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TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO AMAZONAS

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PARECER - TRE-AM/PRES/SETRIB/SGP/COPES/SEATEC

PARECER N. 025/2023 – SEATEC/ COPES/ SGP

PROCESSO ADMINISTRATIVO N.: 0001217-55.2023.6.04.0001


SEI – Sistema Eletrônico de Informação

Unidade manifestante: Seção de Análise Técnico-processual - SEATEC

Assunto: Servidor requisitado.


Direitos e vantagens. Carreira. Enquadramento. Progressão.
Avaliação Periódica. Decreto do Município de Manaus n. 5503/2023.

Interessados: 1ª. Zona Eleitoral do Amazonas;


Sarah do Amaral Pereira, servidora.

Senhora Coordenadora,

A 1ª. Zona Eleitoral do Amazonas, por meio de ofício subscrito pela servidora investida na
função de chefe do respectivo cartório, Sarah do Amaral Pereira, noticia a publicação do Decreto n. 5503, da
Prefeitura de Manaus, no Diário Oficial do Município de 24 de fevereiro de 2023. Trata-se de ato normativo
editado para regulamentar a Avaliação Permanente de Desempenho dos servidores da Secretaria Municipal
de Educação, enquanto requisito obrigatório para progressão funcional.
Preocupada com a situação dos servidores requisitados para o serviço eleitoral, a signatária
pede providências a fim de evitar que sejam prejudicados tanto na carreira, quanto financeiramente. Sugere a
Chefe de Cartório que se indague à Secretaria Municipal de Educação a respeito.
Com vista dos autos, esta Seção de Análise Técnico-processual observa que o Decreto n.
5503, de 24 de fevereiro de 2023, correlaciona a percepção da vantagem remuneratória de produtividade, a
progressão funcional, de um padrão de vencimento para outro subsequente e a promoção funcional, de uma
classe para outra mais elevada, à Avaliação Permanente de Desempenho – APD, tal como predica a Lei
Municipal nº 1624, de 30 de dezembro de 2011.
O normativo estipula, todavia, que não será avaliado, sendo considerado "não habilitado",
entre outros, o servidor técnico-administrativo da educação municipal que se encontre em exercício perante
[1]
órgão ou entidade de outra esfera governamental. Assim, na prática, a legislação do município condiciona
a evolução na carreira dos servidores disposicionados para outros órgãos ou entes federativos à retomada
do exercício do cargo no âmbito da Secretaria Municipal de Educação.
Em face da similaridade, esta unidade técnica resgata as ponderações lançadas em caso
anterior, envolvendo a Lei n. 2556, de 18 de dezembro de 2019, promulgada pelo Município de Manaus, para
disciplinar o Plano de Cargos, Carreiras e Remuneração (PCCR) dos servidores públicos estatutários da área

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não específica do Poder Executivo.
Pois bem, à Justiça Eleitoral exclusivamente confiou a Constituição Republicana a atribuição
de, na salvaguarda da soberania popular e, portanto, da democracia, administrar as eleições, na forma
prescrita em lei complementar.
Nesta qualidade recepcionada pela vigente ordem constitucional, a Lei n. 4737, de 15 de
julho de 1965, conferiu aos tribunais regionais a prerrogativa de requisitar servidores federais, estaduais ou
[2]
municipais para auxiliar esta Justiça Especializada , arrematando que o serviço eleitoral prefere a qualquer
outro, é obrigatório e não interrompe o interstício de promoção dos funcionários para ele
[3]
requisitados
Corolário da primazia do serviço eleitoral é a garantia conferida aos servidores públicos de
outros órgãos ou entidade para ele requisitados sobre os direitos e vantagens inerentes ao exercício do
próprio cargo ou emprego, tal como assentado na Lei n. 6999, de 7 de junho de 1982, que disciplina a
[4]
requisição de pessoal por esta Justiça Especializada.
A par do caráter irrecusável de que se reveste o serviço eleitoral, não pode ser o servidor
retaliado por atuar em prol da jurisdição eleitoral, mormente no que respeita a progressão funcional na
carreira. Nesse sentido vale resgatar orientação do Tribunal de Justiça do Paraná, exarada nos autos do
Conflito de Jurisdição n. 1058709-6:

