do adimplemento da obrigação inadimplida ou cumprida de modo
imperfeito = espécies do gênero tutela específica e com fundamento nos arts. 536, CPC e 84, CDC;

IV) TUTELA RESSARCITÓRIA NA FORMA ESPECÍFICA: a única forma de tutela contra o dano não é aquela que
se presta em dinheiro – visão mercificante dos direitos -, visto que o ressarcimento pode se dar tabém com a
entrega de uma coisa ou com a prestação de uma atividade;

V) TUTELA PELO EQUIVALENTE MONETÁRIO (ex: artigo 499, CPC);

VI) TUTELA DE IMISSÃO NA POSSE: (arts. 498 e 538, CPC);

VII) TUTELA REIVINDICATÓRIA: (pede-se a posse da coisa. Ao passo que o despejo é conferido ao locador, a
reinvidicação se dá em favor do proprietário. A ação reivindicatória é atribuída ao proprietário sem posse
contra o possuidor que não é proprietário. Difere da imissão na posse, pois se funda no domínio e possui
cognição plena);

VIII) TUTELA DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE;

39
IX) TUTELA DE RESTITUIÇÃO DA COISA QUE DEPENDE DA DESCONSTITUIÇÃO DE CONTRATO;

05) PERGUNTAS FEITAS PELO EXAMINADOR NA AULA 06: A SENTENÇA NO PROJETO DE NCPC:

05.1) A previsão do art. 498 (que autoriza o juiz a decidir a causa favoravelmente à parte a quem aproveitaria
o julgamento que não resolve o mérito) pode ser aplicada a todos os casos de extinção sem resolução do
mérito? Com essa regra, é possível dizer que não mais se pode falar em pressupostos processuais de
existência? Essa sentença seria rescindível, por exemplo, por violação à coisa julgada, por violação à
imparcialidade (pressupostos processuais), ou por ilegitimidade de parte (violação à norma jurídica)?

05.2) As imposições de motivação da sentença (postas no art. 499, § 1º, do projeto) representam clara
ruptura com a prática processual brasileira corrente. Essa alteração trará consequências positivas ou
negativas para o sistema? Por que? Em que medida essa modificação favorece o fortalecimento dos
princípios fundamentais processuais?

05.3) O novo regime da fundamentação da sentença traz que tipos de consequências para a implementação
dos precedentes como fonte vinculante da atuação jurisdicional?

05.4) O projeto prevê expressamente a possibilidade da tutela inibitória (art. 508, §§ 1º e 2º). Haveria a
necessidade de alguma outra alteração para viabilizar no sistema nacional essa forma de proteção?

05.5) A manutenção e a ampliação da necessidade de a sentença limitar-se ao pedido (arts. 500, 501 e 502)
tornará inviáveis provimentos estruturantes no sistema nacional?

3C. Juizados Especiais Cíveis Estaduais e Federais

Renata Muniz

I – MICROSSISTEMA - A CRFB dispôs no art. 98 sobre a instituição de juizados com a finalidade de processar,
julgar e executar causas cíveis de menor complexidade. O microssistema dos Juizados Especiais é composto
pelos Juizados Especiais Cíveis e Criminais (Lei 9.099/1995), e Juizados Especiais Federais (Lei 10.259/2001) e
Juizados Especiais da Fazenda Pública (Lei 12.153/2009). Aplica-se subsidiariamente o CPC, desde que não
descaracterize a celeridade do rito. Os juizados especiais são um importante meio de acesso à justiça, pois
permitem que cidadãos busquem soluções para seus conflitos cotidianos de forma rápida, eficiente e
gratuita.
II – PRINCÍPIOS - O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade,
economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação.

III – COMPETÊNCIA:

a) Juizados especiais cíveis estaduais – conciliação, processo e julgamento das causas cíveis de menor
complexidade, assim consideradas: I - as causas cujo valor não exceda a 40 salários mínimos; II - as
enumeradas no art. 275, inciso II, do CPC/73 2; III - a ação de despejo para uso próprio. IV - as ações
2
ARENHART, S. C.; Daniel Francisco Mitidiero ; Luiz Guilherme Marinoni . Código de processo civil comentado: Art. 1.063. Não subsistindo mais o
rito sumário no CPC/2015, fica sem base a remissão contida no art.3º, II, da Lei 9.099/1995. Por isso, o art. 1.063 do CPC, afirma que até a edição
de lei que corrija essa lacuna permanecem, os Juizados Especiais Cíveis sendo competentes para as causas que se sujeitariam ao rito sumário do
CPC/73. Assim, até a edição dessa lei os Juizados permanecem competentes para julgar causas, qualquer que seja o valor; a) de arrendamento
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possessórias sobre bens imóveis de valor não excedente a 40 SM. A competência é relativa. (STJ,
Informativo em Teses. Ed. 89. Tese 1. “O processamento da ação perante o Juizado Especial Estadual é
opção do autor, que pode, se preferir, ajuizar sua demanda perante a Justiça Comum”). Ficam excluídas: as
causas de natureza alimentar, falimentar, fiscal e de interesse da Fazenda Pública, relativas a acidentes de
trabalho, a resíduos e ao estado e capacidade das pessoas, ainda que de cunho patrimonial.

b) Juizados Especiais Federais - causas de competência da Justiça Federal até o valor de 60 salários-
mínimos. Quando a pretensão versar sobre obrigações vincendas, para fins de competência do Juizado
Especial, a soma de 12 parcelas não poderá exceder 60 sm. Não se incluem na competência do Juizado
Especial Federal: I - as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa
domiciliada ou residente no País e as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado
estrangeiro ou organismo internacional; II - as ações de mandado de segurança, de desapropriação, de
divisão e demarcação, populares, execuções fiscais e por improbidade administrativa e as demandas sobre
direitos ou interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos; III - sobre bens imóveis da União,
autarquias e fundações públicas federais; IV - para a anulação ou cancelamento de ato administrativo
federal, SALVO o de natureza previdenciária e o de lançamento fiscal; V - que tenham como objeto a
impugnação da pena de demissão imposta a servidores públicos civis ou de sanções disciplinares aplicadas a
militares. A competência é ABSOLUTA.

c) Juizados Especiais da Fazenda Pública estadual e municipal. Causas cíveis de interesse dos Estados, do
Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, até o valor de 60 salários mínimos. Não se incluem na
competência do Juizado Especial da Fazenda Pública: I – as ações de mandado de segurança, de
desapropriação, de divisão e demarcação, populares, por improbidade administrativa, execuções fiscais e as
demandas sobre direitos ou interesses difusos e coletivos; II – as causas sobre bens imóveis dos Estados,
Distrito Federal, Territórios e Municípios, autarquias e fundações públicas a eles vinculadas; III – as causas
que tenham como objeto a impugnação da pena de demissão imposta a servidores públicos civis ou sanções
disciplinares aplicadas a militares. Quando a pretensão versar sobre obrigações vincendas, para fins de
competência do Juizado Especial, a soma de 12parcelas não poderá exceder 60 SM. A competência é
ABSOLUTA.
 STJ, Informativo em Teses. Ed. 89. Tese 2. Em se tratando de litisconsórcio ativo facultativo, para
que se fixe a competência dos Juizados Especiais, deve ser considerado o valor da causa individualmente por
autor, não importando se a soma ultrapassa o valor de alçada.
 STJ, Informativo em Teses. Ed. 89. Tese 4. É da competência dos Juizados Especiais Federais e dos
Juizados Especiais da Fazenda Pública a defesa de direitos ou interesses difusos e coletivos exercida por meio
de ações propostas individualmente pelos seus titulares ou substitutos processuais.
 STJ, Informativo em Teses. Ed. 89. Tese 5. É possível submeter ao rito dos Juizados Especiais Federais
as causas que envolvem fornecimento de medicamentos/tratamento médico, cujo valor seja de até 60
salários mínimos, ajuizadas pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública em favor de pessoa
determinada.
 STJ, Informativo em Teses. Ed. 89. Tese 6. Compete ao Juizado Especial a execução de seus próprios
julgados, independente da quantia a ser executada, desde que tenha sido observado o valor de alçada na
ocasião da propositura da ação.
 STJ, Informativo em Teses. Ed. 89. Tese 7. Compete ao Tribunal Regional Federal decidir os conflitos
de competência entre juizado especial federal e juízo federal da mesma seção judiciária. (Súmula n. 428/STJ).
 STJ, Informativo em Teses. Ed. 89. Tese 8. Compete a turma recursal processar e julgar o mandado
de segurança contra ato de juizado especial. (Súmula n. 376/STJ)
 STJ, Informativo em Teses. Ed. 89. Tese 9. Admite-se a impetração de mandado de segurança
perante os Tribunais de Justiça e os Tribunais Regionais Federais para o exercício do controle de competência
dos Juizados Especiais Estaduais ou Federais, respectivamente, excepcionando a hipótese de cabimento da
Súmula n. 376/STJ.
rural e de parceria agrícola; b) de cobrança ao condômino de quaisquer quantias devidas ao condomínio; c) de ressarcimento por danos em
prédio urbano ou rústico; d) de ressarcimento por danos causados em acidente de veículo de via terrestre; e) de cobrança de seguro,
relativamente aos danos causados em acidente de veículo, ressalvados os casos de processo de execução; f) de cobrança de honorários dos
profissionais liberais, ressalvado o disposto em legislação especial; g) que versem sobre revogação de doação; h) nos demais casos previstos em
lei.
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IV – DAS PARTES
a) Juizados Especiais Cíveis (art. 8º, Lei 9.099) - podem demandar perante o Juizado Especial: (a)as
pessoas naturais capazes, excluídos os cessionários de direito de pessoas jurídicas; (b) as pessoas
enquadradas como microempreendedores individuais, microempresas e empresas de pequeno porte; (c) as
pessoas jurídicas qualificadas como OSCIP; e (d) as sociedades de crédito ao micro- empreendedor. Não
poderão ser partes: o incapaz, o preso, as pessoas jurídicas de direito público, as empresas públicas da
União, a massa falida e o insolvente civil.
b) Juizados Especiais Federais - Podem ser partes no Juizado Especial Federal Cível: I – como autores, as
pessoas físicas e as microempresas e empresas de pequeno porte; II – como rés, a União, autarquias,
fundações e empresas públicas federais. Aplica-se o art. 8º da Lei 9099 de forma complementar.
c) Juizados Especiais da Fazenda Pública estadual e municipal. Podem ser partes no Juizado Especial da
Fazenda Pública: I – como autores, as pessoas físicas e as microempresas e empresas de pequeno porte; II –
como réus, os Estados, o Distrito Federal, os Territórios e os Municípios, bem como autarquias, fundações e
empresas públicas a eles vinculadas. Aplica-se o art. 8º da Lei 9099 de forma complementar.
 Não cabe intervenção de terceiro, salvo incidente de desconsideração de pessoa jurídica. CPC/15 -
Art. 1.062. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica aplica-se ao processo de competência
dos juizados especiais.
V – DISPENSA DE ADVOGADO: a) Juizados Especiais Cíveis- Nas causas de valor até 20 salários mínimos;
nas de valor superior, a assistência é obrigatória; b) Juizados Especiais Federais - art. 10 Lei 10.529/01: “as
partes poderão designar, por escrito, representantes para a causa, advogado ou não”. Em virtude desse
dispositivo, afirma-se que a presença do advogado é opcional, qualquer que seja o valor da causa. Mesma
regra se aplica aos Juizados da Fazenda Pública dos Estados, DF e Municípios.

VI – PRAZOS DIFERENCIADOS PARA AS PESSOAS DE DIREITO PÚBLICO: Nos Juizados Especiais Federais e nos
Juizados Especiais da Fazenda Pública não há prazos diferenciados para os entes públicos.

VII - PROVAS NOS JUIZADOS ESPECIAIS. Nos Juizados Especiais Federais, é possível a produção de qualquer
meio de prova. As provas devem ser produzidas em audiência. STJ, Informativo em Teses. Ed. 89. Tese 3. A
necessidade de produção de prova pericial, por si só, não influi na definição da competência dos Juizados
Especiais.

VIII - TUTELAS DE URGÊNCIA (ANTECIPADA E CAUTELAR) – são admitidas expressamente no JEF e Juizados
da Fazenda Pública. Assim, pelo microssistema, admite-se nos Juizados Especiais cíveis (Lei 9.099).
IX - SISTEMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS -As causas são examinadas, em 1º grau, por um Juiz do
Juizado. O recurso contra a sentença proferida pelo Juiz do Juizado é julgado pela Turma Recursal. A Turma
Recursal é um colegiado formado por três juízes (não é composta por Desembargadores).
 Recurso contra decisão que concede ou nega tutela provisória – Nos juizados especiais federais, da
decisão que defere a tutela provisória cabe recurso. Esse recurso é o agravo de instrumento para a Turma
Recursal. São irrecorríveis as demais decisões interlocutórias.
 Recurso contra a sentença - Da sentença cabe recurso inominado. Tal recurso - sujeito ao prazo de 10
dias - tem o mesmo regime da apelação. Remessa necessária – Por expressa determinação legal, nos Juizados
Especiais Federais e da Fazenda Pública dos Estados e Municípios, não haverá reexame necessário.
 Embargos de declaração - Caberão embargos de declaração contra sentença ou acórdão, nos casos
previstos no CPC. Os embargos de declaração serão interpostos por escrito ou oralmente, no prazo de 5 dias,
contados da ciência da decisão. Com o novo CPC, os embargos de declaração interrompem o prazo para a
interposição de recurso nos juizados. Antes da reforma, a Lei 9099 previa a suspensão dos prazos.
 RE e REsp. Cabe RE, mas não cabe RESp. Isto porque, o RE é cabível contra causas decididas em única
ou última instância por qualquer órgão jurisdicional. Já o REsp, somente é cabível contra causas decididas em
única ou última instância pelo TJ ou TRF. Como a Turma Recursal não é Tribunal, suas decisões não desafiam
REsp. Súmula 203-STJ: Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos
Juizados Especiais . Súmula 640-STF. É cabível recurso extraordinário contra decisão proferida por juiz de
primeiro grau nas causas de alçada, ou por turma recursal de juizado especial cível e criminal.

X- OUTROS MEIOS DE IMPUGNAÇÃO DAS DECISÕES DAS TURMAS RECURSAIS:


a) Reclamação contra decisão de Turma Recursal nos Juizados Especiais Cíveis. Resolução STJ 03/2016
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– Revogou a Res. Resolução STJ 12/2009, que previa a Reclamação para o STJ. Agora, a parte poderá ajuizar
reclamação no Tribunal de Justiça quando a decisão da Turma Recursal Estadual (ou do DF) contrariar
jurisprudência do STJ que esteja consolidada em: a) incidente de assunção de competência; b) incidente de
resolução de demandas repetitivas (IRDR); c) julgamento de recurso especial repetitivo; d) enunciados das
Súmulas do STJ; e) precedentes do STJ. No TJ, estas reclamações serão julgadas pelas Câmaras Reunidas ou
por uma Seção Especializada (art. 1º da Resolução 03/2016). Crítica: A Resolução STJ 03/2016 cria uma
espécie de "reclamação" na qual o Tribunal que a julga não é aquele que teve a sua decisão afrontada. Em
outras palavras, o TJ julgará reclamação por violação de decisões de outro Tribunal (STJ).
b) Pedido de uniformização de jurisprudência nos Juizados Especiais Federais 3 -Proferido o julgamento
pela Turma Recursal, é possível o ajuizamento de um pedido de uniformização de interpretação de lei federal,
quando houver divergência com precedente de outra Turma Recursal, ou com súmula ou jurisprudência
dominante do Superior Tribunal de Justiça (Lei 10.259/2001, art. 14). STJ. Jurisprudência em tese. Ed. 89. 13.
“É inviável a discussão de matéria processual em sede de incidente de uniformização de jurisprudência
oriundo de juizados especiais, visto que cabível, apenas, contra acórdão da Turma Nacional de Uniformização
que, apreciando questão de direito material, contrarie súmula ou jurisprudência dominante no STJ”. Havendo
divergência entre Turmas Recursais da mesma Região, o pedido de uniformização deve ser julgado pela
reunião conjunta das Turmas em conflito, sob a presidência do Juiz Coordenador. Por sua vez, se a
divergência ocorrer entre Turmas de diferentes regiões, o pedido de uniformização será julgado pela Turma
Nacional de Uniformização - TNU -, que é integrada por juízes de Turmas Recursais, sob a presidência do
Coordenador da Justiça Federal. Havendo divergência entre a decisão da Turma Recursal e súmula ou
jurisprudência dominante do STJ, o pedido de uniformização será igualmente julgado pela Turma Nacional
de Uniformização – TNU. Quando a orientação acolhida pela Turma Nacional de Uniformização - TNU -
contrariar súmula ou jurisprudência dominante do STJ, a parte interessada poderá provocar a manifestação
deste, que deverá dirimir a divergência.
c) Pedido de uniformização de jurisprudência nos Juizados Especiais da Fazenda Pública - Da decisão
proferida pela Turma Recursal cabe pedido de uniformização de interpretação de lei, quando houver
divergência com decisão de outra Turma Recursal sobre questões de Direito material (Lei 12.153/09, art.
18). O pedido fundado em divergência entre Turmas do mesmo Estado será julgado em reunião conjunta
das Turmas em conflito, sob a presidência de desembargador indicado pelo Tribunal de Justiça. Quando as
Turmas de diferentes Estados derem a lei federal interpretações divergentes, ou quando a decisão proferida
estiver em contrariedade com SÚMULA do Superior Tribunal de Justiça, o pedido será por este julgado.
OBS: A Lei dos Juizados da Fazenda Pública se omitiu em relação ao cabimento do pedido de uniformização
para o STJ por violação de precedentes deste tribunal, cabendo apenas da violação de Súmula. “Não é
cabível nem pedido de uniformização nem reclamação ao STJ contra acórdão de Turma Recursal do Juizado
da Fazenda Pública que contrarie orientação fixada em precedentes do STJ.” (Info 559).
XI – DA EXECUÇÃO: a) Juizados Especiais Cíveis - Lei 9099. Art. 52 - A execução da sentença processar-se-á
no próprio Juizado, aplicando-se, no que couber, o disposto no Código de Processo Civil. b) Juizados Especiais
Federais - A sentença proferida nos Juizados Federais pode impor à União, a uma autarquia ou empresa
pública federal o cumprimento de uma obrigação de fazer, não fazer ou entregar coisa. Quando se tratar de
obrigação de pagar quantia certa, somente se deve exigir o cumprimento após o trânsito em julgado da
sentença. Nas hipóteses em que o valor da condenação supera o limite de alçada, a obrigação de pagar deve
ser exigida por precatório, e não por RPV. Para que seu crédito não se submeta ao regime do precatório,
poderá o exequente renunciar ao valor excedente, fazendo, com isso, a opção pela RPV. c) Juizados especiais
da fazenda pública. Mesma lógica dos Juizados Federais. Aos Estados, Municípios e Distrito Federal cabem
fixar o limite considerado de pequeno valor para que seja dispensada a expedição do precatório. Na ausência
de lei: Art. 87 ADCT: Estados e DF - 40 SM; e Municípios -30 SM.
XII – AÇÃO RESCISÓRIA – Lei 9099. Art. 59. Não se admitirá ação rescisória nas causas sujeitas ao
3
1. O incidente de uniformização de jurisprudência no âmbito dos Juizados Especiais Federais, cabível quando “houver divergência entre
decisões sobre questões de direito material proferidas por Turmas Recursais na interpretação da lei” (art. 14, caput, da Lei 10.259/01), POSSUI
NATUREZA RECURSAL, já que propicia a reforma do acórdão impugnado. Trata-se de recurso de interposição facultativa, com perfil semelhante
ao dos embargos de divergência previstos no art. 546 do CPC e dos embargos previstos no art. 894, II, da CLT. 2. Embora se admita, em tese - a
exemplo do que ocorre em relação a aqueles embargos (CPC, art. 546 e CLT, art. 894, II) -, a interposição alternativa de incidente de
uniformização de jurisprudência ou de recurso extraordinário, não é admissível, à luz do princípio da unirrecorribilidade, a interposição
simultânea desses recursos, ambos com o objetivo de reformar o mesmo capítulo do acórdão recorrido. 3. Apresentado incidente de
uniformização de jurisprudência de decisão de Turma Recursal, o recurso extraordinário somente será cabível, em tese, contra o futuro acórdão
que julgar esse incidente, pois somente então, nas circunstâncias, estará exaurida a instância ordinária, para os fins previstos no art. 102, III, da
CF/88. (ARE 850960 AgR, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 24/03/2015)
43
procedimento instituído por esta Lei. Aplica-se aos Juizados Federais e da Fazenda Pública.

4A. Partes. Capacidade. Legitimação. Sucessão. Substituição Processual

Anderson Rocha Paiva

PARTES: Segundo Marinoni e Arenhart (MARINONI, ARENHART, pág. 88), aquele que toma “parte” no litígio
ou dele faz “parte” deve ser considerado parte. Diz, ainda, o mesmo autor, que aquele que é estranho ao
litígio ou dele não faz “parte”, embora a sentença contra ele produza efeitos, deve ser considerado terceiro.
É aquele que pede em juízo (autor), ou aquele em face de quem se pede (réu). Note-se que o conceito faz
abstração do possível destinatário do objeto do processo, expondo, pois, uma idéia que privilegia um
conceito estritamente processual de parte. Não obstante, colhem-se também em doutrina, em
entendimento minoritário, concepções sobre parte que a relacionam com os titulares do direito material ou
de um suposto negócio jurídico posto no centro das discussões do processo. Terceiros, por sua vez, seriam os
a priori não identificados com a coisa ou direito litigiosos. Trata-se de um percepção privatista dos elementos
do processo, ainda atrelados aos institutos do direito civil. PARTES são pressuposto processual de existência
ou constituição do processo.

CAPACIDADE: Nesse ponto, pode-se vislumbrar tríplice aspecto, importando a capacidade de ser parte
(pressuposto de existência ou constituição do processo), capacidade para estar em juízo (pressuposto
processual de validade do processo) e capacidade postulatória (também apontada como pressuposto de
existência).

Capacidade de ser parte. É a aptidão para ser sujeito de uma relação jurídica processual ou a aptidão para
ser titular de situações jurídicas processuais. Diz com a capacidade de direito ou com a personalidade (ou
subjetividade), categorias do Direito Civil. Assim, todos aqueles que têm capacidade de direito, nos termos
da lei civil, têm capacidade de ser parte em um processo judicial. Não obstante, a lei atribui a alguns entes
despersonalizados a capacidade de ser parte, ainda quando não lhes atribua personalidade jurídica, visando
efetiva tutela de direitos, uma vez que dá a tais entes a capacidade de figurarem no palco processual,
levando pleitos a conhecimento judicial. Em síntese, têm capacidade de ser parte: a) as pessoas naturais; b)
as pessoas jurídicas; c) as pessoas formais (entes que detêm personalidade exclusivamente processual ou
judiciária- espólio, herança jacente ou vacante, massa falida, sociedade em comum e condomínio). O MP,
aliás, é um exemplo de pessoa formal.

Capacidade para estar em juízo (capacidade processual ou legitimatio ad processum). Artigo 70 CPC.
Atribuída a todo aquele que tem capacidade de gozo ou exercício, do Direito Civil, ou seja, é aquela detida
por quem tem aptidão para, validamente, praticar atos processuais. A incapacidade processual, assim como
no direito civil, também é suprida por representação ou por assistência (artigo 71, CPC). A incapacidade
processual do autor leva à extinção do processo sem resolução do mérito (antes, deve ser aberto prazo para
que seja suprido o defeito), mas a incapacidade processual do réu determina sua revelia (artigo 76, §1º, CPC).

Capacidade postulatória (ius postulandi). Exigência de que a parte postule por meio de advogado. É a
capacidade técnica exigida para a prática de determinados atos processuais (o depoimento pessoal, p. ex.,
não a requer). Têm capacidade postulatória o advogado regularmente inscrito na OAB e o membro do MP.
Nos Juizados Especiais Cíveis Federais: em primeira instância, a parte pode litigar, no polo ativo, sem
advogado, até 60 salários mínimos. Qualquer recurso à Turma Recursal depende de advogado. Embargos
declaratórios podem ser opostos sem advogado. A Lei 10.259 permite a representação por pessoa que não é
advogado (Enun 83 FONAJEF: representação por não advogado é só para poucos processos e de forma
gratuita).

LEGITIMAÇÃO. A legitimação para agir (legitimatio ad causam) é uma condição da ação. É a titularidade
(ativa e passiva) da ação. Consiste em individualizar a pessoa a quem pertence o interesse de agir (e, pois, a
ação) e a pessoa com referência à qual ele existe. (MARINONI, Pág. 176). Em suma, tem legitimidade para a
causa aquele que detenha pertinência subjetiva com o objeto da demanda e tenha interesse de agir no caso
44
concreto (também aquele titular do interesse contraposto, no sentido de ser parte legítima para figurar no
polo passivo da demanda).

Legitimação ordinária. Os direitos materiais clássicos liberais, ditos de “primeira geração”, foram
responsáveis pela categorização que hoje se conhece como legitimação ordinária (e legitimação
extraordinária), uma vez que se entende que a legitimação ordinária é a coincidência entre o titular da
relação jurídica material e o titular da relação jurídica processual. Diz-se isso uma vez que tal classificação
importa-se tão somente com os direitos com titularidade individual ou bem delimitada, nos quais facilmente
se enxerga o titular do interesse de leva-los a juízo. Na legitimação ordinária há pertinência subjetiva. Assim,
afora casos expressamente previstos em lei, só pode pleitear em juízo o titular do direito material que subjaz
à demanda (artigo 3 CPC).
Legitimação extraordinária. Há legitimidade extraordinária quando a parte na relação jurídica processual diz
estar defendendo direito subjetivo material alheio ou de terceiro. Não se confunde com a representação.
Representante não é parte, apenas representa a parte. Legitimado extraordinário é parte processual. Na
legitimação extraordinária defende-se, em nome próprio, direito alheio (não há pertinência subjetiva).
Representante defende direito alheio (do representado), em nome do representado. Espécies:
1. Subordinada: É a legitimidade do assistente simples.
2. Por substituição processual: É excepcional e depende de autorização legal (não se admite, portanto, a
substituição processual convencional). Exemplos de substituição processual em processos individuais:
a) quando o espólio é parte, ele figura como substituto processual dos sucessores do de cujus;
b) casos de alienação da coisa litigiosa, se o alienante permanece no processo ele passa, a partir da
alienação, a nele figurar como substituto processual do adquirente. Essa hipótese, aliás, exemplifica
também a regra da perpetuação da legitimidade (ou da estabilização subjetiva do processo).

SUCESSÃO PROCESSUAL. A ideia básica dessa temática reside no peculiar fato de que não se pode mudar as
partes dentro de uma relação processual por mudança do direito material que envolve o objeto do processo,
dada a autonomia que existe entre a relação processual e o negócio jurídico nela tratada, em que pese a
patente instrumentalidade do processo frente a sua função de tutela dos direitos materiais. Feita a citação,
portanto, as partes devem ser mantidas (estabilização das partes ou perpetuatio legitimis) ocorrendo
alteração nessa matéria apenas em situações excepcionais. De regra, pois, quaisquer alterações ocorridas no
plano material do direito não têm o poder de refletir no processo, alterando a legitimação no processo.
Chama-se sucessão processual, portanto, a exclusão de certa parte no processo com a inclusão de outra em
seu lugar, em razão da alteração da titularidade do bem, a qual, excepcionalmente, repercute no conceito
processual de legitimidade ad causam. A sucessão processual ocorre quando, havendo falecimento da parte,
esta deixa a relação processual, a qual passa a ser integrada pelo espólio ou pelos sucessores do morto (art.
110, CPC). Ademais, também se dá quando há alienação da coisa ou do direito litigioso a título particular por
ato entre vivos e o adquirente passa a integrar o polo passivo, com a aquiescência do alienante, parte
originária no processo, o qual deixa a relação jurídica processual (art. 109, CPC 4). Note-se – e é importante
não confundir as situações – que, no caso do art. 109 (alienação de coisa ou direito litigioso), a sucessão só se
dá se, e somente se, a parte originária permite o ingresso do novo titular do bem: então, ter-se-á sucessão, o
atual proprietário do bem entra e o antigo sai. Não obstante, quando não há aquiescência do alienante em
relação à entrada do adquirente, o alienante se mantém no processo, como parte, defendendo um direito de
outrem (do adquirente que foi impedido de ingressar no feito), e então, especificamente neste caso, não há
sucessão processual, mas, sim, substituição processual, com pessoa defendendo em juízo, em nome próprio,
direito alheio.

Legitimação extraordinária e substituição processual: Parte da doutrina afirma que a legitimação


extraordinária é gênero, do qual a substituição processual seria espécie. Segundo tal viés doutrinário, há
substituição processual quando o legitimado extraordinário propõe a ação isoladamente, sem litisconsórcio
com o suposto titular do direito material. (...) De todo modo, a doutrina em geral emprega as locuções

4
Art. 109. A alienação da coisa ou do direito litigioso por ato entre vivos, a título particular, não altera a legitimidade
das partes.
§ 1o O adquirente ou cessionário não poderá ingressar em juízo, sucedendo o alienante ou cedente, sem que o consinta a
parte contrária.
45
legitimado extraordinário e substituto processual como sinônimas. (MASSON, ANDRADE, ANDRADE, PÁG. 53-
Interesses Difusos e Coletivos Esquematizado).

Substituição processual e sucessão processual: A substituição processual não se confunde com a sucessão
processual. Sucessão Processual é a substituição da parte, em razão da modificação da titularidade do direito
material afirmado em juízo. É a troca da parte. Uma outra pessoa assume o lugar de quem deveria ser o
litigante, se se tomasse por base a titularidade do direito material, e esta pessoa faz-se parte na relação
processual. Ex1: morte de uma das partes, com a sucessão processual realizada com a figura do espólio ou
dos sucessores. Ex2: alienação da coisa ou do direito litigioso a título particular por ato entre vivos, quando e
somente quando o adquirente passa a integrar o polo passivo, com a aquiescência do alienante, parte
originária no processo, o qual deixa a relação jurídica processual.

Jurisprudência:
1. O Ministério Público Estadual tem legitimidade para atuar diretamente como parte em recurso submetido
a julgamento perante o STJ. EREsp 1.327.573-RJ, Rel. originário e voto vencedor Min. Ari Pargendler, Rel.
para acórdão Min. Nancy Andrighi, julgado em 17/12/2014, DJe 27/2/2015 (Informativo 556 STJ).
2. é cabível o ajuizamento de ação civil pública em defesa de direitos individuais homogêneos não
relacionados a consumidores, devendo ser reconhecida a legitimidade do sindicato recorrente para
propor a presente ação em defesa de interesses individuais homogêneos da categoria que representa.
Com o processamento da demanda na forma de ação civil pública, incide plenamente o art. 18 da Lei
7.347/1985. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.453.237-RS, Segunda Turma, DJe 13/6/2014; e AgRg no
REsp 1.423.654-RS, Segunda Turma, DJe 18/2/2014. EREsp 1.322.166-PR, Rel. Min. Mauro Campbell
Marques, julgado em 4/3/2015, DJe 23/3/2015 (Informativo 558 STJ).
3. O Ministério Público tem legitimidade para promover medida assecuratória que vise à garantia do
pagamento de multa imposta por sentença penal condenatória. REsp 1.275.834-PR, Rel. Min. Ericson
Maranho (Desembargador convocado do TJ-SP), julgado em 17/3/2015, DJe 25/3/2015 (Informativo 558
STJ). Súmula 521-STJ: A legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em
sentença condenatória é exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública.
4. Súmula 506-STJ: A Anatel não é parte legítima nas demandas entre a concessionária e o usuário de
telefonia decorrentes de relação contratual.
5. O Ministério Público não possui legitimidade para ajuizar a execução de título executivo extrajudicial
decorrente de condenação proferida pelo Tribunal de Contas. A legitimidade para a propositura da ação
executiva é apenas do ente público beneficiário (Info 552 STJ).
6. O MP tem legitimidade ad causam para propor ação civil pública com a finalidade de defender interesses
coletivos e individuais homogêneos dos mutuários do Sistema Financeiro da Habitação. Pois a causa
possui uma expressão para a coletividade e o interesse em discussão é socialmente relevante. (Info 552
STJ).
7. A União — e não só Estados, Distrito Federal e Municípios — tem legitimidade passiva em ação de
indenização por erro médico ocorrido em hospital da rede privada durante atendimento custeado pelo
Sistema Único de Saúde (SUS). STJ. 1ª Turma. REsp 1.388.822-RN, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado
em 16/6/2014 (Info 543).
8. A União é parte legítima para figurar no polo passivo de ação em que o arrendatário objetive ser
indenizado pelos prejuízos decorrentes da desapropriação por interesse social, para a reforma agrária, do
imóvel arrendado. STJ. 2ª Turma. REsp 1.130.124-PR, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 4/4/2013 (Info
522)
9. O MPF possui legitimidade para propor, na Justiça Federal, ação civil pública que vise à proteção de zona
de amortecimento de parque nacional, ainda que a referida área não seja de domínio da União. STJ. 2ª
Turma. AgRg no REsp 1.373.302-CE, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 11/6/2013 (Info 526).

4B. Teoria geral da prova. Ônus da prova e convicção judicial. Distribuição dinâmica ou convencional de ônus
da prova. Prova Ilícita.

Sidney Smith
Referência: Marinoni, Arenhart e Mitidiero, Curso de Processo Civil.

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Teoria geral da prova: a prova não se destina a provar fatos, mas sim afirmações de fato. É, com efeito, a
alegação, e não o fato, que pode corresponder ou não à realidade daquilo que se passou fora do processo. O
fato não pode ser qualificado de verdadeiro ou falso, já que esse existe ou não existe. É a alegação do fato
que, em determinado momento, pode assumir importância jurídico -processual e, assim, assumir relevância a
demonstração da veracidade da alegação do fato. De outro lado, o direito não depende de prova, já que é
dever do magistrado conhecê -lo. Excetua -se dessa regra, ao menos aparentemente, a possibilidade de o juiz
exigir a prova do direito municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário. Tal é o que prevê o art. 376,
autorizando o magistrado a, em havendo necessidade de recorrer a essa espécie de direito, poder determinar
a prova de seu teor e sua vigência à parte que o alega. A exceção, porém, é mais aparente do que real. Na
verdade, muito embora o preceito fale em prova da alegação do direito, a verdade é que direito não se alega;
direito invoca -se, supondo -se, em virtude do brocardo Iura novit curia, que o juiz o conheça. O que se alega
são fatos.33 E, a prova admitida no dispositivo, a rigor, não é a prova “do direito”, mas apenas a prova do teor
e da vigência de determinada norma, o que obviamente é questão que não pode ser rigorosamente
qualificada como prova do direito. O direito a produzir prova no processo constitui um direito constitucional,
apoiado tanto na garantia de acesso à Justiça (art. 5.º, XXXV, da da CF) como nos direitos ao contraditório e à
ampla defesa (art. 5.º, LV, da da CF). Em termos mais gerais, pode -se dizer que esse direito constitui
elemento indissociável do direito ao processo justo, que constitui toda a estrutura do nosso direito
processual civil. Ao lado de um direito, a prova é também um dever. E esse dever nada mais é do que um
reflexo – para toda a sociedade – dos direitos fundamentais processuais, em particular, dos direitos de acesso
à Justiça e de ampla defesa. As normas presentes no Código de Processo Civil que impõem algum dever de
colaboração probatória nada mais são do que o desdobramento infraconstitucional de imposições que já são,
antes, abraçados pela própria Constituição Federal. De toda sorte, o Código de Processo Civil possui vários
preceitos que indicam a existência de verdadeiros deveres específicos em matéria de prova. A começar, pode
-se apontar o art. 378, que estabelece que “ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário
para o descobrimento da verdade”. Trata -se de imposição sancionável por diversos dispositivos. Por exemplo,
a violação a esse dever de colaboração pode implicar as sanções correspondentes ao atentado (art. 77, VI, c/c
seu § 7.º). Pode ainda redundar em hipótese de litigância de má -fé, nos termos do que prevê o art. 80, II,
que pode acarretar a incidência da multa e da indenização a que alude o art. 81 do Código. Pode até mesmo
repercutir na esfera criminal, como se vê dos tipos penais de fraude processual (art. 347 do CP) ou de
sonegação de papel ou objeto de valor probatório (art. 356 do CP). De modo ainda mais pontual, estabelece
o art. 380 que o terceiro tem, em relação a qualquer processo, o dever de “I – informar ao juiz os fatos e as
circunstâncias de que tenha conhecimento; II –exibir coisa ou documento que esteja em seu poder”. A
violação desses deveres, aliás, gera sanções enérgicas por parte da jurisdição, que podem consistir, além da
imposição de multa, no emprego de qualquer medida coercitiva ou sub -rogatória necessária à obtenção
dessa colaboração (art. 380, parágrafo único). Também as partes estão submetidas, obviamente, a esse dever
de colaboração. Trata -se de um devergeral de colaboração, no sentido de que as partes devem sempre
contribuir para a solução adequada do litígio. Esse dever encontra assento específico para o campo da prova
nos preceitos do art. 77, I, II, III e VI, que impõe a todos os que participam do processo,aí incluídas,
logicamente, às partes, diversos deveres, especialmente ligados à veracidade e à sinceridade na condução do
processo. E, ainda de modo mais evidente, no ponto que aqui interessa, tem -se o contido no art. 379, a dizer
que, ressalvado o direito de não produzir prova contra si, devem as partes “I – comparecer em juízo,
respondendo ao que lhe for interrogado; II – colaborar com o juízo na realização de inspeção judicial que for
considerada necessária; III – praticar o ato que lhe for determinado”. Todavia, porque a Constituição também
se compromete com outros valores, é necessário, às vezes, limitar esse dever geral, a fim de não ofender
outra garantia também tida como fundamental ao Estado brasileiro (privilégios). Em princípio, o direito
brasileiro prevê duas modalidades de privilégios: o privilégio contra a autoincriminação (alargado, no direito
pátrio, para os fatos torpes e que causam prejuízo à honra da pessoa ou de seus familiares) e o privilégio em
razão do conhecimento de certos assuntos por ofício, função ou profissão (advogado -cliente, médico -
paciente, padre -confitente etc.). O Código Civil brasileiro ampliou sobremodo o primeiro privilégio, dispondo
que ninguém é obrigado a depor sobre fatos que possam expô -lo (ou a seu cônjuge, ou a parente em grau
sucessível, ou ainda a amigo íntimo) a “perigo de vida, de demanda, ou de dano patrimonial imediato” (art.
229, III). O exagero da previsão é evidente, e merece ser temperado pela doutrina e pela jurisprudência, já
que a aplicação irrestrita deste comando permitiria a qualquer um invocá -lo como critério para eximi -lo do
dever de depor. o atual Código de Processo Civil, ao que parece sem notar a dimensão dessa previsão
exagerada, resolveu ampliá -la ainda mais, colocando, no início do art. 379, uma cláusula geral que cria um
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“imaginado” direito civil para a parte de não produzir prova contra si. O outro privilégio diz respeito ao sigilo,
especialmente aquele decorrente de relações ético -profissionais, como o dever de sigilo imposto aos fatos
conhecidos por relação advogado -cliente, médico -paciente etc. Aqui, a previsão se faz para assegurar o
desenvolvimento adequado e correto das próprias atividades profissionais que, sem essa garantia, restariam
abaladas pela falta de confiança entre os sujeitos envolvidos (arts. 388, II; 404, IV e 448, II). Ônus da prova. .
Distribuição dinâmica ou convencional de ônus da prova: De acordo com o art. 373 do CPC, o ônus da prova
incumbe ao autor quanto ao fato constitutivo do seu direito e ao réu quanto à existência de fato impeditivo,
modificativo ou extintivo do direito do autor. Entretanto, os deveres probatórios são amplos e são imputáveis
não apenas às partes, mas também aos terceiros intervenientes, ao Ministério Público e ao próprio
magistrado. Já o ônus da prova tem dupla finalidade. Sua mais importante finalidade é servir como regra de
“fechamento do sistema”, informando ao juiz como deve julgar se, ao final da instrução da causa, permanecer
em dúvida a respeito dos fatos relevantes para a decisão. Ao assim fazer, porém, também a regra exerce
outra finalidade: a de orientar o comportamento das partes, de modo que, cientes de como será a decisão
judicial em caso de insuficiência de prova, passam a ser os maiores interessados em produzir as provas
relevantes para o processo. Nesse sentido, a regra do ônus da prova é um indicativo para as partes a respeito
de quem pode se prejudicar com o estado de dúvida judicial e para o juiz se livrar do estado de dúvida e,
assim, definir o mérito. Tal dúvida deve ser paga pela parte que tem o ônus da prova. Se a dúvida paira sobre
o fato constitutivo, essa deve ser suportada pelo autor, ocorrendo o contrário em relação aos demais fatos. A
produção de prova não é um comportamento necessário para o julgamento favorável. Na verdade, o ônus da
prova indica que a parte que não produzir prova se sujeitará ao risco de um resultado desfavorável. A ideia de
ônus da prova não tem o objetivo de ligar a produção da prova a um resultado favorável, mas sim o de
relacionar a produção da prova a uma maior chance de convencimento do juiz. Quando se fala que a regra do
art. 373 importa para a formação do convencimento, deseja -se dizer que ela pode ser atenuada diante de
determinadas situações de direito substancial. Perceba -se que, ao se admitir que a técnica da
verossimilhança tem a ver com a formação do convencimento judicial, fica fácil explicar porque o juiz, ao
considerar o direito material em litígio, não deve se preocupar com a prova de fatos considerados de
impossível esclarecimento. Se o juiz, para decidir, deve passar por um contexto de descoberta, é necessário
que ele saiba não apenas o objeto que deve descobrir, mas também se esse objeto pode ser totalmente
descoberto. Como o convencimento varia de acordo com o direito material, a regra do ônus da prova
também não pode ser vista sempre do mesmo modo, sem considerar a dificuldade de convicção própria ao
caso concreto. A lei prevê que as peculiaridades do caso podem impor a modificação do ônus da prova
basicamente em duas situações diversas. Em primeiro lugar, essas peculiaridades podem referir -se à maior
facilidade na obtenção da prova por um ou outro sujeito processual. Aqui, a rigor, a regra se alinha ao
conceito de economia processual, de modo que, se a prova é mais facilmente acessível a uma das partes, não
há razão para atribuir -se à outra a tarefa de aportá -la ao processo e, mais do que isso, de correr o risco pela
sua não aquisição nos autos. Em suma, nesse caso se parte da lógica de que aquele que pode facilmente
trazer uma prova para os autos, mas não o faz, deve suportar os ônus daí decorrentes. A situação se afeiçoa à
ideia de que a ausência de certa conduta, que é esperada da parte, deve refletir em seu prejuízo. O segundo
dos casos que pode determinar peculiaridades do caso que admitem a modificação do ônus da prova é a
impossibilidade o a excessiva dificuldade de uma das partes em trazer as provas para o processo,
especialmente daquelas cujo ônus lhe é atribuído. a modificação do ônus da prova é imperativo de bom
senso quando ao autor é impossível, ou muito difícil, provar o fato constitutivo, mas ao réu é viável, ou muito
mais fácil, provar a sua inexistência. Em regra, o juiz deve procurar uma convicção de verdade e, por isso,
deve julgar com base na regra do art. 373, caput, em caso de dúvida. Porém, particulares situações de direito
material exigem que o juiz reduza as exigências de prova, contentando -se com uma convicção de
verossimilhança. Nesses casos, ainda que as partes possam produzir prova, o próprio direito material
demonstra que o processo, para trata os interesses de maneira adequada e efetiva, não pode exigir mais do
que uma convicção de verossimilhança. Outra forma de modificação do ônus da prova admitida no direito
nacional é a convencional. A regra do art. 373 é de cunho dispositivo, podendo ser alterada livremente, desde
que observados certos limites, pelas partes. Essa conclusão ressai evidente da interpretação a contrario sensu
do § 3.º do art. 373, em questão. Como esclarece este dispositivo, “a distribuição diversa do ônus da prova
também pode ocorrer por convenção das partes, salvo quando: I – recair sobre direito indisponível da parte;
II – tornar excessivamente difícil a uma das partes o exercício do direito”. Ademais, para o juiz aplicar a regra
do art. 373, deve estar em estado de dúvida. Para inverter o ônus da prova com base em hipossuficiência,
deve concluir que o fato constitutivo é insuscetível de elucidação. E, finalmente, para inverter o ônus da
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prova com base em verossimilhança, ou ainda para se fundar na ideia de verossimilhança preponderante,
deve formar ao menos uma convicção de verossimilhança. Prova ilícita: Segundo o art. 369 do CPC, todos o s
meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados no Código de Processo Civil,
são hábeis para provar a verdade dos fatos relevantes para o processo e para influenciar na convicção do juiz.
Esse artigo, ao aludir a meios de prova não especificados no CPC, deixa claro que os meios de prova podem
estar previstos em qualquer lei – e nesse sentido seriam “meios legais” – ou não ter previsão expressa em lei
alguma (meios não tipificados na lei). Esses últimos seriam, nos termos do dispositivo, os chamados “meios
moralmente legítimos”. Ou seja, os meios moralmente legítimos são meios que, embora não expressamente
previstos na lei, estão de acordo com o direito. Como é fácil perceber, a redação truncada desse artigo resulta
da falsa assimilação de “meios típicos” por “meios legais”, ou de ter dado o significado de “meios típicos” à
expressão “meios legais”. Os meios de prova, ao menos em princípio, devem estar de acordo com as normas
legais, pouco importando se expressamente previstos na lei. Essa última ideia – de expressa previsão legal –
obviamente não tem relação com a prova estar de acordo com o direito ou não, mas sim com a sua
tipicidade. Quando o art. 369 alude a meios moralmente legítimos, não está contrapondo o que é legal com o
que é moral, mas sim dizendo que esses meios (moralmente legítimos) são aqueles que não estão
expressamente tipificados na lei. Tais meios, dessa forma, são as provas atípicas. Em outros termos, todos os
meios de prova – de lado a possibilidade excepcional da admissão de uma prova ilícita, como será visto a
seguir – devem estar de acordo com o direito, e nessa perspectiva são meios de prova legais. Esses meios de
prova, porém, podem ser típicos ou atípicos, conforme estejam ou não tipificados na lei. O fato de um meio
de prova não estar expresso na lei nada tem a ver com a sua moralidade, pois o que define a possibilidade da
utilização de uma prova é a sua conformação com o direito, e apenas nesse aspecto é que se pode aceitar
que um meio moralmente ilegítimo seja considerado um meio de prova não conforme ao direito e, assim,
ilegal. Está claro que a preocupação do art. 369, ao aludir a meio moralmente legítimo, está ligada, a um só
tempo, à necessidade e à insegurança da prova atípica. É que, se não há como negar a possibilidade do
emprego de meios de prova não tipificados, existe a possibilidade de que a sua aplicação seja feita de forma
abusiva. A admissibilidade e a produção da prova têm relação com os planos dos direitos material e
processual. Uma prova pode ser indevidamente – ilicitamente – admitida no processo, em violação ao direito
processual, e uma prova ilícita no plano do direito material pode ser indevidamente – e mais uma vez
ilicitamente – admitida no processo. De outra parte, uma prova pode ser produzida mediante violação ao
direito material ou em desrespeito ao direito processual. A prova não pode ser sanada quando a ilicitude é a
sua causa. A prova somente pode ser sanada quando constitui o ponto final de um procedimento em que
houve uma ilicitude. Nessa linha, é possível dizer que a prova que resulta da violação de um direito material
não pode ser sanada, não acontecendo o mesmo com a prova em cujo procedimento ocorreu um ilícito.
Porém, isso não significa que todas as provas que não constituam resultados de ilícitos sejam sanáveis. A
prova produzida com violação do direito processual – ou melhor, que não constitui o resultado do ilícito, mas
sim o resultado do procedimento em que ocorreu um ilícito – pode ser sanada somente nas hipóteses em
que a regra violada não é essencial à proteção de um direito fundamental processual –, assim como os
direitos ao contraditório e à defesa. Nesses casos, tendo em vista que a violação da regra processual pode
permitir a salvação do resultado do procedimento probatório – isto é, da prova –, nada impede que ele seja
recuperado mediante a observância do requisito legal ignorado. Ademais, quando se considera a prova
obtida com violação de regra não essencial, não há razão para se retirar qualquer eficácia ao seu resultado.
Ao contrário, na hipótese de violação de direito fundamental, seja material ou processual, a prova não pode
gerar consequência alguma no processo. O art. 5.º, LVI, da CF afirma que “são inadmissíveis, no processo, as
provas obtidas por meios ilícitos”. Esse inciso se refere às provas obtidas mediante a violação do direito
material, pois é óbvio que as provas não devem violar os direitos processuais. Tais provas, em regra, violam
direitos fundamentais materiais, como os direitos à inviolabilidade da intimidade, da imagem, do domicílio e
da correspondência (art. 5.º, X, XI e XII, da CF). A prova que resulta da violação do direito material não pode
ser sanada e produzir qualquer efeito no processo. Nesses casos, como já dito, nada se pode aproveitar da
prova, uma vez que o ilícito é a sua causa. Porém, se foi obtida uma prova mediante a violação da
comunicação telefônica (por exemplo), nada impede que uma nova prova venha a recair sobre o fato que a
prova ilícita tentou esclarecer, desde que essa nova prova receba a devida autorização judicial (art. 5.º, XII, da
CF). Nessa hipótese, como é óbvio, não há como pensar que a prova foi sanada. O que ocorreu foi a
realização de uma nova prova de forma lícita. O art. 5.º, LVI, da CF não nega o direito à prova, mas apenas
limita a busca da verdade, que deixa de ser possível através de provas obtidas de forma ilícita. O interesse no
encontro da verdade cede diante de exigências superiores de proteção dos direitos materiais que podem ser
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violados. A diferença entre os processos penal e civil se torna nítida quando se constata, por exemplo, que as
partes têm o dever de dizer a verdade no processo civil, enquanto que o réu, no processo penal, deve ser
informado do seu direito de permanecer calado.146 Como se vê, a busca da verdade é tratada de modo
totalmente diverso em tais processos. De acordo com a Constituição Federal, o preso deverá ser informado
“de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado”. Não se trata apenas de um direito de calar, mas
sim de um direito de ser informado da possibilidade de calar. Caso essa informação não ocorra, a prova
obtida através da declaração é ilícita. Além do mais, não se pode esquecer que o processo penal é marcado
pela chamada presunção de inocência, ou pela proibição de o juiz condenar o réu quando não está
convencido da verdade – o que não ocorre no processo civil. Especificamente em relação à prova ilícita no
processo civil, o conflito pode se dar entre o direito fundamental material que se deseja ver tutelado através
do processo e o direito fundamental material violado pela prova ilícita. Trata -se de colisão entre dois direitos
fundamentais igualmente dignos de tutela, que não foram, nem poderiam ser, objeto de prévia ponderação
normativa ou de hierarquização. Dizer que a descoberta da verdade não pode ocorrer através de prova ilícita
não é o mesmo que afirmar que um direito fundamental material não pode ser através dela demonstrado. O
uso da prova ilícita poderá ser admitido, segundo a lógica do postulado da proporcionalidade. Quando se
pensa no postulado da proporcionalidade nesses casos, há sempre que se considerar o valor do bem jurídico
que se busca proteger através da prova ilícita. Após, verificar se havia outra prova, além da obtida de forma
ilícita, capaz de demonstrar as alegações em juízo. E, por último, analisar de que modo a prova ilícita
determinou a violação do direito e, especialmente, se existe a possibilidade de limitação ao direito violado,
quando observados determinados requisitos legais, uma vez que a violação de um direito que não admite
sequer restrição legal é mais grave que a violação de um direito que pode ser objeto de restrição. Assim, há
distinção entre a obtenção de um testemunho mediante tortura e a escuta ilícita de uma conversa telefônica
– que pode ser licitamente gravada com autorização judicial. A prova obtida de modo ilícito pode propiciar
outra prova, que então estará contaminada, mas nada impede que o fato que se desejou demonstrar seja
objeto de uma prova que com ela não tenha qualquer vinculação. Essa última prova não pode ser dita
derivada da ilícita ou pensada como contaminada. Tal prova é absolutamente autônoma e independente. Na
exceção do descobrimento inevitável, se admite que a segunda prova deriva da ilícita, porém se entende que
não há razão para reputá -la nula ou ineficaz. Isso porque a descoberta por ela constatada ocorreria mais
cedo ou mais tarde. A lógica do salvamento da segunda prova está em que não há motivo para retirar eficácia
de uma prova, que trouxe uma descoberta que muito provavelmente seria obtida. Dessa forma seria possível
dizer que nem todos os frutos da árvore venenosa são proibidos, pois alguns podem ser aproveitados.
Situação um pouco diferente é a da chamada exceção de descobrimento provavelmente independente. Na
exceção de descobrimento inevitável, a segunda prova é aceita como derivada, mas admite -se que ela possa
produzir efeitos em razão de que a sua descoberta seria naturalmente trazida por uma outra prova. Quebra -
se o nexo de antijuridicidade com base na ideia de que o descobrimento seria inevitável. Porém, na exceção
de descobrimento provavelmente independente, a segunda prova não é admitida como derivada, mas como
uma prova provavelmente independente, e, assim, despida de nexo causal com a prova ilícita. Teoria da
descontaminação do julgado: Essa teoria nada tem a ver com a contaminação da segunda prova pela
primeira, mas sim com a descontaminação do julgado, ou melhor, com a decisão de que uma prova, em que o
julgado se baseou, era ilícita, e assim deve ser afastada. Essa decisão tem o efeito de descontaminar o
julgado.

4C. Meios adequados de resolução de conflitos: negociação, mediação e arbitragem. Convenções


processuais.

Atualizado por Marília Siqueira.

Ao lado da justiça estatal clássica, adjudicada pelo juiz, de porta única, surgem novas formas de acesso,
novos meios de solução adequada de conflitos: a justiça se torna uma justiça multiportas. Noticia-se que a
experiência da multi-door Corthouse foi sugerida em 1976 por Frank Sander. Negociação, mediação e
arbitragem são equivalentes jurisdicionais: métodos de solução de conflitos não jurisdicionais. Não se fala
mais em “meis alternativos”, mas em “meios adequados”, tanto que houve alteração no edital. Pela ótica do CPC/15, não há
superioridade da justiça estatal em relação aos demais meios de solução de controvérsias, deve-se dar preferência ao que for
mais adequado às peculiaridades do litígio; ou seja, não há uma preferência abstrata de qualquer deles, por isso, não se fala
em alternatividade, mas, sim, em adequação. Os meios em análise foram pensados no contexto da “terceira onda” de
50
renovação do processo civil (acesso à Justiça), a partir das preocupações com a morosidade e burocracia
judiciais, o que levava (e leva) a uma litigiosidade contida. Segundo DIDIER e ZANETI, estes meios também
são aplicáveis à tutela coletiva de direitos, embora tenham surgido no âmbito da tutela dos direitos
individuais.
Nesse contexto, duas resoluções merecem destaque: 1) Resolução n. 125/2010 do CNJ, por meio da qual foi
instituída no Brasil uma política pública de tratamento adequado dos conflitos jurídicos, estimulando a
solução por autocomposição; e 2) a Resolução n. 118/2014 do CNMP, que instituiu a política nacional de
incentivo à autocomposição no âmbito do Ministério Público (ver art, 1º, p único). Soma-se a elas o fato de
que o sistema processual brasileiro foi estruturado, com o CPC/15, no sentido de estimular a
autocomposição, com destaque para o art. 3º, §§ 2º e 3º, CPC/15, estabelecendo o estímulo à
autocomposição entre as normas fundamentais.
1) Negociação - processo bilateral de resolução de impasses ou de controvérsias, no qual existe o objetivo de
alcançar um acordo conjunto, através de concessões mútuas. Envolve a comunicação, o processo de tomada
de decisão (sob pressão) e a resolução extrajudicial de uma controvérsia. (PINHO, p.363). A negociação está
na base dos meios não jurisdicionais de resolução de controvérsias e contempla dois métodos básicos: o
competitivo ou distributivo (um dos interlocutores objetiva maximizar vitórias sobre o outro) e o
colaborativo ou integrativo (há preocupação de atender aos interesses de ambos). Resolução 118/2014: art.
8º. A negociação é recomendada para as controvérsias ou conflitos em que o Ministério Público possa atuar
como parte na defesa de direitos e interesses da sociedade, em razão de sua condição de representante
adequado e legitimado coletivo universal (art. 129, III, da CR/1988); Parágrafo único. A negociação é
recomendada, ainda, para a solução de problemas referentes à formulação de convênios, redes de trabalho
e parcerias entre entes públicos e privados, bem como entre os próprios membros do Ministério Público.
2) Mediação – Considera-se mediação a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder
decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções
consensuais para a controvérsia (art. 1º, parágrafo único, Lei 13.140/15). O mediador é um profissional
qualificado que tenta fazer com que os próprios litigantes descubram as causas do problema e tentem
removê-las; é um facilitador do diálogo ente as partes. Na mediação não há heterocomposição, diferente do
que ocorre na arbitragem. As próprias partes decidem.
A mediação pode ocorrer extrajudicialmente ou judicialmente, quando já existente o processo jurisdicional.
Neste último caso, o mediador é auxiliar da justiça. Ela pode ocorrer perante câmaras públicas institucionais,
vinculadas a determinado tribunal ou entes como a Defensoria Pública, serventias extrajudiciais, OAB, por
exemplo, ou em ambientes privados, como câmaras privadas ou mesmo em câmaras administrativas,
vinculadas à administração pública (arts 42 e 43, Lei 13.140/15 e 167, 174, 175, CPC/15). Ademais, os
tribunais deverão criar centro de solução de conflitos, os quais serão preferencialmente responsáveis pela
realização das sessões e audiências de conciliação e mediação, que ficarão a cargo de mediadores e
conciliadores (a realização no próprio juízo em que tramita o processo em excepcional). As partes podem
escolher, de comum acordo, o mediador ou a câmara privada de conciliação e de mediação (art. 168,
CPC/15).
Esta técnica é mais recomendada nos casos em que exista uma relação anterior e permanente entre os
interessados, como nos casos de conflitos societários e familiares (art. 165, §3º, CPC/15). Resolução
118/2014: “Art. 9º A mediação é recomendada para solucionar controvérsias ou conflitos que envolvam
relações jurídicas nas quais é importante a direta e voluntária ação de ambas as partes divergentes.
Parágrafo único. Recomenda-se que a mediação comunitária e a escolar que envolvam a atuação do
Ministério Público sejam regidas pela máxima informalidade possível”.
A mediação é informada pelos seguintes princípios: (i) independência: o mediador tem o dever de atuar com
liberdade, sem sofrer qualquer pressão interna ou externa; (ii) imparcialidade: o mediador não pode ter
qualquer interesse no conflito, é reflexo do princípio da impessoalidade, próprio da administração pública;
(iii) autorregramento da vontade: corolário da liberdade, é pressuposto e razão de ser da mediação, assim, o
mediador está proibido de constranger os interessados à autocomposição; (iv) confidencialidade: estende-se
a todas as informações produzidas ao longo do procedimento, cujo teor não pode ser usado para outra
finalidade diversa daquela expressamente prevista e deliberada pelas partes, assim, o mediador tem dever
de sigilo profissional e não poderá divulgar ou depor acerca de fatos ou elementos oriundos da conciliação
ou da mediação; (v) oralidade; (vi) informalidade: o mediado deve se comunicar em linguagem simples e
acessível; (vii) decisão informada: é imprescindível que as partes sejam bem informadas, tendo correta
compreensão do problema e das consequências do acordo, de modo a garantir uma participação
51
substancialmente qualificada (art. 166, CPC/15); (viii) isonomia entre as partes; (ix) busca do consenso; e (x)
boa-fé (art. 2º, Lei 13.140/15).
No direito comparado, destaca-se a Argentina, onde a mediação possui papel relevante, sendo obrigatória a
sua realização, antes de ingresso com a demanda judicial, desde 1995.
Arbitragem - técnica de solução de conflitos realizada por meio da intervenção de uma ou mais pessoas que
recebem seus poderes de uma convenção privada (convenção de arbitragem), decidindo sem intervenção
estatal, porém com imparcialidade, sendo a decisão destinada a assumir a mesma eficácia da sentença
judicial. Aplica-se a conflitos que envolvam direitos patrimoniais disponíveis. Trata-se de um meio
heterocompositivo de solução de controvérsias, diferenciando-se da conciliação e mediação em razão da
imposição da solução arbitral perante as partes. (CARMONA, p.43). A Lei 9307/96 dispõe sobre a arbitragem.
Jurisdição arbitral - A natureza jurídica da arbitragem é de jurisdição5, embora haja divergência na doutrina a
esse respeito (a exemplo de Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero que sustentam que arbitragem não é
jurisdição). O árbitro exerce jurisdição porque aplica o direito ao caso concreto e coloca fim à lide que existia
entre as partes, na medida em que a decisão arbitral fica imutável pela coisa julgada, após o decurso do
prazo de 90 dias para invalidação. Além disso, a lei denomina a decisão arbitral de sentença e lhe confere
eficácia de título executivo judicial (art. 515, VII CPC/15 e art. 31, Lei 9307/96).
A arbitragem, conforme já decidido pelo STF, não ofende os princípios da inafastabilidade do controle
jurisdicional (seria inconstitucional se fosse compulsória) nem do juiz natural (está presente no juízo arbitral
o requisito da pré-constituição na forma da lei, além disso, a lei garante um juiz imparcial). Em verdade, está-
se no campo da autonomia de vontade das partes que, livremente, decidem submeter o litígio à apreciação
de um árbitro, renunciando à jurisdição estatal.
Estão excluídos do juízo arbitral os direitos indisponíveis. Também não se admite arbitragem nas matérias
submetidas aos procedimentos de jurisdição voluntária (dada a existência de interesse público e
indisponibilidade dos direitos) e nas matérias que, em juízo, reclamam a intervenção do MP no processo. De
outro lado, passou-se a admitir, expressamente, a arbitragrem no âmbito da administração pública direta e
indireta (art. 1º, §1, Lei 9.307/96).
Princípios fundamentais da arbitragem: a) autonomia da vontade (ou autorregramento da vontade). Partes
podem instituir o juízo arbitral, o número de árbitros, o procedimento, aplicação de direito ou de equidade,
etc. (desde que não haja ofensa à ordem pública e aos bons costumes); b) eleição da lei aplicável (nacional
ou estrangeira); c) eleição da lex mercatória, jurisdição de equidade, e princípios gerais de direito que
poderão ser aplicados; d) devido processo legal; e) efeito vinculante da cláusula arbitral (partes ficam
submetidas à sentença arbitral, qualquer que seja o resultado); f) inevitabilidade dos efeitos da sentença
arbitral, que faz coisa julgada material e constitui título executivo judicial; g) autonomia entre a cláusula
arbitral e o contrato (invalidade do contrato não contamina a cláusula compromissória); h) competência-
competência Kompetenz- kompetenz, segundo a qual cabe ao árbitro decidir sobre a existência, validade e
eficácia da convenção de arbitragem; é o juízo arbitral que decide sobre sua própria competência. Sobre o
tema, o STJ decidiu que, nos casos em que prima facie é identificado um compromisso arbitral “patológico”
(claramente ilegal), o Judiciário pode declarar a nulidade dessa cláusula, independentemente do estado em
que se encontre o procedimento arbitral (REsp 1.602.076/SP).
Forma de constituição. A arbitragem, no Brasil, pode ser constituída por meio de um negócio jurídico
denominado convenção de arbitragem que, conforme disposto no art. 3º, Lei 9.307/96, compreende tanto a
cláusula compromissória quanto o compromisso arbitral.
Cláusula compromissória (pactum de compromittendo) – negócio jurídico celebrado como pacto adjeto
dentro de outro contrato, entre pessoas capazes, tendo por objeto direito disponível, por meio do qual as
partes se comprometem a, no futuro, instituir a arbitragem (obrigação de fazer) como meio para resolver as
divergências referentes àquele contrato principal no qual a cláusula compromissória foi inserida. Não se
relaciona a um conflito concreto, determina-se que, se o litígio vier a ocorrer, ele será solucionado por
arbitragem. A cláusula é chamada cheia quando já contém todos os elementos para a instalação da
arbitragem. Quando a cláusula é vazia, a lacuna deve ser preenchida pelas partes (se isto não ocorrer,
frustra-se a arbitragem e as partes deverão socorrer-se do Judiciário). Em contrato de adesão, conforme art.
4º, §2º, a cláusula compromissória só terá eficácia se for de iniciativa do aderente ou se houver sua
concordância por escrito em documento anexo ou em negrito, com assinatura/visto especialmente para essa
cláusula (STJ: essas exigências se aplicam ao contrato de franquia, quando de adesão). Em contrato de

5
Cândido Rangel Dinamarco, Instituições de Direito Processual Civil, v1, 2016, p. 489.
52
consumo, é nula cláusula que imponha arbitragem compulsoriamente. Se uma das partes desrespeita a
cláusula, o réu pode alegar a existência da convenção em preliminar ou reconvir pedindo a condenação
na obrigação de fazer (instituir a arbitragem).
Compromisso arbitral – acordo de vontades pelo qual as partes decidem que determinado conflito já
existente deverá ser resolvido por juízo arbitral. Pode ser que seja precedido de uma cláusula
compromissória (que precisa do compromisso arbitral para ser efetivada).
Observações: 1) O juízo arbitral somente pode ser instituído por pessoas capazes de contratar; 2) somente se
as partes conferirem poderes expressos para o árbitro decidir por equidade é que este poderá assim agir; 3)
o árbitro deve ser pessoa natural e capaz, tendo status de juiz de fato e direito, além de ser equiparado a
servidores públicos para efeitos penais; 4) somente o judiciário pode executar a sentença arbitral, pois,
diversamente do juiz estatal que possui iurisdictio e imperium, o juiz arbitral somente possui iurisdictio; 5)
não há possibilidade de provimento de urgência (cautelar ou satisfativo); 6) a sentença arbitral é insuscetível
de revisão pelo judiciário, mas pode ser invalidada (o controle judicial é restrito à validade, arts. 32 e 33,
caput, Lei 9307/96), ou seja, não pode haver revisão de mérito, não se analisa error in judicando, somente
error in procedendo; 7) Não há necessidade de homologação da sentença arbitral pelo Judiciário (art. 31, Lei
9307/96).
Sentença arbitral: deve preencher os requisitos do art. 26 (relatório, fundamentos, dispositivo, data e lugar).
É necessária a fundamentação, ainda que o árbitro seja leigo e que a jurisdição arbitral seja de equidade. Os
árbitros poderão proferir sentenças parciais (incluído pela Lei 13.129/15). Se, no decurso da arbitragem, as
partes chegarem a acordo quanto ao litígio, o juízo arbitral poderá, a pedido das partes, declarar tal fato
mediante sentença arbitral, que conterá os requisitos do art. 26.
Anulabilidade da sentença. Hipóteses: a) se for nulo o compromisso; b) se emanou de quem não podia ser
árbitro; c) se não contiver os requisitos do art. 26; d) se proferida fora dos limites da convenção; e) se
comprovado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva; g) se proferida fora do
prazo; h) se desrespeitados os princípios do art. 21 (respeito ao procedimento, contraditório, igualdade das
partes, imparcialidade do árbitro e de seu livre convencimento).
Sentença arbitral estrangeira: Para ser reconhecida e executada no Brasil, a sentença arbitral estrangeira deve ser
homologada pelo STJ. Quando, no país estrangeiro, se exigir a homologação judicial da sentença arbitral, essa
decisão homologatória é que fica sujeita à homologação pelo STJ.
Processo judicial: o juiz não pode conhecer de ofício a convenção de arbitragem; a não alegação pelo réu
implica renúncia ao juízo estatal e aceitação da jurisdição estatal. Cabe agravo de instrumento da decisão
que rejeita a alegação da convenção de arbitragem.
Convenções processuais: são espécies de negócios jurídicos processuais bilaterais/plurilaterais,
caracterizadas pela convergência de vontades das partes. Antonio do Passo Cabral apresenta a seguinte
definição “convenção (ou acordo) processual é o negócio jurídico plurilateral, pelo qual as partes, antes ou
durante o processo e sem a necessidade de intermediação de um outro sujeito, determinam a criação,
modificação e extinção de situações jurídicas processuais, ou alteram o procedimento” (2016, p. 68).De
acordo com Fredie Didier Jr, “negócio processual é fato jurídico voluntário, em cujo suporte fático se
reconhece ao sujeito o poder de regular, dentro dos limites fixados no próprio ordenamento jurídico, certas
situações jurídicas processuais ou alterar o procedimento” (2016, p. 380). O edital fala em convenções
processuais, mas isso não exclui a possibilidade de negócios processuais unilaterais.
O CPC/15 adotou a diretriz de valorização da participação das partes na condução do processo, promovendo,
além do estímulo à autocomposição como visto acima, a sua atuação na conformação do procedimento e das
situações jurídicas processuais, por meio da ampliação dos negócios processuais típicos e da previsão de uma
cláusula geral de negociação processual atípica (art. 190, CPC/15). Perceba-se, portanto, que há negócios
processuais típicos, isto é, aqueles expressamente previstos no CPC, como a cláusula de eleição de foro (art.
63, CPC/15), saneamento consensual (art. 357, §2ª, CPC/15), convenção para escolha do perito (art. 471,
CPC/15), convenção sobre ônus da prova (art. 373, §§ 3º e 4º, CPC/15), calendário processual (art. 191,
CPC/15) etc., cujos parâmetros e objeto já estão previamente delineados, e negócios processuais atípicos,
decorrentes do permissivo contido no art. 190, CPC/15, a exemplo da legitimidade extraordinária negociada,
as convenções para ampliação/redução de prazos, etc. A inovação quanto aos negócios processuais típicos
foi a ampliação das espécies, já quanto aos atípicos, foi a própria previsão expressa de sua admissibilidade.
Na vigência do CPC/73, o negócio jurídico processual era figura controversa, havia quem os admitisse, com
Araken de Assis, Fredie Didier Jr, reconhecendo, notadamente, os negócios típicos, como a convenção sobre
ônus da prova, mas também quem afirmasse a inexistência dessa figura, como o Prof Cândido Rangel
53
Dinamarco. Hoje, esta discussão não tem mais lugar.
Especificamente quanto à cláusula geral de negociação processual prevista no art. 190, CPC/15, deve-se
pontuar que o legislador ampliou o espaço de atuação das partes, mas o fez fixando alguns parâmetros, que
podem ser extraídos do referido dispositivo legal: 1) Objeto: as partes podem negociar não só sobre o
procedimento, como alteração ou supressão de atos, reestruturando o procedimento, mas, também, sobre
situações jurídicas processuais, ônus, poderes, deveres e faculdades processuais, a exemplo da legitimidade
extraordinária negociada defendida por Fredie Didier Jr; 2) as convenções processuais podem ser celebradas
antes ou durante o processo, não sendo o momento ou local os critérios definidores da sua qualidade
“processual”; 3) a causa deve versar sobre direitos que admitam autocomposição (ou seja, o âmbito de
incidência é maior do que a arbitragem, que se restringe aos direitos patrimoniais disponíveis), desse modo,
a indisponibilidade do direito material não impede, por si só, a celebração de negócio jurídico processual ; 4)
partes plenamente capazes (a doutrina diverge acerca da possibilidade de representação/assistência); 5) não
é possível a inserção abusiva em contrato de adesão; 6) não pode haver manifesta situação de
vulnerabilidade de uma das partes.
Como se percebe, a maior dificuldade, no âmbito dos negócios processuais atípicos, é a definição dos seus
limites objetivos, não havendo parâmetros específicos, justamente pela opção legislativa de uso de clásula
geral para redação do dispositivo. Fica a cargo a doutrina e jurisprudência o estabelecimento de tais limites
diante do caso concreto. Fredie Didier Jr e Antonio do Passo Cabral, além de outros autores, apresentaram
parâmetros gerais para verificação da licitude do objeto, no entanto, esta é uma questão ainda em aberto na
doutrina.
Outro ponto polêmico, em construção na doutrina, é o papel do juiz nas convenções processuais, o que
envolve duas questões: (i) qual o papel do juiz no controle do negócio e seu grau de ingerência, sobretudo,
para inadmitir o negócio; e (Ii) a possibilidade ou não de o juiz ser parte da convenção. Quanto ao primeiro
ponto, deve-se observar que coube ao juiz o controle de validade das convenções, não devendo analisar o
acerto ou desacerto do objeto ou sua conveniência para as partes. Como pontua Antonio do Passo Cabral,
sendo válido o acordo, o juiz deve dar cumprimento, pois, sendo normal jurídica válida, o juiz está a ela
vinculado.Quando ao segundo ponto, há divergência na doutrina, não sendo possível, ainda, afirmar uma
posição majoritária, a título de exemplo, Fredie Didier Jr entende que o juiz pode ser parte do negócio, ao
passo que Antonio Cabral entende o contrário, que juiz não pode ser parte do negócio.
Em razão do disposto no art. 200, CPC/15, em regra, para a produção de efeitos, não é necessária a
homologação da convenção pelo juiz; para que seja necessária, deve haver previsão legal expressa nesse
sentido, como ocorre no saneamento consensual (art. 357, §2º, CPC/15). Assim, por não haver tal previsão
no art. 190, os negócios processuais atípicos, não precisam de homologação pelo juiz, produzindo seus
efeitos imediatamente. Quanto aos negócios típicos, deve-se verificar em cada um deles se há ou não a
previsão.

5A. Litisconsórcio. Assistência. Intervenção anômala. Amicus curiae.

Marília Siqueira

1. Litisconsórcio. Arts. 113 a 118, CPC.


1.1. Conceito: Na definição clássica, proposta por Chiovenda, litisconsórcio é presença de duas ou
mais pessoas na posição de demandantes ou de demandados. Este é o conceito dominante, seguido, por
exemplo, por Cândido Rangel Dinamarco (DINAMARCO, 2017, p. 385) e Fredie Didier Jr. (DIDER, 2016, p.
457). Marinoni, Mitidiero e Arenhart, no entanto, diferem o litisconsórcio do fenômeno da pluralidade de
partes ou cumulação subjetiva. Segundo estes autores, para que a simples cumulação subjetiva configure
litisconsórcio, é preciso que os sujeitos estejam vinculados por certo grau de afinidade de interesses.
Exemplos: na ação de consignação proposta por A contra B e C, supostos credores, em que há fundada
dúvida sobre quem deva receber o crédito, não há litisconsórcio, mas mera cumulação subjetiva. De outro
lado, na ação de cobrança de A contra B e C, sendo que ambos assumiram a obrigação, aí, sim, há
litisconsórcio, pois os dois são devedores da mesma obrigação.
1.2. Classificação. Os principais critérios utilizados são posição processual, momento da formação,
obrigatoriedade da formação e uniformidade na solução da causa. (i) Segundo a posição processual, será
ativo, quando formado no polo ativo (mais de 1 autor), passivo, quando formado no polo passivo (mais de 1
réu), ou misto, quando formado em ambos os polos da relação processual (mais de 1 autor e mais de 1 réu).
54
(ii) Segundo o momento de formação, será inicial, quando a formação se der já na petição inicial, ou ulterior,
quando se formar no curso do processo. (iii) Pela obrigatoriedade da formação, poderá ser facultativo, que é
simplesmente autorizado pela legislação, não havendo obrigatoriedade na sua formação, podendo, em caso
de litisconsórcio facultativo multitudinário, ser limitado pelo juiz quanto ao número de litigantes houver
comprometimento da rápida solução do litígio ou dificultar a defesa ou o cumprimento da sentença (art. 113,
§1º, CPC) ou necessário, que decorre de disposição de lei ou quando, pela natureza da relação jurídica
controvertida, a eficácia da sentença depender da citação de todos que devam ser litisconsortes (art. 114,
CPC). Em caso de não formação do litisconsórcio necessário, o juiz deverá extinguir o processo sem resolução
do mérito, antes, porém, deve assinar prazo para citação dos litisconsortes necessários(art. 115, p único,
CPC); (iv) Segundo a uniformidade na solução da causa, poderá ser simples, quando a causa puder ser
decidida de maneira diferente para cada um dos litisconsortes, ou unitário, quando o juiz tiver de decidir o
mérito de modo uniforme para todos os litisconsortes (art. 116, CPC), em razão da natureza incindível da
situação jurídica de direito material alegada em juízo.
Observação 1: não há confusão entre litisconsórcio necessário e o unitário, pois a unitariedade não é
pressuposto da necessariedade. Assim, o litisconsórcio necessário poderá ser simples, quando decorrente
de disposição legal, ou unitário, quando decorrer da natureza da relação jurídica controvertida em juízo.
Aqui, deve-se destacar existência de divergência na doutrina quanto à existência de litisconsórcio necessário
ativo: Marinoni, Mitidiero e Arenhart assumem que existe, tanto que afirmam que, pela natureza da relação
jurídica, o litisconsórcio será necessário unitário, ativo ou passivo, de outro lado, Fredie Didier Jr afirma que o
litisconsórcio será necessário por disposição de lei ou, pela natureza da relação jurídica, se unitário passivo,
salvo disposição legal em contrário, assim, no polo ativo, o litisconsórcio unitário seria facultativo. Esclareça-
se, ainda, que, segundo este autor, a lei pode excepcionar a necessariedade do litisconsórcio unitário
passivo, sendo, então, unitário passivo facultativo, a exemplo do litisconsórcio entre devedores solidários de
obrigação indivisível (art. 275, CC).
Observação 2: A distinção entre litisconsórcio necessário simples e necessário unitário é importante,
pois, em caso de não formação, as consequências previstas no art. 115, CPC são distintas: em caso de
litisconsórcio necessário unitário, a não formação torna a sentença de mérito nula e, em caso de
litisconsórcio necessário simples, a sentença de mérito será apenas ineficaz para aqueles que não foram
citados, para os que foram, será válida e eficaz, nesse caso.
Observação 3: os regimes de tratamento do litisconsórcio simples e unitário são distintos, assim, de
acordo com o art. 117, CPC, sendo simples, cada um dos litisconsortes será considerado, em princípio, parte
autônoma frente aos demais, de modo que atos e omissões de um sujeito não prejudicarão nem
beneficiarão os demais, exceto se as razões forem comuns, pois elas vão beneficiar a todos que estiverem na
mesma situação. Por outro lado, sendo unitário, os litisconsortes serão considerados como uma unidade
frente ao outro polo do processo e, nesse caso, atos e omissões de um deles não prejudicarão os demais,
mas poderão beneficiá-los. Em todo caso, os sujeitos poderão promover sozinhos o andamento do processo
e todos devem ser intimados dos respectivos atos (art. 118, CPC).
1.3. Fontes: De acordo, com o art. 113, CPC, duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo
processo, em conjunto, ativa ou passivamente, quando: i) entre elas houver comunhão de direitos ou de
obrigações relativamente à lide; (ii) entre as causas houver conexão pelo pedido ou pela causa de pedir; (iii)
ocorrer afinidade de questões por ponto comum de fato ou de direito (este ponto é o principal, que sustenta
com preponderância, a posição jurídica das partes – MARINONI, MITIDIERO E ARENHART, 2015,p. 87).
2. Assistência. Arts. 119 a 124, CPC.
2.1. Conceito: a assistência é modalidade de intervenção voluntária de terceiro que compreende a
assistência simples e assistência litisconsorcial, as quais se aproximam pela característica da voluntariedade e
se diferenciam pelo vínculo existente entre o terceiro e o objeto litigioso. No CPC/73, a assistência estava
posicionada com o litisconsórcio, o que foi objeto de críticas pela doutrina, culminando no seu
reposicionamento no CPC/15 para o título da intervenção de terceiros. No entanto, as alterações normativas
foram mínimas, de modo que continua sendo figura objeto de muitas divergências, sobretudo a assistência
litisconsorcial.
Disposições comuns: (i) a assistência será admitida em qualquer procedimento e em todos os graus
de jurisdição, recebendo o assistente o processo no estado em que se encontre; (ii) sobre o procedimento:
diante do requerimento de ingresso, se qualquer das partes alegar falta de interesse de agir do requerente, o
juiz irá decidir o incidente, mas não suspenderá o processo, porém, não havendo impugnação no prazo de 15
dias, o pedido do assistente será deferido, salvo se for caso de rejeição liminar.
55
2.2. Assistência simples: trata-se de modalidade de intervenção voluntária que permite ao terceiro
intervir no processo para auxiliar uma das partes (autor ou réu), por ser ele titular de situação jurídica que
poderá ser atingida de forma reflexa, pelos efeitos da decisão proferida naquele processo; o terceiro
também pode fiscalizar a atuação das partes para evitar conluio que possa violar sua esfera jurídica.
Interesse na intervenção: o assistente simples deve ter interesse jurídico em sentença favorável para
o assistido. Não se admite intervenção com base em interesse meramente econômico ou moral. A
configuração do interesse jurídico não é tema homogêneo na doutrina, destaque-se, no entanto, que,
segundo Marinoni, Mitidiero e Arenhart, haverá interesse jurídico quando: (i) houver interesse na correta
interpretação dos fatos e do direito colocados no litígio que não lhe diz respeito diretamente; (ii) possuir
relação jurídica com o assistido, a qual depende da solução a ser dada ao litígio deduzido no processo que
pretende intervir.
Posição assumida: em princípio, o assistente simples atuará como auxiliar da parte principal,
exercerá os mesmos poderes e sujeitar-se-á aos mesmos ônus processuais que o assistido. No entanto, se o
assistido for revel ou de qualquer modo omisso, o assistente será considerado seu substituto processual. Em
razão da posição de auxiliar assumida pelo assistente, ele não poderá obstar que a parte principal reconheça
a procedência do pedido, desista da ação, renuncie ao direito sobre o que se funda a ação ou transija sobre
direitos controvertidos.
Eficácia da intervenção: por não ser titular da relação jurídica deduzida em juízo, transitada em
julgado a sentença, o assistente não se submete à coisa julgada, mas, sim, à justiça da decisão, assim, não
poderá discutir em processo futuro os fatos que lhe dizem respeito e foram tomados como fundamento da
sentença, salvo se alegar e provar que: (i) pelo estado em que recebeu o processo ou pelas declarações e
pelos atos do assistido, foi impedido de produzir provas suscetíveis de influir na sentença; (ii) desconhecia a
existência de alegações ou de provas das quais o assistido, por dolo ou culpa, não se valeu. Na hipótese de os
fatos não dizerem respeito ao assistente, a justiça da decisão significará a impossibilidade de fugir dos efeitos
executivos reflexos da sentença, como ocorre com o sublocatário (MARINONI, MITIDIERO, ARENHART, 2015,
p. 96).
2.3. Assistência litisconsorcial: é regida, especificamente, pelo art. 124, CPC, que diz: considera-se
litisconsorte da parte principal o assistente sempre que a sentença influir na relação jurídica entre ele e o
adversário do assistido. Ou seja, trata-se do ingresso daquele que é titular do próprio direito material
discutido em juízo. Apesar disso, o Código novo manteve a mesma incongruência do CPC/73, ao dizer
“considera-se litisconsorte da parte principal o assistente”, porém, ou bem é litisconsorte, ou bem é
assistente (BARBOSA MOREIRA, 1974, P. 78), o que gera divergência na doutrina. Há duas correntes
principais: os que defendem ser hipótese de formação de litisconsórcio ulterior (MARINONI, MITIDIERO,
ARENHART, 2015, p. 97 e DIDER JR, 2016, p. 496) e os que entendem se tratar de assistência qualificada que
não importa a formação de litisconsórcio (DINAMARCO, 2017, p. 449).
Regime jurídico: idêntico ao da parte originária, sem as restrições da condição de auxiliar do
assistente simples.
Coisa julgada: a sentença irá decidir relação jurídica material da qual o assistente litisconsorcial é
parte, por isso, ele ficará submetido à coisa julgada, e não à justiça da decisão como ocorre com o assistente
simples.
Importante: partindo do conceito de parte como aquele que pede e contra quem se pede a tutela
jurisdicional, Marinoni, Mitidiero e Arenhart entendem que o assistente simples, mesmo após intervir,
continua sendo terceiro, ao passo que o assistente litisconsorcial, por aderir ao pedido anteriormente
formulado, já que titular do direito material discutido em juízo, seria parte do processo. Esse tema encontra
divergência na doutrina, pois outra parcela relevante entende que tanto o assistente simples quanto o
litisconsorcial se tornam partes do processo a partir do ingresso.
3. Intervenção anômala. Art. 5º, parágrafo único, da Lei 9.496/97.
Trata-se de hipótese de intervenção voluntária prevista no art. 5º, p. único, da Lei 9.496/97 que
viável para pessoas jurídicas de direito público, com destaque para a União. Teor: Art. 5º A União poderá
intervir nas causas em que figurarem, como autoras ou rés, autarquias, fundações públicas, sociedades de
economia mista e empresas públicas federais. Parágrafo único. As pessoas jurídicas de direito público
poderão, nas causas cuja decisão possa ter reflexos, ainda que indiretos, de natureza econômica, intervir,
independentemente da demonstração de interesse jurídico, para esclarecer questões de fato e de direito,
podendo juntar documentos e memoriais reputados úteis ao exame da matéria e, se for o caso, recorrer,
hipótese em que, para fins de deslocamento de competência, serão consideradas partes.
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Primeiro. Admite-se a intervenção independentemente de interesse jurídico, sendo suficiente
interesses econômicos indiretos, inclusive, com a finalidade exclusiva de esclarecer apenas questões de fato
e de direito. Segundo. É possível recorrer, caso em que será considerada parte, alterando a competência
(suscita-se a inconstitucionalidade desta alteração). Terceiro. É questão em aberto a eficácia da intervenção.
4. Amicus curiae. Art. 138, CPC.
Conceito: o amicus curiae é o terceiro que, espontaneamente, a pedido da parte ou, por provocação
do órgão jurisdicional, intervém no processo para fornecer subsídios que possam aprimorar a qualidade da
decisão. Sua intervenção não se confunde com a participação do perito, pois este se refere à realização da
perícia, que é meio de prova, de averiguação dos fatos, ao passo que o amicus curiae dá sua opinião sobre a
causa.
A figura do amicus curiae já era presente no nosso ordenamento jurídico (ex: art. 31, Lei 6.385/76e
art. 118, Lei 12.529/11), assim, a novidade do CPC/15 foi a sua previsão tornar atípica a possibilidade de
intervenção a título de amicus curiae.
Forma de intervenção: pode ser voluntária ou provocada, pelas partes ou pelo juiz. Obs: a decisão
que solicita ou admite a participação do amicus curiae é irrecorrível.
Hipóteses autorizadoras: pode ocorrer em qualquer processo, desde que haja relevância da
matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia. Além disso,
há previsão específica nos seguintes dispositivos: art. 950, §§ 1º, 2º e 3º; art. 983, caput e §1º; art. 1035, §4º;
e art. 1038, todos do CPC.
Sujeitos que podem intervir: qualquer pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada,
com representatividade adequada.
Representatividade adequada: esta noção vem sendo criticada pela doutrina, por se tratar, segundo
Antonio Cabral, de uma importação acrítica de instituto que não é próprio do direito brasileiro (CABRAL,
2016, p. 213). No caso, deve-se observar a capacidade do sujeito em contribuir adequadamente para a
solução do litígio, havendo uma relação de pertinência temática ou institucional do amicus curiae com a
questão debatida em juízo.
Finalidade da participação: oferecer razões para a justa solução do processo ou para a formação de
um precedente (MARINONI, MITIDIERO, ARENHART, 2015, p. 99). A participação do amicus curiae é movida
por um interesse institucional, segundo Marinoni, Mitidiero e Arenhart, o interesse no adequado debate em
juízo de determinada questão. Para estes autores, esse, inclusive, é o critério inicial para aferir a
representatividade adequada acima referida.
Prazo para manifestação: 15 dias a contar da intimação da decisão que solicita ou admite sua
participação.
Competência: a intervenção do amicus curiae não altera a competência (art. 138, §1º).
Poderes: caberá ao juiz ou ao relator, na decisão que solicitar ou admitir a intervenção, definir os
poderes do amicus curiae (art. 138, §2º, CPC).
Legitimidade recursal: conferiu-se ao amicus curiae o poder de recorrer apenas da decisão de
inadmite o seu ingresso, da decisão que julgar o IRDR e a oposição de embargos de declaração (este poderes
não podem ser suprimidos pelo juiz). No que concerne ao poder de recorrer da decisão do IRDR, Marinoni,
Mitidiero e Arenhart pontuam que o §3º do art. 138 deve ser interpretado no sentido de admitir que o
amicus curiae recorra não só dessa decisão, mas de toda decisão cujo exame da questão pelo órgão ad quem
possa advir um precedente (2015, p. 99). Isso porque a formação do precedente no direito brasileiro não
está de modo nenhum vinculado a uma forma específica.

5B. Pedido: conceito e características. Interpretação dos pedidos. Cumulação de pedidos.

Paulo Henrique Cardozo 11/09/18


Fontes: MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo curso de processo civil: volume 2 - tutela dos direitos mediante
procedimento comum. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito
processual civil: volume único. 8. ed. São Paulo: JusPODIVM, 2016. Graal 28º CPR.

I. Pedido: conceito e características.

O pedido consiste naquilo que, em virtude da causa de pedir, postula-se ao órgão julgador. O autor
postula o emprego de uma técnica processual (pedido imediato) que permita a prestação da tutela do direito
(pedido mediato).
57
A importância do pedido é bitolar a pretensão jurisdicional, que não poderá ser citra/infra, ultra ou
extra petita, conforme o princípio da congruência; servir como elemento identificador da demanda, para
fins de verificação de ocorrência de conexão, litispendência ou coisa julgada; e ser parâmetro para fixação
do valor da causa. Expressa a doutrina o princípio da demanda através da ideia de que o pedido formulado
pela parte determina os limites da atuação jurisdicional, importando na razão da atuação do Estado e
também na fixação do objeto a ser decidido.

Quando se alude ao pedido imediato, pensa-se na espécie de sentença. Nesse sentido, fala-se em
pedido declaratório, constitutivo, condenatório, mandamental e executivo. O pedido declaratório é aquele
por meio do qual o autor pede a declaração da existência ou da inexistência de uma relação jurídica ou de
seus efeitos, ou ainda da autenticidade ou falsidade de um documento (art. 19). Todas as sentenças contêm
declaração, mas somente a declaratória contém apenas isso.

O pedido constitutivo consiste naquele em que se postula a criação, a extinção ou a modificação de


uma situação jurídica (ex.: anulação de um negócio jurídico).

É o pedido condenatório quando se pede ao juiz que condene o réu ao pagamento de certa quantia
(ex.: indenização). O juiz declara a responsabilidade, condena o réu ao pagamento de uma prestação,
exortando-o ao cumprimento, ao mesmo tempo em que abre as portas da execução para o autor aplicar a
sanção executiva. Do ponto de vista teórico, não há distinção entre a sentença condenatória que exige a
propositura de ação de execução e aquela que pode ser executada como simples fase posterior no próprio
processo. Trata-se de opção técnica ligada à política processual, tendo o CPC adotado a segunda via.

O pedido é mandamental quando o autor pede que o juiz ordene, sob pena de coerção indireta (ex.:
multa). O autor não quer apenas ter a possibilidade de requerer a execução, ele deseja que a sentença
pressione o réu a afazer ou não fazer algo (art. 497). O pedido mandamental está preordenado a que a
própria sentença contenha as técnicas processuais capazes de induzir o demandado ao cumprimento do que
é devido.

Por fim, o pedido executivo faz surgir a sentença executiva, que tem por objetivo corrigir as linhas
que separam as esferas jurídicas do autor e do réu pela atuação direta sobre o seu patrimônio e por meio de
técnicas processuais que independem de uma fase de cumprimento de sentença estruturada a partir da
técnica expropriatória. É apropriado para a tutela do direito à coisa (art. 498) e para a tutela destinada a
suprir a prestação da declaração de vontade (art. 501).

Além do pedido imediato, como dito, há o pedido mediato, que consiste no bem da vida pretendido
pelo autor. Ex.: a declaração da certeza jurídica; a criação de nova situação jurídica; o pagamento de quantia;
a abstenção da adoção de comportamentos poluidores; a coisa reivindicada. Portanto, na petição inicial o
autor precisa relacionar a técnica processual com a tutela do direito. O pedido imediato serve como meio
para a obtenção do pedido mediato.

O pedido deve ser certo (art. 322). Pedido certo é o pedido expresso, que não é implicitamente
formulado. Quando o CPC exige que o pedido seja certo, refere-se ao pedido mediato, ao bem da vida que se
pretende obter em juízo, o qual deve estar expresso e especificado na petição inicial. Admite-se, contudo,
que certas postulações encontram-se implícitas – pedidos implícitos –, como é o caso dos juros legais, da
correção monetária e das verbas de sucumbência. Ademais, na ação que tiver por objeto cumprimento de
obrigação em prestações sucessivas, essas serão consideradas incluídas no pedido (art. 323).

Além de certo, o pedido mediato deve ser determinado (art. 324), ou seja, o autor deve determinar
seu alcance na petição inicial. É lícito ao autor, no entanto, formular pedido genérico nas ações universais, se
não puder individuar os bens demandados; quando não for possível determinar, desde logo, as
consequências do ato ou do fato; e quando a determinação do objeto ou do valor da condenação depender
de ato que deva ser praticado pelo réu (art. 324, § 1.º). Ações universais são aquelas em que o bem da vida
postulado em juízo é uma universalidade (fática ou jurídica). Ademais, em muitas ações não é possível
58
estimar o valor dos danos experimentados, como nos casos em que se busca a reparação de danos morais
(embora os autores falem isso, o art. 292, V, exige que se coloque como valor da causa na ação indenizatória,
inclusive a fundada em dano moral, o valor pretendido). Exemplo de situação que depende de ato a ser
praticado pelo réu para se determinar o valor é a ação de exigir contas. Sendo o pedido indeterminado,
admite-se a sentença genérica, que deve ser liquidada antes de ser submetida a cumprimento. Embora a
interpretação doutrinária não fosse literal, o CPC/73 assim dispunha: “Art. 286. O pedido deve ser certo OU
determinado.” No CPC/15, acaba-se com o problema, pois há um artigo para cada característica.

Os pedidos podem ser divididos em fixos ou alternativos. O pedido é fixo quando o direito material
permite apenas um modo de realização da prestação, ao passo que pode ser alternativo quando, pela
natureza da obrigação, o devedor puder cumprir a prestação de mais de um modo (art. 325). O CPC, quando
alude à natureza da obrigação, faz referência às obrigações alternativas e às obrigações facultativas, isto é, às
obrigações com faculdade de substituição da prestação. Mais uma vez, está-se tratando, aqui, do pedido
mediato. No caso de pedido alternativo, o valor que deve ser atribuído à causa corresponde ao do pedido
com maior valor econômico (art. 292, VII).

O pedido alternativo não deve ser confundido com a cumulação alternativa de pedidos (art. 326). Na
cumulação, há ordem de preferência expressa pelo autor; no pedido alternativo, qualquer deles serve à
satisfação do demandante. A consequência prática é a inexistência, no último caso, de interesse recursal em
pedir especificamente a procedência de um dos pedidos alternativos.

II. Interpretação dos pedidos.

Havendo dúvida a respeito do alcance do pedido, deve o juiz interpretá-lo considerando o “conjunto
da postulação” e de acordo com o “princípio da boa-fé” (art. 322, § 2º), ou seja, sem “formalismo excessivo”
e considerando as declarações de vontade do autor que ressaem da petição inicial e, também, no restante
dos atos praticados no curso do processo. O CPC/15 não determina interpretação “restritiva” do pedido,
como fazia o CPC/73.

III. Cumulação de pedidos.

O autor pode cumular pedidos na petição inicial. Segundo Marinoni, Mitidiero e Arenhart, a
cumulação pode ser simples ou eventual. A cumulação simples é caracterizada pela autonomia entre os
pedidos (art. 327), enquanto a cumulação eventual é caracterizada pela dependência.

Na cumulação simples, a apreciação de um pedido é totalmente independente da apreciação de


outro, tanto que poderiam ser objeto de ações distintas, sendo possível a procedência simultânea de todos.
Trata-se de medida de economia processual. Aqui, o valor da causa corresponderá à soma dos pedidos
cumulados. A cumulação simples é admitida desde que os pedidos sejam compatíveis entre si, o juízo seja
absolutamente competente para conhecer de todos os pedidos e seja adequado para todos o mesmo
procedimento. Não é contrária ao CPC a admissão de cumulação de pedidos contra réus distintos. Pedidos
compatíveis são aqueles que não se excluem mutuamente. Se o juiz é relativamente incompetente, incidem
as normas de prevenção e conexão, não havendo óbice à cumulação. Se o juiz for absolutamente
competente para apenas um ou alguns, deve julgá-los e não conhecer daqueles para os quais não possui
competência.

É possível cumular pedido que siga o procedimento comum com pedido sujeito a procedimento
especial, desde que o demandante opte pela adoção do procedimento comum, sem prejuízo do emprego das
técnicas processuais diferenciadas que não forem incompatíveis com as disposições do procedimento
comum (art. 327, § 2º). A cumulação simples de pedidos deve ser, ainda, oportuna; se comprometer a defesa
do demandado ou a rápida solução do litígio, pode o juiz intimar o autor para escolher qual deve ser
analisado.

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Há cumulação sucessiva de pedidos quando o autor formula dois pedidos pretendendo o
acolhimento de ambos, sendo o acolhimento do primeiro pedido pressuposto lógico e essencial à análise do
sucessivo. O valor da causa obedecerá à soma de todos os pedidos cumulados.

Por fim, há cumulação eventual alternativa quando o autor formula pedido subsidiário, cuja
apreciação só ocorrerá na impossibilidade de acolhimento do pedido principal (art. 326, caput). Aqui, não há
necessidade de que os pedidos sejam compatíveis entre si. Se o juiz julga improcedente o pedido principal,
mas procedente o pedido subsidiário, há interesse recursal na reforma de decisão para provocar o
acolhimento do primeiro.

Além da cumulação alternativa com ordem prioritária, há a cumulação alternativa sem ordem
prioritária (art. 326, parágrafo único, segundo o qual “é lícito formular mais de um pedido, alternativamente,
para que o juiz acolha um deles”). Nesse caso, qualquer pedido que for acolhido satisfaz o demandante.
Havendo cumulação alternativa, o valor da causa corresponde ao valor do pedido principal.

De acordo com Daniel Assumpção, a cumulação pode ser própria (quando é possível a procedência
simultânea de todos os pedidos) ou imprópria (quando somente um puder ser concedido). A cumulação
própria pode ser simples – pedidos absolutamente independentes – ou sucessiva – quando a análise do
posterior depende da procedência do anterior. Já a cumulação imprópria pode ser subsidiária/eventual,
quando o segundo pedido somente será analisado se o primeiro não for concedido; ou alternativa, com a
reunião de pedidos com a intenção de que somente um deles seja acolhido, à escolha do juiz.

Em se tratando de classificação, ainda, a cumulação pode ser inicial (quando o processo já nasce com
vários pedidos formulados) ou ulterior (quando o processo passa a ter um novo pedido já em andamento).
Pode, ainda, quanto à quantidade de sujeitos que participa da cumulação, ser homogênea (quando os
pedidos são feitos por um único sujeito processual) ou heterogênea (quando os pedidos são feitos por
sujeitos diversos).

IV. Modificações da causa de pedir e do pedido.

Segundo o art. 329, linha, o art. 329 refere que o autor poderá, até a citação, aditar ou alterar o
pedido ou a causa de pedir, independentemente do consentimento do réu; e até o saneamento do processo,
aditar ou alterar o pedido e a causa de pedir, com o consentimento do réu, assegurado o contraditório
mediante a possibilidade de manifestação deste no prazo mínimo de quinze dias, facultado o requerimento
de prova suplementar. No CPC anterior, dizia-se que em nenhuma hipótese seria admitida modificação da
causa de pedir e do pedido depois do saneamento da causa. O CPC/15 não repetiu a vedação; versando a
causa sobre direitos disponíveis e sendo as partes capazes, nada obsta à modificação acordada (art. 190),
reabrindo-se os debates. Tal acordo não depende de análise judicial a respeito de sua utilidade.

O art. 329 fala em “aditar ou alterar” o pedido ou a causa de pedir, não sendo vedada a redução da
causa de pedir ou o pedido, a qual não se submete aos limites temporais da citação e do saneamento da
causa. O pedido pode ser reduzido em virtude de: (i) desistência da ação no tocante a uma parte do pedido
ou a um dos pedidos (quando houver cumulação de pedidos); (ii) renúncia a uma parte do direito postulado;
(iii) transação parcial na pendência do processo; (iv) convenção de arbitragem em relação a uma parte do
objeto do litígio e (v) recurso em relação a uma parte da sentença.

5C. Embargos de declaração. Técnica de extensão do colegiado em caso de divergência.

Daniel Medeiros Santos

I) Embargos de declaração

Enquanto a lógica dos demais recursos é a da reforma ou desconstituição dos julgados, a dos
embargos de declaração (EDcl) é a do seu aperfeiçoamento, em virtude de obscuridade, contradição,
omissão e, como novidade do NCPC, de erro material (art. 1022 do CPC). Com relação ao erro material, o art.

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494, I, do CPC permite que o juiz efetue a sua correção ex officio, ainda que não tenham sido interpostos
Edcl.
Malgrado haja vozes em contrário, majoritariamente se entende pela natureza jurídica recursal dos
Edcl.

I.1) Cabimento: Os Edcl são cabíveis contra qualquer decisão judicial, desde que coadunada essa ideia com o
previsto no art. 1001 do CPC, que obstaculiza a interposição de recursos contra despachos. Ocorre que há
sólida posição doutrinária que defende ser cabível a interposição de Edcl contra despachos, desde que haja
algum gravame gerado através deste pronunciamento jurisdicional. Neste sentido, Fredie Didier e Robson
Renault Godinho.

→ Ex: Autor pede tutela provisória de urgência antecipada na inicial e o juiz se omite acerca do tema,
somente expedindo o “cite-se”. Nesse caso, essa corrente entende que caberia a interposição de Edcl.

Nos casos em que ocorre a interposição de Edcl contra decisão monocrática de relator, entendem
deva ser recebido como se agravo interno fosse, à luz da fungibilidade e celeridade processual. Este
entendimento foi positivado no art. 1024, §3º, do CPC. Neste caso, deve haver a intimação do recorrente
para a complementação das razões recursais.
Ademais, é sólida a posição dos Tribunais Superiores (TS) no sentido de não cabimento dos Edcl
interpostos contra a decisão proferida pelo tribunal de 2º grau, por meio do seu presidente ou vice, que
denega o seguimento de RE/REsp, inclusive com a consequência de não haver nesse caso interrupção do
prazo para outros recursos. A única exceção, de acordo com este entendimento, é a de decisão tão genérica
que sequer permita a interposição do recurso de agravo.

I.1.1) Cabimento (vícios): Para Barbosa Moreira, esses vícios compõem de maneira distinta tanto o juízo de
admissibilidade como o de mérito, sendo no 1º caso demandado do julgador uma análise em abstrato do
vício, enquanto no 2º essa análise deverá ser feita em concreto. Significa dizer que a mera alegação do vício
pelo embargante já é suficiente para o seu cabimento, sendo a análise da existência concreta de tal vício
matéria de mérito.

- Obs: O CPC considera omissa a decisão que deixar de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de
casos repetitivos ou em IAC.

I.2) Juízo de admissibilidade: Nos Edcl, o juízo de admissibilidade é realizado pelo próprio magistrado que
proferiu a decisão, não sendo enviado a outro órgão judicial.

I.3) Preparo: Os Edcl dispensam preparo (art. 1023, in fine, do CPC). O outro recurso processual civil que
dispensa preparo é o agravo em RE/REsp (art. 1042, §2º, do CPC).

I.4) Tempestividade: O prazo dos Edcl é de 05 dias, em exceção aos 15 dias dos recursos cíveis em geral (art.
1003, §5º, c/c art. 1023, ambos do CPC). No processo eleitoral, o prazo é de 03 dias. No processo penal, de
02 dias.

I.5) Efeito interruptivo: Quando há interposição de Edcl, o prazo que fluía é interrompido, retomando, em
seguida, o seu curso do zero. Este efeito interrompe o prazo recursal para todos os sujeitos processuais.
Entendem os TS que os Edcl intempestivos não geram o efeito interruptivo.

I.6) Edcl usados para fins de prequestionamento: Sob a égide do CPC-73, o STJ entendia que, nos casos de
decisão de 2º grau que não se manifesta sobre matéria a ser prequestionada, deveria ser interposto REsp
contra tal decisão (por ofensa à lei federal que trata dos Edcl), caso em que o STJ instaria o juízo a quo a
tratar da matéria, que só então estaria prequestionada. O art. 1025 do CPC, todavia, trouxe o chamado
prequestionamento ficto, ou seja, ainda que os Edcl sejam rejeitados/inadmitidos, consideram-se incluídos
no acórdão os elementos que o embargante suscitou, desde que o tribunal superior considere existente erro,
omissão, obscuridade ou contradição. Não se confunde com o prequestionamento implícito, que ocorre nos

61
casos em que o juízo a quo trata da questão, mas não expõe o dispositivo legal em específico – nestes casos,
entendem os TS ter ocorrido legítimo prequestionamento.

I.7) Edcl protelatórios: No caso de Edcl protelatórios, haverá aplicação de multa de 2% sobre o valor
atualizado da causa. Na reiteração de Edcl protelatórios, a multa será elevada a até 10% sobre o valor
atualizado da causa, e a interposição de qualquer recurso ficará condicionada ao depósito prévio do valor
(exceção: Fazenda Pública, MP, beneficiário de justiça gratuita). Não serão admitidos novos Edcl se os dois
anteriores houverem sido considerados protelatórios (art. 1026, §§ 2º a 4º, do CPC).

I.8) Edcl com efeitos infringentes: Neste caso, do saneamento de contradição e omissão pode ocorrer a
modificação do conteúdo da decisão recorrida, como uma consequência lógica do enfrentamento de novas
questões no recurso (no caso de omissão) ou da escolha entre duas proposições inconciliáveis (no caso de
contradição). Em qualquer caso em que os embargos possam assumir caráter infringente – seja no
cumprimento de sua normal função, seja no seu emprego atípico –, antes de decidi-los o julgador deve ouvir
a parte contrária no prazo de cinco dias (art. 1.023, § 2.º). Embora o entendimento firme seja o do não
cabimento de Edcl puramente infringentes, se abre uma verdadeira exceção a esta regra nos casos
extremos em que uma decisão não é passível de nenhum outro recurso, senão EDcl, e padece de defeito
gravíssimo que não se caracteriza como omissão, contradição, obscuridade ou erro material. Embora haja
controvérsia, doutrina até os TS tendem a admitir a utilização dos EDcl em tais casos – com efeitos
infringentes atípicos.

I.9) Edcl e (des)necessidade de complementação de recurso anterior: Caso o acolhimento dos Edcl implique
modificação da decisão embargada, o embargado que já tiver interposto outro recurso terá o direito de
alterar ou complementar as suas razões, nos limites da modificação; caso os Edcl sejam rejeitados ou não
modifiquem a decisão embargada, o outro recurso seguirá independentemente de ratificação (art. 1024, §§
4º e 5º, do CPC).

II) Técnica de extensão do colegiado em caso de divergência

O NCPC retira o recurso de embargos infringentes do rol recursal (art. 994 do CPC). Em seu art. 942
cria uma inovadora técnica de julgamento com propósitos muito semelhantes aos do recurso de embargos
infringentes, mas com natureza de incidente processual, não de recurso.
De acordo com o caput do art. 942 do CPC, quando o resultado da apelação for nâo unânime, o
julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, que serão
convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a
possibilidade de inversão do resultado inicial. Neste caso, os julgadores que já tiverem votado poderão
rever seus votos por ocasião do prosseguimento do julgamento. Essa nova técnica será implementada ex
officio, sem qualquer iniciativa da parte.

O §3º do art. 942 amplia o cabimento dessa técnica para a ação rescisória, quando o resultado for a
rescisão da sentença; e para o agravo de instrumento, quando houver reforma da decisão que julgar
parcialmente o mérito.
O caput do art. 942 não repete a dicção do art. 530 do CPC-73, que condicionava o cabimento dos
embargos infringentes, em decisão de apelação, à reforma da sentença de mérito, o que torna possível uma
interpretação dilargada, que entende ser cabível a técnica de extensão a todo julgamento não unânime de
apelação (Wambier). Todavia, há posição contrária, entendendo que tal omissão fora na verdade
involuntária, de forma a ser cabível tal técnica de julgamento somente na apelação julgada por maioria de
votos que reforma a sentença de mérito (Medina).

O art. 942, §4º, do CPC dispõe não ser cabível a técnica de julgamento nos casos de IAC, de IRDR, de
remessa necessária e de decisões não unânimes proferidas, nos tribunais, pelo plenário ou pela corte
especial.

De acordo com o Enunciado 62 da 1ª Jornada de Direito Processual Civil, aplica-se a técnica do art.
942 no julgamento de recurso de apelação interposto em mandado de segurança.
62
6A. Petição inicial: função e conteúdo. Controle da admissibilidade da demanda.

Renan Lima

Obs.: nos casos em que, neste ponto, for utilizado o termo “CPC” desacompanhado de especificação, ou
mesmo quando for indicado um dispositivo legal sem indicação do diploma correspondente, trata-se de
referência ao CPC de 2015.

PROPOSITURA DA AÇÃO E FORMAÇÃO DO PROCESSO: Conforme o magistério de Marinoni, Arenhart e


Mitidiero, “a propositura da ação dá início ao processo”. Além disso, de acordo com os referidos autores,
“com a propositura da ação considera-se formado o processo”.
No processo civil brasileiro, considera-se proposta a ação “quando a petição inicial é protocolada em juízo
(art. 312 do CPC)”. Essa definição é importante, uma vez que o exercício concreto do direito de ação gera
várias consequências, como: litispendência, interrupção da prescrição (art. 240 do CPC), prevenção do juízo
(art. 59 do CPC) e o marco para perpetuação da competência (art. 43 do CPC).

PETIÇÃO INICIAL: Para Marinoni, Arenhart e Mitidiero, a petição inicial “é o instrumento pelo qual o autor
propõe a ação”. Por sua vez, Fredie Didier Jr sustenta que “a petição inicial é a forma da demanda, o seu
instrumento”.
Em outras palavras, a peça inicial constitui a formalização da demanda do autor, individualizando seus três
elementos, que são: partes, pedido de causa de pedir. A demanda, por sua vez, “é o conteúdo da petição
inicial”.
Nas palavras de Fredie Didier Jr., a relação entre petição inicial e demanda “é a mesma que se estabelece
entre a forma e o seu conteúdo”.

