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EXPERIMENTAÇÃO PROJETUAL: UMA ALTERNATIVA NO

ENSINO DA GESTÃO DE DESENVOLVIMENTO DE PRODUTOS

Luis Carlos Paschoarelli


Depto. de Desenho Industrial - FAAC/UNESP-Bauru

Claudemilson dos Santos


Depto. de Artes e Representação Gráfica -FAAC/ UNESP - Bauru

Abstract: The teaching of product development activity is one of the main characteristics of graduating
course in design. Disciplines as "Design Methodology" and "Product Design Development" show specifics
design tools, aim only a technical graduate. New market demand have created the need of "Design
Experiment" yet during the professional formation procedures, include specially the design management.
Therefore, joined to disciplines previously quoted, had intended a activity such as, with a student team from
design graduation college. The work methodology had expanded the formal contents of disciplines,
characterizing itself for a "Interdisciplinary" process, aim mainly the integration and a chance of students to
manage all process of product development. A project problem was defined starting from explicit need from
neighbor community; and through a briefing and cronograma, establish itself a manage simulation of product
development. Some work team had defined specific concepts and results were respected satisfactory,
specially for realize in way of prototypes, give possibility for the integrate from students to professional
reality. The experiment confirm the interdisciplinary importance such as design manage seeing of design
graduation course.

Palavras chave: ensino, design de produtos, gestão de projetos, interdisciplinaridade.

Tema: Engenharia de Produto / Processo

1. Introdução
As áreas de conhecimento das engenharias, concentram disciplinas cujo objetivo e
objeto de estudos são as técnicas e as tecnologias, destacando-se como sub-área o
desenvolvimento de produtos.
Historicamente, este desenvolvimento de produtos vem agregando novas demandas,
enfatizadas principalmente pela interface entre o produto final e toda a sociedade
(envolvendo tanto consumidores como usuários). Esta reorganização possibilitou ao
desenvolvimento de produtos tornar-se objeto de outras sub-áreas do conhecimento,
incluindo o Desenho Industrial, aqui descrito como Design.
Desde a Bauhaus - no início do século XX - o Design apresenta como objetivo,
desenvolver produtos equacionados a partir de quatro principais características: a
funcionalidade (incluindo a usabilidade, ou interface física entre homem e produto); a
estética (incluindo a semântica, ou interface cognitiva entre homem e produto); a
reprodutibilidade técnica (conceituada pelo intercâmbio produto/produção industrial); e a
inovação (caracterizada pelos aspectos diferenciais dos produtos num mercado de capital
aberto).
Neste sentido, o Design segue metodologias próprias de desenvolvimento de produtos,
que normalmente - por suas características intrínsecas - ignoram a gestão do projeto,
atribuindo esta atividade à engenharia do produto.
Esta limitação atribuída ao designer - profissional formado em design - cria restrições
de ordem organizacional junto a equipe de desenvolvimento de projetos, dificultando sua
interação neste processo, bem como sua inserção no mercado de trabalho.
Uma alternativa para este problema apresenta-se relacionada à formação profissional
deste sujeito, a qual deve basear-se em atividades e exercícios da metodologia de projeto,
considerando também a gestão deste projeto.
Este artigo pretende demonstrar a importância da gestão do projeto nas atividades do
desenvolvimento de produto; demonstrada a partir de uma atividade prática de ensino de
projeto de produtos, então denominada como Experimentação Projetual.

2. Desenvolvimento
Os cursos de graduação em Design no Brasil, caracterizam-se em sua maioria, por
uma estrutura curricular multidisciplinar, onde são encontradas disciplinas das ciências
tecnológicas (p.e. materiais industriais, processos de produção, economia, computação
gráfica, entre outras); das ciências humanas (p.e. sociologia, antropologia, marketing e
outras); das artes (p.e. meios de representação gráfica e/ou tridimensional, estética e
outras); e ultimamente até das ciências biológicas (incluindo ai a ecologia); todas elas
subsidiando as disciplinas de metodologia e desenvolvimento de projetos de produtos.
Estas últimas, são consideradas o núcleo de formação do futuro profissional em
design, entretanto, normalmente contemplam apenas aqueles aspectos operacionais do
projeto (métodos e ferramentas), desconsiderando a organização estratégica do
desenvolvimento do produto.
Segundo MAGALHÃES (1995), este aspecto é problemático para a formação e
(portanto) atividade do designer, uma vez que há uma significativa distinção entre "Design
operacional" - o qual limita-se às atividades descritas em quaisquer metodologias de
projeto de produto - e o "Design estratégico".
Neste sentido, MAGALHÃES (fundamentado em diversas outras referência teóricas)
destaca que é "... necessário acrescentar ao corpo de conhecimentos que habilitam o
designer formado em projeto do produto, informações que contribuam para a capacitação
da sua atuação de modo "estratégico", complementando sua formação "operacional".
Entende-se como design estratégico, uma forma de atuação deste profissional,
disciplinada para a gestão do design nas empresas...", que em suma, podemos considerar
como gestão do projeto.
Assim, constata-se que o ensino de metodologia e desenvolvimento de projeto de
produto não devem limitar-se ao denominado design "operacional", mas abranger também
o design "estratégico".
Um interessante modelo de gestão de desenvolvimento de produto é apresentado por
WHEELWRIGHT and CLARK (1992), através do que se denomina "Funil de
Desenvolvimento", e que BAXTER (1998) irá denominar como "Funil de Decisões".
O Funil de Desenvolvimento "ideal" de WHEELWRIGHT and CLARK, caracteriza-
se por uma estrutura com três fases básicas e distintas, intercaladas por dois filtros também
próprios (Figura 01).
Figura 01 - Funil de Desenvolvimento (adaptado de WHEELWRIGHT and CLARK, 1992).