1) DIREITO ADMINISTRATIVO. PROGRESSÃO FUNCIONAL DE SERVIDOR. REQUISIÇÃO


DO TRE. NÃO INTERRUPÇÃO DO PRAZO DE PROGRESSÃO. PRECLUSÃO
ADMINISTRATIVA. INAFASTABILIDADE JUDICIAL. a) Nos termos do art. 365 do Código
Eleitoral, "o serviço eleitoral prefere a qualquer outro, é obrigatório e não interrompe o interstício
de promoção dos funcionários para ele requisitados". No caso de requisição e não cessão, não
há falar-se em interrupção do prazo, devendo o Município efetuar a respectiva progressão. b) O
fato de o direito não ter sido pleiteado nas vias administrativas não impede o seu
reconhecimento judicial, tendo em vista o princípio da inafastabilidade da jurisdição, através do
qual nenhuma lesão a direito poderá ser afastada da apreciação pelo Poder Judiciário (art. 5º,
XXXV, CF).2) DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO À PROGRESSÃO DURANTE O
TRÂMITE DO PROCESSO.MESMA RAZÃO DE DECIDIR. POSSIBILIDADE DE
CONCESSÃO.É possível o reconhecimento de direito às progressões funcionais, quando se
aplicam as mesmas razões jurídicas, que também não foram garantidas administrativamente
após o ajuizamento da petição inicial, sem que, para isso, seja necessário o ajuizamento de
nova Ação. Por decorrência do princípio da instrumentalidade das formas e da efetividade da
prestação jurisdicional substantiva, é possível projetar as mesmas razões.3) NEGADO
PROVIMENTO AO APELO DO MUNICÍPIO. DADO PROVIMENTO AO APELO DA
AUTORA.PREJUDICADO O REEXAME NECESSÁRIO.
(TJ-PR - CJ: 10587096 PR 1058709-6 (Acórdão), Relator: Leonel Cunha, 5ª Câmara Cível, Data
de Publicação: DJ: 1195 null)

O art. 10 do Decreto n. 5503/2023, editado pelo Município de Manaus, ao obstar a


progressão dos servidores que se encontram requisitados para justiça eleitoral, afronta as disposições do
Código Eleitoral e da legislação federal correlata que garantem a esses servidores os mesmo direitos e
vantagem que teriam pelo exercício do cargo no órgão de origem.
Do cotejo das disposições editadas pelo Congresso Nacional e as do Município, depara-se o
operador do direito com o que a doutrina convencionou denominar antinomia ou conflito aparente de normas.
Diz-se aparente o conflito, porque, a rigor, ambas as normas se revestem de validade e
legitimidade, tendo, portanto, eficácia em relação às hipóteses por elas regidas. A questão reduz-se em
delimitar a extensão desta eficácia, isto é, definir quais as hipóteses são alcançadas por cada uma das

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normas.
A solução do dilema, de certa forma comum no direito positivado, perpassa pelo critério
hierárquico, apoiado na doutrina de Kelsen que estrutura as normas do ordenamento jurídico elevando a
Constituição ao posto mais alto. Pode-se, igualmente, socorrer-se ao critério cronológico, segundo o qual a
norma mais recente prevalece sobre as mais antigas, porém, é o critério da especialidade, sobretudo, que
tem servido com maior frequência a dirimir situações semelhantes.
Por este último critério a norma especial prevalece sobre a geral. Este critério encontra-se
fundado no art. 2°, § 2° da Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro que assim prescreve: a lei nova,
que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei
anterior.
[5]
A célebre Professora Maria Helena Diniz esclarece :