FUNÇÃO E CONTEÚDO DA PETIÇÃO INICIAL: Barbosa Moreira e Dinamarco diferenciam ação e demanda.
Com efeito, a ação é um direito e a demanda é o ato de exercício desse direito. Seguindo esse raciocínio,
tem-se que a petição inicial é o instrumento (forma) da demanda. A demanda, por sua vez, é o conteúdo da
petição inicial.
Conforme o magistério de Fredie Didier Jr., a demanda tem a função de bitolar (demarcar) a atividade
jurisdicional, definindo os limites do que será decidido em sede de sentença. Além disso, a propositura da
peça inicial fixa a competência, evita a ocorrência de prescrição/decadência (embora dependa de citação
válida) e também serve para aferir eventual litispendência ou coisa julgada.

REQUISITOS DA PETIÇÃO INICIAL: A petição inicial deve observar alguns requisitos previstos nos arts. 319 e
320 do CPC. Cumpre analisá-los:

a) forma: Em regra, a petição inicial deve vir em forma escrita, estar datada e ser assinada. Há casos, porém,
em que se admite a postulação oral, a qual será reduzida a termo.
Casos excepcionais que admitem a postulação oral:
- nos Juizados Especiais Cíveis (art. 14 da Lei nº 9.099/95);
- pedido de concessão de medida protetiva de urgência em favor da mulher vítima de violência doméstica ou
familiar (art. 12 da Lei nº 11.340/2006);
- procedimento especial da ação de alimentos (art. 3º, §1º, da Lei nº 5.478/68).

b) assinatura por quem detenha capacidade postulatória: A inicial deve ser assinada por quem detém
capacidade postulatória. Assim, em geral, a lei exige que a peça seja assinada por advogado (público ou
privado), por Defensor Público ou por membro do MP.
Excepcionalmente, a lei possibilita que o ato postulatório seja realizado por leigo. Parcela da doutrina afirma
que, em tais hipóteses, a capacidade postulatória é dispensada. Todavia, Fredie Didier Jr. discorda,
sustentando que, nesses casos, a lei atribui diretamente a capacidade postulatória aos leigos, que poderão
assinar a peça exordial, sem necessidade de representação por advogado ou por Defensor Público.
Exemplos: ação de alimentos (art. 2º da Lei nº 5.478/68), habeas corpus, pedido de concessão de medida
protetiva de urgência em favor da mulher vítima de violência doméstica ou familiar (art. 27 da Lei nº
63
11.340/2006) e causas que tramitam, em primeiro grau, nos Juizados Especiais Cíveis e que não excedam o
valor de 20 (vinte) salários mínimos.

c) endereçamento: a peça inicial deve ser endereçada ao órgão jurisdicional competente (a petição inicial
indicará “o juízo a que é dirigida” – art. 319, inciso I, do CPC). Sendo assim, deve-se atentar para as regras de
competência de modo a evitar erro no endereçamento.

d) qualificação das partes: A exordial deve conter os nomes, os prenomes, o estado civil, a existência de
união estável, a profissão, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional da
Pessoa Jurídica, o endereço eletrônico, o domicílio e a residência do autor e do réu (art. 319, inciso II, do
CPC).
Caso o autor não disponha das informações essenciais para qualificação do réu, poderá requerer ao juiz, na
petição inicial, as diligências necessárias à sua obtenção (art. 319, §1º, do CPC).
Se a obtenção das informações tornar impossível ou excessivamente oneroso o acesso à justiça, a petição
inicial não deve ser indeferida (art. 319, §3º, CPC), sob pena de violação do direito fundamental de acesso ao
Poder Judiciário.
Além disso, dispõe o art. 319, §2º, do CPC que a petição inicial não será indeferida se, a despeito da falta de
alguma informação, for possível a citação do réu.
Destaque-se que a qualificação é fundamental para evitar o processamento de pessoas incertas e também
para verificar se, no caso, incide alguma norma de observância obrigatória, como o litisconsórcio necessário
na hipótese de pessoa casada (art. 73, §1º, do CPC).
Se o autor for um nascituro, que não detém nome, deverá ser qualificado da seguinte forma: “nascituro de
fulana”. Assim, a qualificação será da mãe, ainda que não seja parte. A parte será o nascituro.
Quando a demanda é proposta em desfavor de uma multidão, é possível que o autor qualifique alguns réus e
informe ao juízo que a demanda está sendo proposta contra todos os demais ocupantes do imóvel, no csao
de uma ação possessória, por exemplo.

e) causa de pedir: De acordo com Marinoni, Arenhart e Mitidiero, consiste nas “razões fático-jurídicas que
justificam o pedido”. Na mesma linha, Fredie Didier Jr afirma que a “causa de pedir é o fato ou o conjunto de
fatos jurídicos (fato da vida juridicizado pela incidência da hipótese normativa) e a relação jurídica, efeito
daquele fato jurídico, trazidos pelo demandante como fundamento do seu pedido”.
Em outras palavras, a causa de pedir é a soma do fato jurídico e do fundamento jurídico do pedido.
Conforme Fredie Didier, o nosso CPC adotou a “chamada teoria da substancialização da causa de pedir, que
impõe ao demandante o ônus de indicar, na petição inicial, qual o fato jurídico e qual a relação dele
decorrente que dão suporte ao seu pedido”.
Segundo a doutrina majoritária, a causa de pedir divide-se em: i) causa de pedir remota: que é o fato, o
acontecimento da vida; e ii) causa de pedir próxima: que é o fundamento jurídico, ou seja, é o direito
afirmado em juízo.
Sustenta Fredie Didier que o “magistrado está limitado, na sua decisão, aos fatos jurídicos alegados e ao
pedido formulado – não o está, porém, ao dispositivo legal invocado pelo demandante. O juiz pode decidir
com base em norma legal distinta, preservados o direito afirmado e o pedido formulado”.

f) pedidos: ver resumo do ponto 5.b.

g) especificação de provas: Já na petição inicial, o autor deve indicar os meios de prova que pretende
produzir para comprovar suas alegações (art. 319, inciso VI, do CPC).
Vale relembrar, também, que na fase de saneamento, o juiz deverá delimitar as questões de fato sobre as
quais recairá a atividade probatória, especificando os meios de prova admitidos (art. 357, inciso II, do CPC).
Ademais, o órgão julgador pode determinar, de ofício, a produção de provas, nos termos do art. 370 do CPC:

“Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas


necessárias ao julgamento do mérito.
Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou
meramente protelatórias”.

64
h) valor da causa: A petição inicial conterá o valor da causa (art. 319, inciso V, do CPC). O valor da causa
serve para diversas finalidades, como calcular as custas processuais, os honorários advocatícios, eventuais
multas processuais, bem como definir competência e o procedimento (exemplos: causas de competência do
Juizado Especial).
Há duas espécies de valor da causa: 1) Valor da causa por determinação legal: é o valor da causa cujo
critério de definição é definido pela lei. São os casos do art. 292, do NCPC. Destaque-se que o NCPC, no inciso
V, do art. 292, passa a exigir que nas ações indenizatórias por dano moral haja a especificação do valor que
se postula.
Para atribuição do valor da causa, devem ser observadas as regras dos arts. 291 a 293 do CPC:

Art. 291. A toda causa será atribuído valor certo, ainda que não tenha conteúdo econômico
imediatamente aferível.

Art. 292. O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será:


I - na ação de cobrança de dívida, a soma monetariamente corrigida do principal, dos juros de
mora vencidos e de outras penalidades, se houver, até a data de propositura da ação;
II - na ação que tiver por objeto a existência, a validade, o cumprimento, a modificação, a
resolução, a resilição ou a rescisão de ato jurídico, o valor do ato ou o de sua parte
controvertida;
III - na ação de alimentos, a soma de 12 (doze) prestações mensais pedidas pelo autor;
IV - na ação de divisão, de demarcação e de reivindicação, o valor de avaliação da área ou do
bem objeto do pedido;
V - na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral, o valor pretendido;
VI - na ação em que há cumulação de pedidos, a quantia correspondente à soma dos valores de
todos eles;
VII - na ação em que os pedidos são alternativos, o de maior valor;
VIII - na ação em que houver pedido subsidiário, o valor do pedido principal.
§ 1º Quando se pedirem prestações vencidas e vincendas, considerar-se-á o valor de umas e
outras.
§ 2º O valor das prestações vincendas será igual a uma prestação anual, se a obrigação for por
tempo indeterminado ou por tempo superior a 1 (um) ano, e, se por tempo inferior, será igual à
soma das prestações.
§ 3º O juiz corrigirá, de ofício e por arbitramento, o valor da causa quando verificar que não
corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido pelo
autor, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes.

Art. 293. O réu poderá impugnar, em preliminar da contestação, o valor atribuído à causa pelo
autor, sob pena de preclusão, e o juiz decidirá a respeito, impondo, se for o caso, a
complementação das custas.

2) Valor da causa por arbitramento do autor: quando a causa não se encaixar em nenhuma das hipóteses do
art. 292, do NCPC, o valor da causa será arbitrado pelo próprio autor. Ex.: ação de guarda de filho. Nesses
casos, há uma dificuldade na delimitação valor da causa. O critério a ser aplicado é o da razoabilidade. O
controle poderá ser efetuado pelo magistrado, de ofício, ou por provocação do réu, através de impugnação
ao valor da causa. De acordo com a lógica do NCPC, a impugnação ao valor da causa deve ser formulada em
preliminar de contestação.

i) a opção do autor pela realização ou não de audiência de conciliação ou de mediação: o autor deve
manifestar sua opção ou não pela referida audiência (art. 319, inciso VII, do CPC).
Alguns autores sustentam que se o autor não mencionar sua opção, o juiz deveria determinar a emenda da
peça exordial. Todavia, de acordo com Fredie Didier Jr, se o autor não observar esse requisito, a petição não
deve ser indeferida e nem há necessidade de determinar a emenda, devendo o juiz considerar que o silêncio
indica vontade de seguir a regra, que é a realização da audiência.

65
A propósito, vale lembrar que apenas quando ambas as partes expressamente se manifestarem
contrariamente ou quando o direito em litígio não admitir autocomposição é que a audiência não será
realizada (art. 334, §4º, do CPC).

j) documentos indispensáveis à propositura da ação: A inicial deve vir acompanhada de documentos


indispensáveis à propositura da ação (art. 320 do CPC), que podem ser de duas espécies: i) aqueles que a
própria lei reputa indispensáveis à propositura da ação (exemplos: título executivo na execução, prova
escrita na ação monitória, planta do imóvel na ação de usucapião); ou ii) documentos referenciados na
petição inicial. Assim, se o autor fizer referência a um documento, ele tem de juntá-lo na inicial (o autor
torna indispensável ao mencioná-lo).
Pode ocorrer de o autor fazer referência a documento que esteja nas mãos de terceiro ou do réu, hipótese
em que deve pedir a exibição desse documento já na inicial.

REGISTRO E DISTRIBUIÇÃO DA PETIÇÃO INICIAL: O protocolo da petição inicial formaliza a demanda,


provocando a instauração do processo.

CONTROLE DE ADMISSIBILIDADE DA DEMANDA: Após o registro, os autos são conclusos ao juiz da causa. Em
seguida, cabe ao magistrado realizar o controle (juízo) de admissibilidade da demanda. Assim, se foram
observadas todas as condições da ação e todos os demais requisitos, o juiz determinará a citação do réu.
Por outro lado, se o juiz verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 do CPC,
ou que apresenta defeitos (irregularidades) capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o
autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser
corrigido ou completado (art. 321 do CPC – inspirado no princípio da cooperação).
Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial.

Emenda à petição inicial: significa retificar, corrigir a petição inicial. O NCPC prevê verdadeiro direito do
autor à emenda da inicial. Desse modo, se o defeito verificado é sanável, deve o juiz especificá-lo e
determinar ao autor que promova o necessário para correção do vício. Caso a decisão deixe de indicar qual o
vício sanável, são cabíveis embargos de declaração. Trata-se de regra em sintonia com o Princípio da
Cooperação. O prazo para a emenda é de 15 dias. Esse prazo pode ser prorrogado por ato fundamentado do
juiz.

Aditamento da petição inicial: significa o acréscimo de elemento. Divide-se em aditamento objetivo e


aditamento subjetivo.
Aditamento objetivo (art. 329, NCPC): consiste na troca ou acréscimo de pedido ou causa de pedir à petição
inicial.
O inciso I do art. 329 do CPC trata de direito potestativo do autor de alterar o pedido ou a causa de pedir,
independentemente de consentimento do réu, desde que o faça até a citação.
Depois da citação e até o saneamento do processo, o autor só poderá alterar o pedido ou a causa de pedir
mediante o consentimento do réu (no art. 329, inciso II, do CPC):

Art. 329, NCPC. O autor poderá:


I - até a citação, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, independentemente de
consentimento do réu;
II - até o saneamento do processo, aditar ou alterar o pedido e a causa de pedir, com
consentimento do réu, assegurado o contraditório mediante a possibilidade de manifestação
deste no prazo mínimo de 15 (quinze) dias, facultado o requerimento de prova suplementar.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto neste artigo à reconvenção e à respectiva causa de pedir.

OBS: Após a fase de saneamento pode haver acréscimo/aditamento ou alteração objetiva?


Para Fredie Didier sim, mediante negócio processual celebrado pelas partes. Ademais, o art. 493, do NCPC
expressamente diz que fato constitutivo superveniente deve ser levado em consideração. Nada mais é do
que nova causa de pedir. Não há, portanto, rigor preclusivo quanto à possibilidade de ajuste no objeto do
processo após o saneamento do feito, desde que de comum acordo entre as partes.

66
O aditamento subjetivo consiste na troca ou o acréscimo de réu. O tema da sucessão e substituição
processual é melhor estudado no resumo do ponto 4.a.

Indeferimento da petição inicial: Com o NCPC, houve alteração no conceito de indeferimento da petição
inicial. Até o seu advento, poderia haver decisão de indeferimento com ou sem exame do mérito.
Atualmente, porém, o indeferimento da exordial é sempre decisão sem exame do mérito, proferida
liminarmente, antes da citação do réu.
Observe, porém, que as causas que levam ao indeferimento podem ser reconhecidas pelo juiz após a defesa
do réu. Nessa hipótese, todavia, não haverá indeferimento da petição inicial, uma vez que não se estará mais
em fase de apreciação liminar. A rigor, ter-se-á o julgamento da demanda, sem resolução do mérito.
O indeferimento da petição inicial é regulado pelos arts. 330 e 331 do CPC.

Art. 330. A petição inicial será indeferida quando:


I - for inepta;
II - a parte for manifestamente ilegítima;
III - o autor carecer de interesse processual;
IV - não atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321.
§ 1º Considera-se inepta a petição inicial quando:
I - lhe faltar pedido ou causa de pedir;
II - o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido
genérico;
III - da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão;
IV - contiver pedidos incompatíveis entre si.
§ 2º Nas ações que tenham por objeto a revisão de obrigação decorrente de empréstimo, de
financiamento ou de alienação de bens, o autor terá de, sob pena de inépcia, discriminar na
petição inicial, dentre as obrigações contratuais, aquelas que pretende controverter, além de
quantificar o valor incontroverso do débito.
§ 3º Na hipótese do § 2º, o valor incontroverso deverá continuar a ser pago no tempo e modo
contratados.

Art. 331. Indeferida a petição inicial, o autor poderá apelar, facultado ao juiz, no prazo de 5
(cinco) dias, retratar-se.
§ 1º Se não houver retratação, o juiz mandará citar o réu para responder ao recurso.
§ 2º Sendo a sentença reformada pelo tribunal, o prazo para a contestação começará a correr da
intimação do retorno dos autos, observado o disposto no art. 334.
§ 3º Não interposta a apelação, o réu será intimado do trânsito em julgado da sentença.

Havendo indeferimento liminar da inicial, não deve haver condenação em honorários advocatícios, uma vez
que a parte contrária sequer chegou a integrar o feito ou a utilizar de serviços advocatícios.
O juiz pode indeferir total ou parcialmente a petição inicial. Em sendo parcial, caberá agravo de instrumento
da decisão, e não apelação, cabível tão somente quando ocorrer indeferimento total.
Apelando-se da decisão de indeferimento total da inicial, pode o juiz retratar-se no prazo de 5 dias. Caso
contrário, tão somente enviará o feito ao tribunal.

OBS: Não confundir indeferimento liminar da inicial com improcedência liminar do pedido.
Enquanto o indeferimento da inicial constitui decisão formal, sem análise do mérito da demanda, a
improcedência liminar do pedido consiste na prolação de sentença com exame do mérito, apta à formação
da coisa julgada material, em causas que dependam de prova exclusivamente documental, no qual é possível
a realização do juízo de improcedência do pedido antes mesmo do ingresso do réu no feito.
Tem previsão no art. 332 do CPC:

Art. 332. Nas causas que dispensem a fase instrutória, o juiz, independentemente da citação do
réu, julgará liminarmente improcedente o pedido que contrariar:
I - enunciado de súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça;
67
II - acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em
julgamento de recursos repetitivos;
III - entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção
de competência;
IV - enunciado de súmula de tribunal de justiça sobre direito local.
§ 1º O juiz também poderá julgar liminarmente improcedente o pedido se verificar, desde logo,
a ocorrência de decadência ou de prescrição.
§ 2º Não interposta a apelação, o réu será intimado do trânsito em julgado da sentença, nos
termos do art. 241.
§ 3º Interposta a apelação, o juiz poderá retratar-se em 5 (cinco) dias.
§ 4º Se houver retratação, o juiz determinará o prosseguimento do processo, com a citação do
réu, e, se não houver retratação, determinará a citação do réu para apresentar contrarrazões,
no prazo de 15 (quinze) dias.

Vale observar que o §1º traz o segundo tipo de julgamento liminar de improcedência, baseado em direito
decadente ou prescrito. A improcedência liminar significa que o réu sequer foi citado para integrar a
demanda. Não houve, portanto, alegação quanto à prescrição ou decadência, o que exige que o juízo se
pronuncie de ofício. Ocorre que o prazo decadencial instituído em negócio jurídico somente pode ser
conhecido via provocação do réu. Desse modo, a decadência apta a levar à improcedência liminar do pedido
é somente a decadência legal (determinada em lei).
Ademais, há quem interprete o §1º literalmente, de modo a afirmar que o juiz pode conhecer de ofício de
qualquer tipo de prescrição (de direitos disponíveis e indisponíveis).
Por outro lado, há doutrina sustentando que o juiz somente possa conhecer de oficio de prescrição de
direitos indisponíveis, uma vez que, em tais hipóteses, o réu não pode dispor da prescrição. De acordo com
Fredie Didier, é a interpretação mais razoável, pois diminui a possibilidade do juiz conhecer de ofício da
prescrição. No caso de prescrição disponível, cabe à parte interessada suscitá-la, uma vez que o réu poderia
dispor da prescrição. Cumpre relembrar, a propósito, que se uma dívida lícita, mesmo prescrita, for paga, não
haverá direito à restituição em razão da prescrição. Sendo assim, caberia ao réu alega-la e não ao magistrado
determina-la de ofício.

6B. Ação popular. Ação de consignação em pagamento. Ações possessórias. Ação de desapropriação

Renata Muniz

I. Ação Popular

Aspectos Gerais. Foi elevada a nível constitucional em 1934, retirada da CF de 1937, retornando em 1946 e
permanece até os dias atuais, prevista no art. 5º, LXXIII da CF/88. Regida pela Lei 4.717/65. Súm 101 STF – O
mandado de segurança não substitui a ação popular

Natureza jurídica. Trata-se de procedimento especial de legislação extravagante; garantia constitucional;


mecanismo constitucional de controle popular. A ação popular é um controle popular da administração
pública, ou seja, com a ação popular o cidadão participa do controle dos atos públicos. Ao lado do voto, da
iniciativa popular em projeto de lei, o plebiscito e o referendo, a AP, corrobora o art. 1º, parágrafo único, da
CF/88, constituindo importante instrumento da democracia direta e participação política (Ada Pellegrini
Grinover). Moreira Barbosa diz que o enfoque da AP é a tutela jurisdicional de interesses difusos.

Objeto. Presta-se à tutela (inibitória ou de remoção do ilícito) e/ou ressarcitória dos seguintes direitos
difusos: a) patrimônio público; b) moralidade administrativa; c) meio-ambiente; d) patrimônio histórico-
cultural. Esse rol de interesses difusos protegidos pela AP é um rol taxativo. (STJ, REsp 818725). Segundo o
STJ, não é exigível que haja lesividade em AP que visa à defesa da moralidade administrativa (STJ, REsp
1.130.754).O STJ entendeu que até seria possível a declaração de nulidade de contrato administrativo, mas
não se poderia condenar a empresa a ressarcir o erário se não houve comprovação real de lesão aos cofres
públicos (Info 557).

68
Cabimento. Em face de atos: a) administrativos: Exceção: não cabe AP contra atos administrativos de
natureza política (atos políticos). Os atos políticos não podem ser atacados por AP porque esses são
manifestações de soberania nacional e o cidadão não pode interferir; b) legislativos: regra geral é de que
NÃO cabe AP contra atos legislativos. Isso porque, como a lei é abstrata, ela não é capaz de causar prejuízo
por si só. Exceção: cabe AP contra lei de efeitos concretos; c) jurisdicionais: via de regra, NÃO cabe AP contra
atos jurisdicionais porque existem recursos para atacar esses atos. Exceção: o STJ recentemente estabeleceu
uma hipótese em que será cabível AP contra ato jurisdicional: sentença homologatória de acordo (STJ, REsp
906400 e REsp 884.742); d) particulares: a regra geral é de que NÃO cabe AP. Exceção: cabe AP contra atos
de particulares subvencionados pelo poder público, na proporção do dinheiro público investido.

Legitimidade ativa e passiva. 1) Legitimidade ativa: cidadão é quem goza da plenitude de seus direitos
políticos, podendo votar. Dessa forma, pode propor AP aquele que tiver mais de 16 anos e inscrição eleitoral
(STJ, REsp 889766). Caso de perda ou suspensão direitos políticos no curso do processo: aplica princípio da
máxima amplitude (excepcionalidade na qual MP poderá conduzir AP) – Art. 9º LAP. Obs.: Súm. 365/STF.
Formação de litisconsórcio ativo entre cidadãos: litisconsórcio facultativo unitário. Natureza da legitimação
ativa: prevalece o entendimento de que se trata de legitimação extraordinária, ou seja, o cidadão age em
substituição processual, porque o sujeito age em nome próprio defendendo direito alheio/difuso (José
Afonso da Silva e Hely Lopes Meirelles). STF/Recl 424. O autor só será condenado em custas, em caso de má-
fé/lide temerária (art. 13, LAP). STJ, REsp 1.225.103-MG; REsp 1.242.800-MS. 2) Legitimidade passiva:
(art. 6º da LAP) litisconsórcio necessário simples: a) pessoas jurídicas lesadas; b) todos os que participaram
da formação/execução do ato atacado; c) beneficiários diretos. 3) Litisconsórcio ulterior: art. 7º da LAP
- Qualquer pessoa, beneficiada ou responsável pelo ato impugnado, cuja existência ou identidade se torne
conhecida no curso do processo e antes de proferida a sentença final de primeira instância, deverá ser citada
para a integração do contraditório, restituído o prazo para contestação e produção de provas. 4)
Especial posição da pessoa jurídica lesada: (art. 6º, §3º, LAP) a pessoa jurídica de direito público ou
privado pode deixar de contestar a ação ou, até mesmo, mudar do polo passivo para o ativo.

Papel do Ministério Público na ação popular- O MP (art. 6º, §4º e art. 9º, LAP) atua no processo como fiscal
da lei; e tem legitimidade extraordinária subsidiária para a execução, se não for promovida pelo autor em 60
dias (art. 16). O MP promoverá, também, em ação autônoma, a responsabilidade civil ou criminal dos
responsáveis. Pode também assumir a titularidade da ação no caso do art. 9º.

Particularidades procedimentais: art. 7º da LAP.

A LAP deve ser inserida no contexto da jurisdição civil coletiva e observar os princípios e dispositivos do
Título III do CDC (Lei 8.078) + LACP. Fiorillo pugna, inclusive, por uma abertura do conceito de cidadão
constante da LAP, quando se tratar de defesa do meio-ambiente.

 Poder de requisição: o autor popular tem direito de requisitar documentos às entidades de natureza
pública ou privada (subvencionadas) para instruir a ação popular. Se as informações não foram
prestadas, o autor poderá ajuizar a AP com pedido para que o juiz requisite os documentos.
 Prazo de contestação: o prazo de resposta na AP é de 20 dias, prorrogáveis por mais 20 dias. Não se
aplicam os arts. 188 e 191 do CPC. Para os demais prazos aplicam-se as regras dos dispositivos
processuais.
Natureza jurídica da sentença (art. 11, LAP).

Diferentemente da ACP, a sentença da AP só pode ter natureza desconstitutiva (decretação da invalidade do


ato impugnado) e/ou condenatória (condenação ao pagamento de perdas e danos), porém há discussão na
doutrina sobre a possibilidade de sentença de caráter mandamental. Não há condenações civis, políticas,
administrativas ou criminais na ação popular. A sentença de improcedência ou carência de ação está sujeito
ao duplo grau obrigatório. O MP e qualquer cidadão terão legitimidade para recorrer da sentença proferida
“contra o autor” (art. 19, § 2º ). Críticas doutrinárias: tutela do meio ambiente fica fragilizada sem a tutela

69
mandamental (preventiva). Observação: Não cabe AP, para reparação do dano já consumado; hipótese em
que caberá ACP (Fiorillo, 1996).

Coisa julgada conforme eventum probationis ou secundum eventum litis: se o pedido for julgado
improcedente, por falta de provas, qualquer cidadão poderá ajuizar nova ação, com idêntico fundamento,
valendo-se de novas provas (art. 18). Se procedente ou improcedente por ser infundada terá eficácia erga
omnes.

Regra geral de competência: é do juízo de primeiro grau, dependendo da origem do ato ou omissão a serem
impugnados. Para exemplificar, se o patrimônio lesado for da União, competente será a Justiça Federal, e
assim por diante. Segundo o STF “a competência para julgar ação popular contra ato de qualquer autoridade,
até mesmo o Presidente da República, é, regra geral, do juízo competente de primeiro grau (...) julgado o
feito em primeira instância, se ficar configurado o impedimento de mais da metade dos desembargadores
para apreciar o recurso voluntário ou a remessa obrigatória, ocorrerá a competência do STF, com base na
letra ‘n’ do inciso I, segunda parte, do artigo 102 da CF/88.”(AO 859-QO, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de
01.08.2003). Assim, pode ser que, fugindo à regra geral da competência do juízo de primeiro grau,
caracterize-se a competência originária do STF para o julgamento da ação popular, como na hipóteses das
alíneas “f” (Rcl 3.813/RR, Rel. Min. Carlos Britto, j. 28.06.2006, informativo 433 do STF, julgamento de AP
relativa à terra indigna Raposa do Sol) e “n”(conferir indicação no informativo 443 do STF) do art. 102, I, da
CF/88.

Reexame necessário invertido - O art. 19 da LAP dispõe que o reexame necessário, na ação popular, não é a
favor do Poder Público, mas sim do interesse coletivo. Assim, fica sujeita ao reexame a sentença que implicar
na carência de ação ou improcedência. “Não se admite o cabimento da remessa necessária, tal como
prevista no art. 19 da Lei nº 4.717/65, nas ações coletivas que versem sobre direitos individuais
homogêneos”. Ex: ação proposta pelo MP tutelando direitos individuais homogêneos de consumidores. STJ.
3ª Turma.REsp 1374232-ES, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 26/09/2017 (Info 612).

Prescrição - Dispõe o art. 21 da LAP que “a ação prevista nesta lei prescreve em 5 anos”.

II. Ação de Consignação em Pagamento 6

Art. 539 e ss., CPC/15

É ação que visa à liberação do devedor de determinada obrigação. O objetivo do demandante é a obtenção
de declaração judicial no sentido de que o depósito realizado satisfaz os requisitos legais do pagamento
devido.

Cognição na Ação de Consignação em Pagamento: toda e qualquer discussão que diga respeito ao objetivo
de liberação do devedor é própria à ação de consignação em pagamento. É possível discutir na ação de
consignação em pagamento a origem, a natureza e o valor do débito que se pretende consignar.

Objeto da Prestação. Via de regra, é a prestação em dinheiro. É possível também que se consignem coisas
imóveis e coisa móveis, além de coisas imateriais – determinado documento que serve de suporte para
modelo de invenção, por exemplo. Admite-se, ainda, a consignação condicional - cuja coisa deve ser
entregue ao credor tão somente se e quando esse contraprestar. Apenas o fazer e o não fazer não são
consignáveis.

6
Comentários retitados do Novo Código de Processo Civil comentado. Luiz Guilherme Marinoni. Sérgio Cruz Arenhart. Daniel Mitidiero. 2017.

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Legitimidade – a)Ativa. Devedor e o terceiro juridicamente interessado (art. 304, CC). O terceiro
juridicamente desinteressado tem legitimidade extraordinária, se pagar em nome e à conta do devedor (art.
304, CC). b) Passiva. É do credor. Se há gestão de negócios de terceiro pelo devedor, o gestor legitima-se a
figurar passivamente na ação de consignação em pagamento. Se o fundamento da ação de consignação em
pagamento está na dúvida de quem deva legitimamente receber (art. 335, IV e V, CC), então tem o
demandante de promover a citação de todos os possíveis credores, todos que pretendem pagamento (art.
547, CPC).

Momento para Consignação. É possível consignar a partir do momento em que vencida a obrigação até o
momento em que o objeto da prestação se torne inútil para o credor (art. 395, parágrafo único, CC).

Depósito Bancário (extrajudicial). No caso de obrigação em dinheiro, pode o devedor ou terceiro preferir
efetuar o depósito extrajudicialmente, em momento anterior à propositura da ação de consignação em
pagamento. Trata-se de uma faculdade do devedor.

Competência - A competência é fixada a partir do critério territorial, que é definida pelo local do pagamento.
Por se tratar de competência relativa, é possível a definição de foro de eleição diverso para propositura da
ação de consignação em pagamento.

Prestações periódicas - É possível o depósito de prestações periódicas no mesmo processo desde que digam
respeito ao mesmo título obrigacional. Se os fatos e os fundamentos são outros, outra ação consignatória
deve ser movida. As prestações periódicas podem ser depositadas até o trânsito em julgado.

Petição inicial: Art. 542. Na petição inicial, o autor requererá: I - o depósito da quantia ou da coisa devida, a
ser efetivado no prazo de 5 dias contados do deferimento, ressalvada a hipótese do art. 539, § 3o; II - a
citação do réu para levantar o depósito ou oferecer contestação. Parágrafo único. Não realizado o depósito
no prazo do inciso I, o processo será extinto sem resolução do mérito. OBS: Tendo o credor recusado
extrajudicialmente o depósito efetuado está o demandante desonerado de realizá-lo em juízo com a petição
inicial.

Direito de escolha - Art. 543. Se o objeto da prestação for coisa indeterminada e a escolha couber ao credor,
será este citado para exercer o direito dentro de 5 dias, se outro prazo não constar de lei ou do contrato, ou
para aceitar que o devedor a faça, devendo o juiz, ao despachar a petição inicial, fixar lugar, dia e hora em
que se fará a entrega, sob pena de depósito.

Contestação (art. 544) - O demandado só pode alegar em contestação as seguintes matérias: I – que não
houve recusa ou mora em receber a quantia ou a coisa devida; II – que foi justa a recusa; III - que o depósito
não se efetuou no prazo ou no lugar do pagamento; IV – que o depósito não é integral.

Depósito judicial insuficiente. Concluiu-se que "a insuficiência do depósito não conduz à improcedência do
pedido, mas sim à extinção parcial da obrigação, até o montante da importância consignada. Na hipótese de
procedência parcial dos pedidos os ônus de sucumbência deve ser suportados por ambas as partes" (STJ, 4.ª
Turma.AgR~ no AREsp 735.436/DF,rel.Mm. Lms Felipe Salomão,j.17.09.2015,Dje 25.09.2015).

Despesas Processuais. Havendo julgamento de procedência ou reconhecimento jurídico do pedido, tem o


réu de arcar com as despesas processuais - custas e honorários advocatícios.

Dúvida sobre quem deva receber. Fundando-se a ação de consignação em dúvida sobre quem deva
legitimamente receber ou na existência de litígio sobre o objeto do pagamento, pode o devedor propor ação
de consignação contra todos que pretendam o objeto do pagamento (art. 547, CPC). A consignação exonera-
o para todos os fins de direito (arts. 548, CPC, art. 344, CC). No caso de dúvida, o procedimento é cindido em
duas fases subsequentes: na primeira, o juiz analisa a adequação, suficiência e pertinência do depósito e, se
for o caso, extingue a obrigação do autor, e na segunda, decide o destino a ser dado à quantia depositada.
Não comparecendo nenhum pretendente, converter-se-á o depósito em arrecadação de coisas vagas (art.
546, CPC). Comparecendo apenas um, o juiz decidirá de plano. Comparecendo mais de um, o processo

71
seguirá o procedimento comum entre os credores a fim de apurar quem tem direito à coisa depositada (art.
548, CPC). A sentença que deferir o depósito a um dos litigantes tem de responsabilizar os demais pelos
encargos inerentes à sucumbência relativos à primeira e à segunda fase.

Resgate do Aforamento – aplica-se procedimento da ação de consignação ao resgate do aforamento, no


que couber (art.549). "É resgatável a enfiteuse instituída anteriormente à vigência do Código Civil [de 1916]"
(Súmula 170, STF).

III. Ações Possessórias

Defesa da posse x Defesa da propriedade

A defesa da propriedade é realizada por aquilo que chamamos de ius possiendi, que significa direito de
possuir, cujo fundamento é o domínio. Toda vez que uma ação tiver fundamento (causa de pedir) no
domínio, esta ação será petitória. Vejamos uma lista das ações petitórias:

Ação ex empto: Tem por objeto o pedido da parte faltante da coisa, na venda ad mensuram. Essa parte
faltante foi comprada (propriedade), mas não passada; Ação confessória: Objetiva o reconhecimento de uma
servidão, sendo proposta pelo proprietário do prédio dominante; Ação demarcatória: É utilizada pelo
proprietário, que objetiva aviventar marcas, confrontações; Ação demolitória: Tem por objetivo destruir algo
que viola o direito de vizinhança ou posturas municipais; Ação de imissão de posse: É a ação do proprietário
que nunca teve a posse, a fim de obtê-la. Ação reivindicatória: É a ação do proprietário (que tinha a posse e
perdeu), para o reconhecimento da propriedade e restituição da coisa; Ação publiciana: É a ação de
usucapião de quem já não tem mais a posse e pretende recuperá-la. Tem fundamento a propriedade
adquirida por usucapião, mas não declarada em sentença;

A defesa da posse pode ser feita de duas maneiras distintas: autotutela (art. 1.210, §1º, CC) e ações
possessórias. Ações possessórias ou interditos possessórios são as ações que tutelam o ius possessionis, que
significa o direito de preservar a situação fática, com a retomada dos poderes de fato sobre a coisa. Nestas
ações, tanto o pedido quanto a causa de pedir são a posse. No Brasil, só existem três ações possessórias: a)
reintegração de posse - toda vez que houver esbulho (privação); b) manutenção de posse - toda vez que
houver turbação (incômodo), c) interdito proibitório - toda vez que houver ameaça (fato ainda não
consumado).

Fungibilidade entre as ações possessórias (art. 554 do CPC): nas ações possessórias, como a mudança da
situação fática é repentina e há dificuldade na definição dos três conceitos (esbulho, turbação e ameaça), o
CPC permite que o juiz conceda uma medida no lugar da outra, havendo fungibilidade. Não existe
fungibilidade entre possessórias e petitórias.

As ações possessórias são exemplos de ação dúplice? Em realidade, o art. 556 do CPC cria um pedido
contraposto (que o réu pode fazer na própria contestação) visando a sua proteção possessória e, ainda,
eventual indenização por perdas e danos. Mas ATENÇÃO: é necessário que o réu formule esse pedido para
que tenha proteção jurisdicional. Araken de Assis, Ovídio Batista e Daniel Assumpção, contudo, entendem
que a ação possessória não é dúplice, já que nela a obtenção do bem da vida pelo réu independe de pedido
nesse sentido. Em razão dessa celeuma, alguns autores, como Alexandre Câmara e Fredie Didier criaram a
seguinte distinção: Ação dúplice material – é a ação dúplice genuína, em que o réu não precisa fazer pedido
para obter o bem da vida em razão da improcedência da ação formulada pelo autor. Ex: ações declaratórias,
ação de prestação de contas. Ação dúplice processual – é a ação que admite o pedido contraposto, na
própria contestação. Ex: ação possessória.

Objeto das ações possessórias de um modo geral - bens materiais (bem imóvel, móvel e semoventes). Os
bens imateriais não são tuteláveis por ações possessórias. STJ, Súmula 228,: “é inadmissível interdito
72
proibitório para a proteção do direito autoral”. Súmula 415/STF: “servidão de trânsito não titulada, mas
tornada permanente, sobretudo pela natureza das obras realizadas, considera-se aparente, conferindo
direito à proteção possessória”.

Petição inicial da ação possessória: Segundo o art. 561, incumbe ao autor provar: I - a sua posse; Il - a
turbação ou o esbulho praticado pelo réu; III - a data da turbação ou do esbulho; IV - a continuação da
posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse, na ação de reintegração. A notificação
prévia dos ocupantes não é documento essencial à propositura da ação possessória. STJ. 4ª Turma. REsp
1263164-DF, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 22/11/2016 (Info 594).

Legitimidade ativa - possuidores direto e indireto (proprietário não possuidor). Podem, inclusive, formar
litisconsórcio (facultativo). O possuidor indireto pode ajuizar ação possessória contra qualquer pessoa,
menos o possuidor direto. Nesse sentido, cf. art. 557 do CPC, que trata da exceção de domínio. O co-
possuidor poderá ajuizar ação possessória contra terceiros (art. 1.314 do CC) ou para assegurar a posse “pro-
diviso”. O possuidor de má-fé pode ajuizar ação possessória contra terceiros invasores, nunca contra o
possuidor que foi turbado ou esbulhado. O mero detentor não tem legitimidade para ajuizar a ação.

Legitimidade passiva - Será réu na ação possessória o sujeito responsável pelo ato de violação ou ameaça à
posse. Obs.1: merece atenção a hipótese do art. 554, §1º, que trata da situação em que há uma coletividade
ré. Muitas vezes, é impossível identificar essa coletividade, ficando a ação ajuizada contra “réus incertos.
Obs.2: nos casos de ação possessória contra pessoa casada, não há litisconsórcio necessário entre os
cônjuges. Há apenas duas hipótese em que haverá litisconsórcio necessário: composse e atos de
violação/ameaça praticados por ambos. (art. 72, §2º, CPC). Obs.3: Pergunta-se: o Poder Público pode ser réu
em ração possessória? SIM. Neste caso, 3 são as medidas cabíveis contra o Poder Público: Ação possessória;
Mandado de segurança e Ação de desapropriação indireta ou ação de indenização por apossamento
administrativo. Pergunta-se: é possível o manejo de interditos possessórios em litígio entre particulares
sobre bem público dominical? Para o STJ, sim (REsp 1.296.964-DF, DJ 18.10.2016). No caso, foi feita uma
importante diferenciação: i) casos em que o particular invade imóvel público e almeja proteção possessória
ou indenização/retenção em face do ente estatal (incabível); e ii) as contendas possessórias entre
particulares no tocante a imóvel situado em terras públicas (cabíveis). Segundo o STJ, "particulares podem
ajuizar ação possessória para resguardar o livre exercício do uso de via municipal (bem público de uso
comum do povo) instituída como servidão de passagem" (REsp 1.582.176-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi,
julgado em 20/9/2016, DJe 30/9/2016). “Em ação possessória entre particulares é cabível o oferecimento de
oposição pelo ente público, alegando-se incidentalmente o domínio de bem imóvel como meio de
demonstração da posse”. STJ. Corte Especial. EREsp 1134446-MT, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em
21/03/2018 (Info 623).

Proibição da exceção de domínio – é a propria autonomia do conceito de posse diante da propriedade que
exige a limitação da cognição: Art. 557. Na pendência de ação possessória é vedado, tanto ao autor quanto
ao réu, propor ação de reconhecimento do domínio, exceto se a pretensão for deduzida em face de terceira
pessoa. Parágrafo único. Não obsta à manutenção ou à reintegração de posse a alegação de propriedade ou
de outro direito sobre a coisa.

Posse nova e posse velha - Se a ação for de força nova (vício aconteceu há menos de ano e dia), será
processada pelo procedimento especial. A vantagem é que, no procedimento especial, o autor tem direito a
uma liminar antecipatória de tutela com base na evidência, independentemente da existência de perigo (art.
562). Se a ação for de força velha, será processada pelo rito comum ou pelo rito sumariíssimo dos Juizados
Especiais Cíveis.

Cumulação de pedidos na petição inicial - O art. 555 traz hipóteses de cumulação que não prejudicam o rito
especial. Assim, é possível cumular o pedido de proteção possessória com os pedidos de perdas e danos,

73
indenização dos frutos e medida executiva para evitar nova turbação/esbulho ou para cumprir a tutela
provisória ou final.

Defesa do réu – contestação em 15 dias, que devem ser contados da audiência de justificação prévia, se esta
vier a ocorrer. Cabe reconvenção, nos casos em que não cabe pedido contraposto. Usucapião como matéria
de defesa - o fundamento da aquisição da propriedade via usucapião é a posse. Justamente por isso, a
jurisprudência afasta a incidência do art. 557 do CPC para, nos termos da Súmula 237 do STF, entender que
“o usucapião pode ser arguido em defesa”. Neste caso, a exceção da usucapião serve para reconhecer a
posse, mas não para fins de reconhecimento da propriedade na sentença. Essa é a regra. Exceção prevista no
art. 7º da Lei 6.969/81 e no art. 13 da Lei 10.257/01 (Estatuto da Cidade): quando a usucapião alegada em
defesa for especial rural ou urbana (individual ou coletiva), a sentença que a reconheceu vale como título
para registro no cartório de registro de imóveis.

Regra especial nos litígios coletivos imobiliários - O art. 565 do NCPC traça elementos especializados para os
litígios coletivos imobiliários, com audiência de mediação obrigatória, no caso de: a) posse velha ou sempre
que, b) concedida a liminar, ela não for executada no prazo de um ano.

IV. Ação de Desapropriação

Conceito: A desapropriação tem fundamento constitucional no art. 5o, XXIV, segundo o qual “a lei
estabelecerá procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública ou por interesse social,
mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição”.

Legislação específica: DL 3365/41 (Lei Geral de Desapropriações), Lei 4132/62 (desapropriação por interesse
social), Lei 4593/64 (desapropriação para obras de combate às secas no Nordeste), LC 76/93 (desapropriação
para fins de reforma agrária).

Prazo decadencial: Emitida a declaração expropriatória, tomando as providências para avaliar o bem,
podendo, nos termos do art. 10 do DL n. 3365/41, efetivar desapropriação mediante acordo
(“desapropriação amigável”), que, se recusado ou inviável (caso de proprietário ausente, litígio dominial
etc.), demandará o ajuizamento da ação expropriatória. O ente público dispõe do prazo de 5 anos para fazer
acordo ou propor a demanda judicial, a contar da edição do decreto expropriatório, no caso de necessidade
ou utilidade pública.

Juízo competente: em regra, é o da situação do bem. Sendo a União a autora, a competência é da Justiça
Federal e a ação será proposta no DF ou no foro da capital do estado onde for domiciliado o réu (art. 11 DL).

Petição inicial: além dos requisitos previstos no CPC, conterá a oferta do preço e será instruída com jornal
oficial que houver publicado a declaração expropriatória ou cópia autenticada da mesma, com termo de
contrato ou cópia da lei que deu competência para promover desapropriação (no caso de concessionárias ou
permissionárias), com planta ou descrição dos bens e suas confrontações (memorial descritivo).

Imissão Provisória – antecipação de tutela para que o ente público seja imitido na posse do imóvel. É cabível
quando o poder público alegue urgência (no decreto ou em ato posterior) depositando o valor (Art. 874
NCPC), bem assim observado o art. 15 p.1o., que estabelece parâmetros para o valor. Cumpridas essas
exigências, o expropriante tem direito subjetivo à imissão provisória. A alegação de urgência não poderá ser
renovada e obrigará o expropriante a requerer a imissão provisória dentro do prazo improrrogável de 120
dias, a qual será averbada no registro de imóveis (art. 15, §2º); excedido esse prazo, não será concedida a
imissão provisória.

74
Citação – é feita por mandado na pessoa do proprietário, dispensada a do seu cônjuge; no caso de sócios
basta citar um deles; na coisa em condomínio cita-se o administrador, salvo condomínio de apartamentos
onde cada unidade é autônoma para fim de desapropriação. Cabe inclusive citação por hora certa. A citação
por edital terá lugar se o proprietário encontra-se em local incerto e não sabido ou ainda se ignorado quem
seja o dono. DL, Art. 19. Feita a citação, a causa seguirá com o rito ordinário.

Contestação: só poderá versar sobre vício do processo judicial ou impugnação do preço; qualquer outra
questão deverá ser decidida em ação autônoma (art. 20). Cognição parcial e exauriente: Segundo o art. 9º
c/c art. 20, a ação de desapropriação é uma ação de cognição parcial, pois somente se discute o valor da
indenização, e de cognição exauriente, não havendo limitação quanto à produção de prova relacionada à
indenização. É inconstitucional essa limitação do conteúdo da defesa? De acordo com Luiz Guilherme
Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, NÃO, porque “tais situações ocorrem em benefício da celeridade do
processo, da simplicidade que se pretende emprestar ao procedimento e, por via reflexa, da busca de
adequada tutela jurisdicional para certos tipos de direitos. Precisamente por conta disso, e desde que essas
restrições não extrapolem os limites da razoabilidade, não se lhes há de impor a pecha da
inconstitucionalidade, já que tais providências são colocadas precisamente no conflito de princípios
fundamentais, com o objetivo de conformar uns com os outros. Em todos estes casos, porém, o que não se
pode admitir é a privação ao requerido de discutir aquele tema que lhe foi vedado; será, portanto, sempre
possível, diante de certas limitações ao exercício do direito de defesa, que o réu venha a propor alguma
demanda própria, em que, então, veiculará a matéria (ou a argüição) cuja discussão lhe foi negada no
processo”.

Revelia do expropriado – o fato de não haver contestação não leva à aceitação do valor oferecido pelo poder
público; isso porque a CF/88 exige que a indenização seja justa, e só o juiz poderá dizê-lo.

Desistência da desapropriação: o Poder Público pode desistir da desapropriação. O particular não pode se
opor à desistência (mas tem direito à indenização por prejuízos causados pelo expropriante). O STF vem
reconhecendo ao expropriante o direito de desistir de sua pretensão antes de findo o processo
expropriatório com o recebimento do preço. A desistência unilateral independe de consentimento do
expropriado. Algumas condições são exigidas: a) o bem a ser devolvido é o mesmo bem objeto da
expropriação; assim, tratando-se de bem edificado, será devolvido bem edificado; tratando-se de terreno
livre, não ocupado, será devolvido terreno livre, sem invasão ou ocupação; b) o expropriado tem direito de
receber do expropriante reparação dos danos sofridos desde a imissão deste na posse do bem até a
reintegração do expropriado na posse do bem; c) se o expropriado recebeu alguma importância, por
exemplo, por imissão provisória na posse, deverá devolvê-la, mediante cálculo atualizado; d) homologação
judicial.

Intervenção do Ministério Público – em doutrina, José dos Santos Carvalho Filho afirma que, se na
desapropriação para reforma agrária é expressa a exigência, não há razão para não se exigir nas demais, pois
“pelas mesmas razões se aplica a mesma regra”. No CPC/15 há referencia expressa da participação do MP
em litígios com interesse público ou social (art. 178). No entanto, o STJ já entendeu que, em regra, a ação de
desapropriação direta ou indireta não pressupõe automática intervenção do Parquet. (EREsp 506.226/DF DJe
5.6.2013).

Na sentença, o juiz fixará o valor do bem e demais parcelas incluídas na indenização, indicando as razões
motivadoras de seu convencimento. OBS.: apesar de não se vincular à prova, há casos em que o magistrado
não poderá dispensá-la, como o caso do laudo pericial em procedimento expropriatório (desapropriação).
(STJ. REsp 1.036.289-PA). valor da indenização de um imóvel, em caso de desapropriação, será o
contemporâneo à data da avaliação do perito judicial, não sendo relevante a data em que ocorreu a imissão
na posse, tampouco a data em que se deu a vistoria do expropriante (STJ, AgRg no REsp 1434078 / RN,
julgado em 06.10.2015).

75
Qual o valor devido a título de indenização? - Valor atual do bem expropriado +danos emergentes + lucros
cessantes + juros moratórios e compensatórios + atualização monetária + despesas judiciais + honorários
advocatícios.

Da sentença cabe apelação, com efeito devolutivo, se interposta pelo expropriado, e com efeitos devolutivo
e suspensivo, se interposta pelo expropriante. Há remessa necessária quando a sentença condenar a
Fazenda Pública em quantia superior ao dobro da oferecida (art. 28, § 1o, do DL n. 3.365/41). A sentença na
desapropriação autoriza a imissão definitiva na posse do bem em favor do expropriante, bem como
consubstancia título idôneo para a transcrição da propriedade no registro imobiliário (art. 29).

Ação de Desapropriação na LEI 4.132/62 - O art. 5º da Lei 4132/62 dispõe: “No que esta lei for omissa
aplicam-se as normas legais que regulam a desapropriação por utilidade pública, inclusive no tocante ao
processo e à justa indenização devida ao proprietário.” O prazo decadencial é diferente do da
desapropriação do Decreto-lei 3365/41. Veja: “Art. 3º O expropriante tem o prazo de 2 (dois) anos, a partir
da decretação da desapropriação por interesse social, para efetivar a aludida desapropriação e iniciar as
providências de aproveitamento do bem expropriado.”

Ação de Desapropriação Na LC 76/93 - Apenas a União pode desapropriar para fins de reforma agrária (art.
2o), havendo aqui a peculiaridade de que o pagamento não precisa ser em dinheiro, mas por meio de títulos
da dívida agrária. Decreto e vistoria – elaborado o decreto fixando o interesse social na desapropriação do
imóvel rural para fins de reforma agrária, fica o expropriante autorizado a promover vistoria no imóvel
visando a avaliá-lo. Entende-se que para a vistoria deve haver uma prévia notificação, sob pena de ofensa
aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.

Pequena e média propriedade rural – insuscetíveis de desapropriação para reforma agrária (art. 185 CF). Há
que se considerar ainda a questão da divisão do imóvel para fins de excluí-lo da reforma agrária.

6C. Recurso Extraordinário. Repercussão Geral.

André Rios Gomes Bica


I. Recurso extraordinário
1. Introdução e funções.
Recurso extraordinário (ou recurso excepcional, ou recurso de superposição) é gênero do qual são espécies o
recurso extraordinário (RE) para o STF e o recurso especial (REsp) para o STJ. O RE e REsp possuem regime
jurídico comum, com características semelhantes. Para evitar repetições, far-se-ão remissões ao ponto 8c,
que tratou do recurso especial.
Ao contrário dos recursos ordinários, o recurso extraordinário e o recurso especial não visam diretamente
tutelar os direitos da parte. Objetivam precipuamente a unidade do direito brasileiro tanto em. sua
dimensão retrospectiva (decidindo questão interpretativa controversa) como prospectiva (decidindo
questão nova, desenvolvendo o direito legislado).
O papel do recurso extraordinário é o de resguardar a interpretação dada pelo STF aos dispositivos
constitucionais, garantindo a inteireza do sistema jurídico constitucional federal e assegurando-lhe
validade e uniformidade de entendimento.
Marinoni/Arenhart:
O STF e o STJ como Cortes Supremas. A compreensão do recurso extraordinário e do recurso especial no
novo Código pressupõe a percepção de uma diferente função atribuída às Cortes Supremas no direito
brasileiro (art. 926, CPC), o que levou igualmente à outorga de uma eficácia diversa às suas decisões (art.
927, CPC). A possibilidade de desconsideração de vícios formais não graves (art. 1.029, § 3.º, CPC), a
existência de livre trânsito entre o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça para
admissibilidade recursal (arts. 1.032 e 1033, CPC), a concentração de julgamentos em bloco (recursos
repetitivos, arts. 1.036 a 1.041, CPC), assim como a eficácia de precedente que se projeta a partir das razões
de suas decisões (arts. 926 e 927, CPC) pressupõem a caracterização do Supremo Tribunal Federal e do
Superior Tribunal de Justiça como verdadeiras Cortes Supremas, isto é, como cortes de interpretação e de
precedentes – e não mais como simples cortes de controle e de jurisprudência.
2. Cabimento
76
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a
decisão recorrida:
a) contrariar dispositivo desta Constituição;
b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;
c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição.
d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal. (Incluída pela Emenda Constitucional nº 45, de
2004)
Para que caiba recurso extraordinário com base na letra “a” do inciso III do art. 102 da Constituição Federal,
é preciso que se alegue, como visto, contrariedade a dispositivo constitucional. A contrariedade, nesse caso,
deve ser direta e frontal, não cabendo recurso extraordinário, por ofensa indireta ou reflexa, quando há uma
lei federal de permeio, A necessidade de ofensa direta à Constituição foi expressamente consagrada no art.
1.033 do CPC,7 cuja redação foi inspirada na súmula 636 do STF, e que prevê a fungibilidade entre RE e Resp
em conjunto com o art. 1.032 (ver item 3.8 do Ponto 8c para maiores detalhes sobre a fungibilidade).
O STF entende que não cabe recurso extraordinário contra decisão proferida em processamento de
precatório (súmula, n. 733), porque se trata de decisão administrativa, e contra acórdão que defere medida
liminar (súmula, n. 735), porque não é decisão final, e sim provisória, decorrente de cognição sumária, não
sendo apta a instaurar o contencioso constitucional perante a Corte Suprema.
Cabe RE em face de acórdão proferido por Tribunal local que, em processo de controle concentrado,
reconhece a inconstitucionalidade de lei estadual em face de norma da Constituição do Estado, desde que
se trate de norma de reprodução obrigatória.
3. Características.
3.1 Recurso de fundamentação vinculada/efeito devolutivo horizontal restrito: os recursos ditos excepcionais
servem à impugnação da resolução de questões de direito, não se admitindo a interposição para reexame de
questões de prova ou de fatos (súmulas 279 STF e 07 STJ). No entanto, é admissível recurso por violação às
normas do direito probatório, que não se confunde com reanalisar as provas.
3.2 Não cabe RE/REsp para discutir mera interpretação de cláusula contratual (súm. 454 STF e súm. 5 STJ). O
mero reexame de provas ou de cláusula contratual não se confunde com a qualificação jurídica da prova ou
da cláusula contratual.
3.3 Exige-se o prévio esgotamento das instâncias ordinárias, sendo inadmissível a interposição de recurso
extraordinário (ou especial) per saltum (CRFB/88 102,III e súm. 281 STF e 207 STJ).
3.4 Possibilidade de interposição simultânea de RE e Resp como exceção ao princípio da unirrecorribilidade.
É possível que um mesmo capítulo do acórdão tenha por fundamento matéria constitucional e matéria legal.
Nesse caso, se qualquer desses fundamentos for suficiente para sustentar a decisão, hão de ser interpostos
recurso extraordinário contra a parte constitucional e recurso especial contra a parte infraconstitucional da
fundamentação. Se deixar de ser interposto um desses recursos, o outro que venha a ser intentado não será
admitido, por inutilidade, eis que ainda que vitorioso o recorrente, o recurso nada lhe aproveitaria, já que a
decisão permaneceria intacta com base no outro fundamento. A propósito, nesse sentido, o enunciado 126
da súmula do STJ: “É inadmissível recurso especial, quando o acórdão recorrido assenta em fundamentos
constitucional e infraconstitucional, qualquer deles suficiente, por si só, para mantê-lo, e a parte vencida não
manifesta recurso extraordinário”.
3.5 Primazia da decisão do mérito do recurso extraordinário ou especial (art. 1.029, §3º, cpc)
§ 3o O Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justiça poderá desconsiderar vício formal de
recurso tempestivo ou determinar sua correção, desde que não o repute grave.
Somente se aplica essa regra para os recursos interpostos em face de decisões publicadas após a vigência do
NCPC, vide enunciado administrativo 5 STJ.8
3.6 Exigência dos requisitos específicos de admissibilidade do prequestionamento e da repercussão geral

7
Art. 1.033. Se o Supremo Tribunal Federal considerar como reflexa a ofensa à Constituição afirmada no recurso extraordinário, por
pressupor a revisão da interpretação de lei federal ou de tratado, remetê-lo-á ao Superior Tribunal de Justiça para julgamento como
recurso especial.
8
Enunciado administrativo n. 5
Nos recursos tempestivos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de
2016), não caberá a abertura de prazo prevista no art. 932, parágrafo único, c/c o art. 1.029, § 3º, do novo CPC.
77
Considera-se prequestionamento o enfrentamento, pelo tribunal recorrido no acórdão impugnado, da
questão de direito que é objeto do recurso excepcional. Exige-se o prequestionamento mesmo para o
recurso de terceiro prejudicado. O prequestionamento pode ser expresso/explícito, quando há menção
expressa ao dispositivo normativo cuja interpretação é objeto do recurso; implícito (quando há manifestação
do órgão recorrido sobre a questão objeto do recurso sem menção ao dispositivo legal/constitucional
violado) ou ficto (prequestionamento realizado pela oferta de embargos de declaração).
Segundo Didier, para que haja prequestionamento é necessário haver discussão ou manifestação sobre o
tema, não bastando mera indicação ou menção a dispositivo legal.
O STJ, diferentemente do STF, não admitia a possibilidade de prequestionamento ficto na vigência do
CPC/73, no entanto, o NCPC consagrou a admissibilidade do prequestionamento ficto no art. 1025:
Art. 1.025. Consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-
questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal
superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade.
Também está superado o n. 320 da súmula do STJ: “A questão federal somente ventilada no voto vencido
não atende ao requisito do prequestionamento”, eis que o voto vencido passa a fazer parte do acórdão,
inclusive para fim de pré-questionamento (art. 941, §3º, NCPC).
Segundo Didier, a opção do NCPC em admitir o prequestionamento ficto é coerente com um sistema que
prestigia o julgamento de mérito (art. 4º, 932, §único e 1029, §3º NCPC), podendo-se citar também a noção
de formalismo valorativo defendida por Carlos Alberto Alvaro de Oliveira.
Segundo o STJ, mesmo as questões de ordem pública observam a necessidade de
prequestionamento para a admissibilidade do recurso especial.
3.7 Ausência de efeito suspensivo ope legis em regra
O recurso extraordinário e o recurso especial não têm efeito suspensivo automático (art. 995,
NCPC). Permitem, por isso, o cumprimento provisório da decisão recorrida.
Há, porém, um caso em que possuem efeito suspensivo automático: quando interpostos contra decisão
que julga o incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 987, §1º, NCPC).
De todo modo, será sempre possível pleitear a concessão de efeito suspensivo aos recursos
excepcionais.
A concessão de tutela provisória nesses recursos, porém, poderá ocorrer mediante requerimento
formulado pela parte interessada e dirigido ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça,
no período compreendido entre a publicação da decisão de admissão do recurso e sua distribuição (art.
1.029, § 5.º, I, CPC) ou ao relator, acaso já distribuído o recurso (art. 1.029, § 5.º, II, CPC). Quando, porém, o
recurso extraordinário ou o recurso especial da parte estiver pendente de admissibilidade na origem, o
pedido de tutela provisória deve ser formulado perante o presidente ou vice-presidente do tribunal
recorrido (art. 1.029, § 5.º, III, CPC). Permanecem em vigor, portanto, as súmulas 634 e 635, STF. A concessão
de tutela provisória em recurso extraordinário e em recurso especial submete-se à demonstração da
probabilidade de provimento do recurso e do perigo na demora da tutela jurisdicional (art. 300, CPC).
3.8 Fungibilidade entre RE e Resp
O art. 1.032 do NCPC afirma que, se o relator no STJ entender que o Resp versa sobre questão
constitucional, deverá conceder prazo de 15 (quinze) dias para que o recorrente demonstre a existência de
repercussão geral e se manifeste sobre a questão constitucional. A regra é inversa àquela decorrente do art.
1.033 que admite a conversão do recurso extraordinário em recurso especial – ambas, juntas, estabelecem o
“livre trânsito de recursos entre o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça”, concretizando
o princípio da fungibilidade dos recursos e, por consequência, também, o princípio da primazia da decisão
de mérito, e o princípio da cooperação.
Importante ressaltar que o STF e o STJ fixaram o entendimento de que não se aplica a
convertibilidade aos recursos interpostos contra decisões publicadas antes da data da vigência do CPC/15
(18.03.2016), os quais sevem seguir a sistemática do CPC/73, sendo simplesmente inadmitidos, vide
enunciado administrativo 02 do STJ e RE 959489 STF.9

9
Enunciado administrativo n. 2
Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem
ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela
78
3.9 É cabível a modulação dos efeitos em RE (STF) - RE 522897
4. Procedimento
Prazo de 15 dias. Interposição no juízo a quo (dirigido ao Presidente ou Vice do Tribunal local). Pós
NCPC, o recurso especial e o recurso extraordinário são os únicos recursos que se submetem a um duplo
juízo de admissibilidade.
Não cabem embargos de declaração contra decisão de presidente do tribunal que não admite recurso extraordinário
ARE 688776 ED/RS e ARE 685997 ED/RS, Rel. Min. Dias Toffoli, julgados em 28/11/2017 (Info 886)
Caso o presidente ou vice-presidente do tribunal local não admita o recurso, nos casos do inciso V
do art. 1.030 do NCPC, cabe agravo do art. 1.042 para o respectivo tribunal superior (art. 1.030, §1º, NCPC).
O recurso especial ou extraordinário pode ser inadmitido pelo presidente ou vice-presidente do tribunal de
origem em razão da aplicação de precedente de recurso especial repetitivo ou de repercussão geral. Nesse
caso, não cabe agravo em recurso especial ou em recurso extraordinário a ser encaminhado,
respectivamente, para o STJ ou para o STF. O que cabe, em tal hipótese, é agravo interno para o plenário ou
para o órgão especial do próprio tribunal de origem, a fim de que se faça a distinção para deixar de aplicar o
precedente ao caso. (art. 1.030, §2º, CPC). STJ: NÃO SE APLICA A FUNGIBILIDADE, sendo erro grosseiro a
interposição do agravo do art. 1.042 ao invés do agravo interno. (AREsp 959.991-RS, INFO 589 STJ)
O Presidente ou Vice-Presidente do tribunal local pode negar seguimento a:
a) a recurso extraordinário que discuta questão constitucional à qual o Supremo Tribunal Federal não tenha
reconhecido a existência de repercussão geral ou a recurso extraordinário interposto contra acórdão que
esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal exarado no regime de
repercussão geral;( Lei 13.256, de 2016)
b) a recurso extraordinário ou a recurso especial interposto contra acórdão que esteja em conformidade
com entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, respectivamente,
exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos; (Incluída pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência)
OBS: Marinoni/Mitidiero/Arenhart sustentam a necessidade de interpretação conforme a CRFB da
parte final do art. 1.042:
Note-se que a ressalva da parte final do art. 1.042, CPC, merece interpretação conforme a
Constituição: como é a própria Constituição que defere ao STF e ao STJ a última palavra a respeito da
existência ou não de violação à Constituição e à lei federal (arts. 102, III, e 105, III, CF/1988), não é possível
interpretar o art. 1.042, CPC, no sentido de vedação ao cabimento do agravo. Aliás, além de não ser
hierarquicamente possível do ponto de vista normativo essa interpretação, também não o é do ponto de
vista da coerência: se é o próprio legislador que institui a repercussão geral da questão no recurso que
impugnar acórdão que contrarie precedente ou jurisprudência, sumulada ou não, do STF, como imaginar que
é o tribunal local que fará o juízo a respeito da existência ou não de efetiva violação da orientação do STF?
Isso quer dizer que a ressalvada do art. 1.042, CPC, para não evidenciar evidente supressão de competência
constitucional, deve ser entendido como hipótese em que o cabimento do agravo é simplesmente
condicionado à prévia interposição do agravo interno.
Daí que é necessário entender que da decisão do presidente ou vice-presidente que inadmite o
recurso extraordinário ou o recurso especial com base no art. 1.030, I, CPC, cabe agravo interno (art. 1.030, §
2.º, CPC). Se permanecer a indistinção, cabe agravo em recurso extraordinário ou agravo em recurso especial
(arts. 102, III, e 105, III, CF/1988, e 1.042, CPC) para que o STF ou o STJ, conforme o caso, afirme se é ou não é
o caso de distinção. Interpretar de modo diverso significa suprimir do STF e do STJ o poder de afirmar os seus
próprios precedentes mediante as devidas distinções e, ao fim e ao cabo, não permitir o próprio
desenvolvimento do direito mediante adições de paulatinas ampliações e restrições. Entendendo, porém, de
modo diverso, concluindo pela inexistência de recurso para as instâncias superiores em caso de negativa de
seguimento de recurso especial, mesmo depois da interposição de agravo interno, v. STJ, 4.ª Turma, AgRg na
MC 23.595/RJ, rel. Min. Raúl Araújo, j. 04.08.2016, DJe 12.08.2016.

5. Recurso adesivo cruzado ou condicionado


O recurso adesivo cruzado ou condicionado consiste em um recurso adesivo interposto, de forma
excepcional, em uma situação em que não haja sucumbência recíproca, e de forma condicionada. Em
síntese, trata-se de recurso extraordinário ou especial que adere, respectivamente, a recurso especial ou
extraordinário, de forma, podemos dizer, cruzada.

jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.


79
A situação fica mais clara a partir de um exemplo: imagine-se situação onde a parte fundamente a
sua pretensão em questão constitucional e questão federal, vindo o tribunal a acolher o pedido, mas rejeita
o fundamento constitucional (ou federal). A parte vencida, porque sucumbente, poderá interpor recurso
especial para discutir a questão infraconstitucional que foi acolhida. Neste caso, a parte vencedora não tem
interesse recursal para interpor recurso extraordinário (para discutir a questão constitucional, que foi
rejeitada), uma vez que, como foi vitoriosa na questão principal, não tem interesse em recorrer para discutir
simples fundamento. Ocorre que a parte vencedora, neste caso, pode sofrer prejuízo, em razão de não poder
recorrer extraordinariamente: em sendo dado provimento ao recurso especial, a questão constitucional
restará preclusa, não mais podendo ser discutida.
Nesta situação, defende a doutrina a possibilidade da interposição do recurso extraordinário (ou
especial) cruzado (porque será um recurso extraordinário adesivo a recurso especial, ou vice-versa), sob a
condição de somente ser processado (analisado) se o recurso independente for acolhido.

II. Repercussão geral.


1. Introdução.
Introduzida pela EC 45/2004, que acrescentou o §3º ao art. 102 da CF/1988. Trata-se de requisito
intrínseco de admissibilidade do recurso extraordinário (arts. 102, § 3.º, CF, e 1.035, CPC). A função dessa
técnica processual é selecionar os recursos que devem ser conhecidos pelo Supremo Tribunal Federal.
Somente os recursos em que a questão constitucional apresente repercussão geral devem ser conhecidos
pelo Supremo Tribunal Federal, porque somente a partir desses casos pode o Supremo desempenhar a sua
função de outorga de unidade ao direito mediante adequada interpretação da Constituição.
A argumentação da repercussão geral não vincula o Supremo Tribunal Federal. Vale dizer: pode o
Supremo Tribunal Federal admitir o recurso extraordinário por fundamento diverso daquele invocado pelo
recorrente. No entender do Supremo Tribunal Federal, deve a parte demonstrar, de maneira formal e
fundamentada, a existência de repercussão geral.
É ônus do recorrente de demonstrar "a repercussão geral das questões constitucionais discutidas
no caso", a fim de que o "tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela
manifestação de dois terços dos seus membros". Foi regulamentado pela lei 11.418/2006, e posteriormente
pelo art. 1.035 do NCPC.
De acordo com o RISTF, a deliberação a respeito da existência ou não de repercussão geral ocorre
mediante meio eletrônico – plenário virtual – (arts. 323 e 324, RISTF). O relator examina a questão e
submete a sua solução eletronicamente aos demais Ministros. Os demais membros do colegiado contam
com 20 (vinte) dias para pronunciarem-se a respeito do tema. Acaso não cheguem manifestações em
número suficiente para rejeição da repercussão geral, essa é reconhecida automaticamente.
É possível a rediscussão da repercussão geral no Plenário físico mesmo tendo sido reconhecida
previamente no Plenário Virtual. STF. Plenário. RE 584247/RR, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em
27/10/2016 (Info 845).
2. Conceito. Relevância e Transcendência.
Existe repercussão geral no recurso extraordinário quando a causa constitucional nele debatida
apresenta relevância e transcendência (art. 1.035, § 1.º, CPC).10
3. Presunção absoluta de repercussão geral – art. 1.035,§3º NCPC c/c 987,§1º NCPC:
§ 3o Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar acórdão que:
I - contrarie súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal;
II – revogado (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016)
III - tenha reconhecido a inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal, nos termos do art. 97 da
Constituição Federal.
Também há presunção absoluta de repercussão geral no recurso extraordinário interposto contra decisão
que julga o mérito do IRDR (art. 987,§1º NCPC).
Art. 987. Do julgamento do mérito do incidente caberá recurso extraordinário ou especial, conforme o caso.
4. Possibilidade de amicus curiae (1.035, §4º)
5. Suspensão do processamento de todos os processos pendentes (1.035,§5º)

10
§ 1º Para efeito de repercussão geral, será considerada a existência ou não de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social
ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo.
80
§ 5o Reconhecida a repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do
processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e
tramitem no território nacional.
STF: O plenário do STF decidiu que a suspensão do §5º não é consequência automática e necessária do
reconhecimento da repercussão geral, e que é possível o sobrestamento em processos de natureza penal,
quando haverá a suspensão da prescrição da pretensão punitiva. STF. Plenário. RE 966.177 RG/RS, Rel. Min.
Luiz Fux, julgado em 7/6/2017 (Info 868).
6. Não Reconhecimento.
A decisão que nega a existência de repercussão geral tem eficácia panprocessual (Marinoni/Arenhart),
valendo para todos os recursos que versem sobre idêntica controvérsia (art. 1.035, § 8.º, CPC).
O recurso que tiver a repercussão geral reconhecida deverá ser julgado no prazo de um ano e terá
preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e o pedido de habeas corpus (art.
1.035, § 9.º, CPC). A inobservância do prazo de um ano, porém, com a revogação do § 10 do art. 1.035, CPC,
pela Lei 13.256/2016, não acarreta retomada automática do trâmite de processamento dos recursos
sobrestados.

Possibilidade de apreciação do recurso extraordinário com repercussão geral mesmo que, no caso
concreto, tenha havido prejudicialidade do tema discutido STF. Plenário. ARE 1054490 QO/RJ, Rel. Min.
Roberto Barroso, julgado em 5/10/2017 (Info 880).

7A. Formação, suspensão e extinção do processo.

Atualizado por Igor Lima Goettenauer de Oliveira

1. Formação do processo: a relação processual estabelece-se entre autor, juiz e réu. Nasce linearmente
entre autor e juiz por meio do protocolo da petição inicial (CPC, art. 312). Ocorre que o processo transforma-
se, deixa de ser linear e torna-se “angulado”2 ou “triangulado”3 com a citação, quando o réu passa a compor
o processo. Para o autor, há litispendência desde o procoloco da inicial, enquanto que para o réu a
litispendência depende de sua citação válida (art. CPC, art. 240). Ademais, a partir da citação a alteração do
pedido ou da causa de pedir depende de acordo entre as partes (antes da citação trata-se de ato unilateral
do autor; após o saneamento a modificação é impossível – CPC, art. 329).

2. Suspensão do processo: o curso do procedimento, em razão de certos fatos, pode ficar suspenso
temporariamente, esse fenômeno é denominado suspensão do processo. Essa suspensão não significa a
suspensão dos efeitos jurídicos do processo (efeitos da litispendência.). Fala-se em suspensão prórpia
quando todo o procedimento cessa seu andamento, e em suspensão imprópria quando atinge apenas
parcela do procedimento, enquanto outra parte tramita normalmente. Hpa divergência na doutrina sobre a
natureza jurídica da decisão de suspensão. A doutrina majoritária entende ser uma decisão declaratória
(Theodoro Jr., STJ), enquanto a doutrina minoritária entende ser uma decisão constitutiva (Didier Jr.).
Contudo, há aceitação generalizada sobre a eficácia ex tunc da decisão de suspensão do processo,
retroagindo à data do evento que deu causa à suspensão.

3. Hipóteses de suspensão (art. 313, CPC):

I) pela morte ou pela perda da capacidade processual de qualquer das partes, de seu representante legal
ou de seu procurador: se o direito discutido for intransmissível, o processo será extinto (art. 485, IX, CPC).
Nos demais casos, haverá suspensão do processo. Nos arts. 678 a 692 está prevista a ação de habilitação
para que os interessados sucedam a arte falecida. Não ajuizada a ação, o juiz determinará a suspensão de
ofício, nos seguintes termos: falecido o réu, o juiz ordenará a intimação do autor para que promova a citação
do espólio, herdeiro ou sucesso, no prazo mínimo de 2 meses e máximo de 6 meses, sob pena de extinção do
processo sem resolução de mérito; falecido o autor, o juiz determinará a intimação do espólio, do sucessor
ou dos herdeiros, para que manifestem interesse na sucessão processual e promovam a respectiva
habilitação, no prazo designado, sob pena de extinção do processo sem resolução de mérito (art. 313, §2º,
CPC). *Dissolução da sociedade: Há doutrina que equipara a morte da parte à extinção da pessoa jurídica
(Dinamarco, Didier Jr.), mas esse enetendimento não é pacífico (Theodoro Jr., Câmara), porque diante da
81
dissolução da sociedade sempre haverá alguém encarrregado de representá-la judicialmente até final
liquidação de seus direitos e obrigações. **Morte ou perda de capacidade processual de advogado: em
regra, só se justifica se o advogado morto ou sem caapcidade for o único constituído nos autos. No caso de
morte do procurador de qualquer das partes, ainda que iniciada a audiência de instrução e julgamento, o juiz
determinará que a parte constitua novo mandatário em 15 dias, ao final do qual extinguirá o processo sem
resolução e mérito, se o autor não nomear novo mandatário, ou ordenará o prosseguimento do processo à
revelia do réu, se falecido o procurador deste (art. 313, §3º, CPC).

II) pela convenção das partes: esta hipótese é apenas uma especificação da cláusula geral dos negócios
jurídicos processuais (art. 190, CPC). Não há exigência de motivação do acordo, não sendo dado ao juiz
indeferir o pedido. O prazo máximo de suspensão, nesta hipótese, é de 6 meses (art. 313, §4º, CPC).

III) pela arquição de impedimento ou de suspensão: apenas a arquição de impedimento/suspeição do juiz


suspende o processo, não o fazendo quando a arguição se dirigir ao membro do MP ou auxiliares da Justiça.
Nos termos do art. 146, §2º, CPC, o relator da arguição poderá recebê-la com efeito suspensivo,
suspendendo o procedimento, ou sem efeito suspensivo.

IV) pela admissão do incidente de resolução de demandas repetitivas: neste caso, o art. 980, caput, CPC,
prevê o prazo máximo de 1 ano de suspensão, podendo ser prorrogado por decisão fundamentada.

V.a) prejudicialidade externa (art. 313, V, “a”): o processo será suspenso quando a sentença depender do
julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que
constituia o objeto principal de outro processo pendente. Nesse caso, não se trata de suspensão obrigatória
e depende de decisão do juiz. A suspensão do processo, nesta hipótese, tem um pressuposto negativo:
somente será suspenso o processo se não for possível a reunião das causas pendentes em um mesmo juízo.
Essa suspensão deve durar no máximo um ano. Findo este prazo, o juiz mandará prosseguir no processo

V.b) necessidade de verificação de determinado fato ou a produção de certa prova, requisitada para outro
juízo (art. 313, V, “b”): Trata-se da suspensão em razão de uma questão preliminar ao exame de mérito: a
questão prévia que condiciona o próprio exame da questão de mérito. O art. 377 determina que a carta
precatória, rogatória e o auxílio direto suspenderão o julgamento da causa no caso previsto no art. 313, V,
“b”, quando, tendo sido requerido antes da decisão de saneamento, a prova neles solicitada for
imprescindível.

VI) por motivo de força maior: A suspensão retroagirá à data da ocorrência do evento.

VII) acidentes de navegação de competência do tribunal marítimo: o STJ, ao se manifestar sobre o tema,
estabeleceu que as conclusões do tribunal marítimo são suscetíveis de reexame pelo Poder Judiciário, ainda
que a decisão proferida pelo órgão administrativo, no que se refere à matéria técnica, tenha valor probatório
(Resp 811.769/RJ)

VIII) nos demais casos do Código: tal disposição denota o caráter meramente exemplificativo do rol do art.
313. Podem ser mencionados ainda os seguintes casos de suspensão do processo: incidente de
desconsideração da pessoa jurídica, impugnação ao cumprimento de sentença ou embargos à execução,
julgamento de recursos especiais e extraordinários repetitivos etc.

IX) pelo parto ou pela concessão de adoção, quando a advogada responsável pelo processo constituir a
única patrona na causa: inciso acrescido pela L13.363/2016. O período de suspensão é de 30 dias, contado
do parto ou da concessão da adoção.

X) quando o advogado responsável pelo processo constituir o único patrono da causa e tornar-se pai:
inciso acrescido pela L13.363/2016. O período de suspensão é de 8 dias, contado do parto ou da concessão
da adoção.

4. Prática de atos durante a suspensão do processo: o art. 314 do CPC prescreve ser proibida a prática de
82
qualquer ato processual durante a suspensão do processo, ressalvando a possibilidade de o magistrado
determinar a realização de atos urgentes, para evitar dano irreparável. Se ato não urgente for praticado,
deverá ser invalidado. Se ato não urgente for praticado, deverá ser invalidado. Se for arguida suspeição ou
impedimento, o magistrado não poderá praticar qualquer ato, mesmo os urgentes, cabendo ao substituto do
juiz acusado de parcial realizá-los.

5. Verificação da existência de fato delituoso pela justiça criminal (“prejudicialidade externa”): O art. 315,
CPC, regulamenta a prejudicialidade externa entre a ação civil e a ação criminal, facultando-se ao juiz da ação
civil sua suspensão até que se resolva o processo penal. Existe divergência sobre a obrigatoriedade ou não.
Marinoni-Mitidiero e Nery Jr. posicionam-sem pela faculdade da medida. O STJ já decidiu que quando se
possa comprovar, na esfera criminal, a inexistência de materialidade ou de autoria do crime, será obrigatória
a paralisação da ação cível (Resp 860.591/PR).

Extinção do processo (arts. 316 e 317, CPC): A extinção do processo dar-se-á por meio de senteça. Antes de
proferir sentença terminativa (sentença sem resolução de mérito), o juiz deverá conceder à parte
oportunidade para, se possível, corrigir o vício, por força do princípio da cooperação (art. 6º, CPC) e do
interesse no julgamento do mérito.

Extinção do Processo sem Julgamento de Mérito: a sentença que extingue o processo sem julgamento do
mérito é chamada de terminativa, submetendo-se apenas à coisa julgada formal, de modo que a mesma
ação pode ser novamente proposta.

O art. 485 do CPC elenca as hipóteses de extinção do processo sem julgamento do mérito, que são
essencialmente as seguintes: a) quando a petição inicial não preencher os requisitos dos arts. 319 e 320 do
CPC; b) o processo ficar parado durante mais de 1 ano por negligência das partes; c) por não promover os
atos e as diligências que lhe incumbir, o autor abandonar a causa por mais de 30 dias; d) verificar ausência
dos pressupostos de constituição e de dsenvolvimento válido e regular do processo; e) existência de
perempção, listispendência ou de coisa julgada; f) ausência de legitimidade ou de interesse processual; g)
acolhimento da alegação de existência de convenção de arbitragem ou quando o juiz arbitral reconhecer sua
competência; h) quando o juiz homologar a desistência da ação; i) em caso de morte da parte, a ação for
considerada intransmissível por disposição legal; e j) nos demais casos do Código.

Nesses casos, o juiz determina a intimação pessoal das partes, ou então, por edital, caso estejam em lugar
incerto e não sabido, para que elas providenciem o andamento do processo em 48h, sob pena de extinção
do processo. Quanto ao abandono pelo autor, o juiz só toma tais providências mediante requerimento do
réu, pois o réu pode desejar que o processo continue até a sentença de mérito (Súmula 240 do STJ ).

Extinção do Processo com Julgamento do Mérito: a sentença prolatada com base num dos dispositivos do
art. 487 do CPC é definitiva, submetendo-se à coisa julgada material, inviabilizando, destarte, a repropositura
da ação. A rigor, apenas o inciso I do art. 487 é uma verdadeira sentença de mérito, isto é, a única que exige
os requisitos do art. 489, do CPC , ou seja, relatório, fundamentação e dispositivo. Nas demais hipóteses do
citado art. 487 a sentença de mérito é atípica, tendo sido equiparada a tal pelo legislador para submeter-se à
coisa julgada material e gerar título executivo judicial, distinguindo- se assim das sentenças terminativas do
art. 267, embora ambas dispensem relatório.

7B. Precedentes obrigatórios: conceito, funções, efeitos. Mecanismos para controle da aplicação dos
precedentes.
Nilton Santos 02/09/18

1. Conceito, funções, efeitos

Conceito
Precedentes são as razões generalizáveis que podem ser extraídas da justificação de uma decisão de
tribunal, na qual houve concordância da maioria quanto às razões de decidir. É a primeira decisão que

83
elabora a tese/fundamento jurídico (ratio decidendi) ou a decisão que definitivamente a delineia,
deixando-a cristalina.

Dito de outra forma, precedente é fonte do direito; ou seja, é fato jurídico continente de uma norma
jurídica. Pode-se dizer, então, que, a partir do precedente, através do trabalho dos juízes subsequentes, dar-
se-á uma norma geral. Com efeito, trata-se de instrumento para criação de normas mediante o exercício da
jurisdição.

Entretanto, não forma precedente toda e qualquer decisão de tribunal, mas somente aquela que firma
o posicionamento a respeito de determinada questão de direito debatida, com respaldo da maioria,
construindo uma norma geral a ser aplicada em casos semelhantes.

O precedente em si, como decisão jurídica, não tem como elemento necessário a atribuição de efeito
vinculante. A observância obrigatória é o que se chama de stare decisis (eficácia jurídica do precedente),
consagrada em nosso ordenamento nos artigos 489, § 1º, V e VI, c/c artigos 926 e 927 do CPC/2015.

Assim, para que se tenha a formação de um precedente, são necessários dois elementos:

• Material – nova tese/fundamento jurídico/ratio decidendi apoiada pela maioria do tribunal – não se
encontra na parte dispositiva da sentença, mas na sua fundamentação;

• Formal – decisão proferida em sede de ADI, ADC, ADO, ADPF, Súmula Vinculante, Súmula STF/STJ,
Recurso Repetitivo, Incidente de Assunção de Competência (IAC), Incidente de Resolução de Recursos
Repetitivos (IRDR), Orientação de Tribunal.

OBS: Entende-se que tenha sido consagrado um microssistema de formação concentrada de


precedentes obrigatórios, formado pelo IRDR, pelos recursos especial e extraordinário repetitivos e pelo
IAC, onde as normas reguladoras de cada um dos institutos se comunicam, conformando um arcabouço
normativo geral para o microssistema.

Função
Os fundamentos axiológicos para aplicação dos precedentes são encontrados no princípio da
segurança jurídica, no seu corolário, proteção da confiança, bem como no princípio da isonomia.

Com efeito, a adoção da sistemática dos precedentes tem por função a garantia de previsibilidade e
estabilidade das relações, permitindo aos jurisdicionados o conhecimento prévio das soluções dadas pelo
Judiciário, bem como, garantia de que a jurisprudência uniforme dará tratamento isonômico aos casos
análogos que lhe sejam apresentados.

Efeitos
Formado o precedente, a solução jurídica decidida pelo tribunal há de ser reproduzida na solução de
casos semelhantes.

Por decorrer propriamente da solução de um caso concreto, identificando as razões de decidir o


conflito, o procedente possui natureza de norma-regra. A regra geral do caso concreto que conforma a ratio
decidendi é aplicável, por subsunção, quando seu suporte fático for novamente preenchido.

Consequencialmente, quando presentes os requisitos dos artigos 489, 926 e 927 do NCPC, ou seja,
quando a parte invoca um precedente amoldável de forma silogística ao caso concreto, não há que se abrir
espaço para que o livre convencimento judicial prevaleça, fazendo-se necessário que o dever de integridade
seja privilegiado nas decisões judiciais, em respeito à lei processual vigente, devendo, pois, ser acolhido o
intento da parte.

Com a introdução no novo código, torna-se imperativo que, para demandas idênticas, ou com
matérias fáticas semelhantes, ajuizadas em um mesmo contexto histórico, sejam atribuídas soluções iguais.
84
2. Mecanismos para controle da aplicação dos precedentes

Para incidir o precedente, necessário que a hipótese fática do caso sob julgamento seja análoga
àquela sob a qual se deu a formação do precedente. Assim, impõe-se ao julgador promover à subsunção, ou
à distinção, mediante regular fundamentação na sentença, do precedente ao casuísmo apreciado.

Desta sorte, existindo precedente constitucional ou precedente federal sobre o caso debatido em
juízo, a fidelidade ao direito constitui fidelidade ao precedente. Sendo invocado pela parte, deve ser
analisado pelo juízo. Se disser efetivamente respeito à controvérsia examinada, deve ser adotado como
razão de decidir. Se não, a distinção entre o caso precedente e o caso concreto deve ser declinada na
fundamentação. A ausência de efetivo enfrentamento do precedente constitui violação do dever de
fundamentação (art. 489, § 1º VI, CPC).

Distinguishing - Consiste na demonstração fundamentada de que o caso analisado se revela diferente


daquele apreciado na formação do precedente invocado.

Não implica superação ou limitação no âmbito de incidência do precedente, mas somente define sua
aplicação ou afastamento ao caso concreto apreciado, em face das circunstâncias fáticas que embasaram a
sua formação. A ratio decidendi do precedente é valorizada, pois se busca o seu verdadeiro alcance.

Overruling - É o processo de revogação ou superação do precedente. Ocorre naquelas situações em


que a resolução de um novo caso, cujos fatos guardam identidade com os fatos do caso precedente, é
realizada de forma distinta, sem referência à norma geral anteriormente criada
A revogação do precedente se justifica quando não mais respeite, por modificações supervenientes
nos padrões refletidos pelos posicionamentos das Cortes, os princípios de segurança jurídica, confiança e
estabilidade que o justificaram (art. 927, § 4, CPC).

Overriding – Também representa técnica de superação de precedentes, na qual a aplicação do


precedente é restringida. Promove-se um recorte (redução) no seu âmbito de incidência.
O precedente, de fato, se mantém, havendo a revisão nas razões que lhe servem de fundamento para
restringir o âmbito de sua aplicação.

Transformation – Há a negação do conteúdo do precedente sem, contudo, haver sua expressa


revogação pelo overruling. O órgão julgador promove uma releitura do precedente, superando o
entendimento original sem revogá-lo. São ressaltados aspectos antes considerados irrelevantes ou não
considerados, chegando-se, assim, a uma nova solução jurídica, sem abandono do precedente.

Prospective overruling – Tradicionalmente, a superação de um precedente produz efeitos


retrospectivos, com aplicação a casos passados, que somente sejam levados a julgamento após tal
superação. O prospective overruling nasce da necessidade de se relativizar a regra geral de que o overruling
tem efeitos retroativos, a fim de proteger as expectativas legítimas calcadas nos precedentes que restaram
superados.

Assim, considera-se a hipótese de dar efeitos prospectivos ao overruling, modulando os efeitos da


decisão que supera o precedente anteriormente firmado (art. 927, § 3º, CPC11).

11
§ 3o Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela
oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança
jurídica.
85
7C. A Instrumentalidade do Processo. O Processo Civil na Dimensão dos Direitos Fundamentais 12

Sidney Smith
Obras consultadas:DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Introdução ao Direito Processual, Parte geral e processo de conhecimento. V. 1.
17. ed. Salvador: Jus Podivm, 2015; MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: Teoria Geral do Processo. v. 1. 8. ed. rev. atual. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2014; DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 12. ed. São Paulo: Malheiros editores, 2005; Resumo do
28 CPR; MARINONI, Luiz Guilherme. Novo curso de processo civil, 2017.
Legislação básica: Código de Processo Civil, artigo 1º. Constituição Federal artigo 5º.

1) A INSTRUMENTALIDADE DO PROCESSO: “Se o direito processual é cientificamente autônomo e o processo


possui natureza instrumental, isto está muito longe de significar que ele possa ser neutro em relação ao
direito material e à realidade da vida. Aliás, justamente por ser instrumento é que o processo deve estar
atento às necessidades dos direitos. […] Não há dúvida de que o processo não se confunde com o direito
material e nesse sentido pode ser visto como um instrumento. Mas, para tutelar adequadamente as
diferentes posições sociais e as diversas situações de direito substancial, o processo não pode desconsiderar
o que se passa nos planos da realidade social e do direito material”. (Marinoni e Arenhart). O processo serve
à situação jurídica posta (direito material) e deve ser compreendido e estruturado para servir de instrumento
de tutela. É o direito material que indica quais seriam as possíveis soluções para a causa, enquanto que o
direito processual se preocupa com o modo de implementação dessas soluções. Sob outro prisma, a
instrumentalidade tem como corolário a necessidade de se outorgar preferência à efetiva solução do conflito
ao invés de se oferecer uma resposta meramente processual ou formal ao litígio.
Relação circular entre direito material e processo: Existem dois planos distintos: direito processual e direito
material. Mas há um nexo de finalidade que une estes planos, capaz de unir o instrumento (direito
processual) ao objeto (direito material). Há, portanto, uma relação de complementariedade, pois não há
hierarquia entre direito processual e direito material.
Instrumentalismo: É a abordagem metodológica do processo capaz de estabelecer uma ponte entre o direito
material e o processual. O operador jurídico deve saber que as regras processuais precisam ser aplicadas e
interpretadas de acordo com a sua função: dar efetividade às normas materiais. Para Marinoni, “não há como
conceber a jurisdição em uma dimensão que ignore a sua dinâmica processual, pois o resultado da sua tarefa
é indissociavelmente ligado ao ‘meio instrumental’ (técnica processual, estrutura fática, comportamento dos
auxiliares judiciários e do juiz) com o qual trabalha”.
Teoria da Instrumentalidade e seus Escopos: Trata-se de uma visão teleológica de processo, inaugurada no
Brasil por Cândido Rangel Dinamarco, na qual o processo se prestaria a fins úteis. Seria o processo
instrumento de concretização de uma “justiça social”, servindo à realização de fins sociais, econômicos,
políticos e culturais, os chamados escopos metajurídicos. Revela, assim, um grau de utilidade conferido à
existência do processo, que passa a ser visto como um instrumento de justiça. As normas processuais não
terão utilidade se não proporcionarem a obtenção do direito material. Por meio do processo, a jurisdição,
possui um escopo jurídico, social e político: Escopo jurídico - atuação da vontade concreta do direito; Escopo
social - capacidade de educar e pacificar com justiça (pacificação social); Espoco político - atuação da
jurisdição como poder estatal.
Crítica ao escopo da pacificação social: Marinoni, Arenhart e Mitidiero ponderam que “a ideia do fim de
pacificação social da jurisdição está relacionada com três questões: (i) a existência do juiz dá aos litigantes a
consciência de que os seus conflitos têm uma forma de resolução instituída e estatal, o que elimina as
tentativas de soluções privadas arbitrárias e violentas; (ii) a jurisdição acomoda as disputas, evitando a
potencialização e o agravamento das discussões; (iii) ainda que um dos litigantes não se conforme com a
decisão, ele sabe que, diante da impossibilidade de levar novamente ao juiz a situação conflitiva já
solucionada, nada mais lhe resta fazer e que, portanto, seria improdutivo e ilógico continuar alimentando a
sua posição. Acontece que essas três características, que serviriam para identificar um fim de pacificação
social na jurisdição, são completamente neutras e indiferentes à substância da função ou da decisão
jurisdicional. E definir jurisdição sem saber como a pacificação é alcançada pode conduzir à admissão de que
qualquer poder instituído, mesmo que atuando de forma ilegítima e de modo contrário aos princípios
materiais de justiça, exerce jurisdição. […] a pacificação social é uma mera consequência da existência de um

12
Este ponto é de fundamental importância para a concepção do Processo Civil a partir da Constituição Federal de 1988. É importante
ressaltar que devemos guiar nossos estudos de processo civil a partir das novas concepções do direito e da jurisdição que
influenciarão na compreensão do processo como instrumento a serviço do direito material. Houve uma profunda mudança de
paradigma no direito processual que deixou de ter o processo como foco e passou a dar prioridade a efetividade da tutela em busca
da juris-satisfação. Toda a nova ordem processual concebida pelo Novo CPC impõe a observância desta premissa.
86
poder de resolução dos conflitos que se sobreponha sobre os seus subordinados e não um resultado
particular e próprio do Estado constitucional. Por isso, no atual estágio dos nossos estudos, parece não ser
adequado concluir que a jurisdição se caracteriza pelo fim da pacificação social. É preciso, antes de tudo,
analisar de que forma esse fim é obtido, ou melhor, verificar a legitimidade do poder de resolução dos
conflitos e das decisões destinadas a regulá -los. Sem isso estaríamos aceitando que todo poder direcionado
à pacificação social é um poder jurisdicional e, assim, para dizer o mínimo, igualizando a jurisdição do Estado
legislativo com a jurisdição do Estado Constitucional”.

2) O PROCESSO CIVIL NA DIMENSÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS: O reconhecimento da força normativa


da Constituição no desenvolvimento e aplicação das normas processuais proporcionam o reconhecimento do
devido processo legal como direito fundamental. Os principais documentos responsáveis por esse
desenvolvimento também são: Constituições ocidentais após a 2ª Guerra Mundial; Tratados internacionais de
Direitos Humanos; Convenção Europeia de Direitos do Homem (Art. 6º trata do direito ao julgamento público,
equitativo e em prazo razoável por um tribunal independente e imparcial); Pacto de São José da Costa Rica
(Art. 8º estabelece garantias judiciais como o direito de ser ouvido por um tribunal competente,
independente e imparcial, direito à indenização por erro judiciário e direito ao sistema recursal).
O devido processo legal como direito fundamental abrange também outras garantias constitucionais como o
contraditório, o juiz natural, a duração razoável, a proibição de prova ilícita e outros princípios processuais
constitucionais destacados do artigo 5º e reproduzidos no Novo Código de Processo Civil.
Princípios processuais: O juiz decide a lide conforme o Direito, que é composto de um conjunto de espécies
normativas: regras e princípios. Como espécie normativa, o princípio é norma que estabelece um fim a ser
atingido (DIDIER). Possuem eficácia direta ou indireta, conforme o modo que o princípio atua sobre outras
normas: Eficácia direta – O princípio é eficaz e não depende de outras normas jurídicas. Atua sem a
necessidade de intermediação e exerce função integrativa, pois agrega elementos não previstos. Exemplo: um
procedimento previsto em uma regra em que não exista a previsão de manifestação da outra parte. Mas o
princípio do devido processo legal garantirá o exercício do direito de defesa. Eficácia indireta – Dependem de
outras normas para a sua concretização, pois servirão para delimitar o exercício do poder jurisdicional na
construção da solução do caso. As normas podem conter subprincípios ou regras que servirão como ponte ou
exercerão função definitória em relação aos princípios, porque delimitam com precisão o comando
normativo. Os princípios processuais podem ser subprincípios (menos amplos) que auxiliam a aplicação de
sobreprincípios (mais amplos). Exemplo: o princípio da boa-fé processual é um subprincípio do devido
processo legal, este, por sua vez, pode ser um subprincípio da Dignidade da Pessoa Humana. Didier explica
que classificar um princípio como sub ou sobre é apenas uma técnica para demonstrar como um princípio se
relaciona com outro.
Processo e Direitos Fundamentais: Segundo Marinoni, para se compreender o que o juiz faz quando decide é
necessário entender a concepção de direito do Estado Contemporâneo e a função dos direitos fundamentais
materiais. A adequada prestação jurisdicional depende da universalidade do acesso à justiça, do plano
normativo processual, da estrutura processual da administração da justiça e do comportamento do juiz.
Portanto, é fundamental pensar na relação entre o modo de ser da jurisdição, concebendo a existência de um
direito fundamental processual do particular e a sua relação com a efetividade da prestação da tutela
jurisdicional pelo Estado. A teoria dos Direitos Fundamentais constitui o marco teórico essencial para a
compreensão do Constitucionalismo Contemporâneo. Esses direitos possuem uma dupla dimensão (DIDIER):
Dimensão subjetiva –Direitos fundamentais como situação jurídica ativa. São direitos subjetivos que atribuem
posições jurídicas de vantagem aos seus titulares; (direitos com d minúsculo); Dimensão objetiva–Direitos
fundamentais como norma jurídica. São valores básicos consagrados que devem presidir e interpretação e
aplicação de todo o ordenamento jurídico por todos os seus atores.(Direitos com D maiúsculo). O processo
deve estar adequado à tutela efetiva dos direitos fundamentais (dimensão subjetiva) e estar estruturado de
acordo com os direitos fundamentais (dimensão objetiva). A aplicabilidade imediata dessas normas gera
obrigações para: O Legislador – porque precisa criar normas adequadas à tutela das situações jurídicas ativas.
O Magistrado – porque precisa realizar o controle difuso de constitucionalidade das normas processuais no
caso concreto e de modo incidental (princípio da adequação judicial das normas processuais). Além disso,
também deverá o magistrado: a) Dar eficácia máxima a normas protetoras de direitos fundamentais; b)
Aplicar a máxima da proporcionalidade para afastar qualquer regra que se coloque como obstáculo irrazoável
ou desproporcional para a efetivação de direitos fundamentais; c) Considerar eventuais restrições aos direitos
fundamentais quando da realização de outros direitos fundamentais. Observa-se que o rol dos direitos
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fundamentais inclui um fenômeno alopoiético, isto é, uma especial cláusula de abertura criativa, o que
implica na existência de direitos fundamentais tópicos e atópicos (aqueles direitos fundamentais que, mesmo
não inseridos dentro da Carta Magna, afiguram-se como detentores de fundamentalidade). Percebe-se, da
leitura do §2º do art. 5º da Carta Magna, a possibilidade de previsão de inserção de outros direitos não
contextualizados na Constituição brasileira, tendo Luiz Guilherme Marinoni, relativamente ao §2º do art. 5º
da CF/1988, afirmado que “essa norma permite, por meio da aceitação da ideia de fundamentalidade
material, que outros direitos, mesmo que não expressamente previstos na CF e, por maior razão, não
enumerados no seu título II, sejam considerados direitos fundamentais. Isso quer dizer que o art. 5º, §2º, da
CF institui um sistema constitucional aberto a direitos fundamentais em sentido material”.

8A. Comunicação processual. Prazos. Teoria das invalidades processuais. Primazia do julgamento de mérito e
aproveitamento dos atos processuais.

Samara Dalloul

COMUNICAÇÃO PROCESSUAL: “Transmissão de informações sobre os atos do processo às pessoas sobre


cujas esferas de direito atuarão os efeitos destes, eventualmente acompanhadas do comando a ter uma
conduta positiva ou a uma abstenção.” (Dinamarco) Binômio ciência-reação (efetividade do contraditório).

CITAÇÃO: é o ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual. Só a
partir dela, a relação processual se completa: é pressuposto processual de eficácia. A citação deve observar as
formalidades determinadas por lei, o descumprimento dos requisitos formais poderá invalidar o ato, tornando necessária
a sua repetição. Mas, se apesar do vício ou da falta de citação, o réu comparecer, o ato terá alcançado a sua finalidade, não
sendo necessário realizá-lo ou repeti-lo. Citação direta e indireta: A direta é a feita na pessoa do réu ou de seu
representante legal; a indireta, a feita na pessoa de um terceiro, que tem poderes de recebê-la com efeito vinculante em
relação ao réu. Para as pessoas jurídicas tem-se entendido que a citação será válida se recebida por pessoa que se
apresenta como gerente ou administrador e recebe a contrafé sem negar essa qualidade (teoria da aparência); nas
citações por carta basta a entrega no estabelecimento comercial, ainda que o AR não seja assinado pela pessoa dotada de
poderes para receber a citação, mas seja apenas responsável pelo recebimento da correspondência (CPC art. 248, § 2º). Se
a citação é destinada a pessoas físicas, o aviso de recebimento deve vir assinado por elas, sob pena de invalidade do ato
(Súmula 429 do STJ).
Oportunidade da citação: A citação far-se-á em qualquer lugar em que se encontre o réu, executado ou interessado, com
as seguintes exceções (só podem ser realizadas para evitar perecimento do direito): a) participação em culto religioso; b)
cônjuge ou parente do morto no dia do falecimento e 7 dias seguintes; c) noivos nos 3 dias após o casamento; d) doente
enquanto grave o estado. Ainda, se o oficial de justiça verificar que o réu é mentalmente incapaz ou está impossibilitado
de receber a citação, descreverá e certificará minuciosamente a ocorrência, caso em que o juiz nomeará um médico para
o examinar e, constatada em laudo a impossibilidade, dará curador, na pessoa de quem será realizada a citação. Espécies
de citação: a) Correio (regra, exceto: ações de estado, incapaz, pessoa de direito público, execução, local não
atendido, autor requer outra forma); b) Oficial de Justiça; c) Escrivão ou Chefe de Secretaria (se o citando comparecer
em cartório); d) Edital; e) Meio Eletrônico. Englobada na citação por oficial de justiça está a modalidade citação por hora
certa, que ocorre quando por 2 vezes o citando não for encontrado em seu domicílio, havendo suspeita de ocultação. O
oficial fará uma certidão do ocorrido e deixará a contrafé com a pessoa da família ou com qualquer vizinho, declarando-lhe
o nome. Em seguida, o escrivão ou chefe de secretaria enviará carta, telegrama ou radiograma ao citando, dando-lhe de
tudo ciência. A expedição da carta é requisito para a validade da citação com hora certa, mas não o recebimento pelo
citando. São fictas a citação por edital e a citação por hora certa, caso em que, restando revel o réu citando, há
necessidade de nomeação de curador especial para sua defesa, o que não é necessário na citação real (demais
modalidades). Citação por edital: desconhecido ou incerto o réu; ignorado, incerto ou inacessível o local;
casos expressos em lei (ex: ação de usucapião, ação de Inventário). Considera-se inacessível, para efeito de
citação por edital, o país que recusar o cumprimento de carta rogatória. (inacessibilidade jurídico-política).
No caso de ser inacessível o lugar em que se encontrar o réu, a notícia de sua citação será divulgada também
pelo rádio, se na comarca houver emissora de radiodifusão (inacessibilidade física/geográfica). Doutrina
minoritária: inacessibilidade de natureza social - sempre que o réu se encontre em territórios controlados
pelo crime organizado nos quais o Estado Brasileiro já não tem mais condições de atuar efetivamente.
Citação por correio: SÚM 429-STJ. A citação postal, quando autorizada por lei, exige o aviso de recebimento.
STJ: Admitiu a validade de CITAÇÃO VIA CAIXA POSTAL, se for o único endereço fornecido por PESSOA
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JURÍDICA e em ação que discute relação de consumo (REsp 981.887-RS). Prazo de resposta: começa a fluir da
juntada aos autos do AR firmado pelo destinatário, salvo disposição em contrário. Na citação por hora certa é contato da
data da juntada aos autos do mandado de citação com hora certa (e nao do AR da carta de cientificação). No
procedimento comum corre, no entanto, o prazo de contestação se inicia da audiência de tentativa de conciliação ou da
data em que o réu protocola o pedido de cancelamento dessa audiência, já tendo o autor manifestado desinteresse.
Efeitos da citação: A citação válida torna prevento o juízo, induz litispendência e faz litigiosa a coisa; e, ainda
quando ordenada por juiz incompetente, constitui em mora o devedor e interrompe a prescrição (retroage à
data da propositura da ação). Não se efetuando a citação no prazo de 10 dias, prorrogável até o máximo de
90, haver-se-á por não interrompida a prescrição. A citação interromperá a prescrição ainda que o processo
venha a ser julgado extinto sem resolução de mérito, salvo nas hipóteses de indeferimento da inicial ou
abandono da causa (art.485, I e III).
Intimação: Ato pelo qual se dá ciência a alguém (não somente as partes) dos atos e termos do processo,
para que faça ou deixe de fazer alguma coisa (CPC, art. 269). Quando portadoras de mera ciência, elas criam
ônus e fazem fluir prazos, mas não geram deveres. A intimação tem estrutura complexa: conhecimento de
um ato e comando a realizar conduta. Forma de intimação: por publicação no órgão oficial; por correio;
pessoalmente; por hora certa ou edital; por meio eletrônico (preferencial). As intimações, em suma, são
dirigidas ao advogado para a prática de atos que exijam capacidade postulatória; e são dirigidas às partes,
quando há determinação judicial para que elas, pessoalmente, façam ou deixem de fazer algo. STJ “já firmou
a orientação de que a prerrogativa da intimação pessoal só é conferida aos Procuradores Federais,
Advogados da União, Procuradores da Fazenda Nacional, Defensores Públicos e membros do Ministério
Público, não se aplicando aos Procuradores Estaduais, do Distrito Federal e dos Municípios”. (AgRg no AREsp
227.395/BA)

PRAZOS: prazo é a distância temporal entre dois fatos ou atos, ou a quantidade de tempo medida entre
eles. Classificação: 1) Legais, judiciais, convencionais (partes podem convencionar, reduzindo ou
prorrogando o prazo dilatório); 2) Próprios (inobservância acarreta desvantagem para quem descumpriu;
preclusão temporal), impróprios (fixados apenas como parâmetro); 3) comuns (destinados a todas as partes
para a prática de determinado ato), particulares; 4) peremptórios (são chamados prazos aceleratórios;
desatendidos, acarretam preclusão), dilatórios ou dispositivos (visam refrear a dinâmica do procedimento
em nome da efetividade; pode haver alteração por convenção das partes ou determinação do juiz). 5) Prazos
endoprocessuais: ditam distâncias temporais entre atos de um mesmo procedimento; Prazos
extraprocessuais fluem fora do processo e, às vezes, até antes que algum processo se instaure (2 anos da
rescisória, 120 dias do MS, 15 dias dos embargos a execução forçada).
Os prazos do juiz, de seus auxiliares e do Ministério Público, quando atua como fiscal da ordem jurídica, são
impróprios, não implicam a perda da faculdade, nem o desaparecimento da obrigação de praticar o ato,
mesmo depois de superados. Tradicionalmente costumava-se distinguir entre prazos peremptórios e
dilatórios, mas essa distinção tem pouca utilidade no sistema do CPC atual, diante do que dispõem os arts.
190 e 191, que não fazem nenhuma distinção entre prazos peremptórios ou dilatórios, permitindo que, por
convenção, nos processos que admitem autocomposição, as partes capazes estipulem mudanças no
procedimento e convencionem sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, podendo as
partes, de comum acordo com o juiz, fixar um calendário para a prática de atos processuais quando for o
caso.
Contagem de prazo: Se a intimação for feita pelo Diário Oficial, o prazo começará a correr no primeiro dia
útil seguinte à publicação. Se for eletrônico, a publicação considera-se feita no primeiro dia útil subsequente
à disponibilização da informação (art. 4º, § 3º, da Lei n. 11.419/2006). Suspensão e interrupção do prazo:
Distingue-se a suspensão da interrupção de prazo porque, na primeira, ele fica paralisado, mas volta a correr
do ponto em que parou, quando incidiu a causa suspensiva. Já a interrupção provoca o retorno do prazo à
estaca zero, como se nada tivesse corrido até então.
Benefícios de prazo: a) O Ministério Público (art. 180, caput), a Fazenda Pública (art. 183) e a Defensoria
Pública (art. 186) gozarão de prazo em dobro para manifestar-se nos autos. Não têm privilégio de prazo as
empresas públicas e as sociedades de economia mista, pessoas jurídicas de natureza privada. O Ministério
Público tem o prazo maior, tanto na condição de parte como na de fiscal da ordem jurídica. b) Litisconsortes
com advogados diferentes, todos os prazos legais ser-lhe -ão contados em dobro: para contestar, recorrer,
contrarrazoar e falar nos autos em geral. É preciso que os procuradores sejam diferentes e que não
pertençam ao mesmo escritório de advocacia (art. 229). A dobra de prazo não se aplica aos processos de
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autos eletrônicos (art. 229, § 2º). Tem prevalecido o entendimento de que, se houver dois réus e um deles
permanecer revel, ainda assim o outro terá prazo em dobro para contestar, porque não tinha como saber se
o corréu contrataria ou não advogado. Se a constituição do advogado diferente ocorreu no curso do prazo,
só correrá em dobro o restante. Súmula 641 do STF: “Não se conta em dobro o prazo para recorrer, quando
só um dos litisconsortes haja sucumbido”. Prevalece o entendimento de que o art. 229 do CPC não se aplica
aos Juizados Especiais Cíveis. Os beneficiários da Justiça Gratuita não têm prazo especial em geral. Mas,
quando patrocinados por órgãos públicos da assistência judiciária, como a Defensoria Pública e a
Procuradoria do Estado, passam a ter em dobro todos os prazos para falar nos autos (mesmo que exista dois
réus e sendo um deles a Fazenda Pública). Não há ofensa à isonomia, porque tais órgãos atuam em grande
quantidade de processos, o que justifica o benefício. Equiparam-se, para os fins de dobra do prazo, aos
órgãos públicos os entes que exercem funções equivalentes, como os Centros Acadêmicos de Universidades
Públicas, por força de convênio com o Estado.
Preclusão: É mecanismo de grande importância para o andamento do processo, que, sem ele, se eternizaria.
Consiste na perda de uma faculdade processual por: a) Não ter sido exercida no tempo devido ( preclusão
temporal); b) Incompatibilidade com um ato anteriormente praticado (preclusão lógica); c) Já ter sido
exercida anteriormente (preclusão consumativa). Preclusão “pro judicato”: O juiz não pode voltar atrás nas
decisões que: a) deferem a produção de provas; b) concedem medidas de urgência; c) decidem matérias que
não são de ordem pública, como as referentes a nulidades relativas. Mas, mesmo nelas, o juiz poderá
modificar a decisão anterior, se sobrevierem fatos novos, que justifiquem a alteração. E se a decisão foi
objeto de agravo de instrumento, pode exercer o juízo de retratação, enquanto ele não for julgado.

