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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MINAS GERAIS

BACHARELADO EM DIREITO – 9º PERÍODO NOTURNO 02/2022


DISSERTAÇÃO
DISCIPLINA: PROCESSO DO TRABALHO I
DOCENTE: PROF.ª DR.ª MAÍRA NEIVA GOMES
ANA PAULA SANTOS DE PAULA – 1405484

HONORÁRIOS PERICIAIS NA JUSTIÇA DO TRABALHO

Giovana Martins, em seu texto “Honorários do perito e a fragilização da proteção à


saúde” (2017) trata de alguns pontos que sucederam a “Reforma Trabalhista”. Com a
promulgação da Lei 13.467, de 13 de julho de 2017, diversos dispositivos da Consolidação
das Leis do Trabalho (CLT) foram alterados de modo prejudicial aos trabalhadores, que
tiveram suas garantias reduzidas e seus direitos fundamentais violados. No que se refere à
justiça gratuita, cabe salientar que anteriormente a supramencionada “reforma”, bastava uma
declaração do autor da causa, alegando que ele não poderia arcar com as custas processuais,
para que ocorresse a isenção. No entanto, após a implementação da Lei 13.468/2017, a justiça
gratuita passou a ser concedida apenas para trabalhadores que receberem salário igual ou
inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social
(RGPS) ou para aqueles que comprovarem insuficiência de recursos. Essa situação obsta o
acesso à justiça pela classe trabalhadora e causa interferência aos honorários periciais.
Quando o processo necessita de comprovação por meio de provas técnica, é realizada
a perícia a qual, na redação anterior, dada pela CLT (1943), no artigo 790-B, também estaria
abarcada na justiça gratuita. No entanto, com a nova redação do referido artigo, alterou-se a
expressão “salvo se” para “ainda que”, de modo que independentemente de ter alcançado a
gratuidade, a parte sucumbente deverá arcar com os custos da perícia.
Conforme disposto no artigo, “Art. 790-B. A responsabilidade pelo pagamento dos
honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, ainda que
beneficiária da justiça gratuita. (Redação dada pela Lei nº 13.467/2017)”. Desse modo, os
trabalhadores serão desestimulados a ingressar com reclamações trabalhistas às quais têm
direito (como a indenização por acidente de trabalho), pois precisarão arcar com os custos de
honorários periciais, ainda que se beneficiem da justiça gratuita e não tenham condições.
Ademais, o §1º do supramencionado artigo fixa um valor máximo a ser pago aos
peritos, mas não estabelece um valor mínimo, o que também prejudica os trabalhadores, e
mesmo os peritos que irão receber. Nesse sentido, o reclamado tem o a possibilidade de
parcelar o pagamento, mas isso traz prejuízos ao perito que irá receber (§2º) e, além disso, o
§3º prevê que o juiz não pode exigir adiantamento do valor, contudo, muitos peritos só
trabalham mediante pagamento prévio. Tudo isso incide negativamente na realização de
perícias e na própria vida do cidadão enquanto trabalhador. Assim sendo, infere-se que a
“Reforma” Trabalhista somente tolheu as garantias que deveriam ser asseguradas à classe
trabalhadora. Nas palavras de Martins:
[...] a “Reforma” Trabalhista não cuida de disciplinar com vistas a um ambiente de
trabalho salubre, equilibrado, mas pretende impedir ações judiciais instituindo o
pagamento dos honorários do perito ao Trabalhador e à trabalhadora como forma de
obstar o seu acesso à justiça, tendo em vista os elevados custos processuais e dos
honorários periciais (MARTINS, 2017, p. 522).