“Uma norma é especial se possuir em sua definição legal todos os elementos típicos da norma
geral e mais alguns de natureza objetiva ou subjetiva, denominados especializantes. A norma
especial acresce um elemento próprio à descrição legal do tipo previsto na norma geral,
tendo prevalência sobre esta, afastando-se assim o bis in idem, pois o comportamento
só se enquadrará na norma especial, embora também seja previsto na geral.” (original sem
grifo)

Nesta esteira, o Tribunal Superior Eleitoral tem com veemência ratificado a especificidade
das normas eleitorais a respeito de requisição de servidores, mormente, a vista da correlação direta com
organização e realização de eleições livres.
O Excelentíssimo Ministro Dias Toffoli chegou a assentar que a Justiça Eleitoral, "mais do
que uma justiça especial, é especialíssima" de modo que "não só a sua legislação é especialíssima em face
das demais, mas até sua jurisprudência" (Pet 3.020/DF, Rei. Min. Aldir Passarinho).
Apreciando antinomia entre a normatização baixada pelo Conselho Nacional de Justiça e a
Resolução TSE n. 23.255/2010 o Colendo Tribunal Superior Eleitoral assim se manifestou:

PROCESSO ADMINISTRATIVO. REQUISIÇÃO E CESSÃO DE SERVIDORES NO ÂMBITO


DA JUSTIÇA ELEITORAL. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. ATUAÇÃO DIRETA
PERANTE TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL E INTERFERÊNCIA NA ADMINISTRAÇÃO
DAS ELEIÇÕES. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DA JUSTIÇA ELEITORAL.
PROCESSO RESOLVIDO.
I - A missão constitucional confiada à Justiça Eleitoral é a de garantir que a soberania popular
se manifeste da forma mais livre e democrática possível.
II - O Conselho Nacional de Justiça não tem competência para se imiscuir direta ou
indiretamente na administração das eleições em virtude da atribuição exclusiva que o Poder
Constituinte Originário confiou, privativamente, aos órgãos da Justiça Eleitoral.
III - As matérias que possuem disciplina específica na Justiça Eleitoral não se inserem na
competência do CNJ, de modo que não lhe incumbe regulamentá-las nem determinar sua
aplicação no âmbito desta Justiça Especializada.
IV - As requisições realizadas no âmbito da Justiça Eleitoral possuem regulamento próprio,
consubstanciado na Lei 6.999/1982 e na Resolução 23.255/2010 editada no exercício regular
da competência normativa da Justiça Eleitoral.
V - Processo administrativo resolvido.
(TSE. PA - Processo Administrativo nº 253374 - Brasília/DF. Acórdão de 26/08/2010. Relator:
Min. Enrique Ricardo Lewandowski.Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 220,
Data 17/11/2010, Página 14-15)

Outro exemplo que reforça esta posição vem do voto do Ministro Hamilton Carvalhido a
propósito de requisição formulada pela Defensoria Pública da União com base na Lei n 9020/95.

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O Voto do Ministro Hamilton Carvalhido, a quem coube a relatoria do feito, além de
expressar o entendimento do Ministro, expressa também o entendimento dos setores técnicos do TSE, ali
acolhido. Por sua relevância, faz-se oportuna sua transcrição:

“A questão encerra aparente conflito de normas no que diz respeito à cessão de servidor
público entre órgãos da Administração Federal.
De um lado tem-se a Lei no 9.020/95, que confere à Defensoria Pública da União a prerrogativa
de requisitar servidores de órgãos e entidades da Administração Federal, não podendo o órgão
de origem recusar tal pedido em hipótese alguma até que a Defensoria organize seu próprio
quadro.
De outro lado, tem-se a Lei no 6.999/82, que dá à Justiça Eleitoral prerrogativa semelhante,
especialmente durante o período eleitoral.
Entretanto, consoante ressaltam os órgãos técnicos desta Corte, as disposições contidas na Lei
n° 6.999/82, especialmente durante o período eleitoral, encerram norma especial, mesmo em
relação à Lei no 9.020/95, considerando o reduzido quadro de servidores desta Justiça
Especializada.
Averbe-se, em remate, que a letra do artigo 365 do Código Eleitoral não deixa dúvida quanto à
primazia do serviço eleitoral, senão vejamos:
‘Art. 365. O serviço eleitoral prefere a qualquer outro, é obrigatório e não interrompe o interstício
de promoção dos funcionários para ele requisitados.`