TEORIA DAS INVALIDADES PROCESSUAIS: Aplicam-se as noções da teoria geral do direito sobre o plano da
validade dos atos jurídicos (Didier). PARA MARINONI E ARENHART: Várias são as teorias que procuram
organizar o tema invalidades processuais. Já se procurou classificar as nulidades processuais em nulidades
cominadas e nulidades não cominadas, em nulidades absolutas, nulidades relativas e anulabilidades, em
nulidades absolutas e nulidades relativas. Parece-nos adequado, todavia, trabalhar nos domínios do direito
processual civil simplesmente com o termo invalidade ou nulidade. O ato processual será nulo sempre que a
infração à forma comprometer os fins de justiça do processo, frustrando o alcance de sua finalidade. Do
contrário, o ato processual é válido. Não há nulidade se os fins de justiça do processo forem alcançados; não
há nulidade se realizada a finalidade do ato processual; não há invalidade sem prejuízo (pas de nullité sans
grief). O sistema do Código de Processo Civil em tema de nulidades foi pensado e construído para que não se
decretem invalidades.
Premissas (Fredie Didier): 1) há defeitos processuais que não geram qualquer invalidade (defeitos mínimos;
meras irregularidades). 2) há defeitos processuais que geram invalidade que não pode ser decretada ex
officio - resguarda interesse particular – ex: incompetência relativa; S. 318 do STJ - Formulado pedido certo e
determinado, somente o autor tem interesse recursal em arguir o vício da sentença ilíquida. 3) há invalidades
processuais que podem ser decretadas ex officio. Trata-se, normalmente, de invalidades que decorrem de
defeitos do procedimento, ausência de pressupostos processuais e condições da ação. Não há preclusão; 4)
há os defeitos que levam a invalidade que pode ser decretada de ofício, mas, não tendo havido impugnação
da parte prejudicada, no primeiro momento que cabe a ela falar nos autos, há preclusão. É de difícil
identificação. Mitiga a regra de que toda invalidade que pode ser decretada ex officio pode sê-lo a qualquer
tempo, o que compromete a segurança e os fins do processo. Ex. defeito da citação não alegada e
comparecimento do réu ao processo com resposta sem alegação. Não há invalidade sem prejuízo – pas de
nullité sans grief. Invalidade = defeito + prejuízo.
Classificação (Nery): a) Nulidades de forma: relativas (argüidas pelas partes e sujeitas a preclusão) e
absolutas (alegadas a qualquer tempo, exceto em RE ou RESP se não decidida a questão constitucional ou
federal), conforme previsão legal; b) Nulidades de fundo: sempre absolutas (pressupostos processuais e
condições da ação) c) irregularidades (defeitos de menor gravidade não comprometem a higidez do ato
processual). Há também os atos inexistentes.
Atos processuais meramente irregulares – a lei não dá maior importância a suas próprias exigências, quando
superficialmente formais, porque insignificante ou nenhuma é a relação dessas exigências com a
indispensável seriedade na produção do resultado querido pelo agente. Ex.: o uso do vernáculo, quando há
algumas citações latinas ou o uso de expressões de língua estrangeira. Atos processuais juridicamente
inexistentes: a existência de um ato jurídico depende invariavelmente da presença de seus elementos
essenciais, sem os quais ele não é o que talvez aparente ser. Essa situação típica é composta pela forma
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determinada em lei, pelo sujeito qualificado a realizar o ato, pela vontade do agente e pelo objeto admissível
em direito. Sem a presença cumulativa de todos esses mínimos, ele jamais poderá chegar ao resultado
proposto. Em cinco situações básicas o ato processual é juridicamente inexistente: a) quando não está
ligado à vontade de seu aparente autor (falta de assinatura); b) quando o agente não tem mínimas
condições, perante o direito, para realizar o ato; c) quando o ato não contém conclusão alguma (petição
inicial sem pedido, sentença sem dispositivo); d) quando dita um resultado materialmente impossível; ou e)
quando o resultado ditado afronta normas superiores de proteção ao Estado ou ao ser humano.
Nemo potest venire contra factum proprium - Art. 276. Quando a lei prescrever determinada forma, sob
pena de nulidade, a decretação desta não pode ser requerida pela parte que Ihe deu causa. - Proibição de
comportamento contraditório – ofensa aos princípios da lealdade processual e da boa-fé objetiva; consiste
numa vedação genérica à deslealdade. Há um comportamento anterior que se contrapõe a um
comportamento posterior – o primeiro ato é lícito. Esse ato lícito impede a prática do segundo – que é ilícito.
Princípio da instrumentalidade das formas - Quando a lei prescrever determinada forma, sem cominação de
nulidade, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, Ihe alcançar a finalidade. Também
abarca o princípio da fungibilidade; pode-se aproveitar um ato como outro ato. Nulidades absolutas não
podem ser conhecidas sem prequestionamento – atual posição do STJ e do STF.
É nulo o processo, quando o Ministério Público não for intimado a acompanhar o feito em que deva intervir.
Se o processo tiver corrido, sem conhecimento do Ministério Público, o juiz o anulará a partir do momento
em que o órgão devia ter sido intimado. A participação do MP, em tais casos, é encarada como pressuposto
processual objetivo intrínseco de validade; a falta de intervenção do MP deve ser analisada também frente
ao princípio do prejuízo.
As citações e as intimações serão nulas, quando feitas sem observância das prescrições legais.
Anulado o ato, reputam-se de nenhum efeito todos os subsequentes, que dele dependam; todavia, a
nulidade de uma parte do ato não prejudicará as outras, que dela sejam independentes. O juiz, ao
pronunciar a nulidade, declarará que atos são atingidos, ordenando as providências necessárias, a fim de que
sejam repetidos, ou retificados.

APROVEITAMENTO DOS ATOS PROCESSUAIS: Quando puder decidir do mérito a favor da parte a quem
aproveite a declaração da nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato, ou suprir-lhe a falta.
O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados,
devendo praticar-se os que forem necessários, a fim de se observarem, quanto possível, as prescrições legais.
Dar-se-á o aproveitamento dos atos praticados, desde que não resulte prejuízo à defesa. A inadequação
procedimental não é o suficiente para a anulação de todo o processo, devendo ser mantidos os atos que
podem ser aproveitados.

PRIMAZIA DA DECISÃO DE MÉRITO: Para o NCPC o que importa é a apreciação do mérito pelo
magistrado; ou seja, a decisão de mérito é prioritária em relação à decisão que não é de mérito. O
NCPC inova ao prever expressamente em diversos pontos a primazia do mérito:
a) Art. 4o As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a
atividade satisfativa.
b) Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320
ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito,
determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com
precisão o que deve ser corrigido ou completado. Parágrafo único. Se o autor não cumprir a
diligência, o juiz indeferirá a petição inicial.
c) Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: [...] § 7o Interposta a apelação em qualquer dos
casos de que tratam os incisos deste artigo, o juiz terá 5 (cinco) dias para retratar-se. A apelação
de qualquer sentença que deixa de apreciar o mérito permite retratação.
d) Art. 932. Incumbe ao relator: [...] Parágrafo único. Antes de considerar inadmissível o recurso, o
relator concederá o prazo de 5 (cinco) dias ao recorrente para que seja sanado vício ou
complementada a documentação exigível.
e) Art. 1.029. O recurso extraordinário e o recurso especial, nos casos previstos na Constituição
Federal, serão interpostos perante o presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido, em
petições distintas que conterão: [...] § 3 o O Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de
Justiça poderá desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou determinar sua correção, desde
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que não o repute grave.

8B. Liquidação de sentença. Cumprimento da sentença e de outros títulos judiciais. Formas de


implementação e efetivação das decisões judiciais.

Samara Dallloul

LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA: O título executivo deve representar um direito líquido e certo. A ausência de
qualquer destes dois requisitos do direito representado pelo título faz com que este não tenha eficácia
executiva (art. 783, CPC), revelando-se, assim, inadequada a utilização da execução como meio de
atendimento à pretensão do demandante (carência de ação por falta de interesse de agir). Ocorre que há
situações em que o título judicial, embora represente direito certo, não apresenta a liquidez do crédito , ou
seja, o título judicial apresenta todos os elementos identificadores do direito (o an debeatur, ou seja, a
existência da dívida, e o quid debeatur, isto é, a qualidade do objeto da prestação), mas não revela o
quantum debeatur (ou seja, a quantidade devida). Estar-se-á, nestes casos, diante da chamada condenação
genérica.
A condenação genérica é excepcional, uma vez que a sentença deve ser uma resposta ao pedido
formulado pelo demandante (princípio da congruência entre pedido e sentença, também conhecido como
princípio da adstrição da sentença ao pedido), devendo o pedido ser certo e determinado (arts. 322 e 324,
CPC). A sentença condenatória genérica não é título executivo, uma vez que não representa um direito
líquido. Sendo ilíquido o direito do credor, é preciso determinar o quantum debeatur, para que se torne
adequada a via executiva para a satisfação de sua pretensão. Faz-se mister, assim, a realização da liquidação
da obrigação representada pela sentença, o que se faz através da “liquidação de sentença”.
ESPÉCIES DE LIQUIDAÇÃO: O CPC/73, em sua redação originária, previa três espécies de liquidação: por
cálculo do contador, por arbitramento e por artigos. Isto foi modificado pela Lei n. 8.898/94, que excluiu a
liquidação por cálculo do contador. Ao fazê-lo, atribuiu ao exequente, nos casos em que o débito pode ser
apurado por cálculo, o ônus de, ao requerer a execução, juntar memória discriminada do débito. Com isso,
restaram apenas duas formas de liquidação. O CPC atual as manteve, como liquidação por arbitramento e
de procedimento comum. A elas, deve-se acrescentar um tipo especial previsto no Código do Consumidor: a
apuração do quantum devido às vítimas, quando proferida sentença condenatória genérica nas ações civis
públicas para a defesa de interesses individuais homogêneos. São essas as três formas de liquidação que
persistem em nosso ordenamento jurídico.
a) Liquidação por arbitramento: É aquela que se presta à apuração do valor de um bem ou serviço. A única
tarefa é a apuração desse valor, o que demandará a apresentação de pareceres e documentos elucidativos
pelas partes e, se isso não for suficiente, a nomeação de um perito. Não há nenhum fato novo a ser
demonstrado. Dispõe o art. 509, I, do CPC que a liquidação será feita por arbitramento quando determinado
por sentença ou convencionado pela partes ou quando o exigir a natureza do objeto da liquidação. O
procedimento a ser observado é o mesmo previsto para a prova pericial. Prevalece o entendimento de que
não há honorários advocatícios nessa espécie.
b) Liquidação pelo procedimento comum: Antes chamada de liquidação por artigos. É aquela em que há
necessidade de comprovação de fatos novos, ligados ao quantum debeatur. Dispõe o art. 509, II “pelo
procedimento comum, quando houver necessidade de alegar e provar fato novo”. O formalismo da
liquidação pelo procedimento comum tem por espinha dorsal o procedimento tradicional do processo de
conhecimento. O procedimento comum é aplicável, aqui, no que couber. Procedimento: a liquidação pelo
procedimento comum inicia por requerimento e dele deve ser intimado o devedor. A intimação, quando
possível, deve ocorrer na pessoa de seu advogado e, sendo impossível, por intimação pessoal. O demandado
tem o prazo de quinze dias para oferecer contestação ao pedido de liquidação (não cabe reconvenção).
Ultimada a instrução do incidente, o juiz decidirá a liquidação pelo procedimento comum, fixando o valor
devido. Dessa decisão caberá o recurso de agravo de instrumento (que não impede o cumprimento, salvo
efeito suspensivo concedido).
c) Liquidação e cumprimento de ações coletivas: Basicamente, quatro são as possíveis sentenças proferidas
em ações coletivas que demandarão uma fase de liquidação antes da execução: a) sentença ilíquida,
resultado de ação para a defesa de direito essencialmente coletivo. Nesse caso, como o valor de eventual
condenação será revertido em benefício da coletividade (a um dos fundos criados pela lei), a legitimidade
será de um dos legitimados extraordinários, preferencialmente aquele que tenha atuado na fase de
92
conhecimento, de modo que se trata de autêntica liquidação coletiva; b) sentença ilíquida, resultado de ação
para a defesa de direito acidentalmente coletivo, ou seja, direitos individuais homogêneos. Nesse caso,
levando em conta que a sentença genérica forma título executivo judicial em benefício do legitimado
individual, terá o indivíduo a legitimidade para a fase de liquidação de sentença; c) sentença ilíquida,
resultado de ação para a defesa de direito essencialmente coletivo, que possa ser objeto de transporte in
utilibus para o plano de individual. Nesse caso, também será do indivíduo a legitimação para a fase de
liquidação; e d) Finalmente, sentença ilíquida, resultado de ação para a defesa de direito acidentalmente
coletivo, que não receba liquidações e execuções compatíveis com a extensão do dano, no prazo de 01 (um)
ano. Trata-se, aqui, de uma fase de liquidação preparatória da fluid recovery. O cumprimento/execução das
decisões nas ações coletivas depende da pretensão: (a) se a pretensão é coletiva, a liquidação/execução será
promovida pelo autor da ação coletiva (ou, caso não o faça em 60 dias do trânsito em julgado, por outro
legitimado ou MP), perante o juízo da condenação, e os recursos são destinados ao fundo de reparação de
bens difusos e coletivos; (b) se a pretensão é individual, ocorre o transporte in utilibus da coisa julgada
coletiva: a liquidação/execução é feita pela vítima, seus sucessores ou pelos legitimados coletivos, perante o
juízo da condenação ou o juízo do domicílio da vítima, cabendo à vítima/sucessores os recursos arrecadados.
Não havendo habilitados em número compatível com a extensão dos danos, é possível, ainda, a
liquidação/execução da pretensão coletiva residual (fluid recovery) pelos legitimados coletivos, perante o
juízo da condenação, sendo o valor devido apurado conforme a gravidade do dano e o número de indivíduos
habilitados e destinado ao fundo de reparação de bens difusos e coletivos. A execução no processo coletivo,
em geral, seguirá o sistema do CPC.
NATUREZA DA LIQUIDAÇÃO: Não constitui novo processo, mas fase do processo sincrético. Para MARINONI,
a decisão que encerra a fase de liquidação é uma decisão definitiva de mérito e que a nossa legislação refere
que dessa decisão cabe o recurso de agravo de instrumento, é natural que ela esteja sujeita a ação rescisória
e que a ela se aplique, enfim, o regime tradicional das decisões que resolvem o mérito. A doutrina se divide
quanto à natureza constitutiva ou declaratória da decisão em liquidação (parece-nos melhor que seja
declaratório, pois o título já está constituído desde antes da liquidação). Já a liquidação da sentença
condenatória genérica na ação civil pública tem caráter constitutivo, pois serve para que as vítimas
comprovem sua qualidade, demonstrando que se enquadram naquela situação jurídica indicada na sentença
genérica.

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA E OUTROS TÍTULOS JUDICIAIS: O procedimento do cumprimento de sentença


é aplicável à execução de todos os títulos executivos judiciais, nos termos do art. 515 do CPC, a saber: I - as
decisões proferidas no processo civil que reconheçam a exigibilidade de obrigação de pagar quantia, de
fazer, de não fazer ou de entregar coisa; II - a decisão homologatória de autocomposição judicial; III - a
decisão homologatória de autocomposição extrajudicial de qualquer natureza; IV - o formal e a certidão de
partilha, exclusivamente em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título singular ou
universal; V - o crédito de auxiliar da justiça, quando as custas, emolumentos ou honorários tiverem sido
aprovados por decisão judicial; VI - a sentença penal condenatória transitada em julgado; VII - a sentença
arbitral; VIII - a sentença estrangeira homologada pelo Superior Tribunal de Justiça; IX - a decisão
interlocutória estrangeira, após a concessão do exequatur à carta rogatória pelo Superior Tribunal de
Justiça.

Cumprimento de sentença: Com a edição da Lei n. 11.232/2005 passou-se a não distinguir a execução de
título judicial como processo autônomo, passando a considerá-la apenas como uma fase de um processo
maior, apelidado de “sincrético”. Consolidou-se o sistema dual de execuções: a de título extrajudicial e a de
título judicial (fase de cumprimento de sentença).
Sentenças condenatórias em obrigação de fazer, não fazer ou entregar coisa: Não havendo o cumprimento
voluntário da obrigação, o juiz determinará as medidas coercitivas ou de sub-rogação necessárias para a
satisfação do credor. Se a obrigação for fungível, o juiz poderá determinar os dois tipos de medida; se for
infungível, apenas as coercitivas, já que a obrigação não pode ser prestada por terceiro. Os principais meios
de coerção estão enumerados no art. 536, § 1º, do CPC. Não havendo cumprimento específico da obrigação,
ou de providência que assegure resultado equivalente, e sendo infrutíferas as medidas determinadas, ou
existindo requerimento do credor, haverá conversão em perdas e danos, prosseguindo-se na forma dos arts.
523 e ss., do CPC.
Sentença condenatória ao pagamento de quantia certa contra devedor solvente: O procedimento vem
93
regulado nos arts. 523 e ss., mas naquilo que não for incompatível, aplicam-se as regras do processo de
execução como, por exemplo, as relativas à penhora e avaliação.
Procedimento: Dois são os requisitos fundamentais: o título executivo judicial e o inadimplemento
do devedor. Constituído o título, manda a lei que, a requerimento do exequente, seja dado ao devedor um
prazo de quinze dias para que efetue voluntariamente o pagamento. Se não o fizer passar-se-á à fase de
cumprimento de sentença, com expedição de mandado de penhora e avaliação. O montante da condenação
será acrescido de multa de dez por cento do débito. Prazo para pagamento voluntário: 15 dias a contar da
necessária intimação do devedor na pessoa de seu advogado ou por edital, se revel (no CPC/73 havia
controvérsia sobre a intimação). Se o requerimento do credor para cumprimento for feito após um ano do
trânsito em julgado será necessária intimação pessoal. Nesse período de 15 dias não se admite a prática de
atos satisfativos. Multa: Não efetuado o pagamento no prazo, incide multa de 10% (art. 523, §1º), que
incidirá sobre o valor da condenação (o principal, mais juros, correção monetária, custas e honorários
advocatícios fixados na fase de conhecimento). Além disso, haverá novos honorários na fase executiva, de
também 10% do débito. Também cabe a multa na execução provisória. Requerimento: o cumprimento se
inicia por mera petição requerendo a intimação do devedor para pagar o débito no prazo de 15 dias, sob
pena de, não o fazendo, ter início a fase de cumprimento de sentença. Caso não haja pagamento, a fase de
cumprimento terá início, sem a necessidade de novo requerimento, com a expedição desde logo de
mandado de penhora e avaliação, iniciando-se automaticamente o prazo de 15 dias para impugnação.

FORMAS DE IMPLEMENTAÇÃO E EFETIVAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS: O NCPC torna explícita a disposição
de que dispõe o juiz de quaisquer meios lícitos para implementação de suas decisões. O art. 139, IV, CPC,
explicita os poderes de imperium conferidos ao juiz para concretizar suas ordens. A regra se destina tanto a
ordens instrumentais (aquelas dadas pelo juiz no curso do processo, para permitir a decisão final) como a
ordens finais (consistentes nas técnicas empregadas para a tutela da pretensão 'material' deduzida). De
acordo com a norma, o juiz pode determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou
sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que
tenham por objeto prestação pecuniária.
No cumprimento de sentença das obrigações de fazer ou de não fazer, o código expressamente
reconhece poderes ao juiz para efetivação da tutela específica ou obtenção de tutela pelo resultado prático
equivalente, determinando as medidas necessárias à satisfação do exequente. Há um rol não exaustivo de
medidas: imposição de multa, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e
impedimento de atividade nociva. Este dispositivo (art. 536, §1º) rompe com o dogma da tipicidade dos
meios destinados ao cumprimento das decisões judiciais.
Além disso, prevê o art. 537 do CPC, para que a sentença mandamental tenha força persuasiva para
coagir alguém a fazer ou não fazer, a imposição de multa coercitiva (astreintes), possuindo caráter punitivo
(é cabível também contra a Fazenda Pública). Assim, não tem qualquer relação com o valor da prestação que
se quer observada. O juiz pode modificar a qualquer tmpo, de ofício ou a requerimento, o valor ou
periodicidade da multa.

8C. Recurso especial. Reclamação

André Rios Gomes Bica

I. Recurso especial

1. Introdução

Recurso extraordinário (ou recurso excepcional, ou recurso de superposição) é gênero do qual são
espécies o recurso extraordinário (RE) para o STF e o recurso especial (REsp) para o STJ. Com a criação do STJ
pela CRFB/88, as hipóteses de cabimento do antigo recurso extraordinário foram repartidas entre o STF e o
STJ. Por essa razão, o RE e REsp possuem regime jurídico comum, com diversas características semelhantes.
Para evitar repetições desnecessárias, far-se-ão remissões ao ponto 6c, que tratou do recurso extraordinário.

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A principal função constitucional do Superior Tribunal de Justiça é promover a unidade do Direito,
uniformizar a jurisprudência nacional, eliminando divergência havida entre tribunais diferentes,
independentemente do tipo de recurso em que proferido o precedente.

2. Cabimento

As hipóteses de cabimento do recurso especial estão previstas no art. 105, III, da CRFB/88.
Diferentemente do RE, não cabe REsp em decisão de Turma Recursal de Juizado Especial, por não configurar
Tribunal (súmula 203 do STJ). Segundo a Corte Especial do STJ (alteração jurisprudencial), cabe o recurso
especial em remessa necessária.
"Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais
ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida:

a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;

A simples transcrição de artigos de lei ou a fundamentação genérica tornam deficiente o recurso


especial, devendo o recorrente indicar, com clareza e objetividade, a razão da negativa de vigência da lei e
qual a sua correta interpretação. Lei federal deve ser interpretada em sentido amplo, compreendendo lei
ordinária, complementar, decreto autônomo, decreto-lei, MP etc. Não cabe REsp quando a decisão
contrariar regimento interno.

Não cabe o recurso especial, pela letra "a" do inciso III do art. 105 da CF/88, por suposta ofensa a
entendimento jurisprudencial do próprio STJ, ainda que se trate de entendimento firmado em julgamento
de casos repetitivos ou assunção de competência (Súmula 518 STJ).
b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal;

O texto anterior à EC n. 45 previa também REsp quando a decisão julgasse válida lei local em face
de lei federal. Essa hipótese foi excluída porque eventual conflito existente entre lei local e lei federal é um
conflito de competência legislativa (matéria constitucional) que gera RE, a ser julgado pelo STF.
c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal".

É preciso que essa divergência seja atual e se dê entre tribunais diversos. Não cabe o recurso
especial se a divergência ocorrer dentro do mesmo tribunal (súmula 13 STJ).

O art. 1.029, §1º do NCPC prevê que quando o recurso se fundar em dissídio jurisprudencial, o
recorrente fará a prova da divergência, devendo-se, em qualquer caso, mencionar as circunstâncias que
identifiquem ou assemelhem os casos confrontados.

A parte final do §1º trata do que a praxe forense convencionou denominar de confronto ou cotejo
analítico entre o acórdão recorrido e o acórdão paradigma.

3. Características (para análise detida das características, ver item 3 do ponto 6c)

São características do recurso especial:

3.1 Recurso de fundamentação vinculada/ efeito devolutivo horizontal restrito: (hipóteses de cabimento
taxativamente previstas no art. 105, III, CRFB) e vedação ao reexame de questões de prova ou de fatos
(súmula 07 STJ), sendo, no entanto, admissível recurso por violação às normas do direito probatório, que não
se confunde com reanalisar as provas.

3.2 Não cabe REsp para discutir mera interpretação de cláusula contratual (súm. 5 STJ). O mero reexame de
provas ou de cláusula contratual não se confunde com a qualificação jurídica da prova ou da cláusula
contratual.
95
3.3 Exige-se o prévio esgotamento das instâncias ordinárias, sendo inadmissível a interposição de recurso
especial per saltum (105,III, CRFB/88 c/c súm. 281 STF e 207 STJ).

3.4 Possibilidade de interposição simultânea de RE e REsp como exceção ao princípio da unirrecorribilidade.

3.5 Primazia da decisão do mérito do recurso extraordinário ou especial (art. 1.029, §3º, cpc)

3.6 Exigência dos requisito específico de admissibilidade do prequestionamento e da repercussão geral

3.7 Ausência de efeito suspensivo ope legis em regra

O recurso extraordinário e o recurso especial não têm efeito suspensivo automático (art. 995,
NCPC). Exceção – IRDR (art. 987,§1º,NCPC). Sobre o tema, ver item 3.7 do ponto 6c.

3.8 Fungibilidade entre RE e REsp

4. Procedimento – ver item 4 do ponto 6.c.

II. Reclamação

1. Introdução
A reclamação constitucional nasceu na jurisprudência do STF com fundamento na teoria dos
poderes implícitos. Ela está prevista no RISTF nos arts. 156 a 162.
A reclamação constitucional é uma ação de competência originária de tribunal, prevista na
Constituição Federal e nas Constituições Estaduais, que tem o objetivo de preservar a competência e
garantir a autoridade das decisões destes tribunais.
De acordo com o art. 102, I, L, da Constituição Federal, cabe ao Supremo Tribunal Federal processar
e julgar, originariamente, a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de
suas decisões. Na dicção do art. 105,I,F, da Constituição da República, compete ao Superior Tribunal de
Justiça processar e julgar, originariamente, a reclamação para preservação de sua competência e garantia de
autoridade de suas decisões.
A reclamação era regulada pela Lei n. 8.038/1990. O Código de Processo Civil de 2015 passou a
dispor sobre a reclamação, revogando os dispositivos da L.8.038.
2. Natureza jurídica
Há três correntes sobre a natureza jurídica da reclamação: a) recurso; b) ação constitucional (Fredie
Didier); c) manifestação do direito constitucional de petição.
A posição tradicional do STF era de que a reclamação era o veículo para o exercício do direito de
petição previsto no art. 5º, XXXIV da CRFB/88, razão pela qual não eram cabíveis custas nem condenação em
honorários.
No entanto, o STF parece ter alterado sua posição recentemente:
2. O CPC/2015 promoveu modificação essencial no procedimento da reclamação, ao instituir o
contraditório prévio à decisão final (art. 989, III). Neste novo cenário, a observância do princípio da
causalidade viabiliza a condenação da sucumbente na reclamação ao pagamento dos respectivos
honorários, devendo o respectivo cumprimento da condenação ser realizado nos autos do processo de
origem, quando se tratar de impugnação de decisão judicial. 3. Agravo interno a que se nega provimento”
(Rcl nº 24.417/SP-AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe de 24/4/2017).
3. Cabimento e legitimidade
O art. 988 do CPC prevê que a reclamação pode ser proposta perante qualquer tribunal, e seu
julgamento compete ao órgão jurisdicional cuja competência se busca preservar ou cuja autoridade se
pretenda garantir. Cabe reclamação para:
(I) preservar a competência do tribunal; (II) garantir a autoridade das decisões do tribunal; (III)
garantir a observância de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de
constitucionalidade e garantir a observância de enunciado de súmula vinculante; e (IV) garantir a

96
observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de
incidente de assunção de competência.
Cada uma das hipóteses previstas no art. 988 corresponde a uma causa de pedir suficiente para
fundamentar a reclamação.
Nos termos de seu § 5º, II, é cabível a reclamação para garantir a observância de acórdão de recurso
extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos
especial ou extraordinário repetitivos, mas só depois de esgotadas as instâncias ordinárias . Note-se que
essa redação decorreu da Lei 13.256/2016, editada durante a vacatio legis do NCPC, objetivando restringir a
possibilidade de reclamações diretas aos Tribunais Superiores.

O STF afirmou que essa hipótese de cabimento prevista no art. 988, § 5º, II, do CPC deve ser interpretada
restritivamente, sob pena de o STF assumir, pela via da reclamação, a competência de pelo menos três
tribunais superiores (STJ, TST e TSE) para o julgamento de recursos contra decisões de tribunais de 2º grau de
jurisdição.

Assim, segundo entendeu o STF, quando o CPC exige que se esgotem as instâncias ordinárias, significa que a
parte só poderá apresentar reclamação ao STF depois de ter apresentado todos os recursos cabíveis não
apenas nos Tribunais de 2º grau, mas também nos Tribunais Superiores (STJ, TST e TSE). Se ainda tiver
algum recurso pendente no STJ ou no TSE, por exemplo, não caberá reclamação ao STF.

Em suma, nos casos em que se busca garantir a aplicação de decisão tomada em recurso extraordinário com
repercussão geral, somente é cabível reclamação ao STF quando esgotados todos os recursos cabíveis nas
instâncias antecedentes. STF. 2ª Turma. Rcl 24686 ED-AgR/RJ, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em
28/10/2016 (Info 845).

A reclamação pode ser ajuizada pelo Ministério Público ou por quem seja parte ou assistente num
processo prévio.
O sujeito passivo da reclamação é o beneficiário do ato reclamado, e não a autoridade que
descumpre a decisão do tribunal ou usurpa sua competência.
A autoridade, o órgão, a entidade ou a pessoa que descumpra a decisão do tribunal ou usurpe sua
competência prestará informações no processo da reclamação (art. 989, I, CPC), na qualidade de fonte de
prova.
A reclamação por desrespeito a enunciado de súmula vinculante pode ser intentada contra
autoridade judiciária ou administrativa, não cabendo contra o legislador na sua função legiferante.
O beneficiário do ato reclamado, réu na reclamação, há de ser citado para, querendo, apresentar sua
defesa em favor da manutenção do ato reclamado. Se a parte adversária ao reclamante for o beneficiário
direto do ato impugnado, deve ser ela ré na ação de reclamação, sob pena de nulidade da decisão
eventualmente proferida sem o respeito à garantia do contraditório.
A inadmissibilidade ou o julgamento do recurso interposto contra a decisão proferida pelo órgão
reclamado não prejudica a reclamação.
Não é cabível a propositura de reclamação preventiva. incidido em alguma das outras hipóteses de
cabimento deste instituto. STF. Decisão monocrática. Rcl 25310 MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em
03/10/2016 (Info 845). STF. Plenário. Rcl 4058 AgR, Rel. Min. Cezar Peluso.
4. Reclamação por desrespeito a súmula vinculante
Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar súmula vinculante ou que a aplique indevidamente,
cabe reclamação ao Supremo Tribunal Federal. Julgada procedente a reclamação, o STF anulará o ato
administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, determinando que outra seja proferida com ou sem a
aplicação da súmula.

A reclamação é cabível, se a súmula vinculante não for atendida por órgão jurisdicional ou administrativo.
Se algum órgão legislativo, desconsiderando o conteúdo de determinada súmula vinculante, elabora lei ou
norma com conteúdo que afronta a interpretação dada pelo STF, retratada no enunciado sumular, contra tal
lei não cabe intentar uma reclamação ao STF, mas sim uma Ação Direta de Inconstitucionalidade.

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Se a causa de pedir da reclamação é a violação de uma decisão ou de súmula vinculante do STF, a
reclamação torna-se um instrumento de proteção da ordem constitucional. No caso, o STF poderá, na
reclamação, declarar incidentalmente a inconstitucionalidade de normas tidas como fundamento da decisão
ou do ato que é impugnado na reclamação. Por exemplo, na Reclamação 4.374/PE, foi declarada a
inconstitucionalidade da previsão legal de renda de ¼ do salário mínimo per capita, devendo a
miserabilidade ser auferida no caso concreto. Ou seja, em sede de uma reclamação, o Tribunal reavaliou
aquilo que havia sido decidido na ADIn 1.232, alterando seu entendimento.
A utilização da reclamação para garantir a autoridade de Súmula Vinculante do STF contra ato
administrativo (não-jurisdicional), exige o prévio exaurimento das instâncias administrativas, nos termos do
art. 7º da Lei 11.417/06.
5. Reclamação e decisão transitada em julgado
Não há prazo para ajuizamento da reclamação, mas é inadmissível, segundo o § 5º, I, do art. 988 do
NCPC, a reclamação proposta após o trânsito em julgado da decisão. A reclamação não é sucedânea de
ação rescisória. Esse é o teor da súmula 734 do STF.
Ajuizada a tempo a reclamação, o superveniente trânsito em julgado não a torna incabível, pois,
nessa hipótese, não se está a utilizá-la como sucedâneo de ação rescisória.
6. Procedimento
O procedimento da reclamação passou a ser disciplinado pelo NCPC, mais precisamente nos seus
arts. 988 a 993.

A reclamação deverá ser instruída com prova documental (prova pré-constituída ou cognição
secundum eventum probationis para Marinoni/Arenhart) e dirigida ao presidente do tribunal.
O relator requisitará informações da autoridade a quem for imputada a prática do ato impugnado no
prazo de 10 dias; se necessário ordenará a suspensão do processo ou do ato impugnado para evitar dano
irreparável e determinará a citação do beneficiário da decisão impugnada para apresentar contestação no
prazo de 15 dias.
ENUNCIADO 64 I Jornada de Direito Processual Civil CJF – Ao despachar a reclamação, deferida a
suspensão do ato impugnado, o relator pode conceder tutela provisória satisfativa correspondente à decisão
originária cuja autoridade foi violada.
O art. 991 do CPC estabelece que, na reclamação que não houver formulado, o Ministério Público
terá vista dos autos por cinco dias, após o decurso do prazo para informações e para o oferecimento da
contestação pelo beneficiário do ato impugnado. O dispositivo deve ser cotejado com as funções
institucionais do MP delineadas na Constituição e na racionalização da intervenção do MP no processo civil.
A reclamação é uma ação originária de tribunal, não sendo ajuizada perante juízos de primeira
instância. Logo, não cabem apelação, nem agravo de instrumento, pois estes são recursos interpostos contra
decisões proferidas por juízos de primeira instância. Das decisões proferidas em reclamação cabem
embargos de declaração. Contra as decisões proferidas pelo relator cabe agravo interno (art. 1.021, CPC).
Quando julgada a reclamação por tribunal de segunda instância, cabe recurso especial; contra os
acórdãos cabe, se for o caso, o recurso extraordinário.
7. Reclamação contra decisões de juizado
Como não cabe REsp contra decisão de turma recursal (S. 203 STJ) que deixa de observar a
autoridade do STJ, até a resolução 12/2009 admitia-se reclamação no STJ contra a decisão de Turma Recursal
em JEC.
Para superar o volume de reclamações recebidas, o STJ editou a Resolução STJ 03/2016, segundo a
qual a parte poderá ajuizar reclamação no Tribunal de Justiça quando a decisão da Turma Recursal Estadual
(ou do DF) contrariar jurisprudência do STJ. Dessa forma, é como se tivesse havido uma "delegação" aos
Tribunais de Justiça da competência para analisar se a decisão da Turma Recursal afrontou ou não a
jurisprudência do STJ.
A medida é considerada ilegal e inconstitucional segundo parcela da doutrina, uma vez que a
Resolução STJ 03/2016 cria uma espécie de "reclamação" na qual o Tribunal que a julga não é aquele que
teve a sua decisão afrontada. Em outras palavras, o TJ julgará reclamação por violação de decisões de outro

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Tribunal (STJ). Outrossim, a resolução cria nova competência para os Tribunais de Justiça sem previsão em lei
ou na CRFB.
Note-se que o mesmo problema não ocorre nos JEFS ou JEFP, pois as respectivas leis preveem o
mecanismo do pedido de uniformização de jurisprudência

Qual é o instrumento jurídico cabível contra acórdão de Turma Recursal que viole entendimento
consolidado ou mesmo sumulado do STJ?

1) Juizado Especial Estadual: 2) Juizado Especial Federal: 3) Juizado da Fazenda Pública:

Reclamação para o TJ Pedido de uniformização de Pedido de uniformização de


jurisprudência. jurisprudência.
Fundamento:
Fundamento: Fundamento:
Resolução 03/2016 do STJ.
art. 14 da Lei nº 10.259/2001. art. 19 da Lei nº 12.153/2009.
Hipóteses de cabimento:
Hipóteses de cabimento: Hipótese de cabimento:
Cabível quando a decisão da Turma
contrariar jurisprudência do STJ Cabível quando a decisão da Cabível quando a decisão da
consolidada em: Turma contrariar: Turma contrariar súmula do STJ.

a) incidente de assunção de a) jurisprudência dominante do


competência; STJ; ou

b) incidente de resolução de b) súmula do STJ.


demandas repetitivas (IRDR);

c) julgamento de recurso especial


repetitivo;

d) Súmulas do STJ;

e) precedentes do STJ.

9A. Resposta do réu: contestação e reconvenção. Revelia.

Daniel Medeiros Santos

I) Resposta do réu: contestação e reconvenção

Do mesmo modo que se fala do direito de ação como o direito de provocar a atividade jurisdicional,
relacionando-o ao autor (demandante), fala-se da exceção como o direito do réu de resistir à postulação que
lhe foi formulada, de ser ouvido e de ter, como consequência, uma decisão que aprecie a postulação do
autor. Ambos são assegurados constitucionalmente (art. 5º, XXXV e LV, CRFB/88).
Assim como o direito de ação, o direito de defesa se desdobra em um conjunto de garantias que
confere ao réu a possibilidade de apresentar as suas alegações, produzir as suas provas, recorrer etc. Como
desdobramento dessa ideia, tem-se que, assim como o autor, também o réu tem direito a um procedimento
adequado, em que possa exercer o seu direito de defesa de uma forma adequada, como manifestação das
garantias constitucionais.
Assim como o direito de ação, a exceção também pode ser subdividida em suas acepções pré-
processual, processual e material.

Sentido Ação Exceção


Ação como direito abstrato de provocar a Exceção como direito abstrato de defesa
Pré-processual atividade jurisdicional do Estado-juiz em processo jurisdicional (sentido
(sentido estático). estático).
Ação como exercício do direito abstrato de Exceção como exercício do direito

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Processual provocar a atividade jurisdicional do abstrato de defesa em processo judicial
Estado-juiz (ação concretamente exercida: (defesa concretamente exercida: sentido
sentido dinâmico). dinâmico). Exceção, aqui, é ato.
Ação como o próprio direito material em Exceção como situação jurídica ativa, que
exercício. Trata-se de acepção antiga, a lei material considera como apta a
Material oriunda do Direito Romano, que não impedir, retardar ou extinguir a eficácia
distinguia relação jurídica processual da de determinada pretensão manifestada
relação jurídica material deduzida no pelo autor e que é exercitada como
processo. defesa.

Quando se estuda o direito de defesa no desenvolvimento do processo, o que se estuda é o direito


de defesa concretamente exercido, em seu sentido processual. Dentro dessa ideia, há algumas classificações
de relevância.
Uma delas é a que subdivide a defesa em processual ou de admissibilidade e de mérito. A primeira
tem por objeto os requisitos de admissibilidade da causa (condições da ação e pressupostos processuais), ao
passo que a segunda tem por objeto a defesa que o demandado opõe contra a pretensão do demandante,
para neutralizar os seus efeitos, para retardar a produção destes efeitos, para extingui-los ou para negá-los
peremptoriamente.
Outra subdivisão classificatória divide as matérias de defesa em objeções e exceções. Dessa forma,
exceção, em uma acepção ainda mais estrita, seria a alegação de defesa que, para ser conhecida pelo
magistrado, precisa ter sido arguida pelo interessado. Considera-se objeção, por sua vez, a matéria de defesa
que pode ser conhecida ex officio pelo magistrado.
Podemos falar também em exceções dilatórias e exceções peremptórias. Exceção dilatória é aquela
que apenas dilata no tempo o exercício de determinada pretensão, como, i.e., a nulidade da citação e a
conexão. Exceção peremptória é aquela que objetiva fulminar o exercício da pretensão, como a prescrição, a
compensação, o pagamento etc.
Por fim, podemos falar em defesa direta e indireta. Considera-se defesa direta aquela em que o
demandado se limita (a) a negar a existência dos fatos jurídicos constitutivos do direito do autor ou (b) negar
as consequências jurídicas que o autor pretende retirar dos fatos que aduz (embora reconheça a existência
dos fatos, nega-lhes a eficácia jurídica pretendida) – o réu, ao assim defender-se, não aporta ao processo
nenhum fato novo. Só se pode falar em defesa direta de mérito, pois todas as defesas processuais são
indiretas. O demandado apresenta defesa indireta quando agrega ao processo fato novo, que impede,
modifica ou extingue o direito do autor.
Expostas essas linhas iniciais, cumpre observar que, frustrada a tentativa de solução do processo por
autocomposição, ou não sendo o caso de designação da audiência preliminar, abre-se ao réu a oportunidade
de apresentar a sua resposta à demanda.

É através da contestação que o réu, querendo, veicula a sua defesa. A contestação é o instrumento
da exceção concretamente exercida, assim como a petição inicial é o instrumento da ação exercida. No
procedimento comum, a contestação é escrita e deve ser assinada por quem tenha capacidade postulatória –
advogado, membro do MP ou defensor público.
O prazo para o seu exercício é de 15 dias, tendo como termo inicial (a) a data da audiência de
conciliação ou de mediação, ou da última sessão, quando qualquer parte não comparecer ou,
comparecendo, não houver autocomposição; (b) a data do pedido de cancelamento da referida audiência
apresentado pelo réu; ou (c) um dos momentos do art. 231 do CPC, a depender da modalidade citatória. Esse
prazo deve ser contado em dobro nos casos especificados no CPC (i.e., MP, DP, litisconsortes com
procuradores de escritórios distintos).

Regra de basilar importância aplicável à contestação é a regra da eventualidade, prevista no art. 336
do CPC. Por ela, toda defesa deve ser formulada de uma só vez como medida de previsão, sob pena de
preclusão. O réu tem o ônus de alegar tudo o quanto puder, pois, caso contrário, perderá a oportunidade de
fazê-lo. A regra da eventualidade autoriza, então, que o réu deduza defesas logicamente incompatíveis. Mas
o princípio da boa-fé processual impõe que essa cumulação de defesas incompatíveis tenha limites. Nem
toda ilogicidade é superada pela regra da eventualidade.
100
O art. 337 do CPC elenca as chamadas “questões preliminares”, isto é, aquelas que necessariamente
devem ser enfrentadas preliminarmente às questões de mérito. O CPC de 2015 inovou em alguns aspectos.
Sob a égide do CPC de 1973, várias questões podiam ser arguidas fora da contestação, em peças
apartadas. Hoje, questões que, antes, eram arguidas separadamente, passaram a se concentrar na
contestação (i.e., incompetência relativa, incorreção do valor da causa e impugnação à gratuidade de
justiça). Como exceção que ainda se mantém, devendo ser arguida em peça apartada, temos a arguição de
impedimento ou suspeição do juiz, membro do MP ou auxiliar da justiça. Ademais, como é intuitivo, eventual
alegação atinente a direito ou fato superveniente também pode ser feita posteriormente.
Outra inovação refere-se à extinção da modalidade de intervenção de terceiros denominada
“nomeação à autoria”. Agora, a alegação de ilegitimidade passiva, formulada pelo réu em sua defesa,
confere ao autor o direito de, no prazo de 15 dias, pedir a alteração da petição inicial para a substituição do
réu (art. 338 do CPC). O autor tem, ainda, o direito de optar por substituir o réu ou ampliar o polo passivo.

Vale ressaltar que, embora as questões de admissibilidade necessariamente devam ser analisadas
antes das questões de mérito, há sólido entendimento doutrinário que propugna a quebra do dogma da
primazia da defesa de admissibilidade sobre a defesa de mérito. Isso porque, quando se puder decidir no
mérito a favor da parte a quem se aproveite a nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato
ou suprir-lhe a falta. A falta de um requisito de admissibilidade que visa proteger o réu pode ser ignorada,
por exemplo, se o órgão julgador puder julgar improcedente a demanda. A primazia, portanto, é do
julgamento de mérito.

Uma outra regra de grande relevância para a contestação é a que consagra o ônus da impugnação
especificada, prevista no art. 341 do CPC. O réu, portanto, não pode apresentar a sua defesa com a negativa
geral das alegações de fato apresentadas pelo autor; cabe ao réu impugná-las especificadamente, sob pena
de a alegação não impugnada ser havida como verdadeira. O parágrafo único do art. 341 estabelece que esse
ônus não se aplica quando a defesa tiver sido apresentada por defensor público, advogado dativo ou curador
especial. No tocante à Fazenda Pública, não mencionada pelo dispositivo, há controvérsia: uma primeira
posição entende pela aplicabilidade do ônus aos advogados públicos (Didier), ao passo que uma segunda
posição propugna a sua inaplicabilidade a estes agentes públicos, à luz da indisponibilidade do direito, da
inamissibilidade da confissão e da presunção de legitimidade dos atos administrativos (Leonardo Carneiro da
Cunha).
O art. 341 lista, em seus incisos, algumas situações em que, mesmo não ocorrendo a impugnação
especificada, não ocorrerá a mencionada presunção de veracidade: i) quando não for admissível a confissão
a respeito da questão não impugnada; ii) quando a petição inicial estiver desacompanhada de instrumento
que a lei considere da substância do ato; ou iii) se as alegações estiverem em contradição com a defesa,
considerada em seu conjunto.

Já a reconvenção é verdadeira demanda do réu contra o autor no mesmo processo em que está
sendo demandado. É o contra-ataque que enseja o processamento simultâneo de ação principal e da ação
reconvencional, a fim de que o juiz resolva as duas lides na mesma sentença. Trata-se de incidente
processual que amplia o objeto litigioso do processo. Chama-se reconvinte o réu-demandante e reconvindo
o autor-demandado.
Uma das controvérsias que envolve a reconvenção é a que se debruça sobre a possibilidade de
ampliação subjetiva do processo na reconvenção. Antes do CPC de 2015, havia grande controvérsia
doutrinária e jurisprudencial. O novo Código veio a contornar esta controvérsia, tratando expressamente do
tema: o art. 343, §§ 3º e 4º, permite que a reconvenção possa ser proposta pelo réu e um terceiro em
litisconsórcio, bem como que ela possa ser proposta pelo réu contra o autor e um terceiro.
Para obstaculizar a situação em que o terceiro, ao formar litisconsórcio simples com o réu em
demanda reconvencional contra o autor, escolheria o juízo perante o qual essa demanda seria processada –
em mitigação ao princípio do juiz natural –, Didier faz alguns apontamentos: a) a reconvenção
subjetivamente ampliativa será possível quando conduzir à formação de litisconsórcio ulterior por
colegitimação (em regra, unitário) ou em situações de conexão; b) já o litisconsórcio por afinidade de
questões (que é sempre simples), a princípio, só se vislumbra quando se tratar de litisconsórcio necessário
simples, cuja formação se dê por força de lei.
101
A reconvenção exige o preenchimento de alguns requisitos: i) que haja uma causa pendente, por não
existir reconvenção autônoma, o que seria uma contradição em termos; ii) que seja apresentada no mesmo
prazo da contestação e na mesma peça em que ela é apresentada, sob pena de preclusão consumativa – de
toda maneira, o réu pode reconvir independentemente de contestar, se esta for a sua vontade (art. 343, §
6º, do CPC); iii) que o juízo da causa principal também seja competente para julgar a reconvenção (caso
contrário, indeferirá a petição inicial do réu-reconvinte, não admitindo o seu processamento – a
consequência não pode ser a remessa dos autos ao juízo competente, pois só se pode cogitar reconvenção se
houver ação); iv) que o procedimento da demanda reconvencional seja compatível com o procedimento da
causa principal, tendo em vista que ambas serão processadas conjuntamente; v) que haja conexão da
reconvenção à ação principal ou a algum dos fundamentos da defesa; vi) a observância do interesse
processual, isto é, quando o efeito prático almejado pela reconvenção puder ser alcançado com a simples
contestação, como ocorre nas ações dúplices, não se admite reconvenção por ausência de interesse
processual; ademais, também não se admite reconvenção para a alegação de exceção substancial, que deve
ser exercida como defesa (i.e., compensação).

No tocante à reconvenção em face do substituto processual, o CPC de 2015 estabelece que o réu
deverá fundar o seu pedido em pretensão que tenha em face do substituído, desde que para tal pretensão
o substituto tenha legitimação extraordinária passiva (§5º do art. 343 do CPC).

In fine, não deve haver confusão entre os conceitos de reconvenção e pedido contraposto. Isso
porque, malgrado o pedido contraposto seja também uma espécie de demanda do réu no mesmo processo
(são espécies do mesmo gênero, portanto), trata-se de demanda mais simplificada do que a reconvenção. No
pedido contraposto há restrição legal quanto à sua amplitude (nos JEC, deve ficar restrito aos “fatos da
causa”; nas possessórias, admite-se apenas o pedido de indenização). A reconvenção, de seu lado, é
demanda que pode ter variada natureza: pela lei, basta que seja conexa com a ação principal ou com os
fundamentos de defesa. Não há qualquer outra restrição.

II) Revelia

A revelia é um ato-fato processual, consistente na não apresentação tempestiva da contestação.


Não se pode confundir a revelia, que é um ato-fato, com a presunção de veracidade dos fatos afirmados pelo
autor, que é um dos seus efeitos.

→ A revelia produz os seguintes efeitos:


a) como efeito material, a presunção de veracidade das alegações de fato feitas pelo demandante;
b) os prazos contra o réu revel que não tenha advogado fluem a partir da publicação da decisão;
c) preclusão em desfavor do réu do poder de alegar algumas matérias de defesa (com exceção das previstas
no art. 342: direito/fato superveniente; matérias cognoscíveis ex officio; e que, por autorização legal,
puderem ser formuladas em qualquer tempo e grau de jurisdição);
d) julgamento antecipado do mérito da causa, caso não se produza o efeito material da revelia.
O art. 345 do CPC elenca quatro situações em que o efeito material da revelia não se produz.

A primeira deles ocorre quanto, havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação. Nesse
caso, não haverá a presunção de veracidade quanto à alegação de fato que seja comum ao litisconsorte revel
e àquele que contestou.
A segunda ocorre quando o direito material em discussão é indisponível. Em verdade, parcela da
doutrina aponta que é melhor entender como sendo direito sobre o qual a vontade das partes é ineficaz para
produzir efeito jurídico que pela ação se pretende obter, como ocorre com o CPC português. Se a parte não
pode confessar o fato afirmado pelo autor, a revelia não pode gerar uma confissão ficta.
A terceira ocorre quando a inicial não estiver acompanhada de instrumento que a lei considere da
substância do ato.
A quarta e última ocorre quando as alegações de fato formuladas pelo autor forem inverossímeis
ou estiverem em contradição com prova constante dos autos.

102
O réu revel pode intervir no processo em qualquer fase, recebendo-o no estado em que se
encontrar, passando, a partir daí, a ser intimado dos atos que forem praticados no processo. Ademais, o réu
revel que tenha patrono nos autos deverá ser intimado dos atos processuais – somente ao réu revel que não
tenha patrono nos autos é que se aplica o efeito da revelia de dispensa da intimação dos atos processuais.

Oportuno ressaltar que, se houver revelia, não se poderá estender a coisa julgada à resolução da
questão prejudicial incidental (art. 503, §1º, II, CPC). Entende-se que, com a revelia, não há contraditório
suficiente para a extensão da coisa julgada à resolução de questão que não seja a principal.

9B. Procedimento probatório. Provas em espécie.

Sidney Smith
- Usei apenas a obra Curso de Processo Civil de Marinoni, Arenhart e Mitidiero (são mais de 50 páginas).

1) Depoimento Pessoal: o depoimento pessoal é diferente do chamado interrogatório livre, disciplinado pelo
art. 139, VIII. Pode-se dizer que o interrogatório livre é muito mais forma de esclarecimento, de que se vale o
juiz para melhor inteirar-se dos fatos do processo, do que propriamente meio de prova. Ao contrário, o
depoimento pessoal (ou da parte) tem nítido e específico fim probatório, já que seu objetivo primário é obter
a confissão da parte adversa. Uma diferença que chama atenção é que o interrogatório livre pode ser único
ou múltiplo, no sentido de que a parte pode ser ouvida várias vezes em um único processo; já o depoimento
pessoal é sempre único, realizado, normalmente, na audiência de instrução e julgamento. Por fim, a ausência
injustificada ao depoimento da parte acarreta-lhe a aplicação da chamada confissão ficta (art. 385, § 1.º); já
isso não ocorrerá em relação ao interrogatório livre (art. 139, VIII, in fine). Para compreender
adequadamente, então, o depoimento da parte, é fundamental que se tenha firme o conceito de parte.
Afinal, a posição jurídica daquele que depõe em juízo é que determina a qualificação da prova como “prova
testemunhal” ou como “depoimento pessoal”. Tal conceito – parte-se dessa premissa – deve ser buscado
estritamente no direito processual, sem que seja possível sua influência pelo direito material. Dessa forma,
submetem-se ao depoimento pessoal o assistente litisconsorcial, o denunciado à lide, o chamado ao processo
e o opoente. Quanto à figura do assistente simples, sua situação peculiar – quanto à caracterização de sua
situação jurídica no processo – gera, consequentemente, tratamento disforme na doutrina e na
jurisprudência. João Batista Lopes considera que o assistente litisconsorcial presta depoimento pessoal,
enquanto o assistente simples, não dispondo da condição de parte, mas constituindo mero auxiliar desta, não
se submete a esse instituto, sendo essa, ao ver de Marinoni, Arenhart e Mitidiero, a posição correta. Quanto
ao representante (de incapazes) ou ao presentante (de pessoas jurídicas), a questão também merece
avaliação detida. O problema se põe na medida em que tais pessoas não são propriamente partes no
processo, figurando nos atos processuais apenas porque a verdadeira parte (incapaz, pessoa jurídica ou
pessoa formal) não pode expressar sua vontade, validamente, por si própria. Ora, se o representante não é a
parte, parece claro que não pode ele ser sujeito do depoimento pessoal. Isso se justifica, na medida em que
não se pode confundir a condição de representante com a de parte – pena de admitir-se o depoimento
pessoal também do pai do menor, do curador do enfermo etc. Não obstante a aparente tranquilidade da
conclusão, é certo que a jurisprudência vem admitindo o depoimento pessoal de representante
(especialmente de pessoas jurídicas), aparentando discordar deste raciocínio, e equiparando – ao menos para
os fins do depoimento da parte – a parte real e seu representante. Tal equiparação, contudo, tem o nítido
propósito de aceitar, em juízo, a confissão feita por pessoas jurídicas. Por isso, não se há de falar em
depoimento pessoal de representante de incapaz, de pessoa jurídica ou de pessoa formal. Por não serem
partes, não prestam eles depoimento pessoal. Em relação à natureza jurídica do depoimento pessoal, três
correntes se formaram. Alguns autores consideravam que o depoimento pessoal era declaração de vontade,
semelhante àquilo que acontece no contrato. Outros viam no depoimento pessoal uma comunicação de
vontade. E finalmente havia quem entendesse a confissão como simples declaração de conhecimento, com
único propósito de prova (orientação dominante). Procedimento probatório: deve ser requerido na
oportunidade própria, pela parte adversária, não cabendo ao juiz impô-lo de ofício. A inquirição da parte
obedece, no que for compatível, ao procedimento previsto para a oitiva de testemunhas. Isto é, a parte, no
início de seu depoimento, será qualificada, passando a ser arguida pelo juiz diretamente. Após as perguntas
do juiz, pode o advogado da parte contrária à que presta o depoimento formular suas perguntas a esta, de
forma direta. Logicamente, porque a parte não pode ter interesse em provocar a sua própria confissão, não
se admite que o advogado da parte depoente possa formular-lhe perguntas. Quando ambas as partes devam
103
prestar depoimento pessoal, o magistrado providenciará que uma não assista ao depoimento da outra,
devendo-se, em primeiro lugar, ouvir o autor e, depois, o réu.

2) Confissão (art. 389): é ato exclusivo da parte. Exige-se, para a eficácia da confissão, a capacidade plena do
confitente. A confissão é apenas afirmação de que determinado fato ocorreu de certa forma. Diante dela,
para as partes há a verdade, razão por que não podem produzir outras provas sobre o fato confessado. Para o
juiz, contudo, a vinculação a essa “verdade das partes” apenas ocorrerá se outros meios de prova existentes
nos autos não infirmarem essa conclusão lógica. Quanto à natureza jurídica da confissão, tradicionalmente a
doutrina aponta que se trata de declaração de ciência sobre certo fato. Quando, evidentemente, decorrer de
erro ou coação, porque viciada a vontade, poderá ser anulada por ação anulatória (se pendente a ação em
que foi feita) ou por ação rescisória (após o trânsito em julgado da sentença que a utilizou). Elementos na
confissão: O elemento objetivo da confissão diz respeito aos fatos. A confissão incide sobre fatos, e
exclusivamente sobre eles. Quanto ao elemento subjetivo, tem-se que a confissão somente pode ser
celebrada pela parte. E, mais que isso, somente a parte plenamente capaz é que tem condições de confessar
– porque somente o capaz pode praticar validamente atos de disposição processual (e não material, como a
renúncia), em especial a confissão. Também fundado na mesma restrição é que o Código de Processo Civil
estabelece situação diferenciada para a confissão relativa a bens imóveis ou a direitos sobre imóveis alheios
(art. 391, parágrafo único), estabelecendo que a confissão de um dos cônjuges ou companheiro não é válida
sem a do outro. No que diz respeito ao elemento volitivo, pressupõe-se a vontade de dizer a verdade quanto
aos fatos. Interessa apenas que a confissão se faça com vontade livre e consciente; se, todavia, esta
realmente se destina a produzir confissão, isto já é algo irrelevante. Confissão efetiva e confissão ficta: Já se
observou que a confissão é ato positivo da parte, que declara em juízo ter ciência de que certo fato
realmente ocorreu (fato este favorável à parte contrária e prejudicial a si). A lei, todavia, equipara a essa
confissão – e para fim de estimular a parte a comparecer em juízo e prestar depoimento sobre os fatos da
causa – a ausência da parte depoente ao ato de colheita de seu depoimento pessoal, ou ainda sua recusa em
depor (art. 385, § 1.º). A essa ficção jurídica é que se designa confissão ficta. Os efeitos da ficta confessio
somente se operam no âmbito do processo em que esta ocorre, enquanto a confissão efetiva tem eficácia em
relação a outros processos futuros, desde que entre as mesmas partes. Confissão espontânea e provocada:
Tratando-se de confissão judicial, pondera a lei processual que essa pode ser espontânea ou provocada. A
confissão provocada resulta do depoimento pessoal, no qual a parte acaba por confessar fatos contrários a
seu interesse e favoráveis ao adversário. Já a confissão espontânea pode ocorrer em qualquer momento do
processo, quando a parte nele comparecer – através de representante legal com poderes específicos, ou
pessoalmente – e admitir a verdade de fatos contrários a seu interesse e favoráveis ao seu adversário.
Segundo prescreve o art. 395, a confissão é, em regra, indivisível. A divisibilidade dependerá da análise atenta
do órgão jurisdicional. Ou seja, poderá o juiz tomar por verossímil toda a confissão, se assim se convencer.
Apenas, não será obrigatório que assim proceda. A previsão da divisibilidade da confissão implica apenas
reconhecer que o juiz poderá considerar a confissão como efetivada na parte desfavorável, sem, contudo, ter
também de considerar como verídicas as demais afirmações do declarante.

3) Exibição de documento ou coisa: a legislação processual, ao tratar da exibição, não se preocupa


propriamente com um meio de prova, mas sim com uma tramitação processual, que se presta para oferecer
ao magistrado o meio de prova propriamente dito (o documento ou a coisa). O Código de Processo Civil
somente trata da determinação de exibição dirigida contra a parte ou contra o terceiro particular. Verifica-se
que a questão problemática cinge-se à figura do assistente simples. Este, ainda que intervindo em processo
em curso, mantém sua condição de terceiro, embora tenha poderes processuais semelhantes aos da parte no
processo. A relevância em distinguir a situação de parte ou de terceiro para a exibição está precisamente em
saber quais são as consequências da recusa na apresentação do documento ou coisa. Ora, se a exibição é
determinada contra terceiro, evidentemente não é possível ao juiz admitir como verdadeiro o fato que se
pretendia provar. Procedimento da exibição em face da parte: Constitui mero incidente do processo,
destinado à aquisição de prova. Também o juiz poderá determinar de ofício a exibição. O incidente pode ser
instaurado a pedido de algum sujeito parcial do processo, devendo conter a individualização da coisa ou do
documento a ser exibido, a finalidade da prova buscada e as razões pelas quais se entende que a coisa ou o
documento está em poder da parte solicitada (art. 397). Realizado o pedido, será o requerido intimado a
responder em cinco dias. Se o requerido não as apresentar, ou se o magistrado entender que as razões da
parte solicitada são ilegítimas, aplicará a sanção prevista no art. 400, admitindo como verdadeiros os fatos

104
que, por meio do documento ou da coisa, se queria provar. Todavia, nada impede que, em circunstâncias
excepcionais, seja determinada a exibição como consequência da procedência do pedido de exibição,
especialmente quando se mostrar incabível ou inútil a aplicação da referida presunção. Procedimento da
exibição em face de terceiro: será necessária verdadeira ação incidente, cumulada com a ação inicial, a ser
resolvida no processo. Assim, será necessário elaborar petição inicial, com obediência de todos os requisitos
dos arts. 319 e 320, citando-se o terceiro para responder ao pedido em quinze dias (art. 401). Se o
magistrado acolher o pedido de exibição, ordenará ao terceiro “que proceda ao respectivo depósito em
cartório ou em outro lugar designado, no prazo de cinco dias, impondo ao requerente que o ressarça pelas
despesas que tiver”. Na eventualidade de o terceiro não cumprir a ordem judicial, sujeitar-se-á à busca e
apreensão da coisa ou do documento, se necessário com o apoio de força policial, a par de outras sanções,
criminais, civis ou processuais.

4) Prova documental: nem todo “documento” (prova documentada) constitui, ipso facto, prova documental.
As declarações prestadas por testemunhas são documentadas, porque reduzidas a termo, em papel ou em
outro meio de documentação idôneo (art. 460); a prova pericial é documentada através do laudo (art. 477)
etc. E, apesar de todos esses atos estarem representados por “documentos” nos autos, nem por isso perdem
sua essência (de provas testemunhais, periciais etc.) para se tornarem provas documentais. Na prova
documental, portanto, o documento é capaz de, por si só, representar o fato; é, afinal, o elemento
representativo, o que não ocorre com as provas testemunhal e pericial (onde o elemento representativo é a
pessoa). A mesma força probatória que se confere ao documento público é outorgada a sua “reprodução”
(art. 425). De acordo com os incs. I, II e III do art. 425, as certidões textuais, traslados e reproduções
autenticadas por oficial público – que têm sua gênese confirmada por agente público – guardam a mesma
eficácia probante dos originais. O mesmo vale para as “cópias reprográficas de peças do próprio processo
judicial declaradas autênticas pelo advogado, sob sua responsabilidade pessoal, se não lhes for impugnada a
autenticidade” (inc. IV) e também os extratos digitais de bancos de dados públicos ou privados, quando
conferido seu teor pelo emitente (inc. V). Finalmente, também são consideradas cópias e têm o mesmo valor
do original as “as reproduções digitalizadas de qualquer documento público ou particular, quando juntados
aos autos pelos órgãos da justiça e seus auxiliares, pelo Ministério Público e seus auxiliares, pela Defensoria
Pública e seus auxiliares, pelas procuradorias, pelas repartições públicas em geral e por advogados,
ressalvada a alegação motivada e fundamentada de adulteração” (inc. VI). Quanto ao documento particular,
sua eficácia probatória depende de sua autenticidade (autoria certa). Segundo prevê o art. 408, “as
declarações constantes do documento particular escrito e assinado ou somente assinado presumem-se
verdadeiras em relação ao signatário” (na mesma linha, é a conclusão do art. 412). Assim é porque se
presume que o autor (intelectual) do documento particular é, precisamente, o sujeito que o elaborou e
assinou, ou somente o assinou, após mandar fazê-lo, ou ainda aquele que não o firmou, porque não é
comum assinar tal tipo de documento (art. 410).Essa autenticidade, essencial, portanto, para a eficácia
probatória do documento, permite, por sua importância, questionamento, tanto de modo simples, realizado
quando a parte é instada a manifestar-se sobre documento juntado (art. 436, II), quanto pelo incidente de
falsidade documental (arts. 430 a 433). O primeiro é apenas destinado a arguir a não autenticidade do
documento – porque há dúvida sobre sua autoria –, enquanto o segundo visa a efetivamente comprovar que
o autor do documento não é aquele que se supõe fosse, havendo falsificação no documento para tentar iludir
a autoria. A lei processual, em matéria de prova documental, prevê ainda a conversão de documento público
em particular, admitindo que o documento público, elaborado por servidor incompetente, ou sem obediência
das formalidades legais, tenha a mesma eficácia do documento particular (art. 407). em termos de eficácia
probatória do documento, prevê a lei que é princípio natural da prova documental sua indivisibilidade (art.
412, parágrafo único). A lei somente alude à indivisibilidade do documento particular, mas é certo que o
princípio tem aplicação, também, e com maior razão ainda, ao documento público. Tal como acontece com as
declarações prestadas pela parte, o documento deve ser interpretado como um todo incindível. Em regra, a
produção da prova documental tem momento próprio, concomitante com a apresentação, pelas partes, da
petição inicial e da resposta (art. 434). Eventualmente, para a comprovação de fato novo, podem-se
apresentar documentos ulteriormente (art. 435). Uma vez juntado o documento aos autos, deverá o
magistrado providenciar para a efetivação do contraditório sobre ele, autorizando à parte contrária
manifestar-se sobre a prova juntada. O prazo para esta manifestação será o da resposta do réu ou o da réplica
à contestação (art. 437) ou ainda o prazo de quinze dias, que poderá ser dilatado à vista da complexidade e
da quantidade da prova anexada (art. 437, §§ 1.º e 2.º). tratando-se de prova documental consistente em
105
reprodução cinematográfica ou fonográfica, prevê o CPC que o seu aporte ao processo se faça na forma
regular, mas que ela deva ser exibida em audiência, com a participação das partes (art. 434, parágrafo único).
Incidente de arguição de falsidade documental: o incidente de falso caberá sempre em relação às falsidades
materiais. Quanto às falsidades intelectuais, será necessário distinguir: se se tratar de documento narrativo,
também a arguição pelo incidente será viável, já que se pretende apenas declarar o documento como inábil
para a prova de certo fato; se o documento, ao contrário, for constitutivo, então será necessário propor ação
própria que objetive à desconstituição do ato jurídico (representado pelo documento) viciado. A arguição do
falso pode ocorrer em qualquer tempo ou grau de jurisdição, devendo a parte que tem interesse em fazê-lo
suscitá-lo na contestação (quando o documento tenha sido juntado aos autos na petição inicial), na réplica
(se o documento foi juntado com a defesa do réu) ou, então, no prazo de quinze dias, contados da juntada
aos autos do documento questionado (art. 430). Apresentada a alegação, será a parte contrária ouvida,
também em quinze dias (art. 432). Seguir- se-á a realização de prova pericial sobre o documento, exceto se a
parte que tiver juntado o documento nos autos concordar em retirá-lo (art. 432 e seu parágrafo único).A
decisão sobre a falsidade ou não de um documento será, em regra, feita em sentença, no dispositivo,
acobertada pela coisa julgada, como já se viu. Excepcionalmente, porém, não coexistindo as condições do art.
503, § 1.º, poderá ser feita incidentalmente no processo ou mesmo na fundamentação da sentença, sem,
todavia, sujeitar-se à imutabilidade da coisa julgada.

5) Ata notarial: trata-se de documento público, de autoria de um notário, razão pela qual seu valor probante
é aquele estipulado pelo art. 405. Assim, a ata notarial faz prova não apenas de sua existência, mas ainda dos
fatos que o notário atestar que ocorreram em sua presença ou que foram por ele verificados. Em última
análise, trata-se de maneira peculiar de criação de documento público, cuja finalidade é, especificamente,
servir de meio de prova. Distingue-se, comumente, a ata notarial da escritura pública, na medida em que esta
última se presta para a documentação de atos e negócios jurídicos, certificando a vontade das partes
interessadas. Já a ata notarial tem por finalidade específica a descrição de um fato que foi presenciado pelo
notário.

6) Prova testemunhal: sempre que a lei exigir prova escrita de certa obrigação, admite-se o emprego da
prova testemunhal quando houver início de prova escrita, oriunda da parte contra quem se pretende
produzir a prova (art. 444). Por início de prova escrita, considera-se a prova escrita capaz de constituir indício
do fato que se pretende provar. De outro lado, nos termos do art. 445, a prova exclusivamente testemunhal é
admissível – ainda que em tese se exigisse, para a demonstração de certo fato, prova escrita – “quando o
credor não pode ou não podia, moral ou materialmente, obter a prova escrita da obrigação, em casos como o
de parentesco, depósito necessário ou de hospedagem em hotel ou em razão das práticas comerciais do local
onde contraída a obrigação”. De início, por razões óbvias, somente a pessoa natural é que pode ostentar essa
condição. A pessoa jurídica, que sequer existe e, portanto, não tem sentidos próprios, não se presta a esse
meio de prova. A incapacidade da testemunha deriva de um vício objetivo, que a impede de presenciar
adequadamente fatos ou de retratá-los de maneira compreensível ou correta. Observe-se, porém, que nos
termos do art. 228, § 2º, do Código Civil, incluído pelo art. 114, da lei n. 13.146/2015, “a pessoa com
deficiência poderá testemunhar em igualdade de condições com as demais pessoas, sendo-lhe assegurados
todos os recursos de tecnologia assistiva”.O impedimento e a suspeição, ao contrário da incapacidade, dizem
com a habilitação subjetiva da pessoa em depor. As duas figuras geram resultados idênticos, decorrendo de
situações semelhantes, razão pela qual não existe propriamente critério objetivo. Os menores, os impedidos
e os suspeitos, quando isso for estritamente necessário, podem prestar depoimento, na condição de
informantes, sem, todavia, prestar compromisso de dizer a verdade (art. 447, § 4.º). Nesses casos, o juiz
valorará livremente a força que esses depoimentos possam ter, segundo o vício em que tais pessoas se
encaixam e as circunstâncias da causa. Os servidores públicos, quando for necessário colher seu depoimento,
devem ser requisitados junto a seus superiores, e não intimados a comparecer em juízo. Da mesma forma, as
pessoas enumeradas no art. 454 têm o direito de indicar o local e a data em que pretendam prestar o
depoimento, não se sujeitando, em regra, a comparecer à audiência para a colheita da prova testemunhal. O
juiz da causa, se for arrolado como testemunha, pode também se recusar a depor, se concluir que nada tem a
colaborar em termos de prova com o processo. Autorizada, na decisão de saneamento do processo, a
produção da prova testemunhal, o magistrado fixará prazo comum não superior a quinze dias, para que as
partes especifiquem a relação das testemunhas que pretendem ouvir (art. 357, § 4.º). Caso esse saneamento
ocorra em audiência, cabe as partes trazerem já para ela – e, portanto, mesmo antes da admissão de

106
produção dessa prova – a relação detalhada das testemunhas que pretendem ouvir (art. 357, § 5.º). O rol
poderá conter, no máximo, dez testemunhas; o juiz, porém, somente é obrigado a ouvir três testemunhas
sobre cada fato, sendo dispensável, a seu critério – e de acordo com a uniformidade desses três depoimentos
–, a oitiva das demais testemunhas arroladas sobre a mesma questão (art. 357, § 6.º). Pode ainda o juiz
limitar o número total de testemunhas, à vista da complexidade da causa e dos fatos específicos a serem
demonstrados. Oferecida a relação das testemunhas, o juiz designará audiência de instrução e julgamento,
onde elas serão ouvidas. Aceito o depoimento das pessoas arroladas, compete, em princípio, ao próprio
advogado do sujeito que as arrolou providenciar a sua intimação para comparecer na audiência designada
para sua oitiva (art. 455). Para tanto os advogados das partes (ou dos terceiros intervenientes, se for o caso)
providenciarão carta com aviso de recebimento, para a informação das testemunhas ou então poderá
comprometer-se a levar a testemunha independentemente de intimação. Pode-se utilizar de intimação
“judicial” sempre que: a) for frustrada a comunicação extrajudicial ou quando a parte demonstre,
justificadamente, a sua necessidade; b) a testemunha for servidor público, caso em que se deve providenciar
a sua requisição junto à sua chefia; c) a testemunha tiver sido arrolada pelo Ministério Público ou pela
Defensoria Pública; d) a testemunha gozar de privilégio de indicar o horário e o local para seu depoimento
(art. 455, § 4.º). Primeiramente, ouvem-se as testemunhas arroladas pelo autor, seguindo-se o depoimento
daquelas indicadas pelo réu e, posteriormente, as apontadas pelo Ministério Público (quando atua como
custos legis) e pelo juiz (quando a ouvida de testemunha tiver sido determinada sem requerimento, isto é, de
ofício). A ordem de oitiva, porém, pode ser alterada, se as partes concordarem (art. 456, parágrafo único). Ao
iniciar a colheita do depoimento, será a testemunha qualificada, sendo essa a oportunidade adequada para o
oferecimento da chamada contradita da testemunha – ou seja, para a arguição da incapacidade,
impedimento ou suspeição da testemunha arrolada. A testemunha será interrogada diretamente pelas
partes, devendo responder às perguntas por elas formuladas, pessoal e oralmente, não podendo socorrer-se
de escritos adrede preparados. Primeiramente, arguirá a testemunha a parte que a arrolou; depois, a parte
contrária. Caso o juiz entenda que ainda remanescem pontos a serem esclarecidos, poderá também formular
questionamentos à testemunha, antes ou após a inquirição das partes. Eventualmente, havendo franca
divergência entre depoimentos de testemunhas, ou de testemunha e de parte (em depoimento pessoal),
pode o juiz ordenar, para o esclarecimento da verdade, a acareação de ambas, pondo-as face a face e
ouvindo-as em conjunto.

7) Prova pericial: Segundo prevê o art. 464, a perícia pode consistir em exame, vistoria ou avaliação.
Contudo, não há razão para o CPC usar os vocábulos exame e vistoria. Não tem cabimento estabelecer
diferença entre os dois vocábulos, supondo-se que a vistoria é a atividade de quem vê, pois no exame
também se vê. Note-se que o juiz julga com base no laudo técnico, e o cidadão tem direito fundamental a um
julgamento idôneo. Se é assim, não deve o juiz julgar a partir de laudo pericial assinado por pessoa que não
mereça confiança, já que estaria entregando ao cidadão resposta jurisdicional não idônea. A propósito, note-
se que o art. 471 prevê que as partes podem, de comum acordo, eleger a pessoa que funcionará como perito
no processo, sempre que elas sejam capazes e que a causa admitir autocomposição. Isso, porém, não se
sobrepõe à autônoma do juiz para, em entendendo necessário, afastar essa eleição das partes e valer- se de
prova pericial comum. A perícia também poderá ser, eventualmente, realizada por órgão técnico, composto
por mais de um perito, respeitando os mesmos preceitos necessários à nomeação de perito. Quando, na
localidade em que se há de fazer a perícia, não houver profissional que atenda a esses requisitos, o perito
será de livre escolha pelo juiz, respeitando-se o conhecimento técnico necessário (art. 156, § 5.º). Porém,
quando o exame tiver por objeto a autenticidade ou a falsidade de documento, ou for de natureza médico-
legal, o perito deve ser escolhido, preferencialmente, como prevê o art. 478, entre os profissionais
vinculados a órgãos oficiais especializados (Instituto de Criminalística e Instituto Médico-Legal).
Eventualmente, em se tratando de perícia complexa, que requeira conhecimento especializado em mais de
uma área de conhecimento técnico ou científico, pode o juiz nomear mais de um perito (art. 475). Ao perito
aplicam-se as mesmas causas de impedimento e suspeição atinentes ao juiz (arts. 148, III, e 467). Se o juiz,
fundado no art. 475 (que trata da chamada perícia complexa), nomear mais de um perito, também as partes
poderão indicar mais de um assistente técnico. Ao lado do perito, que assessorará o magistrado nas questões
técnico-científicas da controvérsia, também as partes podem servir-se de auxiliares. Estes são chamados de
assistentes técnicos. A eles não se aplicam as causas de impedimento ou suspeição, nem fica na esfera de
decisão do magistrado sua nomeação ou sua destituição. A perícia extrajudicial, como o próprio nome indica,
ocorre fora e antes do processo. Nesses termos, pode o juiz dispensar a produção da perícia se as partes, na
107
inicial e na contestação, apresentarem sobre as questões técnicas discutidas no processo pareceres ou
documentos elucidativos (art. 472). A prova pericial também pode sujeitar-se a um procedimento judicial
simplificado. Assim, quando a natureza do fato o permitir, por sua menor complexidade, de ofício ou a
requerimento das partes, o juiz pode realizar a prova por simples inquirição pelo juiz de especialista a
respeito do ponto técnico controvertido (art. 464, § 3.º). No regime formal, tem-se a procedimento mais
demorado e compatível com exames mais complexos ou que demandem maiores esclarecimentos. Aqui, o
requerimento da prova pericial será, em regra – e ressalvada a hipótese de prova de fato novo –, feito na fase
postulatória, com a petição inicial ou com a resposta do réu. Eventualmente, diante de certo incidente do
processo (por exemplo, a ação incidental de falsidade documental), haverá espaço para requerimento de
produção de prova pericial em outra oportunidade (art. 432). Deferida a produção da prova,289 nomeará o
juiz perito, fixando desde logo prazo – que deve anteceder, em pelo menos vinte dias, a data fixada para a
audiência de instrução e julgamento (art. 477) – para a entrega do laudo, formulando ainda os quesitos que
entenda necessários para o esclarecimento dos fatos (art. 470, II). No prazo de quinze dias, contados da
intimação dessa decisão judicial, poderão as partes apontar eventual impedimento ou suspeição do perito,
formular quesitos (perguntas) e apontar quem servirá como seu assistente técnico na produção da prova.
Durante o curso da perícia, também se faculta às partes formular quesitos suplementares, a fim de que o
perito possa melhor esclarecer os fatos (art. 469). Note-se que nada impede que a parte, que não tenha
formulado inicialmente quesitos, indique “quesitos suplementares”. Tais quesitos suplementares devem ser
admitidos porque a parte, ainda que não tenha formulado quesitos no momento inicial, tem o direito de
participar da formação da prova. O laudo pericial deve ser apresentado com observância dos requisitos do
art. 473. Em especial, não pode o perito ultrapassar os limites da análise para a qual foi designado, nem pode
emitir opiniões pessoais que excedam os limites de sua atividade. É dever do perito apresentar o laudo
pericial no prazo estipulado pelo juiz. Mostrando-se especialmente complexa a perícia a ser realizada, ou
sobrevindo algum motivo legítimo, pode o perito requerer a dilação do prazo, por uma vez, que será
concedida segundo o prudente arbítrio do juiz por no máximo a metade do prazo originalmente fixado (art.
476). Apresentado o laudo pericial, terão os assistentes prazo comum de quinze dias para juntar aos autos
seus pareceres técnicos, contado o prazo da data da intimação das partes a respeito da juntada do laudo
pericial (art. 477, § 1.º).As partes podem, ainda, solicitar ao perito esclarecimentos, no prazo de quinze dias,
tanto diante de dúvidas ou divergências entre os sujeitos do processo, como em relação a eventual
divergência havida entre o laudo pericial e os pareceres dos assistentes técnicos (art. 477, § 2.º). Caso ainda
persistam dúvidas depois desses esclarecimentos, pode a parte requerer ao juiz que determine o
comparecimento do perito ou dos assistentes à audiência de instrução e julgamento, formulando desde logo
os questionamentos que tenha por escrito, na forma de quesitos (art. 477, § 3.º).

8) Inspeção judicial: Eventualmente, para o convencimento judicial, ao magistrado é melhor o contato direto
e imediato com o fato que requer esclarecimento. A inspeção judicial pode ser realizada a pedido de
qualquer dos sujeitos parciais do processo, ou de ofício pelo magistrado. Determinada a realização da
inspeção, deverá o magistrado cientificar as partes do processo sobre o dia e local (que pode ou não ser a
própria sede do juízo) designado para a inspeção, já que os sujeitos parciais têm o direito de acompanhar a
diligência, inclusive participando dela ativamente, seja prestando esclarecimentos, seja fazendo observações
que reputem necessárias. Em princípio, a inspeção ocorrerá na própria sede do juízo. Poderá, porém, ocorrer
em outro lugar, quando o juiz “julgar necessário para a melhor verificação ou interpretação dos fatos que
deva observar”; “a coisa não puder ser apresentada em juízo, sem consideráveis despesas ou graves
dificuldades”; ou, ainda, quando o magistrado “determinar a reconstituição dos fatos” (art. 483).

9C. Ação Civil Pública e Ação de Improbidade Administrativa. Aplicabilidade do CPC às ações coletivas.

Atualizado por Victor Nunes Carvalho - 29ºCPR

A ação civil pública foi regulamentada pela Lei 7.347 em 1985, como defesa dos diretos difusos e coletivos e
primeiramente tratou de áreas como meio ambiente, patrimônio histórico e cultural e direitos do
consumidor. Logo após estendeu-se ao patrimônio público e ao controle da probidade administrativa até
alcançar os direitos fundamentais como educação, saúde, trabalho, etc. Pode ser usada nos casos de infração
à ordem econômica.
Os elementos do processo coletivo apontados pela doutrina e que, por consequência, podem ser citados
para a ACP coletiva são:
108
a. Presença do interesse público primário;
b. Afirmação de um direito coletivo lato sensu no pólo ativo, ou afirmação de um direito em face de um
titular de um direito coletivo lato sensu (ação coletiva passiva);
c. Extensão subjetiva da coisa julgada;
Conceitos de direitos coletivos latu sensu:
Interesses Difusos: são interesses ou direitos transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares
pessoas indeterminadas e ligadas por circunstância de fato.“Reputam-se direitos difusos aqueles
transindividuais (metaindividuais, supraindividuais, pertencentes a uma coletividade) de natureza indivisível
(só podem ser considerados como um todo) e cujos titulares sejam pessoas indeterminadas (ou seja, há
indeterminabilidade dos sujeitos, não havendo individuação) ligadas por circunstâncias de fato, não existindo
um vínculo de natureza jurídica. Ex: proteção ao meio-ambiente e à moralidade administrativa. (Didier.op.cit.
pág. 76).
Interesses Coletivos (em sentido estrito): são interesses transindividuais indivisíveis de um grupo
determinado ou determinável de pessoas (os titulares são membros de um grupo, categoria ou classe de
pessoas), reunidas por uma relação jurídica base comum. Ex: interesse à nulificação de cláusula abusiva em
contrato de adesão.
Obs: a relação jurídica base pode dar-se entre os membros do grupo “affectio societatis” (Ex: advogados
inscritos na OAB) ou pela ligação com a parte contrária (Ex: contribuintes de um determinado imposto).
Ademais, a relação jurídica base precisa ser anterior à lesão. (op. cit.pág 76)
Elementos Comuns entre Direitos Difusos e Coletivos: de acordo com Carvalho Filho, dois são os pontos de
identificação entre os direitos difusos e coletivos. O primeiro diz respeito aos destinatários, pois em ambos
está presente a transindividualidade; o segundo se refere à indivisibilidade do direito, o que significa que não
se pode identificar o quinhão do direito que cabe a cada integrante do grupo, pois o direito merece a
proteção legal como um todo, abstraindo-se a situação jurídica individual de cada beneficiário.
Diferença entre Direito Difuso e Coletivo: é a determinabilidade inerente aos direitos coletivos e a existência
de uma relação jurídica base.
Interesses Individuais Homogêneos: São aqueles direitos de grupo, categoria ou classe de pessoas
determinadas ou determináveis que compartilhem prejuízos divisíveis, de origem comum, normalmente
oriundas das mesmas circunstâncias de fato. Ex: compradores de veículos produzidos com o mesmo defeito
de série.
Origem: class actions for damages (ações de reparação de danos à coletividade do direito norte- americano).
Sob o aspecto processual, o que caracteriza os interesses transindividuais não é apenas o fato de serem
compartilhados por diversos titulares individuais reunidos pela mesma relação jurídica ou fática, mas
também é a circunstância de que a ordem jurídica reconhece a necessidade de acesso coletivo à Justiça, que
produz uma solução única e mais eficiente para todo o grupo lesado e evita decisões contraditórias.
ACP e direitos individuais. De se ressaltar, contudo, que a doutrina menciona que a ACP nem sempre será
uma ação coletiva. Existe a ACP para tutela de direitos individuais, como a ação que veicula pretensão
individual de uma criança, um idoso ou a saúde de um hipossuficiente. Abaixo as considerações relativas às
ações coletivas, que têm regime previsto na lei citada e no microssistema mais abaixo mencionado.
Legitimação ad causam nas Causas Coletivas (art. 5º, LACP): MP, Defensoria, entes federados e entidades
da administração indireta (atenção: inclusive empresas públicas e sociedades de economia mista),
associações.
Há 3 teorias a respeito da natureza da legitimidade:
1) Legitimação Extraordinária por substituição processual (Mazzilli). Corrente majoritária. Os legitimados
defendem em juízo, em nome próprio, direito alheio. É o posicionamento do STJ e do STF (art. 18 do CPC/15).
2) Legitimação Ordinária das "formações sociais". Trata-se de legitimação ordinária para os direitos
naturalmente coletivos (difusos e coletivos em sentido estrito) e legitimação extraordinária para os direitos
individuais homogêneos. Quando as "formações sociais" estiverem defendendo o "grupo", de acordo com os
seus objetivos institucionais, estarão atuando como titulares do próprio direito alegado, tendo-se, portanto,
legitimação ordinária.
3) Legitimação autônoma para condução do processo para os direitos difusos e coletivos; e legitimação
extraordinária para os direitos individuais homogêneos (Nelson Nery). Legitimação autônoma para a
condução do processo uma vez que o legitimado estará defendendo direito alheio em nome próprio, porque
não se pode identificar o titular do direito. A dicotomia clássica legitimação ordinária-extraordinária só tem
cabimento para a explicação de fenômenos envolvendo direito individual.
109
# Atenção: a expressão "legitimação conglobante" é de Hermes Zanetti Jr. e significa que a legitimação
extraordinária é permitida pelo ordenamento jurídico mesmo que não expressa na lei, por não estar
contrariada por norma jurídica ou em desacordo com os princípios do ordenamento coletivo. Ex: o
ordenamento jurídico como um todo legitima o MP para a propositura de Mandado de Segurança Coletivo. O
CPC/2015 adota a legitimidade conglobante ao alterar o termo "lei" previsto no art. 6º do CPC/73, por
"ordenamento jurídico", no art. 18 do CPC/2015.
Consoante Marinoni, “o direito brasileiro seguiu em parte – mas com inúmeras adaptações, diante da
realidade nacional – a experiência do direito anglo-americano, estabelecendo uma dualidade entre as
condições de legitimação. De um lado, buscou efetivamente atender a critério semelhante ao da
“representatividade adequada”, autorizando a propositura das ações coletivas às associações legalmente
constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre os seus fins institucionais a defesa dos interesses
específicos (art. 82, IV, CDC e art. 5º, V, a e b, da Lei 7.347/85). Estabelecidos os critérios da
“representatividade adequada” em lei (controle ope legis), cumpre ao magistrado avaliar (controle ope
judicis), no caso concreto, o preenchimento de tais condições, outorgando à associação a legitimidade para
postulação do interesse.”(op. cit. 745)
O juiz pode dispensar o requisito de pré-constituição mínima de um ano, quando haja manifesto interesse
social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser
protegido (art. 5º, §4º, LACP). “Note-se que, para defesa destes interesses, não depende a associação de
autorização assemblear ou de específica outorga de poderes pelos interessados”. (Marinoni.op. cit. 745) Obs:
A Lei 9.494//97 em seu art. 2º-A, parágrafo único dispõe: “Nas ações coletivas propostas contra a União, os
Estados, o DF, os Municípios e suas autarquias e fundações, a petição inicial deverá obrigatoriamente estar
instruída com a ata da assembleia da entidade associativa que a autorizou, acompanhada da relação nominal
dos seus associados e indicação dos seus respectivos endereços”. Flagrantemente inconstitucional, fere o
princípio da isonomia e do acesso à justiça, de acordo com Kazuo Watanabe. (op. cit. pág 745).
A eficácia subjetiva da coisa julgada formada a partir de ação coletiva, de rito ordinário, ajuizada por
associação civil na defesa de interesses dos associados, somente alcança os filiados, residentes no âmbito
da jurisdição do órgão julgador, que o fossem em momento anterior ou até a data da propositura da
demanda, constantes da relação jurídica juntada à inicial do processo de conhecimento. STF. Plenário. RE
612043/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 10/5/2017 (repercussão geral) (Info 864).
Em relação ao MS Coletivo não há essa exigência. (Súmula do STF)
Outrossim, o direito pátrio confere a agentes públicos determinados o poder para exercer a ação coletiva.
“Seja por representarem, por sua própria natureza o interesse público, seja pela estrutura e pelas
prerrogativas de que gozam, entende o legislador como conveniente autorizar também a órgãos públicos a
defesa desses direitos. Assim, estabelece-se como legitimados para ação coletiva: i)MP; ii) União, Estados, DF
e Municípios; e iii) a entidades e órgãos da administração pública, direta ou indireta, ainda que sem
personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos difusos, coletivos e
individuais homogêneos (art. 82 do CDC)”.(ib idem).
Defensoria Pública. (Lei 11.448/2007) De acordo com Marinoni, a legitimidade da Defensoria está ligada a
sua finalidade essencial, as ações coletivas precisam ter repercussão em interesses dos necessitados, ainda
que também possa operar efeitos perante outros sujeitos. (op.cit.pag 746)
Ministério Público. A CF prevê, em seu art. 129, III, a atribuição para o MP promover o “inquérito civil e ACP,
para proteção do patrimônio público e social, do meio–ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”.
Por essa previsão, parece que o MP não teria legitimidade para propositura de ações relativas a direitos
individuais homogêneos, mas tal conclusão é errada. O MP possui legitimidade para a defesa de tais direitos,
por expressa previsão do CDC (art. 82, I) e autorização de lei específica (art. 6, XII, LC 75/93), ambas
encontram-se em consonância com o art. 129, IX, da CF, que permite que o MP exerça outras funções
compatíveis com sua finalidade.
Súmula 601-STJ: O Ministério Público tem legitimidade ativa para atuar na defesa de direitos difusos,
coletivos e individuais homogêneos dos consumidores, ainda que decorrentes da prestação de serviço
público. STJ. Corte Especial. Aprovada em 07/02/2018, DJe 14/02/2018.
Contudo, o MP não pode atuar na defesa de quaisquer interesses individuais (ainda que homogêneos), é
preciso que estes caracterizem interesses sociais (tenham relevância social) ou individuais indisponíveis.
Se o MP não intervier como parte, o fará obrigatoriamente como fiscal da ordem jurídica (art 5º §1º). Deve
assumir, também, a titularidade ativa em casos de desistência infundada ou abandono de ação. Caso não

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queira assumir, cabe ao juiz, que com isso não concorde, remeter os autos a Câmara de Coordenação e
Revisão (LC 75/93, Art. 62). Analogia ao art. 9º da LACP.
Associações: estar constituída há pelo menos 01 ano (pode ser dispensado pelo juiz quando houver interesse
social evidenciado pela dimensão ou característica do dano e relevância do bem jurídico), pertinência
temática (nexo dos fins institucionais e objeto da ACP).
Entes despersonalizados: com base no art. 82 do CDC, os entes sem personalidade jurídica podem propor
ACP, a exemplo dos órgãos públicos de defesa do consumidor (ex. PROCON).
Litisconsórcio entre MP’s. É possível litisconsórcio entre MP´s. Ex: MPF e MPE. Se o MP não for autor atuará
como fiscal da lei (fiscal da ordem jurídica), já que a presença do interesse público primário nas ações
coletivas justifica sua atuação.
Quanto à possibilidade de um MP propor ACP na esfera de outro, há 2 posições: a) não pode; e b) é possível,
a natureza difusa/coletiva dos direitos não encontra limites territoriais (Nery).
Em ação civil pública, a formação de litisconsórcio ativo facultativo entre o Ministério Público Estadual e o
Federal depende da demonstração de alguma razão específica que justifique a presença de ambos na lide.
STJ. 3ª Turma. REsp 1254428-MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 2/6/2016 (Info 585).
Legitimação Coletiva Passiva: ocorrerá quando um grupamento humano (titular de um direito coletivo lato
sensu) for colocado como sujeito passivo de uma relação jurídica afirmada na petição inicial. Há quem não
admita a possibilidade, pois não há previsão legal; pela dificuldade de identificar o representante adequado;
e devido à coisa julgada coletiva, que não poderia prejudicar direitos individuais.
Características da Legitimação Coletiva.
a. Concorrente e disjuntiva (independe da participação dos outros).
b. Regulada por lei. Autorizada pelo ordenamento jurídico (legitimação conglobante - art. 18 do
CPC/2015).
c. O legitimado coletivo atua em nome próprio na defesa de direitos que pertencem a um
grupamento humano.
d. Esse grupamento humano não tem personalidade judiciária, só os legitimados coletivos
podem atuar em juízo.
Exceção: atribuição de capacidade de ser parte a uma comunidade – art. 37 do Estatuto do Índio: “Os grupos
tribais ou comunidades indígenas são partes legítimas para a defesa dos seus direitos em juízo, cabendo-lhes,
no caso, a assistência do Ministério Público Federal ou órgão de proteção ao índio”.(op.cit. 227)
Conseqüência da Falta da Legitimação Coletiva Ativa: não pode ser a extinção do processo coletivo, sem
resolução de mérito. Deve haver a substituição (sucessão) da parte que se reputa inadequada para condução
da causa (art. 9º, LAP e art. 5º, p. 3º da LACP).
Intervenção de Terceiros:
1. Assistência nas causas que versem sobre Direitos Difusos e Coletivos em sentido estrito: A)
Particular: não pode, pois não possui legitimidade para a causa; não tem interesse, na medida em que não
pode ser prejudicado pela coisa julgada; e não há relação do particular com a pessoa a quem assiste. (op. cit.
257) B) Co-legitimado: é possível – natureza de assistência litisconsorcial. (art. 3º, p.5º, da Lei 7.853/89 e art.
5º, p. 2º da LACP).
2. Assistência nas causas que versem sobre Direitos Individuais Homogêneos: É possível (natureza de
assistência litisconsorcial - art. 94 do CDC).
3. Intervenção de Amicus Curiae. Previsão expressa: a) Intervenção da CVM nas ações envolvendo
mercado de capitais – art. 31 da Lei 6.385/76. b) Intervenção do CADE nas causas relativas à proteção da
concorrência – art. 118 da Lei 12.529/11.
A tendência da doutrina e da jurisprudência é admitir a intervenção do amicus curiae em todas as ações
coletivas, desde que tenha relevância e condições de auxiliar o trabalho do magistrado.
Denunciação da lide e Chamamento ao Processo nas causas de consumo. A doutrina majoritária não admite
a denunciação da lide, pois o art. 88 do CDC veda expressamente, na hipótese de responsabilidade pelo fato
do produto. Ademais, comprometeria a efetiva e tempestiva tutela jurisdicional, e também seria
incompatível com o sistema de responsabilidade objetiva do CDC. Obs: o art. 88 trata na verdade de
chamamento ao processo (op. cit. 276). O Chamamento ao Processo apenas é admitido na hipótese do art.
101, II, do CDC. O STJ, em sede de julgamento de recursos repetitivos, decidiu pela desnecessidade de
chamamento ao processo em caso de responsabilidade solidária dos entes federados no fornecimento de
medicamentos. A tese foi ficada no sentido de que o chamamento ao processo não deve ser admitido
quando revelar-se medida protelatória que não traz nenhuma utilidade ao processo, além de atrasar a
111
resolução do feito, revelando-se obstáculo inútil à garantia fundamental do cidadão à saúde (REsp 1.203.244,
DJe 17.06.2014).
Competência, critérios: 1) local do dano (art. 2º) - denominada de competência territorial absoluta em razão
do interesse público, defende Barbosa Moreira. Há que se atentar, contudo para a extensão do dano (art .
93, II, do CDC). Se o dano for nacional ou regional, caberá interpor a ação no foro da capital do Estado ou no
DF (neste quando o dano for nacional, defende Mazzilli); 2) é sempre de primeiro grau, ainda que em face do
Presidente ou Ministros.
Pretensão/pedido: embora o art. 3º trate de condenação em dinheiro e obrigação de fazer e não fazer, cabe
a aplicação do art. 83 do CDC que determina serem admissíveis todas as espécies de ações para a adequada
e efetiva tutela do direito coletivo (princípio da atipicidade das ações coletivas).
Princípio da Informação aos Órgãos Competentes: Traduz o dever funcional de informar o MP sobre os fatos
que constituam objeto de uma ACP (arts. 6º e 7º da LACP). O interessado deve ser atendido em 15 dias
quando solicitar certidões ou informações. Requisições do MP por prazo não inferior a 10 dias. Não
oferecimento e retardamento é crime, art. 10.
Desistência: O MP não pode desistir enquanto persistirem as mesmas circunstâncias fáticas vigentes à época
da propositura da ação, em face do princípio da obrigatoriedade. Só pode fazer quando há fato novo.
Abandono e desistência: O MP ou outro legitimado assumirá o pólo ativo (art. 5, p.3º, LACP).
Limites da CJ – art. 16 – a coisa julgada erga omnes se dá nos limites territoriais do órgão julgador, salvo
quando sentença for por insuficiência de provas.
Para o STJ, o art. 16 da LACP é válido? A decisão do juiz na ação civil pública fica restrita apenas à comarca ou
à seção (ou subseção) judiciária do juiz prolator? NÃO. A posição que prevalece atualmente é a seguinte: A
eficácia das decisões proferidas em ações civis públicas coletivas NÃO deve ficar limitada ao território da
competência do órgão jurisdicional que prolatou a decisão. STJ. Corte Especial. EREsp 1134957/SP, Rel. Min.
Laurita Vaz, julgado em 24/10/2016.
Prescrição e Decadência nos Direitos Coletivos Lato Sensu.
A doutrina ensina que os direitos difusos e coletivos são imprescritíveis, já os direitos individuais
homogêneos possuem prazo prescricional.
São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei
de Improbidade Administrativa. STF. Plenário. RE 852475/SP, Rel. orig. Min. Alexandre de Moraes, Rel. para
acórdão Min. Edson Fachin, julgado em 08/08/2018
Contudo, há diversas regras específicas: Ações de ressarcimento ao erário são imprescritíveis apenas quando
decorrentes da prática de ato doloso de improbidade administrativa (art. 37, p. 5º, CF); Art. 23 da LIA; Art.
26, 27 e 100 do CDC; 5 anos para ação popular, ressalvada a imprescritibilidade prevista na letra “A”; 120
dias para optar pelo procedimento do MS. Também são consideradas imprescritíveis as ações coletivas de
reparação a dano ambiental (REsp 1120117/AC).
Obs: causas que obstam o prazo decadencial no CDC: a)Reclamação comprovadamente formulada pelo
consumidor; e b) instauração de IC.
Obs: cabe astreintes, cabe concessão de liminar (cabe suspensão da liminar pelo presidente do Tribunal, da
qual caberá agravo em 05 dias).
Pedido de Indenização por Dano Moral Coletivo: previsão: art. 1º da LACP. A doutrina majoritária admite.
Na hipótese de ação civil pública proposta em razão de dano ambiental, é possível que a sentença
condenatória imponha ao responsável, cumulativamente, as obrigações de recompor o meio ambiente
degradado e de pagar quantia em dinheiro a título de compensação por dano moral coletivo. STJ. 2ª Turma.
REsp 1328753-MG, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 28/5/2013 (Info 526).
ACP e o Controle de Constitucionalidade. O STF admite, desde que se trate de controle difuso, que a
controvérsia constitucional seja apenas uma questão prejudicial e não o objeto único da demanda, e que tal
controvérsia funcione como causa de pedir. Logo, não haverá coisa julgada sobre questão prejudicial e
também a norma não será retirada do ordenamento de direito positivo.
ACP e Matéria Tributária. O STF não admite (RE 195.056-1/PR). No entanto, de acordo com o art. 5º, II, da
LC 75/93 cabe ao MPF zelar pela observância do sistema tributário nacional. Outrossim, a doutrina admite
(Nery, Mazzilli, Kazuo Watanabe).
A MP 2180-35, alterando o parágrafo único da art. 1º da LACP, confirmou a impossibilidade de ACP em
matéria tributária, mas a doutrina considera inconstitucional tal previsão.

112
Reconvenção em Ações Coletivas. Há 2 posições: a) não é possível, pois não existe ação coletiva passiva; e
b) é possível, desde que haja compatibilidade de procedimento com a demanda principal e seja respeitado o
art. 315, parágrafo único do CPC.
Litigância de Má-fé e Despesas Processuais. A lei dispensa do pagamento de custas e isenta do pagamento
de honorários advocatícios. Custas e honorários advocatícios somente são devidos nos casos de litigância de
má-fé (art. 87do CDC). Também a LACP, art. 18, dispensa o adiantamento de custas, emolumentos,
honorários periciais e quaisquer outras despesas. Os dispositivos não se aplicam ao réu (aplica-se in totum o
art 82, §2º, CPC/15). Quanto o MP for autor, contudo, não cabe condenação em honorários em seu favor
(EResp895530-PR).
Qualquer dos litigantes ou intervenientes na ACP pode ser considerado litigante de má-fé. No entanto,
para se condenar o MP é preciso que se comprove o dolo (STJ-REsp 28.751/SP).
ACP e Ação Popular. Normalmente ocorre conexão e não litispendência, por uma das ações ter objeto mais
amplo. Tal identificação dependerá do caso concreto. (STJ, Resp 208680/MG)
Condenação. A condenação é genérica, resultando apenas na fixação do dever de indenizar, sem especificar
o montante devido a cada vítima do prejuízo. A atuação do magistrado é verificar se o réu é ou não o
responsável pelo dano. Trata-se de sentença certa, embora ilíquida. Obtida a sentença de condenação
genérica, surge a necessidade de liquidação. Podem promover a liquidação os legitimados do art. 82 do CDC,
bem como as vítimas específicas do dano ou seus sucessores, sendo certo que estes (vítimas e sucessores)
têm preferência. Na liquidação o autor deve provar que há o direito à indenização, comprovando-se o dano,
o nexo causal e quantum devido. Trata-se de verdadeira ação, chamada pela doutrina de “ação de
cumprimento”. A atuação do ente coletivo, nessa hipótese, é de representação processual. Caso decorra um
ano sem habilitação dos interessados em número compatível com a gravidade do dano, poderão os
legitimados do art. 82 promover a liquidação e execução da indenização. A indenização, nesse caso, vai para
o fundo previsto na LACP. Outrossim, nas hipóteses de dano individualmente insignificantes, mas
ponderáveis em seu conjunto, poderá não existir interesse das vítimas na habilitação, daí o surgimento da
chamada “indenização fluida” (fluid recovery), destinada ao “fundo” para a proteção de bens e valores da
coletividade lesada. A execução da tutela coletiva de direitos individuais homogêneos pode ser também
individual ou coletiva. A execução individual, que poderá ser realizada pelo ente coletivo (mediante
representação) ou pessoalmente, deve ter por título a certidão da sentença de liquidação. A competência
(relativa) é do juízo da liquidação do dano, que pode ser o mesmo da condenação genérica ou outro; e pode
ser afastada em benefício da vítima. A execução será processada pela via normal, observando, quando
possível, o regime de cumprimento de sentença (art. 513 do CPC) A execução coletiva poderá ser submetida
ao sistema da fluid recovery, nos termos do art. 100 do CDC, como supramencionado. Havendo execuções
individuais e coletivas decorrentes da mesma ACP, as primeiras possuem preferência. As vítimas devem
receber as indenizações antes da destinação da importância recuperada para o fundo coletivo (art. 99 do
CDC).
Recursos. Art. 14 da LACP: O juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos, para evitar dano irreparável
à parte. Contra a sentença, portanto, cabe o recurso de Apelação, ao qual pode ser atribuído efeito
suspensivo. Como nas demandas coletivas a coisa julgada é secundum eventum probationis, não há coisa
julgada material se a improcedência se fundar em falta de prova. Assim, há interesse recursal para
modificação do fundamento da sentença, para que seja reconhecida a inexistência do direito, uma vez que
possibilitará a ocorrência da coisa julgada material. (op. cit. pág 366)
Reexame Necessário. 4 posições: a) não há reexame necessário; b) aplica-se a regra geral do art. 496 do
CPC/15 (Mazzilli); c) aplica-se a Lei de Ação Popular, por analogia. d) os 2 regimes são aplicáveis: “Condenada
a Fazenda Pública em ACP, há remessa necessária; julgada improcedente ACP ou extinto o processo por
carência de ação, envolva ou não o ente público, há também, remessa necessária” (Didier e Zaneti, op.cit
pág. 367).
Obs: Na lei dos portadores de necessidades especiais o Reexame Necessário é em favor do deficiente e não
do Poder Público.
Inquérito Civil. (Resolução nº 23 do CNMP – 17/09/2007)
O MP pode instaurar inquérito civil, que é um procedimento administrativo destinado à colheita de
elementos para eventual e futura propositura de ação civil pública. Há 2 espécies: a) Inquérito Civil (causas
mais complexas) e b) Peças de informação (causas menos complexas).
Características:

113
a)Legitimidade: restrita ao MP; b) Objetivo: colher elementos de convicção para o exercício da ACP ou
celebração de um TAC; c)Natureza jurídica: procedimento administrativo inquisitivo (contraditório é
mitigado); d) Facultativo; e) Aplica-se o princípio da publicidade, salvo se: i) O MP teve acesso a informações
sigilosas que passaram a integrar os autos; ii) da publicidade puder resultar prejuízo a investigação ou ao
interesse da sociedade; e iii) quando puder causar dano significativo à imagem do investigado; f) Deve ter
duração razoável (art. 5º, LXXXIII).
Efeitos da instauração do IC
a. Interrupção da decadência – art. 26, p. 2º, CDC.
b. Possibilidade de surgimento de dever de o Estado indenizar o investigado, no caso de
instauração temerária.
Obs: É cabível MS para obstar o IC temerário. Outrossim, é possível a configuração de crime de denunciação
caluniosa para quem der causa a instauração indevida de IC.

Fases do IC
a. Instauração. (art. 4º, Res 23) - Poderá ser por portaria ou por despacho exarado no requerimento,
ofício ou representação enviada ao MP, por designação do PGJ, do CSMP, da Câmara de
Coordenação e Revisão, e demais órgãos superiores da Instituição, nos casos cabíveis (art. 2º, Res
23). É preciso que exista a identificação de fato(s) que serão apurados e a fundamentação jurídica,
ainda que sucinta, que justifique o início da investigação. (op.cit. 250).
O procedimento preparatório deverá ser concluído em 90 dias prorrogável por igual período, em caso de
motivo justificável (art 3º, p.6º, Res. 23)
b. Produção de provas - O MP poderá valer-se do poder de notificação para comparecimento ou de
requisição, de qualquer órgão público ou particular, de certidões, informações, exames ou perícias, no prazo
que assinalar, o qual não poderá ser inferior a dez dias. Além de vistorias e inspeções.
c. Conclusão - arquivamento do IC (art. 10, Res. 23), celebração do TAC ou ajuizamento da ação
coletiva.
Prazo para conclusão do IC: 1 ano, prorrogável pelo mesmo prazo e quantas vezes for necessária, por decisão
fundamentada do seu presidente, dando-se ciência ao CSMP, à Câmara de Coordenação e Revisão ou à
Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão. (art. 9º, Res. 23). Cada MP poderá estabelecer prazo inferior.
Se o órgão do MP, esgotadas todas as diligências, se convencer da inexistência de fundamento para a
propositura da ACP, promoverá motivadamente o arquivamento dos autos do inquérito civil ou das peças
informativas. (art. 9, LACP)
O ato de arquivamento do inquérito ou das peças de informação deve ser encaminhado à Câmara de
Coordenação e Revisão correspondente à matéria tratada no inquérito civil (isso no MPF), no prazo de 3 dias,
sob pena de falta grave. Antes da apreciação pela Câmara, as associações legitimadas poderão apresentar
documentos e razões escritas.
Caso não seja homologada a promoção de arquivamento, será convertido o julgamento em diligência para
realização de atos imprescindíveis, designando-se outro órgão do MP para atuação (se o órgão anterior
recusar de modo fundamentado a diligência); ou deliberará pelo prosseguimento do IC ou do procedimento
preparatório, com atuação de outro membro do MP.
O desarquivamento do IC poderá ocorrer no prazo máximo de 6 meses do arquivamento (da homologação
da promoção do arquivamento, e não deste isoladamente), depois desse prazo será necessária instauração
de novo IC, sem prejuízo das provas colhidas anteriormente. (art. 12, Res. 23)
Termo de Ajustamento de Conduta
Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de conduta às
exigências legais, mediante cominações (obrigações de dar, fazer e/ou não fazer). O Termo terá a eficácia de
título executivo extrajudicial, independentemente de homologação judicial, exceto se o acordo for proposto
no curso da ação.
Vale lembrar que o IC pode resultar na celebração de um TAC. Mas nem sempre o TAC implica a extinção do
IC, pois o TAC pode ser parcial. Nesse caso, prosseguirá a investigação a respeito de fatos não abrangidos por
ele.
Obs: O art. 17, §1º, da Lei 8.429/92, que vedava transação, acordo ou conciliação em improbidade, foi
revogado pela MP 703/2015, que perdeu a eficácia por não ter sido votada pelo Congresso Nacional.
Portanto, referido dispositivo ainda vige, mas não é óbice à autocomposição de litígios que versam sobre
improbidade administrativa. Parte da doutrina afirma que houve a revogação tácita desse dispositivo da LIA
114
pelo art. 36, §4º, da Lei 13.140/15. Assim, é possível a celebração de TAC em sede de improbidade
administrativa.
Recurso. É possível que terceiro (co-legitimado) ingresse com recurso para questionar a homologação do
acordo, uma vez que a coisa julgada produz efeitos erga omnes. Admite-se também ação autônoma para
impugnação do TAC. (op. cit. 365).
AÇÃO DE IMPROBIDADE
O art. 37 da CF estabelece a base jurídica para a improbidade administrativa ao determinar os princípios da
administração pública: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, e em seu parágrafo
4º dispõe as sanções para os atos de improbidade: (I) suspensão de direitos políticos, (II) perda da função
pública, (III) indisponibilidade dos bens e (IV) ressarcimento ao erário, sem prejuízo da sanção penal cabível.
De pronto, já se vê que a Lei 8.429/92 ampliou o rol das sanções (e.g., pena de multa civil).
Esferas de responsabilidades. Por força do art. 12 da Lei de Improbidade, recentemente alterado pela Lei
12.120/2009, consagra-se a existência de 4 (quatro) esferas independentes de responsabilidade, quais sejam:
(I) penal, (II) administrativa, (III) civil e (IV) civil sui generis (improbidade administrativa). Marcelo Figueiredo
aponta: “o mesmo fato pode ensejar a responsabilização do agente nas três esferas – penal, civil e
administrativa. Agora, com a lei, o mesmo fato pode, ainda, configurar infração à probidade administrativa,
nas várias modalidades aqui contidas”.
No julgamento da Reclamação n. 2.138, Rel. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, a tese vencedora foi a de
que os agentes políticos, por terem norma constitucional própria e peculiar de responsabilidade (“crime de
responsabilidade”), não estariam sujeitos à Lei de Improbidade Administrativa. O entendimento foi superado
parcialmente, valendo apenas para o Presidente da República.
Os agentes políticos, com exceção do Presidente da República, encontram-se sujeitos a duplo regime
sancionatório, de modo que se submetem tanto à responsabilização civil pelos atos
de improbidade administrativa quanto à responsabilização político-administrativa por crimes de
responsabilidade. O foro especial por prerrogativa de função previsto na Constituição Federal em relação às
infrações penais comuns não é extensível às ações de improbidade administrativa. STF. Plenário. Pet 3240
AgR/DF, rel. Min. Teori Zavascki, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 10/5/2018 (Info 901).
O STJ, entretanto, decidiu: “Ex-prefeito não se enquadra dentre aquelas autoridades que estão submetidas à
Lei nº 1.070/1950, que dispõe sobre os crimes de responsabilidade, podendo responder por seus atos na via
da ação civil pública de improbidade administrativa” (REsp 764.836/SP, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, Rel. p/
Acórdão Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19.02.2008)
Competência para julgamento. STF (ADIn 2797), não há prerrogativa de foro especial. Tema já pacificado
também no STJ ( REsp 783.823/GO, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em
13.05.2008).
Sujeito ativo da improbidade administrativa (arts. 1º, caput, e § único, 2º e 3º da lei 8.429/92) – É bastante
amplo. Confira-se:
Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a
administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para
cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio
ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei.
Parágrafo único. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de improbidade praticados contra o
patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público
bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de
cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à
repercussão do ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos.
Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que
transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra
forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo
anterior.
Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público,
induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou
indireta.