Nota-se que através do Funil de Desenvolvimento podem ser identificadas elementos e


características da metodologia clássica de projeto; então considerados instrumentos
gerenciais de projeto; e não apenas tópicos de uma atividade estritamente técnica. Desta
maneira, a integração entre Funil de Desenvolvimento e metodologia clássica de projeto,
pode corresponder a uma circunstância própria de gestão e ação de projeto, que o designer
tanto necessita para adequar-se as necessidades do mercado.
Por fim, considera-se que a atividade prática desta situação - aqui denominada de
Experimentação Projetual; e proposta enquanto atividade didática no ensino de Design -
pode ser uma interessante alternativa para a formação deste profissional.

3. Metodologia
A Experimentação Projetual aqui apresentada, caracteriza-se como uma atividade
acadêmica - já que é experimental - onde o desenvolvimento de produto é destacado,
objetivando complementar a metodologia do projeto com aspectos e considerações de sua
gestão.Particularmente, esta Experimentação Projetual caracterizou-se como uma
atividade desenvolvida junto aos alunos do curso de graduação em Desenho Industrial, da
Faculdade de Tecnologia de Birigüi (Birigüi - SP).
O total de alunos envolvidos no experimento foi em número de 24 (vinte e quatro),
divididos em 8 (oito) equipes de projeto, todos matriculados no segundo semestre de 2000,
nas disciplinas "Desenvolvimento do Projeto de Produto III" e "Metodologia do Projeto I",
ambas do terceiro ano; cujo objetivo da primeira foi o desenvolvimento de um
equipamento de transporte; e da segunda, a apresentação de ferramentas metodológicas
para o projeto de produto.
Esta interdisciplinaridade foi decisiva para a efetivação da Experimentação Projetual,
uma vez que o tempo de atividade pôde ser melhor distribuído dentro das 8 horas/aula
semanais; dois professores estiveram disponibilizados para a orientação dos grupos de
trabalho, ambos concentrados num mesmo objetivo; e a utilização dos espaços de
atividades (sala de aulas e oficinas de projeto) que puderam ser amplamente explorados.
Ao final do primeiro semestre de 2000, os alunos já haviam recebido todo o conteúdo
programático sobre metodologia do projeto, assim como todo o conceito, discussão e
demonstração de exemplos de gestão de projeto e sua relação com o desenvolvimento de
produto, demonstrados a partir do Funil de Desenvolvimento, anteriormente descrito. Estes
alunos foram então consultados sobre o interesse em participar da atividade da
Experimentação Projetual, a qual foi plenamente aceita. O Problema projetual, bem como
o briefing inicial, o cronograma de trabalho e os objetivos do mesmo só foram
apresentados aos alunos na primeira semana de aula do segundo semestre.
O briefing apresentado continha todas as informações preliminares do projeto,
consideradas relevantes para o desenvolvimento, porém apresentava um caráter genérico
do problema, já que os grupos de trabalho necessitariam retornar às bases do mesmo,
visando a compreensão das necessidades. O briefing foi baseado em modelo proposto por
STRUNCK (1999) com conteúdo igual para todos os grupos de trabalho, e foi
caracterizado pelos tópicos a seguir:

 Tema: Veículo de Transporte Individual Urbano;