Nesse sentido, um dos problemas é que os trabalhadores se tornam cada vez mais
vulneráveis: a sua saúde e a sua segurança ficam fragilizadas devido aos custos de se ajuizar
uma ação e às dificuldades de se conseguir a justiça gratuita e, mesmo quando ela é
assegurada, devem ser pagos os custos da perícia, impedindo os cidadãos de buscarem seus
direitos, ainda que o Brasil seja um dos países onde mais ocorrem acidentes de trabalho
(MARTINS, 2017).
Ora, se uma pessoa não pode arcar com os custos processuais, tampouco pode fazê-lo
em relação aos custos periciais. Todas essas alterações da Lei 13.467/2017 ferem princípios
constitucionais, violando os artigos 1º, III e IV; 3º, I e III; 5º caput, XXXV e LXXIV, da
Constituição Federal. O referido artigo, portanto, apresenta inconstitucionalidade material e
vai de encontro à gratuidade da justiça e ao princípio da isonomia. Para analisar a questão de
forma pormenorizada, foram pesquisados acórdãos que tratam da temática:

JUSTIÇA GRATUITA. COMPROVAÇÃO. ART. 790, §§ 3º E 4º DA CLT.


Após a entrada em vigor da Lei nº 13.467/17, a apresentação de declaração de
hipossuficiência econômica pela parte que perceba salário igual ou superior a 40%
(quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do regime Geral de
Previdência Social é insuficiente para o deferimento da justiça gratuita. À parte cabe
juntar aos autos documentos que comprovem tal condição sobre pena de
indeferimento do benefício.

No acórdão 78.2018.05.04.0271, cujo redator foi o Desembargador Emílio Papaleo


Zin, julgado pela 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª região (TRT-4), em 14 de
junho de 2020, o reclamante entrou com recurso, pois não havia conseguido o acesso à justiça
gratuita. Isso porque, o último salário que constava em sua Carteira de Trabalho estava um
pouco acima do 40% do limite máximo dos benefícios do RGPS, porém, ele havia ficado
desempregado e não tinha condições de arcar com os custos processuais. Ainda assim, na
primeira instância, alegaram que seria necessário comprovar sua hipossuficiência devido às
mudanças ocorridas no art. 790-B da CLT. O recurso foi provido pelo TRT da 4ª região, e o
recorrente conseguiu o acesso à justiça gratuita.
Quanto aos custos da perícia, mais recentemente, em dezembro de 2022, a 1ª Turma
do Tribunal Superior do Trabalho (TST), cujo redator foi o Ministro Luiz Jose Dezena da
Silva, foram julgados procedentes os embargos de uma trabalhadora que requereu gratuidade
no pagamento dos honorários periciais, por ser ela beneficiária da justiça gratuita.

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. HONORÁRIOS PERICIAIS.


RECLAMANTE BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA. EFEITO
MODIFICATIVO. Verificado a omissão no julgado, no que concerne ao pedido de
exclusão dos honorários periciais, passa-se ao exame da questão, para, assim, sanar a
omissão perpetrada. Embargos de Declaração conhecidos e providos, com efeito
modificativo. RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO NA VIGÊNCIA DA
LEI N.º 13.467/2017. HONORÁRIOS PERICIAIS. RECLAMANTE
BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA. É certo que o Supremo Tribunal
Federal ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 5766, julgada pelo
Tribunal Pleno, em 20/10/2021, declarou a inconstitucionalidade do artigo 790-B,
caput, da CLT. O dispositivo autorizava a cobrança dos honorários periciais da parte
sucumbente na pretensão objeto da perícia, ainda que beneficiária da justiça gratuita.
Desse modo, sendo inconstitucional o referido dispositivo, é incabível a condenação
de litigante beneficiário de justiça gratuita ao pagamento de honorários periciais. In
casu, o Regional conferiu a reclamante o benefício da justiça gratuita e determinou
que os honorários periciais devem ser suportados pela então Recorrente, decidindo,
portanto, em desconformidade com o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal
Federal. Recurso de Revista conhecido e provido" (ED-RR-1002197-
19.2017.5.02.0038, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT
02/02/2023).