115
Sujeito passivo da improbidade administrativa – O sujeito passivo mediato é o Estado, pois a Lei 8.429 tem
por objetivo proteger o patrimônio público, a administração da coisa pública (bens, direitos, recursos, com
ou sem valor econômico). O sujeito passivo imediato é a pessoa jurídica efetivamente afetada pelo ato, rol
do art. 1º, caput, da referida lei. Incluem-se, nesse rol, os partidos políticos. É que, mesmo sendo pessoa
jurídica de direito privado, recebem verba do fundo partidário (tema objeto de questionamento do 23º
concurso, segunda fase).
Tipos Legais – Eram 3 (três), art. 9º (atos que importam em enriquecimento ilícito); art. 10 (atos que causam
prejuízo ao erário); art. 11 (atos que atentam contra os princípios da administração pública). A esses soma-
se o tipo do art. 10-A, acrescido pela LC 157/2016: dos atos de improbidade administrativa decorrentes de
concessão ou aplicação indevida de benefício financeiro ou tributário.
O rol das condutas descritas no art. 9º é meramente exemplificativo. Elemento subjetivo: as condutas são
todas dolosas; nenhuma das condutas admite modalidade culposa. Todas as condutas aptas a gerar
enriquecimento ilícito pressupõem a consciência da antijuridicidade do resultado pretendido. Requisitos: (I)
obtenção de vantagem patrimonial pelo agente; (II) que esta vantagem não tenha causa lícita; (III) nexo
causal entre o exercício funcional e a vantagem indevida.
O art. 10 exige para sua concretização o efetivo dano, a lesão aos cofres públicos, ao Erário ou ao Patrimônio
Público (conceito mais amplo) em todas as suas formas (Emerson Garcia). Consiste na ação ou omissão,
dolosa ou culposa, que enseje lesão ao erário ou perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou
dilapidação dos bens ou haveres. É necessário, além da culpa ou dolo, que a conduta seja ilegal. Os incisos do
art. 10 são exemplificativos.
Aqui, com parcela de crítica da doutrina, está prevista a forma culposa. A propósito: “(...) Embora mereçam
acirradas críticas da doutrina, os atos de improbidade do art. 10, como está no próprio caput, são também
punidos a título de culpa, mas deve estar presente na configuração do tipo a prova inequívoca do prejuízo ao
erário”. (REsp 842.428/ES, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJ 21.05.2007)
A doutrina define o art. 11 como tipo subsidiário, ou norma de reserva, incidindo apenas se não ocorrer
enriquecimento ilícito (art. 9º) ou lesão ao patrimônio público (art. 10). Os incisos são igualmente
exemplificativos.
Este dispositivo é o que apresenta maior controvérsia. Juarez Freitas aponta que não é qualquer violação aos
princípios da administração que implicará a punição do agente por improbidade administrativa. Para ele:
“Não existe, porém, má-fé objetiva. É equívoco crer que erro legal do agente, sem desonestidade, deva ser
enquadrável como improbidade administrativa. Força que se configure, dada a gravidade das sanções, a
irretocável intenção desonesta do agente [má-fé]. Naturalmente, idêntico raciocínio pode operar-se em
relação aos demais princípios (não apenas da legalidade), o que empresta tom inteligível ao disposto no art.
4.º desta lei, convindo notar que, a não prosperar tal entendimento, o disposto soaria, na melhor das
hipóteses, inócuo”. Isso tudo porque a lei pune o administrador desonesto, e não o inábil. O princípio da
insignificância, que exclui as condutas irrelevantes, tem aplicação à improbidade administrativa.
É entendimento uniforme, entretanto, que, para a aplicação deste dispositivo (art. 11), é desnecessária a
comprovação de dano ao patrimônio público, tal como está dito no art. 12, III, e parágrafo único, da Lei
8.429/92.
Sanções – Se houver colidência entre as sanções aplicadas nas diversas esferas de responsabilidade, isso
somente deverá ser aferido no momento da execução. Sobre o ponto, Mônica Nicida Garcia destaca: “A
solução, em casos como tais [colidência], haverá que ser encontrada na fase de execução. Vale dizer, apenas
uma das sanções impostas [desde que sejam iguais, evidentemente] deverá ser executada, devendo a outra
execução ser oportunamente julgada extinta por já ter sido cumprida. Parece ser nesta fase de execução que
se torna aplicável o princípio do non bis in idem”.
A nova redação conferida ao artigo 12 pela edição da Lei 12.120/2009, positivou o entendimento então
adotado pela jurisprudência pátria, afastando, assim, qualquer dúvida acerca da aplicação isolada ou
cumulativa das sanções previstas na lei de improbidade administrativa.
Destaca-se, ainda, que, o STJ, em 2008, admitiu que, além das sanções previstas no art. 12 desta lei, é cabível
também a imposição de dano moral coletivo. Há parcela da doutrina (e.g., Juarez Freitas), entretanto, que
entende que o dano moral estaria inserido na própria previsão de multa civil. O julgado do STJ: (REsp
960926/MG, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 18.03.2008, DJ 01.04.2008 p. 1).
Nesse precedente, a base doutrinária foi a lição de Maria Sylvia Zanella di Pietro: “Vem se firmando o
entendimento de que a ação judicial cabível para apurar e punir os atos de improbidade tem a natureza de
ação civil pública, sendo-lhe cabível, no que não contrariar disposições específicas da lei de improbidade. É
116
sob essa forma que o Ministério Público tem proposto as ações de improbidade administrativa, com
aceitação pela jurisprudência (cf. Alexandre de Moraes, 2000; 330-331, especialmente jurisprudência citada
na nota nº 2. p.330). Essa conclusão encontra fundamento no artigo 129, inciso III, da Constituição Federal,
que ampliou os objetivos a ação civil pública, em relação à redação original da Lei 7.347/85, que somente a
previa em caso de dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético,
histórico, turístico e paisagístico. O dispositivo constitucional fala em ação civil pública 'para a proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos'. Em conseqüência,
o artigo 1º da Lei nº 7.347⁄85 foi acrescido de um inciso, para abranger as ações de responsabilidade por
danos causados 'a qualquer outro interesse difuso ou coletivo'. Aplicam-se, portanto, as normas da Lei nº
7.347⁄85, no que não contrariarem dispositivos da lei de improbidade” (in Direito Administrativo, Ed. Atlas, 17ª
edição, p.718-719).
O art. 21 da LIA sofreu alteração com a edição da Lei 12.120/2009, passando a ter a seguinte redação: Art.
21. A aplicação das sanções previstas nesta lei independe: I - da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio
público, salvo quanto à pena de ressarcimento; (Redação dada pela Lei nº 12.120, de 2009).
Seguindo a trilha da jurisprudência do STJ, cumpre destacar manifestação da Min. Eliana Calmon no sentido
de que não se aplica o princípio da congruência na ação de improbidade administrativa, a saber: “Não
infringe o princípio da congruência a decisão judicial que enquadra o ato de improbidade em dispositivo
diverso do indicado na inicial, eis que deve a defesa ater-se aos fatos e não à capitulação legal”. (REsp
842.428/ES, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 24.04.2007, DJ 21.05.2007 p. 560.
Penas: art. 9º - ENRIQUECIMENTO ILÍCITO: 1 - perda dos bens acrescidos ilicitamente; 2-ressarcimento
integral do dano, se houver; 3 - perda da função pública; 4 -suspensão dos direitos políticos de 8 a 10 anos; 5
- multa civil de até 3 (três) vezes o valor do acréscimo patrimonial; 6 - proibição de contratar com o Poder
Público, ainda que por intermédio de pessoa jurídica pelo prazo de 10 anos. art. 10 – LESÃO AO ERÁRIO
PÚBLICO: 1 -ressarcimento integral do dano; 2 - perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao
patrimônio, se houver; 3 - perda da função pública; 4 - suspensão dos direitos políticos de 5 a 08 anos; 5 -
pagamento de multa civil até 2 (duas) vezes o valor do dano; 6 -proibição de contratar com o Poder
Público, ainda que por intermédio de pessoa jurídica, pelo prazo de 5 anos. art. 11 – ATOS CONTRA OS
PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO: 1 - ressarcimento integral do dano, se houver; 2 - perda da função pública;
3 - suspensão dos direitos políticos de 3 a 5 anos; 4 - pagamento de multa civil de até 100 vezes o valor da
remuneração percebida do agente; 5 - proibição de contratar com o poder público, ainda que por intermédio
de pessoa jurídica, por 3 anos.
 Rito: será ordinário (art. 17 caput da Lei 8429/92).
 Competência: Local do dano, se houver, ou do ato.
 Legitimidade Ativa: É concorrente entre pessoa jurídica lesada e o Ministério Público. O cidadão não
foi legitimado. As associações que tenham por objeto social a preservação dos valores da Administração
Pública, também não.
Caso a ação seja proposta pelo MP, o art. 17, § 3º, da Lei de improbidade dispõe que a pessoa jurídica lesada
será cientificada para integrar a lide (no pólo ativo ou passivo, como lhe convier). Como é hipótese de
litisconsórcio facultativo – e não necessário -, a falta de citação não gera a nulidade do processo, conforme
entendimento pacífico do STJ (REsp. n. 526.982, j. 01.02.06 e REsp. n. 526.982, j.04/06/2009 ).
Decidiu o STF, recentemente, que o Ministério Público tem legitimidade para propor ação de improbidade
com o objetivo de anular Termo de Acordo de Regime Especial -TARE: ( RE 576155 / DF - DISTRITO FEDERAL,
Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Julgamento: 12/08/2010,Órgão Julgador: Tribunal Pleno). *
Transação: É expressamente vedada pelo art. 17, § 1º, com forte crítica doutrinária. Juarez Freitas destaca:
“na contramão das melhores técnicas contemporâneas de valorização do consenso e da persuasão. O Direito
Público, em novas bases, reclama estratégias conciliatórias que não significam dispor indevidamente do
interesse público, porém, ao contrário, realizá-lo de modo mais efetivo e justo”.
Indisponibilidade dos bens.
A jurisprudência do STJ é no sentido de que a decretação da indisponibilidade e do sequestro
de bens em improbidade administrativa é possível antes do recebimento da ação (AgRg no REsp
1317653/SP). A indisponibilidade pode recair sobre bens adquiridos tanto antes quanto depois da prática do
ato de improbidade. A jurisprudência do STJ abona a possibilidade de que a indisponibilidade, na ação
de improbidade administrativa, recaia sobre bens adquiridos antes do fato descrito na inicial. A medida se dá
como garantia de futura execução em caso de constatação do ato ímprobo (REsp 1301695/RS). Há
precedente do STJ que admite que a medida cautelar de indisponibilidade de bens em razão de ato de
117
improbidade administrativa recaia sobre bem de família (STJ. 1ª Turma. AgRg no REsp 1483040/SC, Rel. Min.
Benedito Gonçalves, julgado em 01/09/2015).
Basta que se prove o fumus boni iuris, sendo o periculum in mora presumido (implícito). Assim, é
desnecessária a prova do periculum in mora concreto, ou seja, de que os réus estejam dilapidando seu
patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, exigindo-se apenas a demonstração de fumus boni iuris, consistente
em fundados indícios da prática de atos de improbidade. A medida cautelar de indisponibilidade de bens,
prevista na LIA, consiste em uma tutela de evidência, de forma que basta a comprovação da verossimilhança
das alegações, pois pela própria natureza do bem protegido, o legislador dispensou o requisito do perigo da
demora. STJ. 1ª Seção. REsp 1366721/BA, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ Acórdão Min. Og
Fernandes, julgado em 26/02/2014 (recurso repetitivo). O requisito do periculum in mora está implícito no
referido art. 7º, parágrafo único, da Lei nº 8.429/1992, que visa assegurar “o integral ressarcimento” de
eventual prejuízo ao erário, o que, inclusive, atende à determinação contida no art. 37, § 4º, da CF/88. Como
a indisponibilidade dos bens visa evitar que ocorra a dilapidação patrimonial, o STJ entende que não é
razoável aguardar atos concretos direcionados à sua diminuição ou dissipação, na medida em que exigir a
comprovação de que esse fato estaria ocorrendo ou prestes a ocorrer tornaria difícil a efetivação da medida
cautelar em análise. Além do mais, o disposto no referido art. 7º em nenhum momento exige o requisito da
urgência, reclamando apenas a demonstração, numa cognição sumária, de que o ato de improbidade causou
lesão ao patrimônio público ou ensejou enriquecimento ilícito. Vale ressaltar, no entanto, que a decretação
da indisponibilidade de bens, apesar da excepcionalidade legal expressa da desnecessidade da demonstração
do risco de dilapidação do patrimônio, não é uma medida de adoção automática, devendo ser
adequadamente fundamentada pelo magistrado, sob pena de nulidade (art. 93, IX, da Constituição Federal),
sobretudo por se tratar de constrição patrimonial (REsp 1319515/ES). STJ. 1ª Seção. REsp 1366721-BA, Rel.
Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. para acórdão Min. Og Fernandes, julgado em 26/2/2014 (recurso
repetitivo) (Info 547).
A medida, contudo, não pode atingir aqueles bens tidos por impenhoráveis (Lei n.º 8.009/90), conforme já
restou decidido no STJ (AG n.º 401985, j. 01.09.03). Segundo EMERSON GARCIA e ROGÉRIO PACHECO ALVES,
embora de rara ocorrência, nada impede de lege lata, a decretação da medida quanto aos atos de
improbidade de que cuida o art. 11 da Lei n. 8429-92 (violação de princípios), mormente no que diz respeito
à garantia de reparação de dano moral, o qual, para fins de indisponibilidade, deverá ser estimado pelo autor
na petição inicial. Sobre o ponto, vale notar que o art. 7º da LIA submete a indisponibilidade de bens à
ocorrência de “lesão ao patrimônio público”, expressão que deve ser interpretada em seu sentido mais
amplo de modo a também abarcar o patrimônio moral do ente. Por outro lado, não se tem dúvida de que
além de lesões morais, a violação de princípios também pode repercutir na esfera propriamente pecuniária
do lesado, o que se vê confirmado pelo próprio art. 12, III, da Lei de Improbidade.
Segundo decidiu o STJ, as verbas absolutamente impenhoráveis não podem ser objeto da medida de
indisponibilidade na ação de improbidade administrativa. Isso porque, sendo elas impenhoráveis, não
poderão assegurar uma futura execução (STJ. 1ª Turma. REsp 1164037/RS, Rel. p/ Ac. Min. Napoleão Nunes
Maia Filho, julgado em 20/02/2014). Vale ressaltar que esse entendimento acima exposto (REsp 1164037/RS)
é contraditório com julgados do STJ que afirmam que é possível que a indisponibilidade recaia
sobre bem de família, por exemplo, que, como se sabe, é impenhorável (STJ. 1ª Turma. AgRg no REsp
1483040/SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 01/09/2015).
Notificação prévia: antes de receber a ação, é impositiva a notificação do réu para manifestação prévia. O
entendimento do STJ mais recente tem sido no sentido de que a falta de notificação só gera nulidade
absoluta se houver comprovação de prejuízo. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO
CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. ART. 17, § 7º, DA LEI 8.429/1992. INEXISTÊNCIA.
PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. 1. A ausência da notificação prévia tratada no art. 17, § 7º, da Lei
8.429/1992 somente acarreta nulidade processual se houver comprovação de efetivo prejuízo, de acordo
com a parêmia pas de nullité sans grief. Precedentes do STJ. 2. Agravo Regimental não provido. (AgRg no Ag
1346096 / RJ, T2 - SEGUNDA TURMA Data do Julgamento 16/11/2010).
Prescrição: Acerca de prescrição, temos:
Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser propostas:
I - até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança;
II - dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a
bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego.

118
III - até cinco anos da data da apresentação à administração pública da prestação de contas final pelas
entidades referidas no parágrafo único do art. 1o desta Lei.
Por sua vez, o art. 37, § 5º, da CF diz: “A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por
qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de
ressarcimento”. Há entendimento doutrinário e jurisprudencial de que, por força do dispositivo da CF antes
citado (“ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento”), a pena de ressarcimento seria imprescritível. O
entendimento mais atual do STF é de que são imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas
na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa. STF. Plenário. RE 852475/SP, Rel.
orig. Min. Alexandre de Moraes, Rel. para acórdão Min. Edson Fachin, julgado em 08/08/2018.
Ainda sobre a prescrição, temos a seguinte passagem doutrinária: “O prazo prescricional é de 5 anos para
serem ajuizadas contra agentes públicos eleitos ou ocupantes de cargo de comissão ou de função de
confiança, contados a partir do término do mandato ou do exercício funcional (inciso I). O prazo prescricional
em relação aos demais agentes públicos que exerçam cargo efetivo ou emprego público, é o estabelecido em
lei específica para as faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público (inciso II). No
âmbito da União, é de 5 anos e começa a correr da data em que o fato tornou-se conhecido, não pendendo
causa interruptiva ou suspensiva, e dos Estados ou Municípios, no prazo previsto nas leis por eles editadas
sobre essa matéria. No caso de particulares acionados por ato de improbidade administrativa, por serem
coniventes com o agente público improbo, tendo induzido-os ou concorrendo para a sua prática, entendo eu,
que observa a regra dos incisos I ou II, conforme a qualificação do agente público envolvido.” (Marino
Pazzaglini Filho, in Lei de Improbidade.
Trânsito em julgado. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só ocorrem após o
trânsito em julgado (art. 20, caput).

JURISPRUDÊNCIA:
01) Não é possível a repropositura de ação coletiva de direitos individuais homogêneos julgada
improcedente, ainda que por falta de provas:
Após o trânsito em julgado de decisão que julga improcedente ação coletiva proposta em defesa de direitos
individuais homogêneos, independentemente do motivo que tenha fundamentado a rejeição do pedido, não
é possível a propositura de nova demanda com o mesmo objeto por outro legitimado coletivo, ainda que em
outro Estado da federação. STJ. 2ª Seção. REsp 1302596-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. para
acórdão Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 9/12/2015 (Info 575).
02) Legitimidade da Defensoria Pública para propor ACP na tutela de direitos difusos e coletivos das
pessoas necessitadas:
A Defensoria Pública tem legitimidade para a propositura de ação civil pública em ordem a promover a tutela
judicial de direitos difusos e coletivos de que sejam titulares, em tese, as pessoas necessitadas. STF. Plenário.
RE 733433/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 4/11/2015 (repercussão geral) (Info 806).
03) Legitimidade da Defensoria para propor ACP em defesa de juridicamente necessitados:
A Defensoria Pública tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa de interesses individuais
homogêneos de consumidores idosos que tiveram plano de saúde reajustado em razão da mudança de faixa
etária, ainda que os titulares não sejam carentes de recursos econômicos. A atuação primordial da Defensoria
Pública, sem dúvida, é a assistência jurídica e a defesa dos necessitados econômicos. Entretanto, também
exerce suas atividades em auxílio a necessitados jurídicos, não necessariamente carentes de recursos
econômicos. A expressão "necessitados" prevista no art. 134, caput, da CF/88, que qualifica e orienta a
atuação da Defensoria Pública, deve ser entendida, no campo da Ação Civil Pública, em sentido amplo. Assim,
a Defensoria pode atuar tanto em favor dos carentes de recursos financeiros como também em prol do
necessitado organizacional (que são os "hipervulneráveis"). STJ. Corte Especial. EREsp 1192577-RS, Rel. Min.
Laurita Vaz, julgado em 21/10/2015 (Info 573).
04) Afastamento da presunção de legitimidade de associação para a propositura de ação coletiva:
É possível ao juízo, de ofício, reconhecer a inidoneidade de associação regularmente constituída para
propositura de ação coletiva? SIM. Quando houver sintomas de que a legitimação coletiva vem sendo
utilizada de forma indevida ou abusiva, o magistrado poderá, de ofício, afastar a presunção legal de
legitimação de associação regularmente constituída para propositura de ação coletiva. A legitimidade de uma
associação para a propositura de ACP pode ser afastada pelo fato de o estatuto da associação ser
exageradamente genérico? SIM. O argumento de que o estatuto da associação é desmesuradamente
genérico tem respaldo na jurisprudência do STJ. Embora a finalidade da associação, prevista no estatuto,
119
possa ser razoavelmente genérica, não pode ser, entretanto, desarrazoada, sob pena de admitirmos a criação
de uma associação civil para a defesa de qualquer interesse, o que desnaturaria a exigência de
representatividade adequada do grupo lesado. STJ. 4ª Turma. REsp 1213614-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão,
julgado em 1º/10/2015 (Info 572).
05) Alteração de polo ativo de ação civil pública promovida por associação:
Caso ocorra dissolução da associação que ajuizou ação civil pública, não é possível sua substituição no polo
ativo por outra associação, ainda que os interesses discutidos na ação coletiva sejam comuns a ambas. STJ. 3ª
Turma. REsp 1405697-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 17/9/2015 (Info 570).
06) Termo a quo do prazo prescricional das execuções individuais de sentença coletiva:
O prazo prescricional para a execução individual é contado do trânsito em julgado da sentença coletiva, sendo
desnecessária a providência de que trata o art. 94 da Lei nº 8.078/90 (CDC), ou seja, a publicação de editais
convocando eventuais beneficiários. STJ. 1ª Seção. REsp 1388000-PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho,
Rel. para acórdão Min. Og Fernandes, julgado em 26/8/2015 (recurso repetitivo) (Info 580).
07) Legitimidade do MP para propor ACP objetivando a liberação de saldo de contas do PIS/PASEP:
O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública objetivando a liberação do saldo de
contas PIS/PASEP, na hipótese em que o titular da conta — independentemente da obtenção de
aposentadoria por invalidez ou de benefício assistencial — seja incapaz e insusceptível de reabilitação para o
exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, bem como na hipótese em que o próprio titular da
conta ou quaisquer de seus dependentes for acometido das doenças ou afecções listadas na Portaria
Interministerial MPAS/MS 2.998/2001. Esse pedido veiculado diz respeito a direitos individuais homogêneos
que gozam de relevante interesse social. Logo, o interesse tutelado referente à liberação do saldo do
PIS/PASEP, mesmo se configurando como individual homogêneo, mostra-se de relevante interesse à
coletividade, tornando legítima a propositura de ação civil pública pelo Ministério Público, visto que se
subsume aos seus fins institucionais. STJ. 2ª Turma. REsp 1480250-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado
em 18/8/2015 (Info 568).
08) Impossibilidade de execução individual de sentença coletiva por pessoa não filiada à associação:
A associação dos servidores públicos federais do órgão "XX" ajuizou ação coletiva pedindo que fosse
reconhecida e paga determinada gratificação devida à classe. A ação foi julgada procedente, tendo transitado
em julgado. João é servidor público federal do órgão "XX", mas não é nem nunca foi filiado à referida
associação. Mesmo sem ser associado, João poderá pegar a sentença proferida na ação coletiva e ajuizar
execução individual cobrando o pagamento das verbas relacionadas com a aludida gratificação? NÃO. As
associações, quando propõem ações coletivas, agem como REPRESENTANTES de seus associados (e não
como substitutas processuais). Diante dessa mudança de perspectiva, tem-se o seguinte cenário: • Regra: a
pessoa não filiada não detém legitimidade para executar individualmente a sentença de procedência oriunda
de ação coletiva proposta pela associação. • Exceção: será possível executar individualmente, mesmo se não
for associado, se a sentença coletiva que estiver sendo executada for mandado de segurança coletivo. STJ. 4ª
Turma. REsp 1374678-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 23/6/2015 (Info 565).
09) ACP proposta contra prefeito e previsão na lei estadual de que tal atribuição é privativa do PGJ:
É constitucional lei complementar estadual que afirme que somente o Procurador-Geral de Justiça poderá
ajuizar ação civil pública contra Secretários de Estado, Deputados Estaduais, Prefeitos, membros do MP ou
membros da Magistratura (STF. Plenário. ADI 1916, Rel. Min. Eros Grau, julgado em 14/04/2010). O PGJ
poderá, no entanto, delegar essa atribuição para Promotores de Justiça, sendo, neste caso, legítima a ACP
proposta contra tais autoridades, ainda que por Promotor de Justiça. STF. 2ª Turma. ARE 706288 AgR/MS,
Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 2/6/2015 (Info 788).
10) Legitimidade da Defensoria Pública para ACP:
A Defensoria Pública pode propor ação civil pública na defesa de direitos difusos, coletivos e individuais
homogêneos. É constitucional a Lei nº 11.448/2007, que alterou a Lei 7.347/85, prevendo a Defensoria
Pública como um dos legitimados para propor ação civil pública. STF. Plenário. ADI 3943/DF, Rel. Min.
Cármen Lúcia, julgado em 6 e 7/5/2015 (Info 784).
11) Aplicabilidade do art. 18 da LACP para ação civil pública movida por sindicato:
O art. 18 da Lei 7.347/85 prevê que o autor da ACP, antes de ajuizar a ação, não terá que adiantar custas,
emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem será condenado em honorários
advocatícios, custas e despesas processuais, salvo comprovada má-fé. O STJ decidiu que esse art. 18 da Lei
7.347/85 é aplicável também para a ação civil pública movida por SINDICATO na defesa de direitos

120
individuais homogêneos da categoria que representa. STJ. Corte Especial. EREsp 1322166-PR, Rel. Min.
Mauro Campbell Marques, julgado em 4/3/2015 (Info 558).
12) Alcance da regra de isenção de custas processuais da LACP e do CDC:
O art. 18 da LACP e o art. 87 do CDC preveem que, nas ações de que tratam estas leis, não haverá
adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação
da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais.
O STJ decidiu que essas regras de isenção só se aplicam para as custas judiciais em: • ações civis públicas
(qualquer que seja a matéria); • ações coletivas que tenham por objeto relação de consumo; e • na ação
cautelar prevista no art. 4º da LACP (qualquer que seja a matéria). Não é possível estender, por analogia ou
interpretação extensiva, essa isenção para outros tipos de ação (como a rescisória) ou para incidentes
processuais (como a impugnação ao valor da causa), mesmo que tratem sobre direito do consumidor. STJ. 2ª
Seção. PET 9892-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 11/2/2015 (Info 556).
13) Retenção de honorários contratuais em execução de demanda coletiva:
Na execução de título judicial oriundo de ação coletiva promovida por sindicato na condição de substituto
processual, não é possível destacar os honorários contratuais do montante da condenação sem que haja
autorização expressa dos substituídos ou procuração outorgada por eles aos advogados. STJ. 2ª Turma. REsp
1464567-PB, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 3/2/2015 (Info 555).
14) A eficácia da decisão proferida em ACP não fica limitada ao território do juízo prolator da decisão:
O art. 16 da Lei de Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85) estabelece o seguinte: Art. 16. A sentença civil fará
coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for
julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar
outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova. (Redação dada pela Lei nº 9.494/97) O que
o art. 16 quis dizer foi o seguinte: a decisão do juiz na ação civil pública não produz efeitos no Brasil todo. Ela
irá produzir efeitos apenas na comarca (se for Justiça Estadual) ou na seção ou subseção judiciária (se for
Justiça Federal) do juiz prolator. Para o STJ, o art. 16 da LACP é válido? A decisão do juiz na ação civil pública
fica restrita apenas à comarca ou à seção (ou subseção) judiciária do juiz prolator? NÃO. A posição que
prevalece atualmente é a seguinte: A eficácia das decisões proferidas em ações civis públicas coletivas NÃO
deve ficar limitada ao território da competência do órgão jurisdicional que prolatou a decisão. STJ. Corte
Especial. EREsp 1134957/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 24/10/2016.
15) Mesmo sem 1 ano de constituição, associação poderá ajuizar ACP para que fornecedor preste
informações ao consumidor sobre produtos com glúten:
Como regra, para que uma associação possa propor ACP, ela deverá estar constituída há pelo menos 1 ano.
Exceção. Este requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz quando haja manifesto interesse
social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser
protegido (§ 4º do art. 5º da Lei nº 7.347/85). Neste caso, a ACP, mesmo tendo sido proposta por uma
associação com menos de 1 ano, poderá ser conhecida e julgada. Como exemplo da situação descrita no § 4º
do art. 5º, o STJ decidiu que: É dispensável o requisito temporal (pré-constituição há mais de um ano) para
associação ajuizar ação civil pública quando o bem jurídico tutelado for a prestação de informações ao
consumidor sobre a existência de glúten em alimentos. STJ. 2ª Turma. REsp 1600172-GO, Rel. Min. Herman
Benjamin, julgado em 15/9/2016 (Info 591).
16) Cabe ACP com o objetivo de proibir tráfico de veículos pesados no Município:
É cabível ação civil pública proposta por Ministério Público Estadual para pleitear que Município proíba
máquinas agrícolas e veículos pesados de trafegarem em perímetro urbano deste e torne transitável o anel
viário da região. STJ. 2ª Turma. REsp 1294451-GO, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 1/9/2016 (Info
591).
17) Extensão dos efeitos de coisa julgada coletiva a autores de ações individuais não suspensas:
Os autores de ações individuais em cujos autos não foi dada ciência do ajuizamento de ação coletiva e que
não requereram a suspensão das demandas individuais podem se beneficiar dos efeitos da coisa julgada
formada na ação coletiva. STJ. 1ª Turma. REsp 1593142-DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em
7/6/2016 (Info 585).
18) Necessidade de demonstração de motivos para a formação de litisconsórcio ativo facultativo entre o
MPE e o MPF:
Em ação civil pública, a formação de litisconsórcio ativo facultativo entre o Ministério Público Estadual e o
Federal depende da demonstração de alguma razão específica que justifique a presença de ambos na lide.
STJ. 3ª Turma. REsp 1254428-MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 2/6/2016 (Info 585).
121
19) Legitimidade ativa de associação para a defesa de interesses de seus filiados:
A associação não tem legitimidade ativa para defender os interesses dos associados que vierem a se agregar
somente após o ajuizamento da ação de conhecimento. STJ. 2ª Turma. REsp 1468734-SP, Rel. Min. Humberto
Martins, julgado em 1º/3/2016 (Info 579).
20) Compartilhamento no inquérito civil das provas colhidas em investigação criminal mesmo que
acobertadas pelo sigilo:
É possível compartilhar as provas colhidas em sede de investigação criminal para serem utilizadas, como
prova emprestada, em inquérito civil público e em outras ações decorrentes do fato investigado. Esse
empréstimo é permitido mesmo que as provas tenham sido obtidas por meio do afastamento ("quebra")
judicial dos sigilos financeiro, fiscal e telefônico. STF. 1ª Turma. Inq 3305 AgR/RS, Rel. Min. Marco Aurélio,
red. p/ o acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 23/2/2016 (Info 815).
21) Associação de defesa do consumidor não tem legitimidade para ajuizar ACP discutindo DPVAT:
Uma associação que tenha fins específicos de proteção ao consumidor não possui legitimidade para o
ajuizamento de ação civil pública com a finalidade de tutelar interesses coletivos de beneficiários do seguro
DPVAT. Isso porque o seguro DPVAT não tem natureza consumerista, faltando, portanto, pertinência
temática. STJ. 2ª Seção. REsp 1091756-MG, Rel. Min. Marco Buzzi, Rel. Acd. Min. Marco Aurélio Bellizze,
julgado em 13/12/2017 (Info 618).
22) Emenda da inicial da ACP mesmo após ter sido apresentada a contestação:
Admite-se emenda à inicial de ação civil pública, em face da existência de pedido genérico, ainda que já
tenha sido apresentada a contestação. STJ. 4ª Turma.REsp 1279586-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão,
julgado em 03/10/2017 (Info 615).
23) Não se aplica a remessa necessária do art. 19 da LACP para as ações coletivas tutelando direitos
individuais homogêneos:
Não se admite o cabimento da remessa necessária, tal como prevista no art. 19 da Lei nº 4.717/65, nas ações
coletivas que versem sobre direitos individuais homogêneos. Ex: ação proposta pelo MP tutelando direitos
individuais homogêneos de consumidores. STJ. 3ª Turma.REsp 1374232-ES, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado
em 26/09/2017 (Info 612).
24) MP não pode obter, em ACP, informações bancárias sobre os clientes da instituição porque estas são
protegidas pelo sigilo bancário:
O exercício da legitimação extraordinária, conferida para tutelar direitos individuais homogêneos em ação
civil pública, não pode ser estendido para abarcar a disposição de interesses personalíssimos, tais como a
intimidade, a privacidade e o sigilo bancário dos substituídos. Configura quebra de sigilo bancário a decisão
judicial que antecipa os efeitos da tutela para determinar que o banco forneça os dados cadastrais dos
correntistas que assinaram determinado tipo de contrato, a fim de instruir ação civil pública. STJ. 3ª Turma.
REsp 1611821-MT, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 13/6/2017 (Info 607).
25) Para ser beneficiada pela sentença favorável da ação coletiva proposta por associação é necessário que
a pessoa esteja filiada no momento da propositura e seja residente no âmbito da jurisdição do órgão
julgador:
A eficácia subjetiva da coisa julgada formada a partir de ação coletiva, de rito ordinário, ajuizada por
associação civil na defesa de interesses dos associados, somente alcança os filiados, residentes no âmbito da
jurisdição do órgão julgador, que o fossem em momento anterior ou até a data da propositura da demanda,
constantes da relação jurídica juntada à inicial do processo de conhecimento. STF. Plenário. RE 612043/PR,
Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 10/5/2017 (repercussão geral) (Info 864). Sobre o mesmo tema, veja
também: STF. Plenário. RE 573232/SC, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o acórdão Min. Marco
Aurélio, julgado em 14/5/2014 (repercussão geral) (Info 746).
26) Legitimidade do Município para defesa dos consumidores:
Município tem legitimidade ad causam para ajuizar ação civil pública em defesa de direitos consumeristas
questionando a cobrança de tarifas bancárias. Em relação ao Ministério Público e aos entes políticos, que
têm comofinalidades institucionais a proteção de valores fundamentais, como a defesacoletiva dos
consumidores, não se exige pertinência temática e representatividadeadequada. STJ. 3ª Turma. REsp
1509586-SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/05/2018 (Info 626).
27) É possível que as associações privadas façam transação em ação civil pública:
A associação privada autora de uma ação civil pública pode fazer transação com o réu e pedir a extinção do
processo, nos termos do art. 487, III, “b”, do CPC. O art. 5º, § 6º da Lei nº 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública)
prevê que os órgãos públicos podem fazer acordos nas ações civis públicas em curso, não mencionando as
122
associações privadas. Apesar disso, a ausência de disposição normativa expressa no que concerne a
associações privadas não afasta a viabilidade do acordo. Isso porque a existência de previsão explícita
unicamente quanto aos entes públicos diz respeito ao fato de que somente podem fazer o que a lei
determina, ao passo que aos entes privados é dado fazer tudo que a lei não proíbe. STF. Plenário. ADPF
165/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 1º/3/2018 (Info 892).
28) Legitimidade do Ministério Público para a defesa coletiva dos consumidores:
Súmula 601-STJ: O Ministério Público tem legitimidade ativa para atuar na defesa de direitos difusos,
coletivos e individuais homogêneos dos consumidores, ainda que decorrentes da prestação de serviço
público. STJ. Corte Especial. Aprovada em 07/02/2018, DJe 14/02/2018.

APLICABILIDADE DO CPC ÀS AÇÕES COLETIVAS.


Considerando que as normas que integram o microssistema da tutela coletiva deverão ser aplicadas de
forma subsidiária às ações coletivas, imprescindível afirmar que as normas do CPC serão aplicáveis de
maneira residual, ou seja, somente quando não for encontrada solução decorrente da aplicação do
microssistema. Este entendimento que determina a aplicação residual do CPC, parte da premissa de que tal
norma (CPC) não figura no microssistema da tutela coletiva. Segundo Rodrigo Mazzei, a aplicação é residual
e não meramente subsidiária, pois verificada a omissão no diploma coletivo especial, o intérprete, antes de
angariar solução na codificação processual, deverá buscar os ditames constantes dentro do microssistema
coletivo. No entanto, esse entendimento tinha razão de ser na vigência do CPC/73. A doutrina diverge acerca
da inserção do CPC/2015 no microssistema do processo coletivo. Para uma 1ª tese, a aplicação dar-se-á da
seguinte forma: a) aplicação da lei específica que regulamenta determinada ação específica; b) verificada a
omissão na lei específica, aplicar-se-á o microssistema da tutela coletiva, de forma subsidiária ou supletiva; c)
permanecendo a omissão, ou seja, caso as normas do microssistema não sejam suficientes para resolver a
situação, aplicar-se-á o CPC ou o CC, de forma residual. Essa é a formatação mais comum de ser encontrada
na doutrina (Ricardo Leonel de Barros, Elpídio Donizetti, Gregório Assagra). Para uma 2ª tese, imprescindível
observar os seguintes passos: a) omissão na regulamentação pela lei específica; b) definição dentro do
núcleo duro formado pelo CDC e LACP de qual norma deve ser aplicável; c) fora do núcleo duro, quais as
normas das demais leis integrantes do microssistema deverão ser aplicadas; d) fora do microssistema, devem
ser aplicadas as normas do CPC ou CC, conforme se tratar de questão relativa à direito processual ou
material. Para o entendimento da 1ª tese e da 2ª tese, o CPC/15 não é parte integrante do microssistema da
tutela coletiva e deve ser aplicável somente nos casos de inexistência de solução, ou seja, a aplicação será
residual ou eventual (Daniel Amorim Assumpção). Para uma 3ª tese, contudo, o CPC/2015 é parte integrante
do microssistema da tutela coletiva. Considerando que o CPC/2015 tem eficácia direta nos processos
coletivos e que passa a ser fonte do próprio microssistema, a aplicação dar-se-á da seguinte forma: a)
aplicação direta do diploma legislativo que regulamenta a ação coletiva posta em análise; b) caso seja
verificada omissão nesta regulamentação ou sendo esta insatisfatória, aplicam-se as normas do núcleo
essencial do microssistema da tutela coletiva (normas do CDC e da LACP); c) caso não seja encontrada a
solução, devem ser aplicadas as demais normas regulamentadoras dos demais processos coletivos. Todas
essas normas devem ser aplicadas em regime de coordenação com as normas previstas no CPC/2015 ,
desde que não conflitem com a lógica e com as próprias normas do microssistema e com a Constituição.
Assim, forçoso concluir que o CPC passou a ser aplicável de forma direta aos processos coletivos e não mais
de forma subsidiária, supletiva ou residual. Trata-se de posição mais consentânea com o nosso sistema
processual inaugurado com o CPC/2015, sendo, portanto, possível sustentar que o microssistema da tutela
coletiva deve ser articulado em um diálogo de fontes com a Constituição da República e o CPC/2015.
Microssistema Processual Coletivo e o CDC.
O CDC surgiu no ordenamento jurídico por imposição do art. 5º, XXXII, e do art. 48 do ADCT da CF.
Representa o conjunto de normas de ordem pública e interesse social, nos termos do seu art. 1º. Na seara
processual, conjuntamente com a LACP, constituem um microssistema que rege a ação coletiva para a tutela
de direitos coletivos em sentido amplo, denominado pela doutrina de “Código Brasileiro de Processo
Coletivo”.
O termo ação coletiva traduz, na verdade, um conjunto aberto de ações aptas a tutelar tais direitos. Nesse
sentido, claramente estabelece o art. 83 do CDC que, para a defesa dos direitos difusos e coletivos, são
admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela. (inibitória,
condenatória, constitutiva etc.).

123
Assim, à lei da ACP agregou-se o CDC, formando assim um sistema integrado. Isto porque o art. 90 do CDC
manda aplicar às ações ajuizadas com base nesse código as regras pertencentes à LACP e ao CPC
(subsidiariamente), naquilo que sejam compatíveis, havendo entre esses diplomas perfeita interação
("normas de reenvio").
O sistema de proteção dos direitos transindividuais é completado por leis esparsas, relativas a situações
específicas, como a lei de combate ao abuso de poder econômico (Lei n º 12.529/11) e o Estatuto da Criança
e do Adolescente (arts. 208 e ss.).
Outrossim, admite-se a utilização de tutelas cautelares (art. 4º da LACP) e de tutela antecipada (art.12 da
LACP) quando necessário para a consecução dos objetivos da tutela final pretendida. Portanto, não há uma
ação coletiva, mas sim tantos remédios quantas sejam as pretensões coletivas dedutíveis. Todavia, a LACP
contém uma disciplina mínima a respeito do procedimento a ser obedecido como regra em qualquer dessas
demandas.
Por sua vez, o Título, III, do CDC contempla inúmeras inovações processuais aplicáveis tanto às ações
individuais, como para as coletivas:
1. a possibilidade de determinar a competência pelo domicílio do autor consumidor ( art. 101, I,
do CDC);
2. vedação à denunciação da lide e um novo tipo de chamamento ao processo (art. 88 e 101, do
CDC);
3. possibilidade de o consumidor valer-se, na defesa de seus direitos, de qualquer ação cabível
(art. 83);
4. tutela específica em preferência à tutela do equivalente em dinheiro (art 84);
5. a extensão subjetiva da coisa julgada em benefício das pretensões individuais (art. 103);
6. regras de legitimação (art. 82) e de dispensa de honorários advocatícios (art. 87) específicas
para as ações coletivas e aperfeiçoadas em relação aos sistemas anteriores;
7. regulação da litispendência entre a ação coletiva e a ação individual (art. 104);
8. alteração e ampliação da tutela da LACP, harmonizando-se com o sistema do CDC.
Como exemplo de aplicação do microssistema, a doutrina defende a possibilidade de a pessoa jurídica de
direito público trocar de pólo nas ações coletivas em geral, prevista inicialmente no art. 6º, §3º, da Lei de
Ação Popular e no art. 17, p. 2º, da LIA (intervenção móvel ou reversibilidade da posição preocessual).
ACP e Ação de Impr.: é possível o uso da ACP com base na LIA, se o pedido for de reparação. Contudo, se for
de aplicação de sanção de perda do cargo ou suspensão de direitos políticos, caberá o rito da LIA. (Resp
735424/SP).

10A. Intervenção de terceiros. Embargos de terceiro. Sujeitos auxiliares do processo.

Lilian Farias de Queiroz Pierre

I. Intervenção de Terceiros.
1. Assistência: No CPC/2015, a assistência foi incluída expressamente como modalidade de intervenção de
terceiros, dividindo-se em assistência simples e assistência litisconsorcial. O pressuposto da assistência é a
existência de um interesse jurídico do terceiro na solução do processo, não se admitindo que um interesse
econômico, moral ou de qualquer outra natureza legitime a intervenção por assistência. A assistência é
admitida em qualquer procedimento (inclusive no processo de execução), em todos os graus de jurisdição,
recebendo o assistente o processo no estado em que se encontre (art. 119, parágrafo único, do CPC/2015).
No entanto, apesar da redação do CPC, não é cabível a assistência no procedimento dos juizados especiais
(art. 10 da Lei 9.099/05) e no processo objetivo (art. 7º, da Lei 9.868/99). Na assistência simples, o terceiro
possui relação jurídica apenas com uma das partes do processo (autor ou réu) que será juridicamente
atingida pela decisão a ser proferida no processo do qual não participa. Na assistência litisconsorcial, o
terceiro é titular da relação de direito material discutida no processo, sendo, portanto, diretamente atingido
em sua esfera jurídica pela decisão a ser proferida. Dessa forma, o assistente litisconsorcial tem relação
jurídica tanto com o assistido quanto com a parte contrária.

2. Denunciação da lide: É a única modalidade de intervenção de terceiros cuja legitimidade cabe tanto ao
autor quanto ao réu. Trata- se de uma ação regressiva antecipada (i.e., proposta antes mesmo do
desembolso) e eventual (porque somente será julgada se o denunciante for vencido na ação principal).
124
É admissível a denunciação da lide: (a) ao alienante imediato, no processo relativo à coisa cujo
domínio foi transferido ao denunciante, a fim de que possa exercer os direitos que da evicção lhe resultam;
(b) àquele que estiver obrigado, por lei ou pelo contrato a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo de quem
for vencido no processo. O direito de regresso pode ser exercido por ação autônoma quando a denunciação
da lide for indeferida, deixar de ser promovida ou não for permitida. Ou seja, a denunciação da lide é
facultativa (diferentemente do que constava do CPC/73). Admite-se uma única denunciação sucessiva,
promovida pelo denunciado, contra seu antecessor na cadeia dominial ou quem seja responsável por
indenizá-lo, não podendo o denunciado sucessivo promover nova denunciação, hipótese em que eventual
direito de regresso será exercido por ação autônoma. Para Daniel Amorim, não obstante a redação do art.
456 do CC prever que a denunciação da lide possa ser feita na pessoa do alienante imediato ou em qualquer
dos anteriores, o CPC/15 parece ter repudiado a denunciação per saltum, ao prever expressamente que a
denunciação deve ter como denunciado o alienante imediato. A interpretação do dispositivo do art. 456 do
CC condiciona a intervenção dos alienantes anteriores à lei do processo, e a lei processual prevê claramente
que a denunciação só cabe contra o alienante imediato. Se o denunciante for vencido na ação principal, o
juiz passará ao julgamento da denunciação da lide. Se o denunciante for vencedor, a ação de denunciação
não terá o seu pedido examinado, sem prejuízo da condenação do denunciante ao pagamento das verbas de
sucumbência em favor do denunciado.

03. Chamamento ao processo: Trata-se de mais uma modalidade de intervenção de terceiros de


iniciativa exclusiva do réu (intervenção provocada ou coata, portanto, ou seja, independe de concordância do
terceiro chamado). Serve como um “atalho” para o exercício do direito de regresso, pois, havendo o
chamamento, a sentença condenatória é título executivo contra e a favor de qualquer um dos co-obrigados
que tenha participado do processo. Isso significa que o autor (credor) pode promover a execução em face de
qualquer um deles, mas significa, também, que a mesma sentença poderá ser utilizada para que o devedor
cujo patrimônio responda pela obrigação possa buscar o reembolso do que houver excedido sua cota-parte
junto aos demais co-obrigados. É admissível o chamamento feito: (a) ao afiançado, na ação em que o fiador
for réu; (b) dos demais fiadores, na ação proposta contra um ou alguns deles; (c) dos demais devedores
solidários, quando o credor exigir de um ou de alguns o pagamento da dívida comum. O STJ pacificou sua
jurisprudência no sentido de que o chamamento ao processo da União com base no art. 130, III, do CPC/15,
nas demandas propostas contra os demais entes federativos responsáveis pelo fornecimento de
medicamentos ou prestação de serviços de saúde, não é impositivo, mostrando-se inadequado opor
obstáculo inútil à garantia fundamental do cidadão à saúde.

04. Incidente de desconsideração de personalidade jurídica: Trata-se de nova modalidade de


intervenção de terceiros prevista no CPC/2015, sendo incidente a ser instaurado a pedido da parte ou do
Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo. O CPC/2015 ainda trouxe expressamente a
possibilidade de aplicação da desconsideração inversa da personalidade jurídica (art. 133, §2º, do CPC/2015).
A desconsideração pode ocorrer em qualquer fase do processo de conhecimento, no cumprimento de
sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial (art. 134 do CPC). De acordo com o FPPC, é
desnecessária a intervenção do Ministério Público, como fiscal da ordem jurídica, no incidente de
desconsideração da personalidade jurídica, salvo nos casos em que deva intervir obrigatoriamente, previstos
no art. 178 (Enunciado 123). A instauração do incidente de desconsideração suspenderá o processo, salvo na
hipótese em que a desconsideração é requerida na petição inicial, quando não haverá processo incidental
(será citado o sócio ou a pessoa jurídica). O art. 135 do CPC consagrou o contraditório tradicional para a
desconsideração da personalidade jurídica, exigindo a intimação e oportunidade de manifestação dos sócios
antes de ser proferida a decisão. Nas hipóteses de tutela de urgência, é admissível o contraditório diferido na
desconsideração da personalidade jurídica, sendo admissível a prolação de decisão antes da intimação dos
sócios e da sociedade (REsp 1.182.620/SP). Concluída a instrução do incidente, este será resolvido por
decisão interlocutória, sujeita a recurso de agravo de instrumento. Se for resolvida a desconsideração da
personalidade jurídica na sentença, caberá apenas apelação.

05. Amicus Curiae: O amicus curiae contribui com a qualidade da decisão dando sua versão a
respeito da matéria discutida. No tratamento específico do terceiro ora tratado, existe corrente doutrinária
que entende ser inconfundíveis a figura do amicus curiae e as hipóteses de intervenção de terceiro, devendo
ser o primeiro considerado um mero auxiliar do juízo, em figura muito mais próxima do perito do que de um
125
terceiro interveniente. Para outros, apesar das especificidades, trata-se de um terceiro interveniente atípico,
admitido no processo como parte não para defender interesse próprio ou alheio, mas para contribuir com a
qualidade da prestação jurisdicional. Em geral, há interesse institucional que justifica a participação do
amicus curiae. São condições alternativas a justificar o ingresso do amicus curiae (art. 138 do CPC): a
relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia.
A intervenção pode ocorrer por iniciativa própria do juiz (de ofício), por solicitação das partes, ou do próprio
amicus curiae. A decisão que admite o amicus curiae é irrecorrível, e a decisão que não admitir está sujeita a
recurso de agravo de instrumento (art. 1015, IX, do CPC) ou agravo interno (art. 1021). Quando houver
pluralidade de pedidos de admissão de amicus curiae, o relator deve observar como critério para definição
daqueles que serão admitidos, o equilíbrio na representatividade dos diversos interesses jurídicos
contrapostos no litígio, velando, assim, pelo respeito à amplitude do contraditório, paridade de tratamento e
isonomia entre todos os potencialmente atingidos pela decisão. É cabível a intervenção de amicus curiae no
procedimento do mandado de injunção, do mandado de segurança, e no procedimento de edição, revisão e
cancelamento de enunciados de súmula pelos tribunais. Em regra, a intervenção do amicus curiae não o
habilita a interpor recursos, ressalvada a interposição de embargos de declaração, e de recurso em face da
decisão que julgar o incidente de resolução de demandas repetitivas. Pelo Enunciado 392 do FPPC, o amicus
curiae pode recorrer da decisão que julgar recursos repetitivos.
→ Oposição: No CPC/2015, a oposição perde a natureza de intervenção de terceiros. A oposição passa a ser
procedimento especial previsto nos artigos 682 a 686 do CPC.
→ Nomeação à autoria: No CPC/2015, a nomeação à autoria perde a natureza de intervenção de terceiros, e
se caracteriza como incidente de correção de legitimidade passiva. A nova regra do CPC/2015 substitui a
disciplina do CPC/73 que fazia depender da concordância do nomeado para justificar a correção do polo
passivo. No CPC/15 a alteração do polo passivo não exige a concordância do novo réu indicado. Tem a
peculiar finalidade de permitir a correção da legitimidade passiva para a causa. O réu (nomeante), que é
mero detentor, no prazo para a resposta indica o verdadeiro proprietário ou possuidor da coisa.

II. Embargos de terceiro.


Os embargos de terceiro são ação de conhecimento de rito especial sumário, de que dispõe o
terceiro ou a parte a ele equiparada, sempre que sofra uma constrição de um bem do qual tenha posse
(como senhor ou possuidor) em razão de decisão judicial proferida num processo do qual não participe.
Também pode ser ação utilizada preventivamente com o propósito de evitar a constrição. Como o nome do
instituto deixa claro, a legitimidade para opor esses embargos é do terceiro, assim entendido todo aquele
que não é parte no processo (conceito puro, i.e., processual, de terceiro). Mais precisamente, os embargos
de terceiro são admissíveis quando bem do terceiro é atingido (ou ameaçado) por ato de constrição judicial,
como a penhora, o arresto e o sequestro. Os embargos de terceiro, portanto, se aproximam das ações
possessórias, pois são admitidos quando o terceiro sofre (ou há ameaça de que sofra) turbação ou esbulho
na posse de seus bens — com a peculiaridade de que esses atos de ofensa à posse são, no caso dos
embargos de terceiro, atos judiciais. Daí se extrai que a legitimidade para opor embargos de terceiro é
apenas do terceiro possuidor (seja a posse direta ou indireta) da coisa objeto do ato de constrição judicial.
Considera-se terceiro, para ajuizamento dos embargos: o cônjuge ou companheiro, quando defende a posse
de bens próprios ou de sua meação; o adquirente de bens cuja constrição decorreu de decisão que declara a
ineficácia da alienação realizada em fraude à execução; quem sofre constrição judicial de seus bens por força
de desconsideração da personalidade jurídica, de cujo incidente não fez parte; e o credor com garantia real
para obstar a expropriação judicial do objeto de direito real de garantia, caso não tenha sido intimado, nos
termos legais dos atos expropriatórios respectivos. Por meio dos embargos de terceiro, o terceiro
(embargante) não ingressa no processo alheio em que foi praticado o ato de constrição judicial: os embargos
de terceiro são uma ação que dá origem a um novo processo, autônomo e incidental com relação àquele
outro. É competente para processar e julgar os embargos de terceiro o juízo que determinou a prática do ato
de constrição judicial. Nos casos de ato de constrição judicial praticado em cumprimento de carta precatória,
“o juízo deprecado é o competente para julgar os embargos de terceiro, salvo se o bem apreendido foi
indicado pelo juízo deprecante” (TFR, súm. 33; STJ, 1ª Seção, CC 39.384, rel. Min. Luiz Fux, j. 24.08.05, v.u.).
Aliás, versando os embargos de terceiro sobre todos os bens que foram objeto de constrição, o processo
principal será suspenso; caso versem sobre parte dos bens apenas, o processo principal prosseguirá com
relação à parte não embargada.

126
III. Sujeitos Auxiliares do Processo.
Os auxiliares da Justiça são sujeitos secundários do processo que realizam serviços complementares à
jurisdição, sob a autoridade do juiz. Também a eles se aplica o dever de imparcialidade, de modo que podem
ser recusados pela parte por suspeição ou imparcialidade.

1. Auxiliares permanentes da Justiça: Integram os quadros do Poder Judiciário, i.e., são servidores da Justiça
(em alguns Estados, ainda há cartórios não-oficializados e, portanto, serventuários). Dentre eles, destacam-
se o escrivão (Justiça Estadual) ou diretor de secretaria (Justiça Federal), o oficial de justiça, o distribuidor e o
depositário público.

2. Auxiliares eventuais da Justiça: Não pertencem aos quadros fixos do Poder Judiciário, sendo chamados a
colaborar com este caso a caso. Os principais exemplos são o perito e o intérprete.

10B. Teoria Geral dos Recursos. Duplo Grau de Jurisdição. Efeitos dos Recursos. Pressupostos Recursais.

Renan Lima

Obs.: nos casos em que, neste ponto, for utilizado o termo “CPC” desacompanhado de especificação, ou
mesmo quando for indicado um dispositivo legal sem indicação do diploma correspondente, trata-se de
referência ao CPC de 2015.

1. MEIOS DE IMPUGNAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS: recurso é um dos meios de impugnação das decisões,
ao lado das ações autônomas de impugnação e dos sucedâneos recursais. As ações autônomas de
impugnação buscam a revisão de uma decisão judicial, dando origem a um novo processo (ex.: ação
rescisória, querela nullitatis, embargos de terceiro, reclamação, mandado de segurança contra ato judicial). O
sucedâneo recursal é tudo quanto não seja nem recurso, nem ação autônoma de impugnação, e sirva para
impugnar uma decisão judicial. Trata-se, portanto, de conceito residual (ex.: pedido de suspensão de
segurança, pedido de reconsideração, correição parcial e, para doutrina majoritária, também a remessa
necessária).

2. CONCEITO DE RECURSO: Nas palavras de Marinoni, Arenhart e Mitidiero, pode-se definir o recurso como
“o meio de impugnação de decisões judiciais, voluntário, interno ao processo em que se forma o ato judicial
atacado, apto a obter a sua reforma, anulação ou o seu aprimoramento”.
O direito de recorrer é conteúdo do direito de ação – e também do direito de exceção. Cuida-se de meio de
impugnação da decisão judicial previsto em lei para, no mesmo processo, reformar, invalidar, esclarecer ou
integrar a decisão judicial.
Características:
Meio voluntário: para a doutrina majoritária, recurso é um meio voluntário de impugnação de decisão
judicial. Logo, a remessa necessária não é considerada recurso. Parcela minoritária, contudo, entende que a
remessa necessária seria um recurso necessário, ou seja, por imposição legal. Didier é adepto à corrente
minoritária, pois entende que a voluntariedade não é pressuposto do recurso e que todos os poderes que o
relator tem para julgar o recurso se aplicam ao julgamento da remessa necessária. Todavia, predomina que
o reexame necessário não tem natureza de recurso, mas de condição de eficácia da sentença.
Previsto em lei: cabe à lei criar recursos. Portanto, os regimentos internos dos tribunais não podem criar
recursos, mas apenas disciplinar o seu processamento. Por isso não era correto o termo “agravo regimental”,
adotado na sistemática do CPC/73, que dava a entender que se tratava de agravo previsto no regimento.
Atenção: o CPC/15 unificou a terminologia, prevendo o agravo interno.
Obs.: o CPC/15 criou a cláusula geral de negociação processual, todavia, as partes não podem criar um
recurso por negócio jurídico, pois tal tarefa cabe apenas ao Poder Legislativo.
De acordo com os Marinoni, Arenhart e Mitidiero, o direito ao recurso não pode ser visto como uma resposta
natural ou mesmo uma decorrência necessária da inconformidade diante da decisão judicial. “O contexto
cultural em que o processo civil está inserido influencia a previsão ou não do direito ao recurso e a maneira
como esse pode ser exercido – especialmente no que tange à sua extensão, isto é, matéria que pode ser nele
debatida”.

127
Para, no mesmo processo: o recurso serve para impugnar decisão judicial no mesmo processo (mesma
relação jurídica) em que esta foi proferida. Logo, o recurso não dá origem a processo novo, mas prolonga a
existência daquele em que foi interposto. Com isso, ficam afastadas do conceito de recurso as ações
autônomas de impugnação.
Reformar, invalidar, esclarecer ou integrar a decisão judicial: recurso possui natureza de ato postulatório,
pois veicula um pedido, que pode ser de reforma, invalidação, esclarecimento ou integração da decisão.
Obs.: o pedido recursal não se confunde com o pedido da petição inicial. O recurso tem seu próprio mérito
(que não se confunde com o mérito da causa). Além disso, o recurso tem seu próprio pedido. Em sendo ato
postulatório, admite-se cumulação de pedidos recursais (ex.: pedir que a sentença seja reformada e, se não o
for, que seja invalidada; pedir reforma de um dos capítulos da decisão e anulação de outro). Admite-se,
ademais, a inépcia do recurso (ex.: recurso que não tem pedido é inepto); exigência de interpretação do
recurso de acordo com o conjunto da postulação e com a boa-fé etc.
Como ato postulatório que é, o recurso tem pedido, mas deve também ter causa de pedir recursal. Assim,
para cada um dos pedidos (reforma, invalidação, esclarecimento ou integração), deve corresponder uma
causa de pedir recursal.
O pedido de reforma da decisão se relaciona com a causa de pedir recursal denominada error in judicando.
Trata-se do pedido para que a decisão seja corrigida/revista, sob o fundamento de que está errada ou é
injusta. Quem pede a reforma questiona o conteúdo, o mérito da decisão. Pede-se que o tribunal profira
outra decisão em sentido diverso daquela que foi objeto da impugnação.
Por sua vez, o pedido de invalidação se relaciona com a causa de pedir recursal denominada error in
procedendo (qualquer vício formal da decisão). É o pedido para desfazer a decisão em razão de defeito
formal. Pede-se a invalidação sob o fundamento de que a decisão é nula. Nesse caso, não é questionado o
conteúdo da decisão, mas a sua validade. Ex.: ausência de motivação, decisão ultra petita etc.
Para o pedido de esclarecimento, a causa de pedir é a existência de obscuridade ou a contradição na decisão.
Por fim, para o pedido de integração, a causa de pedir é a omissão (integrar é completar a decisão). Os
pedidos de esclarecimento e integração costumam ser apresentados por meio de embargos de declaração.

3. DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO: Conceito: Conforme Marinoni, Arenhart e Mitidiero, “ter direito ao duplo
grau de jurisdição significa ter direito a um duplo juízo a respeito de determinada questão submetida ao
Poder Judiciário”.
Para uma parcela da doutrina, trata-se de princípio previsto implicitamente na CR/88. Para essa concepção, o
duplo grau pode ser extraído da organização hierarquizada do Poder Judiciário, com existência de vários
tribunais e a previsão legal dos recursos. Nas palavras de Marinoni, Arenhart e Mitidiero, o direito ao duplo
grau de jurisdição “decorre da previsão inespecífica de competência recursal para as Cortes de Justiça”.
A Convenção Americana dos Direitos Humanos prevê expressamente o duplo grau de jurisdição, em seu art.
8º, 2, h(direito de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior). Discute-se se essa previsão teria
aplicabilidade apenas no âmbito do processo penal. Nesse sentido, a Corte Interamericana de Direitos
Humanos já teve inúmeras oportunidades de se manifestar acerca do direito ao duplo grau de jurisdição, tal
como nos seguintes casos: Barreto Leiva vs. Venezuela, Liakat Ali Alibux vs. Suriname (a garantia do duplo
grau se aplica também quando o acusado é julgado pela instância máxima do seu país) e Mohamed vs.
Argentina (a garantia do duplo grau de jurisdição nasce com a prolação de uma sentença desfavorável ao
indivíduo, logo, mesmo se o acusado é absolvido em primeira instância e depois condenado na segunda
instância, a ele deve ser garantido um recurso ordinário para submeter sua condenação a um duplo grau,
com possibilidade de discutir fatos, provas e matérias jurídicas).
Obs. 2: a Corte Europeia de Direitos Humanos, por outro lado, admite que o direito ao duplo grau possa ser
limitado quando o interessado tenha sido julgado em primeira instância pela mais alta jurisdição.
ATENÇÃO: Para Marinoni, Arenhart e Mitidiero, no processo civil, o duplo grau de jurisdição “não se trata de
um direito fundamental: o legislador infraconstitucional pode dispor a respeito de sua conformação”. Com
efeito, para os referidos autores, o legislador infraconstitucional “não se encontra obrigado a observar o
duplo grau em todos os casos, tanto é assim que existem inúmeras exceções na lei processual”.
Exemplos citados como exceções ao duplo grau de jurisdição: sentenças proferidas em execuções fiscais de
valor igual ou menor a 50 (cinquenta) OTN e decisões proferidas em sede de competência originária pelo
Supremo Tribunal Federal.
Conteúdo: direito assegurado à parte vencida de provocar outra avaliação acerca do seu alegado direito, em
regra perante órgão jurisdicional diverso, com outra composição e hierarquia superior. Excepcionalmente,
128
contudo, há casos em que a reapreciação ocorre perante o mesmo órgão, alterada ou não sua composição
originária. Assegura-se que a matéria decidida seja sujeita a dois julgamentos, com vistas a prevenir o abuso
de poder do juiz.
Iniciativa da parte: em regra, o duplo grau depende de iniciativa da parte. Todavia, há casos em que a
própria lei impõe o duplo grau (remessa necessária – art. 496, CPC).
Classificações: tem-se duplo grau vertical quando a revisão é feita por outro órgão de nível hierárquico
superior em relação àquele que originariamente proferiu a decisão, e duplo grau horizontal quando a
decisão é revista por órgão da mesma hierarquia, mas de composição diversa (ex.: turmas recursais dos
Juizados Especiais, que são compostas por juízes de primeira instância).
Críticas: parcela da doutrina (Marinoni; Koehler) tem apresentado pontos negativos do duplo grau, como (i)
prolongamento do processo e, consequentemente, elevação dos custos; (ii) desprestígio da primeira
instância, que passa a ser vista como mero juízo instrutório e de emissão de “opiniões” quanto ao mérito da
causa; (iii) quebra da unidade do poder jurisdicional; e (iv) insegurança.
Limites: há regras constitucionais que atribuem competência originária aos tribunais para julgarem certas
causas, sem recurso de devolução plena, bem como há técnicas previstas no CPC que atribuem ao tribunal o
julgamento direto do mérito, sem que órgão inferior o tenha apreciado (art. 1.013, § 3º) e que permitem ao
recorrente deduzir questões novas no recurso (art. 1.014).
Didier destaca as seguintes regras do CPC/15:
- Apreciada uma das questões de mérito (decadência, p. ex.), o tribunal, rejeitando-a, pode julgar as demais
que não foram examinadas na sentença (art. 1.013, § 1º);
- Interposta apelação contra sentença que não examina o mérito, o tribunal pode julgar diretamente o
mérito (art. art. 1.013, § 3º, I);
- Percebendo afronta à regra da congruência e anulada a decisão, o tribunal pode prosseguir e julgar o
mérito sem tal vício (art. art. 1.013, § 3º, II);
- Verificando omissão do juiz quanto à apreciação de um dos pedidos do autor, o tribunal pode corrigir o
vício julgando o pedido (art. art. 1.013, § 3º, III);
- Se o juiz de 1º grau, em caso de cumulação eventual de pedidos, acolher o primeiro e rejeitar o segundo,
não há óbice a que o tribunal rejeite o primeiro e acolha o segundo, p. ex. (art. 1.013, § 3º, III);
- Se o tribunal anular a sentença por vício na fundamentação, pode julgar a causa com a motivação adequada
(art. 1.013, § 3º, IV).

4. CLASSIFICAÇÃO DOS RECURSOS:


a) Quanto à extensão da matéria (art. 1.002, CPC): o denominado recurso total é aquele que abrange todo o
conteúdo impugnável da decisão recorrida, ao passo que no recurso parcial, o recorrente, voluntariamente,
impugna apenas parte do conteúdo impugnável da decisão (ex.: apenas uma parcela ou um capítulo da
decisão), e parcela da decisão que não foi recorrida fica acobertada pela preclusão. Ao julgar recurso parcial,
o tribunal não pode adentrar o exame de qualquer aspecto referente à parcela/capítulo não impugnado.
Obs.: se o recorrente não especificar a parte em que impugna a decisão, o recurso deve ser interpretado
como total.
b) Quanto à fundamentação: no recurso de fundamentação livre, o recorrente pode impugnar a decisão por
qualquer razão, sem que isso influencie na sua admissibilidade (ex.: apelação, agravo de instrumento,
recurso ordinário), ao passo que no recurso de fundamentação vinculada, o recorrente só pode alegar a
existência de determinado tipo de vício na decisão. A fundamentação do recurso, neste caso, fica vinculada
às hipóteses legais, sendo sua causa de pedir fechada, típica (ex.: embargos de declaração, REsp, RE).
c) Recurso principal/independente e recurso subordinado: principal, independente ou não subordinado é
aquele recurso interposto independentemente da outra parte, ao passo que o recurso subordinado se
verifica quando o sujeito recorre apenas porque a outra parte recorreu, ficando o recurso daquele
subordinado a este. Em sendo assim, o recurso subordinado não será conhecido se houver desistência do
recurso principal ou se este for considerado inadmissível.
Obs. 1: o que se chama recurso subordinado é, em verdade, um modo de interposição de recursos, mas não
uma espécie de recurso.
Obs. 2: na sistemática do CPC/73, recurso subordinado e recurso adesivo eram designações sinônimas; com o
CPC/15, recurso subordinado passa a ser gênero, de que são espécies o recurso adesivo e a apelação do
vencedor contra decisão interlocutória.

129
5. ATOS SUJEITOS A RECURSO:
5.1. Decisões de juiz:
a) Decisão interlocutória: impugnável por agravo de instrumento (art. 1.015, CPC), apelação (art. 1.009, § 1º,
CPC – inovação no CPC/15) ou agravo contra decisão que versa sobre tutela provisória de urgência nos
Juizados Especiais Federais (art. 5º, Lei 10.259/01) e nos Juizados Especiais da Fazenda Pública (art. 4º, Lei
12.153/09).
b) Sentença: em regra, contra sentença cabe apelação (art. 1.009, CPC). Todavia é cabível o recurso
inominado, em face das sentenças nos Juizados Especiais Cíveis (arts. 41 e 42, Lei 9.099/95), agravo de
instrumento em face da sentença que decreta falência (Lei 11.101/05) e embargos infringentes de alçada
contra sentença em execução fiscal de até 50 ORTN, os quais são julgados pelo próprio juiz, e não pelo
tribunal (art. 34, Lei 6.830/80).
Obs. 1: o agravo retido deixou de existir na sistemática do CPC/15.
Obs. 2: não há mais polêmica sobre qual recurso cabível contra as decisões parciais, uma vez que o CPC/15
prevê expressamente o cabimento de agravo de instrumento.
5.2. Decisões em Tribunal:
a) Decisão unipessoal: proferida por apenas um membro do tribunal.
- Decisão unipessoal do relator: impugnável por agravo interno (art. 1.021, CPC).
- Decisão unipessoal do presidente ou vice-presidente do tribunal: impugnável por agravo interno (arts.
1.030, § 2º, 1.035, § 7º, e 1.036, § 3º, CPC) ou agravo em recurso especial ou extraordinário, contra decisão
de presidente ou vice-presidente do tribunal que não admite RE ou REsp na origem (art. 1.042, CPC).
b) Acórdão: preferido pelo colegiado. Impugnável por recurso especial, recurso extraordinário (salvo acórdão
que defere medida liminar – súmula 735, STF), recurso ordinário constitucional (arts. 102, II, “a”, e 105, II,
“b”, CR) e embargos de divergência.
Súmula 735, STF. Não cabe recurso extraordinário contra acórdão que defere medida liminar.
Obs. 1: CPC/15 não prevê os embargos infringentes, os quais tinham previsão no CPC/73 e eram cabíveis em
face de acórdão.
Obs. 2: cabe recurso extraordinário contra decisão do juiz em execução fiscal que julga os embargos
infringentes de alçada (súmula 640, STF). Cuida-se de exceção à regra de que RE é cabível contra acórdão.

Os embargos de declaração são cabíveis contra qualquer espécie de decisão. Por outro lado, os despachos e
os atos praticados por escrivão e chefe de secretaria (em razão de delegação do magistrado), não possuem
caráter decisório, motivo pelo qual são irrecorríveis.

6. DESISTÊNCIA DO RECURSO E RENÚNCIA AO DIREITO DE RECORRER:


6.1. Desistência do recurso:
a) Pressupõe que o recurso já tenha sido interposto, portanto, é posterior ao recurso;
b) Pode ser total ou parcial;
c) Pode ocorrer até o início do julgamento, por escrito ou em sustentação oral (sempre de modo expresso);
d)É negócio jurídico unilateral, pois independe do consentimento da outra parte (art. 998, CPC) – difere-se da
desistência da causa, que depende de homologação;
e)Independe de homologação judicial para produção de efeitos;
f)Exige poder especial do advogado e, se implicar a extinção do processo com decisão de mérito
desfavorável, também exige o poder de disposição do direito material discutido;
g) Somente produz efeito em relação ao recorrente (é conduta determinante) e, em caso de litisconsórcio
unitário, somente é eficaz se todos os litisconsortes desistirem;
h) É fato impeditivo, de modo que, a parte que desistiu fica impedida de interpor novo recurso, ainda que
dentro do prazo.
Obs. 1: em regra, a desistência extingue o procedimento recursal (exceções: casos de desistência parcial e
quando há outro recurso pendente) – mas não necessariamente extingue o processo (ex.: no caso de
desistência de agravo de instrumento).
Obs. 2: desistência de recurso interposto pela Fazenda Nacional (art. 19, Lei 10.522/02) → possível sempre
que a tese fazendária for contrária (i) a precedentes oriundos de julgamento de recursos repetitivos; e (ii) à
jurisprudência pacífica do STF e demais Tribunais Superiores, devidamente ratificada por ato declaratório do
Procurador-Geral da Fazenda Nacional, aprovado pelo Ministro da Fazenda.

130
Obs. 3: desistência do recurso não impede análise da repercussão geral ou da tese a ser fixada no julgamento
dos recursos repetitivos, nem mesmo a desistência do recurso afetado no IRDR impede o julgamento do
incidente.
Obs. 4: no REsp 1.308.830/RS (inf. 497, STJ), o recorrente desistiu do recurso após sua inclusão em pauta e na
véspera do seu julgamento. A Min. Nancy Andrighi indeferiu o pedido de desistência do recorrente sob a
alegação de interesse público na definição da tese a ser adotada. Didier critica essa postura, pois entende
que a desistência não se pede; a parte possui o direito de desistir e, simplesmente desiste do recurso, sendo
os efeitos imediatamente produzidos.

DESISTÊNCIA DA AÇÃO DESISTÊNCIA DO RECURSO


Pode implicar extinção do processo com ou
Extingue o processo sem resolução de sem resolução do mérito, bem como pode
mérito. não implicar a extinção do processo (ex.:
desistência de agravo de instrumento).
Depende de homologação pelo juiz. Independe de homologação.
Depende de consentimento do réu, se já Independe de consentimento da parte
houver contestação. contrária.
Requer poder especial do advogado e, se
implicar a extinção do processo com decisão
Requer poder especial do advogado. de mérito desfavorável, também exige o
poder de disposição do direito material
discutido.

6.2. Renúncia ao direito de recorrer:


a) Pressupõe a não interposição de recurso, sendo ato pelo qual a parte manifesta vontade de não interpor
recurso que era cabível na espécie, portanto, é sempre anterior ao recurso;
b) É um negócio jurídico unilateral, pois não depende do consentimento da outra parte (art. 999, CPC);
c) Não se admite renúncia tácita, devendo ser expressa.
d) É fato extintivo do direito de recorrer, de modo que eventual recurso interposto após a renúncia deve ser
considerado inadmissível.
Obs. 1: Com o CPC/15 ressurge a discussão de saber se é possível a renúncia prévia, ou seja, possibilidade de
a parte renunciar ao direito antes de o juiz/tribunal proferir a decisão. Entende-se, hoje, que é possível as
partes fazerem acordo processual no sentido de que nenhuma delas irá recorrer, qualquer que seja a decisão
(renúncia prévia convencional). É o caso do acordo de instância única. Segundo Didier, admite-se a renúncia
prévia ao direito de recorrer, desde que não haja vício de procedimento.
Obs. 2: renúncia não se confunde com aceitação/aquiescência à decisão que, embora também implique
preclusão lógica do direito de recorrer, é ato de conformação com a decisão, seja expresso ou tácito.
Obs. 3: há autores que, diversamente da forma como exposto acima, designam a desistência do recurso
como fato extintivo do direito de recorrer, e a renúncia como fato impeditivo de tal direito.

6.3. Aceitação/aquiescência da decisão: se o sujeito aceitou a decisão, não pode posteriormente recorrer. A
aceitação extingue o direito de recorrer e é também negócio unilateral, mas, diferentemente da renúncia,
pode ser expressa ou tácita (art. 1000, CPC). Ex.: cumprimento espontâneo da decisão.
Obs.: o art. 520, § 3º, CPC, que trata da execução provisória, admite a aplicação de multa, e dispõe que o
depósito do valor exequendo não pode ser considerado aceitação tácita, pois serve para impedir a incidência
da multa.
Art. 520, § 3º Se o executado comparecer tempestivamente e depositar o valor,
com a finalidade de isentar-se da multa, o ato não será havido como incompatível
com o recurso por ele interposto.

7. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DOS RECURSOS.


7.1. Juízo de admissibilidade vs. juízo de mérito:

Juízo de admissibilidade Juízo de mérito

131
Juízo que se faz sobre a validade
e aptidão do procedimento
recursal, para que o pedido
Juízo que se faz sobre o
recursal seja examinado.
Conceito próprio pedido recursal, se
Verifica a presença dos
deve ou não ser acolhido.
requisitos sem os quais não é
possível, sequer, examinar o
pedido.
Pronunciamento do Conhecer/admitir ou não Dar provimento ou negar
tribunal conhecer/inadmitir o recurso. provimento ao recurso.
Regra: juízo ad quem (aquele ao
qual se destina o recurso).
Exceções:
Regra: juízo ad quem.
- RE e REsp se submetem a
Exceção: casos em que o
duplo juízo de admissibilidade,
recurso possui efeito
realizado primeiramente pelo
regressivo, permitindo que o
juízo a quo (aquele que proferiu
juízo a quo se retrate (ex.:
a decisão), posteriormente pelo
apelação contra a sentença
juízo ad quem;
que indefere a petição
- Nos casos em que o mesmo
Competência inicial, que extingue o
órgão funciona como juízo a
processo sem exame do
quo e ad quem, este será o
mérito, ou que julga
responsável pelo juízo de
liminarmente improcedente
admissibilidade (ex.: embargos
o pedido; apelação nas
de declaração e embargos
causas do ECA; agravo de
infringentes de alçada);
instrumento; agravo interno;
- Relator, no tribunal, pode
agravo em RE e REsp).
decidir sozinho sobre a
admissibilidade do recurso,
cabendo agravo interno contra
esta decisão.

Obs. 1: juízo de admissibilidade é prévio/preliminar ao juízo de mérito. O tribunal primeiro examina a


admissibilidade do recurso e, em seguida, se for o caso, examina o mérito. Assim, se o tribunal conhecer o
recurso, poderá dar ou negar-lhe provimento, todavia, caso não conheça o recurso, sequer irá dar ou negar-
lhe provimento.
Obs. 2 - dever geral de prevenção: o art. 932, p. único, CPC, prevê o dever geral de prevenção, segundo o
qual antes de considerar inadmissível o recurso, o relator deve conceder ao recorrente prazo de 5 dias para
sanar o vício ou complementar a documentação exigível. Portanto, na sistemática do CPC/15, a
inadmissibilidade não é desejada, prevalecendo o princípio da primazia da decisão de mérito em tribunal.
Segundo o STF (inf. 829 - ARE 953221 AgR/SP), a regra do p. único, do art. 932, CPC, só se aplica aos casos em
que seja necessário sanar vícios formais, não podendo ser utilizada visando à complementação da
fundamentação. Logo, não se aplica aos casos em que o recorrente não atacou especificamente todos os
fundamentos da decisão recorrida, para fins de complementação das razões recursais.

7.2. Natureza jurídica da (in)admissibilidade:


a) Positiva: conhece o recurso – natureza declaratória e eficácia retroativa.
b) Negativa: inadmissibilidade – sobre a natureza jurídica, existe a seguinte controvérsia:
1ª corrente - minoritária: segundo Barbosa Moreira, a decisão que não conhece o recurso tem caráter
declaratório com eficácia retroativa (ex tunc)– retroage à data em que se verificar a causa de
inadmissibilidade. Significa que, se o Tribunal, em 2015, entende que o recurso não deve ser conhecido, deve
sê-lo desde o dia em que o recurso foi interposto em 2010, por exemplo. É como se o recurso não tivesse
sido interposto.
A consequência prática dessa corrente é no sentido de que se o recurso é inadmissível, não produz qualquer
efeito, pois é inadmissível desde sempre. Em razão disso, o recurso não impede o trânsito em julgado. No
132
caso do exemplo dado, desde 2010 a decisão teria transitado em julgado, ainda que sem o conhecimento da
parte. Não caberia nem mesmo ação rescisória, porque já ultrapassado o prazo de 2 anos.
2ª corrente - minoritária: segundo Didier, a decisão de inadmissibilidade é constitutiva, ou seja, invalida o
recurso sem eficácia retroativa (ex nunc)– respeita os efeitos até então produzidos.
3ª corrente: a decisão de inadmissibilidade é declaratória sem eficácia retroativa, ressalvadas duas hipóteses,
que admitem a retroação da decisão, quais sejam:
- Quando o não conhecimento decorre de intempestividade;
- Quando o não conhecimento decorre de descabimento do recurso.
Essa corrente foi encampada pelo TST, no enunciado 100 de sua súmula, e era a corrente majoritária.
O CPC/15 acabou com a discussão, colocando tais recursos com juízo de admissibilidade peculiar (art.
1.029, § 3º, CPC – permite a correção de recurso inadmissível, salvo o intempestivo; além disso, o art.
1.026, § 4º, CPC proíbe terceiros embargos de declaração se os dois anteriores forem considerados
protelatórios, assim, os terceiros embargos são incabíveis e não produzem efeito algum).

7.3 Pressupostos recursais ou requisitos de admissibilidade do recurso:


7.3.1. Requisitos intrínsecos de admissibilidade:
a) Cabimento: exige que a decisão seja recorrível e o recurso seja adequado/correto.
Didier identifica três normas fundamentais do sistema recursal brasileiro relacionadas ao cabimento:
(i) Taxatividade: o rol de recursos é taxativo; não se admite, portanto, recurso criado por negócio processual,
nem por regimento interno de tribunal.
(ii) Singularidade ou uni-recorribilidade: cada decisão deve ser impugnada por um recurso de cada vez, não
podendo se valer de mais de um recurso para impugnar a mesma decisão ao mesmo tempo. Há uma regra
implícita no sentido de que, havendo interposição de mais de um recurso em face da mesma decisão, deve
ser considerado inadmissível aquele interposto por último.
Obs.: segundo Didier, essa norma se aplica às decisões de juiz, pois contra acórdão, há previsão expressa do
cabimento, simultâneo, de RE e REsp, embora com objetivos distintos.
(iii) Fungibilidade dos recursos: o recurso interposto de forma inadequada (quando era cabível outro) deve
ser recebido como se correto fosse, pois os recursos são fungíveis entre si. A fungibilidade é corolário do
princípio da primazia da decisão de mérito. O CPC/15 prevê expressamente três regras de fungibilidade dos
recursos:
- Fungibilidade entre embargos de declaração e agravo interno;
- Fungibilidade entre RE e REsp;
- Fungibilidade entre REsp e RE.
Obs. 1: há também um princípio da fungibilidade, aplicável, a priori, a qualquer caso de interposição
incorreta de recurso. Sua aplicação, contudo, exige que não haja erro grosseiro na interposição do recurso
inadequado, pois este equivale à má-fé. Erro grosseiro é aquele que não encontra lastro doutrinário, nem
jurisprudencial.
Obs. 2: tradicionalmente, a aplicação da fungibilidade exigia observância do prazo para interposição do
recurso correto. Contudo, com a unificação dos prazos recursais em 15 dias (ressalvados os embargos de
declaração), a exigência perdeu o sentido.

b) Legitimidade: possuem legitimidade para recorrer, as partes do processo (não apenas autor e réu, mas
também todos aqueles que intervieram no processo), o terceiro prejudicado (recurso de terceiro, o qual é
uma modalidade de intervenção de terceiro - art. 996, CPC) e o Ministério Público (como parte ou como
fiscal da ordem jurídica).
Obs. 1: o conceito de parte inclui o sujeito acusado de suspeito ou impedido na arguição de suspeição ou
impedimento. O CPC/15 expressamente prevê a possibilidade de o juiz recorrer da decisão que o considera
impedido (o juiz é parte do incidente de suspeição ou impedimento, e recorre nessa condição).
Obs. 2: o assistente simples pode recorrer e seu recurso é admitido, ainda que o assistido não tenha
recorrido, salvo se este houver expressamente manifestado a vontade de não recorrer.
Obs. 3: o terceiro pode recorrer sempre que demonstrar que a decisão atinge um direito seu, ou quando for
substituto processual (legitimado extraordinário), caso em que o direito, embora não seja do terceiro, pode
ser por ele discutido em juízo, em razão da legitimação extraordinária. Nesse caso, o terceiro entra no
processo por meio do recurso (modalidade de intervenção de terceiro). O recurso de terceiro também pode

133
ser utilizado pelo litisconsorte necessário não citado/intimado. O prazo para o terceiro é o mesmo prazo para
as partes.
Obs. 4: no caso em que o MP atua como fiscal da ordem jurídica, pode recorrer mesmo que nenhuma das
partes recorra, pois sua legitimidade recursal independe do recurso das partes.
Súmula 99, STJ: O Ministério Público tem legitimidade para recorrer no processo em que oficiou como fiscal
da lei, ainda que não haja recurso da parte.
Súmula 226, STJ: O Ministério Público tem legitimidade para recorrer na ação de acidente do trabalho, ainda
que o segurado esteja assistido por advogado.
Obs.5: o amicus curiae é, nas palavras de Marinoni, Arenhart e Mitidiero, “terceiro que pode participar do
processo a fim de oferecer razões para sua justa solução, ou mesmo para formação de um precedente”. O
amicus curiae possui legitimidade recursal muito restrita, podendo recorrer apenas em três situações: (a)
recurso contra a decisão que não admite a sua intervenção; (b) embargos de declaração; e (c) recurso contra
decisão proferida em IRDR.
c) Inexistência de fatos impeditivos ou extintivos do direito de recorrer: para alguns autores, é considerado
requisito extrínseco. Cuida-se de requisito de admissibilidade negativo, ou seja, que se preenche com a
inexistência de determinados fatos, tais como: renúncia ao direito de recorrer, aceitação da decisão e
desistência do recurso.
d) Interesse recursal: segue a mesma lógica do interesse de agir, ou seja, para que haja interesse recursal, é
preciso que o recurso seja útil e necessário. É preciso demonstrar que o provimento do recurso pode
melhorar a situação do recorrente, e que esta melhora só pode ser alcançada pela interposição do recurso.
Ex.: é considerado desnecessário o recurso contra decisão que concede justiça gratuita, pois, nesse caso,
basta que a parte adversa faça impugnação da gratuidade em primeiro grau de jurisdição; é considerado
inútil o REsp ou RE interposto isoladamente, quando o acórdão recorrido possui fundamentos constitucional
e infraconstitucional, ambos autônomos e suficientes para mantê-lo (súmula 126, STJ).
Súmula 126, STJ: É inadmissível REsp, quando o acórdão recorrido assenta em fundamentos constitucional e
infraconstitucional, qualquer deles suficiente, por si só, para mantê-lo, e a parte vencida não manifesta RE.
Obs. 1: sempre se entendeu que faltaria interesse recursal em discutir o fundamento da decisão. Didier,
contudo, aponta dispositivos do CPC/15 que indicam a existência de interesse recursal em discutir o
fundamento da decisão (e não apenas o dispositivo) em certos casos:
- Embargos de declaração servem para discutir obscuridade, contradição e omissão da decisão, as quais
podem estar presentes apenas na fundamentação;
- A questão prejudicial incidental é resolvida na fundamentação e pode tornar-se indiscutível pela coisa
julgada (arts. 503, §§ 1º e 2º, CPC), assim, pode desafiar recurso;
- Recurso para discutir o precedente que irá se formar com a decisão e que se encontra na fundamentação
(ex.: recurso do amicus curiae contra decisão em IRDR - art. 138, § 3º, CPC).
- Recurso contra decisão que julga improcedente a ação por falta de provas, caso em que não se tem trânsito
em julgado da decisão e pode haver interesse na interposição de recurso para alteração da fundamentação
com vistas a julgamento de improcedência por falta de direito, apto à formação de coisa julgada (ex.:
processo coletivo).
Obs. 2: interesse recursal não se confunde com sucumbência. É evidente que quem sucumbiu tem interesse
recursal, mas pode também ter interesse recursal quem não sucumbiu (interesse para mudar a
fundamentação, p. ex.).

7.3.2. Requisitos extrínsecos de admissibilidade:


a) Preparo: é o adiantamento das despesas relacionadas ao processamento do recurso, composto pelas
custas e despesas postais, relacionadas aos portes de remessa e retorno dos autos. Se o processo tramitar
em autos eletrônicos, não há porte de remessa e retorno. O preparo é prévio ao recurso, devendo ser
comprovado quando de sua interposição, sob pena de deserção.
Obs.: antes da vigência do CPC/15, na Justiça Federal admitia-se a realização do preparo da apelação em até
5 dias após sua interposição. O CPC/15 uniformizou o tema, devendo o preparo ser feito antes de todo e
qualquer recurso e comprovado na interposição.
a.1) Pessoas dispensadas do preparo: o Ministério Público, os entes da Administração Pública Direta e suas
autarquias, bem como os beneficiários da justiça gratuita.
Obs.: INSS, quando atua na Justiça Estadual (ex.: acidente do trabalho), está obrigado a pagar custas, nos
termos da súmula 178, STJ. Os conselhos de fiscalização profissional também estão obrigados ao preparo.
134
a.2) Pedido de gratuidade em recurso: é possível recorrer e, no bojo do recurso, pedir a gratuidade de
justiça. Nesse caso, o requerente fica desincumbido de realizar o preparo. Todavia, em sendo negado o
pedido, a parte terá 5 dias para efetuá-lo (art. 101, CPC).
Obs.: Corte Especial do STJ (AgRg nos EREsp 1.222.355-MG – inf. 574) → é desnecessário o preparo de
recurso cujo mérito discute o próprio direito ao benefício da justiça gratuita. Assim, não se aplica a pena de
deserção a recursos interpostos contra decisão de indeferimento do pedido de justiça gratuita. Ademais, é
possível a formulação de pedido de assistência judiciária na própria petição recursal, dispensando-se a
exigência de petição avulsa, quando não houver prejuízo ao trâmite normal do processo.
a.3) Recursos dispensados do preparo: embargos de declaração, recursos do ECA, agravo interno, agravo em
RE e REsp e embargos infringentes de alçada.
a.4) Preparo insuficiente: não implica inadmissibilidade imediata, devendo o recorrente ser intimado para
complementar o preparo em 5 dias, sob pena de deserção.
a.5) Ausência de preparo: o recorrente deve ser intimado (não há prazo expresso, mas vale a regra geral de 5
dias) para efetuar o preparo em dobro, sob pena de deserção. Nesse caso, se, intimado para efetuar o
preparo em dobro, o recorrente o faz em valor insuficiente, fica vedada a concessão de novo prazo para
complementação.
Obs. 1: se o recorrente demonstrar que a ausência de preparo decorreu de justo motivo (ex.: tragédia na
cidade, greve bancária etc), o relator deve relevar a pena de deserção, por decisão irrecorrível, e fixar prazo
de 5 dias para realização do preparo.
Obs. 2: havendo equívoco no preenchimento da guia de custas, não se aplica pena de deserção, cabendo ao
relator intimar o recorrente para sanar o vício em 5 dias.
b) Regularidade formal: abrange as formalidades inerentes ao recurso, p.ex.: deve ser escrito (exceção: ED
nos Juizados Especiais Cíveis podem ser opostos oralmente); deve vir acompanhado das razões (princípio da
dialeticidade) e estar devidamente fundamentado (art. 489, § 1º, CPC); deve impugnar especificadamente a
decisão recorrida (art. 932, III, CPC); deve conter o pedido; deve ser assinado por quem tem capacidade
postulatória; no caso do agravo de instrumento, deve estar acompanhado dos documentos indispensáveis;
no caso do RE, deve discorrer sobre a repercussão geral etc.
c) Tempestividade: o recurso deve ser interposto no prazo (arts. 1.003 e 1.004, CPC).Em regra, o prazo para
interpor recurso é contado da intimação e a tempestividade é aferida pela data do protocolo.
Obs. 1: o CPC/15 padronizou o prazo de todos os recursos, que passou a ser de 15 dias, salvo os embargos de
declaração (5 dias) e eventuais prazos previstos na lei especial, como ocorre no ECA (10 dias). Ademais, nos
prazos fixados em dias, só se contam os dias úteis.
Obs. 2: as pessoas jurídicas de direito público, o Ministério Público e a Defensoria Pública*possuem prazo em
dobro para recorrer e para contra-arrazoar o recurso, contado da respectiva intimação**, salvo se houver
regra legal específica em sentido diverso.
* DP possui prazo em dobro quer quando seja parte, quer para as pessoas que estão sob sua assistência. Essa
regra foi estendida expressamente aos escritórios de prática jurídica das faculdades de Direito e às entidades
que prestam assistência judiciária em convênio com a Defensoria.
** a intimação da Advocacia Pública, Defensoria Pública e MP é pessoal (por carga, remessa ou meio
eletrônico).
Obs. 3: os prazos também são contados em dobro para litisconsortes, em sendo ambos sucumbentes, e com
advogados diferentes, de escritórios de advocacia distintos, salvo no caso de autos eletrônicos (art. 229, CPC,
c/c súmula 641, STF).
Súmula 641 do STF: Não se conta em dobro o prazo para recorrer, quando só um dos litisconsortes haja
sucumbido.
Obs. 4: em caso de falecimento da parte ou de seu advogado ou outro motivo de força maior que suspenda o
curso do processo, ocorridos durante o prazo para interposição do recurso, o prazo deve ser restituído à
parte, herdeiro ou sucessor (art. 1.004, CPC).
Obs. 5: em caso de feriado local na data da interposição do recurso, o ônus da respectiva comprovação é do
recorrente.
Obs. 6: em caso de recurso remetido por correio, considera-se interposto na data da postagem (art. 1.003, §
4º, CPC) → superação da súmula 216, STJ, que considerava a data do registro no protocolo da secretaria, e
não a data da postagem, para fins de tempestividade.

135
Obs. 7: no caso de decisão liminar, anterior à citação, o termo inicial do prazo para o réu recorrer é o mesmo
considerado para fins de contestação, ou seja, a data da juntada do mandado de citação (art. 1.003, § 2º,
CPC).
Obs. 8: o § 3º, art. 1.003, CPC, prevê que o recurso pode ser protocolado em cartório ou conforme as normas
de organização judiciária, ressalvado o disposto em regra especial. Com isso, percebe-se a possibilidade de
criação de protocolos descentralizados para recebimento dos recursos, já que os Tribunais, via de regra, são
localizados apenas nas capitais.

8. RECURSO PREMATURO: é aquele interposto antes do início do prazo. Na vigência do CPC/73, havia
discussão sobre a tempestividade ou não do recurso prematuro. O CPC/15 colocou fim à questão, pois prevê
expressamente que o ato praticado antes do início da fluência do prazo é tempestivo (art. 218, § 4º).

9. EFEITOS DOS RECURSOS:


a) Impede o trânsito em julgado: recurso prolonga a litispendência do processo, impedindo o trânsito em
julgado, salvo o recurso intempestivo e o recurso manifestamente incabível.
b) Efeito regressivo ou efeito de retratação: alguns recursos permitem o juízo de retratação, a
reconsideração da decisão pelo órgão a quo(é uma dimensão do efeito devolutivo), são eles: (i)apelação
contra a sentença que indefere a petição inicial, extingue o processo sem exame do mérito ou julga
liminarmente improcedente o pedido; (ii) apelação no ECA; (iii) agravo de instrumento; (iv) agravo interno;
(v) RE e REsp, se julgados como recursos repetitivos e se a tese firmada nos repetitivos for contrária à decisão
recorrida (art. 1.040, II, CPC).
c) Efeito suspensivo (art. 995, CPC): é efeito de impedir a eficácia da decisão recorrida. Todo recurso pode ter
efeito suspensivo, sem exceções. A diferença consiste no fato de que há recursos que produzem efeito
suspensivo automaticamente (por disposição legal – ex.: apelação e RE contra acórdão proferido em IRDR),
enquanto outros dependem de pedido do recorrente e concessão pelo relator (por decisão judicial – caso
haja risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, ou se ficar demonstrada a probabilidade de
provimento do recurso). Mas a regra é a não ocorrência do efeito suspensivo automático.
Obs. 1: mesmo o recurso com efeito suspensivo não impede que a decisão sirva como título de hipoteca
judiciária (art. 495, CPC).
Obs. 2: o efeito suspensivo não decorre da interposição do recurso, mas resulta da mera recorribilidade do
ato. Havendo recurso com efeito suspensivo decorrente de lei para determinado tipo de decisão, essa,
quando proferida, já é lançada aos autos com sua executoriedade adiada ou suspensa, perdurando a
suspensão até, pelo menos, o transcurso do prazo para interposição do recurso. Havendo recurso, a
suspensividade é confirmada, estendendo-se até seu julgamento pelo tribunal. Não sendo interposto o
recurso, opera-se o trânsito em julgado, passando-se, então, o ato judicial a produzir efeitos e a conter
executoriedade.
Obs. 3: se a decisão contiver mais de um capítulo, é possível que o recurso tenha efeito suspensivo em
relação a um e não tenha em relação a outro.
d) Efeito expansivo subjetivo: em regra, o recurso produz efeitos apenas para o recorrente (princípio da
personalidade do recurso), todavia, há casos em que seus efeitos se estendem à outra parte, a saber:
- Recurso interposto por um dos litisconsortes a todos aproveita, salvo se distintos ou opostos seus
interesses (art. 1.005, CPC – aplicável ao litisconsórcio unitário);
- Recurso de devedor solidário que veicula defesa comum a todos os devedores solidários, beneficia os
demais (art. 1.005, p.u., CPC – caso em que se permite a expansão subjetiva mesmo que o litisconsórcio não
seja unitário);
- Recurso do assistente simples é eficaz em relação ao assistido (art. 121, CPC);
- Embargos de declaração interpostos por uma das partes interrompem o prazo para a interposição de outro
recurso para ambas as partes, e não apenas para aquela que embargou (art. 1.026, CPC);
- Embargos de divergência no STJ interrompem, para ambas as partes, o prazo para a interposição de RE (art.
1.044, §1º, CPC).
e) Efeito devolutivo (art. 1.013, CPC):esse efeito é da essência de todos recursos, pois visa à devolução da
questão impugnada para apreciação do Poder Judiciário (órgão ad quem).
(i) Dimensão horizontal ou extensão do efeito devolutivo: determina o objeto litigioso, questão principal do
procedimento recursal (tantum devolutum quantum appellatum), ou seja, o que é levado à apreciação do
tribunal. Só é devolvido o conhecimento da matéria impugnada. Trata-se da questão que o recorrente deseja
136
seja decidida novamente pelo tribunal, ou seja, o mérito do recurso. É o recorrente quem delimita a
extensão de um recurso, especificando qual parte da decisão pretende que seja revista pelo Judiciário. Em
razão disso, o recurso pode ser total ou parcial, conforme sua extensão.
(ii) Dimensão vertical, profundidade do efeito devolutivo ou efeito translativo: determina as questões que
devem ser analisadas pelo órgão ad quem para decidir o objeto litigioso do recurso, ou seja, quais questões o
tribunal terá de examinar para decidir o que foi impugnado.
A profundidade do efeito devolutivo não pode ser delimitada pelo recorrente, e abrange todas as questões
suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, relativas ao capítulo
impugnado (ex.: todos os argumentos do autor, do réu e de terceiros) e todas as questões conhecíveis ex
officio, relativas ao capítulo impugnado (ex.: incompetência absoluta, decadência, legitimidade ad causam,
etc.).
Obs.: as questões que não guardam relação com o capítulo impugnado, ainda que conhecíveis de ofício, não
podem subir ao tribunal.
f) Efeito substitutivo: a decisão que julga o recurso substitui a decisão recorrida, a qual deixa de existir. O
efeito substitutivo decorre do julgamento do recurso, razão pela qual, recurso inadmissível não produz efeito
substitutivo. Todavia, referido efeito se verifica mesmo que o recurso seja improvido.
Há apenas uma hipótese em que recurso julgado não produz efeito substitutivo: caso em que o recurso é
acolhido para invalidar a decisão. Nessa hipótese, o tribunal não substitui a decisão, mas a desfaz para que
outra seja proferida pelo órgão a quo.
Obs.: embora não esteja previsto expressamente, em regra, no processo civil também não se admite a
reformatio in pejus. Vale lembrar, todavia, que é possível a majoração dos honorários advocatícios na
instância recursal (art. 85, §11, CPC).

10. RECURSO ADESIVO: O CPC/15, de maneira inovadora, prevê duas situações que permitem a interposição
subordinada de recurso: recurso adesivo (única prevista no CPC/73) e apelação do vencedor contra decisão
interlocutória (novidade do CPC/15, abordada no ponto 14.c.). Recurso adesivo não é uma espécie de
recurso, mas uma forma de interposição.
10.1. Pressuposto e características: recurso adesivo pressupõe sucumbência recíproca, ou seja, vitória e
derrota de ambas as partes. Nesse caso, ambas as partes poderiam ter recorrido logo após a intimação da
decisão, caso em que haveria dois recursos independentes. Se ambas as partes não recorrerem, haverá o
trânsito em jugado. Mas se apenas uma das partes recorrer, a outra parte, no prazo para contrarrazões pode,
além de contra-arrazoar, recorrer adesivamente.
Embora seja interposto no prazo das contrarrazões, estas e o recurso adesivo devem ser apresentados em
peças separadas (segundo Didier, convém que sejam apresentados em peças separadas, mas não há óbice na
apresentação de peça única, se preenchidos todos os requisitos do recurso adesivo). Uma vez interposto o
recurso adesivo, a parte que primeiro recorreu deve ser intimada para contra-arrazoar o adesivo. Sendo o
recurso adesivo um recurso subordinado, só será conhecido se o recurso independente o for.
Obs. 1: segundo Didier, o recurso adesivo, embora pareça ser uma segunda chance para o sujeito recorrer
nos casos de sucumbência recíproca, é um estímulo para que não haja recurso desnecessário.
Obs. 2: no REsp 1.285.405/SP (inf. 554), o STJ decidiu que, se já foi concedida antecipação dos efeitos da
tutela no recurso adesivo, não se admite a desistência do recurso principal de apelação.
Obs. 3: o recurso adesivo pode ter por objeto capítulo distinto daquele impugnado pelo recurso principal.
10.2. Requisitos de admissibilidade: recurso adesivo deve observar os mesmos requisitos de admissibilidade
do recurso independente, inclusive o preparo.
Obs.: no que tange à legitimidade, pela interpretação literal do art. 997, CPC (adotada por Humberto
Theodoro Jr. e Barbosa Moreira), somente as partes podem interpor recurso adesivo. Os terceiros e, nem
mesmo o MP na qualidade de fiscal da ordem jurídica, podem fazê-lo. Do mesmo modo, só se pode aderir a
um recurso de parte, sendo vedado aderir a recurso de terceiro ou do MP, enquanto fiscal da ordem jurídica.
Parcela da doutrina (Didier), contudo, confere interpretação extensiva para admitir recurso adesivo por
terceiro e MP.
10.3. Recursos passíveis de interposição de forma adesiva: apenas a apelação, o recurso extraordinário e o
recurso especial.
Obs. 1: segundo Didier, admite-se ROC adesivo, quando fizer as vezes de apelação (Município/pessoa
residente no Brasil vs. Estado estrangeiro ou organismo internacional).

137
Obs. 2: há entendimento no sentido de que, nos Juizados Especiais, não cabe recurso adesivo, por
comprometer a celeridade(nesse caso, não seria cabível recurso inominado adesivo, mas admite-se RE
adesivo). Segundo Didier, esse entendimento não deve prosperar, pois o recurso adesivo é um instrumento
favorável, e não contrário à celeridade.
Obs. 3: só pode recorrer de modo adesivo quem não recorreu de modo independente, assim: (i) quem teve
seu recurso independente inadmitido por intempestividade, não pode posteriormente interpor recurso
adesivo em face da mesma decisão; (ii) quem desistiu do recurso independente não pode em seguida
interpor recurso adesivo; (iii) quem apresentou recurso parcial de forma independente não pode interpor
recurso adesivo para complementar a parte não impugnada.
Obs. 4: o recurso adesivo costuma ter a mesma natureza do recurso independente, ou seja, a apelação é
adesiva a outra apelação, RE é adesivo a outro RE e REsp é adesivo a outro REsp. Todavia, admite-se o
chamado recurso adesivo cruzado, no caso de RE adesivo a um REsp, a depender do assunto constitucional
ou infraconstitucional versado (caso de RE adesivo condicionado → RE adesivo somente será processado se o
REsp independente for acolhido).
Obs. 5: em demandas contra o Poder Público só cabe recurso adesivo pelo particular se não houver reexame
necessário. O Poder Público, contudo, pode aderir ao recurso da outra parte.
Obs. 6: se a parte que interpôs o recurso principal gozar de prazo em dobro ou estiver dispensada de
preparo, por exemplo, tais benefícios não se estendem ao recorrente adesivo.

11. SUCUMBÊNCIA RECURSAL: é uma inovação prevista no CPC/15 (art. 85, § 11), que prevê a majoração dos
honorários se o recurso for inadmitido ou rejeitado. Trata-se de um efeito da interposição do recurso.
O ato de recorrer contém a causalidade (é o recorrente quem dá causa à interposição do recurso) que
acarreta a majoração dos honorários quando o recurso for inadmitido ou rejeitado, seja por decisão isolada
do relator ou por decisão de órgão colegiado.
11.1. Responsabilidade pelo pagamento de honorários recursais: é objetiva; independe de comprovação de
dolo ou culpa da parte vencida.
11.2. Valor e limite dos honorários recursais: o valor dos honorários recursais soma-se aos honorários
anteriormente fixados, e o valor total dos honorários fixados em cada uma das fases do processo (ex.: fase
de conhecimento, fase de cumprimento de sentença) não deve superar o equivalente a 20% sobre o valor da
condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, do valor atualizado da causa.
Obs.: caso o juiz, ao julgar a causa, já fixe os honorários de sucumbência em 20%, já se terá, desde logo,
alcançado o limite máximo, não sendo possível qualquer majoração no julgamento de eventual recurso.
11.3. Pressuposto: a sucumbência recursal pressupõe que o recurso seja inadmitido ou rejeitado, e que o
recorrido tenha advogado constituído e tenha sido intimado para apresentação de contrarrazões. Segundo
Didier, bem como entendimento já esposado pela 1ª Turma do STF (AI 864689 AgR/MS e ARE 951257 AgR/RJ
– inf. 841), é indiferente o fato de o recorrido ter ou não apresentado contrarrazões, desde que tenha sido
intimado para apresentá-las (situação semelhante à condenação em honorários de sucumbência nos casos
de revelia com advogado constituído). Todavia, se o recurso for rejeitado liminarmente pelo relator, sem que
tenha havido intimação do recorrido para contrarrazões, não haverá honorários recursais (situação
semelhante à improcedência liminar do pedido em 1ª instância).
11.4. Casos em que não se admite honorários recursais: são fixados honorários recursais apenas no
julgamento de recursos em que é admissível a condenação em honorários em 1ª instância. Assim, p. ex., não
cabe sucumbência recursal em agravo de instrumento interposto contra decisão que versa sobre tutela
provisória, mas cabe em agravo de instrumento interposto contra decisão que versa sobre o de agravo
interno.
Também não se aplica sucumbência recursal no âmbito da 1ª instância (ex.: embargos de declaração
interpostos em face de sentença).
Obs. 1: segundo Didier, em virtude da simetria, não se deve aplicar a sucumbência recursal também no caso
de embargos de declaração opostos contra decisão isolada de relator ou contra acórdão. Todavia, a 1ª Turma
do STF já entendeu pela possibilidade de condenar o sucumbente ao pagamento de honorários advocatícios
em hipótese de embargos de declaração interpostos perante tribunal, que não atendem aos requisitos legais
de cabimento, nem se enquadram nas situações excepcionais que autorizam a concessão de efeitos
infringentes (RE 929.925 AgR-ED/RS - inf. 829, STF).

138
Obs. 2: STF (inf. 831) e STJ (inf. 592) entendem que não cabe fixação de honorários recursais em caso de
recurso interposto no curso de processo cujo rito não admite a condenação em honorários (p. ex., recurso
em mandado de segurança).
11.5. Regra de transição: o art. 85, § 11, CPC, somente deve ser aplicado aos casos em que for possível
recorrer ou já houver recorribilidade a partir do início da vigência do CPC/15, não se aplicando aos recursos
já interpostos ou pendentes de julgamento.
Obs.: o marco temporal para a aplicação da lei nova é a interposição do recurso, e não seu julgamento.

10C. Cumprimento de sentença que reconhece exigibilidade de obrigação de pagar quantia certa.