 Objetivo: Desenvolver um produto de acordo com o tema e viável em termos
econômicos, ecológicos e técnicos, proporcionando uma alternativa de transporte para
a comunidade local (o perímetro urbano de Birigüi - SP, apresenta uma topografia
plana, o que favorece a força motriz muscular aplicada em meios de transporte
individual);
 Conceito do produto: Sistema individual de locomoção urbana em percursos médios,
composto basicamente pelos sub-sistemas - Suporte, Controle, Interfaces, Estrutura;
 Diferencial a ser explorado: Utilização criativa de novos conceitos de produto,
inexplorados pela indústria deste segmento;
 Concorrência direta e indireta: Caracterizados por todos que convergem para um
mesmo objetivo (outras equipes de projeto) e por produtos de desta natureza, que
atendem às mesmas necessidades;
 Perfil do Mercado: Públicos compostos por jovens e adultos, com atividades normais
da vida diária. A estratégia de venda foi definida por marketing direto, ou seja, sem
intermediários entre o produtor e o consumidor, com vendas efetuadas através de
telemarketing, Internet e outros.
 Instruções Específicas / Obrigatoriedades: Também compreendida por requisitos de
projeto, subdividem-se em requisitos técnicos, de mercado, de uso, ecológico e legal.
Partes destes requisitos foram considerados obrigatórios e fornecidos aos alunos.
Outros foram pesquisados por eles e seu grau de obrigatoriedade foi definido por uma
escala hierárquica de importância.

Como método (operacional) de projeto indicou-se aquele proposto por


PASCHOARELLI, VENTURA e AVENDAÑO (1998). Possibilitou-se que este método
operacional de projeto fosse readequado pelas equipes - de acordo com as necessidades e
limitações de cada uma - visando organizar um cronograma de trabalho, considerando o
período de 15 semanas letivas para a efetivação das atividades e apresentação dos
resultados, na forma de um protótipo e de um relatório de projeto

4. Resultados
A maioria dos projetos desenvolvidos com esta atividade atingiu os objetivos
propostos. Apenas um foi considerado falho, uma vez que os resultados finais foram
insatisfatórios - e cuja razão acredita-se estar no âmbito técnico, já que as diretrizes do
projeto desconsideraram o conceito de gestão, então demonstrado nas atividades dos
demais grupos.
Além da qualidade formal (estética), funcional e da possibilidade de produção -
características mínimas que atenderiam aos parâmetros convencionais da metodologia do
projeto - constatou-se que os demais grupos de trabalho envolveram conceitos e ações de
gerenciamento no desenvolvimento de seus projetos; entretanto dois deles se destacaram e
podem servir de modelo para demonstrar tanto a qualidade dos resultados finais (o produto
e/ou seus conceitos), como a inserção das noções de gestão de projeto em seu
desenvolvimento.

4.1. O desenvolvimento do "Skatenete TALT"


Ao receber o briefing inicial e participar das discussões sobre gestão do projeto e sua
influência no desenvolvimento de produto, um dos grupos de trabalho percebeu a
possibilidade de desenvolver um produto que contemplasse duas funções: a de locomoção
individual, então possibilitada por um "patinete"; e a de lazer (ou esporte), então
possibilitada por um "skate".
Esta idéia - ou conceito de produto - não demonstrou-se inédita, entretanto a equipe de
trabalho notou que o mercado deste gênero de produto oferecia poucas alternativas; e estas
não satisfaziam o caráter de inovação que um produto necessita para conquistar e
estabelecer-se no mercado.
Após verificar todas as possibilidades de desenvolvimento e a partir de uma série de
fatores limitantes, a equipe definiu um conceito único de produto, apresentado inicialmente
na forma de sketches (ilustrações rápidas); e em seguida, na forma de um mock-up em
madeira.
Com estes elementos as discussões se concentraram na solução de problemas pontuais
(sistemas de frenagem, sistemas de intercambialidade, aplicação de componentes,
processos de produção, fornecedores de matéria prima, entre outros); sempre considerando
outras alternativas (conceitos de produtos) que poderiam ser desenvolvidos, caso a
proposta principal necessitasse, por algum motivo, ser "abortada".
Enfim, ao considerar novamente todos os requisitos de projeto, verificou-se que o
conceito de "skatenete", poderia ser uma alternativa viável, necessitando somente ser
focado como elemento estratégico.
Assim, desencadeou-se o processo de especificação do projeto técnico, possibilitando
a confecção de um protótipo (Figuras 02 e 03 ), onde puderam ser avaliados alguns
critérios mais específicos, como por exemplo a usabilidade física.

Figura 02 - Sistema de engate rápido usando entre a barra de apoio / prancha,


possibilitando a fácil intercambialidade patinete / skate.