Do mesmo modo, no Recurso de Revista, julgado em dezembro de 2022, pela 2ª


Turma do TST, cuja Relatora foi a Ministra Margareth Rodrigues Costa, deferiu-se o recurso
de isenção do pagamento dos honorários periciais por reclamante beneficiária da justiça
gratuita:

RECURSO DE REVISTA - HONORÁRIOS PERICIAIS - RECLAMANTE


BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA.
O Tribunal Regional do Trabalho manteve a sentença que condenou a parte
beneficiária da justiça gratuita ao pagamento de honorários periciais, com
fundamento nos arts. 790-B, caput e § 4º, da CLT.
2. O Supremo Tribunal Federal, no entanto, ao julgar a ADI 5766/DF, em
20/10/2021, declarou a inconstitucionalidade dos arts. 790-B, caput e § 4º, e 791-A,
§ 4º, da CLT, afastando a possibilidade de condenação do beneficiário da justiça
gratuita ao pagamento de honorários periciais.
3. Sendo assim, merece reforma a decisão recorrida, na medida em que a decisão
proferida em sede de controle concentrado de constitucionalidade tem eficácia
contra todos e efeito vinculante, nos termos do § 2º do art. 102 da Constituição
Federal.
4. Com relação aos honorários periciais, sendo a reclamante sucumbente no objeto
da perícia e beneficiária da justiça gratuita, está isenta do seu pagamento, devendo
os honorários periciais ser arcados pela União, nos moldes da Resolução nº 66/2010
do CSJT e da Súmula nº 457 do TST.
Recurso de revista provido. (RR-1001207-15.2019.5.02.0052, 2ª Turma, Relatora
Desembargadora Convocada Margareth Rodrigues Costa, DEJT 19/12/2022).

Graças à Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 5766, do Supremo Tribunal


Federal (STF), alguns trechos da CLT que tinham sido alterados pela “Reforma” trabalhista
foram considerados inconstitucionais. Em 03 de maio de 2022, o acórdão referente à ADI foi
publicado, modificando as condições de pagamento. Atualmente, o beneficiário da justiça
gratuita que obtiver créditos em juízo, deverá arcar com os honorários periciais, se tais
créditos forem capazes de suportar a despesa; caso contrário, os honorários serão pagos pela
União (BRASIL, STF, 2022). Espera-se que, assim, possam ser minimizados alguns dos
impactos negativos advindos com a “Reforma” Trabalhista, sobretudo para a classe
trabalhadora.

REFERÊNCIAS:

BRASIL. Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT. Decreto-Lei n. 5.452, de 1º de maio de


1943. Disponível em: < https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-
lei/Del5452compilado.htm>.

BRASIL, Supremo Tribunal Federal – STF. Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI


5766. Disponível em: <https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5250582 >.
Acesso em fev. 2023.

BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho – TST. ED-RR-1002197-19.2017.5.02.0038, 1ª


Turma, Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT 02/02/2023. Disponível em:
<https://jurisprudencia.tst.jus.br/>. Acesso em fev. 2023.

BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho – TST. RR-1001207-15.2019.5.02.0052, 2ª Turma,


Relatora Desembargadora Convocada Margareth Rodrigues Costa, DEJT 19/12/2022.
Disponível em: <https://jurisprudencia.tst.jus.br/#12de09169983632fe704cb4812556372>.
Acesso em fev. 2023.

JUSBRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 4ª região – TRT4. Recurso Ordinário


Trabalhista 78.2018.5.04.0271, 14/06/2020. Disponível em:
<https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt-4/860989838/inteiro-teor-860989848>.
Acesso em: fev. 2023.
MARTINS, G. L. Honorários do perito e a fragilização da proteção à saúde. In: SOUTO
MAIOR, J. L.; SEVERO, V. S. (org.). Resistência ? Aportes teóricos contra o retrocesso
trabalhista. São Paulo: Expressão Popular, 2017 , p. 511-518.

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