Elaborado por Igor Lima Goettenauer de Oliveira


Material consultado: ARENHART, Sérgio Cruz; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil Comentado. 2017.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 2018. Informativos jurisprudenciais do STF/STJ.

CUPRIMENTO DE PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA: O cumprimento de prestação pecuniária pode ocorrer por


expropriação patrimonial (art. 523 e ss.) ou por emprego das técnicas de indução ou sub-rogação (art. 139,
IV). Compete ao juiz, diante do caso concreto, estabelecer o regime a ser cumprido. Todavia, quando a
sentença for condenatória e nela houver quantia certa, seja como consequência direta da fase de
conhecimento, seja como resultado da fixação por liquidação, obsrvar-se-á o art. 523 e ss, CPC, tendo ainda
aplicação subsidiária das normas que regem o processo de execução.

REQUERIMENTO DE EXECUÇÃO: O cumprimento da sentença que reconhece a exigibilidade de pagar quantia


ceta não se inicia de ofício pelo juiz (mitigação do princípio do impulso oficial), devendo ser requerido pelo
credor (art. 513, §1º). Tal requerimento não é um novo processo, não sendo, pois, uma petição inicial, mas
uma mera fase procedimental. O art. 524 estabelece os requisitos do requerimento de cumprimento,
devendo ser instruído com demonstrativo discrimanado e atualizado de crédito. Quando a elaboração do
demonstrativo depender de dados em poder de terceiros ou do executado, o juiz poderá requisitá-los, sob
cominação do crime de desobediência (art. 524, §3º). Alternativamente, poderá o juiz fixar medida de
indução ou de coerção, como multa e busca e apreensão. Por outro lado, quando os cálculos já apresentados
pelo exequente precisarem de complementação de dados adicionais que estão em poder do executado, o
juiz poderá, a requerimento do exequente, erquisitá-los, fixando prazo de 30 dias, sob pena de se reputarem
corretos os cálculos apresentados pelo exequente apenas com base nos dados de que dispõe (art. 524, §§ 4º
e 5º).

APARENTE EXCESSO DE CÁLCULOS: Quando valor apontado no demonstrativo aparentemente exceder os


limites da condeção, a execução será iniciada pelo valor pretendido, mas a penhora terá por base a
importância que o juiz entender adequada. Para tanto, o juiz poderá valer-se de contabilista (art. 524, §§ 1º e
2º).

ADMISSÃO DA EXECUÇÃO E INTIMAÇÃO DO DEVEDOR: Admitido o requerimento de cumprimento da


sentença, o devedor será intimado para, no prazo de 15 dias, cumprir a obrigação. No CPC/73 havia certa
polêmica o devedor deveria ser intimado pessoalmente para cumprir a obrigação. Com o CPC/2015,
sedimentou-se que, em regra, dispensa-se a intimação pessoal do devedor, bastanto a intimação de seu
advogado constituído (art. 513, §2º, I, CPC), salvo casos excepcionais (quando o devedor: for representado
pela Defensoria Pública; não tiver advogado constituído nos autos; for citado por edital e ser revel; ou
quando o requerimento de cumprimento de sentença for formulado após 1 ano do trânsito em julgado da
senteça – art. 513, §§ 2º e 3º).

PAGAMENTO EM FACE DE DECISÃO DEFINITIVA E PAGAMENTO EM FACE DE DECISÃO PROVISÓRIA: Se o


pagamento se dá em face de decisão definitiva, extingue-se o processo. Se o pagamento ocorre em face de
decisão provisória (que ocorre quando a senteça é impugnada por recurso desprovido de efeito suspensivo),
o levantamento do depósito depende de caução, por parte do exequente, suficiente e idônea, a ser arbitrada
pelo juiz e prestada nos mesmos autos (art. 520, IV), salvo presente uma das exceções legais (art. 521 –
crédito de natureza alimentar; credor demonstrar situação de necessidade; pernder agravo do 1.042; ou a
sentença provisória estiver em consonância com súmula do STJ/STF ou com acórdão proferido no julgamento

139
de casos repetitivos). Sendo provido o recursso do executado, exequente deve restituir a quantia e se
responsabiliza por eventuais prejuízos suportado pelo demandado (art. 520, I).

MULTA E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS PELO NÃO CUMPRIMENTO: Não ocorrendo pagamento voluntário
no prazo de 15 dias, o débito será acrescido de multa de 10% e, também, de honorários advocatícios de 10%.
A multa tem natureza punitiva (STJ) e tanto ela, quanto os honorários, devem ser impostos ao executado,
não podendo o juiz modificar seus montantes. Efetuado o pagamento parcial no prazo (15 dias), a multa e os
honorários incidirão sobre o restante (art. 523, §2º). Ainda, não efetuado tempestivamente o pagamento
voluntário, será expedido, desde logo (de ofício pelo juiz), mandado de penhora e avaliação, seguindo-se os
atos de expropriação (art. 523, §3º).

DEFESA DO EXECUTADO: Ocorre normalmente por impugnação (art. 525), mas pode o executado apresentar
outros meios de defesa, como a exceção de pré-executividade ou por simples petição nos autos em razão de
fato novo (art. 525, §11).

 Impugnação: Transcorrido o prazo de 15 dias sem pagamento voluntário, inicia-se


(automaticamente, sem necessidade de manifestação do interessado) o prazo de 15 dias
para que o executado independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos
próprios autos, sua impugnação. Nela, o executado pode discutir as matérias elencadas no
art. 525, §1º (I - falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu
à revelia; II - ilegitimidade de parte; III - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da
obrigação; IV - penhora incorreta ou avaliação errônea; V - excesso de execução ou
cumulação indevida de execuções; VI - incompetência absoluta ou relativa do juízo da
execução; VII - qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento,
novação, compensação, transação ou prescrição, desde que supervenientes à sentença).
Pode ainda o executado arguir objeções processuais posteriores ao trânsito em julgado
(como os pressupostos processuais), quando forem matérias de ordem pública. Sobre o
tema, convém destacar a hipótese de inexigibilidade da obrigação reconhecida em título
executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo STF, ou
fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo STF como
incompatível com a CRFB, em controle de constitucionalidade difuso ou concentrado, desde
que tal decisão do STJ seja anterior ao trânsito em julgado da decisão exequenda; se for
posterior, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão
proferida pelo STF (art. 525, §§ 12 - 15). Sobre este último ponto, a possibilidade de ação
rescisória, alegam ARENHART, MARINONI e MITIDIERO ser inconstitucional, porque viola a
imutabilidade da coisa julgada. Efeito suspensivo: A impugnação não tem, em regra, efeito
suspensivo. Contudo, poderá o juiz determiná-lo se: a) haja requerimento da parte; b) se
convença da relevância dos fundamentos do impugnante; c) seja a execução manifestamente
suscetível de causar grave dano de difícil ou incerta reparação ao executado; d) já esteja
garantida por penhora, depósito ou caução suficientes (art. 525, §6º). O efeito suspensivo
pode ser concedido a qualquer tempo enquanto pendente o cumprimento de senteça. Não
sendo relevantes os fundamentos da impugnação, ainda que o prosseguimento da execução
possa causar grave dano de difícil ou incerta reparação, é defeso ao juiz determinar a
suspensão da execução (STJ, MC 13.086/RJ, 15.08.2007). A decisão que nega ou concede o
efeito suspensivo desafia agravo de instrumento. A suspensão ainda pode ser total ou recair
apenas sobre alguns atos executivos. Se a impugnação for oferecida tão somente por um dos
executados e as razões por ele apresentadas disserem respeito apenas a ele, a execução
deverá prosseguir contra os demais, não podendo o juiz suspender o curso da execução em
relação a todos os executados (art. 525, §9). O efeito suspensivo não impede os atos de
substituição, reforço ou redução da penhora, nem a avaliaçao dos bens penhorados (art.
525, §7º). Contudo, ainda que atribuído efeito suspensivo, o exequente pode pedir o
prosseguimento da execução, oferencendo e prestando, nos autos, caução idônea e
suficiente, arbitrada pelo juiz (art. 525, §10). Decisão Final: A decisão que resolver a
impugnação é recorrível mediante agravo de instrumento, salvo quando importar extinção
da execução, caso em que caberá apelação. Configurará decisão interlocutória se julgar
140
improcedente a impugnação ou se, por exemplo, excluir um dos executados do processo.
Quando, porém, o julgamento de procedência da impugnação importar a extinção da
execução, deve ser considerada sentença, recorrível mediante apelação.
 Exceção de pré-executividade: é uma defesa atípica do executado na qual ele alega,
incidentalmente no cumprimento de senteça ou no processo de execução, por meio de
simples petição, matérias de ordem pública que o juiz deveria ter conhecido de ofício ou
outras objeções processuais (como a invalidade do título executivo). Todo o alegado tem de
estar provado de plano (STJ, 1.ª Turma,AgRg noAg 775.393/RS). O STJ também já decidiu que
a exceção de pré-executividade pode ser arguida a qualquer tempo no curso do processo,
mesmo depois de julgada a impugnação, desde que não tenha havido expresso
pronunciamento jurisdicional sobre a questão (STJ, l.ª Turma, REsp 667.002/DF,
j.12.12.2006). O regime da exceção de pré-executividade será o mesmo da impugnação,
inclusive quanto à concessão de efeito suspensivo da execução.

CUMPRIMENTO ESPONTANEO DA OBRIGAÇÃO: Ainda que não intimado para cumprimento da sentença
pode o devedor espontaneamente satisfazer a obrigação. O art. 526 estabelece um procedimento de
depósito judicial para a satisfação da dívida, no qual o devedor apresenta memória discriminada do cálculo.
O autor será ouvido em 5 dias, podendo impugnar o valor depositado, sem prejuízo do levantamento do
depósito a título de parcela incontroversa. Conluindo o juiz pela insuficiência do depósito, sobre a diferença
incidirão multa de dez por cento e honorários advocatícios, também fixados em dez por cento, seguindo-se a
execução com penhora e atos subsequentes. Se o autor não se opuser, o juiz declarará satisfeita a obrigação
e extinguirá o processo.

11A. Coisa julgada sobre questões prejudiciais decididas incidentalmente. Ação declaratória incidental:
função e hipóteses de cabimento.

André Bica

I. Legislação aplicável
Art. 503. A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal
expressamente decidida.
§ 1o O disposto no caput aplica-se à resolução de questão prejudicial, decidida expressa e incidentemente no
processo, se:
I - dessa resolução depender o julgamento do mérito;
II - a seu respeito tiver havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia;
III - o juízo tiver competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal.
§ 2o A hipótese do § 1o não se aplica se no processo houver restrições probatórias ou limitações à cognição
que impeçam o aprofundamento da análise da questão prejudicial.
II. Introdução
A coisa julgada sobre questões prejudiciais decididas incidentalmente diz respeito aos limites objetivos da
coisa julgada, tratados no art. 503 do NCPC.
Considera-se questão prejudicial aquela de cuja solução dependerá não a possibilidade nem a forma do
pronunciamento sobre a outra questão, mas o teor mesmo desse pronunciamento. Ex: validade do contrato
em demanda que se pretende a sua execução, filiação em demanda de alimentos.
À luz do art. 503, §1º do NCPC, a coisa julgada estende-se à solução da questão prejudicial incidental que
tenha sido expressamente decidida na fundamentação da sentença. A coisa julgada abrangerá, nesse caso, a
resolução de questão que não compunha o objeto litigioso do processo. Essa extensão não depende de
pedido da parte; dá-se automaticamente; há uma ampliação do objeto da coisa julgada por determinação
legal. Nessa linha, o enunciado 165 do FPPC: "Independentemente de provocação, a análise de questão
prejudicial incidental, desde que preencha os pressupostos dos parágrafos do art. 503, está sujeita à coisa
julgada".
III. Requisitos

141
São requisitos: a) ser prejudicial (da resolução deve depender o teor do julgamento do mérito); b) deve haver
contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia; c) não haver incompetência em razão da
pessoa e da matéria para resolver a matéria como questão principal; d) não haver restrições probatórias ou
limitações à cognição.
Cabe ao recorrente impugnar a resolução da questão prejudicial incidental; se não o fizer, haverá preclusão.
IV. Extinção da ação declaratória incidental?
O CPC/73 estabelecia regime diferente para a resolução das prejudiciais incidentais: a coisa julgada não se
estendia a elas (469, III, CPC/73). Para que houvesse coisa julgada em relação a uma questão prejudicial, era
preciso que se tratasse de questão principal, por meio de ação declaratória incidental.
A inovação do NCPC, aliada à ausência de reprodução dos arts. 325 e 470 do CPC/73, levou diversos autores
a sustentar que a ação declaratória incidental foi extinta pelo NCPC (por todos, Marinoni). No entanto, é
válido registrar a posição de Fredie Didier, que sustenta que: “A ação declaratória incidental ainda
permanece em nosso sistema, ao menos em duas situações: a) reconvenção declaratória proposta pelo réu,
que pode ter por objeto a questão prejudicial incidental controvertida: nesse caso, a prejudicial se torna
questão principal, para cuja resolução vige o regime jurídico comum da coisa julgada; b) ação declaratória
incidental de falsidade de documento, expressamente prevista no par. ún. do art. 430 do CPC”.
ENUNCIADO 35 – I Jornada de Direito Processual – Considerando os princípios do acesso à justiça e da
segurança jurídica, persiste o interesse de agir na propositura de ação declaratória a respeito da questão
prejudicial incidental, a ser distribuída por dependência da ação preexistente, inexistindo litispendência
entre ambas as demandas (arts. 329 e 503, § 1º, do CPC).
V. Direito processual Intertemporal
Cabe ressaltar que o regime jurídico especial de coisa julgada, relativo à resolução das prejudiciais
incidentais, somente aplica-se aos processos iniciados após a vigência do CPC-2015 (art. 1.054, NCPC). Aos
processos pendentes ao tempo do início da vigência do CPC-2015, aplica-se o regramento do CPC-1973,
sendo imprescindível o manejo da ação declaratória incidental para que a autoridade da coisa julgada incida
sobre questões prejudiciais incidentais.
Ação Declaratória Incidental. Regramento do CPC/73
VI. Regime da ação declaratória incidental no Código Buzaid
A ação declaratória incidental é uma ação incidental (e não um incidente processual). O objeto da
declaração, no caso, será sempre uma questão prejudicial, sendo cabível a ação declaratória incidental se, no
curso do processo, se tornar litigiosa relação jurídica de cuja existência ou inexistência depender o
julgamento da lide, qualquer das partes poderá requerer que o juiz a declare por sentença. (CPC 5ºc/c 325).
A finalidade/função da ação declaratória incidental é ampliar os limites objetivos da coisa julgada material,
transformando a questão que seria conhecida incidenter tantum em parte do thema decidendum, que será
objeto de resolução principaliter tantum, acobertada pela imutabilidade da coisa julgada. A propositura da
ação declaratória incidental faz com que o juiz tenha que se manifestar a respeito daquela relação jurídica no
dispositivo da sentença (principaliter), o que faz com que a declaração se torne imutável e indiscutível (CPC
470).
Qualquer uma das partes pode propor ação declaratória incidental. O autor deve fazê-lo durante a fase das
providências preliminares, no mesmo prazo de que dispõe para a apresentação de sua réplica (10 dias: CPC
325).
“Quando ajuizada pelo réu, embora possua caráter reconvencional, a ADI não se confunde com a
reconvenção (...). Diferenças entre reconvenção e ação declaratória incidental: a) legitimidade – só o réu
pode reconvir, ao passo que qualquer das partes pode ajuizar ADI; b) contestação – não há necessidade de
contestar-se a ação principal para poder-se reconvir; a litigiosidade, quer dizer, a presença efetiva da
contestação é requisito necessário para a ADI; c) autonomia – extinta a ação principal, subsiste a
reconvenção, que deverá ser julgada (CPC 317); extinta a ação principal, de consequência estará extinta a
ADI, que dela é dependente; d) tipo de ação – a reconvenção é ação de conhecimento, de qualquer
modalidade, ao passo que a ADI é exclusiva e necessariamente declaratória; e) cognição do juiz – a
reconvenção aumenta a carga cognitiva do juiz; para julgar a ADI o juiz terá a mesma carga cognitiva que teria
para o julgamento tão-só da ação principal. Daí por que a ADI, quando ajuizada pelo réu, não se confunde
com a reconvenção” (NERY JUNIOR e ANDRADE NERY, 2006, p. 148, 509-510).

11B. Tutela provisória. Tutela de urgência e tutela de evidência: conceito, espécies, pressupostos.

142
Sadi Machado 6/9/18

Conceito e fundamento: a tutela provisória é uma técnica processual de antecipação ou acautelamento dos
efeitos da tutela definitiva. Fundamenta-se na distribuição isonômica do ônus do tempo no processo,
decorrente tanto da urgência quanto da evidência do direito posto em Juízo. Mitiga-se parcialmente o
princípio constitucional do contraditório, em favor da efetividade.

Características: i) sumariedade da cognição: análise superficial do objeto litigioso, que autoriza que o juiz
decida a partir de um juízo de probabilidade; ii) precariedade: possibilidade de ser revogada ou modificada a
qualquer tempo. Enunciado 140 do FPPC: “A decisão que julga improcedente o pedido final gera a perda de
eficácia da tutela antecipada”; iii) reversibilidade: em regra, não pode ser concedida se o juiz constatar sua
irreversibilidade; entretanto, a reversibilidade não precisa ser “in natura”, podendo ser “in pecunia”, isto, é,
conversão em perdas e danos; iv) responsabilidade objetiva por dano processual: considerando-se que a
tutela provisória se funda em juízo provisório, baseado na verossimilhança, todo prejuízo que o beneficiário
eventualmente ocasionar a outra parte será causa causa de responsabilidade objetiva (responderá pelos
danos causados, independentemente de culpa); e v) inaptidão à formação de coisa julgada material: que
não se confunde com a estabilização da tutela antecipada prevista no art. 304.

Inovações do NCPC: o “Processo Cautelar” deixou de ser considerado um processo autônomo. Destinou-se
Livro específico, na Parte Geral do NCPC, ao tratamento da Tutela Provisória (gênero), que compreende as
espécies Tutela de Urgência (art. 300 a art. 310), antecipada ou cautelar; Tutela da Evidência (art. 311) –
questão 87 do 29º CPR. As tutelas provisórias podem ser requeridas em caráter antecedente (tutelas de
urgência) ou incidental (tutelas de urgência e tutela da evidência).

Tutela de urgência: pressupõe elementos que evidenciem: i) a probabilidade do direito; e ii) o perigo de
dano ou o risco ao resultado útil do processo (art. 300). Enunciado 143 do FPPC: “A redação do art. 300,
caput, superou a distinção entre os requisitos da concessão para a tutela cautelar e para a tutela satisfativa
de urgência, erigindo a probabilidade e o perigo na demora a requisitos comuns para a prestação de ambas
as tutelas de forma antecipada”. A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando
houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão (questão 87 do 29º CPR). Aplica-se o princípio da
fungibilidade à tutela provisória de urgência: embora haja divergência doutrinária, predomina o
entendimento de que a fungibilidade tem mão dupla: tanto a tutela cautelar pode ser apreciado como tutela
antecipada, quanto a tutela antecipada pode ser apreciada como tutela cautelar.

A tutela cautelar conserva o bem pleiteado e protege o resultado útil do processo (assegura para satisfazer).
Já a tutela antecipada satisfaz o interesse da parte e evita dano ao direito material (satisfaz para assegurar).
O CPC prevê procedimento específico para a tutela antecipada requerida em caráter antecedente (art. 303 a
305) e para a tutela cautelar requerida em caráter antecedente (art. 305 a 310). Prevê a possibilidade de
estabilização dos efeitos da tutela antecipada, quando da decisão que a conceder não for interposto o
respectivo recurso (art. 304).

143
Tutela da evidência: independe da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo
(questão 87 do 29º CPR). Será concedida quando i) ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o
manifesto propósito protelatório da parte; ii) as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas
documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante; iii)
se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso
em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa; iv) a petição
inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu
não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. Há duas modalidades de tutela provisória da evidência: i)
punitiva (art. 311, I, CPC), para coibir o "abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da
parte"; ii) documentada: quando há prova documental das alegações de fato da parte, nas hipóteses do art.
311, II a IV.

Recursos: Conforme o art. 1.015, contra as decisões interlocutórias que versarem sobre tutelas provisórias é
cabível a interposição de agravo de instrumento. Se a tutela provisória for confirmada, concedida ou
revogada em sede de sentença, desafiará recurso de apelação (art. 1.009). Nesse caso, porém, a apelação
não terá efeito suspensivo, e a sentença começará a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação.
Por fim, caso seja concedida em decisão proferida em segunda instância, monocraticamente pelo relator,
caberá agravo interno (art. 1.021 do NCPC).

Tutela provisória recursal: se existir, na instância inferior, uma decisão indeferindo uma medida pleiteada
pelo recorrente, a única forma de ser obtida, no tribunal, a providência desejada - ainda que em caráter
temporário - será por meio da antecipação dos efeitos da tutela em sede recursal, pela qual o relator defere
a medida que foi negada na decisão recorrida, e não por meio de obtenção ou de retirada de efeito
suspensivo, incapazes de ensejar o deferimento da providencia desejada. Antecipação de tutela em sede
recursal, portanto, é a nomenclatura atualmente técnica para a tutela de urgência satisfativa que consista no
deferimento, pelo relator, de uma providência pela primeira vez no curso daquela demanda, tratando-se da
verdadeira aplicação do art. 299, parágrafo único, CPC.

Bloqueio e sequestro de verbas públicas


Em ação para fornecimento de medicamentos, o juiz pode determinar o bloqueio e sequestro de verbas
públicas em caso de descumprimento da decisão. Tratando-se de fornecimento de medicamentos, cabe ao
Juiz adotar medidas eficazes à efetivação de suas decisões, podendo, se necessário, determinar, até mesmo, o
sequestro de valores do devedor (bloqueio), segundo o seu prudente arbítrio, e sempre com adequada
fundamentação. STJ. 1ª Seção. REsp 1069810-RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em
23/10/2013 (recurso repetitivo) (Info 532).

11C. Embargos do executado. Impugnação ao cumprimento de sentença. Responsabilidade patrimonial e


atos praticados em fraude.

Samara Dalloul

Embargos do Executado: Ação autônoma com vistas a impugnar a execução forçada, distribuída por
dependência à principal (execução). Não cabe embargos à execução no cumprimento de sentença. Além
dos embargos, o executado pode se opor por meio da objeção de pré-executividade, arguição de suspeição
ou impedimento, petição simples ou ação impugnativa declaratória ou desconstitutiva autônoma. Como têm
natureza jurídica de ação de conhecimento, o contraditório é pleno (devedor pode alegar o que quiser em
sua defesa).
Competência: serão propostos no juízo da execução e distribuídos por dependência (competência
funcional absoluta). Mesmo que a penhora seja feita por carta, os embargos serão julgados no juízo da
execução, salvo se a matéria alegada em defesa se referir a ato praticado pelo juízo deprecado.
Garantia do juízo: Mantida a regra da modificação operada pela Lei 11.382/2006 ao CPC/73, de
modo que a apresentação de embargos prescinde a prévia garantia do juízo. Portanto, ainda que o devedor
não tenha bens, ou eles não sejam localizados, o prazo de embargos fluirá do momento em que houver a
citação, observadas as regras sobre o início do prazo, estabelecidas no art. 231 do CPC. A penhora e a
144
avaliação dos bens poderão ocorrer somente depois que os embargos já tiverem sido julgados. Isso não
impedirá que o devedor alegue vícios de uma e outra, por simples petição, no prazo de 15 dias (art. 917, §1º,
CPC).
Prazo: Os embargos deverão ser opostos no prazo de quinze dias, contados de forma comum e com
prazo iniciando no dia seguinte à juntada do AR de intimação. Não se aplica a dobra de prazo para
litisconsortes com advogados diferentes porque se trata de ação autônoma e não mera defesa. Quando
houver mais de um executado o prazo não se inicial da juntada do último AR, mas prazo autônomo para cada
AR juntado e seu respectivo receptor (não se aplica o art. 231, §1º). Caso se trate de execução por carta, o
prazo de 15 dias se inicia da juntada do AR na carta (quando a defesa versar sobre vícios da penhora,
avaliação ou alienação), da juntada da carta cumprida nos autos judiciais (outras matérias de defesa) ou da
juntada de comunicado de citação pelo deprecado ao deprecante.
Pagamento parcelado: O devedor, no prazo dos embargos, poderá depositando 30% do valor da
execução, incluindo custas e honorários advocatícios, postular o pagamento do saldo em até seis parcelas
mensais, acrescidas de correção monetária e juros de 1% ao mês. Trata-se de espécie de moratória, se
deferido o pedido a execução fica suspensa até o pagamento integral. É direito do devedor, não podendo
ser recusada pelo credor se obedecidos os requisitos legais. Se o devedor deixar de fazer o pagamento de
alguma das parcelas, as restantes vencerão antecipadamente e a execução prosseguirá, acrescida de multa
de 10% sobre o saldo restante, vedada a oposição de embargos. Não se aplica o pagamento parcelado ao
cumprimento de sentença.
Objeto do embargos: O embargante pode postular ao juízo que, nos embargos, se reconheça a falta
dos pressupostos processuais e das condições da ação executiva (não da ação de embargos, mas da
execução). A falta de uns e de outros constitui mérito dos embargos. Também constitui mérito nos
embargos as questões suscitadas pelo embargante, relacionadas à existência, à constituição ou a extinção do
crédito.
Procedimento
Petição inicial: A petição inicial deve preencher os requisitos gerais e o valor da causa é o benefício
econômico que se pretende com os embargos. Se o fundamento dos embargos for excesso de execução, a
inicial deve indicar o valor que o embargante entende correto, apresentando memória de cálculo, sob pena
de indeferimento. Se a inicial contiver vício sanável, o juízo determinará que seja emendada no prazo de
quinze dias. Caso sejam os embargos intempestivos, manifestamente protelatórios ou seja caso de
indeferimento da inicial ou improcedência liminar do pedido, os embargos deverão ser liminarmente
rejeitados.
Efeito suspensivo: Os embargos, como regra, não têm efeito suspensivo e permitem o
prosseguimento da execução, sendo possível sua concessão mediante pedido expresso, com preenchimento
dos requisitos de tutela provisória, além da garantia da execução por penhora, depósito ou caução. A
garantia não é condição para que os embargos sejam recebidos, mas para que lhes seja outorgado efeito
suspensivo. Se os embargos forem parciais, ainda que o juiz conceda efeito suspensivo, a execução
prosseguirá sobre a parte incontroversa. Mesmo com efeito suspensivo, não haverá óbice à prática de atos
relacionados à penhora ou avaliação de bens.
Resposta do embargado: Recebida a inicial dos embargos, o juiz determinará a intimação do credor
embargado para apresentar impugnação no prazo de quinze dias. Não cabe reconvenção, pois extrapola os
limites de mera defesa. Não cabem as formas de intervenção de terceiros previstas na Parte Geral do CPC,
exceto assistência, já que é possível que terceiro tenha interesse jurídico no resultado. Havendo mais de um
embargado com advogados diferentes, não sendo eletrônico o processo, aplica-se o prazo em dobro. A falta
de impugnação fará presumir a veracidade dos fatos alegados na petição inicial, que não sejam
contrariados por aquilo que consta do título executivo.
Instrução: após a réplica do embargante (se for o caso), o juízo verificará se há necessidade de
produção de provas, não havendo restrições no procedimento.
Sentença e recursos: Como os embargos constituem um processo de conhecimento, ao final, o juiz
proferirá sentença, com (art. 487) ou sem (art. 485) resolução de mérito. Eventual apelação não tem efeito
suspensivo. Se o juiz considerar os embargos manifestamente protelatórios, haverá conduta atentatória à
dignidade da justiça e ele imporá ao embargante multa de até 20% do valor da execução, que reverterá em
favor do exequente

145
Impugnação ao cumprimento de sentença A forma de defesa do executado, por excelência, é a
impugnação. Admitem-se, ainda que excepcionalmente, as exceções e objeções de pré-executividade,
embora tenham perdido quase toda a sua utilidade, já que tanto na execução por título extrajudicial quanto
no cumprimento de sentença o oferecimento de embargos ou de impugnação dispensa a prévia penhora,
depósito ou caução. A impugnação não é ação autônoma, mas incidente da fase de cumprimento de
sentença. É um incidente processual, julgado por decisão interlocutória. Há uma única hipótese em que ela
será ação incidental: quando tiver por objeto a declaração de inexistência ou extinção do débito (art. 525,
VII).
Prazo: é de 15 dias, a contar do transcurso in albis do prazo de 15 dias para pagamento voluntário,
independentemente de penhora ou nova intimação. Serão dois prazos de 15 dias distintos: primeiro, o de 15
dias para o pagamento voluntário do débito; e o segundo prazo, também de 15 dias, para oferecer
impugnação, já iniciada a fase de cumprimento de sentença. A dobra de prazo em caso de litisconsórcio com
advogados diferentes aplica-se ao prazo da impugnação, não sendo necessária a garantia do juízo.
Efeito suspensivo: Em regra, a impugnação, tal como os embargos, não é dotada de efeito
suspensivo. No entanto, excepcionalmente, o juiz pode concedê-lo. Os requisitos são os mesmos para que
ele o conceda nos embargos: que haja requerimento do impugnante; que o juízo esteja garantido
com penhora, caução ou depósito suficiente; que seja relevante a sua fundamentação, isto é, que sejam
verossímeis as alegações; que o prosseguimento da execução seja manifestamente suscetível de causar ao
executado grave dano de difícil ou incerta reparação.
Objeto: ao contrário dos embargos à execução, a cognição é restrita. O rol de defesas alegáveis está
no art. 525, §1º do CPC. A impugnação, conquanto limitada no que concerne à extensão das matérias
alegáveis, não sofre restrições quanto à profundidade da cognição judicial. O juiz não a decidirá em um juízo
de mera verossimilhança ou plausibilidade, em cognição superficial. Todos os meios lícitos de prova são
admitidos na impugnação.
a) Falta ou nulidade de citação, se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia;
Acarretará a ineficácia da sentença ou do acórdão proferidos, adquirindo a impugnação
características de querella nullitatis insanabilis.
b) Ilegitimidade de parte;
c) Inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação;
O art. 525, § 12 autoriza o reconhecimento da inexigibilidade da sentença ainda que transitada em
julgado, fundada em norma declarada inconstitucional, ou que deu a essa norma interpretação que foi tida
como incompatível com a CRFB. Para que a sentença possa ser reconhecida como inexigível, é preciso que a
declaração de inconstitucionalidade preceda o trânsito em julgado. Se ela for posterior, só caberá ação
rescisória. Nesse caso, o prazo da rescisória não será de dois anos a contar do trânsito em julgado da
sentença, mas de dois anos a contar do trânsito em julgado da decisão proferida pelo STF, em controle
concentrado ou difuso de constitucionalidade.
d) Penhora incorreta ou avaliação errônea;
e) Excesso de execução ou cumulação indevida de execuções;
O excesso ocorre quando o credor postula montantes ou prestações superiores aos que são
efetivamente devidos. A cumulação indevida de execuções ocorre quando há pretensões executivas
cumuladas, sem a observância das exigências do art. 327 do CPC. O art. 917, §2º do CPC enumera as
hipóteses de excesso (exceto pelos incisos IV e V, que se referem a inexigibilidade do título, embora previstas
como excesso). O que pode ser objeto de impugnação é o excesso de execução. Com ela não se confunde o
excesso de penhora, que ocorre quando o credor cobra o que é devido, mas a penhora acaba recaindo sobre
bens de valor superior ao do débito. Havendo apenas excesso de penhora, não é necessária a impugnação,
bastando às partes, a qualquer tempo, postular a redução àquilo que seja suficiente para garantia do crédito.
Quando alega excesso de execução, o devedor deve declarar o valor que entende correto (com memória
do cálculo) - se o executado não cumprir a determinação e o excesso de execução for o único fundamento da
impugnação, ela será rejeitada liminarmente. Se houver outros fundamentos, a impugnação será recebida,
mas a alegação de excesso de execução não será examinada.
f) Incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução;
Dificilmente será possível arguir a incompetência, se o título for sentença civil condenatória, já que
ela teria de ter sido alegada na fase cognitiva. Já o impedimento e a suspeição do juiz devem ser alegados
por simples petição.
g) Qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, desde que superveniente;
146
A lei dá alguns exemplos, como o pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição,
desde que superveniente à sentença. Essa hipótese terá natureza de ação incidente, e não de mero incidente
processual, uma vez que aquilo que o juiz declarar a respeito do débito terá de se tornar definitivo, por força
da coisa julgada material. Quando ele acolhe a impugnação, reconhecendo a inexistência do débito, terá de
extinguir a execução. Ao fazê-lo, não proferirá uma decisão interlocutória, mas verdadeira sentença, exceto
se acolher apenas parte da impugnação (a execução corre pelo remanescente).
Decisão: A impugnação será julgada por decisão interlocutória. Ainda assim, o que for
decidido a respeito do crédito não mais poderá ser rediscutido. Nessa situação, a impugnação tem natureza
de ação incidente, ainda que não constitua processo autônomo. A decisão interlocutória proferida pelo juiz
terá força de sentença e se revestirá da autoridade da coisa julgada material. O mesmo ocorrerá em caso de
improcedência da impugnação.

Responsabilidade patrimonial e fraudes do devedor. A dívida e a responsabilidade podem estar separadas


(ex.: devedor e fiador). Em regra, a responsabilidade patrimonial do devedor atinge “todos os seus bens
presentes ou futuros” (art. 789). Na verdade, todos os bens que se encontrem no patrimônio do devedor no
momento em que praticada a ação executiva se sujeitam à execução, sem se observar a época em que foram
adquiridos. O patrimônio sujeito à execução é composto apenas de bens de valor pecuniário, excluindo, pois,
os bens sem significado econômico (honra, vida, etc), bem como os bens patrimoniais considerados
impenhoráveis (art. 833). Responsabilidade e legitimação passiva para a execução (art. 779).
Responsabilidade executiva secundária (art. 790). atinge interesses privados; permite ajuizamento de ação
revocatória.
Existem três espécies de fraude do devedor (alienações fraudulentas):
a) Fraude contra credores;
b) Fraude à execução;
c) Atos de disposição de bem já penhorado.

Fraude contra credores e ação pauliana.


Pressupostos:
a) Eventus damni (dano): é o prejuízo provocado ao credor. Deverá ser demonstrado que a alienação
acarretou prejuízo ao credor porque esta disposição dos bens levou o devedor à insolvência ou agravou
ainda mais esse estado. É classificado como pressuposto objetivo.
b) Consilium fraudis: é o conluio fraudulento entre o alienante e o adquirente. Para que haja a anulação, o
adquirente precisa estar de má-fé. É o pressuposto subjetivo. Não é necessário provar o consilium fraudis
caso a alienação tenha sido gratuita ou caso o devedor tenha perdoado a dívida de alguém.
O art. 159 do CC presume a má-fé do adquirente (presume o consilium fraudis) em duas hipóteses: a)
Quando a insolvência do devedor/alienante for notória; b) Quando houver motivo para que a insolvência do
devedor/alienante seja conhecida do outro contratante. Ex: se o negócio jurídico for celebrado entre dois
irmãos ou entre sogro e genro.
Anterioridade do crédito: exige-se que o crédito seja anterior à alienação. Assim, em regra, somente quem já
era credor no momento da alienação fraudulenta é que poderá pedir a anulação do negócio jurídico.
Excepcionalmente, contudo, o STJ afirma que este requisito da anterioridade pode ser dispensado se for
verificado que a pessoa, já sabendo que iria ter dívidas em um futuro próximo, aliena seus bens para evitar
que os credores tenham como cobrá-lo.
A fraude contra credores pressupõe um devedor em estado de insolvência e ocorre antes de o
credor ingressar em juízo para cobrar seus créditos, é causa de anulação do ato de disposição, depende de
sentença própria (arts. 158 e 159 do CC/2002). Viola a própria atividade jurisdicional. Desafia ação pauliana,
que possui prazo decadencial de 4 anos, contados da data em que foi realizada a alienação.
Há duas correntes para os efeitos sobre a alienação:
a) ANULÁVEL: Adotada pelo CC/02 em sua redação literal (ADOTADA POR GUILHERME MARINONI). Art
159 - Serão igualmente anuláveis os contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for
notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante.
b) VÁLIDA, MAS INEFICAZ PERANTE O CREDOR: a alienação é válida, mas ineficaz perante o credor. Na
doutrina, é defendida por Yussef Cahali, Dinamarco, Teori Zawascki.

147
Fraude à execução: É instituto de direito processual civil que constitui ato atentatório à dignidade da justiça
e se distingue da fraude contra credores, defeito dos negócios jurídicos, tratada no art. 158 do Código Civil.

Fraude contra credores x Fraude à execução: A fraude contra credores ofende o direito dos credores; a
fraude à execução atenta contra o bom funcionamento do Poder Judiciário. Em ambas, o devedor desfaz-se
de bens do seu patrimônio, tornando-se insolvente. A diferença é que, na fraude contra credores, a alienação
é feita quando ainda não havia ação em curso, ao passo que a fraude à execução só existe se a ação já estava
em andamento. Na fraude à execução não é necessário demonstrar consilium fraudis. Além disso, a fraude
contra credores não pode ser reconhecida incidenter tantum, no curso de processo pendente, nem no bojo
de embargos de terceiro (Súmula 195 do STJ). Ela pressupõe a ação pauliana, cuja natureza não é
desconstitutiva, já que não desfará a alienação, mas declaratória de ineficácia. O reconhecimento da fraude
à execução prescinde de ação declaratória e pode ser feita incidentemente, no bojo da própria execução,
quando o juiz verificar que o devedor está insolvente e que alienou bens após a citação.
Hipóteses: O art. 792 do CP C dispõe que “A alienação ou a oneração de bem é considerada em fraude à
execução: I — quando sobre o bem pender ação fundada em direito real ou com pretensão reipersecutória,
desde que a pendência do processo tenha sido averbada no respectivo registro público, se houver; II —
quando tiver sido averbada, no registro do bem, a pendência do processo de execução, na forma do art. 828;
III — quando tiver sido averbado, no registro do bem, hipoteca judiciária ou outro ato de constrição judicial
originário do processo onde foi arguida a fraude; IV — quando, ao tempo da alienação ou oneração,
tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência; V — nos demais casos expressos em lei”.
O reconhecimento da fraude contra credores ou da fraude à execução não implicará a declaração de
nulidade ou a anulação do ato de alienação, mas tão somente a de ineficácia perante o credor. Se o devedor
saldar o débito para com o credor, a alienação remanescerá íntegra e válida, ainda que se tenha reconhecido
a fraude.
Requisitos: Processo pendente (prevalece o entendimento de que é preciso que o devedor já tenha sido
citado para o processo, seja ele de conhecimento ou de execução) ou averbação de certidão de distribuição
(Diante da possibilidade de o devedor desfazer-se dos seus bens entre o protocolo da inicial e a citação, foi
editado o art. 828, que autoriza o exequente a obter certidão comprobatória da admissão da execução para
averbação no registro de imóveis, de veículos ou de outros bens sujeitos à penhora, arresto ou
indisponibilidade); coisa litigiosa ou insolvência do devedor (se alienada a coisa litigiosa há fraude, mesmo
que o devedor tenha vários bens; se for insolvente, qualquer alienação já caracteriza fraude); má-fé do
adquirente (é expressamente prevista para a fraude contra credores e o STJ solidificou esse requisito para a
fraude à execução na Súmula 375 – a má fé não é presumida); intimação do terceiro adquirente (o terceiro
adquirente não se tornará parte, mas o bem por ele adquirido responderá pela dívida).
Súmula 375-STJ: O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado
ou da prova de má-fé do terceiro adquirente.

"O STJ apreciando o tema sob o regime do recurso repetitivo, reafirmou os entendimentos acima expostos e
definiu as seguintes teses: 1) Em regra, para que haja fraude à execução é indispensável que tenha havido a
citação válida do devedor; 2) Mesmo sem citação válida, haverá fraude à execução se, quando o devedor
alienou ou onerou o bem, o credor já havia realizado a averbação da execução nos registros públicos (art.
615-A do CPC/73, art. 799, IX e 828, caput do CPC/15). Presume-se em fraude de execução a alienação ou
oneração de bens realizada após essa averbação (§ 3º do art. 615-A do CPC/73, art. 828, §4º). 3) Persiste
válida a Súmula 375 do STJ segundo a qual o reconhecimento da fraude de execução depende do registro da
penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente; 4) A presunção de boa-fé é princípio
geral de direito universalmente aceito, devendo ser respeitado a parêmia (ditado) milenar que diz o
seguinte: “a boa-fé se presume, a má-fé se prova”; 5) Assim, não havendo registro da penhora na matrícula
do imóvel, é do credor o ônus de provar que o terceiro adquirente tinha conhecimento de demanda capaz de
levar o alienante à insolvência (art. 659, § 4º, do CPC). STJ. Corte Especial. REsp 956.943-PR, Rel. originária
Min. Nancy Andrighi, Rel. para acórdão Min. João Otávio de Noronha, julgado em 20/8/2014 (recurso
repetitivo) (Info 552)."

12A. Atos processuais. Despesas processuais. Honorários. Processo eletrônico.

Renan Lima

148
Obs.: nos casos em que, neste ponto, for utilizado o termo “CPC” desacompanhado de especificação, ou
mesmo quando for indicado um dispositivo legal sem indicação do diploma correspondente, trata-se de
referência ao CPC de 2015.

ATOS PROCESSUAIS: De acordo com Marinoni, Arenhart e Mitidiero, atos processuais são “declarações de
vontade que visam à criação, modificação ou extinção de situações processuais”. Trata-se de espécie do
gênero fato jurídico processual. Nesse sentido, fatos processuais são todos os acontecimentos da vida
processual que acabam por criar, modificar ou extinguir situações processuais e que possuem o processo
como espaço próprio de ocorrência.
Para Dinamarco, o ato processual civil é conduta humana voluntária, realizada no processo por um de seus
sujeitos e dotada da capacidade de produzir efeitos sobre este (p. 475).
O novo CPC disciplina os atos processuais a partir de seu art. 188.

Forma dos atos processuais: Em regra, os atos processuais não dependem de forma, salvo quando a lei
expressamente o exigir. Além disso, não se pronunciará a nulidade de ato realizado em desconformidade
com a lei, quando atingida a sua finalidade. Trata-se, de acordo com Marinoni, Arenhart e Mitidiero, do
“sistema de instrumentalidade das formas processuais”.

Art. 188 do CPC: Os atos e os termos processuais independem de forma determinada, salvo
quando a lei expressamente a exigir, considerando-se válidos os que, realizados de outro modo,
lhe preencham a finalidade essencial.

Nos termos do art. 192 do CPC, é obrigatório o uso da língua portuguesa nos atos processuais. Por essa
razão, o documento redigido em língua estrangeira somente poderá ser juntado aos autos quando
acompanhado de versão para a língua portuguesa tramitada por via diplomática ou pela autoridade central,
ou firmada por tradutor juramentado.

Publicidade dos atos processuais: Em regra, os atos processuais são públicos. No que se refere
especificamente às decisões judiciais, o art. 93, inciso IX, da CF assim dispõe:

“todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as
decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às
próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do
direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação”.

Observa-se, no entanto, que o próprio dispositivo constitucional prevê a possibilidade restrição à publicidade
dos atos processuais para preservação do direito à intimidade do interessado.
Em conformidade com o preceito constitucional, eis o regramento do CPC sobre a publicidade dos atos
processuais:

Art. 189. Os atos processuais são públicos, todavia tramitam em segredo de justiça os
processos:
I - em que o exija o interesse público ou social;
II - que versem sobre casamento, separação de corpos, divórcio, separação, união estável,
filiação, alimentos e guarda de crianças e adolescentes;
III - em que constem dados protegidos pelo direito constitucional à intimidade;
IV - que versem sobre arbitragem, inclusive sobre cumprimento de carta arbitral, desde que a
confidencialidade estipulada na arbitragem seja comprovada perante o juízo.
§ 1º O direito de consultar os autos de processo que tramite em segredo de justiça e de pedir
certidões de seus atos é restrito às partes e aos seus procuradores.
§ 2º O terceiro que demonstrar interesse jurídico pode requerer ao juiz certidão do dispositivo
da sentença, bem como de inventário e de partilha resultantes de divórcio ou separação.

149
Percebe-se, assim, que o próprio CPC prevê as hipóteses em que os processos deverão tramitar em segredo
de justiça.

Classificação dos atos processuais:


Atos das partes:
a) Postulatórios (pleiteiam provimento);
b) dispositivos (abdica de prerrogativa em prejuízo próprio);
c) instrutórios (buscam o convencimento);
d) reais (condutas materiais).
Quanto à aptidão para produzir imediatamente situação jurídica nova, os atos das partes são
causativos/determinantes ou indutivos/alternativos (estes isoladamente não produzem de imediato o efeito
almejado).
Art. 200. Os atos das partes consistentes em declarações unilaterais ou bilaterais de vontade
produzem imediatamente a constituição, modificação ou extinção de direitos processuais.
Parágrafo único. A desistência da ação só produzirá efeitos após homologação judicial.

Art. 201. As partes poderão exigir recibo de petições, arrazoados, papéis e documentos que
entregarem em cartório.

Art. 202. É vedado lançar nos autos cotas marginais ou interlineares, as quais o juiz mandará
riscar, impondo a quem as escrever multa correspondente à metade do salário-mínimo.

Atos do Juiz:
De acordo com o art. 203 do CPC: “Os pronunciamentos do juiz consistirão em sentenças, decisões
interlocutórias e despachos”.
O próprio Código de Processo traz a definição de cada ato do juiz nos seguintes termos:
Sentença: ressalvadas as disposições expressas dos procedimentos especiais, sentença é o pronunciamento
por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento
comum, bem como extingue a execução.

Obs: há doutrina sustentando que o conceito de sentença possui uma imperfeição técnica. Para essa
corrente, ao falar em colocar fim à fase cognitiva do procedimento comum, o legislador esqueceu-se de uma
hipótese em que, mesmo com a prolação da sentença, o procedimento comum ainda permanece em curso.
Trata-se do caso em que a sentença prolatada é ilíquida. Nessa hipótese, a fase cognitiva do procedimento
comum tem prosseguimento com a apuração do quantum debeatur.

Decisão interlocutória: é todo pronunciamento judicial de natureza decisória que não se enquadre no
conceito de sentença.
Despachos: todos os demais pronunciamentos do juiz praticados no processo, de ofício ou a requerimento
da parte.

A distinção é importante, sobretudo porque identificar as espécies de atos com conteúdo decisório
determina eventual recurso cabível.

Tempo dos atos:


De acordo com o art. 212 do CPC, os atos processuais serão realizados em dias úteis, das 6 (seis) às 20 (vinte)
horas. Todavia, poderão ser concluídos após as 20 (vinte) horas os atos iniciados antes, quando o adiamento
prejudicar a diligência ou causar grave dano.
Quando o ato tiver de ser praticado por meio de petição em autos não eletrônicos, essa deverá ser
protocolada no horário de funcionamento do fórum ou tribunal, conforme o disposto na lei de organização
judiciária local.
Por outro lado, a prática eletrônica de ato processual pode ocorrer em qualquer horário até as 24 (vinte e
quatro) horas do último dia do prazo. Deve-se observar o horário vigente no juízo perante o qual o ato deve
ser praticado para fins de atendimento do prazo.

150
Independentemente de autorização judicial, as citações, intimações e penhoras poderão ser realizadas no
período de férias forenses, onde as houver, e nos feriados ou dias úteis fora do horário estabelecido neste
artigo, observado a garantia constitucional da inviolabilidade do domicílio.
Durante as férias forenses e nos feriados, não se praticarão atos processuais, excetuando-se as citações,
intimações e penhoras, bem como a tutela de urgência.
Nos termos do art. 215 do CPC, processam-se durante as férias forenses, onde as houver, e não se
suspendem pela superveniência delas, os procedimentos de jurisdição voluntária e os necessários à
conservação de direitos, quando puderem ser prejudicados pelo adiamento, a ação de alimentos e os
processos de nomeação ou remoção de tutor e curador, bem como outros casos em que a lei determinar.
Conforme o art. 216 do CPC, para efeito forense, são feriados, além dos declarados em lei, os sábados, os
domingos e os dias em que não haja expediente forense.

Do lugar dos atos processuais:


Os atos processuais serão realizados ordinariamente na sede do juízo, ou, excepcionalmente, em outro lugar
em razão de deferência, de interesse da justiça, da natureza do ato ou de obstáculo arguido pelo interessado
e acolhido pelo juiz (art. 217 do CPC).

COMUNICAÇÃO DOS ATOS PROCESSUAIS E PRAZOS: Ver resumo do Ponto 8.a

NEGÓCIOS JURÍDICOS PROCESSUAIS (CONVENÇÕES PROCESSUAIS):


Os negócios jurídicos processuais podem ser definidos como fatos voluntários que sofreram a incidência de
norma processual, cujo suporte fático atribui ao sujeito o poder de decidir quanto à prática ou não do ato e
quanto à definição dos seus efeitos.
Assim, o sujeito pode (i) selecionar uma categoria jurídica eficacial já definida previamente pelo sistema
jurídico; ou (ii) estabelecer, dentro dos limites fixados no ordenamento jurídico, determinadas situações
jurídicas processuais ou alteração do procedimento.
Na mesma linha, Fredie Didier Jr. (2016b, p. 380) ensina que negócio processual é o fato jurídico voluntário,
em cujo suporte fático se reconhece ao sujeito o poder de regular, dentro dos limites fixados no próprio
ordenamento jurídico, certas situações jurídicas processuais, ou alterar o procedimento.
Antonio do Passo Cabral (2016, p. 68), por sua vez, define as “convenções ou acordos processuais” como
“[...] negócio jurídico plurilateral, pelo qual as partes, antes ou durante o processo e sem necessidade de
intermediação de nenhum outro sujeito, determinam a criação, modificação e extinção de situações jurídicas
processuais, ou alteram o procedimento”.
O acordo processual está sujeito à teoria do fato jurídico, até por se tratar de uma espécie de negócio
jurídico, e, por isso, deve-se atentar a três planos que irão influenciá-lo: o da existência, o da validade e o da
eficácia.
Dessa maneira, para existir um acordo haverá a necessidade: da figura do agente; da vontade manifesta; do
autorregramento desta; do objeto; e da forma prescrita em lei.
Configurados estes elementos, o negócio processual deverá seguir os requisitos da validade, dispostos na
norma do art. 104 do Código Civil brasileiro (CC/2002), sendo eles: a capacidade do agente; o objeto lícito,
possível e determinável; e a forma não defesa em lei.
A propósito, deverá ser observada tanto a capacidade civil quanto a capacidade postulatória. Assim, mesmo
o civilmente capaz, mas juridicamente vulnerável, presumir-se-á incapaz, tais como ocorre com as posições
jurídicas do consumidor e do trabalhador, costumeiramente apontados como vulneráveis frente às empresas
e empregadores, respectivamente (DIDIER JÚNIOR, 2015, p.386). São também considerados nesse mesmo
padrão aqueles que não estejam representados juridicamente.
Em conformidade com o enunciado nº 256 do Fórum Permanente de Processualistas Civis, a Fazenda Pública
também pode celebrar acordo procedimental, não havendo qualquer invalidade, já que, caso esta nulidade
ocorresse, recairia sobre o objeto, mas não sobre a capacidade postulante.
Na mesma linha, tem-se que o Ministério Público poderá celebrar negócios processuais desde que atue na
qualidade de parte, nos termos do enunciado nº 253, também do Fórum Permanente de Processualistas Civis
e da Resolução nº 118/2014 do Conselho Nacional do Ministério Público.
O CPC/2015 traz a possibilidade de serem realizados negócios processuais, sendo eles classificados em
típicos, isto é, aqueles trazidos como hipóteses regulamentadas ao longo do próprio texto legal, e atípicos,

151
cuja possibilidade pode ser vislumbrada através da cláusula geral de negociação processual disposta no art.
190 do CPC/2015.
Segundo Didier Júnior (2015, p. 380), o referido dispositivo é uma cláusula genérica que evidencia a
existência do subprincípio da atipicidade da negociação processual, o qual serve como base para a
materialização do princípio do respeito ao autorregramento da vontade no processo civil.
Assim, tem-se a possibilidade de criação de diversos tipos de acordos processuais não previstos
expressamente, os quais podem ter como objeto o ônus processual, as faculdades, deveres e poderes, bem
como os seguintes exemplos: acordo de impenhorabilidade, acordo de instância única, acordo de ampliação
ou redução de prazos, acordo para superação de preclusão, acordo de substituição de bem penhorado,
acordo de rateio de despesas processuais, dispensa consensual de assistente técnico, acordo para retirar o
efeito suspensivo da apelação, acordo para não promover execução provisória, acordo para limitar número
de testemunhas, etc.
No mesmo sentido, José Miguel Garcia Medina (2016, p. 337) afirma que atípicos ou inominados são os
negócios jurídicos processuais cujo regime não possui previsão legal, e o art. 190 do CPC/2015 estabelece,
textualmente, a possibilidade de as partes celebrarem acordo sobre procedimentos, ônus, poderes,
faculdades e deveres processuais. Cuida-se, então, de autorização para que as partes firmem negócios
processuais, ainda que “[...] não se encontrem disciplinados ou sequer referidos, com antecedência, na lei”.
Já em relação à negociação processual típica, o CPC/2015, ampliou as hipóteses destas convenções, dentre
as quais se encontram os acordos de saneamento (art. 357, §2º e §3º), a redução consensual dos prazos (art.
222, § 1º), os de escolha convencional do perito e a calendarização dos atos processuais (art. 191 do CPC).

DESPESAS PROCESSUAIS:
Nos termos do art. 82 do CPC, excetuados os casos de gratuidade de justiça, incumbe às partes prover as
despesas dos atos que realizarem ou requererem no processo, antecipando-lhes o pagamento, desde o início
até a sentença final ou, na execução, até a plena satisfação do direito reconhecido no título.
As despesas abrangem as custas dos atos do processo, a indenização de viagem, a remuneração do
assistente técnico e a diária de testemunha.
Incumbe ao autor adiantar as despesas relativas a ato cuja realização o juiz determinar de ofício ou a
requerimento do Ministério Público, quando sua intervenção ocorrer como fiscal da ordem jurídica.
A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou, bem como os honorários
advocatícios.
Se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as
despesas.
Se um litigante sucumbir em parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas despesas e pelos
honorários.
OBS: Caução às custas – era prevista no CPC/73 na parte das cautelares (quando o autor residente no
exterior propusesse ação no Brasil, teria que prestar caução para o caso de sucumbência, se não tivesse bens
no Brasil que respondessem por isso). O Novo CPC trouxe essa previsão para o rol das despesas processuais.

Art. 83. O autor, brasileiro ou estrangeiro, que residir fora do Brasil ou deixar de residir no país
ao longo da tramitação de processo prestará caução suficiente ao pagamento das custas e dos
honorários de advogado da parte contrária nas ações que propuser, se não tiver no Brasil bens
imóveis que lhes assegurem o pagamento.
§ 1º Não se exigirá a caução de que trata o caput:
I - quando houver dispensa prevista em acordo ou tratado internacional de que o Brasil faz
parte;
II - na execução fundada em título extrajudicial e no cumprimento de sentença;
III - na reconvenção.
§ 2o Verificando-se no trâmite do processo que se desfalcou a garantia, poderá o interessado
exigir reforço da caução, justificando seu pedido com a indicação da depreciação do bem dado
em garantia e a importância do reforço que pretende obter.

Vale destacar que o inciso I traz uma novidade: essa caução é dispensada se houver previsão em acordo ou
tratado internacional.

152
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS:
O Novo CPC ampliou a regulamentação dos honorários advocatícios, criando uma seção específica para tratar
das despesas, honorários e multas do processo. Os honorários advocatícios constituem como direito do
advogado, têm natureza alimentar e possuem os mesmos privilégios dos créditos trabalhistas.
A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor (art. 85 do CPC). São devidos
honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na
execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente.
Os honorários serão fixados entre o mínimo de 10 (dez) e o máximo de 20 (vinte) por cento sobre o valor da
condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da
causa, atendidos, o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância
da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
Os honorários advocatícios nascem contemporaneamente à sentença e não preexistem à propositura da
demanda, devendo observar as normas do CPC/2015 nos casos de decisões proferidas a partir de 18/3/2016.
Os juros moratórios contam a partir do trânsito em julgado e é cabível ação autônoma para definição e
cobrança dos honorários quando a decisão transitada em julgado for omissa, seja quanto ao direito de sua
percepção, seja quanto a seu valor.
Ressalte-se que é incabível a compensação de honorários advocatícios em caso de sucumbência recíproca,
ressalvados os casos em que uma parte é sucumbente em parcela mínima da demanda proposta, hipótese na
qual a outra parte suportará os ônus sucumbenciais na integralidade.
Concorrendo diversos autores ou diversos réus, os vencidos respondem proporcionalmente pelas despesas e
pelos honorários.
Nos casos de perda do objeto, os honorários serão devidos por quem deu causa ao processo.
Se houver desistência, renúncia ao direito sob o qual se funda a ação ou reconhecimento do pedido, a parte
que realizou tal ato suportará os honorários sucumbenciais (art. 90). Se o reconhecimento, desistência ou
renúncia forem parciais, a parte que o fez suportará o ônus sucumbencial de maneira proporcional (art. 90,
§1º).
Se, no entanto, o réu reconhecer a procedência do pedido e, imediatamente, adimplir integralmente a
prestação reconhecida, os honorários serão devidos pela metade.
Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for
muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa.
Na ação de indenização por ato ilícito contra pessoa, o percentual de honorários incidirá sobre a soma das
prestações vencidas acrescida de 12 (doze) prestações vincendas (art. 85, §9º do Novo CPC).
Os honorários recursais podem ser acumulados com as multas e sanções processuais.
As verbas de sucumbência arbitradas em embargos à execução rejeitados ou julgados improcedentes e em
fase de cumprimento de sentença serão acrescidas no valor do débito principal, para todos os efeitos legais.
A sentença deverá distribuir entre os litisconsortes, de forma expressa, a responsabilidade proporcional pelo
pagamento das verbas sucumbenciais, havendo solidariedade em caso de omissão da decisão judicial.
Houve um claro intento do legislador em persuadir os litigantes a diminuir a litigiosidade, já que previu
expressamente que haverá condenação em honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de
sentença, na execução (ainda que não haja resistência) e nos recursos interpostos.
Assim, é possível, por exemplo, que uma sentença tenha condenado a parte em 10% de honorários e, caso
haja interposição de recurso de apelação não provido, é cabível a majoração dos honorários.
Com efeito, trata-se de inovação do NCPC, que previu expressamente a possibilidade de os tribunais
aumentarem o valor dos honorários sucumbenciais em virtude de manejo de recurso que acabe improvido.
Não é necessário que o recurso seja protelatório, descabido, basta o não provimento.
Especificamente em relação aos honorários advocatícios recursais, é importante destacar que o percentual
total na fase de conhecimento não poderá ultrapassar 20% da condenação ou valor atualizado da causa.
Por isso, se a condenação em sentença de primeiro grau for fixada em 20%, não será mais possível ao
tribunal ampliar os honorários advocatícios, no entanto, se fixado em percentual menor, será obrigatório o
aumento da verba honorária quando do julgamento do recurso se houver o indeferimento.
O STF já possui, pelo menos, dois precedentes no sentido de que os honorários recursais independem da
apresentação de contrarrazões, ou seja, mesmo que o advogado da parte vencedora fique absolutamente
inerte, terá direito ao aumento da verba honorária. Isto porque, como já disse, esse aumento se justifica pela
simples interposição de recurso que foi improvido, ainda que a parte recorrida não tenha oferecido
resistência.
153
Jurisprudência:
STJ: Honorários advocatícios. Natureza jurídica. Lei nova. Marco temporal para a aplicação do CPC/2015.
Prolação da sentença.
TESE FIRMADA: Os honorários advocatícios nascem contemporaneamente à sentença e não preexistem à
propositura da demanda, devendo observar as normas do CPC/2015 nos casos de decisões proferidas a
partir de 18/3/2016.
(REsp 1.636.124-AL, Rel. Min. Herman Benjamin, por unanimidade, julgado em 6/12/2016, DJe 27/4/2017.)

Honorários em causas que envolvam a Fazenda Pública:


Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os mesmos critérios
estabelecidos (o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da
causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço), bem como seguintes
percentuais:
I - mínimo de dez e máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico
obtido até 200 (duzentos) salários-mínimos;
II - mínimo de oito e máximo de dez por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico
obtido acima de 200 (duzentos) salários-mínimos até 2.000 (dois mil) salários-mínimos;
III - mínimo de cinco e máximo de oito por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico
obtido acima de 2.000 (dois mil) salários-mínimos até 20.000 (vinte mil) salários-mínimos;
IV - mínimo de três e máximo de cinco por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico
obtido acima de 20.000 (vinte mil) salários-mínimos até 100.000 (cem mil) salários-mínimos;
V - mínimo de um e máximo de três por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido
acima de 100.000 (cem mil) salários-mínimos.

Deve ser considerado o salário-mínimo vigente quando prolatada sentença líquida ou o que estiver em vigor
na data da decisão de liquidação.
Tais percentuais devem ser aplicados desde logo, quando for líquida a sentença. Não sendo líquida a
sentença, a definição do percentual, nos termos previstos nos incisos I a V, somente ocorrerá quando
liquidado o julgado.
Não havendo condenação principal ou não sendo possível mensurar o proveito econômico obtido, a
condenação em honorários dar-se-á sobre o valor atualizado da causa.
Quando, conforme o caso, a condenação contra a Fazenda Pública ou o benefício econômico obtido pelo
vencedor ou o valor da causa for superior ao valor de 200 (duzentos salários mínimos), a fixação do
percentual de honorários deve observar a faixa inicial e, naquilo que a exceder, a faixa subsequente, e assim
sucessivamente. Em outras palavras, os honorários devem ser fixados de maneira progressiva.
Por fim, não serão devidos honorários no cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública que enseje
expedição de precatório, desde que não tenha sido impugnada.

PROCESSO ELETRÔNICO:
A Lei nº 11.419/2006 instituiu o uso de meio eletrônico para tramitação de processos judiciais, comunicação
de atos e transmissão de peças processuais.
A lei considerou como meio eletrônico qualquer forma de armazenamento ou tráfego de documentos e de
arquivos digitais, e como transmissão eletrônica toda forma de comunicação à distância, dando ênfase a
utilização da rede mundial de computadores. Também adotou de forma expressa a possibilidade de
assinatura eletrônica.
Os profissionais que atuarem nos processos eletrônicos deverão obrigatoriamente estar cadastrados ou
credenciados junto ao Poder Judiciário, para possibilitar-lhes o envio de petições, de recursos e a prática de
atos processuais, sendo aconselhável a criação de um cadastro único por todos os órgãos do Poder Judiciário
(art. 2º, §§ 1º, 2º e 3º).
De acordo com a lei que os atos processuais por meio eletrônico consideram-se realizados no dia e hora de
seu envio ao sistema do Poder Judiciário, quando haverá fornecimento de protocolo eletrônico (art. 3º).
As intimações e citações em meio eletrônico são consideradas pessoais e verificam-se na data da consulta ou
automaticamente após 10 dias corridos (art. 5º, §3º).

154
Em outras palavras, o § 3º do art. 5º prevê a obrigatoriedade da pessoa cadastrada realizar a consulta no
máximo em 10 dias corridos, contados da data do envio da intimação, sob pena de ser considerada efetivada
no término desse prazo.
Há restrição quanto à citação em matéria criminal e infracional (art. 6º), mas não quanto a direitos
indisponíveis. Documentos juntados aos processos eletrônicos com garantia da origem e de seu signatário,
serão considerados originais para todos os efeitos legais. (art. 11).
É possível a alegação motivada e fundamentada de adulteração antes ou durante o processo de digitalização
(art. 11). Os originais dos documentos deverão ser preservados até o trânsito em julgado da sentença ou até
o final do prazo para rescisória.

12B. Julgamento de casos repetitivos. Incidente de resolução de demandas repetitivas e recursos especial e
extraordinário repetitivos.

André Bica

1. Introdução e microssistema de julgamento de casos repetitivos


Segundo Fredie Didier, existe atualmente um microssistema de julgamento de casos repetitivos (Enunciado
345 FPPC), composto pelo IRDR (Incidente de resolução de casos repetitivos) e pelos recursos especial e
extraordinário repetitivos. O referido microssistema possuiria duas funções: a) formar precedentes
obrigatórios; b) gerir e julgar casos repetitivos. Segundo Didier, os institutos compõem dois microssistemas,
integrando o de gestão e julgamento de casos repetitivos (art. 928, CPC) e pertencem ao microssistema de
formação concentrada de precedentes obrigatórios.
O microssistema de formação e aplicação de precedentes obrigatórios é formado pelo IRDR, pelos recursos
repetitivos e, ainda, pelo incidente de assunção de competência. A formação de precedentes é o objetivo
desse microssistema. Formado o precedente obrigatório, tanto no incidente de assunção de competência
como no julgamento de casos repetitivos, os juízos e tribunais devem observá-lo:
O microssistema de formação e aplicação de precedentes obrigatórios é formado pelo IRDR, pelos recursos
repetitivos e, ainda, pelo incidente de assunção de competência. Sobre o tema, ver ponto referente aos
precedentes.
Cabe reclamação para garantir a observância de precedente proferido em julgamento de casos repetitivos ou
em incidente de assunção de competência (art. 988, IV, e § 5º , CPC), sendo considerada omissa a decisão
que deixar de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de
assunção de competência (art. 1.022, parágrafo único, I, CPC).
INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS
1. Introdução. O IRDR tem natureza jurídica de incidente processual, instaurado em um processo de
competência originária ou em recurso (inclusive na remessa necessária), com o objetivo de evitar que
demandas repetitivas (ou seja, que envolvam a mesma discussão de questão exclusivamente de direito)
possam gerar risco à isonomia e à segurança jurídica. Segundo Antonio do Passo Cabral, não se deve
considerar o IRDR/recursos repetitivos como substitutos das ações coletivas, são instrumentos
complementares.
Q: Qual a natureza do IRDR? Trata-se de causa-piloto ou procedimento-modelo?
Processos-teste ou causas-piloto:
Exemplo da GLO (Group litigation order) e do Pilotverfahren austríaco. Se caracteriza por haver unidade de
processo e julgamento, ou seja, o órgão decisor julga não apenas a questão comum, mas todas as demais
questões, resolvendo o caso por completo, e posteriormente ocorrendo a replicação da ratio decidendi aos
casos similares. Adotado no julgamento de casos repetitivos.
Procedimentos-modelo:
Exemplo é o musterverfahren alemão, que se caracteriza pela cisão cognitiva e decisória, o órgão julgador
julga somente as questões comuns, seguido de incorporação da decisão aos processos que discutam a
mesma controvérsia, devolvendo aos demais órgãos jurisdicionais a solução de todas as questões específicas
de cada caso.
Segundo Cabral (e Didier), após a inserção do art. 978, §único, o IRDR será, via de regra, uma causa-piloto, eis
que o órgão julgará o caso todo, inclusive recurso e remessa necessária. Afirma que a opção pelo parâmetro
do processo-teste faz com que a cognição no IRDR seja empreendida à luz de direitos subjetivos concretos.
Cabral critica a opção do legislador pela causa-piloto, e aponta que o NCPC acabou por consagrar um sistema
155
híbrido, pois em que pese a adoção geral do causa-piloto, Cabral aduz que quando houver desistência do
processo afetado, o incidente pode prosseguir mesmo assim para a definição da questão comum (art.
976,§1º NCPC).
2. Pressupostos do IRDR. São pressupostos cumulativos do IRDR: 1) efetiva repetição de processos que
contenham controvérsia sobre a mesma questão de direito (976,I, NCPC); 2) risco de ofensa à isonomia e à
segurança jurídica (976,II); 3) a não afetação por tribunais superiores para julgamento de recurso repetitivo –
976, §4o, (pressuposto negativo).
A desistência ou abandono do processo não impede o exame de mérito do incidente (976, §1o)
Prevê o art. 976, §2o que se não for o requerente, o Ministério Público intervirá obrigatoriamente no
incidente e deverá assumir sua titularidade em caso de desistência ou de abandono. O dispositivo deve ser
lido com cautela à luz das atribuições institucionais do MP na CRFB, que deverá ser obrigatoriamente
intimado, mas não será obrigado a intervir (ou prosseguir no caso na hipótese do §2o).
A inadmissão do incidente de resolução de demandas repetitivas por ausência de qualquer de seus
pressupostos de admissibilidade não impede que, uma vez satisfeito o requisito, seja o incidente novamente
suscitado. (976,§ 3o)
Art. 976,§ 5o Não serão exigidas custas processuais no incidente de resolução de demandas repetitivas.
3. Legitimados
Art. 977. O pedido de instauração do incidente será dirigido ao presidente de tribunal:
I - pelo juiz ou relator, por ofício;
II - pelas partes, por petição;
III - pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública, por petição.
Parágrafo único. O ofício ou a petição será instruído com os documentos necessários à demonstração do
preenchimento dos pressupostos para a instauração do incidente.
Art. 978. O julgamento do incidente caberá ao órgão indicado pelo regimento interno dentre aqueles
responsáveis pela uniformização de jurisprudência do tribunal.
Parágrafo único. O órgão colegiado incumbido de julgar o incidente e de fixar a tese jurídica julgará
igualmente o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária de onde se originou o
incidente.
4. Publicidade. O art. 979 regulamenta a publicidade como técnica de gestão das causas repetitivas (a
instauração e o julgamento do IRDR serão sucedidos da mais ampla e específica divulgação e publicidade,
por meio de registro eletrônico no Conselho Nacional de Justiça e os tribunais manterão banco de dados).
5. Prazo de julgamento e admissibilidade.
Art. 980. O incidente será julgado no prazo de 1 (um) ano e terá preferência sobre os demais feitos,
ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus.
Parágrafo único. Superado o prazo previsto no caput, cessa a suspensão dos processos prevista no art. 982,
salvo decisão fundamentada do relator em sentido contrário.
A análise da presença dos requisitos de admissibilidade previstos no art. 976 do CPC deve ser feita pelo órgão
colegiado competente para julgar o IRDR. O juízo de admissibilidade é realizado pelo órgão colegiado, não
cabendo ao relator fazê-lo isoladamente (art. 981, CPC).
6. Efeitos (art. 982)
Suspensão dos Processos. Admitida a tramitação do incidente, os processos que envolvam a mesma questão
de direito, em curso perante a esfera de atribuição do tribunal, devem ser suspensos (art. 980, CPC), por até
um ano, podendo porém ser prorrogado a critério do relator, por decisão fundamentada (art. 980, parágrafo
único, CPC).
Requisição de Informações. Além de determinar a suspensão dos processos envolvidos, o relator pode
também requisitar informações aos órgãos judiciários em que tramitam as causas sujeitas ao incidente. Os
juízes desses casos deverão prestar tais informações requisitadas no prazo de quinze dias.
Pedido de Tutela de Urgência. Havendo a necessidade de requerimento de tutela de urgência durante a
suspensão dos processos submetidos à suspensão por conta do IRDR, este deve ser postulado ao juízo da
causa suspensa (art. 982, § 2.º, CPC), e não ao órgão do tribunal que julgará o incidente.
Ampliação do efeito suspensivo do incidente. Qualquer dos legitimados do art. 977 II e III poderá solicitar ao
tribunal superior – ao qual será dirigido eventual o recurso extraordinário ou especial (art. 987, CPC) – a
suspensão de todos os processos que discutam a questão de direito a ser apreciada, e que tramitam no
território nacional. A suspensão, nesse caso, pode ser postulada depois de já oferecido o recurso especial ou

156
extraordinário ou antes de sua interposição. Se não houver, futuramente, a interposição de recurso especial
ou extraordinário contra o julgamento do IRDR, o efeito suspensivo nacional caducará (art. 982, § 5.º).
O art. 983 abre espaço para amicus curiae, seguindo a linha do NCPC de ampliar, valorizar e democratizar a
participação processual.
O art. 984 trata da sessão de julgamento do IRDR. Cabral afirma que deve ser dada possibilidade de
sustentação oral ao amicus curiae. Há previsão de prazo de sustentação oral ao MP. Aplicando-se ao IRDR o
art. 1.037,§7º, deve o tribunal decidir em primeiro lugar a questão comum (da forma mais abstrata possível
de forma a aplicar a ratio decidendi aos casos análogos).
7. Obrigatoriedade de observância da decisão e revisão da tese jurídica (arts. 985 e 986)
Art. 985. Julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada:
I - a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem
na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive àqueles que tramitem nos juizados especiais do
respectivo Estado ou região;
II - aos casos futuros que versem idêntica questão de direito e que venham a tramitar no território de
competência do tribunal, salvo revisão na forma do art. 986.
§ 1o Não observada a tese adotada no incidente, caberá reclamação.
§ 2o Se o incidente tiver por objeto questão relativa a prestação de serviço concedido, permitido ou
autorizado, o resultado do julgamento será comunicado ao órgão, ao ente ou à agência reguladora
competente para fiscalização da efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos a regulação, da tese adotada.
O incidente tem dupla dimensão, uma delas é o julgamento dos casos afetados como um todo. No entanto a
dimensão mais importante, e a ratio essendi do instituto é outra. O IRDR se destina a produzir uma decisão
cuja conclusão possa ser replicada em muitos outros processos. A ratio decidendi será aplicada sem qualquer
conduta da parte do processo originário, ou seja, não há opt-in ou opt-out.
A lei determina a aplicação da tese a todos os processos atualmente em tramitação (suspensos ou não). Se o
processo já tiver sentença, e pendente apelação em sentido contrário à tese fixada no IRDR, aplica-se por
analogia o art. 1.040,I do NCPC.
Estabilidade da decisão do IRDR
Segundo Cabral/Sofia Temer não faz coisa julgada (para Marinoni, a decisão tomada em IRDR implica coisa
julgada erga omnes a propósito da questão de direito repetitiva) a estabilidade da decisão decorre de uma
preclusão extraprocessual ceteris paribus (condicionada à manutenção das circunstâncias fático-jurídicas que
levaram à conclusão da inadmissão do incidente).
Revisão da Tese. A revisão de tese firmada em IRDR pode dar-se de ofício ou a requerimento do Ministério
Público ou da Defensoria Pública, nos mesmos termos em que se pode revisar precedente obrigatório (art.
927, §§ 2.º a 4.º, CPC). Ou seja, deve-se observar fundamentação específica, que considere, entre outros
valores, a revogação ou modificação da norma em que se baseava, a alteração econômica, política ou social
do ambiente em que se deu o entendimento anterior e ainda a preservação da segurança jurídica, da
proteção da confiança e da isonomia
8. Cabimento de Recurso Especial e Extraordinário. O julgamento de mérito do IRDR admite a interposição
imediata de recurso especial e extraordinário, com efeito suspensivo ope legis, presumindo-se a repercussão
geral da questão constitucional (987,§1º). Julgado, no mérito, o recurso especial ou o recurso extraordinário,
a decisão do Tribunal Superior que examina a tese jurídica discutida no IRDR deverá ser aplicada em todo
território nacional, para todos os processos coletivos ou individuais em que a mesma questão de direito
esteja envolvida. Para ser aplicada em território nacional, o STJ e STF devem conhecer do mérito do incidente
(o mérito da causa e do recurso podem ser distintos).

Recurso especial e extraordinários repetitivos


1. Introdução. Segundo Marinoni, procedimento que visa à solução dos recursos repetitivos obedece a cinco
estágios distintos: i) seleção de recursos fundados em idêntica controvérsia de direito (art. 1.036, CPC); ii)
afetação da questão como repetitiva (art. 1.037, CPC); iii) instrução da controvérsia (art. 1.038, CPC); iv)
decisão da questão repetida (art. 1.038, § 3.º, CPC); e v) irradiação dos efeitos da decisão para os casos
repetidos (arts. 1.039 a 1.041, CPC).
2. Seleção. O procedimento para a aferição da existência de múltiplos recursos fundados em idêntica
controvérsia de direito inicia com a seleção de recursos e pode ocorrer por iniciativa do presidente ou vice-
presidente dos tribunais locais (art. 1.036, § 1.º, CPC) ou por iniciativa do relator de determinado recurso
extraordinário ou recurso especial (art. 1.036, § 5.º, CPC). Em quaisquer dos casos, o órgão jurisdicional
157
selecionará recursos representativos da controvérsia admissíveis que contenham abrangente argumentação
e discussão a respeito da questão (art. 1.036, § 6.º, CPC). A seleção realizada pelo tribunal local não vincula o
relator no tribunal superior, que pode selecionar outros recursos (art. 1.036, § 4.º, CPC). Qualquer questão
de direito pode ser objeto do julgamento de casos repetitivos: questão de direito material ou processual,
individual ou coletivo.
3. Afetação. Reunidos os recursos selecionados, constatada a multiplicidade, o relator afetará a questão para
julgamento. Nessa oportunidade, o relator identificará com precisão a questão a ser submetida a julgamento,
determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que
versem sobre a questão afetada e tramitem em todo o território nacional, e poderá requisitar de todos os
tribunais locais a remessa de um recurso representativo da controvérsia (art. 1.037, CPC). Recebidos os
recursos repetidos de todo o país, pode o relator retratar-se da decisão de afetação, com o que determinará
a revogação da suspensão (art. 1.037, § 1.º, CPC). Havendo mais de uma afetação, será prevento o relator
que primeiro tiver proferida a decisão de afetação (art. 1.037, § 3.º, CPC). Os recursos afetados deverão ser
julgados no prazo de um ano e terão preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu
preso e o pedido de habeas corpus. Com a revogação do § 5.º do art. 1.037, CPC, pela Lei 13.256/2016, o não
julgamento do recurso no prazo de um ano não implica automática retomada do curso dos processos em
todo o território nacional. A desafetação não impede nova afetação por outro relator (art. 1.037, § 6.º, CPC).
4. Distinção. As partes têm o direito de ser intimadas da decisão de suspensão por força da afetação da
questão (art. 1.037, § 8.º, CPC). Isso porque pode ocorrer indevido sobrestamento de determinado processo
por equivocada identificação da questão nele tratada. Nesse caso, a parte poderá demonstrar a distinção
entre os casos, requerendo o prosseguimento do seu processo (art. 1.037, § 9.º, CPC). Esse requerimento
será dirigido ao juiz, se o processo sobrestado estiver em primeiro grau, ao relator, se o processo sobrestado
estiver no tribunal de origem, ao relator do acórdão recorrido, se for sobrestado, no tribunal de origem,
recurso especial ou extraordinário, ou ao relator do recurso especial ou extraordinário, cujo processamento
houver sido sobrestado (art. 1.037, § 10, CPC). Antes de decidi-lo, o órgão judicial deve oportunizar o
contraditório (art. 1.037, § 11, CPC). Reconhecida a distinção, o processo terá prosseguimento na forma legal
(art. 1.037, § 12, CPC). Não reconhecida, conforme o caso, caberá agravo de instrumento ou agravo interno
(art. 1.037, § 13, CPC).
5. Instrução. A fim de instruir a controvérsia, poderá o relator requisitar informações aos tribunais locais,
bem como admitir a intervenção de amicus curiae e fixar data para audiência pública (art. 1.038 CPC).
6. Decisão. Na sessão destinada à decisão da controvérsia, o debate concernente à controvérsia deve
abranger todos os fundamentos relevantes suscitados para solução da questão, sendo imprescindível que o
acórdão reflita essa análise completa da questão (art. 1.038, § 3.º, CPC).
7. Irradiação. Resolvida a questão, a solução formulada deverá disciplinar todos os casos idênticos (arts.
1.039 e 1.040, CPC). Vale dizer: as razões oriundas do julgamento servem tendencialmente como precedente
e nessa linha devem irradiar seus efeitos para todas as questões idênticas ou semelhantes. Se o recurso tiver
por objeto questão atinente à prestação de serviço concedido, permitido ou autorizado, o resultado do
julgamento será comunicado ao órgão, ao ente ou à agência reguladora competente para fiscalização da
efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos a regulação, da tese adotada (art. 1.040, IV, CPC). Decidido o
recurso representativo da controvérsia, os órgãos colegiados têm o dever, conforme o caso, de inadmitir,
desprover ou aplicar a tese aos demais recursos versando idêntica controvérsia (art. 1.039, CPC – o novo
Código fala em declarar “prejudicados” os demais recursos, mas é certo que está querendo se referir aí, em
sendo o caso, à necessidade de inadmissão ou de desprovimento do recurso). Ainda, negada a existência de
repercussão geral no recurso extraordinário afetado e no representativo da controvérsia, serão considerados
automaticamente inadmitidos os recursos extraordinários cujo processamento tenha sido sobrestado (art.
1.039, parágrafo único, CPC).
8. Publicação. Publicado o acórdão oriundo do julgamento dos recursos repetitivos: I – o presidente ou vice-
presidente do tribunal de origem negará seguimento aos recursos especiais ou extraordinários sobrestados
na origem, se o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Supremo Tribunal Federal ou do Superior
Tribunal de Justiça; II – o órgão que proferiu o acórdão recorrido, na origem, reexaminará a causa de
competência originária, a remessa necessária ou o recurso anteriormente julgado, na hipótese de o acórdão
recorrido contrariar o precedente constitucional ou federal; III – os processos suspensos em primeiro e
segundo grau de jurisdição retomarão o seu curso para julgamento e aplicação do precedente firmado (art.
1.040, CPC).

158
9.Desistência. A parte pode desistir da ação em curso no primeiro grau de jurisdição, antes de proferida a
sentença, se a questão nela discutida for idêntica à resolvida pelo recurso representativo da controvérsia
(art. 1.040, § 1.º, CPC). Se a desistência ocorrer antes de oferecida a contestação, a parte ficará isenta do
pagamento de custas e de honorários de sucumbência (art. 1.040, § 2.º, CPC). A desistência nesse caso
independe de consentimento do réu, ainda que já apresentada a contestação (art. 1.040, § 3.º, CPC).
10. Inobservância do precedente. Se o tribunal de origem violar o precedente, o recurso deve ser remetido
ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça (art. 1.041, CPC). Realizado o juízo de
retratação, com alteração do acórdão divergente, o tribunal de origem, se for o caso, decidirá as demais
questões ainda não decididas, cujo enfrentamento se tornou necessário em decorrência da alteração (art.
1.041, § 1.º, CPC). Quando houver o reexame da causa com o fito de alinhamento à tese vencedora e o
recurso versar sobre outras questões, caberá ao presidente do tribunal local, depois do reexame pelo órgão
de origem e independentemente de ratificação do recurso, determinar a remessa do recurso ao Supremo
Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça para julgamento das demais questões, desde que positivo
o seu juízo de admissibilidade (art. 1.041, § 2.º, CPC).

12C. Cumprimento de sentença que reconhece exigibilidade de obrigação de fazer, não fazer e entregar
coisa. Tutela específica dos direitos. Execução de títulos extrajudiciais que impõem a entrega de coisa,
prestação de fazer ou de não fazer.

Caio Hideki Kusaba 16/09/18

O cumprimento de sentença é uma forma de execução dos títulos executivos judiciais, buscando
garantir ao requerente a satisfação de sua pretensão.

I. Cumprimento de sentença que reconhece exigibilidade de obrigação de fazer, não fazer

Diferentemente do cumprimento de sentença de obrigação de pagar quantia, neste caso o


cumprimento de sentença pode se dar por requerimento da parte ou de ofício (art. 536 do CPC/2015).

Como regra, no cumprimento de sentença de obrigação de fazer ou de não fazer, busca-se a tutela
específica, que é justamente esta obrigação de fazer ou não fazer. Exemplos de tutela específica são trazidos
no art. 536, § 1º, do CPC/2015:
Art. 523, § 1º Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar,
entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção
de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade
nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial.

Caso o executado descumpra injustificadamente a tutela fixada pelo juiz, ele incidirá nas penas de
litigância de má-fé e responderá por crime de desobediência (art. 536, § 3º).

Como se disse, neste procedimento busca-se, via de regra, a tutela específica ou equivalente.
Entretanto, existem casos em que a tutela específica pode ser convertida em prestação pecuniária. São
elas:
1. Vontade do exequente: o exequente pode preferir a prestação pecuniária no lugar da tutela
específica. Autores como ASSUMPÇÃO NEVES defendem que só pode haver a conversão da tutela específica
em perdas e danos no caso de direitos disponíveis;
2. Impossibilidade da obtenção da tutela específica ou equivalente: a impossibilidade pode ser
material (ex.: fisicamente impossível) ou jurídica (ex.: tutela específica violar norma do Direito);
3. Onerosidade excessiva: pode ser que a execução da tutela específica seja excessivamente onerosa
ao executado, podendo o juiz, com base nas regras de proporcionalidade e razoabilidade, convertê-la em
perdas e danos.

A mais famosa das medidas aplicáveis pelos juízes para satisfação da tutela específica é a multa
coercitiva (astreinte) (art. 537 do CPC/2015).

159
Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada
na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de
execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se
determine prazo razoável para cumprimento do preceito.

As astreintes têm natureza coercitiva, visando a realizar uma pressão psicológica para que a parte
cumpra sua obrigação. Em razão disso, seu valor é revertido em favor do exequente (art. 537, § 2º).

O valor da multa coercitiva deve ser fixado pelo juiz de acordo com o caso concreto, devendo ser
suficiente e compatível com a obrigação que se busca forçar o executado a cumprir. Uma vez fixada as
astreintes, ela pode ser modificada ou excluída pelo magistrado, dependendo do surgimento de fatos
supervenientes:
1. se tornou insuficiente ou excessiva;
2. o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o
descumprimento.

A multa coercitiva é passível de cumprimento provisório, mas o valor depositado a título de multa
coercitiva só pode ser levantado após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte beneficiária da
multa (art. 537, § 3º).
Obs.: a fixação de astreintes é possível mesmo que contra a Fazenda Pública.

Por fim, para sua defesa o executado pode apresentar impugnação no cumprimento de sentença de
obrigação de fazer ou de não fazer (art. 536, § 4º, do CPC/2015).

II. Cumprimento de sentença que reconhece exigibilidade de entregar coisa

O CPC/2015 não traz um procedimento específico, devendo ser aplicado, no que couber, os
procedimentos do cumprimento de sentença de obrigação de fazer ou de não fazer (art. 538, § 3º, do
CPC/2015). Ex.: conversão em perdas e danos e fixação de multa coercitiva.

Tratando-se de obrigação de entregar coisa incerta, deve-se distinguir duas situações (art. 498, p.ú.,
do CPC/2015):
1. Escolha cabe ao credor: o exequente deve apresentar uma petição individualizando qual o bem de
sua escolha;
2. Escolha cabe ao devedor: o executado deverá entregar o bem individualizado ao exequente. Não
basta ao devedor apenas indicar o bem, deve também entregá-lo, sob pena de o direito de escolha passar ao
credor.

O juiz deve estipular um prazo para entrega da coisa pretendida. Não entregue a coisa dentro do
prazo estabelecido pelo juiz, este expedirá mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse em favor
do credor, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel (art. 538 do CPC/2015).
Obs.1: as medidas previstas no art. 538 não impedem que o juiz se valha de outras medidas, como a
estipulação de astreintes.
Obs.2: a existência de benfeitorias e o direito de retenção por elas devem ser alegados pelo
executado em sua contestação, na fase de conhecimento (art. 538, §§ 1º e 2º, do CPC/2015).

III. Execução de títulos extrajudiciais que impõem a entrega de coisa

O executado é citado para cumprir a obrigação no prazo de 15 dias (art. 806), mesmo prazo que tem
para oferecer embargos. Diante disso, o executado pode adotar três posturas distintas:
1. Oferecer embargos: junto à apresentação dos embargos, o executado pode oferecer a coisa em
depósito, condição necessário para a atribuição de efeito suspensivo aos embargos;
2. Entregar a coisa: o exequente deve ser intimado para se manifestar quanto à coisa ofertada pelo
executado. Caso concorde com o bem oferecido, o processo é extinto, após o pagamento das custas e
honorários;
160
3. Não entregar a coisa: mantendo-se o estado de inadimplência, o juiz poderá dar início à prática
dos atos executivos, o que inclui a cobrança de astreintes – que podem ser fixadas desde o despacho da
petição (art. 806, § 1º), mas só incidem após o prazo de 15 dias transcorridos –, bem como a expedição de
mandado de busca e apreensão – bem móvel – ou de imissão na posse – bem imóvel.

Bem em Poder de Terceiro: na hipótese de a coisa devida estar no patrimônio de terceiro e de ter
sido desviada de forma fraudulenta, será ali buscada, sendo que o terceiro que a adquiriu somente será
ouvido pelo juízo depois de depositá-la em juízo. Obs.: o terceiro poderá defender seu interesse por meio de
embargos de terceiro.

Caso o exequente entenda que a execução deixou de ser interessante em razão de a coisa estar no
patrimônio de terceiro, poderá converter a execução de entrega de coisa em execução de pagar quantia
certa.

Impossibilidade de Obtenção da Coisa: é possível que o bem não seja localizado, tendo se
deteriorado ou desaparecido, além de não ser reclamado do poder do terceiro adquirente, situações que
ensejaram a conversão da execução para entrega de coisa em execução por quantia certa para cobrança do
valor da coisa, além de perdas e danos e eventual astreintes.

Benfeitorias: havendo benfeitorias indenizáveis feitas na coisa pelo executado ou por terceiros de
cujo poder ela houver sido tirada, a liquidação prévia é obrigatória. Dois podem ser os resultados da
liquidação (art. 810):
1. Saldo em favor do executado: o exequente depositará o valor ao requerer a entrega da coisa;
2. Saldo em favor do exequente: este poderá cobrá-lo nos autos do mesmo processo.

Não havendo tal liquidação prévia, é possível ao executado suspender a execução por meio da
interposição de embargos à execução (art. 917, IV).

Execução de Entrega de Coisa Incerta: o procedimento de individualização da coisa deverá ocorrer


no início do processo executivo. Após a escolha, a coisa passa a ser certa e o procedimento seguirá as regras
acima. A escolha pode caber:
1. Ao exequente: deverá individualizar o bem já na petição inicial, sob pena de a escolha passar ao
executado. Se o executado também não individualizar a coisa, o direito de escolha volta ao exequente;
2. Ao executado: é citado para entregar ou depositar a coisa individualizada em 10 dias. O executado
poderá, ainda, apenas indicar o bem escolhido, sem entregá-lo ou depositá-lo, situação na qual a execução
prosseguirá pelo rito visto acima. Se o executado não fizer a escolha, ela passará a ser do exequente.

Qualquer das partes pode impugnar, no prazo de 15 dias, a escolha feita pela outra parte, e o juiz
decidirá de plano, ou, se necessário, ouvindo perito de sua nomeação.

IV. Execução de títulos extrajudiciais que impõem prestação de fazer ou de não fazer

Trata-se de forma de execução na qual se exige um comportamento do devedor, consubstanciado


num fazer ou não fazer. A natureza da obrigação influencia nas opções disponíveis ao juiz para a satisfação
do direito diante da crise de inadimplemento:
1. Obrigação fungível: como a obrigação pode ser satisfeita por outros sujeitos além do devedor, há
uma maior gama de opções ao juiz, que podem ser:
A. Aplicar as astreintes (art. 814);
B. Determinar a realização da obrigação por terceiro (arts. 816 e 817);
C. Determinar a realização da obrigação pelo próprio exequente ou sob a sua supervisão (art.
816);
2. Obrigação infungível: por só poder ser satisfeita pelo devedor, em razão de suas qualidades
pessoais únicas, só existe como forma procedimental de busca da satisfação do direito do credor a aplicação
das astreintes ou de outras formas de pressão psicológica.

161
IV.I. Execução de Obrigação de Fazer

O executado é citado para cumprir a obrigação no prazo fixado no título executivo. Na ausência de
indicação de prazo, caberá ao juiz tal fixação, devendo levar em consideração a complexidade do ato a ser
praticado (art. 815).

Já nesse momento inicial pode o juiz fixar multa por período de atraso no cumprimento da
obrigação ainda que tal providência não tenha sido requerida pelo exequente (art. 814). Inclusive, pode o
magistrado fixar outros meios coativos diversos das astreintes. Obs.: segundo entendimento do STJ, a multa
só passa a ser eficaz após a intimação pessoal do executado.

Opções do Executado: citado o executado, este tem três opções:


1. Embargar a execução em 15 dias;
2. Cumprir a obrigação no prazo fixado pelo título ou pelo juiz;
3. Permanecer inerte, sem embargar nem cumprir a obrigação.

Opções do Exequente Diante do Não Cumprimento da Obrigação: tratando-se de obrigação


infungível, resta ao exequente apenas a conversão da execução de fazer em execução por quantia certa,
sendo feita a liquidação nos próprios autos. Após, procede-se para a execução pelo procedimento do
cumprimento de sentença.

Por outro lado, sendo a obrigação fungível, além da conversão em perdas e danos, pode o
exequente:
1. Requerer a satisfação da obrigação por terceiro, à custa do executado.
2. Cumprir a obrigação pessoalmente ou por preposto, sob sua direção e vigilância.

IV.II. Execução de Obrigação de Não Fazer

A execução de obrigação de não fazer, na verdade, é uma obrigação de desfazer o fato feito pelo
devedor, ou de ser indenizado quando os efeitos forem irremediáveis. A obrigação de não fazer pode ser de
dois tipos:
1. Permanente ou contínua: permite o retorno ao estado anterior (ex.: construção de um muro, que
pode ser destruído, retornando-se as coisas ao estado anterior). Neste caso, havendo recusa ou mora do
devedor, o exequente poderá requerer ao juiz que mande desfazer o ato à custa daquele;
2. Instantânea: é impossível o retorno ao status quo ante uma vez descumprida a obrigação de não
fazer (ex.: obrigação de não exibir um jogo de futebol em rede nacional). Como é impossível o desfazimento
do ato, resta apenas a conversão em perdas e danos.

13A. O direito fundamental de defesa. Devido processo legal. Cognição judicial. Convicção judicial e
fundamentação das decisões

Rafael Rodrigues Veloso

01) O DIREITO FUNDAMENTAL DE DEFESA DIANTE DO DIREITO FUNDAMENTAL DE AÇÃO:


01.1) PRIMEIRAS CONSIDERAÇÕES:

I) OS DIREITOS FUNDAMENTAIS PODEM SER OBJETO DE CONFRONTAÇÃO NO CASO CONCRETO (COLISÃO):


isso requer a adoção de métodos de solução de antinomias concretas, contingentes e externas, que
normalmente são expressos através dos postulados da concordância prática, da ponderação, da
proporcionalidade e da razoabilidade.

II) NOTE -SE, CONTUDO, QUE OS DIREITOS DE AÇÃO E DE DEFESA, EM RAZÃO DA SUA NATUREZA
PROCESSUAL, TÊM UMA EVIDENTE PECULIARIDADE EM RELAÇÃO AOS DEMAIS DIREITOS FUNDAMENTAIS:

162
II.a) LIMITAÇÃO FEITA PELO LEGISLADOR: muitas vezes, quando se supõe um conflito entres os direitos de
ação e de defesa, o juiz está apenas diante da necessidade de considerar os direitos em litígio, concretizando
uma limitação feita pelo legislador ao direito de defesa;

II.b) LIMITAÇÃO COMO DIREITO DE DEFESA A NÃO TER A ESFERA JURÍDICA INVADIDA POR MEIOS DE
EXECUÇÃO NÃO TIPIFICADOS NA LEI: por outro lado, quando o legislador, a partir do direito fundamental à
tutela jurisdicional efetiva, dá ao juiz poder para determinar a modalidade executiva adequada ao caso
concreto (arts. 139, IV, e 497, 498, 536, 537 e 538 do CPC e 84 do CDC), a única forma de se conceber alguma
restrição é compreendendo -se a defesa como o direito de não ter a esfera jurídica invadida por meios de
execução não tipificados na lei.

III) O QUE HÁ, PORTANTO, DIANTE DE UM SISTEMA DE FORMAS EXECUTIVAS EM QUE SE MISTURAM
TÉCNICAS PROCESSUAIS TÍPICAS E ATÍPICAS NÃO É PROPRIAMENTE UMA RESTRIÇÃO: mas uma instância de
controle baseado na regra da menor restrição possível – que de seu turno está legitimada em nome do
direito de defesa.

IV) MESMO QUANDO O JUIZ SUPRE A OMISSÃO DE LEI COM BASE NO DIREITO FUNDAMENTAL DE AÇÃO,
ISSO NÃO QUER DIZER QUE ESTEJA LIMITANDO O DIREITO DE DEFESA. O juiz, mesmo na ausência de lei,
sempre deve raciocinar sobre os direitos de ação e de defesa a partir da natureza da tutela do direito. O juiz
não supre a omissão legal apenas com base no direito de ação, pois para individualizar a própria omissão
deve se fundar na tutela do direito pretendida pelo autor, para somente depois concluir que a omissão de lei
atenta contra o direito fundamental de ação. Ou seja, a admissão de omissão violadora do direito
fundamental de ação deve se apoiar nas necessidades de tutela do direito material.

V) O JUIZ AO CONCRETIZAR UMA NORMA PROCESSUAL ABERTA CONSIDERA: A TUTELA DO DIREITO DO


AUTOR + ADEQUAÇÃO E NECESSIDADE EM FACE DO DIREITO DE DEFESA: o que poderia preocupar, nessas
duas situações, é o fato de que o juiz, ao concretizar a norma processual aberta e ao suprir a falta de técnica
processual adequada, considera a tutela do direito almejada pelo autor. Acontece que o juiz, ao atentar para
as necessidades do autor, não pode se esquecer das regras da adequação e da necessidade, e assim do
direito de defesa inerente ao seu exame

01.2) AS RELAÇÕES ENTRE OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DE DEFESA E DE AÇÃO NA PERSPECTIVA DO


LEGISLADOR:

I) PRESSUPOSTO: A necessidade de efetividade do direito buscada por intermédio do direito de ação pode
impor a limitação do direito de defesa.

II) É SABIDO QUE OS DIREITOS FUNDAMENTAIS SE RELACIONAM COM NORMAS RESTRITIVAS E NORMAS
CONFORMADORAS: As primeiras restringem ou limitam posições que, em princípio, estão inseridas no
âmbito de proteção do direito, ao passo que as normas conformadoras, ao contrário, têm o objetivo de
densificar e concretizar o direito fundamental.

III) AS NORMAS RESTRITIVAS: são admitidas não apenas quando as normas constitucionais expressamente as
autorizam – mediante expressões como “na forma da lei”, “nos termos da lei” etc. –, mas também quando o

163
direito fundamental entra em choque com outros direitos fundamentais, existindo aí uma “restrição
imanente”, recomendada pela necessidade de harmonização entre os direitos fundamentais.

IV) A NORMA RESTRITIVA, EMBORA POSSA AFETAR UMA POSIÇÃO JURÍDICA SITUADA NO “ÂMBITO DE
PROTEÇÃO” DO DIREITO FUNDAMENTAL, NÃO PODE VIOLAR O SEU “NÚCLEO ESSENCIAL”. Nem toda norma
conformadora do direito de ação – como é óbvio – causa restrição ao direito de defesa. Porém, algumas
normas, instituídas em benefício do direito de ação, inegavelmente limitam o direito de defesa.

V) ADMITE -SE A AFETAÇÃO DE POSIÇÕES JURÍDICAS SITUADAS NO “ÂMBITO DE PROTEÇÃO” DO DIREITO DE


DEFESA DESDE QUE FUNDAMENTADA NO DIREITO FUNDAMENTAL DE AÇÃO: É o que ocorre, por exemplo,
na hipótese de antecipação da tutela. Se um direito, em razão das particularidades da situação concreta,
necessita de pronta tutela jurisdicional para não sofrer prejuízo irreparável ou de difícil reparação, é racional
e legítimo admitir, diante da probabilidade do direito afirmado pelo autor, a concessão da tutela jurisdicional
antes de se dar ao réu a oportunidade para o pleno exercício do seu direito de defesa (art. 9.º, parágrafo
único, I).

VI) EFEITOS DA COISA JULGADA x EFEITOS DA ESTABILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA: Deixe -se claro que a
coisa julgada ou os efeitos de uma sentença que produziu coisa julgada não podem atingir a esfera jurídica
do réu antes de lhe ser dada oportunidade para o pleno exercício do direito de defesa. Retirar do réu a
oportunidade de defesa, deixando -o subordinado aos efeitos de uma decisão não mais passível de discussão
(porque marcada pela coisa julgada), significa violação do núcleo essencial do direito fundamental de defesa.
Daí a razão pela qual, a propósito, qualquer interpretação da estabilização dos efeitos da antecipação da
tutela que visualize na decisão provisória fundada em cognição sumária vocação à formação de uma
estabilidade semelhante à coisa julgada é inquestionavelmente inconstitucional (art. 304 do novo Código, e
5.º, LV, da CF/1988).

VII) POSSIBILIDADE DE LIMITAÇÕES JUSFUNDAMENTADAS AO DIREITO DE DEFESA: Contudo, as posições


jurídicas contidas no âmbito de proteção do direito fundamental de defesa – como, por exemplo, a de ser
informado e de ter a oportunidade de reagir diante de qualquer ato praticado pelo autor ou pelo juiz –
podem ser restringidas em razão de necessidades advindas do direito fundamental de ação. Não há dúvida
de que o direito fundamental de defesa admite limitações jusfundamentadas.

VIII) EXEMPLOS: a) TUTELA ANTECIPADA: assim, não há qualquer violação ao núcleo essencial do direito de
defesa quando se postecipa, para momento posterior ao da concessão da tutela, a plenitude do exercício do
direito de defesa (art. 9.º, parágrafo único, I). b) POSSIBILIDADE DE EXECUÇÃO PROVISÓRIA: execução
imediata na pendência dos recursos especial e extraordinário (art. 995), os quais devem ser recebidos apenas
no efeito devolutivo. O direito de ação, que evidentemente se liga ao direito fundamental à duração razoável
do processo (arts. 5.º, LXXVIII, da CF/1988, e 4.º), justifica a execução da condenação na pendência da
apelação e dos recursos especial e extraordinário, pois tais recursos visam a contrastar cognição exauriente
sobre a causa já realizada por outro órgão jurisdicional.

01.3) AS RELAÇÕES ENTRE OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DE DEFESA E DE AÇÃO NA PERSPECTIVA DO JUIZ:

I) A NECESSIDADE DE CONCRETIZAR UMA PONDERAÇÃO JÁ FEITA PELO LEGISLADOR ESTÁ PRESENTE,


EMBORA NÃO SEJA PERCEBIDA, DIANTE DA TUTELA ANTECIPATÓRIA: É frequente se dizer que o juiz, ao
decidir sobre um pedido de antecipação da tutela, faz uma ponderação entre os direitos de ação e de defesa.
Ninguém discute que a técnica antecipatória admite a postergação do exercício da plenitude do direito de
defesa para a efetividade do direito de ação. Acontece que essa ponderação foi feita pelo próprio legislador,
ao instituir os arts. 294 e ss.

164
II) O JUIZ NÃO FAZ QUALQUER PONDERAÇÃO ENTRE O DIREITO DE AÇÃO E O DIREITO DE DEFESA QUANDO
DECIDE SOBRE A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA: em primeiro lugar, porque não há como conceber uma
ponderação judicial entre direito de ação e direito de defesa; em segundo lugar, porque a ponderação que
outorga fundamento à antecipação da tutela tem sede legislativa. O art. 300 ao admitir a antecipação da
tutela com base na urgência, afirma expressa e claramente que isso é possível quando a alegação do autor
for provável, o que significa dizer que o legislador admitiu a limitação do direito de defesa para a efetividade
do direito de ação, obrigando o juiz a assim proceder quando o direito do autor, apresentando -se submetido
a fundado receio de perigo, for mais provável que o do réu.

III) PERCEBA -SE QUE, NESSA HIPÓTESE, O LEGISLADOR NÃO DEIXOU AO JUIZ QUALQUER MARGEM PARA
PONDERAÇÃO: O legislador, ao admitir a antecipação da tutela, já ponderou o que havia a ser ponderado
nessa circunstância.

IV) EM OUTRO CASO, O LEGISLADOR, PARA PERMITIR A EFETIVIDADE DO DIREITO DE AÇÃO, OUTORGA AO
JUIZ O PODER DE DETERMINAR A MODALIDADE EXECUTIVA ADEQUADA À TUTELA DO DIREITO, CONFORME
AS NECESSIDADES DO CASO CONCRETO: o art. 536 diz que, para a efetivação da tutela específica ou a
obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, “determinar as
medidas necessárias, tais como (...)”. Tal norma representa uma expressa opção pela efetividade do direito
de ação diante da tipicidade da técnica executiva e, em determina perspectiva, do direito de defesa. A ideia
de que somente podem ser admitidos os meios executivos tipificados na lei – fundadora do princípio da
tipicidade dos meios de execução – deriva da necessidade de garantir a liberdade do litigante e, nesse
sentido, o direito de defesa contra a possibilidade de arbítrio do juiz. A norma do art. 381 ao conferir ao juiz
tal poder, não lhe deixa margem para limitar o direito de defesa em face do direito de ação ou para aplicar a
regra da proporcionalidade em sentido estrito. A norma já ponderou o que havia para ser ponderado,
optando por dar ao juiz o poder de agir de acordo com as necessidades concretas. Ou seja, para determinar o
meio executivo idôneo – e assim para concretizar o direito fundamental de ação –, o juiz deve
necessariamente considerar a natureza da tutela do direito. Porém, a concretização do direito de ação, como
é óbvio, não pode esquecer o réu, razão pela qual o meio executivo deve significar a melhor escolha diante
do direito de defesa (direito do réu a não sofrer interferências arbitrárias na sua esfera jurídica particular).

V) OUTRO EXEMPLO TRABALHADO PELO EXAMINADOR = A INADMISSIBILIDADE DAS PROVAS OBTIDAS POR
MEIOS ILÍCITOS: (pondera os direitos da personalidade x busca da verdade em âmbito processual. Mas há
exceções, com base na ponderação). No processo civil, o uso da prova prima facie ilícita pode ser admitido,
segundo a lógica da regra da proporcionalidade em sentido estrito, conforme as circunstâncias do caso
concreto. Deixe -se claro, porém, que nesse caso se está muito longe de ponderação entre direito de ação e
direito de defesa, ou mesmo entre direito à descoberta da verdade (ou de produzir prova) e direito de não
ter a esfera jurídica atingida pelos efeitos de prova obtida por meio ilícito. A ponderação deverá ocorrer
entre o direito fundamental objeto de tutela e o direito fundamental violado com a obtenção da prova.

02) DEVIDO PROCESSO LEGAL: O PROCESSO NA PERSPECTIVA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. O DIREITO
FUNDAMENTAL AO PROCESSO JUSTO E SUA DENSIFICAÇÃO CONSTITUCIONAL:

02.1) PRIMEIRAS CONSIDERAÇÕES:

I) O PROCESSO NÃO PODE MAIS SER VISTO COMO UMA RELAÇÃO JURÍDICA PROCESSUAL: Aliás, não importa
nem mesmo saber se realmente existe uma relação jurídica processual. É que a sua existência revelaria
apenas o aspecto interno do processo, dando ainda a equivocada ideia de que o processo seria algo
simplesmente estático, quando o que importa diante do estágio que o direito processual atingiu no Estado
Constitucional é sublinhar não só o seu aspecto interno, mas a sua percepção sob um ângulo externo,

165
compreendido no quadro maior das funções de tutela aos direitos do Estado, realçando –se ainda o seu perfil
dinâmico, inerente à temporalidade que caracteriza o conceito de processo e de procedimento.

II) É EVIDENTE QUE HÁ ALGUMA RELAÇÃO ENTRE AS PARTES E O JUIZ: pouco importando se existe uma única
relação que se desenvolve ou várias relações ou se essas relações decorrem de situações jurídicas ou de uma
única situação jurídica. Essa questão possuía relevo há quase cento e cinquenta anos, época em que os
doutrinadores se preocuparam em elaborar o que acontecia no plano da aplicação do direito ou do direito
processual a partir da formulação de conceitos gerais -abstratos, como o da relação jurídica.

III) É INDISCUTÍVEL QUE A JURISDIÇÃO, POR CONSTITUIR MANIFESTAÇÃO DO PODER ESTATAL, DEVE
REVELAR OS FINS DO ESTADO CONSTITUCIONAL: Portanto, se a jurisdição atua por meio do processo, não há
como negar a importância dos fins do processo. Alguém diria que, nesse caso, não se estaria falando dos fins
do processo, mas sim dos fins da jurisdição. Acontece que a jurisdição realiza os seus fins através do
processo. Além disso, atribuir esses fins ao processo revela uma visão não unilateral do problema, na medida
em que coloca o foco não em apenas um dos seus participantes, isto é, no juiz, com o que se privilegia uma
perspectiva pluralista na sua consideração – vale dizer, que considera o processo como algo ligado não só da
jurisdição, mas também da ação e da defesa. Deixar de relacionar o processo com os fins da jurisdição
somente teria cabimento caso fosse ele visto em uma dimensão interna e não externa, ou melhor, caso o
processo fosse compreendido isento dos seus fins e independentemente dos objetivos da jurisdição.

IV) O PROCESSO NÃO PODE SER ALHEIO AO SEU PRODUTO, ISTO É, À LEGITIMIDADE DA DECISÃO: O processo
deve produzir decisões legítimas e justas, ou seja, decisões adequadas aos direitos fundamentais, além de
formar precedentes capazes de orientar o Poder Judiciário e à sociedade civil como um todo. Nem se diga
que o processo apenas prepara a decisão e por isso nada tem a ver com a sua legitimidade. Essa forma de
pensar faria com que a legitimidade da decisão fosse absorvida pela legitimação da jurisdição pelo
procedimento, na linha de Luhmann. Ao se admitir essa última ideia, não importaria a legitimidade da
decisão, mas apenas a legitimidade do procedimento, uma vez que apenas essa seria suficiente para
legitimar a decisão.