Os resultados finais foram considerados satisfatórios, já que um novo desenho para um


"skatenete" foi proposto, satisfazendo os aspectos clássicos do Design (produção em série,
funcionalidade e semântica estética), além da interação na atividade de projeto por parte
dos alunos, os quais não compreenderam a atividade apenas como um exercício
operacional do projeto; mas responsabilizaram-se com o gerenciamento do mesmo.
Figura 03 - Protótipo do skatenete "Talt" sendo utilizado.

4.2. O desenvolvimento da bicicleta Grasshopper


O desenvolvimento do projeto da bicicleta Grasshopper pode ser considerado um
exemplo interessante da Experimentação Projetual, uma vez que o conceito do produto foi
estabelecido somente após a apresentação dos conteúdos de metodologia e gestão de
projeto, entretanto, diferenciando-se dos demais, já que objetivou um "desenho" realmente
diferenciado para um equipamento de transporte individual (no caso, uma bicicleta), que
reunisse todas as características positivas dos similares do mercado.
Aqui também foram levantadas e discutidas todas as informações necessárias para a
criação de novos conceitos, além da especificação de critérios de avaliação que
subsidiariam os filtros do "funil de desenvolvimento". Através de sketches, alguns
conceitos foram criados e destes, selecionado um que serviu de base para a confecção de
um modelo em escala (Figura 04), possibilitando assim, uma segunda avaliação; e portanto
um conceito final, onde destacou-se principalmente o redesenho do "quadro".
O projeto gráfico foi sendo desenvolvido concomitante os parâmetros técnicos e de
produção possibilitando a confecção de um protótipo (Figuras 05, 06 e 07).
Figura 04 - Modelo em escala (1:10) da bicicleta "Grasshopper".

Figura 5 - Protótipo do "quadro" da bicicleta "Grasshopper". Componente cuja


interferência do desenho foi decisiva para as inovações do produto.

Como resultado final, a equipe apresentou um novo desenho de bicicleta, com um


protótipo confeccionado em alumínio, cujas características técnicas (peso, resistência e
funcionalidade) superaram as similares encontradas no mercado, percebendo que a
Experimentação Projetual pode ser uma alternativa satisfatória, mesmo se os objetivos de
projeto forem principalmente a inovação formal (estética).

Figura 06 - Protótipo final da bicicleta "Grasshopper".


Figura 07 - Protótipo da bicicleta Grasshopper em uso.

5. Considerações Finais
O desenvolvimento de produtos é uma das principais características das atividades do
Designer, mas sua gestão é pouco discutida (senão desconsiderada) no ensino de graduação
deste profissional. Entretanto, constatando-se sua importância para o sucesso do projeto,
propôs-se uma Experimentação Projetual, como alternativa de gestão de projeto, no ensino
de desenvolvimento de produto.
Após apresentar os conceitos da gestão do projeto e orientar uma atividade deste
gênero, junto aos alunos de um curso de graduação em Design, obteve-se resultados
considerados satisfatórios, tanto no que refere ao Design dos produtos apresentados,
quanto que na conscientização da importância desta gestão.

6. Agradecimentos
Agradecimentos aos alunos do curso de graduação em Design da Faculdade de
Tecnologia de Birigüi, que aceitaram o desafio de desenvolver os projetos de
equipamentos de transporte individual, a partir da proposta aqui apresentada; e que
alcançaram os surpreendentes resultados.
O skatenet "Talt" foi desenvolvido pelos alunos: Armstron de Carvalho Zanata, Cleuza
Cristina da Silva Cardoso, Leandro Contel Careta e Tânia Cristina Batista, os quais detém
a propriedade intelectual e industrial do produto. A bicibleta "Grasshopper" foi
desenvolvida pelos alunos André Rocha Galdeano, Flávio Buri Rosin e Francis Martins de
Souza, os quais também detém a propriedade intelectual e industrial do produto.

5. Referências bibliográficas
1. BAXTER, Mike. Projeto de Produto: guia prático para o desenvolvimento de novos
produtos. Tradução: Itiro Iida. São Paulo, Edgard Blücher, 1998. 261p.
2. MAGALHÃES, C. Design Estratégico: integração e ação do design industrial.
Estudos em Design, Rio de Janeiro, v. 03, n. 01, p:15-27, 1995.
3. PASCHOARELLI, L.C.; VENTURA, A; AVENDAÑO, L.E.C. O conhecer e a
prática do design: algumas considerações sobre metodologia do projeto. In: III
Congresso Brasileiro de Desenvolvimento e Pesquisa em Design, Rio de Janeiro, Anais
P&D Design 1998, p: 403-412.
4. STRUNCK, G. Viver de design. 2AB, Rio de Janeiro, 1999.
5. WHEELWRIGHT, S. C. and CLARK, K. B. Revolutionizing product development:
quantum leaps in speed, efficiency and quality. New York, Free Press, 1992.

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