Esta é a mesma linha de raciocínio que orienta o presente parecer. Vez que as requisições
no âmbito da Justiça Eleitoral possuem regulamento especial, consubstanciado no Código Eleitoral e na Lei
6.999/1982, fica afastada para a hipótese dos autos as disposições que impedem a progressão de carreira
dos servidores da Secretaria Municipal de Educação a disposição deste órgão de justiça, adotadas pelo
Município de Manaus.
Firme neste entendimento, sugere-se seja oficiado o Poder Executivo do Município de
Manaus, para que promova a devida avaliação permanente de desempenho e permita a progressão na
carreira instituída pela Lei n. 1.624/2011, de cada um dos servidores da Secretaria Municipal de Educação
requisitados para o serviço eleitoral.
Protesta-se, ainda, no sentido de que, resistindo ou divergindo o Poder Executivo do
Município, sejam oficiados o Ministério Público e a Advocacia Geral da União, com fim de que adotem as
providências necessárias para preservar a prevalência do serviço eleitoral e a eficácia da legislação federal
específica.
É o parecer
Manaus (AM), 13 de março de 2023.

Marcos Freitas de Moraes


Assistente - Seção de Legislação e Normas

Mariene Soares Pessôa Linhares


Chefe da Seção de Legislação e Normas

[1]
Decreto n. 5503/2023 – Município de Manaus/AM:
Não será avaliado, sendo considerado "não habilitado", pela APD o servidor técnico-administrativo da educação municipal que:

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[...]

IV - afastado para:
a) servir em órgão ou entidade de outra esfera governamental;
[...]

[2]
Código Eleitoral:
Art. 30. Compete, ainda, privativamente, aos Tribunais Regionais:

[...]
XIII - autorizar, no Distrito Federal e nas capitais dos Estados, ao seu presidente e, no interior, aos juizes eleitorais, a requisição de funcionários federais, estaduais
ou municipais para auxiliarem os escrivães eleitorais, quando o exigir o acúmulo ocasional do serviço;

XIV - requisitar funcionários da União e, ainda, no Distrito Federal e em cada Estado ou Território, funcionários dos respectivos quadros administrativos, no caso de
acúmulo ocasional de serviço de suas Secretarias;
[...]
[3]
Código Eleitoral:
Art. 365. O serviço eleitoral prefere a qualquer outro, é obrigatório e não interrompe o interstício de promoção dos funcionários para ele requisitados
[4]
Art. 9º O servidor requisitado para o serviço eleitoral conservará os direitos e vantagens inerentes ao exercício de seu cargo ou emprego.
[5]
DINIZ, Maria Helena. Conflito de Normas. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 40. Citada em: http://jus.com.br/revista/texto/22752/as-antinomias-aparentes-no-
direito#ixzz2M7uxkrER .

Documento assinado eletronicamente por MARCOS FREITAS DE MORAES, Analista


Judiciário, em 13/03/2023, às 15:51, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006.

Documento assinado eletronicamente por MARIENE SOARES PESSOA LINHARES, Chefa


de Seção, em 14/03/2023, às 09:10, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006.

A autenticidade do documento pode ser conferida no site https://sei.tre-


am.jus.br/sei/controlador_externo.php?
acao=documento_conferir&id_orgao_acesso_externo=0 informando o código verificador
0000009690 e o código CRC 0CAB5EF4.

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Parecer - Requisitados. SEMED. Avaliação. Desempenho (0000009690) SEI 0001217-55.2023.6.04.0001 / pg. 5

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