V) PORÉM, NÃO BASTA UM PROCEDIMENTO LEGÍTIMO. NO ESTADO CONSTITUCIONAL, A JURISDIÇÃO


REALIZA OS SEUS FINS APENAS QUANDO A ORDEM JURÍDICA É RACIONALMENTE INTERPRETADA E APLICADA
NA DIMENSÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS:

VI) O PROCEDIMENTO COMO GARANTIA DE PARTICIPAÇÃO: Exatamente porque o processo deve ser visto
em uma dimensão externa, de atuação dos fins do Estado, é que ele deve se desenvolver de modo a
propiciar a efetiva participação de todos os seus participantes – do juiz e das partes (arts. 6.º, 7.º, 9.º, 10 e
11). Um procedimento que não permite a efetiva participação das partes não tem qualquer condição de
legitimar o exercício da jurisdição e a realização dos seus fins. Na verdade, um procedimento incapaz de
atender ao direito de participação daqueles que são atingidos pelos efeitos da decisão está longe de espelhar
a ideia de democracia, pressuposto indispensável para a legitimidade do poder.

VII) O PROCEDIMENTO, VISTO COMO GARANTIA DE PARTICIPAÇÃO DAS PARTES, RELACIONA -SE COM O
“DEVIDO PROCESSO LEGAL” (OBVIAMENTE AQUI COMPREENDIDO EM SENTIDO PROCESSUAL, ART. 5.º, LIV,
CF/1988): Somente é o “devido processo legal” o procedimento que obedece aos direitos fundamentais
processuais insculpidas na Constituição, tais como o contraditório, a imparcialidade do juiz, a publicidade e a
motivação. A observância do “devido processo legal” – ou, mais propriamente, do direito ao “processo justo”
– legitima o exercício da jurisdição e, de outro ângulo, constitui garantia das partes diante do poder estatal.

VIII) PORÉM, O PROCEDIMENTO TAMBÉM DEVE SER IDÔNEO ÀS NECESSIDADES DE TUTELA DOS DIREITOS,
ALÉM DE RESPEITAR, EM SUA CONFORMAÇÃO, AS NECESSIDADES EVIDENCIADAS PELOS DIREITOS
ALEGADOS EM JUÍZO: Ou seja, o procedimento não pode ser tecnicamente inidôneo às tutelas prometidas
pelo direito material – deixando de prever, por exemplo, meio executivo adequado – ou negar, em seu
próprio desenho legal, os direitos fundamentais materiais – retirando do réu, por exemplo, o direito de

166
discutir as cláusulas contratuais, cujo inadimplemento é pressuposto para o autor obter o bem que está na
posse do demandado.

IX) ALÉM DISSO, O PROCEDIMENTO DEVE SER CAPAZ DE PERMITIR O ACESSO DO MAIS POBRE AO PODER
JUDICIÁRIO, TENDO IMPORTÂNCIA PARA VIABILIZAR A UNIVERSALIDADE DE ACESSO À JUSTIÇA. Daí a
importância, mais uma vez, da diferenciação dos procedimentos. O procedimento não deve se diferenciar
apenas para atender às diferentes necessidades de tutela dos direitos, mas também para permitir o acesso
das populações economicamente menos privilegiadas ao Poder Judiciário. Um processo que não garante a
todos, independentemente das suas posições financeiras, o acesso à justiça possui um déficit de
legitimidade.

X) DE OUTRA PARTE, O PROCEDIMENTO TAMBÉM PODE SER VISTO COMO VERDADEIRO CANAL PARA A
PARTICIPAÇÃO POPULAR NO PODER E NA SOCIEDADE, CONCRETIZANDO OS IDEAIS DA DEMOCRACIA
PARTICIPATIVA. É quando se pensa na ação popular e nas ações coletivas, as quais podem ser compreendidas
como condutos para a participação do cidadão na gestão da coisa pública (ação popular) e para a
participação, ainda que mediante entes legitimados – por exemplo, uma associação de defesa do meio
ambiente –, na reivindicação de concretização e de proteção dos direitos fundamentais (ações coletivas).
Nesse sentido o procedimento atende ao direito de participação reclamado pelos direitos fundamentais. Isso
tudo demonstra a importância do procedimento, revelando as várias formas e fins que ele deve assumir
diante do exercício da jurisdição no Estado Constitucional. As formas e os fins do procedimento dão
significado ao processo, tornando inseparável um e outro. Não há como, nem por que, separar a noção de
procedimento da de processo, uma vez que o procedimento que revela os propósitos do Estado
Constitucional nada mais é do que o processo jurisdicional do Estado contemporâneo.

02.2) O DIREITO FUNDAMENTAL AO PROCESSO JUSTO. DO DEVIDO PROCESSO LEGAL AO PROCESSO JUSTO:

02.2.1) NOÇÕES GERAIS:

I) O DEVIDO PROCESSO LEGAL E A INSPIRAÇÃO ESTADUNIDENSE: Nossa Constituição refere que “ninguém
será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal” (art. 5.º, LIV). Com isso, institui o
direito fundamental ao processo justo no direito brasileiro. Embora de inspiração estadunidense notória,
sendo nítida a sua ligação com a V e a XIV Emendas à Constituição dos Estados Unidos da América, certo é
que se trata de norma presente hoje nas principais constituições ocidentais, consagrada igualmente no plano
internacional na Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948, arts. 8.º e 10), na Convenção Europeia
dos Direitos do Homem (1950, art. 6.º), no Pacto Internacional relativo aos Direitos Civis e Políticos (1966,
art. 14) e na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969, art. 8.º). O direito ao fair trial, não por
acaso, constitui a maior contribuição do Common Law para a civilidade do direito e hoje certamente
representa o novo jus commune em matéria processual.

II) O DIREITO AO PROCESSO JUSTO CONSTITUI PRINCÍPIO FUNDAMENTAL PARA ORGANIZAÇÃO DO


PROCESSO NO ESTADO CONSTITUCIONAL: É o modelo mínimo de atuação processual do Estado e mesmo dos
particulares em determinadas situações substanciais. A sua observação é condição necessária e indispensável
para obtenção de decisões justas e para a formação de precedentes.

III) A CONSTITUIÇÃO FALA EM DEVIDO PROCESSO LEGAL (DUE PROCESS OF LAW). A EXPRESSÃO É CRITICÁVEL
NO MÍNIMO EM DUAS FRENTES. Em primeiro lugar, porque remete ao contexto cultural do Estado de Direito
(Rechtsstaat, État Légal), em que o processo era concebido unicamente como um anteparo ao arbítrio
estatal, ao passo que hoje o Estado Constitucional (Verfassungsstaat, État de Droit) tem por missão colaborar
na realização da tutela efetiva dos direitos mediante a organização de um processo justo. Em segundo lugar,
porque dá azo a que se procure, por conta da tradição estadunidense em que colhida, uma dimensão
substancial à previsão (substantive due process of law), quando inexiste necessidade de pensá -la para além
de sua dimensão processual no direito brasileiro. Daí a razão pela qual prefere a doutrina falar em direito ao
processo justo (giusto processo, procès équitable, faires Verfahren, fair trial) – além de culturalmente

167
consentânea ao Estado Constitucional, essa desde logo revela o cariz puramente processual de seu
conteúdo.

IV) O DIREITO AO PROCESSO JUSTO É UM DIREITO DE NATUREZA PROCESSUAL: ele impõe deveres
organizacionais ao Estado na sua função legislativa, judiciária e executiva. É por essa razão que se enquadra
dentro da categoria dos direitos à organização e ao procedimento. A legislação infraconstitucional constitui
um meio de densificação do direito ao processo justo pelo legislador. É a forma pela qual esse cumpre com o
seu dever de organizar um processo idôneo à tutela dos direitos. As leis processuais não são nada mais nada
menos do que concretizações do direito ao processo justo. O mesmo se passa com a atuação do Executivo e
do Judiciário.

V) O DIREITO AO PROCESSO JUSTO VISA A ASSEGURAR A OBTENÇÃO DE UMA DECISÃO JUSTA PARA AS
PARTES E A UNIDADE DO DIREITO PARA A SOCIEDADE CIVIL: Ele é o meio pelo qual se exerce pretensão à
justiça (Justizanspruch) e pretensão à tutela jurídica (Rechtsschutzanspruch).18 Esse é o seu objetivo central
dentro do Estado Constitucional.

VI) DEFINIÇÃO ACERCA DO DIREITO AO PROCESSO JUSTO:

VI.a) NÃO É POSSÍVEL DEFINIR EM ABSTRATO: a cabal conformação do direito ao processo justo. Trata -se de
termo indeterminado. O direito ao processo justo constitui cláusula geral – a norma prevê um termo
indeterminado no seu suporte fático e não comina consequências jurídicas à sua violação.

VI.b) NO ENTANTO, É POSSÍVEL IDENTIFICAR UM “NÚCLEO FORTE INELIMINÁVEL”, UM “CONTEÚDO MÍNIMO


ESSENCIAL” sem o qual seguramente não se está diante de um processo justo. O direito ao processo justo
conta, pois, com um perfil mínimo.

VII) EXEMPLOS DESSE “CONTEÚDO MÍNIMO EXISTENCIAL”: a) o processo justo é pautado pela colaboração
do juiz para com as partes (cooperação e participação no NCPC); b) justa estruturação do processo (meio
objetivo de controle de justiça processual); c) o direito ao processo justo requer para sua concretização
efetiva adequação do processo ao direito material – adequação da tutela jurisdicional à tutela do direito
(tutela adequada dos direitos); d) o direito ao processo justo goza de eficácia vertical, horizontal e vertical
com repercussão lateral; e) Tem função integrativa, interpretativa, bloqueadora e otimizadora. Como
princípio, exige a realização de um estado ideal de proteção aos direitos, determinando a criação dos
elementos necessários à promoção do ideal de protetividade; etc.

VIII) CONCLUSÃO: a Constituição – o direito ao processo justo nela previsto – é o centro a partir do qual a
legislação infraconstitucional deve se estruturar. O direito ao processo justo exerce papel de centralidade na
compreensão da organização infraconstitucional do processo. É nele que se deve buscar a unidade na
conformação do processo no Estado Constitucional. Nessa linha, o novo Código de Processo Civil só pode ser
visto como concretização do direito ao processo justo.

02.2.2) DECORRÊCIAS LÓGICAS:

I) A DIVISÃO DO TRABALHO ENTRE O JUIZ E AS PARTES NO PROCESSO CIVIL E O DIREITO À COLABORAÇÃO NO


PROCESSO: colaboração como um princípio jurídico e com finalidade de organização de processo justo
idôneo a alcançar decisão justa, posições jurídicas equilibradas, partes colaborando, nova dimensão ao papel
do juiz na condução do processo;

II) DIREITO À IGUALDADE E À PARIDADE DE ARMAS: assegura-se às partes a paridade de tratamento em


relação ao exercício de direitos e faculdades processuais (7º, CPC) = aplicação uniforme da legislação
processual, inexistindo distinções arbitrárias. O direito à igualdade processual formal e material é o suporte
do direito à paridade de armas no processo, a fim de que ele seja considerado justo.

168
III) DIREITO AO CONTRADITÓRIO COMO DIREITO DE INFLUÊNCIA E DEERR DE DEBATE DO JUIZ. A VEDAÇÃO À
DECISÃO-SURPRESA: Na esteira do art. 5.º, LV, CF/1988, referem os arts. 9.º, caput, e 10, do novo Código:
“não se proferirá decisão contra uma das partes sem que esta seja previamente ouvida” e que “o juiz não
pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado
às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”.
Atualmente, porém, a doutrina tem identificado no direito ao contraditório muito mais do que simples
bilateralidade da instância. Ao binômio conhecimento -reação tem -se acrescentado a ideia de cabal
participação como núcleo -duro do direito ao contraditório.

IV) DIREITO FUNDAMENTAL À PROVA NO PROCESSO: Trata -se de elemento essencial à conformação do
direito ao processo justo.86 O direito à prova impõe que o legislador e o órgão jurisdicional atentem para: (i)
existência de relação teleológica entre prova e verdade; (ii) admissibilidade da prova e dos meios de prova;
(iii) distribuição adequada do ônus da prova; (iv) momento de produção da prova; e (v) valoração da prova.

V) DIREITO À PUBLICIDADE COMO ELEMENTO INDISPENSÁVEL À CONFORMAÇÃO DE UM PROCESSO JUSTO: A


publicidade é essencial ao princípio democrático e ao princípio do Estado de Direito. Tem assento, portanto,
nos dois corações políticos que movem o Estado Constitucional.100 Por essa razão, ainda que não fosse
prevista constitucionalmente de forma expressa, sua imprescindibilidade seria facilmente compreendida
como consequência necessária do caráter democrático da administração da justiça no Estado Constitucional.

VI) DIREITO À FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES. O DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO ANALÍTICA DO JUIZ E A SUA
CONEXÃO COM O DIREITO AO CONTRADITÓRIO COMO DIREITO DE INFLUÊNCIA: Nossa Constituição refere
que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as
decisões, sob pena de nulidade” (art. 93, IX). O novo CPC repete essa regra (art. 11), além de acrescentar que
“não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
(...) (489, §§ 1º e 2º). O dever de motivação das decisões judicial é inerente ao Estado Constitucional e
constitui verdadeiro banco de prova do direito ao contraditório das partes. normas sobre a justificação
judicial têm duas funções essenciais. A uma, elas possibilitam a construção de um discurso jurídico a respeito
da necessidade de justificação das decisões judiciais. Nesse espaço entra a teoria da motivação das decisões
como direito ligado ao processo justo das partes. O endereço desse discurso é o caso concreto. A duas,
viabilizam a organização de um discurso jurídico a respeito da teoria dos precedentes judiciais obrigatórios.
Trata -se de discurso ligado à unidade – prospectiva e retrospectiva – do Direito no Estado Constitucional,
cuja missão está em orientar condutas sociais e promover a igualdade, a segurança jurídica e a coerência do
sistema. É um discurso que não está ligado ao caso concreto, mas visa à promoção da unidade do Direito
como um todo, sendo necessariamente ultra partes.

VII) DIREITO À SEGURANÇA JURÍDICA NO PROCESSO: Nossa Constituição não prevê o direito à segurança
jurídica no processo. Também o novo Código silencia a respeito. Contudo, um dos fundamentos do Estado
Constitucional é a segurança jurídica.

02.2.3) O DIREITO À DECISÃO JUSTA E À FORMAÇÃO DO PRECEDENTE: A legitimidade da decisão e do


precedente a partir dos direitos fundamentais, a otimização da participação popular no procedimento e a
argumentação judicial.

169
02.2.4) A LEGITIMIDADE DO PROCEDIMENTO E A PARTICIPAÇÃO ATRAVÉS DO PROCEDIMENTO;

03) COGNIÇÃO JUDICIAL:

03.1) O CONVENCIMENTO JUDICIAL E A REGRA DO ÔNUS DA PROVA:

I) ÔNUS DA PROVA x VEROSSIMILHANÇA: Como é sabido, em casos excepcionais o juiz pode julgar fundado
na dificuldade da prova e nas particularidades do direito material com base em verossimilhança. Mas, por
enquanto, é oportuno tratar da questão relativa ao julgamento com base na regra do ônus da prova, ou mais
precisamente, da situação em que o juiz, por não ter se convencido de que o autor provou o fato
constitutivo, proferiu a sentença afirmando que a regra do ônus da prova não foi observada.

II) É CLARO QUE O JUIZ, QUANDO NÃO CONVENCIDO PELA PROVA DAS PARTES, PODE DETERMINAR PROVA
DE OFÍCIO: Acontece que essa possibilidade pode não ser suficiente para permitir a elucidação de todos os
casos concretos, especialmente porque, na maioria das vezes, não há outras provas a produzir ou o juiz
desconhece os meios de prova que efetivamente podem auxiliar.

III) EM ALGUNS CASOS, O JUIZ PODE ESTAR EM ESTADO DE DÚVIDA NO MOMENTO DE SENTENCIAR: Nessas
hipóteses, se a dificuldade da prova e as características do direito material em litígio não justificarem a
chamada “redução do módulo da prova” ou a modificação do ônus da prova, não resta outra saída ao juiz
senão julgar improcedente o pedido com base na regra do ônus da prova.

IV) PORTANTO, ALÉM DE SER FALSA A SUPOSIÇÃO DE QUE O JUIZ SEMPRE JULGA DEPOIS DE “TER
DESCOBERTO A VERDADE”, É IMPOSSÍVEL AFIRMAR QUE O JUIZ PODE DEIXAR DE JULGAR POR NÃO ESTAR
CONVENCIDO.

V) NÃO HÁ MAIS COMO SUPOR QUE A DECISÃO JURISDICIONAL ENCONTRE APENAS FUNDAMENTO NA
VERDADE ABSOLUTA: A convicção do juiz se faz a partir da argumentação e das provas trazidas ao processo,
inclusive as determinadas de ofício, o que gera uma verdade reconstruída a partir das narrativas formuladas
no processo. O que legitima a decisão jurisdicional é a orientação à verdade que deve nortear a atuação do
juiz e a devida participação das partes e do juiz, ou melhor, a observação das próprias regras que criam as
balizas para a reconstrução da verdade processual.

03.2) FUNDAMENTAÇÃO E PROVA: Nada obstante a valoração da prova seja livre pelo juiz, já que o direito
brasileiro adotou – e continua adotando, conquanto a supressão do adjetivo “livre”, tendo em conta que a
eventualidade de ter o juiz de escolher entre duas versões probatórias é ineliminável – a regra da valoração
racional da prova (art. 371), as razões que fundaram o seu convencimento a respeito da prova devem constar
da fundamentação da sentença. É por essa razão que se diz que o juiz tem de estar racionalmente
convencido das alegações de fato à luz do conjunto probatório. A aferição da racionalidade do
convencimento do juiz ocorre mediante a análise da fundamentação da sentença no que tange à prova.

04) CONVICÇÃO JUDICIAL E FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES:

04.1) FUNDAMENTAÇÃO E DIREITO. O DIREITO AO CONTRADITÓRIO COMO DIREITO DE INFLUÊNCIA E O


DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO ANALÍTICA COMO DEVER DE DIÁLOGO NO NOVO CPC: O novo Código
dedicou especial atenção à fundamentação da sentença no que tange à interpretação do direito. Tanto é
assim que, além de ligá -la diretamente ao direito ao contraditório, referiu expressamente o que entende por
uma decisão não fundamentada. Diz o art. 489, § 1.º, que “não se considera fundamentada qualquer decisão
judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: I – se limitar à indicação, à reprodução ou à
paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; II – empregar
conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência; III – invocar motivos
que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no

170
processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo juiz; V – se limitar a invocar precedente ou
enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob
julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou
precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a
superação do entendimento”. Na sequência, o § 2.º desse mesmo artigo refere que “no caso de colisão entre
normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões
que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão”.

Em outras palavras, para que uma decisão possa ser considerada como fundamentada à luz dos arts. 93, IX,
da CF, e 7.º, 9.º, 10, 11 e 489 do CPC, exige -se: i) a enunciação das escolhas desenvolvidas pelo órgão judicial
para, i.i) individualização das normas aplicáveis; i.ii) verificação das alegações de fato; i.iii) qualificação
jurídica do suporte fático; i.iv) consequências jurídicas decorrentes da qualificação jurídica do fato; ii) o
contexto dos nexos de implicação e coerência entre tais enunciados e iii) a justificação dos enunciados com
base em critérios que evidenciam ter a escolha do juiz ter sido racionalmente apropriada.

04.2) AS HIPÓTESES DO ART. 489, § 1º, DO CPC/2015. A VEDAÇÃO À DECISÃO GENÉRICA:

I) A NECESSIDADE DE INDIVIDUALIZAÇÃO DAS NORMAS APLICÁVEIS REPELE A POSSIBILIDADE DE O JUIZ SE


LIMITAR À INDICAÇÃO, À REPRODUÇÃO OU À PARÁFRASE (AQUI ENTENDIDA COMO SIMPLES
REELABORAÇÃO DO TEXTO LEGAL COM OUTRAS PALAVRAS) DE ATO NORMATIVO (ART. 489, § 1.º, I) : Isso
porque para a individualização das normas aplicáveis é preciso em primeiro lugar explicar as razões pelas
quais as normas aplicadas servem para solução do caso concreto: isto é, é preciso mostrar por quais motivos
as normas devem ser aplicadas.

II) SE ISSO É VERDADE, É CLARO QUE A SIMPLES TRANSCRIÇÃO DO TEXTO LEGAL: – sem qualquer menção ao
caso concreto – não serve para individualização do direito que deve ser aplicado.

III) A MESMA OBSERVAÇÃO VALE PARA OS CASOS EM QUE O DEBATE DO CASO CONCRETO ENVOLVE A
CONCRETIZAÇÃO DE TERMOS VAGOS (art. 489, § 1.º, II, presentes, por exemplo, nos conceitos jurídicos
indeterminados e nas cláusulas gerais): Se não se outorga sentido ao termo vago e não se mostra a razão
pela qual esse pertine ao caso concreto, a indeterminação normativa do texto impede que se tenha por
individualizada a norma que será aplicada para solução da questão debatida entre as partes.

IV) DO MESMO MODO, TAMBÉM SÃO PROBLEMAS LIGADOS À: ausência de identificação das normas
aplicáveis ao caso concreto aqueles oriundos da invocação de precedente sem a devida justificação da
identidade ou semelhança entre os casos (art. 489, § 1.º, V) e da omissão de justificativa capaz de levar à
distinção entre o caso sentenciado e o caso invocado como precedente ou capaz de mostrar a superação do
precedente invocado pela parte, mas não aplicado (art. 489, § 1.º, VI).

V) SEMELHANTE VEDAÇÃO À DECISÃO GENÉRICA VALE PARA TODAS AS INSTÂNCIAS DO PODER JUDICIÁRIO .
Trata-se de dever que decorre da Constituição (art. 93, IX). Isso quer dizer que a revogação do § 2.º do art.
1.029 e do § 5.º do art. 1.043 do CPC não tem o condão de dispensar os Ministros das Cortes Supremas do
dever de fundamentação analítica no que tange ao juízo de admissibilidade do recurso extraordinário, do
recurso especial e dos embargos de divergência.

04.3) AINDA AS HIPÓTESES DO ART. 489, § 1º, DO CPC/2015. O PRÉVIO DIÁLOGO NA DETERMINAÇÃO DA
INTERPRETAÇÃO E NA APLICAÇÃO DO DIREITO. A VEDAÇÃO À DECISÃO-SURPRESA: Ainda, o processo de
individualização das normas aplicáveis, dado que os arts. 9.º e 10 referem que “não se proferirá decisão
contra uma das partes sem que esta seja previamente ouvida” e que “o juiz não pode decidir, em grau algum
de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se
manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”, está condicionado a um prévio

171
diálogo entre o juiz e as partes a respeito da seleção do material que servirá à interpretação e à aplicação do
direito.97 Essa seleção, dimensionada a partir das manifestações das partes e eventualmente por indicações
do juiz (Hinweispflicht), cria a expectativa legítima para as partes de que a decisão será fundamentada
dentro da moldura delineada pelo debate processual. Essa expectativa legítima constitui manifestação do
direito à segurança jurídica no processo e veda a prolação de decisões -surpresas no processo (Verbot der
Überraschungsentscheidungen).98 Daí que a necessidade de efetivo diálogo entre o juiz e as partes, tendo
em conta o caráter lógico -argumentativo da interpretação do direito, repele que se possa considerar como
fundamentada uma decisão que invoca “motivos que se prestariam a justificar qualquer decisão” (art. 489, §
1.º, III) e que não enfrenta “todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a
conclusão adotada pelo julgador” (art. 489, § 1.º, IV). Se determinada decisão apresenta fundamentação que
serve para justificar qualquer decisão, é porque essa decisão não particulariza o caso concreto. A existência
de respostas padronizadas que servem indistintamente para qualquer caso justamente pela ausência de
referências às particularidades do caso demonstra a inexistência de consideração judicial pela demanda
proposta pela parte. Com fundamentação padrão, desligada de qualquer aspecto da causa, a parte não é
ouvida, porque o seu caso não é considerado.

04.4) A NECESSIDADE DE ANÁLISE DE TODOS OS FUNDAMENTOS DO PROCESSO E NÃO SÓ DAQUELES QUE


CONVERGEM PARA A DECISÃO: A decisão judicial deve conter o enfrentamento de “todos os argumentos
deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador” (art. 489, § 1.º, IV).
Esse dispositivo só pode ser compreendido adequadamente a partir dos novos contornos do direito ao
contraditório – que de seu turno só encontram apropriada justificação a partir da adoção de uma perspectiva
não cognitivista da interpretação judicial do direito. Ao tempo em que se entendia o contraditório como algo
tão-somente atinente às partes e, portanto, em sentido fraco (contraditório como bilateralidade da
instância), afirmava -se que o dever de motivação das decisões judiciais não poderia ter como parâmetro
para aferição de correção a atividade desenvolvida pelas partes em juízo. Bastava ao órgão jurisdicional, para
ter considerada como motivada sua decisão, demonstrar quais as razões que fundavam o dispositivo.
Bastava a não contradição entre as proposições constantes da sentença. Partia -se de um critério intrínseco
para aferição da completude do dever de motivação. Ocorre que entendimento dessa ordem encontra-se em
total descompasso com a nova visão a respeito do direito ao contraditório. Se contraditório significa direito
de influir (arts. 7.º, 9.º e 10), é pouco mais do que evidente que tem de ter como contrapartida dever de
debate – dever de consulta, de diálogo, de consideração. Como é de facílima intuição, não é possível aferir se
a influência foi efetiva se não há dever judicial de rebate aos fundamentos levantados pelas partes. Daí a
razão pela qual não basta o critério da não contradição: além de não ser contraditória, a fundamentação tem
a sua completude pautada também por um critério extrínseco – a consideração pelos argumentos
desenvolvidos pelas partes em suas manifestações processuais. É importante perceber, porém, que o art.
489, § 1.º, IV, não visa a fazer com que o juiz rebata todo e qualquer argumento invocado pelas partes no
processo. O Poder Judiciário tem o dever de dialogar com a parte a respeito dos argumentos capazes de
determinar por si só a procedência ou improcedência de um pedido – ou de determinar por si só o
conhecimento, não conhecimento, provimento ou desprovimento de um recurso. Isso quer dizer que todos
os demais argumentos só precisam ser considerados pelo juiz com o fim de demonstração de que não são
capazes de determinar conclusão diversa daquela adotada pelo julgador. Vale dizer: nem os juízes de
primeiro grau, nem os desembargadores das Cortes de Justiça (Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais
Federais) e nem os Ministros das Cortes Supremas (Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça)
têm o dever de rebater todos os argumentos deduzidos pelas partes. Há dever de debate apenas em
relação aos fundamentos relevantes, isto é, aqueles que são capazes de levar, por si só, a procedência ou
improcedência de um pedido ou ao não conhecimento, provimento ou desprovimento de um recurso. Esse é
o sentido com que têm de ser lidos, por exemplo, os arts. 489, § 1º, IV, e 1.038, § 3.º, CPC.

04.5) O ART. 489, § 2º, DO CPC/2015

172
I) EXEMPLIFICA COMO A FUNDAMENTAÇÃO DEVE SE DAR EM SEMELHANTES HIPÓTESES VALENDO -SE DO
POSTULADO DA PONDERAÇÃO – UMA NORMA SOBRE COMO APLICAR OUTRAS NORMAS (NORMAS DE
SEGUNDO GRAU OU METANORMAS). O legislador poderia ter exemplificado essa necessidade de justificação
racional das escolhas interpretativas aludindo a outros postulados direcionados à aplicação de outras
normas, como os postulados da proporcionalidade, da razoabilidade (mencionados no art. 8.º), da
concordância prática ou da proibição do excesso. Poderia ter exemplificado inclusive com textos que dão
lugar a normas de primeiro grau, que também dependem de escolhas racionais para adequada adscrição de
sentido normativo. Optou por fazê-lo em relação à ponderação. Para que se possa compreender o significado
do art. 489, § 2.º, é preciso em primeiro lugar entender a razão pela qual existem normas que são dirigidas à
estruturação da aplicação de outras normas. Em segundo lugar, é preciso fazer um acordo semântico a
respeito dos conceitos de ponderação, proporcionalidade e razoabilidade – para ficarmos com os exemplos
lembrados pelo próprio Código. Somente depois de assentadas essas premissas é que será possível esboçar
uma adequada interpretação desse dispositivo.

II) EXISTEM NORMAS QUE SÃO DESTINADAS A REGER O CASO CONCRETO, AO PASSO QUE EXISTEM NORMAS
QUE VISAM A VIABILIZAR A INTERPRETAÇÃO E A APLICAÇÃO DE OUTRAS NORMAS. No primeiro grupo
entram as normas de primeiro grau – destinadas à aplicação ao caso concreto: sobreprincípios, princípios e
regras. No segundo, as normas de segundo grau – destinadas à interpretação e aplicação de outras normas:
os postulados hermenêuticos e os postulados aplicativos. Como as normas de primeiro grau relacionam -se
entre si de diferentes maneiras, pode ocorrer de ser necessário guiar o processo de interpretação e aplicação
a partir de um determinado método. Esse é justamente o papel dos postulados: servir como meio de
estruturação metódica para interpretação e aplicação do direito.

III) O NOVO CÓDIGO MENCIONA EXPRESSAMENTE TRÊS POSTULADOS NORMATIVOS: proporcionalidade,


razoabilidade e ponderação. III.a) A proporcionalidade é um postulado que visa a estruturar a aplicação de
duas normas que se encontram em uma relação de meio e fim. O objetivo é preservar o máximo possível do
princípio da liberdade, restringindo -se a esfera jurídica de determinada pessoa apenas naquilo que for
necessário para consecução do fim que deve preponderar. A proporcionalidade exige o exame de três
diferentes elementos: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. III.b) A razoabilidade
é um postulado que visa a estruturar a aplicação de outras normas visando à harmonização e à vinculação à
realidade. O objetivo é preservar o máximo possível o princípio da igualdade. A razoabilidade pode ser
trabalhada em três acepções básicas: razoabilidade como equidade (em que a razoabilidade visa a resolver
um problema envolvendo uma relação entre o geral e o particular), como congruência e como equivalência.
III.c) A ponderação, por fim, é um postulado que visa a atribuir pesos a elementos que se entrelaçam. Como
se pode perceber facilmente, cada um desses postulados serve para resolver um problema normativo
específico e cada qual apresenta uma estrutura própria de aplicação. Esses diferentes objetivos, que refletem
diferentes exigências aplicativas, devem estar projetados na fundamentação da decisão.

IV) DENTRE AS DIFERENTES MANEIRAS COM QUE AS NORMAS PODEM SE RELACIONAR ENCONTRA -SE
AQUELA EXEMPLIFICADA PELO ART. 489, § 2.º: diferentes finalidades normativas podem apontar soluções
diversas e até mesmo opostas para resolução de determinados casos (é o que o Código chama de “colisão
entre normas”). O Código fala em ponderação, mas pode ser o caso de o conflito normativo ser resolvido
com o emprego da proporcionalidade. No primeiro caso, deve o juiz “justificar o objeto e os critérios gerais
da ponderação, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas
que fundamentam a conclusão”. No segundo, deve o juiz retratar a relação entre meio e fim e justificar
argumentativamente a adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito da decisão. O
emprego genérico de postulados normativos, sem qualquer referência às suas funções e àquilo que no caso
concreto autoriza o respectivo emprego, constitui violação ao dever judicial de fundamentação analítica.

04.7) OBSERVAÇÕES DO CPC COMENTADO (2017) SOBRE O ARTIGO 11, NCPC (PUBLCIDADE E
FUNDAMENTAÇÃO x NULIDADE):

173
04.7.1) FUNDAMENTAÇÃO: Nossa CRFB se refere ao tema no artigo 93, IX. O dever de fundamentação das
decisões judiciais é inerente ao Estado Constitucional e constitui verdadeiro banco de prova do direito ao
contraditório das partes. Sem motivação a decisão judicial perde duas características centrais: a justificação
da norma jurisdicional para o caso concreto e a capacidade de orientação de condutas sociais. Perde, em
uma palvra, o seu próprio caráter jurisdicional. O dever de fundamentação é informado pelo direito ao
contraditório como direito de influência – não por acaso direito ao contraditório e dever de fundamentação
estão previstos na sequência no novo código. Adiante, o artigo 489, §§ 1º e 2º, CPC, visa a delinear de forma
analítica o conteúdo do dever de fundamentação.

04.7.2) PUBLICIDADE: é essencial ao princípio democrático, tendo assento, portanto, em um dos corações do
Estado Constitucional (1º, caput, CRFB). A publicidade tem um duplo significado: publicidade geral, que
outorga direito de acesso ao conteúdo dos autos do processo, e publicidade imediata, que outorga direito de
presença no momento da prática de atos processuais. Como regra, qualquer do povo pode ter acesso ao
conteúdo dos autos e estar presente no momento da prática de atos processuais, ressalvados os casos em
que há segredo de justiça, em que tanto a publicidade geral como a publicidade imediata sofrem restrições
(5º, LX, 93, IX, CRFB e 11, pu, e 189, NCPC).

04.7.3) ADMINISTRAÇÃO DEMOCRÁTICA DA JUSTIÇA CIVIL: a alocação do dever de fundamentação e do


direito à publicidade como normas fundamentais do processo civil – especialmente previstas em conjunto e
na sequência do direito ao contraditório – visa a caracterizar o processo civil brasileiro e a administração da
Justiça Civil em nosso país a partir de uma ideologia democrática. As razões invocadas pelas partes devem ser
ouvidas e a fundamentação ocorre em função da necessidade de controle de poder pelas partes e pela
sociedade em geral, o que é justamente assegurado pela publicidade do processo e dos seus atos.

05) PERGUNTAS FEITAS EM AULA PELO EXAMINADOR: O DIREITO À FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO


JUDICIAL

05.1. O silogismo judicial está na base de máximas como o “iura novit curia”, da noção de imparcialidade
(neutralidade) judicial e mesmo das restrições à antecipação de tutela. Essa noção, porém, é bastante
questionável, o que poderia implicar o questionamento sobre todas as “decorrências processuais” dessa
noção. Em que medida a teoria processual é afetada pela desconstrução do modo como opera o raciocínio
judicial?

05.2. Afirma-se em doutrina que a fundamentação da decisão judicial impõe ao juiz o dever não apenas de
alinhar os argumentos que formaram o seu convencimento, mas também o de rechaçar os argumentos em
sentido contrário, apontando os motivos que o levaram, ainda, a rejeitar as provas em sentido contrário
àquelas que ele usou para formar sua convicção. Essa orientação não poderia tornar ainda mais complexa a
atividade judicial, aumentando a morosidade já constante no sistema brasileiro?

05.3. Modelos processuais que exigem a fundamentação da decisão são normalmente ligados ao exercício
“profissional” da jurisdição. Nessa linha, sistemas que trabalham com o júri em regra não exigem a
fundamentação da decisão, nem se considera ilegítimo que os jurados estejam dispensados de fundamentar
suas decisões. Não é um paradoxo que a maior participação popular no exercício da jurisdição implique a
menor amplitude da garantia das partes? O mesmo problema não poderia ser verificado em decisões
colegiadas?

05.4. Pode o juiz expor os “verdadeiros” motivos de seu convencimento, sem atentar para critérios
“externos” de “justificação válida”?

05.5. A fundamentação da decisão judicial se presta, em grande medida, para o controle da decisão do juiz.
Assim, sistemas que não contem com a possibilidade de revisão da decisão podem dispensar a necessidade
de fundamentação? As críticas por muitos feitas ao “duplo grau de jurisdição” pode redundar em um uma
desnecessidade da fundamentação da decisão?

174
05.6. Conceitos abertos e indeterminados admitem uma multiplicidade de entendimentos. Até que ponto se
pode exigir do juiz uma “explicação” desses conceitos empregados em suas decisões?

13B. Ação de alimentos e convenções internacionais. Cumprimento de sentença que reconhece exigibilidade
de obrigação de prestar alimentos.

Natália Lievore
Principais obras consultadas: Resumo do 28º CPR;
Novo Código de Processo Civil Comentado – Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero (2017);
Novo Código de Processo Civil Comentado: artigo por artigo – Daniel Amorim Assumpcao Neves (2016);
Direito Internacional Público e Privado – Paulo Henrique Gonçalves Portela; Informativo SCI.
Legislação básica: “Convenção da Organização das Nações Unidas sobre a Prestação de Alimentos no Estrangeiro” (Convenção da ONU de Nova
Iorque), celebrada em 1956 (Decreto 56.826/1965);
“Convenção Interamericana sobre Obrigação Alimentar” (Convenção da OEA de Montevidéu), celebrada em 1989 – Decreto nº 2.428/1997; e
arts. 528 a 533 do CPC/15.

AÇÃO DE ALIMENTOS E CONVENÇÕES INTERNACIONAIS


A Convenção da ONU sobre a Prestação de Alimentos no Estrangeiro (Convenção de Nova York, celebrada
em 1956 – Decreto nº 56826/65) objetiva facilitar a cobrança de alimentos providos por pessoa que resida
em país diverso ao do alimentando. É regida pelo princípio da complementaridade e da reciprocidade.
No Brasil, a PGR exerce as funções de “Autoridades Remetentes” e “Instituições Intermediárias”, conforme
art. 26, da lei nº 5.478/68, o qual também define a competência do juízo federal da capital do estado-
membro em que reside o devedor. A ela compete: a) receber os documentos do demandante, encaminhadas
pela Autoridade Remetente (art. IV, par. 1, da Convenção de Nova Iorque – CNY); b) tomar, em seu nome,
atuando dentro dos limites dos poderes conferidos pelo demandante, quaisquer medidas apropriadas para
assegurar a prestação dos alimentos, inclusive transigir e, quando necessário, ajuizar ação alimentar e
executar sentença, decisão ou outro ato judiciário (art. VI, § 1º, CNY); e c) manter a Autoridade Remetente
informada e, se não puder atuar, notificá-la das razões e devolver-lhe a documentação (art. VI, § 2º, CNY).
Ainda, nos termos da Convenção da ONU: i) a lei que regerá as ações mencionadas e qualquer questão
conexa será a do Estado do demandado, inclusive em matéria de direito internacional privado (art. VI, § 3º,
CNY); ii) os demandantes gozarão do tratamento e das isenções de custos e de despesas concedidas aos
demandantes residentes no Estado (no caso, o Brasil) em cujo território for proposta a ação (art. IX, §1º,
CNY); iii) dos demandantes estrangeiros ou não residentes não poderá ser exigida uma caução “judicatum
solvi”, ou qualquer outro pagamento ou depósito para garantir a cobertura das despesas (art. IX, § 2º); iv) as
autoridades remetentes e as instituições intermediárias não poderão perceber remuneração alguma pelos
serviços que prestarem (art. IX, § 3º, CNY).
A Convenção Interamericana sobre Obrigação Alimentar (Convenção da OEA de Montevidéu, celebrada em
1989 – Decreto nº 2.428/97) visa “a determinação do direito aplicável à obrigação alimentar, bem como à
competência e à cooperação processual internacional”, em caso de menores de 18 anos ou decorrentes de
relações matrimoniais (art. 1º, da Convenção de Montevidéu – CM); admitida pelos Estados contratantes a
exclusão desta última hipótese ou se incluir obrigações alimentares em favor de outros credores, o que não
foi adotado pelo Brasil. Aplica-se a norma mais favorável ao credor (art. 6º, CM), seja ela a do domicílio ou
residência habitual do alimentante ou do alimentado. A competência internacional, a critério do credor, é do
juiz ou autoridade do Estado de domicílio ou residência habitual do devedor ou do credor. As sentenças
estrangeiras terão eficácia extraterritorial, nas condições dos artigos 11 e 12 da Convenção; nada obstante, a
jurisprudência brasileira não tem dispensado o procedimento de homologação de sentença estrangeira,
prática admitida pelo art. 18 da CM.
Em 19 de outubro de 2017, entrou em vigor a Convenção de Haia de 23 de novembro de 2007 sobre a
Cobrança Internacional de Alimentos para Crianças e outros Membros da Família e o Protocolo sobre a Lei
Aplicável às Obrigações de Prestar Alimentos, promulgados pelo Decreto n° 9.176/2017. Essa Convenção
substitui a CNY de 1956 para os Estados convenentes. A autoridade central designada foi o Departamento de
Recuperação de Ativos e Cooperação Internacional (DRCI) do MJ.
A aplicabilidade da Convenção de Nova York permanece para os pedidos que já tramitavam em 19 de
outubro. Além disso, nem todos os Estados signatários da CNY aderiram à Convenção da Haia. Desse modo,
caso o pedido refira-se a um Estado não signatário da Haia, deverá ser formalizado com base na CNY,
portanto, perante o MPF.

175
AÇÃO DE ALIMENTOS
A ação de alimentos é regida pela Lei 5.478/68. Ela tramita sob um rito especial em razão de algumas
peculiaridades. A inicial deve constar e seguir com documentação comprobatória o parentesco ou a
obrigação alimentar do devedor. Logo que receber o pedido, o juiz fixará alimentos provisórios, que poderão
ser revistos a qualquer tempo, salvo se o credor expressamente declarar que deles não necessita.
O Ministério Público tem legitimidade ativa para ajuizar essa ação em proveito de criança ou
adolescente, independentemente do poder familiar dos pais, das situações de risco do art. 98 do ECA ou da
existência de Defensoria Pública na comarca (STJ, Súmula 594).
O foro competente é o de domicílio ou residência do alimentando (art. 100, II, CPC), porém há
precedentes do STJ no sentido de lhe permitir também escolher entre o juízo da sentença exequenda, o do
local dos bens passíveis de expropriação ou o do domicílio do alimentante, notadamente no caso de
menores, haja vista o princípio do melhor interesse e da proteção integral da criança.
No despacho inicial, além de fixar o valor, o juiz designará audiência de conciliação e prazo razoável
para que o réu apresente contestação (art. 5º, § 1º). O não comparecimento do autor determina o
arquivamento do pedido, e a ausência do réu importa em revelia, além de confissão quanto à matéria de fato
(art. 7º).
Vale ressaltar que a decisão judicial sobre alimentos não transita em julgado e pode a qualquer
tempo ser revista em face da modificação na situação financeira do réu (art. 15).

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA E EXECUÇÃO DE ALIMENTOS


A execução de alimentos, ou cumprimento de sentença que os fixou, é uma espécie de execução para
pagamento de quantia certa.
A competência para processamento da ação foi descrita no art. 528, §9° do CPC e consagrou
entendimento jurisprudencial já vigente: poderá ser proposta no juízo que prolatou a decisão exequenda, no
foro do local dos bens do executado, no foro do domicílio do executado e no foro de seu domicílio.
Ademais, uma nova forma de coerção para pagamento foi inserida no Código, com a possibilidade de
protesto, caso o executado não efetue o pagamento ou não apresente justificativa para não fazê-lo.
No novo CPC foi facultado a escolha de duas formas do credor executar seu crédito, aplicando-se em
ambos os casos aos alimentos provisórios e definitivos (art. 530): i) com a decretação de prisão se o débito,
referente às três prestações anteriores ao ajuizamento da ação, não for pago em 03 dias (art. 528); ii) sem a
decretação de prisão, como execução por quantia certa.
No tocante à prisão civil, destaque-se que ela é inaplicável ao inventariante em razão do
descumprimento do dever do espólio de prestar alimentos, haja vista a natureza personalíssima dessa sanção
(precedentes do STJ).
Importante particularidade é a admissão não só da constrição de bens regular, mas também o
desconto em folha de pagamento (art. 529 CPC). O descumprimento de decisão judicial pelo empregador que
determina o desconto acarreta crime de desobediência previsto no art. 22 da Lei 5.478/68.

13C. Estabilização da tutela provisória.

Atualizado por Felipe Fróes, em 28/08/2018


FONTES: Material do grupo MPF LEVADO À SÉRIO; Santo Graal 28CPR;
BORBA, Mozart. Diálogos sobre o novo CPC (4 ed, 2017);
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil (8 ed, 2016).

O instituto da estabilização da tutela provisória é novo para o ordenamento jurídico brasileiro e foi trazido
pelo CPC/2015. Entretanto, já havia experiências semelhantes no direito comparado, podendo-se citar a
França (o art. 845 do CPC francês prevê o chamado despacho de medidas provisórias – les ordinnances de
référé –, permitindo a estabilização da tutela provisória) e Portugal (o CPC português prevê a chamada
“inversão do contencioso”).
Essa estabilização ocorre quando não há interposição de recurso contra a decisão judicial que defere a
tutela antecipada requerida em caráter antecedente. Para Daniel Neves, o legislador fez clara opção de
limitar a possibilidade de estabilização da tutela antecipada à sua concessão antecedente, de forma que,
sendo concedida de forma incidental, mesmo sem a interposição do recurso da parte contrária, o processo
não deve ser extinto e a tutela antecipada não se estabilizará nos termos do art. 304 do Novo CPC. Ainda de
acordo com o autor, NÃO é possível a estabilização da tutela quando ocorrer concessão parcial de tutela
176
antecipada requerida de forma antecedente, por dois motivos: (a) seria gerada indesejável confusão
procedimental com parcela do pedido estabilizado em razão da concessão parcial de tutela antecipada e
outra parcela a ser decidida mediante cognição exauriente; e (b) por uma questão de economia processual,
tendo seguimento o processo em razão da parcela de mérito não concedida em sede de tutela antecipada,
não tem sentido deixar de decidir ao final, com cognição exauriente e juízo de certeza, a parcela do mérito
que já foi objeto da tutela antecipada.
Há entendimentos doutrinários no sentido de que ações submetidas a ritos especiais (ex. mandado de
segurança e ação rescisória) não admitem essa técnica de estabilização (Enunciado nº 421 do FPPC e
Enunciado 43 da I jornada de Direito Processual Civil - CJF). Além disso, ela não ocorrerá quando se tratar de
tutela cautelar (Enunciado nº 420 do FPPC).
Interpretando-se literalmente o art. 304, § 1º, do CPC, verifica-se que a não interposição do recurso contra a
decisão antecipatória acarreta, ainda, a extinção do processo. A doutrina critica esse dispositivo,
notadamente quanto à violação ao direito do autor à tutela definitiva (art. 4º do CPC).
Marcelo Neves defende que o aditamento da petição inicial (art. 303, § 1º, I, do CPC) afasta a possibilidade
de estabilização, uma vez que o autor demonstra com esse comportamento o interesse em prosseguir na
lide para obtenção da tutela definitiva. Assim, a estabilização demanda não apenas a ausência de recurso
contra a decisão judicial, mas também a ausência desse aditamento. O autor ressalta que a sentença
extintiva não faz coisa julgada material (opção legislativa).
Por fim, registra-se que o CPC aplica a esse instituto a técnica do contraditório eventual, haja vista que o
contraditório quanto ao mérito da causa somente ocorrerá por iniciativa do réu, caso tenha interesse na
interposição do recurso (semelhante à ação monitória, na qual cabe ao réu opor os embargos para discutir o
título sem eficácia executiva, sob pena de convolação da ordem de pagamento) ou ajuizamento de ação
revisional (prazo de dois anos após ciência de decisão que extingue o processo, art. 304, § 5º). Assim,
presentes os requisitos legais, quem obteve uma tutela provisória não fica obrigado a ajuizar a ação principal.
A outra parte, se tiver interesse, deve propor a ação para discutir o mérito impedir a estabilização.
Entretanto, caso admitido o entendimento doutrinário acima citado, esse contraditório deve ocorrer por
iniciativa do juiz na hipótese de aditamento.

14A. Conexão e Continência. Reunião e Separação de Causas. Agregação de Processos e Atos Conjuntos.
Cooperação entre órgãos jurisdicionais nacionais.

Atualizado por Felipe Fróes, em 15/09/2018


FONTES: Material do grupo MPF LEVADO À SÉRIO; NEVES, Daniel Amorim Assumpção.
Manual de Direito Processual Civil (8 ed, 2016). MARINONI, Luiz Guiherme.
Novo Código de Processo Civil Comentado (3 ed, 2017) e Novo Curso de Processo Civil (3 ed, 2017).

O fenômeno da conexão vem previsto no art. 55, caput, do Novo CPC: “Reputam-se conexas duas ou
mais ações, quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir” e o da continência no art. 56 do Novo
CPC: “Dá-se continência entre duas ou mais ações quando houver identidade quanto às partes e à causa de
pedir, mas o objeto de uma, por ser mais amplo, abrange o das demais”. A continência é uma espécie de
conexão, considerando-se que, para que exista o fenômeno da continência entre duas ações,
obrigatoriamente deverá haver a identidade de causa de pedir, o que por si só já as torna também conexas.
A continência, assim, vai além da conexão, pois exige mais requisitos para se ver configurada no caso
concreto. Nem sempre a continência terá como efeito a reunião dos processos. Segundo o art. 57 do Novo
CPC, quando houver continência e a ação continente tiver sido proposta anteriormente, o processo relativo à
ação contida será extinto por sentença sem resolução de mérito; caso contrário, as ações serão
necessariamente reunidas.
NEVES entende ser clara a disposição do legislador para tutelar exclusivamente o processo individual.
No processo coletivo a extinção não deve ser admitida, salvo se houver a identidade de autor, o que
raramente ocorre. No mais das vezes, os autores são diferentes, mas, por defenderem o mesmo titular do
direito, são considerados no plano material como o mesmo sujeito, o que permite o fenômeno da
continência. Nesse caso, em razão da diversidade de autores, a reunião seria o único efeito aceitável da
continência, sob pena de ofensa ao princípio da inafastabilidade da jurisdição para o autor que tiver sua ação
extinta.
No tocante à identidade da causa de pedir como elemento para a conexão, a doutrina vem
entendendo bastar que um de seus elementos seja coincidente para que haja conexão entre as ações (seja
177
dos fatos ou dos fundamentos jurídicos). Esse entendimento se coaduna com os objetivos traçados pela
conexão (economia processual e harmonia entre julgados), abrangendo um número maior de situações
amoldáveis ao instituto legal. Assim, onde se lê causa de pedir comum (art. 55), deve-se entender fatos ou
fundamentos jurídicos do pedido comum. Há decisões do STJ que flexibilizam ainda mais o conceito de
conexão, afirmando não ser necessário que se cuide de causas idênticas quanto aos fundamentos e objetos,
bastando que sejam análogas (REsp 1.226.016/RJ).
Há no CPC/2015 duas hipóteses de reunião de processos perante o juízo prevento ainda que não
haja conexão. Para permitir a reunião de execução de título extrajudicial e de ação de conhecimento relativa
ao mesmo ato jurídico, o art. 55, § 2º, I, equipara tal situação à conexão, num reconhecimento tácito de que
realmente nessa hipótese não há conexão, ao menos não nos termos do art. 55, caput, do Novo CPC. Além
disso, o art. 55, § 2º, II, equipara à conexão a existência de ações de execução fundadas no mesmo título
executivo. A grande novidade a respeito do tema fica por conta do §3º do art. 55 do Novo CPC. O dispositivo
prevê a reunião de processos, mesmo não conexos, sempre que exista risco de prolação de decisões
conflitantes ou contraditórias caso sejam decididos separadamente (diferentes juízos). A reunião nessas
circunstâncias já vinha sendo aceita pelo Superior Tribunal de Justiça, ainda que por meio da extensão do
conceito de conexão (STJ CC 55.584/SC).
Dentre as vantagens aferida com o fenômeno da conexão, consegue-se evitar que decisões
conflitantes sejam proferidas por dois juízos diferentes. A questão da economia processual, entretanto, deve
ser considerada de forma secundária, seja pelo maior relevo que se dá à harmonização dos julgados, seja
porque nem sempre a reunião de processos conexos representará a concretização de tal princípio. Por outro
lado, como desvantagens verifica-se que a reunião de processos perante o juízo prevento pode sacrificar o
exercício da ampla defesa das partes do processo que é remetido para o outro juízo se os foros são distantes
um do outro, ainda mais em um país de dimensões continentais como é o Brasil. Isso prejudica em especial o
litigante eventual e, de forma ainda mais sentida, a parte que não tem condições econômicas para participar
adequadamente de um processo que correrá à distância. Além disso, essa reunião poderá se sobrepor a
regra de competência criada justamente para proteger o hipossuficiente, como ocorre, por exemplo, com o
art. 101, I, do CDC. Ademais, havendo uma pluralidade considerável de processos conexos, uma eventual
reunião de todos eles perante o juízo prevento inviabilizaria o trabalho judiciário de tal juízo.
O art. 55, § 1º, do Novo CPC prevê que os processos de ações conexas serão reunidos para decisão
conjunta, salvo se um deles já houver sido sentenciado. Essa hipótese já vinha sendo reconhecida pela
jurisprudência, passando agora a estar prevista em lei. Há corrente doutrinária que entendia ser a regra do
art. 105 do CPC/1973 (agora art. 55, § 1º, do CPC/2015) de natureza cogente, o que retiraria do juiz qualquer
liberdade a respeito de sua aplicação no caso concreto. Havendo a identidade de causa de pedir ou do
pedido, os processos deveriam – e não poderiam – ser reunidos. Para Didier, se houver conexão, e for
possível a reunião dos processos, o juiz deve reuni-los, pois se trata de regra processual cogente. Por outro
lado, existia corrente doutrinária mais flexível quanto à reunião dos processos por conexão, atribuindo ao
juiz uma maior liberdade no caso concreto para analisar a conveniência de realizar tal reunião. Essa liberdade
variaria conforme a intensidade da conexão e os benefícios reais advindos da reunião das demandas. É lição
muito próxima de parcela da doutrina que entendia ser obrigatória a reunião, desde que se verificasse a
efetiva realização dos objetivos traçados por tal fenômeno processual, em especial a economia processual.
Há julgados do STJ que afirmam expressamente existir um verdadeiro juízo de conveniência baseado na
discricionariedade quanto à reunião de ações conexas, deixando claro não ser obrigatória tal reunião no caso
concreto (REsp 1.278.217/MG, REsp 1.226.016/RJ). Essa faculdade está inclusive sumulada quando a conexão
se der entre execuções fiscais propostas contra o mesmo devedor (Súmula 515/STJ). Para NEVES, tudo leva a
crer que a reunião nos termos do § 3º do art. 55 do Novo CPC seguirá a mesma lógica, ou seja, não será
obrigatória mesmo que haja risco de decisões conflitantes e contraditórias. Registra-se, ainda, que, havendo
ações conexas de diferentes competências absolutas em trâmite, haverá um impedimento legal para sua
reunião perante o juízo prevento (STJ CC 119.090/MG). Existindo o perigo de decisões conflitantes, o
máximo que poderá ser feito é a suspensão de uma das ações em razão de prejudicialidade externa, nos
termos do art. 313, V, “a”, CPC/2015 (STJ AgRg no CC 112.956/MS).
Inicialmente, havia dois entendimentos acerca da conexão de ações coletivas conexas em trâmite na
Justiça Federal e na Justiça Estadual. Enquanto a 1ª Seção do STJ decidia no sentido de ser possível a reunião
de ações coletivas originariamente em trâmite na Justiça Estadual e na Justiça Federal perante a segunda,
aparentemente desprezando as demais regras que determinam a prevenção do juízo (CC 78.058/RJ), a 2ª
Seção entendia pela inviabilidade de reunião em razão das diferentes competências de Justiça das duas
178
ações coletivas (CC 111.727/SP). O primeiro entendimento, pela reunião perante a Justiça Federal, acabou
prevalecendo e gerou a Súmula 489/STJ.
Para o STJ, ainda que exista conexão entre as causas e estas tramitem perante o mesmo juízo, não há
obrigatoriedade de decisão conjunta. Segundo essa Corte, notando o juiz que a solução de uma demanda
não influenciará a decisão da outra, não existe qualquer nulidade em decidi-las em momentos distintos (REsp
1.126.639/SE). Obrigatória ou não a reunião dos processos, a conexão tem tratamento processual de
matéria de ordem pública, o que significa legitimidade plena para sua arguição (qualquer dos sujeitos
processuais poderá fazê-lo: autor, réu, terceiro interveniente, Ministério Público como fiscal da lei, juiz de
ofício) e não sujeição à preclusão. A competência que surge para o juízo prevento tem natureza absoluta
(funcional). Entretanto, a parte que alegar o vício deverá comprovar seu efetivo prejuízo pela não reunião
dos processos, que uma vez comprovado gerará a anulação da decisão.
Sobre a cooperação de órgãos jurisdicionais nacionais, dispõe o art. 67 do CPC/2015 que se trata de
um dever. Assim, não é necessário condicionar ao requerimento das partes à possibilidade de existir essa
cooperação. O Poder Judiciário, apesar das distinções decorrentes de competências, de graus de jurisdição e
afins, é uno. Em prestígio a esse mandamento de recíproca cooperação, deverão ser objeto de fluxo franco,
célere, independente de forma pré-fixada (o que não quer dizer destituído de forma). Consiste em algo que
se impõe ao Poder Judiciário como um todo (inclusive para juízos arbitrais, o que ocorre mediante a carta
arbitral), aplicando-se tanto a magistrados quanto a todos os servidores da Justiça. O pedido de cooperação
pode ser executado como auxílio direto, reunião ou apensamento de processos, prestação de informações e
atos concertados. MARINONI destaca, dentre as formas de cooperação nacional, a figura dos atos
concertados entre juízes cooperantes. A medida é prevista no art. 69, inc. IV, e posteriormente esmiuçada
no art. 69, § 2º, todos do CPC/2015. A técnica encontra paralelo no multidistrict litigation norte-americano
e constitui uma técnica de racionalizar os recursos judiciários, oferecendo soluções que tendem à isonomia.
Constitui uma técnica de coletivização, ainda que não se identifique as ações coletivas. Trata-se de
instrumento por meio do qual juízes concentram a prática de certas atividades – ou, eventualmente, o
próprio julgamento de casos repetitivos (art. 69, § 2º, VI) – buscando racionalizar a distribuição do trabalho.
Essa concentração pode envolver desde a prática de simples atos de comunicação processual, envolvendo
vários processos, até mesmo a colheita de prova, o julgamento, a efetivação de decisões ou mesmo a
centralização de processos de massa. Pode envolver órgãos jurisdicionais de distintos ramos do Poder
Judiciário (art. 69, § 3º) e dispensa forma específica. A figura se presta, dentre outras, a lidar com questões
de massa ou com aspectos convergentes de distintos processos.

14B. Ação discriminatória, de divisão e de demarcação. Mandado de segurança individual e coletivo.

Samara Dalloul

Ação discriminatória, de divisão e de demarcação


Noções gerais: O CPC (art. 569-598) regula os processos de divisão e de demarcação de terras
particulares. São processos de conhecimento, com procedimento especial, que veiculam pretensão real. Já a
ação discriminatória é regulada pela Lei 6.383/76 e, subsidiariamente, pelo CPC. Todas possuem um
procedimento que se desdobra em duas fases, uma de identificação sobre o direito à discriminação,
demarcação ou divisão e outra destinada a concretizar o direito declarado. Possuem ainda caráter dúplice,
pois a discriminação e a demarcação fixam os limites tanto da propriedade do autor como do réu. É possível
a cumulação de pedidos: primeiro faz-se a demarcação (envolvendo proprietários e confinantes), para, após,
fazer-se a divisão (apenas entre coproprietários).
Inovações CPC/15: demarcação e divisão extrajudiciais, realizadas por escritura pública por maiores,
capazes, concordes todos os interessados (art. 571). Além disso, se o imóvel for georreferenciado, com
averbação no registro de imóveis, pode ser dispensada a prova pericial (art. 573).
O direito de discriminar, dividir e demarcar é de natureza potestativa, de modo que são inaplicáveis os
prazos prescricionais. Por outro lado, prazo decadencial – de que se poderia cogitar – não é imposto por lei,
podendo a parte interessada ingressar com a ação em qualquer momento.

Ação Discriminatória:
Noções gerais: tem por objetivo separar as terras públicas (terras devolutas) das particulares, mediante
verificação da legitimidade dos títulos de domínio particulares, apurando, por exclusão, as terras do
179
domínio público. Será parte legítima para a ação discriminatória o ente público titular do domínio da terra
devoluta.
Situações em que será necessário o ajuizamento: indicada pelo art. 19 da Lei n. 6.383/76: a) quando o
processo discriminatório administrativo for dispensado ou interrompido por presumida ineficácia; b) contra
aqueles que não atenderem ao edital de convocação ou à notificação; c) quando iniciado o processo
discriminatório, alguém promover a alteração de quaisquer divisas na área discriminada, derrubar cobertura
vegetal, construir cercas e transferências de benfeitorias a qualquer título, sem assentimento do
representante da União; d) houver dúvida sobre a legitimidade dos títulos apresentados pelos interessados
(art. 8º, Lei n. 6.383/76).
Procedimento: A sentença da primeira fase do procedimento judicial é declaratória, visto que é
orientada a declarar a submissão da área ao regime de terra devoluta. A segunda fase será regida pelos
artigos 582 a 587 do CPC (art. 22, parágrafo único, Lei 6.383/76), cujo rito procedimental será estudado no
tópico da ação de demarcação. Tanto da sentença da primeira fase quanto da sentença da segunda fase
caberá apelação com efeitos devolutivos. (art. 21, Lei 6.383/76 e art. 1.012, §1º, I, CPC).

Ação de demarcação
Noções gerais: A ação de demarcação é manejada pelo proprietário para o fim de fixar limites
territoriais ou resgatar os que de alguma forma foram apagados, estremando seu imóvel dos confinantes .
Se houver propriedade conjunta pode ser ajuizada por qualquer condômino – os demais deverão ser
intimados para, querendo, intervir no feito.
Surge aqui a polêmica do litisconsórcio ativo necessário e unitário, já que a relação jurídica é incindível
e o código menciona facultatividade na intervenção, sem mencionar a qual espécie (o CPC/73 determinava
citação para formação de litisconsórcio). ARENHART explicita que o que interessa é que a decisão tem de ser
uniforme a todos os litisconsortes, não a possibilidade de alegar coisas diversas.
Procedimento: A inicial deve ser instruída com título da propriedade. O objeto principal da ação é a
demarcação do traçado da linha demarcatória. Inovando, o par. único do art. 581 prevê efeito anexo da
sentença de procedência: determinará a restituição da área invadida, se houver, declarando o domínio ou a
posse do prejudicado, ou ambos. O foro competente é o do imóvel (art. 47, CPC – competência absoluta).
As citações, que antes eram pessoais, agora serão feitas por correio (observadas as exceções do art.
247) e serão publicados editais previstos no art. 259, III por força de expressa determinação (art. 576, p.
único). Feitas as citações, os réus terão prazo de 15 dias para contestar (antes eram 20 dias), após tal prazo
será seguido o procedimento comum (antes só se seguia o proc. ordinário se houvesse contestação, senão
declarava-se a revelia e já seguia à nomeação dos agrimensores
A sentença de procedência determina o traçado da linha demarcanda. A sentença desafia apelação.
Após o trânsito em julgado, inicia-se outra fase, para efetivação da demarcação (art. 582-587). O perito
(antes o CPC se referia a agrimensor) efetuará a demarcação colocando os marcos necessários. Os peritos
percorrerão a linha formada pelos marcos, consignando tudo em relatório. O juiz abre vista às partes para se
manifestarem no prazo comum de 15 dias (anteriormente era de 10 dias), sobre o relatório, cabendo ao juiz
efetivar eventuais correções. Após, lavra-se o auto de demarcação, que será assinado pelo juiz, e pelos
peritos, proferindo-se sentença homologatória da demarcação – contra a qual cabe apelação sem efeito
suspensivo (art.1.009 e 1.012, §1º, I, CPC) e não cabe a ação anulatória do atual art. 966, §4º CPC (REsp
776242, em 17.12.06), mas ação rescisória.

Ação de divisão:
Noções gerais: A ação de divisão é manejada pelo condômino, com o fim de obrigar os demais
condôminos a partilharem o bem comum. Possui regras processuais semelhantes às da demarcação. A inicial
deve conter o título do domínio. O foro é o do local do imóvel. Todos os condôminos devem ser citados e
devem apresentar, em 10 dias, seus títulos. Em caso de revelia, antigamente havia julgamento antecipado da
lide, porém, mas o novo CPC determina que se prossiga como no art. 578 (utiliza-se o procedimento comum).
(antes era um agrimensor e dois arbitradores). Julgada procedente a demanda, inicia-se a fase executiva,
idêntica àquela da ação de demarcação. O condomínio é extinto após o cumprimento da sentença. Altera-se
apenas o propósito da demanda.
Jurisprudência: (A) A alegação da União de que determinada área constitui terreno de marinha, sem que
tenha sido realizado processo demarcatório específico e conclusivo pela Delegacia de Patrimônio da União,
não obsta o reconhecimento de usucapião. Nesse caso, na sentença que reconhecer a usucapião, o juiz
180
deverá ressalvar que a União poderá fazer uma eventual e futura demarcação no terreno. Se ficar
constatado, efetivamente, que o imóvel está localizado em terreno de marinha, a União será declarada
proprietária da área, não havendo preclusão sobre o tema. Aplica-se o mesmo raciocínio constante na
Súmula 496 do STJ: Os registros de propriedade particular de imóveis situados em terrenos de marinha não
são oponíveis à União. Com isso, não haverá prejuízo à União. STJ. 4ª Turma. REsp 1.090.847-SP, Rel. Min.
Luis Felipe Salomão, julgado em 23/4/2013 (Info 524). (B) A ausência de citação do litisconsorte passivo
necessário conduz à nulidade parcial do processo (TJMG, APCV 1.0720.16.007818-7/001 – J. 17.05.2018).

Mandado de segurança individual e coletivo.


Noções gerais: O mandado de segurança protege direito líquido e certo (liquido quanto à existência e
certo quanto à delimitação), de modo que o direito seja demonstrado de plano, por meio de prova pré-
constituída. Para Marinoni, Mitidiero e Arenhart: “A noção de direito líquido e certo não tem, ao contrário do
que a expressão possa sugerir, qualquer relação com espécie particular de direito. (...) A liquidez e certeza do
direito têm sim vinculação com a maior ou menor facilidade na demonstração dos fatos sobre os quais incide
o direito."
Embora não admita produção de prova (pericial ou testemunhal), é admissível tais provas desde que
previamente documentadas. O mandado de segurança tem caráter residual, já que só cabe ante a não
possibilidade de utilização do Habeas Corpus ou do Habeas Data, e possui o prazo decadencial de 120 dias
para a impetração. No curso de um processo administrativo federal o prazo de 120 dias para impetração
somente se inicia quando a parte for intimada diretamente de ato contrário aos seus interesses (STF, RMS
32487).
Legitimado ativo: O legitimado ativo é o titular do direito líquido e certo violado, pessoa física ou jurídica;
brasileira ou estrangeira, incluindo os entes despersonalizados; autoridades públicas e o nascituro. Também
se admite a impetração por órgão público (que não possui personalidade jurídica), desde que direcionado à
defesa de suas prerrogativas ou que esteja autorizado por lei. Afirma a doutrina que o mandado de
segurança é uma ação personalíssima. Com isso, a morte do autor gera extinção do processo. O STF tem
jurisprudência pacífica reconhecendo o cunho personalíssimo do direito em disputa no mandado de
segurança, de modo que não admite a habilitação de herdeiros em caso de óbitos, os quais devem se valer
das vias ordinárias na busca de seus direitos (RE-AgR 445.409). Há um precedente em que o STF reconheceu
a impetração fora do prazo mas apreciou o mérito em nome da segurança jurídica porque havia concedido
liminar que perdurou por 12 anos antes de verificar a decadência do prazo (MS 25097/DF)
Legitimado passivo: Para a melhor doutrina, somente contra o poder público pode ser reclamado o
mandado, pois a Constituição pressupõe, no art. 5º, LXIX, uma autoridade como coatora. Equiparam-se a
autoridade os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas,
bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou pessoas naturais no exercício de atribuição do poder público.
Observações sobre a legitimidade passiva: 1) simples subalterno não pode ser autoridade coatora; 2) ato
coator praticado diversas vezes e em áreas distintas, inclusive por executores distintos - pode-se impetrar
contra cada ato ou um único MS em desfavor do superior hierárquico; 3) MS no ato complexo – a autoridade
coatora é a final; 5) MS no ato composto – autoridade coatora é a que homologa; 6) Ato colegiado –
autoridade coatora é o presidente; 7) STJ – indicação errônea da autoridade coatora - caso de extinção do
MS.-
Competência: A competência para o mandado de segurança é determinada em razão da pessoa. Sob
esse aspecto, é importante se destacar a Teoria da Encampação, em que a impetração se dá com relação à
autoridade diversa, mas que se sobrepõe à que possui realmente a legitimidade passiva. Para aplicação dessa
Teoria, a autoridade indicada erroneamente como coatora deverá não só apontar a sua ilegitimidade, mas
defender o ato impugnado, passando a deter assim, pela Teoria da Encampação, a legitimidade passiva de
que era carecedora outrora. A aplicação desta teoria demanda a presença de alguns requisitos, a saber: a) o
encampante deve ser superior hierárquico do encampado, b) o juízo deve ser competente para apreciar o
MS contra o encampante; c) as informações prestadas pelo encampante devem enfrentar diretamente o
mérito do ato impugnado, não servindo apenas para alegar ilegitimidade; d) a dúvida quanto à real
autoridade coatora deve ser razoável. OBS.: Sob o ponto de vista territorial, a competência é definida pelo
domicílio funcional da autoridade coatora. A competência territorial em MS é absoluta.

MS Coletivo: O conceito de mandado de segurança coletivo é o mesmo do que o do individual: deve ser
impetrado especificamente quando houver violação pelo poder público a um direito líquido e certo,
181
excluindo-se o direito de locomoção (protegido pelo habeas corpus) e o direito ao acesso a informações
pessoais (protegido pelo habeas data). No caso, se referirá a algum dos direitos coletivos: direitos difusos,
direitos coletivos stricto sensu e direitos individuais homogêneos.
Legitimidade ativa: pertence a partido político com representação no Congresso Nacional, organização
sindical, entidade de classe e associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um
ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados. Exige-se pertinência temática entre esses
legitimados e os interesses tutelados. Seu objeto será os direitos coletivos e os individuais homogêneos. A
coisa julgada será limitada aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante.
O MS coletivo não induz litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada não
beneficiarão o impetrante a título individual se não requerer a desistência de seu mandado de segurança no
prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência comprovada da impetração da segurança coletiva.
Cabimento: Não cabe mandado de segurança diante de: 1) atos de gestão comercial praticados por
administradores de empresas públicas, sociedade de economia mista e concessionária de serviço público; 2)
atos que caiba recurso administrativo com efeito suspensivo; 3) decisão judicial que admita recurso com
efeito suspensivo; 4) decisão judicial transitada em julgado; e 5) lei em tese.
Aspectos procedimentais: 1) não há efeitos da revelia, mesmo diante da inércia da autoridade coatora e
da pessoa jurídica respectiva; 2) podem ser determinadas astreintes; 3) no MS coletivo, a concessão de
liminar deve ser precedida de audiência com o representante judicial da pessoa jurídica de direito público;
4) a decisão final poderá ou não formar coisa julgada impugnável via ação rescisória, o que dependerá de ter
ou não havido congnição aprofundada.

Suspensão da segurança: conquanto o nome pareça indicar ser instituto próprio do mandado de
segurança, trata-se de medida utilizável em vários tipos de ações, e é manejada para evitar grave lesão à
ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. Compete ao Presidente do Tribunal ao qual seria
encaminhado eventual recurso julgar a suspensão da segurança, que se indeferido, possibilitará novo
pedido de suspensão perante o Presidente do Tribunal competente para julgar eventual Recurso Especial ou
Extraordinário. Esse instituto é incidental, não possui prazo para a sua utilização nem previsão de
procedimento específico, podendo ser utilizada por meio de petição ou no bojo do recurso cabível. Não
discute o mérito, pelo que nunca poderá ser atacada via ação rescisória. Sobre a manutenção da decisão
concessiva da suspensão de segurança, ver a Súmula 626 do STF.
Teoria do fato consumado: Segundo esta teoria, as situações jurídicas consolidadas pelo decurso do
tempo, amparada por decisão judicial, não devem ser desconstituídas, em razão do princípio da segurança
jurídica e da estabilidade das relações sociais (STJ, REsp. 709.934). Trata-se de tema polêmico e é resolvido
em conformidade com o caso concreto.
Atualmente tanto o STF quanto o STJ aplicam esta teoria somente em casos excepcionais, nos quais a
inércia da administração ou a morosidade do Judiciário deram causa a que situações precárias se
consolidassem pelo decurso do tempo, quando a restauração da estrita legalidade ocasionaria mais danos
sociais do que a manutenção da situação consolidada pelo decurso do tempo.
Em relação a concursos públicos, em regra, STF e STJ negam a aplicação da teoria do fato consumado
em relação a candidato que consegue provimento liminar para manter-se no concurso público, mas que ao
final a ação é julgada improcedente. Nestes casos, as mencionadas cortes entendem que o candidato não
tem direito à permanência no cargo.

Recursos:
a) Da decisão que denega ou concede a segurança: apelação (art. 14, caput, L. 12016/09);
b) Da concessão de segurança sem recurso: remessa necessária (art. 14, §1º, L. 12016/09);
c) Da concessão da ordem em decisão proferida em única instância pelos tribunais no MS: recurso
especial e extraordinário (art.18, L. 12016/09);
d) Da denegação da ordem em decisão proferida em única instância pelos tribunais no MS: recurso
ordinário (art.18, L. 12016/09)

Jurisprudência: 1. É plenamente possível que o impetrante desista do mandado de segurança


impetrado. Vale ressaltar que, para que haja a desistência do MS, não é necessária a concordância da parte
adversa (STJ. REsp 930.952-RJ). O STF afirmou que não é cabível a desistência de mandado de segurança
182
quando sucessivos recursos incabíveis nele utilizados fazem crer que a parte buscava a não formação da
coisa julgada e a desistência se prestaria apenas para autorizar nova ação em 1º grau para "ganhar tempo"
(STF, Info 781). 2. Se a autoridade removeu servidor sem motivação, mas ela, ao prestar as informações no
mandado de segurança, trouxe aos autos os motivos que justificaram a remoção, o vício que existia foi
corrigido (STJ, Info 529). 3. Hipóteses de MS por parlamentar a respeito do processo legislativo: a) PEC que
viole cláusula pétrea; b) PEC ou projeto de lei cuja tramitação esteja ocorrendo com violação às regras
constitucionais sobre o processo legislativo (STF, Info 711). 4. Indicação incorreta da autoridade coatora,
pode o juiz mandar emendar a inicia? 2 posições: 1ª) NÃO. Havendo erro na indicação da autoridade
coatora, deve o juiz extinguir o processo sem julgamento do mérito (STJ, 2012); 2ª) SIM. Nos casos de
equívoco facilmente perceptível, o juiz competente para julgar o MS pode autorizar a emenda da petição
inicial ou determinar a notificação, para prestar informações da autoridade adequada, desde que seja
possível identifica-la pela simples leitura da inicial e exame da documentação anexada (STJ, Info 551). 5. O
termo inicial do prazo decadencial para a impetração de mandado de segurança no qual se discuta regra
editalícia que tenha fundamentado eliminação em concurso público é a data em que o candidato toma
ciência do ato administrativo que determina sua exclusão do certame, e não a da publicação do edital do
certame. (STJ, Info 545). 6. Não é cabível a intervenção de amicus curiae em mandado de segurança. (STF,
Info 755). 7. O termo inicial do MS impetrado do ato que suprime ou reduz vantagem de servidor será: a) a
data em que o prejudicado tomou ciência do ato, na hipótese de supressão, pois há ato único; b) o prazo
renova-se mês a mês, pois se trata de prestação de trato sucessivo (STJ, Info 513, 2012). 8. A União pode
intervir em MS impetrado contra ato do CNJ, mesmo que no processo esteja sedo discutido um concurso
público do Tribunal de Justiça, que é estadual (STF, Info 701, 2013). 9. Não há sucessão processual em MS.
Assim, falecendo o impetrante, o MS será extinto sem resolução do mérito ainda que já esteja em fase de
recurso. (STJ, Info 528, 2013). 10. Na hipótese de interposição do incidente de suspensão de liminar
previsto no art. 4º, § 3º, da Lei 8.437/992, não incide o art. 188 do CPC/73 (que conferia prazo em dobro
para recorrer à Fazenda Pública ou ao MP) (STJ, Info 523, 2013). 11. Compete ao juiz da vara federal com
atuação na cidade de domicílio do impetrante processar e julgar MS impetrado por promotor de justiça
contra ato administrativo de procurador regional eleitoral, desde que não se trate de matéria eleitoral
(STF, Info 746, 2014). 12. Em relação ao MS impetrado contra ato do presidente de seccional da OAB, o STJ
tem entendimento no sentido de que a competência é da Justiça Federal (AgRg no REsp 1.255.052-AP). 13. O
reconhecimento da repercussão geral pelo STF não implica, necessariamente, a suspensão do MS em trâmite
no STJ, pois o que fica sobrestado são os recursos. Portanto, o STJ poderá julgar normalmente o writ (STJ,
Info 519, 2013). 14. O mandado de segurança não é a via adequada para aferir critérios utilizados pelo TCU,
já que a análise pericial necessária é incompatível com o rito (STF, Info 816). 15. Na vigência do CPC/1973, o
STJ possuía entendimento consolidado no sentido de que o "princípio da causa madura" não se aplicava ao
recurso ordinário em mandado de segurança. Esta posição deverá ser alterada em razão do art. 1.027, § 2º
do CPC/2015. 16. Os efeitos financeiros, por ocasião da concessão da segurança, devem retroagir à data de
sua impetração, devendo os valores pretéritos ser cobrados em ação própria. (STJ, 2018).

14C. Apelação. Recurso Ordinário Constitucional.

Laiz Mello

I. Apelação

Da sentença – terminativa ou definitiva – cabe apelação. Pouco importa que o juiz tenha resolvido na
sentença questões que, acaso decididas em momento anterior do procedimento, desafiariam o recurso de
agravo de instrumento: decididas na sentença, o recurso cabível é o de apelação (art. 1.015, § 3º)13. No novo
Código, a apelação também se presta para impugnar todas as questões decididas ao longo do procedimento
que não comportarem recurso de agravo de instrumento (art. 1.009, § 1º), as quais são infensas à preclusão

13
Excepcionalmente, contudo, há dois casos de sentenças que não são apeláveis: (a) sentença proferida em execução fiscal de valor igual ou inferior a
50 ORTN → impugnável por embargos infringentes de alçada; e (b) sentença que decreta falência → impugnável por agravo de instrumento. Obs. 1: o
STJ não admite princípio da fungibilidade no caso em que a parte interpõe apelação, sendo hipótese de embargos infringentes de alçada. Obs. 2: a
decisão sobre tutela provisória proferida no bojo da sentença é impugnável por apelação. Havia polêmica na vigência do CPC/73, se o capítulo da
sentença que versava sobre tutela provisória seria impugnável por agravo de instrumento ou por apelação. O CPC/15 colocou fim à controvérsia,
passando a prever expressamente que “o capítulo da sentença que confirma, concede ou revoga a tutela provisória é impugnável na apelação” (art.
1.013, § 5º).
183
e podem ser debatidas como preliminar de apelação ou de contrarrazões (art. 1.015, §§ 1º e 2º).

A apelação tem devolutividade ampla, ou seja, permite a impugnação de qualquer vício encontrado
na sentença, seja de forma (error in procedendo), seja de julgamento (error in iudicando). Sentença
prolatada com vício de forma deve ser anulada na instância recursal e baixados os autos para prolação de
nova decisão no primeiro grau de jurisdição, salvo se a causa se encontrar madura para imediato
julgamento (art. 1.013, § 3º). Sentença prolatada com vício de julgamento importa na simples reforma, com
a substituição por outra decisão na instância recursal, que deverá reapreciar o caso apresentado pelas partes,
sem necessidade de retornar o feito para o primeiro grau de jurisdição.

Em situações excepcionais, é possível arguir temas novos na apelação, não apresentados no juízo a
quo (art. 1.014). Essa possibilidade se liga à existência de questões de fato, não oferecidas no juízo a quo,
por motivo de força maior, que, segundo entende a doutrina, estaria presente nas seguintes situações: i)
superveniência do fato (fato novo, ulterior à publicação da sentença); ii) ignorância do fato pela parte (ciência
nova de fato velho); iii) impossibilidade efetiva de comunicar o fato ao advogado ou ao juiz a tempo; iv)
impossibilidade de provar o fato até a sentença. As novas alegações ainda poderão ser apresentadas
diretamente ao tribunal em duas outras situações: no caso do recurso interposto por terceiro prejudicado
(art. 996, parágrafo único) e de questões de ordem pública.

O prazo para a interposição da apelação é de quinze dias (art. 1.003, § 5º), em petição escrita,
dirigida ao juiz da causa, contendo especificamente: i) os nomes e a qualificação das partes; ii) a exposição do
fato e do direito; iii) as razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade; e iv) o pedido de nova
decisão (art. 1.010). O desatendimento à regularidade formal do recurso (art. 1.010) leva ao não
conhecimento por ausência de requisito extrínseco de admissibilidade recursal, acaso não sanado
oportunamente (art. 932, parágrafo único). Ademais, impõe-se ao recorrente o ônus de contrastar
efetivamente a sentença nas razões recursais (art. 1.010, II e III).

A sentença em regra não é suscetível de retratação. No entanto, nos casos de indeferimento da


petição inicial (art. 331), de improcedência liminar (art. 332) e de sentenças terminativas (art. 485, § 7º),
permite-se a retratação, isto é, que o juiz modifique o seu julgamento, à vista da interposição da apelação.
Não sendo o caso de retratação, o apelado será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de quinze
dias. Se o apelado interpuser apelação adesiva, o juiz intimará o apelante para apresentar contrarrazões.
Realizado o contraditório, os autos serão remetidos ao tribunal independentemente de juízo de
admissibilidade no primeiro grau de jurisdição (o juízo de primeiro grau não tem mais competência para
deixar de conhecer o recurso de apelação).

Recebido o recurso de apelação no tribunal e distribuído imediatamente, o relator poderá decidi-lo


monocraticamente a fim de: i) declarar a sua inadmissibilidade (poderá “não conhecer de recurso
inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão
recorrida”, art. 932, III); ii) negar provimento ao recurso contrário a precedentes do Supremo Tribunal Federal
e do Superior Tribunal de Justiça ou contrário à jurisprudência firmada em incidente de resolução de
demandas repetitivas, em incidente de assunção de competência ou enunciada em súmula do próprio
tribunal (art. 932, IV); e iii) depois de facultado o contraditório, dar provimento ao recurso se a decisão
recorrida for contrária a precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça ou
contrário à jurisprudência firmada em incidente de resolução de demandas repetitivas, em incidente de
assunção de competência ou enunciada em súmula do próprio tribunal (art. 932, V). Julgado
monocraticamente o recurso de apelação, a parte interessada poderá interpor agravo interno para levar a
causa ao conhecimento do colegiado (art. 1.021). Se não for o caso de decisão monocrática, o relartor
elaborará seu voto para julgamento do recurso pelo órgão colegiado (art. 1.011, II).

A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada (tantum devolutum


quantum appellatum, art. 1.013). Ao examiná-la, o tribunal ficará a princípio adstrito à matéria impugnada,
devendo decidir o recurso nos limites do pedido. Independentemente de efetiva impugnação pela parte,
restam submetidas ao tribunal, em face do efeito translativo, as questões conhecíveis de ofício (por exemplo,
arts. 337, § 5º, 485, § 3º, 487, II), bem como todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que
184
não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado e todos os fundamentos arguidos
pelas partes no primeiro grau de jurisdição que podem servir para solução do caso levado a juízo (art. 1.013,
§§ 1º e 2º)14.

Ademais, o novo Código é expresso em admitir que o tribunal conheça de questões não decididas em
primeiro grau de jurisdição quando “a causa estiver em condições de imediato julgamento” (isto é, quando
não for necessária instrução probatória diversa daquela já realizada – “causa madura”15) e reformar sentença
terminativa, decretar nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa
de pedir, constatar omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá julgá-lo e decretar a
nulidade da sentença por falta de fundamentação (art. 1.013, § 3º). O mesmo vale quando a decisão
reformar sentença que “reconheça a decadência ou a prescrição” (art. 1.013, § 4º).

O direito brasileiro não admite como regra a eficácia imediata da sentença. Vale dizer: não admite
como regra, em sendo o caso, o cumprimento imediato da sentença. Desse modo, em regra, a apelação tem
efeito suspensivo (art. 1.012)16, motivo pelo qual, ressalvadas hipóteses muito específicas, a sentença não
produz efeitos enquanto pende o prazo para a sua interposição e após seu oferecimento, exceto para o fim de
constituir hipoteca judiciária (art. 495). Será a apelação recebida apenas no efeito devolutivo, sem impedir-se
que a sentença produza efeitos na pendência do recurso, quando: “I – homologa divisão ou demarcação de
terras; II – condena a pagar alimentos17; III – extingue sem resolução do mérito ou julga improcedentes os
embargos do executado; IV – julga procedente o pedido de instituição de arbitragem; V – confirma, concede
ou revoga tutela provisória; VI – decreta interdição”. Fora do sistema do Código, ainda, a sentença concessiva
de mandado de segurança também tem eficácia imediata (art. 14, §§ 1º e 3º, da Lei 12.016/09).

Quando a apelação é recebida apenas no efeito devolutivo, a parte interessada pode, querendo e em
sendo o caso, requerer o cumprimento imediato da sentença (art. 1.012, § 2º). Nada obsta igualmente que o
apelante, querendo impedir a eficácia imediata da sentença, peça a concessão de efeito suspensivo ao
tribunal competente para julgar a apelação. Nesse caso, o pedido deve ser formulado: I – ao tribunal, no
período compreendido entre a interposição da apelação e sua distribuição, ficando o relator designado para
seu exame prevento para julgá -la; e II – ao relator, se já distribuída a apelação. A concessão de efeito
suspensivo ope judicis à apelação depende da demonstração da probabilidade de provimento do recurso e
da existência de perigo na demora (arts. 995, parágrafo único e 1.012, § 4º).

II. Recurso Ordinário Constitucional

O recurso ordinário equivale em tudo a uma apelação. É um recurso com ampla devolutividade
dirigido às Cortes Supremas (Supremo Tribunal Federal ou Superior Tribunal de Justiça), tendo lugar em
matérias civis geralmente atribuídas à competência originária de tribunais.

14
Neste caso, o tribunal pode decidir a respeito sem a proibição de reformatio in pejus, já que a matéria é translada ao conhecimento do tribunal
independentemente de qualquer manifestaçao de vontade da parte.
15
A aplicação do art. 1.013, § 3º, CPC, que independe de requerimento da parte (STJ, REsp 819.165/ES), autoriza que o tribunal julgue desde logo a
causa - ainda que a partir de matéria não apreciada em primeiro grau - desde que as partes não tenham nada mais a alegar ou provar. Vale dizer: as
causas que admitem a aplicação do art. 1.013, § 3º são as causas maduras: os seus incisos são apenas exemplos. Causa madura é aquela cujo processo
já se encontra com todas as alegações necessárias feitas e todas as provas admissíveis colhidas.
16
Note-se que a sentença de procedência tem a sua eficácia inibida pela contingência de encontrar-se sujeita ao recurso de apelação. Ao referir que a
apelação tem "efeito suspensivo" (art. 1.012, caput, CPC), não permite o nosso legislador que a sentença, enquanto sujeita ao recurso de apelação -
durante o prazo para sua interposição - e enquanto se aguarda o julgamento do tribunal, produza seus efeitos. Rigorosamente, pois, a apelação não
suspende o efeito da sentença de procedência: não permite a sua produção. De um lado, trata-se de opção evidentemente questionável, na medida
em que não permite uma adequada distribuição do peso do tempo no processo de acordo com a evidência da posição jurídica sustentada pela parte.
Observe-se que quem tem de suportar o tempo de tramitação do recurso é a parte que dele precisa para lograr uma situação mais vantajosa no
processo. De outro, essa mesma opção encerra uma incômoda contradição em nosso sistema de tutela dos direitos, porquanto, ao mesmo tempo em
que admite a eficácia imediata da tutela antecipatória, lastreada em cognição sumária (juízo de probabilidade), não permite, salvo em contadas
exceções, a eficácia imediata da sentença de procedência, que tem esteio em cognição exauriente (juízo de verdade). O novo Código perdeu a
oportunidade de corrigir essa evidente contradição em nosso sistema.
17
O STJ tem precedentes no sentido de que a sentença que majora a prestação alimentar também produz efeitos imediatamente, não tendo efeito
suspensivo a apelação que a ataca (STJ, REsp 28.144/SP). Não assim, todavia, consoante a jurisprudência dessa mesma Corte, a sentença que exonera
o demandante do dever de pagar alimentos, que desafia recurso de apelação com efeito suspensivo (STJ, REsp 9.393/SP). Se a sentença julga ao
mesmo tempo procedente o pedido de reconhecimento de paternidade e o pedido condenatório ao pagamento de alimentos, a “apelação interposta,
quanto à condenação à prestação alimentícia, será recebida tão somente no efeito devolutivo” (STJ, REsp214.835/PR), devendo ser recebida, quanto à
parte que julgou o reconhecimento de paternidade, com efeito suspensivo.
185
Recurso ordinário para o STF. De um lado, conforme prevê o art. 102, II, da CF, cabe recurso ordinário
em matéria cível para o Supremo Tribunal Federal do julgamento de mandados de segurança, habeas data e
mandados de injunção, decididos em única instância pelos tribunais superiores, quando denegatória a
decisão – incluídos nessa noção os casos em que o julgamento é de extinção do processo sem resolução de
mérito. Por oportuno, anote-se que quando a decisão for concessiva, caberá apenas recurso extraordinário18.

Recurso ordinário para o STJ. De outro, conforme prevê o art. 105, II, da CF, cabe recurso ordinário
em matéria cível para o Superior Tribunal de Justiça nos casos de julgamento de mandados de segurança,
decididos em única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito
Federal e dos Territórios, quando denegatória a decisão (ou ainda quando a decisão for de extinção do
processo sem resolução do mérito – anote-se que, se concessiva a decisão, poderão ser interpostos recurso
extraordinário ou recurso especial, conforme o caso19), bem como das causas, julgadas por juiz federal,
envolvendo Estado estrangeiro ou organismo internacional de um lado e de outro Município ou pessoa
residente ou domiciliada no Brasil. Nessa última hipótese, o recurso ordinário somente caberá da sentença do
magistrado, pois das decisões interlocutórias mencionadas no art. 1.015 caberá agravo de instrumento. O
juízo competente para conhecer do recurso ordinário também é competente para conhecer dos agravos
interpostos contra decisões interlocutórias. Assim, das decisões interlocutórias caberá agravo para o Superior
Tribunal de Justiça (art. 1.027, §1º, CPC).

Sendo o recurso ordinário um recurso símile à apelação, a sua disciplina é aplicável no que couber
(art. 1.027, § 2º) – como exemplo, a possibilidade de julgamento imediato da causa madura. Quando for o
caso, porém, a obtenção de efeito suspensivo obedece à forma própria existente para sua outorga em
recurso especial e recurso extraordinário (art. 1.029, § 5º). O recurso ordinário deve ser interposto, no prazo
de 15 dias (art. 1.003, §5º, CPC), perante o tribunal de origem, cabendo ao seu presidente ou vice-presidente
determinar a intimação do recorrido para, no mesmo prazo, apresentar as contrarrazões. Findo esse prazo, os
autos serão remetidos independentemente de juízo de admissibilidade (art. 1.028, § 3º). Além das
disposições concernentes à apelação, aplicam-se no mais aquelas constantes dos regimentos internos do
Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.

15A. Incidente de arguição de inconstitucionalidade. Incidente de assunção da competência. Ação monitória.


Arguição incidental de inconstitucionalidade.

Samara Dalloul

Incidente de assunção de competência

Noção geral: (art. 947, CPC) em julgamento de questão relevante de direito, com grande repercussão
social e sem múltipla repetição, poderá o relator do recurso, remessa necessária ou feito de competência
originária propor a assunção de competência para julgá-lo por órgão colegiado que o regimento interno
previr.

Objetivo: prevenir ou dirimir controvérsia a respeito da matéria e orientar juízes mediante a formação de
precedente ou jurisprudência vinculante. Se a questão possuir repetição o adequado é o IRDR ou a técnica de
recursos repetitivos.
18
Já admitiu o Supremo Tribunal Federal a conversão de recurso extraordinário interposto inadequadamente em recurso ordinário, aplicando a regra
da fungibilidade recursal – nada obstante o teor da súmula 272, STF ("não se admite como recurso ordinário recurso extraordinário de decisão
denegatória de mandado de segurança"). A decisão pela fungibilidade é acertada e é a que melhor se adequa ao sistema do novo Código, que
privilegia a prolação de decisões de mérito em detrimento de decisões meramente processuais para os litígios. A decisão denegatória que desafia a
interposição de recurso ordinário é a decisão denegatória do colegiado do tribunal superior – se aplicado na origem o art. 932, III a V, CPC, a
jurisprudência entende que o acesso ao recurso ordinário fica condicionado à interposição do agravo interno (art. 1.021, CPC) ao colegiado. O
Supremo Tribunal Federal não tem competência para conhecer originariamente de mandado de segurança contra atos de outros tribunais (súmula
624, STF: "não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer originanamente de mandado de segurança contra atos de outros tribunais").
19
O Superior Tribunal de Justiça já se negou a aplicar a regra da fungibilidade recursal na hipótese de interposição de recurso especial no lugar de
recurso ordinário, entendendo aí a existência de erro grosseiro. Essa orientação tem de ser revista, tendo em conta a necessidade de se prestigiar a
prolação de decisões de mérito em detrimento de decisões processuais (arts. 6º e 932, parágrafo único, CPC). Se aplicado na origem o art. 932, III a V,
CPC, a jurisprudência entende que o acesso ao recurso ordinário para o Superior Tnbunal de Justiça está condicionado à interposição de agravo interno
(art. 1.021, CPC), a fim de que esgotada a instância. O Superior Tribunal de Justiça não tem competência para conhecer originalmente de mandado de
segurança contra atos de outros tribunais (súmula 41, STJ: "o Superior Tribunal de Justiça não tem competência para processar e julgar,
originariamente, mandado de segurança contra ato de outros tribunais ou dos respectivos órgãos").
186
Legitimidade: podem suscitar o relato de ofício, a parte, o MP ou a DP. O recurso será remetido ao órgão
incumbido de examinar a questão, que decidirá se há ou não interesse público em seu julgamento.

Procedimento: em razão do amplo alcance dos efeitos da decisão, o procedimento deve ser idêntico
àquele utilizado para o IRDR (Arenhardt). Para que terceiros possam ser prejudicados pela decisão do
incidente é necessária a intervenção dos legitimados para a tutela coletiva para garantir a representação
adequadas dos interessados ausentes. Sem essa representação qualquer terceiro poderá, no futuro, alegar a
não vinculatividade à decisão no incidente, sob pena de violação ao contraditório. As razões do acórdão
vinculam todos os órgãos fracionários e todos os juízes submetidos à autoridade do tribunal que o proferiu
(ressalvada a possibilidade de revisão da tese).

Incidente de arguição de inconstitucionalidade

Noção geral: (arts. 948-950, CPC) se qualquer dos participantes afirma a inconstitucionalidade de lei ou
ato normativo em suas manifestações processuais, o tribunal só poderá apreciar o tema a fim de decretar a
inconstitucionalidade por seu plenário ou órgão especial. Verificada a arguição de inconstitucionalidade em
órgão fracionário, poderá, de ofício ou a requerimento, submeter a questão ao colegiado, ouvido o MP e as
partes, para que se possa instaurar ou não o incidente. Trata-se do procedimento para afetar ao órgão
competente a arguição incidental ou principal de constitucionalidade no controle difuso.

Se a arguição for rejeitada, prosseguirá o julgamento no órgão fracionário (não desafia recurso). Admitido
o incidente, a questão é submetida ao plenário ou órgão especial.

Dispensa: Se a questão já foi examinada pelo plenário ou órgão especial do próprio tribunal ou pelo
plenário do STF, o órgão fracionário está dispensado de submeter a tese ao tribunal.

Procedimento: Remetida cópia do acórdão para todos os membros do plenário ou órgão especial, o
presidente designará sessão de julgamento. Somente a questão de inconstitucionalidade pode ser debatida.
Pode haver a oitiva da pessoa jurídica responsável pela edição do ato, MP, legitimados da ADIn, e setores
sociais (amicus curiae). A decisão a respeito da constitucionalidade ou inconstitucionalidade é irrecorrível,
salvo por embargos de declaração.

Arguição incidental de inconstitucionalidade

Noção geral: o controle de constitucionalidade pode ocorrer incidentalmente ou por via direta. De forma
incidental (como razão de decidir), qualquer magistrado pode exercer o controle de constitucionalidade das
leis e dos atos normativos, sem ensejar intervenção do MP. Prevalece atualmente o entendimento de que a
questão constitucional deve ser enfrentada sempre que possível, ainda que de ofício pelo juiz, quando do
controle incidental.

Características: a decisão proferida em sede de controle concreto produz consequências jurídicas


abstratas, independentes do feito originário. Sua característica reside em ter surgido e se desenvolvido no
curso de um processo subjetivo. Nos tribunais, desde a CF/1934, a inconstitucionalidade deverá ser
declarada por voto da maioria absoluta de seus membros ou do órgão especial (art. 97, CRFB/1988 – “ full
bench” ou bancada cheia – “en bench” ou pela bancada). Trata-se de decorrência da presunção de
constitucionalidade das leis.

Legitimidade e competência: Quem argui a inconstitucionalidade são as partes ou o MP, o juiz ou


quaisquer dos magistrados do órgão jurisdicional. O relator submete a arguição à câmara, turma, ou outro
órgão fracionário competente para o julgamento da causa. Se rejeitada a alegação, prossegue o julgamento.
Se o órgão fracionário, por maioria simples, entender que procede a arguição, remete ao pleno, nos termos
do art. 97, CR/88 (CPC, art. 949 O MP deve ser ouvido (art. 948, CPC).

187
A decisão do pleno ou do órgão especial que acolher a arguição de inconstitucionalidade é irrecorrível
(salvo para minoria, representada por THEODORO JÚNIOR), somente cabendo recurso da decisão
posteriormente proferida pelo órgão fracionário. Nesse caso, para fins de recurso extraordinário, necessário
que a parte junte o acórdão plenário ao recurso, sob pena de não ser conhecido. S.513/STF: A decisão que
enseja a interposição de recurso ordinário ou extraordinário não é a do plenário, que resolve o incidente de
inconstitucionalidade, mas a do órgão (câmaras, grupos ou turmas) que completa o julgamento do feito.). Só
a inconstitucionalidade é reservada ao plenário, a constitucionalidade não.

SV10/STF: viola a cláusula de reserva de plenário a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora
não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua
incidência, no todo ou em parte.

Desnecessidade da reserva de plenário (CPC, 949, p.u.): quando a inconstitucionalidade já houver sido
pronunciada em decisão anterior no plenário ou órgão especial ou pelo plenário do STF.

Repercussão: o órgão fracionário fica vinculado ao entendimento fixado pelo pleno ou órgão especial,
produzindo-se um “self restraint” com relação ao próprio tribunal que decidiu a questão. Isso ocorre,
inclusive, com o próprio STF, como ressaltam BRANCO e MENDES: se o Tribunal julgar necessário rever seu
entendimento, novo procedimento é imposto, na forma do art. 97 da CRFB/1988.

Fenômeno da abstração das decisões proferidas em sede de controle incidental: dispensa da remessa ao
órgão especial/pleno caso já tenha se pronunciado a respeito; aplicação do art. 932, IV do CPC (negativa de
seguimento pelo relator).

Nas ADIs xxx e xxx o STF adotou expressamente a tese de eficácia vinculante da arguição incidental de
inconstitucionalidade no bojo de uma ação de controle concentrado de constitucionalidade (no julgamento
de uma das ADIs declarou a lei em análise constitucional e, incidentalmente, uma lei que não fazia parte do
pedido como inconstitucional). Utilizou-se antigo entendimento de Gilmar Mendes no sentido de mutação
constitucional do art. 52, X da CRFB (Senado não suspende a norma, apenas dá publicidade). Ressalte-se que
não se enfrentou ainda a questão do controle difuso, mas da arguição incidental em controle concentrado.

Para Lordelo tratou-se de aplicação da transcendência dos motivos determinantes. Para Marcio
Cavalcante (DoD) NÃO houve essa adoção, já que não se tratou de transcendência dos motivos
determinantes, mas de uma arguição específica (inconstitucionalidade) – para ele houve a adoção apenas de
técnica de abstrativização do controle difuso.

Ação monitória.

Conceito e aspectos gerais: instrumento processual colocado à disposição do credor de quantia


certa, de coisa fungível, infungível, bem móvel ou imóvel ou prestação de fazer/não fazer, comprovado por
qualquer documento escrito sem eficácia de título executivo, para que possa requerer ao juiz a expedição de
mandado de pagamento ou de entrega de coisa para satisfação de seu direito. A ação monitória está prevista
entre os procedimentos especiais de jurisdição contenciosa (art. 700-702, CPC). Oportunidade de um credor
– portando prova literal do seu crédito, porém, destituída de eficácia executiva – manejar via processual mais
célere que o processo de conhecimento 20, com o intuito de obter um título executivo. Trata-se de tutela
jurídica diferenciada, com cognição sumária e contraditório diferido. Observa Marinoni que o legislador
inverteu o ônus da prova a respeito da discussão da existência ou inexistência do direito, desestimulando
defesas infundadas e permitindo presteza na tutela jurisdicional.

20
Marinoni assevera que como o legislador deixou de prever a execução imediata do mandado de pagamento na pendência de embargos
infundados, o procedimento comum, por vezes, pode ser mais efetivo que o monitório. A ação monitória só é vantajosa quando o réu não resiste
à pretensão inicial, pois, se oferecer embargos, se processará daí por diante pelo rito comum.
188
Características: (i) cognição sumária (de que pode decorrer o “mandado monitório”); (ii)
contraditório diferido (ante a possibilidade de provimento sem a oitiva do réu). O uso da via é facultativa ao
credor (diferentemente da via executiva).

Admissibilidade: prova escrita sem eficácia de título executivo. Influência do direito processual
italiano, adotando o procedimento monitório documental, e não puro (o qual se contenta com a mera
alegação do credor). Deve haver, na inicial, demonstrativo do cálculo (quando obriga

Objetivo: O CPC/73 previa as obrigações tuteláveis pela monitória. Já o NCPC não limita, permitindo
concluir que todas as obrigações são tuteláveis por ação monitória. Há grande utilidade para “ex-títulos
executivos”, como o cheque prescrito (Súmula 299/STJ); para “quase títulos executivos”, como o contrato
sem assinatura de duas testemunhas, duplicata sem aceite, contrato de abertura e crédito em conta-
corrente acompanhado do demonstrativo de débito (Súmula 247/STJ).

Monitória e Fazenda Pública: A Súmula 339/STJ foi confirmada pelo art. 700, §26º do NCPC,
prevendo monitória em face da Fazenda Pública. Precedentes do STJ apontam que, após a expedição do
mandado monitório, havendo ou não embargos monitórios da Fazenda, forma-se o título e instaura-se a
execução (art. 730, CPC). No entanto, isto não significa – para o STJ – que a Fazenda não possa cumprir a
obrigação espontaneamente. Pode (e deve) ela, em vez de oferecer embargos, pagar o montante, caso haja
previsão orçamentária para tanto (e.g. dívida de um contrato). Assim, reconhecendo a dívida, deve a Fazenda
Pública, também, efetuar espontaneamente o pagamento, sob pena de não se beneficiar da isenção de
custas e honorários. Há julgado dizendo que o prazo para a FP embargar é quadruplicado.

Incapaz como réu na ação monitória: polêmica se o incapaz pode ser réu na ação monitória. Minoria
da doutrina entende que sim, desde que esteja representado (DINAMARCO). Maioria entende que não, por
se tratar de direito indisponível – não se opera efeito material da revelia (art. 345, II, CPC). A necessária
atuação do MP nas ações de incapazes desvirtuaria o objetivo da monitória. Não se trata de uma questão de
ilegitimidade passiva, mas de falta de interesse de agir (inadequação da via).

Procedimento: Na inicial deve haver descrição dos fatos referentes à dívida. O juiz analisa
pressupostos processuais e condições da ação. No mérito monitório, analisa a verossimilhança das alegações
para, sendo caso, expedir o mandado monitório. Há uma análise, mesmo que sumária, do direito alegado (ao
contrário da execução). Em regra, nas ações de procedimento comum, o juiz não precisa fundamentar o
recebimento da petição inicial, bastando que determine a citação do réu. A situação é diferente no
procedimento monitório, porque, caso não haja resistência do réu, é essa decisão que, de pleno direito,
adquirirá eficácia de título executivo judicial. Então precisa ser fundamentada. Essa fundamentação deve
ser dada em cognição superficial (requisitos de admissibilidade). É possível tutela provisória no procedimento
monitório por não haver incompatibilidade.

Decreto injuntivo ou mandado monitório. A doutrina diverge sobre sua natureza: despacho, decisão
interlocutória ou sentença. Em todo caso, ele tem dupla função: citar o réu + ordenar o pagamento ou
entrega da coisa. STJ/REsp 712.575-DF: a decisão que converte o mandado em título executivo judicial tem
natureza de sentença de mérito; é a própria decisão que tem natureza de título executivo, e não o
documento juntado à inicial. Apenas se reconhece que é devida a obrigação nele subscrita, na forma
apresentada. Expede-se o mandado monitório, com prazo de 15 dias para o réu apresentar embargos
monitórios. Não se trata de processo executivo: é possível citação por edital (S.282/STJ). O réu pode: a)
pagar/entregar – ficando isento de custas e honorários; b) omitir-se – convertendo-se de pleno direito o
mandado monitório em título executivo judicial; e c) manejar embargos monitórios – que suspendem a
eficácia do mandado monitório. Formado o título judicial, inicia-se o cumprimento de sentença (523 ou 498,
CPC, conforme seja obrigação de pagar ou de entregar). A conversão do mandado monitório em mandado
definitivo equivale a sentença transitada em julgado e, por isso, admite ação rescisória, se presentes os
requisitos do art. 966, CP.

189
Embargos monitórios: Apresentados embargos, abre-se às partes todas as possibilidades de
alegações e provas (os embargos permitem que o juiz chegue a um juízo de cognição exauriente). Assim,
sob o ponto de vista da cognição, o procedimento monitório é dúplice: primeira fase (expedição do
mandado) de cognição sumária e segunda fase (sentença dos embargos) de cognição exauriente.

Natureza dos embargos monitórios: parte da doutrina entende ser uma ação. Há julgado da 2ª
Seção do STJ dizendo que é uma contestação, o que tornaria ordinário o rito, admitindo, assim, a
reconvenção (S.292/STJ). Essa parece ser a posição de Marinoni e Arenhardt.

Jurisprudência. (A) S.531/STJ: Em ação monitória fundada em cheque prescrito ajuizada contra o
emitente, é dispensável a menção ao negócio jurídico subjacente à emissão da cártula. S.504/STJ: O prazo
para ajuizamento de ação monitória em face do emitente de nota promissória sem força executiva é
quinquenal, a contar do dia seguinte ao vencimento do título. S.503/STJ: O prazo para ajuizamento de ação
monitória em face do emitente de cheque sem força executiva é quinquenal, a contar do dia seguinte à data
de emissão estampada na cártula. S.384/STJ: cabe ação monitória para haver saldo remanescente oriundo
de venda extrajudicial de bem alienado fiduciariamente em garantia. (B) Não se exige o recolhimento de
custas iniciais para oferecer embargos à ação monitória; os embargos à monitória têm natureza jurídica de
defesa; é como se fosse uma contestação e o réu não precisa recolher custas para apresentar contestação
(STJ. 3ªT. REsp 1.265.509-SP, j. 19/3/2015 - Info 558). (C) O emai pode fundamentar a pretensão monitória,
desde que o juízo se convença da verossimilhança das alegações e da idoneidade das declarações. STJ. 4ª
Turma. REsp 1381603-MS, j. 6.10.2016 – Info 593.

15B. Ação Rescisória. Querela Nullitatis.

Leonardo Ferreira Mendes 21/09/18


I. Ação rescisória.

Conceito: Ação autônoma de impugnação, de natureza constitutiva negativa, que visa a desconstituir a coisa
julgada material (Assumpção).
Objeto da ação: Juízo rescindendo (iudicium rescindens) e juízo rescisório (iudicium rescissorium). Das
decisões de mérito, é cabível ação rescisória, nas hipóteses do art. 966, do CPC (rol taxativo). Não se
confunde rescindibilidade com nulidade ou com inexistência. A sentença inexistente não faz coisa julgada e
não é rescindível. Para que a sentença de mérito proferida pelo juiz no processo civil adquira autoridade de
coisa julgada, é necessária a presença dos pressupostos processuais de existência (jurisdição do juiz, petição
inicial, capacidade postulatória e, para alguns, a citação do réu). Abrange não apenas a sentença, mas toda
decisão, incluindo interlocutória, que julga o mérito do pedido (ex.: exclusão liminar de um litisconsorte).
Deve haver decisão de mérito transitada em julgado ou decisão transitada em julgado que embora não seja
de mérito impeça a propositura de nova demanda ou impeça a admissibilidade do recurso correspondente.
Ação rescisória em processos nos quais foram interpostos recursos: se houver interposição de recursos,
somente é rescindível acórdão que conhece do recurso e se pronuncia sobre o meritum causae. S.515/STF: a
competência para a ação rescisória não é do supremo tribunal federal, quando a questão federal, apreciada
no recurso extraordinário ou no agravo de instrumento, seja diversa da que foi suscitada no pedido
rescisório.
Aspectos processuais: É cabível rescisória de rescisória. Desnecessário prequestionamento. A legitimidade
para propor ação rescisória está prevista no art. 967 do CPC. O litisconsórcio passivo é necessário; mas o
ativo, é facultativo. O depósito de 5% do valor da causa não se aplica à Fazenda Pública, ao MP, à DP e aos
com justiça gratuita.
Peculiaridades: i) prazo para contestação: 15 a 30 dias. Aplicam-se os casos de prazo dobrado. Não se
aplicam efeitos CPC – 344 (interesse público manifesto na CJ). ii) Admite-se reconvenção em ação rescisória
se o objeto da reconvenção for, também, de rescindir a mesma sentença ou acórdão.
Prazo da ação rescisória: decadencial de 2 anos, iniciado a partir do trânsito em julgado da decisão proferida
no último recurso (Súmula 401/STJ). Para o STF, o prazo era contado do trânsito em julgado de cada capítulo
da sentença. Para o STJ (EDcl no AgRg nos EAg 1.218.222/MA, Corte Especial, DJe 15/02/2012), o dies a quo é
o trânsito em julgado da decisão proferida sobre o último recurso interposto, ainda que discuta apenas a
coisa julgada progressiva (admitida pelo STF, não admitida pelo STJ). Não há, para o STJ, trânsito em julgado

190
parcial, razão pela qual o prazo decadencial tem início somente após transitarem em julgado todos os
capítulos da decisão (Marinoni e Arenhart). Súmulas relacionadas ao tema: S.514/STF: admite-se ação
rescisória contra sentença transitada em julgado, ainda que contra ela não se tenha esgotado todos os
recursos. Com o novo Código Civil, prevaleceu a posição do STJ, conforme art. 975, do CPC. Não foi
encontrada decisão do STF a respeito do art. 975. Aplica-se os casos de julgamento de improcedência
prima facie, do art. 332, do CPC. Se fundada a ação no inciso VII do art. 966, o termo inicial do prazo será a
data de descoberta da prova nova, observado o prazo máximo de 5 (cinco) anos, contado do trânsito em
julgado da última decisão proferida no processo. Nas hipóteses de simulação ou de colusão das partes, o
prazo começa a contar, para o terceiro prejudicado e para o Ministério Público, que não interveio no
processo, a partir do momento em que têm ciência da simulação ou da colusão. Os atos de disposição de
direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem
como os atos homologatórios praticados no curso da execução são casos de ação anulatória e não de ação
rescisória. Entretanto, o STJ admite o emprego da ação rescisória nos casos de nulidade absoluta, uma vez
que tal espécie de vício pode ser alegado por qualquer meio processual.
Súmulas: S.343/STF: Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão
rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais. S.264/STF: verifica-
se a prescrição intercorrente pela paralisação da ação rescisória por mais de cinco anos. S.252/STF: na ação
rescisória, não estão impedidos juízes que participaram do julgamento rescindendo. S. 249/STF: é
competente o supremo tribunal federal para a ação rescisória, quando, embora não tendo conhecido do
recurso extraordinário, ou havendo negado provimento ao agravo, tiver apreciado a questão federal
controvertida. S.401/STJ: o prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer
recurso do último pronunciamento judicial. S.175/STJ: descabe o deposito prévio nas ações rescisórias
propostas pelo INSS.
Julgados recentes: (A) A decisão do STF que declara a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade de
preceito normativo não produz a automática reforma ou rescisão das decisões proferidas em outros
processos anteriores que tenham adotado entendimento diferente do que posteriormente decidiu o STF.
Para que haja essa reforma ou rescisão, será indispensável a interposição do recurso próprio ou, se for o
caso, a propositura da ação rescisória própria, nos termos do art. 485, V, do CPC 1973 (art. 966, V do
CPC/15), observado o prazo decadencial de 2 anos (STF. Plenário. RE 730462/SP, j. 28/5/2015, Inf. 787). (B)
Não cabe ação rescisória em face de acórdão que, à época de sua prolação, estava em conformidade com a
jurisprudência predominante do STF (STF. Plenário. AR 2199/SC, j. 23/4/2015 - Inf 782). (C) O prazo
decadencial para a propositura de ação rescisória começa a correr da data do trânsito em julgado da
sentença rescindenda, incluindo-se no cômputo o dia do começo; o termo final do prazo para o ajuizamento
da ação rescisória, embora decadencial, prorroga-se para o primeiro dia útil subsequente se recair em dia de
não funcionamento da secretaria do Juízo competente (STJ. Corte Especial. REsp 1.112.864-MG, j.
19/11/2014 -Inf 553) – esse entendimento foi adotado pelo novo CPC, art. 975, §1º. (D) Somente quando
não for cabível qualquer recurso, terá início o prazo para a ação rescisória em relação à todos os capítulos da
sentença (STJ. Corte Especial. REsp 736.650, j. 20/08/2014); o prazo para a rescisória se iniciará para cada
capítulo à medida que ele transitar em julgado (STF. 1ªT. RE 666589, j. 25/03/2014).

II. Querela nullitatis.

Conceito e noções gerais: meio de impugnação da decisão judicial (ou ação de nulidade da sentença -
minoria). Pode ser manejada mesmo após o prazo da ação rescisória.
Objeto: Tem por objeto a decisão proferida em desfavor do réu, em processo que correu à sua revelia, quer
porque não fora citado, quer porque o fora de maneira defeituosa (decisão com vícios transrescisórios). Há
doutrinadores que consideram que a citação é pressuposto de existência do processo, razão pela qual a
querela nullitatis é equiparada a uma ação declaratória de inexistência. Mas há críticas com relação a essa
postura, pois os atos existem, tanto assim que devem ser afastados via ação, e também porque pode ocorrer
convalidação. Para maioria da doutrina (incluindo Didier Júnior; Marinoni e Arenhart), a citação é
pressuposto processual de validade (e não propriamente de existência) do processo. A ausência de citação
seria, assim, vício transrescisório. Nessa hipótese, a sentença seria impugnável pelo réu não citado a
qualquer tempo por meio de querela nullitatis.
Competência: A querela nullitatis tem hipótese de cabimento restrito e é ajuizada perante o juízo que
proferiu a decisão.
191
Réu não citado: no caso de o prejudicado ou revel apresentar impugnação, sendo anulado o processo,
desnecessária nova citação, porque já ingressou no feito voluntariamente. Ainda que não tenha ocorrido a
citação, se o executado, citado comparecer e não apontar o vício, ter-se-á por sanado, pela ocorrência da
preclusão, fato não explicado satisfatoriamente pela doutrina da Escola Processualista Paulista (Ada
Pellegrini, Cândido Rangel Dinamarco etc), que considera a citação como pressuposto de existência. Para
reconhecer esse defeito, Marinoni, minoritariamente, defende ser possível a utilização de impugnação (CPC,
art. 525, §1º, I ou art. 535, I) ou da ação do art. 966, §4º, do CPC, que seria ação declaratória de inexistência
de ato processual. O STJ, em decisão de 2017 (REsp 1456632), com base no antigo CPC, admitiu ação
rescisória quando cabível querela nullitatis. Mas também há decisão em sentido contrário (STJ, 2ªT, REsp
1105944/SC, DJ 08/02/2011).

15C. Incidente de Desconsideração de Personalidade Jurídica (IDPJ)

Robert Lucht
FONTE: Daniel Amorim Assumpção Neves, Novo CPC para Advogados, 2018.
Humberto Theodoro Júnior, Curso de Direito Processual Civil, vol I, 2018.

É um dos casos de intervenção de terceiros, conforme o NCPC. É a denominada disregard doctrine


do direito norte americano. O principal efeito da desconsideração da personalidade jurídica é imputar aos
sócios ou administradores da empresa a responsabilidade pelos atos fraudulentos praticados em prejuízo
de terceiros.

Quais são os requisitos para o IDPJ?


Requisitos materiais: nas leis específicas (em especial pelo art. 50, CC e art. 28, CDC)
Requisitos procedimentais: arts. 133 a 137, do NCPC.

IDPJ é obrigatório?
Apenas quando houver pedido formulado pela parte nesse sentido, salvo se tal requerimento já for
formulado na própria petição inicial do processo de conhecimento ou de execução, quando haverá um
litisconsórcio passivo inicial entre sociedade e sócios.

IDPJ é exigido para qualquer espécie de desconsideração da personalidade jurídica?


STJ reconhece que sim. Aplica-se o IDPJ (arts. 133 a 137, NCPC) à hipótese de desconsideração inversa da
personalidade jurídica, às hipóteses de desconsideração indireta e expansiva da personalidade jurídica
(Enunciado CJF 11).

Direta Inversa Indireta Expansiva


(tradicional)
PJ que, para ocultar seu PF que, para ocultar Empresa controladora Utilização de “laranjas”
bens, se utiliza de PF seus bens pessoais, se que comete fraudes e como sócios de
sócia utiliza de PJ abusos por intermédio empresas que cometem
de empresa controlada fraudes e abusos,
ou coligada buscando blindar os
reais sócios que
deveriam ser
responsabilizados

IDPJ é cabível nos Juizados Especiais?


Sim (art. 1.062, NCPC).

Em que momento pode ser suscitado o IDPJ?


Em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em
título executivo extrajudicial. Não há, portanto, preclusão temporal para a instauração do incidente.

O juiz pode desconsiderar a personalidade jurídica do demandado de ofício?

192
Parte da doutrina entende que sim (CDC, art. 28). Recomendável defender que é possível a decretação
judicial sempre que o direito material não permitir à parte fazê-lo.

É cabível o IDPJ antes da oitiva dos sócios?


Como regra, não, em razão do contraditório. Excepcionalmente, sim, no caso de decisão liminar de
acolhimento do pedido de desconsideração nas hipóteses previstas no art. 9º, parágrafo único, do NCPC. O
contraditório diferido, portanto, será admitido nas hipóteses de preenchimento dos requisitos de tutela
provisória – de urgência ou da evidência – no caso concreto. STJ tem precedente admitindo a penhora do
bem de sócios (antecipação prática da tutela definitiva de desconsideração da personalidade jurídica) antes
de sua citação. No mesmo sentido, o Enunciado 42 da I Jornada de Direito Processual Civil do CJF: “É cabível a
concessão de tutela provisória de urgência em incidente de desconsideração da personalidade jurídica”.

Qual o recurso cabível contra a decisão que resolve o IDPJ?


Se decidido na sentença, apelação.
Se decidido por decisão interlocutória, agravo de instrumento.
Se decidido monocraticamente por relator, agravo interno.

É obrigatória a intervenção do MP no IDPJ?


Não.

Aplica-se IDPJ no redirecionamento da execução fiscal tributária?


Prevalece que NÃO (STJ, maio/2017 + Orientação do II FONEF + Orientação do FOREXEC da 2ª Região).
(i) Requerimento se baseia na responsabilização do sócio por ato próprio e não na utilização abusiva da
personalidade jurídica, nos termos do art. 50 do CC/02;
(ii) Incompatibilidade do IDPJ com a Lei de Execuções Fiscais (LEF);
(iii) Responsabilidade não é determinada em decisão judicial mas decorre diretamente de lei;
(iv) IDPJ demanda dilação probatória, que somente é permitida, na execução fiscal, quando o juízo estiver
garantido, com o oferecimento de embargos;
(v) quando o legislador pretendeu que IDPJ fosse aplicado a um microssistema, ele foi expresso nesse
sentido.

Exceção: “novas” modalidades de desconsideração de personalidade jurídica não previstas expressamente


em leis, mas decorrentes de interpretação extensiva por parte do Judiciário (ex.: grupos econômicos). Nesses
casos, ainda que no reduto de uma ação regida pela LEF, doutrina especializada se inclina em considerar que
o IDPJ constitui o único caminho possível para fins de desconsideração, tendo em vista que o suporte
normativo do pedido seria exclusivamente o art. 50 do CC/02.

Enunciado ENFAM 53 – O redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente prescinde do IDPJ


previsto no art. 133, CPC/2015.

Aplica-se IDPJ no redirecionamento da execução fiscal não tributária (casos do art. 50, CC/02 – utilização
abusiva)?
Há julgados que dizem NÃO, em razão da incompatibilidade do incidente com a LEF
(POLÊMICO AINDA)!

A instauração do IDPJ suspende o processo?


Sim, salvo se requerida na petição inicial.

CPC/73 CPC/2015
Desconsidera e chama sócio para pagar dívida Chama sócio, este se manifesta e depois
desconsidera.

193
A nulidade quanto à falta de citação dos sócios em desfavor de quem foi superada a PJ é relativa
ou absoluta?
Relativa (STJ).

Segundo Didier, o IDPJ gera coisa julgada, permitindo o ingresso de ação rescisória.

16A. Sentenças e tutelas jurisdicionais dos direitos. Espécies. Ações declaratória, constitutiva, condenatória e
mandamental.

Caio Hideki Kusaba 16/09/18

Tutela jurisdicional é a proteção prestada pelo Estado quando provocado por meio de um processo,
gerado em razão de uma lesão ou ameaça de lesão a um direito.

É tradicional a lição que associa a tutela jurisdicional à espécie de crise jurídica que o demandante
busca solucionar por meio do processo. Tal ideia é ligada à teoria da ação de direito material de PONTES DE
MIRANDA, podendo ser apresentada a seguinte classificação:
1. Tutela jurisdicional de conhecimento: é apta a resolver três diferentes espécies de crise jurídica:
a) Ação meramente declaratória: resolve uma crise de certeza. Ao declarar a existência,
inexistência ou o modo de ser de uma relação jurídica, e excepcionalmente de um fato, a
sentença resolve a incerteza que existia;
b) Ação constitutiva: resolve uma crise de situação jurídica. Ao criar, extinguir uma modificar
uma relação jurídica, a sentença cria uma nova situação jurídica;
c) Ação condenatória: resolve uma crise de inadimplemento. Ao reconhecer esse
inadimplemento e imputar ao demandado o cumprimento de uma prestação, estará
resolvida a crise.
Importante observar que essa classificação está associada à teoria ternária das sentenças, que
reconhecem as sentenças executiva lato sensu e mandamental como figuras pertencentes à tutela
condenatória.
Porém, adotada a teoria quinária das sentenças, tem-se outras duas espécies de tutela:
a) Ação mandamental: contém uma ordem expedida para que alguma das partes faça ou deixe
de fazer algo.
b) Ação executiva lato sensu: a sentença determina, no seu próprio corpo e, portanto, sem a
necessidade de iniciativa por parte do autor, que o provimento jurisdicional seja efetivado,
sem necessidade de um processo ou fase de execução.

2. Tutela jurisdicional executiva: busca resolver uma crise de satisfação, considerando que já existe
um direito reconhecido, mas o seu titular não se encontra satisfeito em razão da resistência da parte
contrária.

3. Tutela jurisdicional cautelar: resolve-se uma crise de perigo, em razão do tempo necessário para a
concessão de uma tutela definitiva.

Entretanto, a classificação acima recebe críticas da doutrina, como de LUIZ GUILHERME MARINONI,
SÉRGIO CRUZ ARENHART e DANIEL MITIDIERO. Isso porque, ao classificar as ações, foram invocados
fundamentos que não estão em um mesmo plano lógico, ora fazendo referência ao seu conteúdo (“a ação
declarativa é ação a respeito de ser ou não ser a relação jurídica”), ora justificando-as com base no
comportamento do réu (“a ação de condenação supõe que aquele ou aqueles, a quem ela se dirige, tenham
obrado contra direito, que tenham causado dano”), ora caracterizando-as a partir do que o juiz faz (“a ação
mandamental prende-se a ato que o juiz ou outra autoridade deve mandar que se pratique”).

Por essa razão, pode ser apresentada outra classificação para as tutelas jurisdicionais, preocupada
apenas com os resultados do processo no plano do direito material. Por tal classificação, a tutela
jurisdicional pode ser dividida em:

194
1. Tutela preventiva (tem lastro no art. 497 do CPC/2015 e no art. 84 do CDC): voltada para o futuro,
visando evitar a prática do ato ilícito, o que pode ocorrer de três formas: (a) evitar a prática originária do ato
ilícito; (b) impedir a continuação do ato ilícito na hipótese de ato ilícito continuado; e (c) impedir a repetição
do ato ilícito.
A tutela preventiva pode ser subdividida em duas:
a) Tutela inibitória: no caso de ato ilícito que ainda não foi praticado ou de ato ilícito continuado. A
tutela tem por finalidade evitar a prática do ato ou impedir a sua continuação, respectivamente;
b) Tutela de remoção do ilícito: é possível que um ato ilícito não exista mais, mas seus efeitos
continuem a ser gerados, cabendo essa tutela.

2. Tutela reparatória ou ressarcitória: voltada para o passado, buscando a reparação pelo ato ilícito
praticado.

A diferenciação entre essas tutelas pode ficar mais clara com o seguinte exemplo: importação de
medicamento proibido. Se a ACP for ajuizada para evitar que ocorra a importação, antes que ela ocorra, a
tutela é preventiva e inibitória. Porém, se a importação já foi feita, mas ainda não houve a comercialização
do medicamento, a tutela é preventiva de remoção do ilícito (ex.: devolução, incineração, etc.). A seu turno,
se além de importada, a mercadoria já foi comercializada, o dano já ocorreu, e a tutela é ressarcitória.
As três tutelas são PLENAMENTE CUMULÁVEIS, ou seja, uma ACP pode ter, a um mesmo tempo, a
tutela preventiva em suas duas espécies e a tutela ressarcitória. Imaginando que no exemplo acima, o
medicamento já foi importado, comercializado, e a empresa pretende importar mais: o MP pode ajuizar ACP
para impedir nova importação (preventiva inibitória), retirada dos medicamentos já importados (preventiva
de remoção do ilícito) e ressarcitória.

16B. Julgamento conforme o estado do processo. Decisões parciais de mérito

Atualizado por Igor Lima Goettenauer de Oliveira

JULGAMENTO CONFORME O ESTADO DO PROCESSO: As providencias preliminares preparam o processo


para que nele seja proferida uma decisão, denominada julgamento conforme o estado do processo. Há cinco
atitudes que o juiz pode adotar no julgamento conforme o estado do processo: 1. Extinção do processo sem
julgamento do mérito (art. 354, caput); 2. Extinção do processo com resolução do mérito em razão de: a)
ocorrência de prescrição ou decadência; b) homologar: o reconhecimento da procedência do pedido
formulado na ação ou na reconvenção; a transação; ou a renúncia à pretensão formulada na ação ou na
reconvenção; 3. Julgamento antecipado do mérito da causa; 4. Julgamento antecipado do parcial do
mérito; e 5. Prolação de decisão saneadora

EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO (art. 354, caput, “primeira parte”): Trata-se de norma
legal ligada ao princípio da economia processual. Se o juiz perceber a inutilidade da continuação do processo, em razão de
vício formal insanável, deve determinar a extinção do processo sem resolução do mérito (senteça terminativa). As hipóteses
estão previstas no art. 485, CPC: “Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: I - indeferir a petição inicial; II -
o processo ficar parado durante mais de 1 (um) ano por negligência das partes; III - por não promover os atos
e as diligências que lhe incumbir, o autor abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias; IV - verificar a
ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo; V - reconhecer a
existência de perempção, de litispendência ou de coisa julgada;VI – verificar ausência de legitimidade ou de
interesse processual; VII - acolher a alegação de existência de convenção de arbitragem ou quando o juízo
arbitral reconhecer sua competência; VIII - homologar a desistência da ação; IX - em caso de morte da parte,
a ação for considerada intransmissível por disposição legal; e X - nos demais casos prescritos neste Código
[...]”. Nos casos incisos IV, V, VI e IX, o juiz pode apreciar tais matérias de ofício em momento procedimental
anterior ao do julgamento conforme o estado do processo. A extinção do processo sem resolução do mérito
pode ser total (extinção do próprio processo) ou parcial (extinção de parcela do processo, reduzindo a
demanda subjetiva ou objetivamente). Quando a extinção for total, cabe apelação. Quando a extinção for
parcial, caberá agravo de instrumento (art. 354, parágrafo único). OBS: Mesmo havendo falta de um
requisito processual de validade, o magistrado pode ignorá-lo (se não houver prejuízo) e avançar e resolver o
mérito da causa. Isso porque o objetivo do processo é a solução do mérito, sua própria razão de ser. Assim, é
195
preciso sempre lembrar que o magistrado tem o dever de examinar o mérito da causa, só não o fazendo
quando houver obstáculo intransponível.

EXTINÇÃO DO PROCESSO COM A RESOLUÇÃO DO MÉRITO, FUNDADA NO ART. 487, II E III, CPC (ART. 354,
caput, “segunda parte”): Extingue-se a demanda com resolução de mérito, nos termos do art. 354, caput,
CPC, na fase de julgamento conforme o estado do processo, quando houver: a) prescrição ou decadência; b)
homologação de reconhecimento jurídico do pedido, de transação e de renúncia. A previsão dessas espécies
de sentença de mérito como providências a serem adotadas pelo juiz no momento procedimental do
“julgamento conforme o estado do processo” não cria uma limitação temporal para a prolação de tais
sentenças.

JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO (ART. 355, CPC): o julgamento antecipado do mérito se justifica em
razão da desnecessidade da fase probatória. O art. 355 prevê duas situações que não se confundem, mas que
geram o fenômeno: a) quando não houver necessidade de produção de outras provas; b) quando o réu for
revel, ocorrer o efeito previsto no 344, CPC (presunção de veracidade das alegações de fato formuladas pelo
autor) e não houver requerimento de prova, na forma do 349, CPC (Art. 349. Ao réu revel será lícita a
produção de provas, contrapostas às alegações do autor, desde que se faça representar nos autos a tempo
de praticar os atos processuais indispensáveis a essa produção.).

JULGAMENTO ANTECIPADO PARCIAL DO MÉRITO (ART. 356, CPC): a previsão de julgamento antecipado
parcial do mérito é uma novidade do CPC/2015 (no CPC/73, essa espécie de julgamento era uma modalidade
de tutela antecipada). O juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados –
ou parte deles – mostra-se incontroverso ou estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do
art. 355 (supra). Esta hipótese afasta, portanto, o princípio da unicidade do julgamento de mérito
(Chiovenda), passando a prever hipótese de julgamento fracionado do mérito. O §2º do art. 356 estabelece
que a parte poderá liquidar ou executar, desde logo, a obrigação reconhecida na decisão que julgar
parcialmente o mérito, independentemente de caução, ainda que haja recurso contra essa interposto. O §5º
determina que a decisão é recorrível por agravo de instrumento. O julgamento antecipado da lide gera uma
decisão de mérito, fundada em cognição exauriente, em que o magistrado decide o objeto litigioso, julgando
procedente ou improcedente uma demanda formulada, sem necessidade de realização de instrução
probatória (provas orais, periciais e inspeção judicial).

SANEAMENTO E ORGANIZAÇÃO DO PROCESSO: o saneamento e a organização do processo estão previstos


no art. 357, CPC. Em relação ao CPC/73, duas são as alterações marcantes: no CPC/2015 a regra é o
saneamento escrito e não consta mais, expressamente, no art. 357 a previsão de tentativa de
autocomposição nesse ato. Cabe ao juiz, no saneamento e organização: delimitar as questões de fato sobre
as quais recairá a atividade probatória, especificando os meios de prova admitidos; definir a distribuição do
ônus da prova, observado o art. 373, CPC; delimitar as questões de direito relevantes para a decisão do
mérito; e, se necessário, designar audiência de instrução e julgamento (a audiência de instrução e
julgamento será necessária apenas quando houver prova oral. Sobre a prova testemunhal, o número de
testemunhas será de no máximo 10, sendo 3, no máximo, para a prova de cada fato (art. 357, §6º). O CPC
ainda autoriza que o juiz poderá limitar o número de testemunhas levando em conta a complexidade da
causa e dos fatos individualmente considerados (art. 357, §7º). A regra é que o saneamento seja feito em
decisão escrita, mas se a causa apresentar complexidade em matéria de fato ou de direito, deverá o juiz
designar audiência para que o saneamento seja feito em cooperação com as partes, oportunidade em que o
juiz, se for o caso, convidará as partes a integrar ou esclarecer suas alegações (art. 357, §3º).
Independentemente de ser escrito ou feito em audiência, realizado o saneamento, as partes têm o direito de
pedir esclarecimentos ou solicitar ajustes, no prazo comum de 5 (cinco) dias, findo o qual a decisão se torna
estável (art. 357, §1º). Salvo a distribuição do ônus da prova, as outras questões decididas no saneamento
não são recorríveis por agravo de instrumento, razão pela qual é dado às partes o direito de pedir
esclarecimentos e ajustes. Por fim, o art. 357, §2º determina que as partes podem apresentar ao juiz, para
homologação, delimitação consensual das questões de fato e de direito a que se referem os incisos II e IV, a
qual, se homologada, vincula as partes e o juiz.

196
16C. Instrumentos e técnicas extraprocessuais de atuação em tutela coletiva: inquérito civil, compromisso de
ajustamento de conduta, recomendação e audiência pública.

Natalia Lievore
Atualizado e complementado por Valmor Cella Piazza
Principais obras consultadas: Resumo do Grupo do 28º CPR; MAZZILLI, Hugo Nigro. “A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo”. 20ª Ed. São Paulo:
Saraiva, 2007, fls. 375/461; DIDIER JR., Fredie e ZANETTI JR., Hermes. Curso de Direito Processual Civil: Processo Coletivo, vol. 4, 10ª Ed., Salvador:
JusPodivm, fls. 237/275.
Legislação básica: CF (art. 129, III); LACP (arts. 5º, §6º, 8º, §1º, e 9º); Res. 23/2007 do CNMP; CPP (art. 20); LONMP (arts. 20, 26); ECA (arts. 201, V, e
211); CDC (art. 90); LC 75/93 (art. 7º, I); Res. 87/2006 do CSMPF.

1) Considerações preliminares
Há dois “modelos” de Ministério Público: o Demandista, que prefere atuar (demandar) perante o Poder
Judiciário, como agente processual, transferindo-lhe a responsabilidade de resolver as diuturnas afrontas à
lei, mormente no que se refere aos direitos sociais e coletivos, e o Resolutivo, que, valendo-se dos
instrumentos de atuação à sua disposição (inquérito civil, procedimento administrativo, termo de
ajustamento de conduta, recomendação), soluciona os problemas que atentam contra tais direitos.
Essa resolutividade manifesta-se tanto preventivamente, para evitar lesões a direitos coletivos, com a
instauração de inquéritos civis ou por meio de recomendações; quanto repressivamente, por meio de termos
de ajustamento de conduta.
A função resolutiva do Ministério Público deixou de ser subsidiária e passou a assumir um caráter central nos
inquéritos civis; verdadeiro desdobramento da justica multiportas atualmente prevista no CPC (arts. 3º, arts.
165 a 175, todos do CPC/15).
Exemplos desse fortalecimento podem ser observados na Res. 118/2014 do CNMP, que trata do incentivo a
autocomposição.
Nesse diapasão, dentro do modelo resolutivo, passaremos à análise dos instrumentos e técnicas
extraprocessuais de atuação em tutela coletiva.

2) Inquérito civil
Tradicionalmente o inquérito civil é conceituado como um procedimento administrativo, de competência
exclusiva do MP, que visa instruir futura ação coletiva. Com uma visão mais moderna, Didier e Zanetti
afirmam que atualmente o inquérito civil insere-se no contexto do sistema multiportas, ou seja, volta-se à
obtenção de dados para a realização de soluções extrajudiciais, como celebração de TAC, mediação,
conciliação, transação, etc.
Tem como características principais: (a) procedimento informativo; (b) presidência administrativa; (c)
dispensabilidade; (d) publicidade (sendo possível decretar, motivadamente, sigilo nos casos em que a
publicidade possa acarretar prejuízo às investigações); (e) inquisitivo (contudo, permite-se ao defensor
constituído assistir o investigado e apresentar razões); (f) exclusivo do MP.
Como regra, o IC instaura-se por meio de portaria.
Antes da instauração, pode ser possível a instauração de um procedimento administrativo preliminar ao IC,
com o objetivo de instrução da instauração do IC (art. 2º, §§4º a 7º, da Res. 23/07 do CNMP). Ele é
denominado procedimento preparatório e deve ser concluído no prazo de 90 dias, prorrogável uma única vez
por igual período. Com efeito, a Resolução 87/2006 do CSMPF trata o procedimento administrativo como um
instrumento transitório à disposição do membro que ainda não visualiza elementos suficientes a instaurar
inquérito civil, mas precisa valer-se do poder requisitório de que trata o art. 8º para obtê-los, como se
constata da redação do § 1º do art. 4º da resolução.
Aplicam-se ao presidente do IC as causas de impedimento e suspeição previstas no CPC. Contudo, a
presidência do IC não torna o membro do MP suspeito/impedido para a ACP.
Na instrução do IC, o MP goza dos seguintes poderes, dentre outros: (a) vistorias e inspeções em locais não
protegidos pela inviolabilidade de domicílio (art. 8º, V, LONMP); (b) intimação para depoimento, sob pena de
condução coercitiva (art. 26 da LONMP) – STF vedou a condução coercitiva (ADPFs 395 e 444); (c) requisição
de documentos (art. 26 LONMP), salvo os protegidos por reserva de jurisdição. No tocante aos documentos
referentes a sigilo bancário e fiscal, existe grande divergência doutrinária e jurisprudencial. Para a primeira
corrente, o MP pode requisitar tais documentos, uma vez que esse sigilo é apenas legal, regulado pela LC
105/01, devendo prevalecer o poder requisitório da LONMP (Nery, Mazzilli, STF – MS 21.729). Para a
segunda corrente, a LC apenas regulamenta o sigilo constitucional, portanto, o MP não pode requisitar

197
diretamente documentos referentes a esses sigilos (STF – RMS 8.716) 1. O STJ vedou o acesso a
procedimentos disciplinares de advogados na OAB, em razão de previsão legal de reserva de jurisdição.
No REsp 476.660/MG, relatado pela Ministra Eliana Calmon, ficou assentado que as provas colhidas no
inquérito civil têm valor probatório relativo, porque colhidas sem a observância do contraditório, mas só
devem ser afastadas quando há contraprova de hierarquia superior, ou seja, produzida sob a vigilância do
contraditório. A decisão foi explícita em registrar que a mera negativa não é suficiente a afastar a prova
produzida no inquérito civil, o que corrobora sua importância como elemento formador da convicção não
apenas do Ministério Público como do juízo.
Findo o IC, o presidente poderá: (a) ajuizar a ACP; (b) Arquivar, fundamentadamente; ou, (c) celebrar TAC e
posterior arquivamento. O membro do MP deve submeter a promoção de arquivamento ao órgão interno de
controle, em até 3 dias, sob pena de falta funcional. No caso do MPF, o órgão é uma das Câmaras de
Coordenação e Revisão, a quem caberá designar uma sessão pública, momento até o qual qualquer
interessado poderá se manifestar. Na audiência, três são as decisões possíveis: (b.1) homologação do
arquivamento; (b.2) requerimento de diligências; (b.3) determinação, a outro membro do MP, de
ajuizamento da ACP. Arquivado o IC, nada impede sua reabertura em momento posterior,
fundamentadamente. O arquivamento difere do indeferimento do pedido de instauração do IC (art. 5º da
Res. 23/07), pois somente haverá revisão pela CCR em caso de recurso pela parte interessada. Interposto o
recurso, pode haver reconsideração. Não ocorrendo, deve ser remetida à CCR em três dias.
O inquérito civil deverá ser concluído no prazo de um ano, prorrogável pelo mesmo prazo e quantas vezes
forem necessárias, por decisão fundamentada, dando-se ciência ao órgão de revisão.

3) Compromisso de Ajustamento de Conduta


O Compromisso de Ajustamento de Conduta não se confunde com o Termo de Ajustamento de Conduta. O
TAC é o documento/forma; o CAC é o conteúdo. Na prática, não existe tal diferença.
Apesar de uma minoria afirmar tratar-se de transação, prevalece que a natureza jurídica do CAC é de
reconhecimento jurídico do pedido, pois os titulares da ação não são os titulares dos direitos em discussão,
não podendo, portanto, deles dispor, por meio da transação. Neste ponto, insta salientar que o MP atua por
legitimação extraordinária (art. 18 CPC), de modo que não detém titularidade/disponibilidade sobre o bem
jurídico material, mas tão somente quanto à forma de seu adimplemento. Ou seja, transaciona-se o prazo, o
modo, a forma de regularização da situação, mas não o direito difuso em si.
Os legitimados a tomar o CAC são alguns dos legitimados a ingressar com a ACP: MP, Defensoria,
Administração Direta. No tocante à Administração Indireta, as pessoas com personalidade de direito público
podem. Por outro lado, a possibilidade de pessoas com personalidade de direito privado tomarem o CAC é
divergente (não podem X podem sempre X podem somente se prestarem serviço público – maioria –
MAZZILLI, p. 384). Recentemente, o STF decidiu que as associações podem firmar CAC (ADPF 165)
Em qualquer hipótese, o CAC será considerado título executivo extrajudicial. Celebrado o CAC, o inquérito
civil perde o objeto, devendo ser arquivado - com remessa ao órgão revisor. Com o fim de acompanhar o
cumprimento do CAC, deve-se intaurar Procedimento Administrativo de acompanhamento.
O CAC pode ser total ou parcial, hipótese que não impedirá o prosseguimento da ACP ou do IC. Ambas, por
outro lado, não impedem a ação penal (STJ, HC 187.043) e podem ser rescindidas (STJ, REsp 884.742).
Em improbidade administrativa, o MPF entende que a Lei 8.429/92, no artigo 17, § 1º, afirma ser inviável a
formalização de termo de ajustamento de conduta em casos relacionados com improbidade administrativa,
uma vez que são vedados acordos, transações ou conciliações nesta matéria, em razão de estarem
envolvidos interesses indisponíveis, como a probidade administrativa e o patrimônio público, os quais não
podem ser transacionados. Entretanto, o Ministério Público pode utilizar-se de termo de compromisso de
ajustamento de conduta, durante o inquérito civil ou procedimento administrativo preliminar, desde que não
haja configuração de prejuízo ao erário - o próprio CNMP emitiu resolução autorizando CAC em improbidade
administrativa (art. 2º, §2º, Res 179/2017). Vale ressaltar que no ambito da operação Lava-Jato foram
homologados pela 5ª CCR, Termos de Ajustamento de Conduta. Nicolao Dino, em artigo constante no livro “A
prova no enfrentamento a Macrocriminalidade”, fundamenta esta possibilidade diante do instituto da
colaboração premiada:
“É correto afirmar, com efeito, a existência de um microssistema destinado ao enfrentamento da corrupção.
Também integram esse microssistema a Leis 12.850/2013, a Lei 12.529/2011 e a Lei 12.846/2013. Em tais
diplomas legais, encontram-se disposições relativas à colaboração premiada e ao acordo de leniência. Vale
dizer, tanto no que se refere à esfera criminal, como no campo da responsabilização administrativa, há farto
198
regramento acerca da concessão de medidas premiais em prol do investigado/acusado que colabora
efetivamente na elucidação do fato e sua estrutura hierárquica, com vistas à ampla punição de coautores e
partícipes da empreitada ilícita.
É importante considerar, nesse passo, que o próprio êxito da colaboração premiada ou do acordo de
leniência firmados no âmbito da persecução penal ou do processo administrativo, pode ficar comprometido
se a autoincriminação numa instância, em troca de um benefício, puder implicar responsabilização integral
em outra instância, na esfera da improbidade administrativa. Isso iria de encontro, inclusive, ao princípio da
proteção da confiança legítima, corolário do princípio da segurança jurídica, o qual preconiza que o cidadão,
ao confiar no comportamento do Estado, não pode sofrer prejuízos em consequência direta do crédito a ele
atribuído.
Deve-se remover a aparente contradição com o disposto no art. 17, §1º, da Lei 8.429/92, por meio do
emprego daquilo que BOBBIO denomina de interpretação corretiva. Sim, pois não podem conviver
harmonicamente disposições que, de um lado, vão permitir o uso da colaboração premiada ou do acordo de
leniência e, de outro, uma previsão legal que [aparentemente] os proíbe.”
Em outras palavras, o emprego da colaboração premiada, na esfera da responsabilização por improbidade
administrativa, não implica livre disponibilidade da ação, mas sim o exercício de uma discricionariedade
regrada, condicionada pela busca de maior eficiência e efetividade na atuação repressiva do Estado. É
fundamental, contudo, que nos casos de concessão de imunidade plena, haja submissão da matéria à revisão
da instância superior do Ministério Público, para homologação (art. 9º, §1º, da Lei 7.347/85, e art. 62, IV, da
Lei Complementar 75/93).

4) Recomendação
Trata-se de ato não vinculado expedido pelo órgão do MP, com o objetivo de melhoria dos serviços públicos
ou de proteção dos direitos que permitem a tutela pelo parquet (art. 22, XX, LC 75/93, art. 129, II e III, CF e
Res. 87/2006 do CSMPF). A recomendação pode consistir na edição de norma regulamentar e somente pode
ser feita pelo promotor natural. Apesar de não vinculante para o recomendado, o ato tem grande
importância e pode gerar algumas consequências: (a) sujeitar o descumpridor a ação competente; (b)
caracterizar e comprovar dolo/má-fé; (c) estimular atos discricionários dos agentes públicos.
Caso a recomendação seja necessária durante processo administrativo ou IC e seja interessante sua
publicação, caberá à Câmara respectiva ou à Procuradoria dos Direitos do Cidadão fazê-lo. O mesmo
procedimento deve ser adotado se a recomendação possuir interesse nacional.
A expedição da recomendação não gera o arquivamento do IC ou processo administrativo. Apenas o seu
cumprimento tem tal efeito, por perda o interesse de agir.

5) Audiência Pública
Trata-se de um mecanismo de pluralização do debate, de participação (democracia participativa), uma vez
que os temas das ações coletivas envolvem diversos interesses, por vezes, conflitantes. É possível vê-la,
também como uma forma de repartição de responsabilidade das decisões com toda a sociedade.
A LC 75/95 é omissa sobre o tema, mas a LONMP (art. 27, p.ú., IV) a prevê. Além disso, é regulamentada pela
Res. 87/2006 do CSMPF, que permite o seu uso de forma ampla (En. 7 do VIII Encontro da 5ª CCR: “As
finalidades referidas no art. 22 (da Res. 87/06) não contemplam rol exaustivo”). Os interessados se
manifestarão, mas não terão direito a voto, em sessão que será presidida pelo membro do MP que a
convocou. Dos trabalhos, será lavrada ata, da qual se dará publicidade ampla.
Para que esses objetivos sejam realizados, dois critérios devem ser observados: (a) convocação ampla, por
meio de edital, convite, meios eletrônicos, indicando, com antecedência, data, local, objeto etc.; (b) ampla
acessibilidade aos interessados. Convém, ainda, disponibilizar com antecedência os autos para os
interessados.

Questões:
Topjuris-2016 MPF 1ª Fase Rodada 6 – 51. Sobre os instrumentos e técnicas extraprocessuais de atuação em
tutela coletiva, assinale a alternativa INCORRETA:
a) O Termo de Ajustamento de Conduta-TAC possui natureza jurídica de ato administrativo negocial, haja
vista que nas ações coletivas, o legitimado extraordinário não é o titular do direito alegado (que tem
natureza transindividual) e, portanto, não poderia negociar porque não teria disponibilidade sobre o direito
material subjacente.
199
VERDADEIRO.
A alternativa A está correta. Corresponde ao que defende a doutrina majoritária sobre o tema, conforme se
pode conferir da leitura do artigo “As Convenções Processuais e o Termo de Ajustamento de Conduta”, do
autor Antônio do Passo Cabral, página 201, veiculado no livro Repercussões do Novo CPC: Ministério Público:
“A doutrina majoritária não considera o TAC uma forma de transação, mas um ato administrativo negocial,
ao argumento de que, nas ações coletivas, o legitimado extraordinário não é o titular do direito alegado (que
tem natureza transindividual) e, portanto, não poderia negociar porque não teria disponibilidade sobre o
direito material subjacente. Não podemos concordar com este entendimento. Parece-nos evidente que há
negociação nas ações coletivas no que tange ao modo e ao tempo da reparação do dano coletivo, sempre
com vistas à máxima efetividade da tutela destes interesses. Neste sentido, ainda que indisponíveis em
algum grau, este dado não impede a negociação”. Atenção para a crítica efetuada pelo autor que não
concorda com a posição da doutrina majoritária”

b) As convenções processuais podem ser inseridas e documentadas em cláusulas de TAC.


VERDADEIRO.
A alternativa B está correta. É o que prevê o art. 17, da Resolução nº 118/2014 do CNMP: “Art. 17. As
convenções processuais devem ser celebradas de maneira dialogal e colaborativa, com o objetivo de
restaurar o convívio social e a efetiva pacificação dos relacionamentos por intermédio da harmonização
entre os envolvidos, podendo ser documentadas como cláusulas de termo de ajustamento de conduta”.

c) É possível impedir o prosseguimento de inquérito civil instaurado com a finalidade de apurar possível
incompatibilidade entre a evolução patrimonial de vereadores e seus respectivos rendimentos, quando
referido procedimento tenha-se originado a partir de denúncia anônima, mesmo que realizadas diligências
investigativas para a averiguação da veracidade dos fatos relatados.
FALSO.
A alternativa C está INCORRETA, portanto, é o gabarito. Não foi o que entendeu o STJ quando do julgamento
do RMS nº 38.010-RJ, rel. Min. Herman Benjamim, j. 04/04/2013: “[...] A CF impôs ao MP o dever de
promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio
ambiente e de outros interesses difusos e coletivos (art. 129, III). O dever constitucional deve ser
compatibilizado com a vedação ao anonimato (art. 5º, IV, CF), com base no princípio da concordância prática.
Nos termos do art. 22 da Lei 8.429/1992, o MP pode, mesmo de ofício, requisitar a instauração de inquérito
policial ou procedimento administrativo para apurar qualquer ilícito previsto no mencionado diploma legal.
Ressalte-se que o art. 13 dessa lei obriga os agentes públicos a disponibilizar periodicamente informações
sobre seus bens e evolução patrimonial. Vale destacar que os agentes políticos sujeitam-se a uma diminuição
na esfera de privacidade e intimidade, de modo que se mostra ilegítima a pretensão de não revelar fatos
relacionados à evolução patrimonial.”

d) É atribuição do Ministério Público expedir recomendações visando à melhoria dos serviços de relevância
pública, bem como o respeito aos interesses, direitos e bens cuja defesa lhe cabe promover, fixando prazo
razoável para a adoção das providências cabíveis.
VERDADEIRO.
A alternativa D está correta. Corresponde exatamente à previsão legislativa contida no art. 6º, XX, da LC
75/1993. Semelhante previsão existe na LONMP (L8.625/1993, art. 10, XII).

Emagis-2016 MPF Rodada 3 – 26. (EMAGIS) ACERCA DO INQUÉRITO CIVIL, ASSINALE A ALTERNATIVA
CORRETA:
a) É cabível suspensão de segurança contra o trancamento do inquérito civil, por constituir ameaça à ordem
administrativa e, por via de consequência, à ordem pública.
VERDADEIRO.
A afirmativa reproduz posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, expresso no AgRg na SS 1.045/RJ: “A
imposição de obstáculos à atividade institucional do Ministério Público ameaça a ordem administrativa e, via
desta, a ordem pública, especialmente quando ordenada em sede de cognição sumária, passível de reforma
quando do exame definitivo da demanda. (AgRg na SS 1.045/RJ, Rel. Min. EDSON VIDIGAL, CORTE ESPECIAL,
j. 04/08/2004).

200
b) A instauração do inquérito civil no âmbito do Ministério Público Federal pode se dar de duas formas: a) de
ofício; b) em face de requerimento ou representação de qualquer pessoa ou de comunicação de outro órgão
do Ministério Público, da autoridade judiciária, policial ou qualquer outra autoridade.
FALSO. A instauração do inquérito civil no âmbito do Ministério Público Federal pode se dar de tres formas.
Além dessas duas formas de instauração, o inquérito civil também pode ser instaurado “por determinação de
Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal ou da Procuradoria Federal dos Direitos do
Cidadão, nos casos em que tenha recusado o arquivamento de peças informativas, promovido por órgão da
Instituição”, conforme consta no art. 2º, III, da Resolução nº. 87/2010 do Conselho Superior do Ministério
Público Federal (CSMPF).

c) As provas produzidas no inquérito civil tem valor probatório relativo, pois colhidas sem a observância do
contraditório, de modo que, impugnadas pela outra parte, afasta-se o seu valor.
FALSO.
As provas colhidas em inquérito civil, ainda que de valor relativo, não se afastam em virtude de mera
impugnação, conforme decidiu o STJ: “2. As provas colhidas no inquérito têm valor probatório relativo,
porque colhidas sem a observância do contraditório, mas só devem ser afastadas quando há contraprova de
hierarquia superior, ou seja, produzida sob a vigilância do contraditório. 3. A prova colhida inquisitorialmente
não se afasta por mera negativa, cabendo ao juiz, no seu livre convencimento, sopesá-las, observando as
regras processuais pertinentes à distribuição do ônus da prova. (REsp 849.841/MG, Rel. Ministra ELIANA
CALMON, SEGUNDA TURMA, j.28/08/2007)

d) Recebida notícia de fato (representação), o membro do Ministério Público Federal deverá adotar uma das
seguintes medidas: a) instaurar o inquérito civil; b) arquivar as peças de informação ou c) ajuizar a ação
apropriada.
FALSO.
As alternativas que se colocam à disposição do membro não se limitam aquelas três. Com efeito, ele poderá,
ainda, celebrar compromisso de ajustamento de conduta (inciso III), expedir recomendação legal (IV),
declinar da atribuição (inciso VI) e instaurar procedimento administrativo prévio (§2º), consoante o disposto
no art. 5º da Resolução nº. 87/2010 do CSMPF. Também, se os fatos narrados na representação não
configurarem lesão aos interesses ou direitos que lhe incumbe defender ou “se o fato já tiver sido objeto de
investigação ou de ação civil pública ou se os fatos apresentados já se encontrarem solucionados”, poderá
indeferir liminarmente o pedido de instauração, de acordo com o art. 5º-A da citada Resolução.

Nesse ponto, recomenda-se a leitura do art. 26 da Lei 8.625/1993, que indica os poderes do Ministério
Público para exercício de suas funções constitucionais.

17A. Aspectos processuais da Lei do CADE. Aspectos processuais do Estatuto de Idoso.

Letícia Gonçalves

1. Aspectos processuais da Lei do CADE: Os aspectos processuais da Lei do CADE (Lei n. 12.529/11) dizem
respeito basicamente à execução judicial de seus julgados. Neste aspecto, destacam-se as atribuições da
Procuradoria Federal Especializada (art. 15) e as disposições do Título VIII – Da execução judicial das decisões
do CADE, que se divide em dois capítulos: I. Do processo (arts. 93 a 101) e II. Da intervenção judicial (arts.
102 a 111).

I) Introdução: A execução judicial das decisões e julgados do CADE compete à Procuradoria Federal
Especializada que funciona junto ao CADE (art. 15, III), a quem compete também: representar o CADE
judicial e extrajudicialmente (II), proceder à apuração da liquidez dos créditos do CADE, inscrevendo-os em
dívida ativa para fins de cobrança administrativa ou judicial (IV), tomar as medidas judiciais solicitadas pelo
Tribunal ou pela Superintendência-Geral, necessárias à cessação de infrações da ordem econômica ou à
obtenção de documentos para a instrução de processos administrativos de qualquer natureza (V), além de
promover acordos judiciais nos processos relativos a infrações contra a ordem econômica, mediante
autorização do Tribunal (VII). O MPF, que sob a égide da Lei n. 8.884/94 tinha atribuição de promover a
execução judicial das decisões e julgados do CADE, entre outras, teve atuação restringida pela atual Lei
201
Antitruste, que agora, em tese, se limita à emissão de pareceres nos processos administrativos para a
imposição de sanções administrativas por infrações à ordem econômica, de ofício ou a requerimento do
Conselheiro-Relator (art. 20). Contudo, caso o CADE não adote as providências processuais necessárias em
tempo razoável para a execução dos títulos extrajudiciais decorrentes de suas decisões, o MPF deverá fazê-
lo, pois lhe cabe a defesa em juízo da ordem econômica. Como se trata de direito difuso, qualquer legitimado
à tutela coletiva poderia executar o título extrajudicial – interpretação sistemática da nova Lei do CADE e Lei
n. 7.347/85.

II) Do processo de execução judicial das decisões do CADE (arts. 93 a 101): a) as decisões do Plenário do
Tribunal (Tribunal Administrativo de Defesa Econômica) que cominem multa ou obrigações de fazer ou não
fazer constituem título executivo extrajudicial. Quando o objeto da execução for exclusivamente cobrança
de multa, será observada a Lei de Execução Fiscal (Lei n 6.830/80); quando, além da cobrança de multa,
houver cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá tutela específica da obrigação, ou
determinará providências que assegurem resultado equivalente ao do adimplemento, e apenas na
impossibilidade destas medidas caberá conversão em perdas e danos. A execução será feita por todos os
meios, inclusive mediante intervenção na empresa quando necessária. b) foro competente: a execução das
decisões do CADE será promovida na Justiça Federal do Distrito Federal ou da sede ou domicílio do
executado, à escolha do CADE. c) o oferecimento de embargos ou ajuizamento de ações, em regra, não
suspendem a execução. Exceção: podem implicar suspensão se for garantido o juízo no valor das multas
aplicadas (inclusive quanto às multas diárias), para que se garanta o cumprimento da decisão final; a garantia
do cumprimento das obrigações de fazer ocorrerá por meio de caução idônea; revogada a liminar, o depósito
do valor da multa será convertido em renda do Fundo de Defesa de Direitos Difusos, caso em que o CADE
pode promover execução para cobrar a diferença entre o valor revertido e o valor da multa atualizada, já que
o depósito em dinheiro não suspende a incidência de juros de mora e atualização monetária. d) em caso de
grave infração da ordem econômica e presente o periculum in mora, o juízo poderá́ conceder a antecipação
da tutela executiva (total ou parcial), mesmo que garantida a multa e prestada a caução. e) a execução das
decisões do CADE tem preferência sobre outros feitos, à exceção de habeas corpus e mandado de
segurança. f) Neste capítulo havia previsão muito criticada pela doutrina, no sentido de que a ação que
tivesse por objeto decisão do CADE caberia ao autor deduzir todas as questões de fato e de direito, sob pena
de preclusão consumativa, reputando-se deduzidas todas as alegações que poderia deduzir em favor do
acolhimento do pedido, não podendo o mesmo pedido ser deduzido sob diferentes causas de pedir em ações
distintas, salvo em relação a fatos supervenientes (art. 98, §4º). Esta previsão foi objeto de revogação
expressa pelo Novo Código de Processo Civil (art. 1.072, VI).

III. Da Intervenção Judicial (arts. 102 a 111): a) a execução específica das obrigações contidas no título
executivo contempla, em caso de necessidade, a nomeação de interventor, o afastamento dos responsáveis
pela administração da empresa, bem como a possibilidade de atribuição de poderes de administração total
da empresa ao interventor, sempre de acordo com a necessidade da medida restritiva e mediante decisão
fundamentada do juízo. b) o executado pode impugnar o interventor em 48 horas por motivo de inaptidão
ou inidoneidade, devendo a alegação ser provada em 3 dias e o juiz decidir também em 3 dias; procedente a
impugnação, juiz nomeará novo interventor em 5 dias. c) prazo: a intervenção judicial terá duração máxima
de 180 dias, podendo ser revogada antes do prazo estabelecido, desde que comprovado o cumprimento
integral da obrigação que a determinou. d) objeto: a decisão deverá indicar clara e precisamente as
providências a serem tomadas pelo interventor nomeado, e a intervenção deverá restringir-se aos atos
necessários ao cumprimento da decisão judicial que a determinar. e) interventor: o interventor ficará
responsável por suas ações e omissões, especialmente em caso de abuso de poder e desvio de finalidade,
aplicando-se-lhe, no que couber, os arts. 153 a 159 da Lei n. 6.404/76 (deveres e responsabilidades dos
administradores das Sociedades Anônimas); sua remuneração será arbitrada pelo juiz, que poderá substituí-
lo a qualquer tempo, sendo obrigatória a substituição quando incorrer em insolvência civil, quando for
sujeito passivo ou ativo de qualquer forma de corrupção ou prevaricação ou infringir quaisquer de seus
deveres; compete ao interventor: i. Praticar ou ordenar que sejam praticados os atos necessários à execução,
ii. Denunciar ao juiz quaisquer irregularidades praticadas pelos responsáveis pela empresa e das quais venha
a ter conhecimento e iii. Apresentar ao juiz relatório mensal de suas atividades. f) as despesas resultantes da
intervenção correrão por conta do executado. g) Decorrido o prazo da intervenção, o interventor
apresentará ao juiz relatório circunstanciado de sua gestão, propondo a extinção e arquivamento do
202
processo ou pedindo a prorrogação do prazo, na hipótese de não ter sido possível cumprir integralmente a
decisão exequenda. h) crimes: todo aquele que se opuser ou obstaculizar a intervenção ou, cessada esta,
praticar atos que anulem seus efeitos (direta ou indiretamente, no todo ou em parte) ou desobedecer a
ordens legais do interventor, será responsabilizado criminalmente por resistência, desobediência ou coação
no curso do processo (arts. 329, 330 e 334, CP).

IV. Jurisprudência: O sigilo do acordo de leniência celebrado com o CADE não pode ser oposto ao Poder
Judiciário para fins de acesso aos documentos que instruem o respectivo procedimento administrativo. STJ.
3ª Turma. REsp 1554986-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 8/3/2016 (Info 580)

2. Aspectos Processuais do Estatuto do Idoso: No Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03) há aspectos processuais
especiais no título “Do acesso à justiça”, que se divide em disposições gerais (arts. 69 a 71), do Ministério
Público (arts. 73 a 77) e da proteção judicial dos interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis ou
homogêneos (arts. 78 a 92).

I. Disposições gerais. O Estatuto do Idoso determina a aplicação do procedimento sumário de forma


subsidiária, no que não contrariar os prazos da Lei (art. 69) (O NCPC, por não contemplar mais o
procedimento sumário, determina que remissões como esta devem ser entendidas como referentes ao
procedimento comum, cf. Art. 1.049, p.u., NCPC). Autoriza a criação de varas especializadas e exclusivas do
idoso. Assegura prioridade na tramitação dos processos e procedimentos e na execução dos atos e
diligências judiciais em que figure como parte ou interveniente pessoa com idade igual ou superior a 60 anos,
em qualquer instância, com a recente inclusão da prioridade especial, dentre os processos de idosos, aos
maiores de 80 anos. Nesse contexto, o NCPC também concede prioridade de tramitação às pessoas com
idade igual ou superior a 60 anos (ou portadora de doença grave) (art. 1.048), que independe de deferimento
da autoridade jurisdicional, devendo ser conferida assim que comprovada a condição de beneficiário (§4º).

II. Do Ministério Público. Atribui ao MP a competência para: i. Instaurar inquérito civil e ACP para a proteção
dos direitos e interesses difusos ou coletivos, individuais indisponíveis e individuais homogêneos dos idosos;
ii. Promover e acompanhar as ações de alimentos, de interdição total ou parcial, de designação de curador
especial, em circunstancias que justifiquem a medida e oficiar em todos os feitos em que se discutam os
direitos de idosos em condições de risco, iii. Atuar como substituto processual do idoso em situação de risco,
além de outras atribuições de cunho administrativo. Nos processos e procedimentos em que não for parte, o
MP atuará obrigatoriamente na defesa dos direitos e interesses dos idosos (custos legis), será intimado
pessoalmente em qualquer caso, e a ausência de sua intervenção acarreta nulidade do feito, a ser declarada
de ofício pelo juiz ou a requerimento de qualquer interessado.

III. Da proteção judicial dos interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis ou homogêneos. A lei
disciplina, por disposição expressa, as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados ao
idoso, referentes à ação, omissão ou ao oferecimento insatisfatório de: i. Acesso às ações e serviços de
saúde, atendimento especializado ao idoso portador de deficiência ou com limitação incapacitante, iii.
Atendimento especializado ao idoso portador de doença infectocontagiosa, iv. Serviço de assistência social
visando ao amparo do idoso. Garante que estas hipóteses não excluem da proteção judicial outros direitos
coletivos lato senso próprios do idoso com proteção legal. Com vistas a assegurar a eficácia das ações
coletivas ali previstas, o Estatuto atribuiu competência absoluta ao foro do domicílio do idoso para o
julgamento das referidas (art. 80), prevendo a legitimação concorrente ativa do Ministério Público, entes
políticos, OAB e associações que atendam aos requisitos daquele diploma (requisito similar à lei da ACP).
Previu, ainda, a reversão dos valores das multas aplicadas em razão de suas disposições (inclusive astreintes
decorrentes de ações de cumprimento de obrigações de fazer e não fazer) ao Fundo do Idoso ou, na sua
falta, ao Fundo Municipal de Assistência Social, vinculados ao atendimento do idoso. Há previsão de
execução pelo Ministério Público (e aos demais legitimados coletivos) das multas (caso não recolhidas em 30
dias após seu trânsito em julgado) e da sentença condenatória favorável ao idoso (decorridos 60 dias do
trânsito em julgado sem execução pelo autor. Nas ações coletivas do E. Idoso não haverá adiantamento de
custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas e não se imporá sucumbência ao
Ministério Público.

203
17B. Títulos executivos judiciais e extrajudiciais.

Leonardo Ferreira Mendes 22/09/18

Segundo Fredie Didier, título executivo é o “documento que certifica um ato jurídico normativo, que
atribui a alguém um dever de prestar líquido, certo e exigível, a que a lei atribui o efeito de autorizar a
instauração da atividade executiva”. Os títulos executivos estão sujeitos aos princípios da taxatividade e da
tipicidade: taxatividade: o título é executivo se estiver em rol legal taxativo. Não há título executivo por mera
deliberação das partes, de sorte que é tida como ineficaz; tipicidade: em razão da taxatividade, é impossível
conceber a existência de outros títulos além daqueles já previstos em lei. Mas atente: essa tipicidade pode
ser aberta, como veremos adiante, o que amplia infinitamente o rol.
Os títulos executivos JUDICIAIS estão listados no art 515, do CPC. São 9 incisos. I - as decisões
proferidas no processo civil que reconheçam a exigibilidade de obrigação de pagar quantia, de fazer, de
não fazer ou de entregar coisa – existe discussão sobre a execução de sentença meramente declaratória. Em
princípio, não há o que ser executado em sentença declaratória, que apenas fornece uma certeza jurídica
(ex: investigação de paternidade, usucapião). Mas quando se pretende a declaração de existência de uma
obrigação inadimplida, a execução será útil. Na doutrina, há 3 correntes sobre a possibilidade de execução de
sentença meramente declaratória: (i) Nery e Araken de Assis: a sentença meramente declaratória não era
título executivo e, após 2005, continua não sendo, em razão do princípio da congruência (CPC/73, art. 460);
(ii) para Zavascki e Didier: a sentença meramente declaratória sempre foi título executivo, baseado nos
princípios da economia processual (execução da sentença declaratória dispensa o ajuizamento de nova
ação), e da nulla executio sine titulo; (iii) para STJ e Abelha, a sentença declaratória não era título executivo e
passou a ser com a lei 11.232/05; II - a decisão homologatória de autocomposição judicial - é o caso de
autocomposição em processo em curso. A sentença homologatória pode ser mais ampla do que o objeto do
processo; III - a decisão homologatória de autocomposição extrajudicial de qualquer natureza -
autocomposição sem que haja processo em curso. O pedido de homologação é de jurisdição voluntária; IV -
o formal e a certidão de partilha, exclusivamente em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos
sucessores a título singular ou universal - esses títulos só são eficazes perante o inventariante e os herdeiros
e as únicas obrigações possíveis são as de pagar e entregar; V - o crédito de auxiliar da justiça, quando as
custas, emolumentos ou honorários tiverem sido aprovados por decisão judicial – no CPC/73 a hipótese era
prevista como título executivo extrajudicial.; VI - a sentença penal condenatória transitada em julgado -
diferente da sentença civil, que se sujeita a execução provisória, só é possível executar a sentença penal na
esfera cível após o trânsito em julgado, em virtude do princípio da presunção de inocência. A legitimidade
passiva da sentença penal condenatória é exclusivamente do condenado (e seus herdeiros). Na esfera civil,
até podem existir corresponsáveis pelo ato ilícito, mas não se admite execução da sentença penal
condenatória contra os corresponsáveis que não foram condenados penalmente. Ex: se o motorista de
ônibus condenado na esfera penal pelo atropelamento não tem patrimônio, a vítima não pode executar a
sentença penal contra a empresa. Se a sentença penal condenatória é desconstituída por revisão criminal, os
reflexos são: (i) se ainda não há execução, não haverá mais; (ii) se a execução está em trâmite, ela será
extinta, por falta de título (iii) se a execução já foi feita, a repetição de indébito depende da fundamentação
acolhida na revisão criminal (ex: ausência de autoria, materialidade, etc). Ao proferir a sentença penal, o juiz
deve fixar um valor mínimo de danos (CPP, art. 387, IV), a partir do que foi aferido na cognição penal, o que
não impede a liquidação do dano na esfera civil, com o acerto da diferença;; VII - a sentença arbitral - a
sentença arbitral é o único título judicial não formado pelo juiz e independe de homologação judicial para ser
considerada título executivo; VIII - a sentença estrangeira homologada pelo Superior Tribunal de Justiça -
toda sentença estrangeira, judicial ou arbitral, só gera efeitos no Brasil depois de homologada, inclusive as
declaratórias do estado das pessoas. Título executivo extrajudicial estrangeiro não precisa de homologação,
podendo ser executado normalmente; IX - a decisão interlocutória estrangeira, após a concessão
do exequatur à carta rogatória pelo Superior Tribunal de Justiça – novidade do novo CPC, atende ao
princípio da homogeneidade, quando comparado com o inciso VIII.
Os títulos executivos EXTRAJUDICIAIS estão no art. 784, do CPC, em rol exemplificativo, existindo
outros títulos na legislação extravagante (inciso XII): I - a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a
debênture e o cheque - em regra, é preciso que o exequente instrua a inicial com a via original do título para
cortar a circulabilidade. No campo processual, não há necessidade de protesto para execução dos títulos. O
STJ decidiu que a duplicata virtual é título executivo (RESP 1024691); II - a escritura pública ou outro
204
documento público assinado pelo devedor - documento público só é título executivo se estiver assinado
pelo devedor. Já na escritura pública, basta a declaração do Tabelião, dispensando a assinatura do devedor.;
III - o documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas - Para ser título executivo, o
documento particular precisa ter assinatura do devedor e de 2 testemunhas. Segundo o STJ, as testemunhas
não precisam estar presentes no momento da formação do título (RESP 541267-RJ); IV - o instrumento de
transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública, pela Advocacia Pública, pelos
advogados dos transatores ou por conciliador ou mediador credenciado por tribunal – admite-se como
válido o título referendado pelo MP que não envolva direito indisponível, o referendado pela Defensoria
Púbica que não envolva economicamente necessitado e o título referendado por um único advogado
contratado por ambos os contratantes; V - o contrato garantido por hipoteca, penhor, anticrese ou outro
direito real de garantia e aquele garantido por caução; VI - o contrato de seguro de vida em caso de morte
– o dispositivo restringe como título executivo o contrato de seguro de vida, excluindo os demais seguros.
Daniel Amorim entende, entretanto, que os contratos de seguro de acidentes pessoais do qual decorra
morte também deve ser albergado pelo dispositivo. ; VII - o crédito decorrente de foro e laudêmio – o art.
2038, do CC, proibiu a constituição de novas enfiteuses; VIII - o crédito, documentalmente comprovado,
decorrente de aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, tais como taxas e despesas de
condomínio – não é necessário contrato escrito de locação, bastando a existência de prova documental; IX -
a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
correspondente aos créditos inscritos na forma da lei - é título extrajudicial unilateralmente formado pelo
credor (Fazenda Pública), diante da presunção de legalidade do ato administrativo; X - o crédito referente às
contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na respectiva convenção ou
aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas – no antigo código a
exequibilidade das dívidas condominiais dependia da existência de contrato escrito, como o contrato de
locação. A novidade admite que o crédito condominial seja título executivo extrajudicial, desde que previsto
na convenção ou aprovado em assembleia geral e desde que seja comprovado documentalmente; XI - a
certidão expedida por serventia notarial ou de registro relativa a valores de emolumentos e demais
despesas devidas pelos atos por ela praticados, fixados nas tabelas estabelecidas em lei - novidade do
novo CPC, permitindo a criação unilateral do título pela serventia notarial ou de registro.

17C. Tutela jurisdicional dos direitos e interesses coletivos, difusos e individuais homogêneos. Teoria geral do
processo coletivo. Liquidação e cumprimento de ações coletivas.

Caio Hideki Kusaba 16/09/18

I. Tutela jurisdicional dos direitos e interesses coletivos, difusos e individuais homogêneos

A tutela jurisdicional dos direitos e interesses transindividuais faz parte de uma das três ondas
renovatórias do processo civil:
1ª onda: tutela aos pobres/hipossuficientes: o sistema só será acessível se o hipossuficiente tiver
acesso à Justiça. É nesta onda que surge a Defensoria Pública, a justiça gratuita e os Tribunais de pequena
causa;
2ª onda: necessidade de coletivização do processo: nesta onda, promove-se a representação em
juízo dos direitos metaindividuais. É este o momento principal para o estudo dos processos coletivos. O
processo coletivo nasceu em virtude da necessidade de se tutelar duas situações básicas:
a) Tutela dos direitos de titularidade indeterminada: era necessário estabelecer quem seria o
legitimado a defender tais direitos, ou seja, era preciso determinar a titularidade destes direitos. Daí
a necessidade de criar processo coletivo;
b) Tutela dos direitos economicamente não tuteláveis do ponto de vista individual: a ideia é evitar a
impunidade generalizada: por exemplo, empresa vende caixa de biscoitos indicando 300g de
conteúdo, mas coloca apenas 250g. Individualmente, dificilmente alguém demandaria o prejuízo em
juízo. Por outro lado, o prejudicado, vendo que outras pessoas são trapaceiras, sente-se incentivado
em ser também, devido à impunidade. Daí a necessidade de alguém tutelar tais situações.
O processo coletivo não disputa espaço com o processo individual. O processo individual tem fim
egoístico; o processo coletivo, por sua vez, tem fim altruístico, pois o que ali for decidido valerá para toda a
sociedade;
205
Surgimento do processo coletivo no Brasil: surgiu com a ação popular – que já tinha previsão nas
Ordenações Manuelinas –, mas se consolida com a criação da ação civil pública (Lei nº 7.347/85 - LACP).
Desde 1985, a LACP passou por avanços e retrocessos, sendo marco no processo coletivo brasileiro.
3ª onda: efetividade do processo: é a onda que vivemos hoje, com as súmulas vinculantes, os recursos
repetitivos e a repercussão geral, por exemplo – medidas que visam a tornar o processo mais efetivo.

A tutela jurisdicional dos direitos coletivos podem seguir dois modelos principais:
1. Modelo Europeu (Verbandsklage – Ações Associativas): tem origem ítalo-franco-alemã, sendo
adotado pela Europa Continental, salvo a Escandinávia. Tem como características: (a) legitimidade apenas
das associações; (b) fragmentário: não abrange qualquer direito.
O sistema de processo coletivo europeu é pouco desenvolvido diante da desnecessidade de um
modelo de processo coletivo, tendo em vista o grande desenvolvimento humanitário dos países europeus.
2. Modelo Americano (Class Actions): é o modelo mais difundido no mundo. Possui as seguintes
características: (a) pragmatismo: o processo é voltado para a maior efetividade possível; (b) adequada
representação (adequacy of representation): o legitimado coletivo deve demonstrar para o Judiciário que
tem condições de conduzir o processo, inclusive condições financeiras para isso; (c) coisa julgada vincula a
todos, independentemente do resultado; (d) adequada notificação (fair notice): quando uma ação coletiva é
promovida, todos os membros do grupo devem ser notificados para manifestar interesse de exclusão da
ação coletiva (opt out). Com a exclusão, a pessoa não é afetada pelo resultado do processo coletivo; (e)
defining function: significa poderes acentuados do juiz.

II. Teoria geral do processo coletivo

Aqui serão tratados de questões relativas ao processo coletivo de forma geral e que não sejam
objeto específico de outro subponto do edital do MPF (ex.: competência, coisa julgada e litispendência -
subponto 19B; tutela específica e procedimentos - subponto 20A) ou do tópico seguinte deste subponto.

Princípios: são apontados muitos princípios atinentes ao processo coletivo, mas os principais, os
quais trazem grande parte das marcas características dessa espécie processual, são os seguintes:
1. Princípio da Indisponibilidade Mitigada da Ação Coletiva (art. 9º da LAP e art. 5º, § 3º, da LACP):
estabelece que o autor da ação coletiva não pode dela desistir (indisponibilidade), pois o objeto da ação
coletiva a ele não pertence, mas sim à coletividade. Mas, se desistir, não haverá extinção, e sim sucessão
processual. É mitigada porque o que é vedado é a desistência infundada. A desistência fundada é possível,
caso em que haverá a extinção do processo.
2. Princípio da Indisponibilidade da Execução Coletiva (art. 15 da LACP e art. 16 da LAP): uma vez
obtida a condenação do réu a determinada obrigação, é obrigatória a execução da sentença caso não haja
cumprimento voluntário. Tanto é assim, que o art. 15 citado estabelece que, decorridos 60 dias da sentença
sem execução, qualquer legitimado pode executá-la e, caso ainda assim não haja execução, o MP DEVERÁ
executá-la.
3. Princípio do Interesse Jurisdicional no Conhecimento do Mérito: estabelece que deve-se sempre
evitar a extinção do processo sem conhecimento de mérito, pois isso não resolve o conflito. Ora, se o conflito
atinge várias pessoas (a coletividade), o juiz deve fazer de tudo para que o mérito seja conhecido.
4. Princípio da Máxima Efetividade do Processo Coletivo ou Princípio do Ativismo Judicial : não tem
previsão legal expressa, mas é decorrência do sistema. Foi copiado do modelo americano, lá chamado de
defining function, pelo qual o juiz, no processo coletivo, tem funções extraordinárias, que superam os limites
daquelas que tem no processo individual. Daí a ideia de ativismo judicial.
5. Princípio da Ampla Divulgação da Demanda (art. 94 do CDC): esse princípio também foi copiado
do direito norte-americano, do princípio da fair notice. Por este princípio, o ajuizamento de ação coletiva
deve ser noticiado, por meio de editais, à coletividade.
6. Princípio da Integratividade do Microssistema Processual Coletivo: as diversas leis que tratam de
matérias afeitas ao processo coletivo formam um microssistema, no centro do qual está a LACP e o CDC.

Legitimidade: os legitimados para ingressar em Juízo na defesa de direitos e interesses


transindividuais dependem da espécie de ação coletiva. Porém, os legitimados das duas principais
modalidades de ação coletiva (ação popular e ação civil pública) são:
206
1. Ação popular: cidadão, isto é, aquele que está no exercício e gozo de seus direitos políticos.
2. Ação civil pública: os legitimados estão previstos no art. 5º da LACP: (i) Ministério Público; (ii)
Defensoria Pública; (iii) a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; (iv) a autarquia, empresa
pública, fundação ou sociedade de economia mista; e (v) a associação que, concomitantemente: a) esteja
constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil; e b) inclua, entre as suas finalidades
institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, aos
direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e
paisagístico.
Há grande discussão se o Judiciário poderia fazer o controle da legitimidade na análise do caso
concreto. Há duas correntes:
1ª corrente: defendida por NERY, estabelece que, salvo para as associações, NÃO é possível controle
judicial. Para NERY, então, o controle da representação adequada é ope legis (é o legislador quem define).
Ressalva as associações porque o próprio legislador as ressalvou (art. 5º, V, da LACP), exigindo a pertinência
temática para que sejam legitimadas. Apenas nesse caso o juiz poderia controlar a adequada representação,
por meio da análise da pertinência temática;
2ª corrente (majoritária): defendida por GRINOVER, entende que, sem prejuízo do controle
legislativo, também é possível o controle judicial da representação de todos os legitimados, de modo que o
controle não é só ope legis como também ope judicis. Nesta corrente, o controle judicial seria feito conforme
os seguintes critérios: (a) finalidade institucional e (b) pertinência temática do autor. Ex.: o MP, pelo art.
127 da CF, possui finalidade institucional de defesa de interesses sociais e individuais indisponíveis. Pela 1ª
corrente, compete apenas ao MP decidir se entra ou não com a ação coletiva (melhor para concurso do MP).
Pela 2ª corrente, o juiz poderia controlar sua representação.

Objeto: tem previsão no art. 81 do CDC. Segundo BARBOSA MOREIRA os interesses/direitos


transindividuais podem ser divididos em:
1. Interesses Naturalmente Coletivos: o traço caracterizador é a INDIVISIBILIDADE do objeto. Os
interesses naturalmente coletivos dividem-se em dois subgrupos:
a) Difusos: (i) sujeitos indeterminados e indetermináveis; (ii) unidos entre si por circunstâncias
de fato extremamente mutáveis; (iii) alta conflituosidade interna; e (iv) alta abstração;
b) Coletivos em Sentido Estrito: (i) sujeitos indeterminados, mas determináveis por grupo; (ii)
unidos por circunstâncias jurídicas (há existência de relação jurídica base entre os titulares
ou entre estes e a parte contrária); (iii) baixa conflituosidade interna; e (iv) menor abstração.
Note: a diferença central entre difusos e coletivos é a circunstância que ligam os sujeitos: nos
coletivos há relação jurídica base, enquanto nos difusos as circunstâncias são de fato.
2. Interesses Acidentalmente Coletivos: são caracterizados pela DIVISIBILIDADE do objeto,
constituindo os chamados interesses individuais homogêneos. Tem como características: (i) sujeitos
indeterminados, porém determináveis; (ii) a pretensão dos sujeitos tem origem comum; e (iii) natureza
individual: NUNCA esquecer que os direitos individuais homogêneos são individuais, mas, por uma questão
pragmática, podem ser tutelados coletivamente.

III. Liquidação e cumprimento de ações coletivas

A liquidação e o cumprimento das ações coletivas dependem da espécie de direito transindividual


tutelado.
No caso de direitos difusos e coletivos, estes comportam dois tipos de execução:
Execução da Pretensão Coletiva:
1. Legitimidade: a legitimidade para a execução coletiva está no art. 15 da LACP: é o autor,
qualquer outro legitimado ou o MP;
2. Destinatário da execução: é o fundo de reparação de bens difusos e coletivos lesados, criado
conforme o art. 13 da LACP. No âmbito federal, o Fundo Federal está regulado na Lei 9.008/1995.
3. Competência: é o juízo da condenação (cumprimento de sentença).
Execução da Pretensão Individual: é fruto do art. 103, § 3º, do CDC, representativa do transporte in
utilibus da coisa julgada:
1. Legitimidade: é execução de pretensão individual, de modo que são legitimadas à execução as
vítimas (se vivas) ou seus sucessores;
207
2. Liquidação da sentença genérica: diferentemente da execução da pretensão coletiva, cujo valo
já está definido na sentença coletiva, na execução individual o valor ainda não está definido,
demandando liquidação da sentença genérica. Tal liquidação é ligeiramente diferente da
sentença no processo individual (que serve apenas para apurar o quantum debeatur): além de
apurar o quantum, também vai ter de apurar o an debeatur, ou seja, se o exequente tem direito
à pretensão que alega.
Em face disso, chamar tal etapa de liquidação não é o mais correto. Daí porque seria muito mais
adequado utilizar a expressão HABILITAÇÃO, no lugar de liquidação, quando se tratar de
execução individual de sentença genérica coletiva. DINAMARCO prefere usar a expressão
“liquidação imprópria”;
3. Destinatário: apurado que o exequente tem direito à indenização, e apurado seu valor, quem vai
receber o valor é a vítima exequente ou seus sucessores.
4. Competência: a competência é concorrente: a execução pode ser proposta (a) no juízo do
domicílio do lesado (art. 101, I, do CDC), (b) no juízo da condenação (art. 98, § 2º, I, do CDC), (c)
no juízo onde podem ser encontrados os bens (doutrina) ou (d) no juízo do exequente (doutrina);
5. Prazo prescricional: é de 5 anos a contar do trânsito em julgado da sentença coletiva. Obs.: a
publicação de editais convocando eventuais beneficiários não interfere no prazo prescricional
(STJ. 1ª Seção. REsp 1.388.000-PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. para acórdão Min.
Og Fernandes, julgado em 26/8/2015 – recurso repetitivo).

Já os direitos individuais homogêneos têm o seguinte tratamento:


Execução da Pretensão Individual: tem previsão no art. 97 do CDC, são legitimados a vítima e seus
sucessores, além dos entes coletivos do art. 82 do CDC, agindo como substitutos processuais (hipótese
subsidiária). A liquidação é imprópria (habilitação). A competência é do juízo da vítima ou da condenação.
Execução da Pretensão Coletiva Residual: tem previsão no art. 100 do CDC, chamada de fluid
recovery. No prazo de 1 ano, não havendo habilitados em número compatível à extensão dos danos, permite
aos legitimados coletivos apurar o valor supostamente devido e executá-lo a bem não mais dos indivíduos,
mas sim da coletividade. O valor apurado é destinado àquele fundo do art. 13 da LACP.
1. Legitimidade: são os legitimados coletivos (art. 82);
2. Destinatário: não podem ser as vítimas, pois não se sabem quem são. Então o valor vai para o
fundo do art. 13 do LACP;
3. Competência: por se tratar de execução coletiva, a competência é do juízo da condenação, cf.
art. 98, § 2º, do CDC;
4. Prazo prescricional: é de 5 anos a contar do trânsito em julgado da sentença coletiva. Obs.: a
publicação de editais convocando eventuais beneficiários não interfere no prazo prescricional
(STJ. 1ª Seção. REsp 1.388.000-PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. para acórdão Min.
Og Fernandes, julgado em 26/8/2015 – recurso repetitivo);
5. Critérios para a estimativa do valor devido: o juiz deverá fixar valor supondo que este seria o
valor que as vítimas receberiam caso tivessem se habilitado. Os critérios são: (a) gravidade do
dano e (b) número de indivíduos habilitados e indenizados.

18A. O Ministério Público no processo civil.

Sidney Smith

No processo civil, especificamente, é o órgão incumbido de tutelar o interesse público, que compreende os
interesses e direitos sociais e individuais indisponíveis, e a ordem jurídica, na relação processual e nos
procedimentos de jurisdição voluntária. No processo civil, o Ministério Público atua como parte ou como
fiscal da lei (custos legis). Sua atuação como parte se dá conforme as suas atribuições institucionais (art. 177,
CPC/2015). Como fiscal da lei atua nas hipóteses elencadas no art. 178, CPC/2015. O Ministério Público
jamais atua como mandatário ou procurador da parte. Mesmo nas hipóteses em que a lei prevê a defesa de
terceiros (art. 748, I e II, CPC/2015), a atuação é no sentido de tutelar a ordem jurídica ou interesses sociais e
individuais indisponíveis.

208
O Ministério Público como parte: inicialmente há que distinguir parte material de parte processual.
Geralmente, a parte processual é também a parte do direito material controvertido. Ocorre, todavia, de a lei,
em casos extraordinários, autorizar certas pessoas e órgãos, inclusive o Ministério Público, a pleitear em
nome próprio direito alheio (art. 18, CPC/2015). Na primeira hipótese, temos a parte material, que também
pode figurar como parte no processo; na segunda, temos a ideia de parte num sentido meramente
processual. Assim, quando o Ministério Público age na qualidade de Estado (como órgão estatal, compõe o
próprio Estado), por exemplo, exercendo a titularidade da ação penal, ou, no processo civil, fazendo
requerimento por meio de procedimento de jurisdição voluntária, sua atuação se dá como parte material.
Quando pleiteia em nome próprio direito alheio, seja de pessoas ou da coletividade, como, por exemplo, na
ação civil pública, na ação civil ex delicto, diz-se que é parte apenas no sentido processual (substituto
processual). De qualquer forma, nas duas hipóteses sua atuação é como parte. Geralmente, como parte, tem
legitimidade apenas ativa. A doutrina costuma dizer que ocorre apenas uma hipótese em que o Ministério
Público figura como réu: na ação rescisória de sentença, em cujo processo atuou como autor. Exemplo: ação
rescisória de sentença proferida em ação de inventário e partilha proposta pelo Ministério Público na
hipótese de existir herdeiro incapaz (art. 616, VII, CPC/2015). O art. 341, parágrafo único, do Novo CPC tem
duas diferenças quando comparado com o parágrafo único do art. 302 do CPC/1973. Exclui o Ministério
Público e inclui o defensor público no rol dos sujeitos que têm a prerrogativa da negativa geral. A ausência de
previsão expressa do Ministério Público não deve gerar consequências práticas porque sua presença como
parte no polo passivo é excepcionalíssima e porque quando atuar, também excepcionalmente, como curador
especial, continua a ter a prerrogativa. São casos mais comuns de atuação do Ministério Público como parte
(parte material ou substituto processual): Ação rescisória de sentença fruto de colusão das partes para
fraudar a lei (art. 966, III, b, CPC/2015); Ação de nulidade de casamento (CC, art. 1.549); Ação direta de
inconstitucionalidade (CF/88, art. 129, IV); Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85, art. 5º); Pedido de interdição
em caso de doença mental grave, quando o cônjuge, companheiro, parente ou entidade na qual se encontrar
o interditando não propuserem o pedido, bem como quanto os primeiros legitimados também forem
incapazes (art. 748, I e II, CPC/2015); Pedido de abertura de inventário e partilha na hipótese de herdeiro
incapaz (art. 616, VII, CPC/2015); Incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 977, III, CPC/2015):
aqui se o Ministério Público não for o requerente, deve intervir obrigatoriamente no incidente; Reclamação
para preservar a competência de tribunal, garantir a autoridade de suas decisões ou a observância de súmula
vinculante ou acórdão proferido no julgamento de demandas repetitivas (art. 988, CPC/2015).

O Ministério Público como custos legis: Art. 178, CPC/2015.O que determina a intimação do Ministério
Público em todas as hipóteses do artigo em comento é o interesse público primário (o bem comum). O
interesse público secundário (o interesse da pessoa pública), por si só, não justifica a participação como
custos legis do Ministério Público (art. 178, parágrafo único, CPC). O Ministério Público será intimado para, no
prazo de 30 (trinta) dias, intervir como fiscal da ordem jurídica nas hipóteses previstas em lei ou na
Constituição Federal e nos processos que envolvam: I – interesse público ou social; II – interesse de incapaz;
III – litígios coletivos pela posse de terra rural ou urbana. Qualquer que seja o interesse justificador da
intervenção do Ministério Público, incumbe ao órgão, precipuamente, a defesa da ordem jurídica. Pouco
importa figure num dos polos da relação processual um incapaz ou a Fazenda Pública. O primeiro aspecto a
ser tutelado é a ordem jurídica, até porque, preservada esta, na demanda, preservado estará o regime
democrático, os interesses sociais e individuais indisponíveis (CF/88, art. 127). Afora a tutela da ordem
jurídica, cada hipótese revela o interesse que deva ser tutelado pelo órgão ministerial. Interesses sociais são
aqueles de transcendem o âmbito individual para atingir o interesse da coletividade. Nas causas que
envolvam interesse público este será evidenciado pela natureza da lide e, em regra, a necessidade de
intervenção é ditada pela própria lei. Entretanto, quando não houver disposição que determine a
manifestação do órgão do Ministério Público, deverá o juiz, verificando a existência de interesse público,
provocar a intervenção do Parquet. A Justiça Estadual comumente adotava praxe viciosa de intimar o
Ministério Público para todas as causas em que num dos polos figurasse uma pessoa jurídica de direito
público, ainda que o direito controvertido tivesse reflexo meramente econômico. Por tal razão é que o novo
CPC precisou regulamentar a matéria, de modo a dispor, expressamente, que “a participação da Fazenda
Pública não configura, por si só, hipótese de intervenção do Ministério Público” (art. 178, parágrafo único).
Assim, a intervenção do Parquet somente se justifica quando o interesse público estiver relacionado com o
interesse geral, da coletividade, e não com o mero interesse patrimonial da Fazenda Pública. Nas ações em
que há interesses de incapazes (inciso II), a atuação justifica-se pela proteção que a lei outorga ao incapaz,
209
seja a incapacidade absoluta ou relativa. Na hipótese do inciso III (“nas causas que envolvam litígios coletivos
pela posse de terra rural ou urbana”), a intervenção do Ministério Público objetiva garantir o direito social à
moradia, expressamente incluído no rol do art. 6º, da Constituição Federal. Vale lembrar que de acordo com a
redação do art. 82, III, do CPC/73, a intervenção do Ministério Público esta restrita aos litígios coletivos pela
posse de terra rural. Com a nova legislação, estendeu-se a atuação do órgão ministerial aos conflitos coletivos
de posse das terras urbanas, sobretudo nos assentamentos informais de baixa renda que rotineiramente são
objetos de demandas que envolvem o exercício do direito à moradia. Nos litígios coletivos pela posse de
imóvel o Ministério Público é chamado para intervir e, inclusive, para acompanhar a audiência de mediação
prevista no art. 565, §2º, CPC/2015. Destaque-se que o novo CPC não repetiu a redação do art. 82, II, do
CPC/73, que prevê a intervenção do Ministério Público “nas causas concernentes ao estado da pessoa, pátrio
poder, tutela, curatela, interdição, casamento, declaração de ausência e disposições de última vontade”. Não
há mais, portanto, necessidade de intervenção obrigatória do órgão ministerial em todas as ações de família,
mas somente quando houver interesse de incapaz. Por fim, o prazo para se manifestar deve ser contado
sucessivamente para autor e réu, sendo o último a se manifestar o Ministério Público quando funcionar no
processo como fiscal da ordem jurídica.

Consequências da ausência do Ministério Público no processo: atuando como parte, não se pode falar em
ausência do Ministério Público no processo. Já na qualidade de fiscal da ordem jurídica, caso o Ministério
Público não seja intimado a intervir, poderá ser considerado nulo o processo (art. 279, CPC/2015) – Marinoni,
Arenhart e Mitiero explicam que nesse caso há vício de forma no processo, pois mesmo na hipótese de não
ocorrer intimação do órgão do Ministério Público para intervir nas causas elencadas no art. 178, a nulidade só
poderá ser decretada depois que o Parquet for efetivamente intimado e se manifestar sobre a existência ou
inexistência de prejuízo (art. 279, §2º, CPC/2015). O que enseja a nulidade nas ações em que há
obrigatoriedade de intervenção do Ministério Público é a falta de intimação do seu representante e não a
ausência de manifestação.

Prazos e responsabilidades: o novo CPC disciplinou a matéria de forma distinta do CPC anterior,
possibilitando ao Ministério Público, à Fazenda Pública e à Defensoria Pública o prazo em dobro para
qualquer manifestação nos autos, exceto nas hipóteses em que a lei estabelecer, de forma expressa, outro
prazo próprio para esses entes. O prazo começa a correr a partir da citação, da intimação ou da notificação da
instituição (art. 230, CPC/2015), a qual será preferencialmente por meio eletrônico, conforme art. 246, §1º e
270, parágrafo único, ambos do CPC/2015. Marinoni, Arenhart e Mitiero acrescentam que, se o juiz entender
que há interesse público para a intervenção do Ministério Público e este, intimado, não intervier no prazo de
trinta dias, omitindo-se de qualquer pronunciamento, deve o juiz submeter a questão ao órgão de supervisão
do Ministério Público (art. 28, do CPP, por analogia). O órgão do Ministério Público será civil e
regressivamente responsável quando, no exercício de suas funções, proceder com dolo ou fraude (art. 181,
CPC/2015). O prejudicado por ato doloso ou fraudulento praticado por representante do Ministério Público
terá o direito de ressarcir-se por meio de ação dirigida contra o Poder Público. Em tal hipótese, o membro do
Ministério Público é responsável perante o Estado, devendo indenizá-lo em regresso. Nada obsta a que o
prejudicado intente ação diretamente contra o membro do MP ou contra este e o Estado, conjuntamente
(nesse sentido o REsp nº. 1.325.862/PR). Já o comportamento culposo não é suficiente para caracterizar a
responsabilidade pessoal do representante do Ministério Público, a teor do dispositivo legal citado, embora
não exima a Fazenda Pública de responsabilidade (objetiva).

Legitimidade para recorrer: O Ministério Público tem legitimidade para recorrer tanto quanto atua como
parte, como quando oficia como fiscal da lei. Além disso, até mesmo nas hipóteses em que a intervenção se
dá como fiscal da ordem jurídica, pode o Ministério Público produzir provas e requerer medidas processuais
pertinentes (art. 179, II, CPC/2015). A indicação do artigo em comento não é exaustiva, podendo o Ministério
Público promover o que tiver por conveniente à guarda do interesse público primário. Não pode, contudo,
ampliar o mérito da causa (arts. 2º e 141, CPC).Legitimidade não se confunde com interesse. O Ministério
Público pode ter legitimidade, porque interveio no processo, mas não ter interesse para recorrer no caso
concreto, em razão de o desfecho da demanda ter sido favorável ao interesse justificador de sua intervenção.
Assim, se a sentença foi favorável ao incapaz, carece o Ministério Público de interesse para recorrer. O
Ministério Público, exercendo a função de fiscal da lei, não tem legitimidade para recorrer adesivamente. Isso
porque a interposição de recurso adesivo pressupõe mútua sucumbência, o que não ocorre quando o
210
Ministério Público atua como custos legis. E também porque, no caso, o Ministério Público não é parte e, nos
termos do art. 997, §1º, somente quem figura nessa qualidade pode recorrer adesivamente. Conforme a
Súmula 99 do STJ, “o Ministério Público tem legitimidade para recorrer no processo em que oficiou como
fiscal da lei, ainda que não haja recurso da parte”. Quanto à ausência do representante do Ministério Público
na audiência: É possível encontrar na doutrina três correntes doutrinárias bem definidas a respeito da
ausência injustificada do MP em audiência. Uma primeira entende ser a presença do membro do Ministério
Público indispensável, e isso independentemente de sua qualidade no processo (de parte, em regra como
autor, ou fiscal da ordem jurídica). A audiência realizada sem a presença do membro do Ministério Público,
portanto, qualquer que seja o motivo de sua ausência, gerará uma nulidade relativa (Dinamarco). Outra
corrente doutrinária tem entendimento em sentido diametralmente oposto, justificando que a única exigência
formal exigida no caso é a intimação do promotor de justiça, cuja ausência não será capaz de determinar o
adiamento da audiência (Gusmão Carneiro,). Por fim, há uma terceira corrente que entende depender da
qualidade assumida pelo Ministério Público no processo o adiamento da audiência: figurando no processo
como parte, como tal deverá ser tratado, sendo que a sua ausência injustificada não será capaz de causar o
adiamento da audiência, o mesmo não podendo ser dito na hipótese do Ministério Público figurar na
demanda como fiscal da ordem jurídica (Fidelis dos Santos).

Outras hipóteses de atuação do Ministério Público no Processo Civil: O Ministério Público tem legitimidade
para arguir a incompetência relativa, nas causas que atuar (art. 65, parágrafo único, CPC/2015); O Ministério
Público é parte legítima para propor ação de investigação de paternidade (Lei n o560/92, art. 2o, § 4o) e ação
de alimentos (ECA, art. 201, III), podendo cumular ambas as ações. Em tais hipóteses, ele é parte (substituto
processual) e não mandatário; A intervenção do Ministério Público na insolvência civil se impõe em razão do
que dispõe o art. 178, I, CPC/2015. Há interesse público nas execuções contra devedor insolvente, pois a
finalidade dessa ação não é apenas evitar que o patrimônio dele seja dilapidado, mas também impedir
prejuízos à ordem econômica geral. (STJ, REsp nº. 488432/MG, j. 01/11/2012); Segundo disposto no art. 721,
CPC/2015, o Ministério Público deve ser intimado para se manifestar nos procedimentos de jurisdição
voluntária, se presente alguma das hipóteses do art. 178, CPC/2015; O órgão do Ministério Público
promoverá a extinção da fundação quando ocorrer uma das hipóteses: tornar ilícito o seu objeto, for
impossível a sua manutenção ou vencer o prazo de sua existência (art. 765 do CPC/2015); É obrigatória a
intervenção do Ministério Público em ação de nulidade de compra e venda que for objeto de registro
imobiliário, uma vez que a anulação do negócio jurídico implicará a desconstituição do registro e, nesse caso,
há interesse público evidenciado pela natureza da lide. Aliás, a atuação do Ministério Público é exigida em
muitos procedimentos previstos na Lei de Registros Públicos (Lei n o 015/73), sobretudo no que tange ao
registro civil e registro imobiliário; O Ministério Público, órgão componente do Estado, em razão de sua
incumbência de defender a ordem jurídica, é parte material em ação direta de inconstitucionalidade de leis
ou atos normativos estaduais ou municipais, em face da Constituição Estadual (art. 125, § 2 o, CF/88, e Lei
no625/93, art. 29, I); O Ministério Público da União, representado pelo Procurador-Geral da República, pode
propor ação de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual em face da Constituição da
República (arts. 102, I, a, e 103, I, todos da CF/88); O Ministério Público deve ser ouvido no incidente de
arguição de inconstitucionalidade, em controle difuso, de lei ou de ato normativo do poder público (art. 948,
CPC/2015). Igualmente, ainda que figure como suscitante, será ouvido como custos legis no incidente de
resolução de demandas repetitivas – IRDR (art. 976, CPC/2015).

18B. Saneamento e organização do processo

Rafael Rodrigues Veloso

01) DISPOSIÇÕES LEGAIS SOBRE O SANEAMENTO:


01.1) MARCO TEMPORAL EM RELAÇÃO A ALGUMAS SOLICITAÇÕES:

01.1.1) CPC, art. 329. O autor poderá: I - até a citação, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir,
independentemente de consentimento do réu; II - até o saneamento do processo, aditar ou alterar o pedido
e a causa de pedir, com consentimento do réu, assegurado o contraditório mediante a possibilidade de
manifestação deste no prazo mínimo de 15 (quinze) dias, facultado o requerimento de prova suplementar.
211
01.1.2) CPC, Art. 377. A carta precatória, a carta rogatória e o auxílio direto suspenderão o julgamento da
causa no caso previsto no art. 313, inciso V, alínea “b”, quando, tendo sido requeridos antes da decisão de
saneamento, a prova neles solicitada for imprescindível.

01.2) REGULAMENTAÇÃO DA MATÉRIA: NCPC, art. 357. Não ocorrendo nenhuma das hipóteses deste
Capítulo, deverá o juiz, em decisão de saneamento e de organização do processo: I - resolver as questões
processuais pendentes, se houver; II - delimitar as questões de fato sobre as quais recairá a atividade
probatória, especificando os meios de prova admitidos; III - definir a distribuição do ônus da prova,
observado o art. 373; IV - delimitar as questões de direito relevantes para a decisão do mérito; V - designar,
se necessário, audiência de instrução e julgamento.

§ 1º Realizado o saneamento, as partes têm o direito de pedir esclarecimentos ou solicitar ajustes, no prazo
comum de 5 (cinco) dias, findo o qual a decisão se torna estável.

§ 2º As partes podem apresentar ao juiz, para homologação, delimitação consensual das questões de fato e
de direito a que se referem os incisos II e IV, a qual, se homologada, vincula as partes e o juiz.

§ 3º Se a causa apresentar complexidade em matéria de fato ou de direito, deverá o juiz designar audiência
para que o saneamento seja feito em cooperação com as partes, oportunidade em que o juiz, se for o caso,
convidará as partes a integrar ou esclarecer suas alegações.

§ 4º Caso tenha sido determinada a produção de prova testemunhal, o juiz fixará prazo comum não superior
a 15 (quinze) dias para que as partes apresentem rol de testemunhas.

§ 5º Na hipótese do § 3º, as partes devem levar, para a audiência prevista, o respectivo rol de testemunhas.

§ 6º O número de testemunhas arroladas não pode ser superior a 10 (dez), sendo 3 (três), no máximo, para a
prova de cada fato.

§ 7º O juiz poderá limitar o número de testemunhas levando em conta a complexidade da causa e dos fatos
individualmente considerados.

§ 8º Caso tenha sido determinada a produção de prova pericial, o juiz deve observar o disposto no art. 465 e,
se possível, estabelecer, desde logo, calendário para sua realização.

§ 9º As pautas deverão ser preparadas com intervalo mínimo de 1 (uma) hora entre as audiências.

02) DO DESPACHO SANEADOR À ORGANIZAÇÃO EM COLABORAÇÃO COM AS PARTES:

Depois de realizado o contraditório entre as partes, e não sendo o caso de julgar o processo no estado em
que se encontra, tem-se que proceder à organização do processo, isto é, tem-se que sanear o processo e
prepará-lo para a instrução e o respectivo julgamento.

O NCPC fala a respeito em “saneamento e organização do processo” (art. 357), mas é certo que melhor seria
falar aí apenas em organização do processo – saneamento e preparação são atividades que nele se realizam
a fim de organizá-lo para que se possa seguir adinta rumo à prestação da tutela jurisdicional.

Tradicionalmente em nosso sistema, toda a atividade de organização do processo era tratada sob o nome de
saneamento da causa e era realizada de forma concentrada e estrita mediante o chamado despacho
saneador. O despacho saneador era o ato com que o juiz examinava a existência de óbices processuais
capazes de impedir a apreciação do mérito da causa, tomava providências para delimitar as questões
litigiosas entre as partes e deliberava a respeito dos meios de prova.

Com as reformas do direito anterior, o direito brasileiro evoluiu para a organização do processo de forma
concentrada e oral, seguindo-se a tendência oriunda da área de influência austro-alemã pela realização de
212
um audiência preliminar (à semelhança da “erste Tagsatzung” austríaca e da “früher erster Termin” alemã)
como meio preferencial para organização do processo.

O NCPC continua com a forma concentrada de organização do processo, destinando um momento específico
para sua realização.

Se a causa não apresentar complexidade, a organização pode ocorrer de maneira escrita.

Se porém, a causa for complexa em matéria de fato ou de direito, então deve o juiz designar audiência a fim
de que a organização do processo seja feita em cooperação com as partes – com intervalo mínimo de pauta
de uma hora entre as audiências.

Na linha da contratualização do processo civil, o NCPC permitiu ainda que as partes apresentem delimitação
consensual das questões de fato e de direito para homologação judicial, sendo claro, porém, que o consenso
entre as partes não afasta a possibilidade de o juiz determinar prova diversa daquela acorda (é ineficaz a
disposição das partes sobre os poderes instrutórios do juiz – art. 370).

03) ORGANIZAÇÃO DO PROCESSO: A organização do processo no art 357 CPC tem uma dupla direção.

A primeira é retrospectiva, tendo por objeto eventuais óbices processuais capazes de impedir a apreciação
do mérito da causa (“definição das questões processuais pendentes”). Assim, a primeira tem por objeto
questões capazes de impedir a apreciação do mérito a fim de, em sendo possível, saneá-las.

A segunda é prospectiva, tendo por objeto a delimitação do “thema probandum”, a especificação dos meios
de prova, a definição da distribuição do ônus da prova, a delimitação do “thema decidendum” (questões de
direito relevantes para a decisão do mérito) e a designação da AIJ, em sendo o caso. Assim, a segunda tem
por objeto questões capazes de preparar uma adequada apreciação do mérito.

04) POR ESCRITO:

Organizado o processo por escrito, as partes têm o direito de pedir esclarecimentos ou solicitar ajustes na
delimitação do thema probandum e do thema decidendum no prazo comum de 05 (cinco) dias.

Findo esse prazo, a decisão torna-se estável e seu conteúdo só poderá ser objeto de novo debate no juízo de
segundo grau, acaso devidamente impugnada a questão em preliminar de apelação ou nas respectivas
contrarrazões (1009, NCPC), ressalvada eventual decisão sobre a distribuição do ônus da prova, que é
imediatamente recorrível mediante agravo de instrumento (1015, XI, NCPC).

Embora o NCPC fale que é recorrível via agravo de instrumento apenas a decisão que redistribua o ônus da
prova, permitir a imediata revisão no caso de redistribuição e não permiti-la no caso de inferimento do
pedido de redistribuição é algo contrário ao princípio da igualdade e da paridade de armas no processo civil
(arts. 5º, I, CRFB e 7º, NCPC). Em ambos os casos é de se admitir o duplo exame imediato da questão, sob
pena de assimetria entre as partes, com evidente prejuízo ao direito ao contraditório (arts. 5º, LV, CRFB, 7º,
9º e 10, NCPC).

05) EM AUDIÊNCIA: Organizado o processo em audiência, até mesmo para estimular o debate e a
autorresponsabilidade das partes, o direito de pedir esclarecimentos ou solicitar ajustes preclui com o seu
término. Nesse caso, as questões decididas visando à organização do processo só poderão ser novamente
examinadas pelo tribunal, se impugnadas em apelação ou nas respectivas contrarrazões (1009), ressalvada
novamente eventual decisão sobre a distribuição do ônus da prova em audiência, hipótese em que será
cabível agravo de instrumento (1015, XI) – caso tenha sido deferido ou indeferido o requerimento (art. 5º,
LV, CRFB, 7º, 9º e 10, NCPC).
213
06) CONSENSUAL: Se a causa é delimitada consensualmente pelas partes, inexiste direito de impugnar ou de
ajustar, porque isso representaria claro comportamento contraditório e, portanto, vedado pelo princípio da
boa-fé processual (art. 5º, CPC). Nesse caso, eventuais irresignações das partes só poderiam encontrar
espaço mediante ação anulatória de ato processual fundada nos motivos expressamente admitidos em lei
(966, § 4º).

07) ORGANIZAÇÃO RETROSPECTIVA: Havendo questões processuais pendentes, deve o juiz examiná-las a
fim de, em sendo possível, saneá-las. Como o NCPC privilegia a efetiva tutela dos direitos em detrimento de
soluções puramente formais e processuais, o ideal é que a organiza retrospectiva do processo tenha como
objetivo a busca por um justo equilíbrio entre a forma e a instrumentalidade. Vale dizer: sendo possível
aproveitar o ato, deverá fazê-lo. Não sendo, deverá determinar a sua renovação. Na organização
retrospectiva do processo também é oportuno o exame dos requisitos necessários à concessão da tutela
jurisdicional do direito, notadamente dos pressupostos processuais e das questões concernentes à
legitimidade das partes e ao interesse processual. Também aqui, sempre que possível, deve o juiz viabilizar
às partes o atendimento de quaisquer prescrições de ordem processual a fim de que o mérito da causa possa
ser efetivamente julgado posteriormente (317). O ideal é que todas as questões processuais sejam
examinadas e resolvidas com o saneamento, de modo que a sentença se ocupe apenas das questões
concernentes ao mérito da causa. Com isso, busca-se outorgar maior eficiência ao processo (art. 8º): seja
porque evita que o processo se desenvolva sem condições de efetivamente resolver o conflito entre as
partes, seja porque permite que no momento oportuno o juiz ocupe-se apenas das questões de mérito.

08) ORGANIZAÇÃO PROSPECTIVA: Pertencem à organização prospectiva todas aquelas questões que visam a
preparar a causa para a instrução e para o seu julgamento. São basicamente questões concernentes à
delimitação e prova das alegações de fato e à delimitação do direito relevante para a decisão de mérito. As
alegações de fato que constituem o objeto do debate são aquelas formuladas pelas partes (arts. 2º e 141).
São as alegações de fatos essenciais – aqueles dos quais decorrem as consequências jurídicas pretendidas
pelas partes. Como corolários da estrutura cooperativa do processo civil brasileiro (art. 6º), se a narrativa das
partes encontrar-se lacunosa, obscura ou de qualquer modo de difícil compreensão, tem o juiz de convidá-las
à integração e ao esclarecimento, tendo o dever de colaborar indicando exatamente aquilo que pretende ver
integrado e esclarecido (analogamente ao 321). Tendo em conta que a colaboração é uma das normas
fundamentais do processo civil brasileiro, o convite à integração e ao esclarecimento não está restrito à
organização do processo em audiência (sempre que necessários, pode o juiz determina-los).

09) MEIOS DE PROVA: As alegações de fato que podem ser objeto de prova são aquelas controversas,
pertinentes e relevantes. Daí que devem entrar na delimitação das questões de fato suscetíveis de prova
todas as alegações que apresentem essas características. É sobre essas questões que recairão os meios de
prova, que o juiz deve também especificar nessa oportunidade a partir dos requerimentos das partes ou de
ofício. Pretendendo as partes provar alegações incontroversas, impertinentes ou irrelevantes, deve o juiz
indeferir o pedido de admissão de prova (370, pu). Caso tenha sido determinada a produção de prova
testemunhal, o juiz fixará prazo comum não superior a 15 dias para que as partes apresentem rol de
testemunhas. Tendo havido designação de audiência para organização do processo, as partes têm de nela
consignar o rol de testemunhas. Contudo, haja vista a necessidade de abrir o processo para o maior acervo
probatório possível, com o que se incrementa a busca pela verdade das alegações de fato (369) e a
possibilidade de se produzir uma decisão justa, dificilmente pode se entender que a ausência de
apresentação de rol em audiência gera preclusão do direito de produzir prova testemunhal. O número de
testemunhas não pode ser superior a dez, sendo três, no máximo, para a prova de cada fato. O juiz pode
214
limitar o número de testemunhas em consideração à complexidade da causa e dos fatos individualmente
considerados. Caso tenha sido determinada a produção de prova pericial, o juiz designará desde logo o perito
e assinalará o prazo legal para as partes formularem quesitos e apresentarem seus assistentes técnicos (465,
1º). Em sendo o caso, esse mesmo prazo servirá para a impugnação do perito pelas partes. Se possível, o juiz
estabelecerá desde logo calendário para realização da perícia.

10) ÔNUS DA PROVA: Em regra, o ônus da prova é distribuído de maneira fixa pelo legislador (373). Não
havendo convenção sobre o ônus da prova ou requerimento para a sua redistribuição (363, §§), não há
necessidade de qualquer decisão a respeito do assunto: o ônus da prova será aquele distribuído legalmente.
Porém, havendo controvérsia a respeito, tem o juiz de decidir a questão na decisão de organização da causa
ou em audiência a fim de não surpreender as partes com ônus retroativos ou não atrasar a marcha
procedimental com reabertura da fase instrutória em momento deslocado do procedimento.

11) QUESTÕES DE DIREITO RELEVANTES: Cada uma das partes invoca a seu favor os fundamentos jurídicos
que entende pertinente para melhor defesa de sua posição em juízo. As partes levam ao processo, portanto,
não só as alegações de fato, mas também os fundamentos jurídicos com que pretendem ver decidido o caso
(319, III e 336). Daí que normalmente as questões de direito relevantes para a decisão da causa serão
selecionadas do contraste entre as alegações fático-jurídicas do autor e dor réu. Pode ocorrer, porém, de o
juiz trazer ao debate questões de direito que pode conhecer de ofício, mas que não foram previamente
alegadas pelas partes (por exemplo, a prescrição ou a decadência). Pode ainda ocorrer de o juiz entender
que o direito que rege o caso é outro, diverso daquele alegado pelas partes, com o que poderá aplica-lo de
ofício à luz do brocardo iura novit curia. Como, porém, nenhuma questão pode ser decidida definitivamente
sem que se tenha viabilizado às partes o direito ao contraditório (arts. 5º, LV, CRFB e 7º, 9º e 10, CPC), o que
inclui igualmente a nova visão jurídica dos fatos, então o ideal é que todo esse material jurídico novo seja
identificado o quanto antes no procedimento a fim de que todos os participantes do processo possam
debate-las. O momento mais oportuno, segundo o legislador, é o momento da organização prospectiva do
processo – esse é o sentido, portanto, da previsão de delimitação das questões de direito relevantes para a
decisão do mérito (357, IV).

18C. Competência interna: classificação, divisão e modificação. Competência internacional. Homologação de


sentença estrangeira. Carta rogatória. Tratados e convenções para cumprimento de decisões estrangeiras no
Brasil.

Letícia Gonçalves
Fontes: Graal 28º CPR. Novo Código de Processo Civil Comentado - Marinoni, Arenhart e Mitidiero, 3 ed., RT. Anotações Curso Ênfase.

I. Competência Interna. Enquanto as normas de competência internacional definem se o Judiciário brasileiro


irá julgar ou não a causa, as regras de competência interna apontam quais os órgãos locais incumbidos da
tarefa no caso concreto. A competência internacional trata dos limites da própria jurisdição brasileira. 1.
Divisão: Como o poder jurisdicional deve ser distribuído, dá-se o nome de competência à jurisdição que pode
e deve ser efetivamente exercida por um ou vários órgãos do Poder Judiciário. Para determinar a
competência no caso concreto, deve-se verificar: a) competência internacional (verificar critérios para
determinar as causas que podem ou devem ser julgadas pela jurisdição brasileira) ; b) competência de
jurisdição (a competência da Justiça comum federal é expressa); c) competência de foro (CPC); d)
competência de juízo (LOJ e RI). A competência de jurisdição está delineada na CR: especial (eleitoral,
trabalhista e militar) e comum (federal e dos Estados). Convencionou-se chamar de jurisdição civil toda
aquela alheia à matéria penal que não tenha sido cometida às justiças especializadas. A competência do foro
divide-se em: comum ou geral (domicílio do réu) e especiais (pessoas, coisas e fatos envolvidos no litígio). 2.
Critérios. Define-se a competência a partir de três critérios: o objetivo, o funcional e o territorial. O primeiro
critério desdobra-se em objetivo a) em razão do valor, b) em razão da matéria e c) em razão da pessoa; o
segundo em a) funcional horizontal (ex.: competência para o cumprimento de sentença condenatória – art.
215
516 – e para conhecer de ações acessórias – art. 61) e b) funcional vertical (também conhecido como critério
hierárquico, ex.: competência recursal). 3. Classificação: Incompetência absoluta ou relativa. São dois os
regimes jurídicos a que se submete a competência: competência absoluta e competência relativa,
organizados segundo a maior ou menor disponibilidade da vontade das partes sobre as normas
determinadoras da competência. Incompetência absoluta: pode ser reconhecida de ofício em qualquer
tempo e grau de jurisdição, não preclui, não há prorrogação e nem modificação pela vontade das partes;
competência absoluta é requisito de validade do processo, pelo que decisão proferida por órgão jurisdicional
absolutamente incompetente é passível de ação rescisória (art. 966, II); CPC considera absoluta a
competência: fixada com base no critério objetivo em razão da matéria e da pessoa e do critério funcional
horizontal (com a ressalva do CPC 516, pu – possibilidade de opção do exequente no cumprimento de
sentença condenatória) e vertical (ou hierárquico). Incompetência relativa: não pode ser reconhecida de
ofício (STJ, Súm. 33), preclui se ausente alegação no prazo, prorrogando a competência (art. 65) e comporta
modificação pela vontade das partes; pode ser alegada pelo MP nas causas em que atuar (65, p.u.); CPC
considera relativa a competência: fixada pelo critério objetivo em razão do valor e pelo critério territorial
(salvo em casos como os dos arts. 47, §§1º e 2º e 63, §3º, em que há disciplina sui generis da competência
territorial, havendo concorrência entre os juízos onde se encontram os bens sujeitos à expropriação, onde
deva ser realizada a prestação de fazer ou não fazer e o do domicílio do executado). Tanto a incompetência
absoluta quanto a relativa devem ser alegadas em preliminar de contestação (art. 64), e, salvo decisão
judicial em sentido contrário, conservar-se-ão os efeitos de decisão proferida pelo juízo incompetente até
que outra seja proferida, se for o caso, pelo juízo competente (§4º). A competência territorial decorrente da
divisão territorial da seção judiciária federal é absoluta (ainda que alguns a trate como funcional). Em razão
disso, é lícita a redistribuição de processos para as novas subseções, de acordo com a nova divisão territorial
da competência: como se trata de alteração superveniente de competência absoluta (ainda que territorial),
excepciona-se a regra da perpetuatio jurisdicionis. 3. Modificação. O NCPC prevê que se determina a
competência no momento em que a demanda é ajuizada, assim considerada a data do registro ou da
distribuição da petição inicial, sendo irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas
posteriormente, salvo quando suprimirem órgão judiciário ou alterarem competência absoluta (arts. 43 e
312). Prevê ainda que a competência relativa poderá modificar-se pela conexão ou continência (art. 54).
Além disso, a prorrogação pode afastar a incompetência relativa. Já a prevenção (arts. 58 a 60) não modifica
a competência, mas sim a fixa, em função do elemento temporal. a) Conexão é nexo de semelhança entre
duas ou mais ações; segundo o caput do art. 55, reputam-se conexas duas ou mais ações quando lhes for
comum o pedido ou a causa de pedir; para Arenhart, este artigo apenas conceitua uma espécie de conexão, a
conexão própria simples objetiva, não abarcando outros casos, certo que STJ já decidiu que a conceituação
legal admite certo grau de maleabilidade no exame dos casos concretos pelo juiz, à luz do critério da
utilidade da reunião dos processos como forma de evitar decisões judiciais inconciliáveis sob ponto de vista
prático; Classificação (Arenhart, Marinoni, Mitidiero): i. Conexão própria = há semelhança entre causas ou
ações, subdivide-se em simples ou qualificada; a conexão própria simples pode ser subjetiva (que é a
continência, art. 56) ou objetiva (art. 55); a conexão própria qualificada pode ser por acessoriedade (art. 61),
por prejudicialidade, por reconvenção, por garantia ou por compensação. ii. Conexão imprópria = quando
existem duas ações ou causas diferentes, mas que dependem total ou parcialmente da resolução de
questões idênticas. Tanto a conexão própria quanto a imprópria podem dar lugar à reunião de processos,
que se trata de uma faculdade (e não de um dever) do órgão jurisdicional (STJ). CPC ainda determina que:
aplica-se a conexão à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato
jurídico e às execuções fundadas no mesmo título executivo (art. 55, §2º) e que serão reunidos para
julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou
contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre eles. b) Continência. Continência é
espécie de conexão (própria simples subjetiva) que ocorre quando entre duas ou mais ações há mesmas
partes e mesma causa de pedir mas o pedido, em uma delas, é mais amplo, abarcando os pedidos
formulados nas demais (Arenhart, Mitidiero, Marinoni); o CPC dá tratamento intermediário à continência,
entre a conexão e a litispendência (art. 57) a depender de qual ação foi primeiro ajuizada: a continente (mais
ampla) ou a contida (menos ampla): se a continente foi deduzida anteriormente, a contida será extinta sem
resolução de mérito; se a contida foi ajuizada anteriormente, aplica-se o regime da conexão, devendo as
causas ser reunidas no juízo prevento (art. 58). A reunião de causas na continência, quando cabível, é
obrigatória, ressalvada a hipótese em que uma das causas já foi julgada. iii. Prorrogação de competência
ocorre quando um juízo inicialmente incompetente de maneira relativa torna-se competente; pode ser legal
216
(art 60 = competência territorial que se estende sobre a totalidade de um imóvel situado em mais de um
Estado) ou voluntária a qual, por sua vez, pode ser expressa (art. 63) ou tácita (arts. 65 e 63, §§3º e 4º); com
a prorrogação preclui a possibilidade de alegação de incompetência relativa (STJ); a competência absoluta
não se prorroga. iv. A prevenção não é causa que modifica, mas sim que fixa a competência em função de
determinado elemento temporal e impõe a reunião das causas e julgamento conjunto (art. 58). A medida de
produção antecipada de prova não induz prevenção para eventual ação a ser eventualmente proposta com
base na prova obtida (art. 381, §3º). Para as ações coletivas, prevento é o juízo onde a primeira causa for
ajuizada. É a data da propositura da ação que define o juízo prevento (Art. 2º, p.u., L. 7.347/85).

II. Competência Internacional. Jurisdição é poder e competência é capacidade de exercer poder outorgada
pela Constituição e pela legislação infraconstitucional. A alusão à competência internacional concorrente ou
exclusiva presente no CPC trata na realidade de problemas de limites da jurisdição brasileira e não
propriamente de competência (Arenhart, Marinoni e Mitidiero). 1. Diz-se competência internacional
concorrente as hipóteses do CPC em que a jurisdição brasileira pode concorrer com eventuais jurisdições
estrangeiras (arts. 21 e 22); apenas é possível homologação de decisão estrangeira no Brasil em casos de
competência internacional concorrente (sendo incabível na exclusiva); hipóteses de competência
internacional concorrente (arts. 21 e 22): a) réu, independentemente de sua nacionalidade, estiver
domicilidado no Brasil, b) no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação, c) fundamento seja fato ocorrido ou
ato praticado no brasil, d) ações de alimentos, quando o credor tiver domicílio ou residência no Brasil ou o
réu mantiver vínculos no Brasil, tais como posse ou propriedade de bens, recebimento de renda ou obtenção
de benefícios econômicos, e) decorrentes de relações de consumo, quando o consumidor tiver domicílio ou
residência no Brasil, f) em que as partes, expressa ou tacitamente, se submeterem à jurisdição nacional. o
Código atualmente admite a cláusula de eleição de foro estrangeiro, com o condão de afastar a incidência da
jurisdição brasileira em casos de competência concorrente (art. 25); o juiz pode, de ofício, recusar aplicação à
cláusula de eleição de foro internacional se a reputar abusiva; considera-se abusiva a cláusula de eleição de
foro internacional que busca, exclusivamente, por meio oblíquo, a obtenção de vantagem no julgamento de
certa lide, feita de forma ardilosa, com vantagem exclusiva para uma das partes contratantes (forum
shopping). A ação intentada perante órgão jurisdicional estrangeiro não induz litispendência e não obsta a
que a autoridade judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são conexas, ressalvadas as
disposições em contrário de tratados internacionais e acordos bilaterais em vigor no Brasil. Ainda, a
pendência de causa perante a jurisdição brasileira não impede a homologação de sentença judicial
estrangeira quando exigida para produzir efeitos no Brasil (art. 24). 2. Há competência internacional
exclusiva quando o Código atribui tão somente ao juiz brasileiro examinar e julgar determinados assuntos
(art. 23); as hipóteses de competência exclusiva da autoridade judiciária brasileira são: a) ações relativas a
imóveis situados no Brasil, b) confirmação de testamento particular, inventário e partilha de bens situados no
Brasil em matéria de sucessão hereditária, ainda que o autor da herança seja de nacionalidade estrangeira
ou tenha domicílio fora do território nacional, c) partilha de bens situados no Brasil em caso de divórcio,
separação judicial ou dissolução de união estável, ainda que o titular seja de nacionalidade estrangeira ou
tenha domicílio fora do território nacional; eventual decisão estrangeira que se enquadre nestas hipóteses
não surte efeitos no país, não é passível de homologação e tampouco de concessão de exequatur a cartas
rogatórias (964, p.u.).
A Res. 9/2005 da Presidência do STJ tratava da homologação de sentenças estrangeiras e concessão de
exequatur a cartas rogatórias passivas (nas quais o Brasil é rogado). No entanto, tal resolução foi incorporada
ao RISTJ (cf. art. 216-A e ss.). Em ambos os procedimentos, adota-se o sistema de contenciosidade limitada
ou delibação. Ver também: CR, 105, I, i, e 109, X.

III. Homologação de decisão estrangeira. (CPC, arts 960 a 965 e RISTJ, arts. 216-A a 216-N). O sistema
vigente no Brasil é o da delibação, em que se analisam apenas os pressupostos formais para fins de
homologação. A competência para a homologação é do STJ (art. 105, I, i, CR), e quem executa são os juízes
federais (art. 109, X, CR). O NCPC fala em homologação de DECISÃO, e não de sentença estrangeira, podendo
ser objeto da homologação (art. 961): a) decisão judicial definitiva, b) decisão não judicial que, pela lei
brasileira, teria natureza jurisdicional e c) decisão arbitral estrangeira (960, §3º). Dispensam homologação:
sentenças estrangeiras de divórcio consensual (961, §5º) e sentenças de tribunais internacionais. Requisitos
para a homologação (art. 963): a) ser proferida por autoridade competente, b) ser precedida de citação
regular, ainda que verificada a revelia, c) ser eficaz no país em que proferida, d) não ofender a coisa julgada
217
brasileira, e) estar acompanhada de tradução oficial, salvo dispensa em tratado e f) não conter manifesta
ofensa à ordem pública. Não se exige reciprocidade para a homologação de sentença estrangeira, mesmo na
ausência de tratado (art. 26, §2º). Quanto ao requisito da citação, o STJ entende que o comparecimento à
audiência em juízo estrangeiro supre a citação (SEC 2259-EX), que é possível citação por edital se a parte
estava em local desconhecido (SEC 11850-EX) e que não é suprida pela citação por correio se a parte residia
no Brasil, caso em que se exige carta rogatória (SEC 8396-EX). A homologação de sentença estrangeira tem
natureza jurídica de ação constitutiva (portanto, processo contencioso) e, em regra, inicia-se com uma
propositura (CPC, 960 e 216-C RISTJ), com exceção do art. 19 do protocolo de Las Leñas no âmbito do
MERCOSUL. É cabível a concessão de tutela de urgência (961, §3º) e a homologação parcial de sentença
estrangeira (961, §2º). Há intervenção obrigatória do Ministério Público (216-L, RISTJ). Uma vez homologada,
a decisão estrangeira será considerada título executivo judicial (CPC, 515, VIII) e será cumprida na justiça
federal de 1º grau mediante extração de carta de sentença. Jurisprudência: É inadmissível a renúncia em
sede de homologação de provimento estrangeiro (STJ, Info 621); a ausência de jurisdição brasileira conduz
necessariamente à falta de interesse processual na homologação de provimento estrangeiro (STJ, Info 621); é
possível a homologação pelo STJ de sentença eclesiástica de anulação de matrimônio, confirmada pelo órgão
de controle superior da Santa Sé (STJ, Info 574); é possível a homologação de sentença penal estrangeira que
determine o perdimento de imóvel situado no Brasil em razão de o bem ser produto do crime de lavagem de
dinheiro (não há ofensa ao 23, I do CPC pois a sentença estrangeira não tratou especificamente sobre a
situação dos bens imóveis, sobre sua titularidade, mas sim sobre os efeitos civis de uma condenação penal,
determinando o perdimento de bens que foram objeto de crime de lavagem de capitais) (STJ, Info 586).

IV. Carta Rogatória (CPC, art. 36, 962 e RISTJ arts 216-O a 216-X). É um mecanismo de cooperação jurídica
internacional, sendo de entendimento atual que é possível ser expedida por autoridade estrangeira
competente de acordo com a legislação local, mesmo que não integrada ao Judiciário (AgRg na CR8.436).
Cartas rogatórias podem ser ativas (expedidas pelo Brasil para cumprimento no exterior) ou passivas
(expedidas por país estrangeiro para cumprimento no Brasil). A) Carta Rogatória Ativa: será expedida para
que órgão jurisdicional estrangeiro pratique ato de cooperação jurídica internacional, relativo a processo em
curto perante órgão jurisdicional brasileiro (237, II, CPC), tem os mesmos requisitos da carta de ordem e
precatória (art. 260). B) Carta Rotagória Passiva: Competência para o exequatur é do STJ (105, I, i, CR), como
atribuição do presidente do tribunal, e competência para seu cumprimento é dos juízes federais de primeiro
grau. Quanto a seu objeto, ante a vedação do art. 35 do CPC, a doutrina elenca como possíveis objetos de
carta rogatória: a) atos ordinatórios de mero trâmite (intimação, notificação, citação), b) atos instrutórios
(coleta de prova), c) atos executórios (cumprimento de medidas constritivas) (desde a edição da Resolução n.
9/2005, restou superada a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que não admitia cartas rogatórias
com caráter executório. O atual art. 216-O do RISTJ prevê expressamente que ‘as cartas rogatórias podem ter
por objeto atos decisórios ou não decisórios’) (não eram admitidos quando a competência era do STF, mas
agora o são pelo STJ). Não é cabível carta rogatória para remessa de menor, pois, para tanto, já há o
procedimento previsto na Convenção de Haia para aspectos civis do Sequestro Internacional de Crianças
(STJ, AgRg na CR 2874/CR). Não será concedido exequatur à carta rogatória na hipótese de competência
exclusiva da autoridade judiciária brasileira (964, p.u., CPC). Não ofende a soberania do Brasil ou a ordem
pública conceder exequatur para citar alguém a se defender contra cobrança de dívida de jogo contraída e
exigida em Estado estrangeiro onde tais pretensões são lícitas (STJ, AgRg na CR 3198/US). Procedimento:
também nas cartas rogatórias o juízo exercido pelo STJ é o de delibação ou contenciosidade limitada (análise
apenas dos pressupostos formais, não havendo ingresso no mérito), há prazo de 15 dias para impugnação,
que, se houver, determina a remessa à Corte Especial. Admite-se tutela de urgência. Das decisões do
presidente ou do relator cabe agravo (216-U RISTJ). Jurisprudência: “Não há ilegalidade na utilização, em
processo penal em curso no Brasil, de informações compartilhadas por força de acordo internacional de
cooperação em matéria penal e oriundas de quebra de sigilo bancário determinada por autoridade
estrangeira, com respaldo no ordenamento jurídico de seu país, para a apuração de outros fatos criminosos
lá́ ocorridos, ainda que não haja prévia decisão da justiça brasileira autorizando a quebra do sigilo. Em outras
palavras, o STJ julgou válida a utilização, em processo penal no Brasil, de informações bancárias sigilosas
obtidas pela Justiça dos EUA e trazidas para o processo aqui por força do Acordo de Assistência Judiciária em
Matéria Penal (MLAT).” STJ. 5a Turma. HC 231.633-PR, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 25/11/2014 (Info
553).

218
V. Principais tratados e convenções para cumprimento de decisões estrangeiras: Código Bustamante
(1928); Convenção de alimentos de Nova Iorque (1956): PGR é instituição intermediária e propõe ação de
alimentos ou homologação (no STJ) ou execução (na 1ª instância) (art. VI); Convenção interamericana sobre
obrigação alimentar (1989) (art. 13); Protocolo de Ouro Preto (MERCOSUL): execução de cautelar estrangeira
via carta rogatória; Acordo de Buenos Aires (MERCOSUL, Bolívia e Chile): execução de sentença estrangeira
via carta rogatória; Protocolo de Las Leñas: este protocolo prevê, em seu artigo 19, que o pedido de
reconhecimento e execução de sentenças e de laudos arbitrais no âmbito do MERCOSUL será tramitado por
via de cartas rogatórias e por intermédio de Autoridade Central. Para o STF (CR-AgR 7613), este dispositivo
deve ser interpretado no sentido de que sentenças estrangeiras no âmbito do MERCOSUL podem ser
homologadas por iniciativa oficial, e que seu contraditório é diferido.

19A. Estabilidades processuais: regimes e efeitos. Coisa julgada. Preclusões. Estabilidade da sentença que
extingue o processo sem julgamento de mérito e da decisão de saneamento e organização do processo.

Marília Siqueira

1.Coisa julgada. Arts. 502 a 508, CPC.


1.1. Conceito: A eficácia da sentença não se confunde com a sua autoridade. A eficácia da sentença é
a sua aptidão para produção de efeitos. A autoridade da sentença é a sua imutabilidade e indiscutibilidade -
é a coisa julgada. A coisa julgada não é uma eficácia da sentença, mas simplesmente uma qualidade que se
agrega ao efeito declaratório da sentença de mérito transitada em Julgado. E a indiscutibilidade que se
agrega àquilo que ficou decidido no dispositivo da sentença de mérito de que não caiba mais recurso. Daí
que fez bem o art. 502, CPC, em evitar o uso da expressão 'eficácia" para conceituação da coisa julgada.
1.2. Coisa julgada e preclusão. Embora seja corrente alusão na doutrina à coisa julgada material e à
coisa julgada formal, rigorosamente só pode ser denominada de coisa julgada a qualidade que torna
imutável e indiscutível a sentença de mérito transitada em julgado. A coisa julgada dita formal, na realidade,
não passa de uma preclusão temporal (MARINONI-ARENHART-MITIDIERO), não constituí outra coisa senão a
última preclusão temporal do processo - daí porque, por vezes, denominada de preclusão máxima. A coisa
julgada só se forma se há enfrentamento definitivo do mérito da causa. É por essa razão que é oportuno
distinguir coisa julgada e preclusão – e não propriamente coisa julgada material e coisa julgada formal.
Afinal, como refere a doutrina, as próprias expressões coisa julgada material e coisa julgada formal carecem
de adequado sentido, quando vistas em uma perspectiva mais atenta. Se coisa julgada advém da expressão
res iudicata, que de seu turno indica que a coisa – o mérito – foi julgado, então de um lado a expressão coisa
julgada material é tautológica (porque apenas procura repetir com o adjetivo material algo que a locução já
expressa), e, de outro, a expressão coisa julgada formal é contraditória (porque refere que a coisa – o mérito
– na verdade não foi julgado).
1.3. Limites da coisa julgada. A coisa julgada exerce sua autoridade em quatro domínios: territoriais,
temporais, subjetivos e objetivos. Esses domínios correspondem aos limites territoriais (em que porção
geográfica), temporais (com que extensão no tempo), subjetivos (para quais pessoas) e objetivos (sobre
quais questões) da coisa julgada.
1.3.1. Limites objetivos. A questão está em saber o que pode ser objeto da parte dispositiva da
sentença. Em um sistema que concebe a coisa julgada a partir de um contexto argumentativo dinâmico e
cooperativo, pode ser objeto do dispositivo da sentença não só os pedidos das partes, mas também a
resolução de questão prejudicial evidenciada no curso do processo, inclusive identificada de ofício pelo juiz
(art. 503, §§ 1.º e 2.º). Com isso, o pedido formulado na inicial pela parte autora (art. 319, IV), eventual
pedido reconvencional (art. 343) e o pedido de declaração incidental de falsidade documental (art. 433)
certamente estarão recobertos pela estabilidade da coisa julgada, sempre que receberem pronunciamento
judicial a respeito do mérito dessas pretensões. Pouco importa, nestes casos, se o pronunciamento se dá em
sentença final ou em decisão interlocutória (art. 356), se o julgamento é favorável ou não a pretensão
deduzida, ou ainda se há ou não provas suficientes para o convencimento judicial. Sempre que houver
pronunciamento a respeito da pretensão deduzida, desde que não seja provisório (arts. 294-311) há a
incidência de coisa julgada, com a sua imutabilidade característica.
O §1º, art. 503, amplia os limites subjetivos da coisa julgada para as questões prejudiciais. Questão
prejudicial é aquela que condiciona o conteúdo do julgamento de outra questão, que nessa perspectiva
passa a ser encarada como questão subordinada. A questão prejudicial, devidamente alegada pelas partes
219
com respectivo pedido ou independentemente de pedido, pode ser objeto da parte dispositiva da sentença
(art. 503, §§ 1.º e 2.º) (MARINONI-ARENHART-MITIDIERO). Contudo, outros posicionamentos são no sentido
de que não é necessário decidir a questão prejudicial no dispositivo, pois o mesmo efeito da lei seria obtido
com a solução na fundamentação (FREDIE DIDER JR.). A possibilidade de formação da coisa julgada sobre a
questão prejudicial, inclusive mediante provocação de ofício pelo juiz, suplantou, para alguns, a necessidade
de ação declaratória incidental (MARINONI-ARENHART-MITIDIERO), enquanto que para outros ainda existe
interesse na sua utilização (FREDIE DIDIER JR). No novo Código, tendo o juiz competência absoluta para
conhecer da questão prejudicial, sendo o procedimento de cognição exauriente e tendo havido contraditório
prévio e efetivo, a solução da questão prejudicial pode ser objeto do dispositivo e, portanto, sua resolução
pode fazer coisa julgada.
1.3.2. Limites subjetivos: A princípio, tomando -se a regra geral, tem -se que somente as partes
ficam acobertadas pela coisa julgada. Autor e réu da ação ficam vinculados à decisão judicial, já que
participaram do contraditório que resultou na prolação da decisão judicial. Naturalmente, se esses sujeitos
tiveram condição de influenciar na prolação da decisão judicial, indubitavelmente devem se sujeitar -se à
resposta jurisdicional oferecida. Também se submetem à coisa julgada o substituído processual (art.18), o
sucessor a título universal e o sucessor na coisa litigiosa (arts. 108 e 109), ressalvada, é claro, a boa -fé do
terceiro adquirente. Nesses casos, a ligação jurídica com as partes autoriza a vinculação à coisa julgada. Para
as partes e seus sucessores, assim, a decisão judicial, preclusa em função do esgotamento dos meios de
impugnação, torna -se imutável. O CPC/2015 procedeu a relevante alteração no campo dos limites subjetivos
da coisa julgada. O art. 506, dessa lei, ao contrário do que fazia o art. 472, do CPC/73, suprimiu a previsão de
que a coisa julgada não poderia “beneficiar terceiros”. A coisa julgada pode, portanto, beneficiar terceiros. Se
o terceiro tem ligação com a causa debatida em juízo, mas não participou do processo, a coisa julgada
aproveita-lhe. Cuidado com o fato de que a coisa julgada somente poderá beneficiar terceiros, mas nunca
poderá ser invocada para prejudicá-los. Assim, o vencedor de uma demanda não poderá invocar coisa
julgada em face de terceiros que não participaram de processo do qual deveriam ter participado.
1.3.3. Limites temporais. Normalmente, a vinculação temporal à coisa julgada é tratada a partir da
aplicação da máxima “rebus sic stantibus”: a coisa julgada vincula enquanto o estado das coisas permanecer
o mesmo. É por essa razão que o art. 505 refere que “nenhum juiz decidirá novamente as questões já
decididas relativas à mesma lide”, salvo “se, tratando -se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio
modificação no estado de fato ou de direito”, hipótese em que poderá a parte propor nova ação pedindo a
revisão do que foi decidido na sentença. O mesmo será possível nos demais casos prescritos em lei. A rigor,
porém, havendo modificação no estado de fato ou de direito no estado de coisas que foi objeto da coisa
julgada, o juiz não estará propriamente decidindo novamente a “mesma lide”: isso porque a alteração no
estado de fato ou de direito faz com que surja uma nova causa, uma nova lide, ainda não examinada
judicialmente. Nesse tema, também é importante o debate em torno da relativização da coisa julgada,
célebre discussão processual com base no confronto entre a garantia da coisa julgada e outra garantia
fundamental, que foi feita pela jurisprudência mesmo após escoado o prazo para a ação rescisória.
1.3.4. Limites territoriais. Como a “jurisdição civil é exercida pelos juízes e pelos tribunais em todo o
território nacional” (art.16), a autoridade da coisa julgada de que revestidas suas decisões também vinculam
em todo o território nacional. A coisa julgada estrangeira é aquela oriunda de decisões judiciais estrangeiras,
isto é, de jurisdições estrangeiras – de outros países. A coisa julgada estrangeira só poderá ser eficaz no
território nacional depois de internalizada pelo processo de homologação de sentença estrangeira perante o
Superior Tribunal de Justiça (arts. 960 e ss.). Até a sua homologação a coisa julgada estrangeira não é eficaz
em nosso país. É preciso distinguir a coisa julgada estrangeira da coisa julgada internacional. Enquanto a
primeira é oriunda de jurisdições estrangeiras, a segunda decorre de jurisdições internacionais, vale dizer, de
cortes internacionais (como, por exemplo, a Corte Interamericana de Direitos Humanos). A jurisdição das
cortes internacionais decorre da adesão aos tratados ou convenções internacionais que as constituíram.
1.4. Eficácia preclusiva da coisa julgada. A eficácia preclusiva da coisa julgada constitui uma proteção
à coisa julgada. Uma vez transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas e repelidas
todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido
(art. 508). A eficácia preclusiva da coisa julgada não é capaz de tornar indiscutíveis quaisquer espécies de
alegações, mas tão somente aquelas relacionadas com objeto da demanda, ou seja, aquelas vinculadas ao
pedido, às partes e à causa de pedir oferecidos na ação respectiva. Não se estender, portanto, às causas de
pedir não deduzidas pela parte, pois isso representaria indevida ampliação dos limites objetivos da coisa
julgada para questões não decididas. Considerando que na elaboração da petição que fundamenta o pedido
220
de certa tutela jurisdicional devem estar presentes, a título de causa de pedir, apenas os elementos
relacionados ao específico fundamento – fatos jurídicos necessários e suficientes para ensejar certo efeito
jurídico, que corresponde ao pedido na ação – somente os fatos relacionados a essa causa de pedir deverão
ser contemplados na petição inicial da causa.
1.5. Eficácia positiva e negativa da coisa julgada. a eficácia positiva atine à possibilidade de
invocação da coisa julgada como ponto de apoio para uma nova ação. Vale dizer: a eficácia positiva da coisa
julgada ocorre quando a parte alega na causa de pedir de uma nova ação a indiscutibilidade de determinada
questão decidida com força de coisa julgada para fundar um novo pedido. A eficácia negativa da coisa
julgada está ligada à necessidade de vedar um novo conhecimento e um novo julgamento a respeito da
causa já examinada no mérito com trânsito em julgado. É um efeito que visa a impedir que o processo se
desenvolva e que a tutela jurisdicional seja prestada novamente. A eficácia negativa da coisa julgada é
associada desde as fontes romanas à exceção de coisa julgada (mais propriamente, objeção de coisa julgada),
configurando -se modernamente como um pressuposto processual negativo.
2. Extinção do processo sem resolução de mérito e estabilidade da sentença. As decisões que
extinguem o processo sem resolução de mérito são tratadas como sentenças terminativas, fundadas nas
hipóteses do artigo 485, CPC. Tais decisão não são acobertadas pela coisa julgada material, mas apenas a
coisa julgada formal, que representa estabilidade endoprocessual que impede a rediscussão no mesmo
processo. Portanto, em regra, a extinção do processo sem resolução de mérito não impede a repropositura
da demanda. Contudo, o artigo 486, §1º prevê que, quando a sentença de extinção estiver embasada em
litispendência, indeferimento da petição inicial (inc. I), ausência de pressupostos processuais (inc. IV),
ausência de legitimidade ou interesse (inc., VI) ou existência de convenção de arbitragem ou quando o juízo
arbitral reconhecer sua competência (inc. VII), a repropositura da demanda somente poderá ser feita se
esses vícios forem sanados.
3. Preclusão. O conceito clássico e amplamente aceito de preclusão foi cunhado por Chiovenda,
segundo o qual a preclusão consiste na perda de uma faculdade processual. Opera-se endoprocessualmente.
Há, ainda, quem defenda se tratar da extinção de uma situação jurídica processual (ANTONIO CABRAL,
FREDIE DIDIER JR).
3.1. Classificações. A preclusão é, frequentemente, classificada em temporal, consumativa e lógica.
Há, ainda, posição que inclui outras categorias, como a preclusão-sanção (FREDIE DIDIER JR.).
3.1.1. Preclusão temporal. A preclusão temporal, a impossibilidade de certo sujeito praticar
determinado ato decorre da circunstância de já haver sido esgotado o prazo para que o ato seja praticado.
Ela se dá, pois, quando a parte deixa de exercitar um poder processual no prazo para tanto estipulado,
ficando, por isto, impossibilitada de exercitá-lo. É fruto da inércia da parte.
3.1.2. Preclusão lógica. Impossibilidade de praticar determinado ato decorre da circunstância de
outro ato, incompatível com o ato que ele quer praticar, haver sido anteriormente levado a cabo.
3.1.3. Preclusão consumativa. Impossibilidade de certo sujeito praticar determinado ato decorre da
circunstância de haver ele praticado um ato anterior que esgotou os efeitos do ato que ele quer praticar.
3.1.4. Preclusão sanção. Impossibilidade de se praticar determinado ato decorre de uma sanção
anteriormente aplicada. Ex. Régis é regularmente intimado, comparece à audiência, mas se recusa a
cumprir o dever de depor (CPC, art. 340, I). Diante da recusa, o juiz aplica a pena de confissão a respeito da
matéria fática (CPC, art. 343, § 2º). Aplicada a pena de confissão, Régis estará impossibilitado de praticar
atos tendentes a provar que os fatos aconteceram de maneira distinta.
4. Estabilidade da decisão de saneamento do processo. O art. 357, §1º prevê que a decisão de
saneamento se torna estável após o prazo de 5 (cinco) dias para esclarecimentos ou ajustes a serem
requeridos pelas partes. Ocorre que essa estabilidade não é absoluta e comporta temperamentos. Ainda que
enfrentado no saneamento, eventual defeito que imponha extinção do processo sem resolução de mérito
poderá ser revisto, tendo em vista um dever de permanente presença de pressupostos processuais no curso
do processo. Outro fator que pode importar na relatividade dessa estabilidade é o conhecimento de questão
fática ou jurídica que ficou de fora da decisão de saneamento e veio a ser conhecida posteriormente pelo
juiz. Não obstante, há relatividade dessa estabilidade em matéria probatória, porquanto somente após o
saneador se constatou a relevância em se inverter o ônus da prova, determinar a produção de outros meios
de prova ou negar a produção de meios de prova que se mostraram, após o saneador, inúteis ou
protelatórios.
5. Regime Efeitos das estabilidades. O desenvolvimento do tema é feito por Antonio do Passo
Cabral, que defende a tese de que se deve colocar fim à dicotomia entre preclusões e coisa julgada, tendo
221
em vista a matriz comum de ambas pautada na necessidade de se compreender que ambas fazem parte de
uma categoria comum que é a estabilidade. O regime de estabilidades, segundo CABRAL, se configura pelo
parâmetro de segurança jurídica no processo contemporâneo, que, segundo sua visão, se consubstancia em
continuidade jurídica. A gradação de força das estabilidades tem, portanto, como baliza o objeto, efeitos,
limites e sujeitos.

19B. Procedimentos das ações coletivas. Competência para ações coletivas. Coisa julgada e litispendência em
ações coletivas. As relações entre os instrumentos de tutela coletiva e os incidentes para resolução de casos
repetitivos.

Marília Siqueira
Legislação básica: Código de Processo Civil; Lei nº 8.078/1990; Lei nº 7.347/1985.
*MMA = Marinoni, Mitidiero e Arenhart.

1. Procedimento das ações coletivas.


Procedimento adequado. O regramento da tutela coletiva não conta com um Código próprio, o que
leva a doutrina a sistematizar a legislação esparsa, afirmando a existência de um “microssistema de tutela
coletiva”, o qual é composto, basicamente, pela Lei de Ação Civil Pública e o CDC; há autores que incluem a
Lei de ação popular, a LIA, e, também, pelo Código de Processo Civil (CPC). Segundo MMA, “não se trata de
uma única ação, mas sim de um conjunto aberto de ações, de que se pode lançar mão sempre que se
apresentem adequadas para a tutela desses direitos. Vale dizer que é possível o emprego de qualquer
procedimento adequado para a proteção dos direitos difusos ou coletivos. Não há um só procedimento para
essa tutela, mas é possível o emprego de qualquer técnica processual ou qualquer procedimento para essa
finalidade.” (grifos aditados). Nesse sentido é o art. 83, CDC. Não há, portanto, uma ação civil pública ou uma
ação coletiva, mas, sim, uma categoria de ações, que recebem todas o rótulo geral de “ações coletivas”
(MMA).
Gratuidade. Apesar de não haver um só procedimento para as ações coletivas, a LACP contém uma
disciplina mínima a respeito do processamento de demandas coletivas. Assim, todas as ACP’s (que tratam de
relações de consumo, como as que versam sobre outros interesses) são gratuitas para o autor coletivo,
exceto se constatada sua má-fé na propositura da ação; não há, pois, adiantamento de custas, emolumentos,
honorários periciais ou outras despesas, nem condenação dos autores coletivos nos ônus da sucumbência,
exceto no caso de má-fé (art. 87 do CDC e do art. 18 da LACP) (MMA).
Segundo jurisprudência, vencido o Ministério Público, não caberia condenação em honorários, tendo
em vista que o parquet age em nome da coletividade, embora alguns defendam o cabimento desse ônus ao
Estado, com fundamento em sua responsabilidade objetiva. STJ: Nos casos em que a ação civil pública
proposta pelo Ministério Público for julgada improcedente, somente haverá condenação ao pagamento de
honorários advocatícios e custas judiciais quando comprovada a má-fé do Parquet, nos termos do art. 18 da
Lei n. 7.347/85. (EDcl no REsp 1171680/PB, 1ª Turma, 2012).
Nesse contexto, é importante destacar ainda a regra do art. 91, p único, CPC que pode ter impacto
positivo no processo coletivo: “as perícias requeridas pela Fazenda Pública, pelo Ministério Público ou pela
Defensoria Pública poderão ser realizadas por entidade pública ou, havendo previsão orçamentária, ter os
valores adiantados por aquele que requerer a prova”.
Tutela provisória. Em regra, são admitidas tutelas provisórias assecuratórias (art. 4.º da LACP) e
tutelas provisórias satisfativas (art. 12 LACP), quando isso for necessário para a consecução dos objetivos da
proteção (final) pretendida. Para a concessão liminar de tutela provisória em ACP, o representante judicial da
pessoa jurídica de direito público deve ser ouvido em 72 hrs (art. 2º, Lei 8.437/92). Da concessão da liminar,
cabe agravo de instrumento (art. 12 da LACP) e pedido de suspensão ao Presidente do Tribunal competente
para a apreciação do recurso, seja tutela assecuratória ou satisfativa, decisão da qual caberá agravo interno
(art. 12, par. 1.º LACP). Poderá o Presidente ouvir o autor e o MP, no prazo de 72h (art. 4.º, par. 2.º, da lei
8437/92). Aplicam-se à ação civil pública as mesmas disposições relativas à suspensão de liminares,
instituídas pela MP 2180-35, que incluiu os §§ 3.º a 9.º ao art. 4.º da Lei 8437/92, os quais foram declarados
constitucionais na ADIn 2251-DF. De acordo com a Lei 8.437 poderá haver a suspensão dos efeitos da
sentença até seu trânsito em julgado, assim como da liminar concedida. O juiz poderá conceder efeito
suspensivo aos recursos para evitar dano irreparável à parte.
Instrução da PI. Para bem instruir a petição inicial, o legitimado coletivo possui certos poderes
investigatórios e requisitórios, assim, autoriza-se ao interessado (i) requisitar “às autoridades competentes as
222
certidões e informações que julgar necessárias, a serem fornecidas no prazo de 15 (quinze) dias” (art. 8.º da
LACP), as quais somente serão negadas se houver previsão legal de sigilo; (ii) ao MP, instaurar inquérito civil
para a colheita dessas provas, seguindo o procedimento do art. 8.º, § 1.º, da LACP, além das normas
específicas previstas pelas leis do Ministério Público). (MMA)
Desistência. Considerando que não se pode obrigar o legitimado autor a litigar, havendo desistência
infundada por este da ação proposta ou abandono da causa, prevê a lei que o Ministério Público, ou outro
legitimado, assuma o prosseguimento dela (art. 5.º, § 3.º), até final julgamento, não lhe sendo lícito desistir
(imotivadamente) ou abandonar a causa. (MMA). Se ação foi originariamente proposta pelo MP, ele não
poderá desistir, podendo, no entanto, manifestar-se pela improcedência ao final, se assim se convencer.
Aplicação CPC. No mais, a disciplina dessas ações deve pautar-se pelas regras procedimentais do
Código de Processo Civil, desde que se mostrem compatíveis com o “processo coletivo” e com os objetivos
da ação proposta (arts. 19 da LACP e 90 do CDC). (MMA).
Nesse contexto, vale destacar alguns dispositivos apontados por Sérgio Arenhart (aula Youtube) para
aplicação às ações coletivas: (i) os atos concertados entre juízes cooperantes (art. 69, IV e §2º, CPC), uma
vez que várias situações coletivas não impõem ações coletivas para sua resolução, sendo suficiente, em
muitos casos, a coletivização de determinados aspectos, como concentração para produção de prova de
fatos comuns; (ii) o §1º do art. 91 que trata do custeio da prova técnica; (iii) a intervenção do amicus curiae,
que, para ele, não é propriamente intervenção de terceiros, que pode ser utilizada na tutela coletiva para
garantir a participação de interessados no litígio (ainda que isso configure, para ele, desvirtuamento da
figura), que não poderiam ingressar como parte, por falta de legitimidade; (iv) o art. 139, IX, segundo o qual,
o juiz deve, “quando se deparar com diversas demandas individuais repetitivas, oficiar o Ministério Público, a
Defensoria Pública e, na medida do possível, outros legitimados a que se referem o art. 5o da Lei no 7.347, de
24 de julho de 1985, e o art. 82 da Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, para, se for o caso, promover a
propositura da ação coletiva respectiva”; (iv) não afirma que os negócios processuais não se aplicam ao
processo coletivo, mas trata do assunto com muita resistência, tanto que também não foi categórico quanto
à sua aplicabilidade; (v) destaca a importância, para as ações coletivas, da ideia de instrumentalidade elevada
trazida no código, salientado os arts. 139, IX, 317, 488 e outros; (vi) afirma a aplicabilidade do art. 139, VI,
que trata da adaptação do procedimento pelo juiz, mas entende que ele é insuficiente para a tutela coletiva,
que demanda um poder de adequação maior do juiz; (vii) defende a aplicação do art. 322, §2º ao processo
coletivo, pois o pedido também deve ser interpretado de acordo com a boa-fé e o conjunto da postulação,
porém entende que isso deve ser ampliado, de modo que a interpretação compreenda o conjunto da
atuação do autor na demanda, dada a dinamicidade própria do processo coletivo; (viii) afirma a
aplicabilidade das regras de mediação e conciliação, para possibilitar o diálogo entre as partes (não fala em
negociação) e destaca que não se deve haver limitação a essas técnicas, permitindo-se outras, inclusive, que
se mostrem mais adequadas; (ix) entende que aplica a regra de correção do polo passivo (art. 337 e 338),
mas que deveria ser ampliada para possibilitar, nas ações coletivas, a correção também no polo ativo; (x)
aplicação do saneamento compartilho, sendo regra muito importante para a tutela coletiva, pois possibilita,
por exemplo, definir de forma cooperativa as provas que devem ser produzidas; (xi) a produção antecipada
de prova também é aplicável; (xii) do mesmo modo, as sentenças parciais de mérito; (xiii) e também a regra
do art. 139, IV.
2. Competência para ações coletivas
A competência para tais ações será absoluta, como se infere da expressão “competência funcional” e
sempre será determinada pelo local da lesão (art. 2.º da LACP). Se a lesão for sentida para além das
fronteiras de uma comarca (ou circunscrição judiciária), qualquer delas será competente para a causa,
fixando-se aí a prevenção para as demais ações que versem sobre a questão. Quando a ação competir à
Justiça federal, entende-se que a competência será do juízo federal cuja competência abarque o “local do
dano” (art. 93, CDC), afinal, uma circunscrição judiciária pode abranger mais de um Município.
Tratando-se de dano que atinja dimensões regionais ou nacionais, deve-se aplicar aqui também a
previsão contida no art. 93, II, do CDC. Assim, a competência será de qualquer capital de Estado ou do
Distrito Federal. Embora o dispositivo esteja inserido no regime das ações que tratam de direitos individuais
homogêneos, não há sentido nenhum em supor distinção de tratamento. MMA entendem adequado o
critério utilizado pelo art. 93, II, restringindo-se a competência apenas às capitais dos Estados ou ao Distrito
Federal. Segundo eles, embora pareça difícil determinar o que é um “dano regional ou nacional”, é
necessário aplicar critério pragmático para a solução, assim, sempre que atingida, dentro de um Estado, a
sua capital, é de se ter o dano como regional, de modo a atrair a competência do foro dessa capital. Por
223
outro lado, sempre que ultrapassados os limites territoriais de um Estado, é de se considerar o dano como
nacional, o que implica a competência da capital de qualquer Estado atingido. O STJ entende como dano
regional aquele que atinge domiciliados num mesmo estado da federação, desde que espalhados por
diferentes locais; nacional o que atinja pelo menos três estados da federação ou que atinja consumidores de
mais de uma região. Entendendo-se, a partir dessas considerações, que o dano local seria aquele reservado a
uma comarca ou a um pequeno grupo de comarcas.
As ações coletivas deverão ser propostas no primeiro grau de jurisdição, podendo-se afirmar ser essa
a regra nos casos de ações civis públicas e ações populares, mesmo que o polo passivo seja composto por
agentes públicos com prerrogativa de foro para processos cujo objeto seja ilícito penal ou crime de
responsabilidade.
Contudo, o STF já decidiu que, em situações excepcionais, terá competência originária para o
julgamento da ação popular, em entendimento também aplicável à ação civil pública. As situações são as
seguintes: artigos 102, I, f (as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou
entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta) e 102, I, n (a ação em que
todos os membros da magistratura sejam direta ou indiretamente interessados, e aquela em que mais da
metade dos membros do tribunal de origem estejam impedidos ou sejam direta ou indiretamente
interessados) e 102, I, e (o litígio entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e a União, o Estado, o
Distrito Federal ou o Território – caso da ação proposta pelo MPF contra a Itaipu Binacional), da Constituição
da República.
3. Coisa julgada nas ações coletivas
A disciplina da coisa julgada em relação às ações coletivas no direito brasileiro é disciplinada, para
direitos coletivos, difusos ou individuais homogêneos, pelos arts. 103 e 104 do CDC. Em função da previsão
contida no art. 21, LACP, existe verdadeira “simbiose” entre a LACP e CDC. Do art. 103, CDC, extrai-se que a
disciplina da coisa julgada frente às ações coletivas é estabelecida de modo diferenciado, conforme a espécie
de “direito coletivo” (direito coletivo stricto sensu, direito difuso ou direito individual homogêneo) objeto da
ação.
Direitos difusos (art. 103, I, CDC): a coisa julgada será erga omnes (oponível contra todos), salvo
quando o pedido for julgado improcedente por falta de provas (coisa julgada secundum eventum
probationis). O direito difuso é aquele direito transindividual, indivisível, de sujeito indeterminado,
pertencente a toda a coletividade.
Direitos coletivos (stricto sensu, art. 103, II, CDC): a coisa julgada será ultra partes, salvo
improcedência por falta de prova (coisa julgada secundum eventum probationis). Ou seja, para além das
partes do processo, atinge a todo o grupo, categoria ou classe a quem pertence o direito discutido. Estes
direitos são transindividuais, de natureza indivisível, mas com “sujeito” determinado, consistente em um
grupo, categoria ou classe de sujeitos, ligados entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base
(art. 81, II, do CDC).
Obs MMA: segundo eles, não é a coisa julgada que, nas hipóteses acima, opera efeitos erga omnes
ou ultra partes, mas, sim, os efeitos diretos da sentença, pois os sujeitos atingidos não têm legitimidade para
impugnar a decisão e é daí que decorre a imutabilidade para eles.
No caso de improcedência por insuficiência/falta de provas, todos os legitimados, inclusive aquele
que intentou a primeira ação, poderão propor a “segunda” demanda, com base em prova nova. A noção de
prova nova não restrita à prova surgida após a conclusão do processo anterior, podendo ser utilizada
qualquer prova, ainda que já existente e conhecida (mas não utilizada por má-fé ou por falta de preparo, não
importa) (MMA). Se não houver prova nova, o processo deverá ser extinto sem julgamento de mérito, seja
por falta de interesse de agir (como entende prefere a doutrina), seja por força da coisa julgada material.
Discute-se na doutrina se a “insuficiência de provas” deverá constar da decisão de improcedência ou
se poderá ser demonstrada apenas na “segunda” demanda. No ponto, existem duas teses: (a) tese restritiva
– exige que conste expressa ou implicitamente na motivação ou no dispositivo a circunstância de
improcedência por falta ou ausência de provas. A ausência desse indicativo levaria à geração da coisa julgada
material tradicional; (b) tese ampliativa – essa corrente não vê qualquer necessidade de constar na sentença,
expressa ou implicitamente o fato de a improcedência do pedido ter se dado por falta ou insuficiência de
provas.
Direitos individuais homogêneos (art. 103, III, CDC): a coisa julga será erga omnes somente no caso
de procedência da ação, para beneficiar todos os sujeitos titulares dos direitos individuais postulados, bem
como seus sucessores (coisa julgada secundum eventum litis), porque somente operada quando a sentença
224
for de procedência. Segundo MMA, isso não significa que, na improcedência, não haverá coisa julgada
material; o que não existirá é a coisa julgada erga omnes. A sentença de improcedência operará coisa julgada
(i) para as partes do processo; (ii) para os titulares dos direitos individuais homogêneos que hajam intervindo
no processo; (iii) para os co-legitimados para o processo coletivo, salvo, para este caso, quando houver prova
nova.
Transporte da coisa julgada in utilibus: os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes acima
referidos não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de
30 (trinta) dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva. Parcela da doutrina entende
que essa regra só alcança os incisos II e III do art. 103, no entanto, MMA entendem que vale para os 3 incisos
do art. 103, ou seja, para todas as espécies de ações coletivas.
Limitação territorial da coisa julgada: O artigo 16 da LACP, com redação dada pela Lei nº 9.494/97,
estabelece que “A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territorial do
órgão prolator [...]”. Contudo, além da feroz crítica doutrinária a esse dispositiva, o STJ entendeu que nele se
faz uma confusão entre coisa julgada e competência territorial. O julgado reconhece que, em casos de
direitos difusos e coletivos, a limitação territorial sugerida é lógica e juridicamente inviável, considerando-se
a natureza indivisível dos direitos materiais; recentemente, afastou o art. 16 também das ações envolvendo
direito individuais homogêneos (pelo menos nas ações de consumo). Com base no microssistema coletivo, o
STJ determinou a interpretação do artigo 16 da LACP à luz dos artigos 93 e 103 do CDC, considerando-se a
extensão do dano e a qualidade dos direitos postos em juízo. Referiu que sendo o dano de escala local,
regional ou nacional, o juiz, no comando da sentença, deve ter capacidade para recompô-los ou indenizá-los
em suas abrangências territoriais, independentemente de qualquer limitação.
Obs MMA: Limitar a abrangência da coisa julgada é impossível, sob pena de deixar ela de ser coisa
julgada. O objetivo do dispositivo é limitar a abrangência dos efeitos da sentença (dentre os quais,
certamente, não se encaixa a coisa julgada). Mas nem para isso ele se presta. Os efeitos concretos da decisão
(que se operam no mundo real) atuam em sentidos imprevisíveis e não podem ser contidos pela vontade do
legislador. Os efeitos da sentença operam-se onde devem operar-se, e não onde o legislador queira que eles
se verifiquem.
3. Litispendência entre ações coletivas
Não há litispendência entre a ação individual e as ações para a tutela de direitos difusos ou coletivos,
por dois fundamentos: (i) dicção expressa do art. 104 do CDC; (ii) natureza das ações examinadas. Para os
direitos difusos e coletivos sequer é possível pensar em litispendência em relação a direitos individuais que
envolvam o mesmo fato, pois o indivíduo não tem legitimidade para propor a ação coletiva. Tem-se, assim,
pedidos diversos, baseados em causas de pedir distintas. Também entre ação individual e ações de direitos
individuais homogêneos não há litispendência, com fundamento no mesmo art. 104, CDC. A diferença, aqui,
é que o indivíduo tem legitimidade concorrente para a proteção do seu direito tutelado na ação coletiva e,
por isso, seria possível que se afirmasse a ocorrência de litispendência; no entanto, não há por opção
legislativa. No caso, havendo ação individual e a coletiva, o autor da individual poderá requerer a suspensão
do seu processo, para ser beneficiado com eventual resultado positivo ou prosseguir com ele e, nesta
situação, diversamente do que ocorre com a litispendência, não haverá extinção do processo, mas apenas
não será possível a extensão da decisão positiva na ação coletiva.
Naturalmente, pode ocorrer litispendência entre ações coletivas, se um legitimado para a ação
coletiva ingressa com ação já proposta por outro legitimado (mesma causa de pedir e pedido), o caso será de
litispendência. O fato de serem sujeitos distintos é irrelevante, pois os legitimados para essas ações agem em
defesa de direito alheio (legitimação extraordinária), pertencente à coletividade ou a certo grupo de pessoas.
O sujeito material do processo, portanto, permanece sendo o mesmo. As ações são, por isso, iguais, havendo
litispendência desde que sejam uniformes a causa de pedir e o pedido.
4. As relações entre os instrumento de tutela coletiva e os incidentes para resolução de casos
repetitivos.
Tanto as ações coletivas como o julgamento de casos repetitivos, seja por Incidente de Resolução de
Demandas Repetitivas (IRDR) seja por Recurso Especial ou Recurso Extraordinários repetitivos – ver ponto
12.b – (e mesmo o Incidente de Assunção de Competência – IAC, que, para Arenhart é instrumento para
casos repetitivos ou com potencial de repetição), são mecanismos de tutela coletiva.
Nas ações coletivas, busca-se a prolação de uma sentença, com formação de coisa julgada que será
erga omnes ou ultra partes, conforme o caso, desde que favorável. Já no IRDR há uma decisão que vinculará
os julgadores para a decisão nos processos (em curso e futuros) de sua competência que versam sobre
225
aquela questão decidida, seja a decisão favorável ou não. Parte da doutrina trata o julgamento dos casos
repetitivos como formação de precedente obrigatório, mas, para Arenhart, não há formação de precedente
no caso, mas uma decisão que vincula os juízes no julgamento dos casos que tratam da mesma questão.
Assim, para ele, no IRDR, não há precedente, mas coletivização da demanda, seguindo a mesma ratio das
ações coletivas. Ainda para Arenhart, o problema desse instrumento é o déficit de participação, pois quem
garante que os sujeitos afetados vão participar? Quem garante que o Tribunal que irá decidir será o melhor
para julgar? O banco, por exemplo, vendo a repetitividade, pode escolher o Tribunal que lhe seja mais
favorável. Tem, portanto, a dificuldade de representatividade adequada, o que deve implicar a autorização
do legitimado coletivo a intervir e garantia de participação dos afetados.
Ademais, o julgamento de casos repetitivos envolve tanto processos individuais quanto coletivos.
Outra importante distinção entre ação coletiva e julgamento de casos repetitivos: quem não foi a
juízo não se beneficia da decisão no julgamento de casos repetitivos, já na ação coletiva não é preciso ir a
juízo para se beneficiar.
Aos jurisdicionados não é dada a escolha de não se submeterem aos efeitos das decisões proferidas
em IRDR ou em Julgamentos de Recursos Repetitivos, salvo se desistirem dos seus processos respectivos.
Além disso, em ambos os casos, haverá suspensão automática dos processos em cursos (art.982, I c/c
art.1.036, §1º, ambos do novo CPC).
Fredie Didier e Hermes Zaneti destacam os seguintes aspectos técnicos semelhantes entre ações
coletivas e julgamento de casos repetitivos: (i) regramento especial da desistência; (ii) legitimação
extraordinária para provocação de um ou outro; (iii) possibilidade de suspensão de processos individuais; (iv)
realização de audiências públicas; (v) intervenção obrigatória do MP como fiscal da ordem jurídica; (vi)
aumento da participação de outros sujeitos no processo em qualquer caso. Estes autores advertem, porém,
que há uma diretriz normativa no já citado art. 139, X, CPC no sentido de priorizar a tutela coletiva por ação
coletiva, pois, diante de casos repetitivos, é dever do juiz comunicar o fato aos legitimados, para que
verifiquem a viabilidade de ajuizamento de uma ação coletiva.

Arenhart: Quais as vantagens e desvantagens no emprego dos incidentes em exame e no emprego


da tutela coletiva no ordenamento nacional? E em comparação com a figura dos “atos concertados” entre
juízes?
Vantagens do IRDR: possibilidade de coletivização de questão que não poderia ser objeto de tutela
coletiva, pois insuficiente para resolver integralmente os litígios nos quais ela se faz presente, em razão de
suas peculiaridades e existência de outras questões relacionadas ou mesmo por incompatibilidade, como a
definição, por exemplo, da penhorabilidade de uma espécie de bem; permite finalizar diversos processos em
curso; promove a isonomia ao vincular os juízes ao seu resultado, impedindo decisões conflitantes sobre o
mesmo tema.
Desvantagens: problema da representatividade adequada, dificuldade de participação pelos sujeitos
afetados, possibilidade de escolha do tribunal que julgará o IRDR, de acordo com a conveniência de quem o
instaura.
Vantagens ação coletiva: trata de situações que não compensariam a demanda individual,
adulteração em preço no posto de gasolina e, se não fosse a ação coletiva, não seriam reparadas; permitem
uma visão global da situação e suas implicações econômicas.
Desvantagens: dificuldade na efetivação das decisões, demora na execução das sentenças de direitos
individuais homogêneos, gerando, muitas vezes retrabalho ao judiciário.
Os atos concertados, por sua vez, servem para situações em que apenas uma parcela ou um ou
alguns aspectos comportam a coletivização, como a coletivização para produção de prova sobre fato comum.
Em seguida, não seria mais possível prosseguir com ação coletiva, pois cada caso tem suas peculiaridades e
implicações.

19C. Julgamento unipessoal dos recursos pelo relator: pressupostos e limites.

Valmor Piazza
Doutrina: Daniel Amorim Assumpção Neves

➢ No que consiste o Julgamento Unipessoal pelo relator? Nas hipóteses do art. 932 do CPC, resta
autorizado o relator a julgar monocraticamente determinados recursos. Todavia, há de se destacar

226
ser caso de delegação legal de competência do órgão colegiado. Ou seja, a competência não é do
relator, mas do órgão colegiado, que a delega ao relator. A decisão monocrática contradiz a própria
natureza colegiada dos órgãos de 2º grau; entretanto, por razões de economia processual e efetiva
tutela em casos de urgência, delega a lei essa competência ao relator.
➢ Existe um momento apropriado? Sim, somente poderá efetivar o julgamento monocrático até o
lançamento do relatório e remessa dos autos ao revisor ou pedir dia para julgamento. Trata-se de
preclusão lógica para o juiz - fenômeno processual extremamente raro.
➢ Há alguma novidade nos poderes do relator frente ao CPC/1973? A principal novidade reside na
possibilidade de o relator homologar, monocraticamente, autocomposição das partes. Não obstante
se aceitasse no CPC/1973, havia desembargadores a rejeitar essa possibilidade, por enteder ser
competência do juízo de 1º grau.
➢ Como funciona a Tutela Provisória nos Tribunais? Incumbe ao relator apreciar o pedido de Tutela
Provisória (art. 932, II) e de efeito suspesivo, tanto nos recursos, quanto nos processos de
competência originária. Mais uma vez, destaca-se que o relator atua com delegação da competência
do órgão colegiado, de forma que lhe é permitido optar por levar a julgamento em sessão colegiada
o pedido, ao invés de resolvê-lo monocraticamente.
➢ Cabe Recurso do julgamento monocrático? Sim, a decisão monocrática do relator desafia Agravo
Interno (art. 1.021)
➢ A quem compete analisar a admissibilidade recursal? Compete ao relator não conhecer do recurso
inadmissível, prejudicado (falta superveniente de interesse recursal) ou que não tenha impugnado
especificamente os fundmentos da decisão recorrida (art. 932, III). Obs. No CPC/1973 cabia também
um juízo de admissibilidade pelo juízo de 1º grau; o CPC/2015 aboliu essa hipótese.
➢ Cabe julgamento monocrático do mérito do recurso? Sim (art. 932, IV), o relator poderá dar ou
negar provimento ao recurso conforme a decisão recorrida contrariar ou estiver em consonância,
respectivamente, com: (I) Súmula do STF, STJ ou do próprio Tribunal (novidade do CPC/2015); (II)
acódão do STF ou STJ em sede de recursos repetitivos; e (III) acórdão firmado em IRDR ou IAC. Obs.
No caso de dar provimento, compete ao relator intimar o recorrido para ofertar contrarrazões, em
respeito ao princípio do contraditório (art. 9º e 10)
➢ Quais são as hipóteses de julgamento monocrático? Não obstante o CPC (art. 932) trate
genericamente de Recursos, há de se extender o julgamento monocrático para o reexame necessário.
Lado outro, excepciona-se os recursos de embargos de declaração (divergência no STJ) e do próprio
Agravo Interno contra sua decisão monocrática. Do mesmo modo, não permite a jurisprudência o
julgamento monocrático em sede de Ação Originária.c
➢ Há outras incumbências ao Relator? Sim, o art. 932 do CPC permite ainda ao relator: (VI) decidir o
incidente de desconsideração de personalidade jurídica; (VII) intimar o Ministério Público; e (VIII)
exercer outras atribuições do Reigmento Interno do Tribunal - rol exemplificativo.
➢ Mais alguma incumbência? Sim, (1) o relator deve conceder prazo de 5 dias para o recorrente sanar
vício ou complementar documentação do recurso - princípio da primazia do julgamento de mérito.
Ademais, (2) verificando fato superveniente ou matéria que deva ser conhecido ex officio e ainda não
fora examinada, deve intimar as partes para se manifestar no prazo de 5 dias - consagração do efeito
translativo com respeito à dialeticidade e ao contraditório. Obs. Caso se verifique essas questões em
pedido de vista, deve o juiz que solicitou vista dos autos encaimnhá-los ao relator para que tome
referidas providências. Obs. 2. Caso necessária produção de prova pericial ou oral, deve o relator
converter o julgamento em diligências e expedir carta de ordem ao juízo de 1º grau.

20A. Tutela específica dos direitos difusos e coletivos. Procedimento da ação civil pública e da ação coletiva
para direitos individuais homogêneos

William Chaves Souza

1. A tutela específica consiste na condenação ao cumprimento de uma obrigação de dar (coisa certa
ou incerta), fazer (fungível ou infungível) e não fazer. Nela, ao contrário das perdas e danos, há
correspondência com aquilo que o credor almeja, daí seu caráter de especificidade, diferentemente da
condenação em perdas e danos, que têm caráter ressarcitório subsidiário. Trata-se de valioso instrumento
processual ao processo coletivo, pois através dela consegue-se proteger, na maior medida possível, o bem
227
jurídico tutelado. Está prevista no art. 84, caput, do CDC, com redação semelhante à do art. 497, caput, do
NCPC. Também nesse sentido dispõe o art. 11 da LACP.
Pode ser concedida de ofício e deve ser preferencial, por atender mais de perto ao princípio da
adequada prestação jurisdicional, pois ela: a) mantém intacta a esfera jurídica do autor (tutela preventiva);
ou b) a restitui com exatidão à situação existente antes do dano ou do ilícito (tutela repressiva), ou provê
exatamente a prestação contemplada no contrato (tutela específica da obrigação inadimplida). É cabível,
principalmente, para afastar ameaça ou lesão a direitos infungíveis ou não patrimoniais.
Excepcionalmente, em vez de prestá-la, o magistrado poderá condenar o responsável (mesmo de
forma diferente da requerida pelo autor) a providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do
objeto do pedido, desde que: a) não for tecnicamente possível a tutela específica; ou b) houver um meio de
entregar ao autor um resultado equivalente, com restrições menos gravosas ao responsável. Conforme
Arenhart, a disciplina conferida à tutela específica das obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa constitui
a mais expressiva atenuação do princípio da demanda (para o autor, princípio da congruência é um dos
aspectos do princípio da demanda) porque a tutela jurisdicional pode ser adaptada às circunstâncias do caso
concreto, independentemente do pedido da parte autora. Exige-se apenas que o autor requeira o
"cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer". Assim, nesses casos não haverá inobservância do
princípio da congruência entre a sentença e o pedido, pois a finalidade buscada pelo autor acaba sendo de
igual modo preservada. OBS.: para Arenhart, o princípio da demanda associa-se essencialmente ao objeto do
processo, indicando o momento em que a atuação jurisdicional é exigida e determinando sobre o que deverá
ela incidir. Compreende a prerrogativa da parte de dar início ao processo, bem como a de determinar a
extensão do julgamento do juiz - o chamado princípio da congruência ou correlação, que impõe uma
correspondência necessária entre o solicitado e o decidido. O princípio da demanda é, pois, afeto
especialmente ao direito material, porque busca determinar a dimensão do direito cuja proteção será
requerida ao Estado.
Como ainda não contamos com um sistema processual coletivo sistematizado, é imperioso analisar o
sistema integrado de tutela coletiva instituído conjuntamente pela LACP, CDC, LAP etc, que invocam a
aplicação subsidiária do NCPC nas eventuais lacunas existentes, mantendo o diálogo das fontes (art. 19,
LACP).
Para a tutela específica em cognição parcial, a doutrina aponta a superação da anacrônica ação
cautelar preparatória (art. 4º-LACP), tendo em vista que o NCPC substituiu as ações cautelares pelo
procedimento da tutela cautelar requerida em caráter antecedente (305 a 310, NCPC). Assim, são cabidas as
tutelas de urgência cautelares, tanto antecedentes quanto incidentes, no bojo do mesmo processo em que se
faz o pedido definitivo, atendidos os requisitos: A) perigo de dano ou ilícito (tutelas inibitória ou de remoção
do ilícito) – art. 300 c/c 497, pu, NCPC; B) prova da probabilidade do direito; C) prestação de eventual caução
ou provocar sua dispensa: o rol de legitimados do art. 5º, da Lei 7.347/85 são legalmente dispensados de
pagamento prévio de custas ou preparo; D) oferta de prova que autorize a concessão liminar da tutela
provisória ou submeter-se à audiência de justificação prévia; E) não declinar em sede de urgência pretensões
qualificadas pela irreversibilidade. OBS.: Didier aponta que a tutela cautelar é atípica, no sentido que o
magistrado pode impor, a título cautelar, qualquer medida apta a resguardar o resultado útil do processo.
Doutrina aponta incabível a tutela antecipada requerida em caráter antecedente (303 e 304 do
NCPC), uma vez que se trata de tutela satisfativa sujeita à estabilização. É, pois, incompatível com a ACP e os
bens da vida que objetiva tutelar. A pretensão deduzida, que diz com os direitos ou interesses difusos,
transindividuais, metaindividuais, não convive com a ideia de estabilidade proposta pela lei processual,
carecendo da definitividade que só a sentença de mérito pode conferir, sentença essa apta a produzir a
indiscutibilidadee imutabilidade da coisa julgada material, que a estabilidade da tutela antecipada concedida
em caráter antecedente não logra alcançar.
Ademais, regra ínsita à tutela de urgência, é a indenização pelos danos ou pelos prejuízos que sua
efetivação pode causar à parte adversa, prevendo o Código de 2015 uma responsabilidade objetiva nas
seguintes hipóteses: A) sentença desfavorável ao autor; B) negligência do autor em fornecer os meios
necessários para a citação do requerido quando obtida a tutela cautelar antecedente, no prazo de 5 (cinco)
dias; C) cessação da eficácia da medida em qualquer hipótese legal; D) reconhecimento, pelo juiz, da
decadência ou da prescrição da pretensão do autor. Na ACP – no que diz respeito ao processo coletivo – o

228
art.18 da Lei n. 7.347/85 prevê que não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e
quaisquer outras despesas, nem condenação da parte autora a honorários advocatícios ou quaisquer outras
despesas, salvo comprovada má-fé. a regra visa acesso mais amplo e irrestrito possível à justiça pela via do
processo coletivo. Assim, apenas a litigância de má-fé autoriza tais condenações, o que deve ser estendido à
ideia de qualquer outra reparação. Não se está defendendo a ausência de reparação por eventuais prejuízos,
mas exigindo-se que esta só seja reconhecida e aplicada pela via da responsabilidade subjetiva, na medida
em que se está frente a um processo coletivo. Trata-sede limitação da maior relevância sob pena de se
intimidar a parte autora, representante da coletividade, a renunciar ao pedido de tutela de urgência, no mais
das vezes faz necessária nos conflitos coletivos, frente aos riscos de uma improcedência, cuja probabilidade é
sempre.
A LACP prevê, ainda, a medida liminar, com cominação de multa, que pode ser imposta também em
face da Fazenda Pública (art. 12-LACP). Tal deve ser compatibilizado com a perspectiva do NCPC de tutela
provisória satisfativa incidental fundada em urgência ou evidência, que pode ser requerida ou não na petição
inicial (arts.300-302e 311, NCPC). Além disso, há de se perceber a possibilidade de pedidos cautelares ou
antecipatórios incidentais, ante novos fatos no decurso do processo, em sintonia com o NCPC. Observe-se
que o STJ entende que a cobrança da multa fixada liminarmente requer trânsito em julgado (LACP- art. 12
§2º), não preclui nem faz coisa julgada. Todavia, o NCPC prevê a possibilidade de cumprimento provisório,
devendo ser depositada em juízo, com o levantamento do valor após o trânsito em julgado (NCPC, art.537,
§3º).
As obrigações de fazer e não fazer são tratadas no art. 11, LACP e no art. 84 do CDC: o juiz determina,
inclusive de ofício, a prestação devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica ou
multa diária. Não havendo cumprimento espontâneo, pode haver fixação de multa (“astreintes” - execução
indireta), ou execução direta da medida, p.ex., obstruindo uma obra. STJ entende “ser cabível a cominação
astreintes contra a Fazenda pública (REsp 1664327/PB, DJe 12-09-2017). Há divergência na Corte quanto à
aplicação da multa em relação ao próprio agente público. Em julgado de 2015 assentou-se que “Inexiste
óbice, por outro lado, a que as astreintes possam também recair sobre a autoridade coatora recalcitrante
que, sem justo motivo, cause embaraço ou deixe de dar cumprimento a decisão judicial proferida no curso da
ação mandamental” (REsp 1399842/ES,DJe 03-02-2015). Mas a orientação preponderante naquela Corte é no
sentido contrário, ou seja, é a de que “determinar a cominação de astreintes aos gestores públicos sem lhes
oferecer oportunidade para se manifestarem em juízo acabaria por violar os princípios do contraditório e da
ampla defesa” (REsp 1657795/PB, DJe 13-09-2017).
Reconhecimento do microssistema de tutela coletiva pelo STJ – “A lei de improbidade
administrativa, juntamente com a lei da ação civil pública, da ação popular, do mandado de segurança
coletivo, do Código de Defesa do Consumidor e do Estatuto da Criança e do Adolescente e do Idoso,
compõem um microssistema de tutela dos interesses transindividuais e sob esse enfoque interdisciplinar,
interpenetram-se e subsidiam-se. (...)” (STJ, 1ª Turma, Resp. nº 510.150/MA, Rel. Min. Luiz Fux, j. 17.02.2004,
DJ 29.03.2004).
2. Procedimento da ação civil pública: inicialmente mencionada na Lei 6.938/81, só veio a ser
regulada com a Lei 7.347/85. Presta-se a tutelar qualquer direito metaindividual (art. 1º, IV está em vigor –
STJ, RESP 706.791). A competência é do foro do local do dano/ilícito (Atenção: por força dos §§1º e 2º do art.
109 da CF, se a União for autora a ação, necessariamente, deverá ser proposta na seção judiciária em que
tiver domicílio o réu; se a União for ré, o autor poderá optar entre o foro de seu próprio domicílio, do distrito
federal ou do local onde esteja situada a coisa ou tenha ocorrido o fato ou ato que deu origem à demanda).
Deve haver pertinência temática entre o ente legitimado e a lide coletiva tutelada - quando se tratar de Entes
da Administração Direta e Indireta, de direito público e privado, Associações e Defensoria Pública. A recusa, o
retardamento ou a omissão de dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civil, quando requisitados
pelo Ministério Público, é crime. Não cabe ACP para pretensões que envolvam tributos, contribuições
previdenciárias, FGTS ou outros fundos de natureza institucional cujos beneficiários podem ser
individualmente determinados.
Na ACP contra o Poder Público, é vedada a liminar inaudita altera pars (art. 2º, Lei 8.734/92), todavia
a doutrina sustenta que em casos de perecimento de direito esse dispositivo deve ser afastado por força do
art. 5º, XXXV da CF. A Fazenda Pública deve se pronunciar em 72 horas. O MP, não sendo parte, será fiscal da
lei (sua ausência gera nulidade absoluta, mesmo que o direito seja disponível). Litisconsórcio pode ser não só
229
inicial, mas também ulterior. Os legitimados, salvo o MP, poderão desistir, e o MP ou outro legitimado ativo
pode assumir a demanda infundadamente abandonada. Admite-se litisconsórcio entre MP´s (controvérsia
doutrinária. STF admitiu V. ACO 1020). STJ também admite (REsp 1.254.428-MG info 585): litisconsórcio ativo
facultativo entre o MPE e MPU depende da demonstração de razão específica que justifique a presença de
ambos na lide.
Doutrina e jurisprudência vêm entendendo que a responsabilidade dos poluidores pelos danos
ambientais é solidária, por consequência, dá azo a litisconsórcio passivo facultativo. A ACP pode ou não ser
precedida de inquérito civil (procedimento administrativo, de natureza inquisitorial, regulado pela Resolução
nº 23/2007 do CNMP, instaurado e presidido pelo Ministério Público, destinado a apurar a ocorrência de
danos efetivos ou potenciais a interesses que lhe incumba defender, servindo como preparação para o
exercício das atribuições inerentes às suas funções institucionais). A condenação em dinheiro é revertida para
um fundo (art. 13). Porém, se o dano decorrer de discriminação étnica, a pecúnia será destinada a ações de
promoção de igualdade étnica (inovação da Lei 12.288/10).
Há controvérsia sobre a reconvenção. O art. 343, §5º do NCPC prevê possibilidade de substituto
processual figurar no polo passivo da reconvenção também como substituto. Todavia, Hugo Nigro Mazzilli
aponta: “Porque os entes estatais e as associações, legitimados à propositura da ação civil pública ou
coletiva, como regra geral, não podem ser réus nessas mesmas ações? Porque a substituição processual é
matéria de direito estrito, e a lei só lhes conferiu a possibilidade de exercerem a substituição processual do
grupo lesado no pólo ativo. Por isso é que não cabe ação civil pública ou coletiva contra o grupo lesado, nem
mesmo por meio de reconvenção”. Outra parte da doutrina (DIDIER) entende ser cabível a reconvenção (Ex.
sindicato de trabalhadores contra sindicato patronal).
Os recursos, em regra, não têm efeito suspensivo; poderá o juiz conferir este efeito para evitar dano
irreparável. É cabível também suspensão de segurança (suspensão de liminar por presidente de tribunal- art.
12, § 1º, LACP). Não há adiantamento de custas. Não há ônus de sucumbência, salvo má-fé. Exame
necessário aplica-se apenas em caso de improcedência/extinção sem resolução de mérito (analogia com o
art. 19 LAP e art. 4º, §1º, Lei 7.853/89 – STJ – Resp 1.108.542, 29/05/2009; e RESP 1.219.033, 17/03/2011).
Efetivação do julgado: Art. 15 LACP. Decorridos sessenta dias do trânsito em julgado da sentença
condenatória, sem que a associação autora lhe promova a execução, deverá fazê-lo o Ministério Público,
facultada igual iniciativa aos demais legitimados.
OBS. STJ: em ACP do MP-GO (2016) pretendendo a condenação do Estado de Goiás a reduzir o
número de comissionados da Secretaria de Estado de Agricultura, o ministro Mauro Campbell decidiu pela
desnecessidade de incluir todos os servidores comissionados como litisconsortes passivos necessários, pois "
Na espécie, não há indivisibilidade na relação jurídica, visto que não são todos aqueles apontados como
litisconsortes pela Corte de origem que serão afetados pelo provimento ou pelo não provimento da ação”.
OBS2: Atentar para a alteração trazida pela Lei 12.966/2014, que inclui a proteção da honra e da
dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos como um dos objetivos da ACP. A respeito do tema,
consoante leciona o Juiz Federal Márcio André Lopes Cavalcante: o rol de bens e interesses jurídicos que
podem ser tutelados por meio da ACP, na Lei 7.347/85(meio ambiente, consumidor etc), é exemplificativo.
Assim, também poderão ser defendidos mediante a ACP outros bens e direitos de caráter difuso, coletivo e
individual homogêneo. Exemplos de interesses que são tutelados pela ACP, apesar de não estarem
expressamente previstos na Lei 7.347/85: direitos dos portadores de necessidades especiais, dos idosos, das
crianças e adolescentes, patrimônio público.
A nova Lei n. 12.966/2014 acrescenta mais um inciso ao art. 1º da Lei n. 7.347/85 e estabelecer, de forma
expressa, que a ação civil pública poderá também prevenir e reparar danos morais e patrimoniais causados:

• à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos.

Assim, caso uma rede de televisão mantenha programas que exponham pessoa ou grupo ao ódio ou
ao desprezo por motivos fundados na raça, na etnia ou na religiosidade, o Ministério Público (ou outro
legitimado) poderá ajuizar ação civil pública contra a emissora pedindo o fim da exibição e a sua condenação
em danos morais coletivos. A alteração é positiva em termos simbólicos. Na prática, pouco mudou, pois tais
valores já podiam ser protegidos pela ACP, conforme previsão do art. 1º, IV e V da Lei 7.347/85 e do art. 55 da
Lei n 12.288/2010 (Estatuto da Igualdade Racial). Outra mudança: expressamente previsto que as
230
associações cuja finalidade institucional é a proteção dos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos são
legitimadas para ajuizar ação civil pública.

3. Procedimento para direitos individuais homogêneos: tratado em capítulo próprio no CDC (art. 91-
100). A competência, ressalvada a da Justiça Federal, é do foro do local do dano/ilícito (ou na respectiva
capital, para dano nacional/regional). Proposta a ação, há publicação de edital, com ampla divulgação para o
ingresso de litisconsortes (sua inobservância não gera nulidade – REsp 205481). Na procedência, a
condenação é genérica; a execução é individual ou coletiva, com preferência para os créditos individuais.
Após um ano sem habilitações individuais suficientes, os legitimados coletivos liquidarão e executarão a
decisão, cujo produto irá para o Fundo de Defesa de Direitos Difusos – aqui se tem a versão brasileira do fluid
recovery, ou reparação fluida, que é solução pela qual, ao mesmo tempo em que se privilegia a tutela coletiva
como instrumento da reparação dos danos causados individualmente para a massa de consumidores, na
hipótese destes não a reclamarem, na medida do seu prejuízo, permite sua conversão para um Fundo, cujo
objetivo final é reverter em favor dos interesses lesados (Arenhart critica muito tanto as execuções
individuais - pelo contransenso que representa frente ao propósito das ações coletivas de reduzir o volume
de processos -, quanto a destinação que se tem dado aos recursos dos fundos). As vantagens são duas: 1º)
não permitir que a falta de habilitação dos consumidores lesados termine por liberar o fornecedor que atuou
ilicitamente de suportar a reparação pelos danos causados, reforçando a função de desestímulo que a
indenização deve possuir. 2º) determina a possibilidade da reparação; não sendo diretamente reclamada
pelos lesados, a indenização pode ser utilizada em iniciativas e projetos vinculados aos direitos que a ação
coletiva buscou proteger.
Nos direitos individuais homogêneos, não há coisa julgada secundum eventum litis. Há sempre coisa
julgada da ação coletiva – o que não prejudica a ação individual (aquele indivíduo possuidor de direito
individual homogêneo, não participante do processo coletivo, quer como litisconsorte, quer como assistente,
poderá propor sua demanda a título individual em juízo, nos termos do artigo 103, § 1º, do CDC. O CDC faz
referência apenas à procedência para conferir o transporte in utilibus,i.e., esteado no princípio do máximo
benefício da tutela jurisdicional coletiva determina que,na procedência do pedido, é possível utilizar o
resultado da sentença em demandas individuais, transportando, para estes casos, a coisa julgada benéfica. O
art. 104 diz que a parte, para se beneficiar, deve requerer a suspensão de seu processo individual. O STJ,
aplicando por analogia o recurso repetitivo, disse que esta suspensão é cogente, podendo ser determinada
para evitar decisões contraditórias (REsp 1110549). O MP possui legitimidade condicionada (deve existir
relevante interesse social, não se podendo falar em tutela de direito individual disponível e identificável) Ex.:
Súmula 470 do STJ: “O Ministério Público não tem legitimidade para pleitear, em ação civil pública, a
indenização decorrente do DPVAT em benefício do segurado”. Nas ações coletivas para a defesa de interesses
individuais homogêneos que não tenham sido ajuizadas pelo Ministério Público, a ele caberá, de ofício, a
atuação como fiscal da lei.
Não se admite o cabimento da remessa necessária, tal como prevista no art. 19 da Lei nº 4.717/65
(caso de carência ou improcedência da ação), nas ações coletivas que versem sobre direitos individuais
homogêneos. Ex: ação proposta pelo MP tutelando direitos individuais homogêneos de consumidores. STJ/
REsp 1.374.232-ES, 26/09/2017 (Info 612). Observe-se que o STJ admite cabível o reexame, por analogia, em
ação de improbidade e em ACP ( respectivamente EREsp 1.220.667-MG, Info 607-2017; e REsp 1596028/MG,
julgado em 26/09/2017).
Nas ações coletivas, em geral, a coisa julgada ocorre de acordo com o resultado do processo,
secundum eventum litis, o que significa dizer simplesmente que havendo procedência da demanda ou face à
improcedência fundada em provas suficientes, operar-se-á coisa julgada; caso contrário, havendo
improcedência por falta de provas, poderá ser proposta nova ação, com base em prova nova. Todavia, para o
STJ, após o trânsito em julgado de decisão que julga improcedente ação coletiva proposta em defesa de
direitos individuais homogêneos, independentemente do motivo que tenha fundamentado a rejeição do
pedido, não é possível a propositura de nova demanda com o mesmo objeto por outro legitimado coletivo,
ainda que em outro Estado da federação.STJ. REsp 1.302.596-SP, julgado em 9/12/2015 (Info 575).

Quadro-resumo Relevante:
231
SENTENÇA DIFUSOS COLETIVOS INDIVIDUAIS HOMOG

Fará coisa julgada Fará coisa julgada Fará coisa julgada


PROCEDENTE
erga omnes. ultra partes. erga omnes.

Fará coisa julgada Fará coisa julgada


Impede nova ação coletiva.
erga omnes. ultra partes.
IMPROCEDENTE COM O lesado pode propor
Impede nova ação coletiva. Impede nova ação coletiva.
EXAME DAS PROVAS ação individual se não
O lesado pode propor O lesado pode propor
participou da ação coletiva.
ação individual. ação individual.

Não fará coisa julgada Não fará coisa julgada


Impede nova ação coletiva.
erga omnes. erga omnes.
IMPROCEDENTE POR O lesado pode propor
Qualquer legitimado pode Qualquer legitimado pode
FALTA DE PROVAS ação individual se não
propor nova ação coletiva, propor nova ação coletiva,
participou da ação coletiva.
desde que haja prova nova. desde que haja prova nova.

20B. Agravo

Leonardo Ferreira Mendes 24/09/18

O recurso de agravo é gênero, do qual são espécies: agravo de instrumento; agravo interno ou
agravo para destrancamento de recursos de natureza extraordinária, e; agravo do art. 15, da Lei
12.016/2009. Em nenhuma hipótese de agravo há previsão de efeito suspensivo ope legis. Com o novo CPC,
foi extinto o agravo retido, o agravo de instrumento passou a ser admissível de acordo com rol taxativo (art.
1015, novo CPC) e segundo Daniel Amorim, foi extinto o agravo regimental, substituído pelo agravo interno.
Agravo de instrumento: recurso dirigido contra decisão interlocutória nos casos previstos no art.
1015, do CPC. O prazo de interposição é de 15 (quinze) dias. O art. 1019, I, do CPC, prevê a possibilidade de
concessão de tutela de urgência mediante pedido do recorrente. A tutela de urgência pode se dar mediante
concessão de efeito suspensivo e mediante concessão de antecipação de tutela recursal. Nos termos do art.
995, a atribuição de efeito suspensivo depende de que a imediata produção de efeitos da decisão recorrida
gerar risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de
provimento do recurso. Para a obtenção de antecipação de tutela recursal, devem ser demonstrados os
requisitos do art. 300, do CPC, a saber, a existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito
e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. O agravo de instrumento é um recurso
interposto diretamente no órgão ad quem. Tem custas e não passa pelo juízo de admissibilidade perante o
órgão a quo. Por conta disso, deve ser formado um instrumento, conjunto organizado de peças processuais
que o agravante tem de fazer, tentando reproduzir no tribunal o que ocorre na primeira instância. Na lei, só
existem 6 peças obrigatórias: 1) cópias da petição inicial; 2) cópias da contestação; 3) cópias da petição que
ensejou a decisão agravada; 4) cópias da própria decisão agravada; 5) cópias da certidão da respectiva
intimação ou outro documento oficial que comprove a tempestividade, e; 6) das procurações outorgadas aos
advogados do agravante e do agravado.
ATENÇÃO: o STJ, sob a égide do CPC/73, pacificou o entendimento de que a falta de peças
obrigatórias (as acima arroladas) gera a inadmissibilidade do agravo de instrumento por inépcia. Entretanto,
com base no art. 1017, §3º, c.c. art. 932, do novo CPC, tem sido determinada a intimação da parte para
regularização de falhas formais na interposição do recurso. O agravante deve, no prazo de 3 (três) dias da
interposição do recurso, juntar aos autos de primeira instância cópia do recurso de agravo de instrumento e
dos documentos novos nele juntados, sendo desnecessária a juntada de documentos constantes dos autos
principais. Segundo o art. 1018, §2º, do CPC, fica dispensada referida juntada caso os autos sejam
eletrônicos. O recurso possui efeito regressivo.
São casos de interposição de Agravo de Instrumento: I - tutelas provisórias; II - mérito do processo;
III - rejeição da alegação de convenção de arbitragem; IV - incidente de desconsideração da personalidade
jurídica; V - rejeição do pedido de gratuidade da justiça ou acolhimento do pedido de sua revogação; VI -
exibição ou posse de documento ou coisa; VII - exclusão de litisconsorte; VIII - rejeição do pedido de
232
limitação do litisconsórcio; IX - admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros; X - concessão,
modificação ou revogação do efeito suspensivo aos embargos à execução; XI - redistribuição do ônus da
prova nos termos do art. 373, § 1o; XIII - contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de
sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário.
Questão controversa é o cabimento de Agravo de Instrumento em casos não previstos em lei,
notadamente nas decisões sobre competência. O tema está afetado para julgamento na sistemática dos
recursos repetitivos pelo STJ, tema 988.
Agravo Interno: agravo interno é um recurso contra a decisão monocrática do relator para o próprio
órgão colegiado a que pertence o magistrado, para ver se ele agiu corretamente. O recurso não possui efeito
suspensivo automático e admite efeito regressivo. O recorrido será intimado para apresentar contrarrazões
no prazo de 15 dias. Caso seja manifestamente improcedente ou inadmissível, ensejará a aplicação de multa
um e cinco por cento do valor atualizado da causa. A interposição de qualquer outro recurso será
condicionada ao recolhimento da multa, salvo para a Fazenda Pública e beneficiário da justiça gratuita.
Agravo para destrancamento de recurso especial e extraordinário: caberá da decisão do tribunal
que, em juízo de admissibilidade, negar seguimento ao recurso de índole extraordinária, nos seguintes casos:
a) o recurso ainda não tenha sido submetido ao regime de repercussão geral ou de julgamento de recursos
repetitivos; b) o recurso tenha sido selecionado como representativo da controvérsia; ou c) o tribunal
recorrido tenha refutado o juízo de retratação. O recurso deve ser interposto nos próprios autos. O agravado
será intimado para contrarrazões no prazo de 15 dias e se admite juízo de retratação (efeito regressivo). Em
caso de inadmissão de recurso especial e de recurso extraordinário, o agravante deverá interpor um agravo
para casa recurso que se pretende destrancar. Primeiramente o STJ decidirá o agravo e eventualmente o
recurso especial, e posteriormente encaminhará o agravo contra o recurso extraordinário ao supremo, para
mesma providência.

20C. Cumprimento de sentença que reconheça obrigação de pagar quantia certa pela Fazenda Pública.
Execução fiscal.

Milton Tiago Souza Jr.

I. Cumprimento de sentença que reconheça obrigação de pagar quantia certa pela Fazenda Pública

O cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública é uma execução especial, pois a Fazenda Pública
possui uma forma particular de cumprimento de seus débitos pecuniários (precatório, art. 100 da CF), em
razão de os bens públicos se encontrarem vinculados em princípio a uma finalidade pública, sendo, portanto,
inalienáveis e impenhoráveis. Aliás, os próprios bens públicos alienáveis (bens públicos dominicais) têm
regime jurídico próprio de alienação, o que obsta a sua venda em execução forçada.
No CPC de 2015, o cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de pagar quantia
certa pela Fazenda Pública se encontra disciplinado nos artigos 534 e 535. Importante frisar que o
cumprimento de obrigações de fazer, de não fazer ou de entregar coisa contra a Fazenda Pública é regulado
pelos artigos 536 a 538 do CPC. A respeito da possibilidade de cumprimento de sentença de decisão
provisória, a jurisprudência admitia a execução provisória de obrigação pecuniária contra a Fazenda Pública
quando não fosse necessária a expedição de precatório ou quando prestada caução idônea pelo exequente.
O Professor Arenhart entende que eventuais restrições ao cumprimento provisório contra a Fazenda Pública
são inconstitucionais por violarem o direito fundamental à tutela jurisdicional adequada e efetiva dos
direitos. O STF reconheceu a repercussão geral do tema (RE 573.872-RS), que aguarda julgamento.
Em relação ao procedimento, para dar início ao cumprimento de sentença de prestação pecuniária, deve o
exequente apresentar demonstrativo discriminado e atualizado do crédito, que deve conter as seguintes
informações: (I) - o nome completo e o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro
Nacional da Pessoa Jurídica do exequente; (II) - o índice de correção monetária adotado; (III) - os juros
aplicados e as respectivas taxas; (IV) - o termo inicial e o termo final dos juros e da correção monetária
utilizados; (V) - a periodicidade da capitalização dos juros, se for o caso; e (VI) - a especificação dos eventuais
descontos obrigatórios realizados. Se houver litisconsórcio, cada exequente deve apresentar o respectivo
demonstrativo, podendo o juiz limitar o litisconsórcio quando o quantitativo de partes puder comprometer o
cumprimento de sentença. (Incisos do art. 534)

233
A multa prevista pela falta de pagamento voluntário do título objeto do cumprimento de sentença, no prazo
de 15 (quinze) dias, não se aplica à Fazenda Pública por força do § 2 o do art. 534 e por conta da
irrenunciabilidade do pagamento de prestação pecuniária pela via do precatório ou da requisição de
pequeno valor.
No cumprimento de sentença, a Fazenda Pública é intimada, na pessoa de seu representante judicial, para,
querendo, impugnar a execução no prazo de 30 dias. As matérias passíveis de arguição na impugnação são:
(I) - falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia; (II) - ilegitimidade
de parte; (III) - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; (IV) - excesso de execução ou
cumulação indevida de execuções; (V) - incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução; e (VI) -
qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação
ou prescrição, desde que supervenientes ao trânsito em julgado da sentença. É possível ainda a alegação de
impedimento e suspeição, observado o disposto nos artigos. 146 e 148 do CPC. (Incisos do art. 535) Na
alegação de excesso de execução, a Fazenda Pública deve de imediato declarar o valor que entende correto,
sob pena de não conhecimento da arguição ou de indeferimento da impugnação, caso este seja o único
argumento.
Além disso, a defesa de inexigibilidade da obrigação pode decorrer do fato de o título executivo judicial
fundar-se em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou mesmo
em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como
incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso,
observando-se a existência de modulação dos efeitos da respectiva decisão. Além disso, para lastrear a
impugnação, a decisão do STF que afete a higidez do título executivo judicial deve ter sido proferida antes do
trânsito em julgado da decisão exequenda, pois, do contrário, caberá ação rescisória cujo prazo decadencial
será contado a partir do trânsito em julgado da decisão do STF. A crítica em relação a tal regra é que ela gera
confusão entre “validade da lei” e “validade do juízo sobre a lei”, o que ofende a coisa julgada de decisão
validamente proferida.
Vale lembrar que, embora anteriores ao NCPC, o STF possui precedentes no sentido de não ser possível ação
rescisória fundada em posterior decisão de inconstitucionalidade, quando à época da decisão rescindenda
havia controvérsia acerca da interpretação constitucional, sob pena de vulnerar a garantia da coisa julgada
material (RE 590.809). Com efeito, o dispositivo do NCPC acaba por subordinar a coisa julgada a uma
verdadeira condição atemporal, na medida em que, reconhecida ou declarada a inconstitucionalidade de
certa norma pelo STF, inicia-se o prazo para ação rescisória, sendo, por tal razão, inconstitucional.
Noutro ponto, é importante destacar que a impugnação parcial do crédito executado torna a parte
incontroversa desde logo passível de cumprimento. Observe-se que o cumprimento parcial de parcela
incontroversa do crédito não conflita com o disposto no § 8 do art. 100 da CF, uma vez que o intuito do óbice
de fracionamento de precatório da norma constitucional é coibir fraudes, e não embaraçar a célere
satisfação do crédito exequendo.
Ademais, observa-se que, ao contrário do que ocorre no cumprimento de sentença comum, a impugnação ao
cumprimento de sentença apresentado pela Fazenda Pública possui efeito suspensivo, de modo que o seu
prosseguimento apenas ocorre com a preclusão da decisão de impugnação.
Caso não haja impugnação ou esta seja rejeitada, o cumprimento de sentença tem prosseguimento com a
expedição, por intermédio do presidente do tribunal competente, do precatório em favor do exequente,
observando-se o disposto na CF (art. 535, § 3 o, I, do CPC). Na hipótese de a obrigação ser de pequeno valor,
na forma da lei do ente executado, o juiz ordenará, à autoridade na pessoa de quem o ente público foi citado
para o processo, o pagamento de obrigação de pequeno valor deverá ser realizado no prazo de 2 (dois)
meses contado da entrega da requisição, mediante depósito na agência de banco oficial mais próxima da
residência do exequente (art. 535, § 3o, II, do CPC). Vale acrescentar que o art. 17 da Lei 10.259 e o art. 13 da
Lei 12.153 tratam da requisição de pequeno valor no âmbito dos Juizados Especiais.
Caso alguém seja preterido no seu direito de preferência, pode requerer o sequestro da quantia necessária.
O presidente do tribunal, após ouvir o chefe do MP, pode determinar a apreensão e entrega do valor ao
credor. A doutrina majoritária entende que o sequestro, aqui, tem natureza de ato executivo. Para Barbosa
Moreira, o ato de constrição deve recair sobre o patrimônio do credor que recebeu antes da hora. Já para
Araken de Assis, recai sobre o patrimônio da Fazenda Pública, devedora original. STF entende que recai sobre
renda pública (ADI 1.662), enquanto que o STJ pacificou entendimento de que o sequestro deve recair sobre
renda pública não só na preterição da ordem, mas também no caso de omissão no orçamento e nos casos de
não ser a dívida que foi parcelada paga no vencimento (RMS 22.519). STJ ainda entende que a legitimidade
234
passiva no sequestro é exclusiva do ente público. Aparentemente a EC 62/2009 pôs fim à polêmica por meio
do art. 100, p. 6 o, CF: as dotações orçamentárias e os créditos abertos serão consignados diretamente no
Poder Judiciário, autorizado, para os casos de preterimento do direito de precedência ou não alocação
orçamentária do valor necessário, o sequestro desses valores.

II. Execução Fiscal

Dívida Ativa: a Execução fiscal está regulada pela Lei Federal n 6.830/80 e, subsidiariamente, pelas
disposições do CPC. A dívida ativa da Fazenda é constituída por qualquer valor definido como de natureza
tributária ou não tributária pela Lei Federal n. 4.320/64. Essa dívida ativa compreende, além do principal, a
atualização monetária, os juros, a multa de mora e os demais encargos previstos em lei ou contrato. O valor
devido à Fazenda deve ser inscrito em dívida ativa, por meio de um procedimento administrativo que
apurará sua liquidez e certeza. Notificado o devedor para pagar o valor devido ou defender-se, caso
mantenha-se inerte ou sua defesa seja rejeitada, sobrevirá o ato administrativo de inscrição do valor na
dívida ativa. Após a inscrição, é emitida uma certidão que atesta a certeza e liquidez do crédito, denominada
CDA, constituindo título executivo hábil a legitimar a propositura da execução fiscal. As Fazendas não
promovem execução fiscal quando a dívida for de pequeno valor, de acordo com limites fixados em cada
esfera. Mas, se ainda assim ela intentar execução, não cabe ao juiz extinguir o feito, porque apenas cabe ao
ente público avaliar o ajuizamento. Nesse sentido a Súmula 452, STJ. A certidão pode ser, até a prolação da
sentença de embargos, substituída, em caso de erro material ou formal. O que não se admite é a modificação
do sujeito passivo da execução (Súmula 392, STJ).

LEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA NA EXECUÇÃO FISCAL: pode ser ajuizada pela Fazenda Pública (União,
Estados, Municípios, DF e suas autarquias e fundações públicas). Para parcela da doutrina, também devem
ser incluídas as agências reguladoras (Scarpinella Bueno). Para Didier e Marinoni-Arenhart, não pode ser
ajuizada pelas empresas públicas e sociedades de economia mista. Reconhece Didier, todavia, ser possível, a
celebração de convênio entre um ente público e uma empresa pública ou sociedade de economia mista para
que esta possa promover a execução fiscal. Cita como exemplo o ERESP n 537.559/RJ, em que reconhecida a
legitimidade da CEF para intentar execução fiscal como substituta processual do FGTS. Para Theodoro Jr,
citando precedente STJ (Resp 397.363), a aplicação do procedimento executivo dependerá da atividade que
elas exercem, exigindo-a no caso da ECT. Os conselhos profissionais são também partes legítimas (ADI n
1.717/DF). É de se observar que a OAB não pode se valer do executivo fiscal para cobrar anuidades de
advogados, devendo utilizar a execução por quantia certa contra devedor solvente (não integra a
Administração Indireta - STJ, ERESP 503.252/SC). O polo passivo, por sua vez, compõe- se pelo devedor
constante da certidão ou por seus sucessores a qualquer título. Pode, ainda, ser promovida a execução em
face do garantidor da dívida ou contra a pessoa obrigada a satisfazer a obrigação, como o fiador, o espólio, a
massa falida ou o responsável, nos termos da lei, por dívidas tributárias ou não tributárias. Tanto o devedor
quanto os demais responsáveis devem estar designados no termo de inscrição de dívida conforme dispõe o
art. 2, § 5, I, da LEF. Conquanto o referido dispositivo exija a referência aos responsáveis no termo de
inscrição, o art. 4 o dispõe que a execução pode ser promovida contra o responsável (inciso V). Se fosse
necessária a designação do responsável no termo de inscrição de dívida ativa, ele se tornaria devedor, não
havendo razão para esse artigo referir-se ao responsável, sendo suficiente apenas haver referência ao
devedor. Significa que a execução fiscal pode incidir contra o devedor ou o responsável, não sendo
necessária que conste o nome deste na certidão. STJ, RESP 271.584: a execução fiscal é proposta contra a
pessoa jurídica, não sendo exigível constar da CDA os nomes dos corresponsáveis pelo débito tributário, que
podem ser chamados supletivamente. A diferença é que, se seu nome constar já na CDA, há presunção de
liquidez e certeza de ser ele o responsável, mas, caso não conste, pode ser contra ele redirecionada a
execução, contanto que haja comprovação de sua responsabilidade pela dívida. No caso de encerramento da
falência da pessoa jurídica, não deve prosseguir a execução fiscal contra a massa falida, por inexistência de
sujeito passivo, devendo ser facultada à exequente a oportunidade de postular o redirecionamento contra os
sócios – art. 134, VII, CTN (STJ, RESP 608.198).

COMPETÊNCIA: É do foro do domicílio do devedor, podendo ser ajuizada no foro do lugar em que se praticou
o ato ou ocorreu o fato que deu origem à dívida. A Medida Provisória 651/2014 foi convertida na Lei 13.043,

235
de 13 de novembro de 2014, revogando definitivamente a chamada competência delegada para as ações
fiscais federais. A mudança passou a valer a partir de janeiro de 2015.
Em regra a execução é intentada perante juiz de primeira instância, mas pode também sê-la perante o STF,
originariamente. A execução fiscal proposta pela União contra Estado estrangeiro ou organismo internacional
deve ser intentada no STF, cf art. 102, I, alínea e, CF (STF, ACO-AgR n 543/SP). Com o advento da EC 45/2004,
uma multa imposta por um órgão de fiscalização do trabalho, se não for paga, deve ser cobrada por
execução fiscal perante a Justiça do Trabalho. Tal situação não significa que as execuções propostas por
conselhos profissionais tramitem na JT (não há qualquer relação de trabalho que justifique sua competência).
FGTS segue sendo competência federal (Súmula 349, STJ - STJ, CC n. 23.132/TO). É da Justiça Eleitoral a
competência para processar execução fiscal que objetiva a cobrança de multa eleitoral. A incompetência de
juízo distinto daquele em que é domiciliado o devedor é de natureza relativa, não podendo ser reconhecida
de ofício (aplica-se o princípio da perpetuatio jurisdictionis). De acordo com a jurisprudência do STJ, a
possibilidade de cobrança do crédito por meio de execução fiscal não impede a opção do credor pela
habilitação do crédito no processo falimentar (RESP 874.065/RS). É que não se aplica à execução fiscal a vis
attractiva do juízo universal da falência. Todavia, apesar de os créditos tributários não estarem sujeitos à
habilitação no juízo falimentar, não se livram de classificação, para disputa de preferência. Assim, a Fazenda
não tem de encerrar o executivo fiscal para habilitar seu crédito, mas deve encaminhar o produto de sua
execução singular ao juízo da falência, para que se incorpore ao monte e seja distribuído, observadas as
preferências e as forças da massa (STJ, RESP 188.148 e AgRg no AgRg no AgRg no CC 117184).

PROCEDIMENTO: deve-se instruir a petição inicial com a certidão de dívida ativa. Estando em ordem, o juiz
determina a citação do executado, preferencialmente por meio dos correios com AR, podendo a Fazenda
requerer seja de outra forma. A citação pelo correio considera-se feita na data a entrega da carta no
endereço do executado. Se a data for omitida no AR, considera-se feita a citação 10 (dez) dias após a entrega
à agencia postal (art. 8 o, II, LEF). Se o AR não retornar em 15 dias da entrega da carta à agencia postal, a
citação deve ser feito por oficial de justiça ou por edital. Frustradas as tentativas para citação, faz-se por
edital. Na execução fiscal ela só ocorre após o esgotamento de todos os meios possíveis para localização do
executado. O executado é então citado para, no prazo de 5 dias, pagar a dívida com juros e multas de mora,
além de encargos, ou garantir a execução. Se o devedor não pagar nem nomear bens à penhora no prazo
legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz, de acordo com o art. 185-A do CTN, determinará a
indisponibilidade de seus bens e direitos. Essa indisponibilidade deve limitar-se ao valor total exigível,
devendo ser imediatamente levantada a indisponibilidade dos bens ou valores que excederem esse limite.
Mas ela só ocorre se a dívida for de natureza tributária. A indisponibilidade não impede que o devedor use e
usufrua de seu bem, só não podendo aliená-lo. Deve sempre, nessa medida de natureza cautelar, ser
observado o princípio da proporcionalidade, somente sendo adotada se inexistente outro meio de garantir-
se a execução. Nas execuções fiscais as intimações dos representantes judiciais da Fazenda são feitas
pessoalmente, mediante vista dos autos. STJ, RESP 743.867: nas comarcas do interior dos Estados, onde não
há sede de procuradorias, a intimação pode ser via postal. A intervenção do Ministério Público só se dá, na
execução fiscal, se verificada alguma das hipóteses previstas no art. 178, CPC, não bastando a mera presença
da Fazenda Pública.
Quanto à penhora, deve-se obedecer ao previsto no art. 11 da LEF. Se necessário o reforço de penhora, tal
não pode ser determinado de ofício pelo juiz, sob pena de violação ao princípio dispositivo (STJ, RESP
475.693). A substituição depende de requerimento justificado da Fazenda, sendo aplicável à execução fiscal
o art. 848 do CPC, com exceção de seu inciso I. É que esse inciso prevê que a parte pode requerer a
substituição no caso de desobediência à ordem legal e, nos termos do art. 15 da LEF, a substituição de bens
penhorados por outros independe da ordem de nomeação. A intimação da penhora ao executado dá-se por
publicação no Diário Oficial. Se a penhora recair sobre imóvel, será feita a intimação do cônjuge. É possível a
penhora sobre o faturamento diário de empresa, desde que seja excepcional, caso não haja outro meio de se
garantir o juízo nem bens suficientes para cobrir o valor. De acordo com o entendimento do Superior
Tribunal de Justiça, é possível a penhora de crédito relativo a precatório judicial. Todavia, equiparando-se o
precatório a direito de crédito, a Fazenda Pública pode recusar a indicação ou substituição do bem por
quaisquer das causas previstas no art. 848 do CPC, ou nos arts. 11 e 15 da LEF. Inteligência da Súmula
406/STJ. (AgRg no RECURSO ESPECIAL No 1.202.794). No que tange à penhora eletrônica, "A interpretação
sistemática dos artigos 185-A, do CTN, com os artigos 11, da Lei 6.830/80 e 854 do CPC, autoriza a penhora
eletrônica de depósitos ou aplicações financeiras independentemente do exaurimento de diligências
236
extrajudiciais por parte do exequente" (REsp 1.184.765/PA). Do contrário, o fundamento do princípio da
especialidade cairia por terra porque ao invés de facilitar a consecução do crédito tributário, a lei mais
específica estaria obstaculizando a prerrogativa da Fazenda Pública. Daí o diálogo das fontes, cuja função
primordial está em evitar uma interpretação absurda que ofende a lógica.

DEFESA DO EXECUTADO: o devedor é citado para, em 5 (cinco) dias, pagar ou garantir a execução. Feito o
depósito em dinheiro, procedida a juntada da fiança bancária ou havendo a intimação da penhora, inicia-se o
prazo de 30 dias para o executado embargar. Na STJ, prevalece que na LEF não existe a figura dos embargos
sem garantia, que é sempre exigida para que o contribuinte exerça seu direito de defesa (AgRg no REsp
1257434 e AgRg no REsp 1251021).
Ao executado cumpre alegar, nos embargos, toda matéria útil à defesa; não se admite reconvenção.
Majoritariamente, não se exige garantia integral, bastando a existência de penhora. Está superado o par 3 o
do art. 16 da LEF, que não admitia a alegação de compensação nos embargos. STJ, AgRg nos Edcl no REsp
573.212: está pacificado que, com a edição da Lei 8.383/91, regulamentando a compensação na esfera
tributária, restou viabilizada a possibilidade de discutir sobre o instituto em sede de embargos. O STJ admite
exceção de pré-executividade em sede de execução fiscal, em que pese a especialidade do art. 16 da LEF que
prevê apenas os embargos à execução. Tudo em função do princípio da menor onerosidade do devedor.
Efeito suspensivo dos embargos: Apesar de haver entendimento pacificado no sentido da aplicação
subsidiária do CPC, a primeira e segunda Turma do STJ passaram a divergir quanto à aplicabilidade do art.
739-A (atual art. 919 do NCPC) às execuções fiscais. No sentido da sua inaplicabilidade, 1 Turma do STJ, RESP
1291923: Votação unânime - (...) A interpretação dos artigos 18, 19, 24, inciso I, e 32, § 2, da LEF leva à
conclusão de que o efeito suspensivo dos embargos à execução fiscal decorre da sua apresentação. Isso
porque tais dispositivos legais preveem a realização de procedimentos tendentes à satisfação do crédito
(manifestação sobre a garantia, remissão, pagamento, adjudicação, conversão de depósito em renda) apenas
após o julgamento dos embargos ou nas hipóteses em que estes não sejam oferecidos, evidenciando a
suspensão do prosseguimento da execução até o julgamento final dos embargos. Também o REsp
1178883.No sentido da sua aplicabilidade, 2. Turma do STJ: AgRg no AREsp 88226. Para Didier, os embargos à
execução fiscal não têm efeito suspensivo, mas não se pode fazer adjudicação, nem levantamento do
depósito pela Fazenda, diante da dificuldade de reverter esses valores ao particular. A falta de efeito
suspensivo serve apenas para adiantar o rito da execução, permitindo a penhora e venda dos bens, tão
somente. Oferecimento: Na execução fiscal por carta, os embargos do executado serão oferecidos no juízo
deprecado, que os remeterá ao juízo deprecante para instrução e julgamento (art. 20, LEF) em que os
embargos podem ser oferecidos tanto no juízo deprecante como no deprecado. Já a competência para
julgamento é a mesma: juízo deprecante, salvo quando versarem sobre vícios ou irregularidades de atos do
próprio juízo deprecado. A diferença está no oferecimento. Suspensão da execução: Caso não sejam
encontrados bens penhoráveis, suspende-se o processo (art. 40): a) por 1 ano, quando não corre o prazo
prescricional; b) após tal período, não localizados bens, arquiva-se provisoriamente os autos; c) se de tal
decisão decorrer o lustro prescricional, reconhece-se, ouvida a Fazenda, a prescrição intercorrente. Se o juiz
decretá-la sem ouvir a Fazenda, pode ser anulada a decisão, em razão de error in procedendo. Exceção de
pré-executividade: É pacífica a jurisprudência no sentido de seu cabimento nas execuções fiscais (Súmula
393, STJ). Solve et repete (pague e depois reclame): Roque Carraza: o art. 38 da LEF, que a prevê, é
inconstitucional, porque discrimina em função de poder ou não o contribuinte depositar para ter acesso à
prestação jurisdicional. Ofende o princípio da igualdade e o da universalidade de jurisdição. Expropriação:
Passada a fase de penhora, sem embargos ou sendo rejeitados, possibilita-se à Fazenda adjudicar pelo valor
da avaliação. Art. 23 da LEF, a alienação será feita em leilão público. Recursos: Admitem-se todos os recursos
do CPC. Das sentenças em execuções fiscais de valor inferior ou igual a 50 ORTN cabem unicamente
embargos infringentes de alçada (art. 34), que se destinam ao próprio juiz sentenciante, em 10 dias, bem
como embargos de declaração.

PRECATÓRIO – MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA ADI QUE JULGOU INCONSTITUCIONAL O NOVO REGIME DE
PRECATÓRIOS ESTABELECIDO PELA EC 62/2009: A EC 62/2009 alterou o art. 100 da CF/88 e o art. 97 do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da CF/88 prevendo inúmeras mudanças no regime dos
precatórios. Tais alterações foram impugnadas por meio de ações diretas de inconstitucionalidade que foram
julgadas parcialmente procedentes. No entanto, o STF decidiu modular os efeitos da decisão, ou seja, alguns
dispositivos, apesar de terem sido declarados inconstitucionais, ainda irão vigorar por mais algum tempo.
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Veja o resumo do que foi decidido quanto à modulação: 1. O § 15 do art. 100 da CF/88 e o art. 97 do ADCT
(que tratam sobre o regime especial de pagamento de precatórios) ainda irão valer (poderão ser aplicados)
por mais cinco anos (cinco exercícios financeiros) a contar de 01/01/2016. Em outras palavras, tais regras
serão válidas até 2020. 2. §§ 9o e 10 do art. 100 da CF/88 (previam a possibilidade de compensação
obrigatória das dívidas que a pessoa tinha com a Fazenda Pública com os créditos que tinha para receber
com precatório): o STF afirmou que são válidas as compensações obrigatórias que foram feitas até
25/03/2015 (dia em que ocorreu a modulação). A partir desta data, não será possível mais a realização de
compensações obrigatórias, mas é possível que sejam feitos acordos entre a Fazenda e o credor do
precatório e que também possua dívidas com o Poder Público para compensações voluntárias. 3. Leilões para
desconto de precatório: o regime especial instituído pela EC 62/2009 previa uma série de vantagens aos
Estados e Municípios, sendo permitido que tais entes realizassem uma espécie de “leilão de precatórios” no
qual os credores de precatórios competem entre si oferecendo deságios (“descontos”) em relação aos
valores que têm para receber. Aqueles que oferecem maiores descontos irão receber antes do que os
demais. Esse sistema de leilões foi declarado inconstitucional, mas o STF afirmou que os leilões realizados até
25/03/2015 (dia em que ocorreu a modulação) são válidos (não podem ser anulados mesmo sendo
inconstitucionais). A partir desta data, não será possível mais a realização de tais leilões. 4. Vinculação de
percentuais mínimos da receita corrente líquida ao pagamento dos precatórios e sanções para o caso de não
liberação tempestiva dos recursos destinados ao pagamento de precatórios: as regras que tratam sobre o
tema, previstas nos §§ 2o e 10 do art. 97 do ADCT da CF/88, continuam válidas e poderão ser utilizadas pelos
Estados e Municípios até 2020. 5. Expressão “índice oficial de remuneração básica da caderneta de
poupança” prevista no § 12 do art. 100: 5.1 Para precatórios da administração ESTADUAL e MUNICIPAL: o
STF disse que a TR (índice da poupança) poderia ser aplicada até 25/03/2015. 5.2 Para os precatórios da
administração FEDERAL: o STF afirmou que se poderia aplicar a TR até 31/12/2013. Após essas datas, qual
índice será utilizado para substituir a TR (julgada inconstitucional)??? (a) Precatórios em geral: IPCA-E. (b)
Precatórios tributários: SELIC. CNJ deverá apresentar proposta normativa que discipline (i) a utilização
compulsória de 50% dos recursos da conta de depósitos judiciais tributários para o pagamento de
precatórios e (ii) a possibilidade de compensação de precatórios vencidos, próprios ou de terceiros, com o
estoque de créditos inscritos em dívida ativa até 25.03.2015, por opção do credor do precatório. CNJ deverá
monitorar e supervisionar o pagamento dos precatórios pelos entes públicos na forma da presente decisão.
STF. Plenário. ADI 4357 QO/DF e ADI 4425 QO/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgados em 25/3/2015 (Info 779).

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