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CAM & KYLE

CENA BÔNUS
Penelope Douglas
KYLE
Vicodin realmente é a pílula mais agradável. Oxi é pequeno, não dá para saber
realmente se você engoliu, e morfina não desce com facilidade. Sempre achei as cápsulas
grudentas.
Mas Vicodin, com sua forma alongada e suave, é como o primeiro gole de licor. Você
ainda não está sentindo os efeitos, mas apenas a promessa do que virá é um conforto.
Coloco as três pílulas que estão na minha palma de volta para o frasco e rapidamente o
fecho, sacudindo perto do ouvido. Minha cabeça relaxa com o som familiar das cápsulas do
lado de dentro e meu estômago estremece quando devolvo os remédios para o bolso da calça,
todas as trinta doses ainda presentes e contabilizadas.
Desligo o carro e seguro a maçaneta, mas paro e levanto a mão, vendo um pouco de
pó branco ali.
Tento engolir, mas minha boca está seca demais.
— Foda-se — rosno e coloco a mão na boca, lambendo o pó como a porra de um
viciado.
Abro a porta, desço e tiro a gravata, jogando-a para dentro do carro antes de abrir os
dois primeiros botões do colarinho, tentando respirar. Nunca sei onde o dia me levará, então
comecei a usar ternos pretos em todo lugar. Eu pareço estar na máfia em vez de um cartel
respeitável.
Bato a porta, tranco o carro e vou em direção às portas, os gritos e aplausos escapando
pelas paredes sem janelas do estabelecimento de teto alto.
The Hook. Um clube de strip modesto localizado no meio do nada. Em um trecho
solitário da estrada. Longe das pré-escolas e escolas primárias. Fora de vista do novo conjunto
habitacional com famílias que fazem trilhas de bicicleta e dos parques para cães.
— Sabe que temos vários desses em Chicago, né? — uma voz chama, mas eu
reconheço antes mesmo de olhar para cima.
Encontro o olhar de Anthony, seus dois seguranças ao seu lado como paredes de
tijolos.
— E temos vários desses aqui também — digo, abrindo a porta. — Você vai gostar
daqui. A cidade pequena vai encantá-lo. E agora está mais segura.
— Hmmm — grunhe, entrando na minha frente. — Provavelmente você está certo.
Sei que estou. Chicago está quente demais agora. Para nós dois.
Max Haverstein nos recebe na porta.
— Como estão? — pergunta.
Aceno, passando pelo segurança em direção ao clube. Um rock soa, a voz de uma
mulher cheia de blues cantando pelos alto-falantes e vibrando debaixo dos meus pés, aquela
mesma pequena onda de endorfina me saudando sempre que entro aqui.
Talvez seja quão alta está a música. Talvez seja o ar, perfumado para encobrir o álcool
e o suor. Talvez seja a escuridão, as luzes rosa neon ao redor do palco e os pontos de luz sobre
nossas cabeças que quase não chegam às cadeiras e cabines de couro lá embaixo.
Talvez seja a pele.
É como se aqui fosse uma caverna e eu posso ser quem eu quiser quando ninguém
está olhando.
— Oi. — A voz doce e sonora de Kitty me acaricia tão gentilmente quanto sua mão
deslizando pelo meu pescoço.
Passo o braço por sua cintura nua, pressionando a bochecha na dela.
— Preciso de uma bebida — digo, em seu ouvido.
Ela sorri, as anteninhas no topo da sua cabeça adornadas com pequenos trevos por
conta do St. Patrick’s Day1 balançando para frente e para trás. Ela pega o cartão de crédito que
jogo em sua bandeja antes de colocar uma garrafa de uísque e dois copos. É provavelmente
uma boa ideia estar aqui, de todo jeito. Chicago durante este feriado é uma festa maior do que
consigo aguentar agora.
— Não é tão ruim — Santaro grita por cima da música. Destiny se aproxima, sua pele
bronzeada e as curvas que preenchem o biquíni de veludo rosa sem problemas. Ele sorri para
ela, deslizando o braço em sua cintura. — Como esse lugar paga por garotas tão bonitas? —
pergunta para mim.
Mas ainda não me olha.
Fácil, penso comigo mesmo, mas não tenho paciência para tentar gritar por cima da
música. Esse é o único clube em um raio de oitenta quilômetros. Mick procura carne quente
em seis cidades, e belas garotas completam vinte e um anos todos os dias. Ou pelo menos é o
que suas identidades falsas dizem.
— Mas eu sei quem vocês vieram ver! — o DJ grita no microfone. — Agitem os trevos e
comemorem, porque vocês estão com sorte, rapazes!
Gritos surgem, uivos enchem a sala.
— É a… — arrasta as palavras. — Ha-lo!
Os pelos em meu braço se arrepiam, aplausos começam junto da música, Tainted Love,
do Marilyn Manson, soando pelo sistema de áudio enquanto um corpo entra em minha visão
periférica. A batida enche meu peito e leva um momento, mas, finalmente, olho para cima e
encontro o centro do palco.
Cameron Hadley, conhecida como Halo aqui, pisa no palco como se o mundo inteiro
estivesse aqui por ela. Seus olhos hipnóticos e sorriso travesso sempre mostram a confiança de
uma mulher adulta, mas ela tem apenas vinte e quatro anos. Enquanto eu preciso de álcool —
ou qualquer outro tipo de ajuda — para ser eu mesmo, aos meus trinta e cinco anos.
Ela domina o lugar. Sem nenhum percalço. Joga o cabelo, arqueia o corpo, os passos
acompanhando a batida, completamente em sintonia enquanto desliza de costas, empurra os
quadris para cima e bate no chão duas vezes. Gira ao redor da barra de pole dance, um
aplauso ensurdecedor ecoando enquanto os chifrinhos verdes de diabo brilham sobre os
holofotes, os cabelos castanhos descendo por suas costas. Ela sobe mais alto, sua pele
dourada e tonificada contra a tanga de couro preta e o top de malha preta com transparência.
A parte de cima do biquíni verde com lantejoulas fica visível por baixo.
Descendo em um espacate, a bunda virada para o público, ela se move com a música
enquanto dinheiro é jogado no palco.
E, por um momento, fico maravilhado. Há uma razão para ela ser a atração mais
popular.

1
O Dia de São Patrício é um feriado celebrado em 17 de março. O santo é o padroeiro da
Irlanda. Por conta da enorme comunidade irlandesa em Chicago, o feriado também é
comemorado na cidade.
Dando uma olhada pela barra em suas costas, ela me vê aqui embaixo. Seus olhos
escurecem contra a maquiagem preta do olho e ergue o queixo, parecendo muito poderosa.
Mais poderosa que eu.
Mas sabemos a real, né, baby? Gesticulando com os dedos, faço um gesto para ela.
Outras dançarinas entram no palco e ela faz seu caminho para mim, descendo as escadas.
Encaro-a, o glitter que pensei ver em seus lábios não estava mesmo lá. Eles estavam
apenas brilhando.
Passo um braço por sua cintura.
— Essa é a Halo — aviso para Anthony. Em seguida, inclino-me para Cam. — Preciso
que você o amacie enquanto conversamos.
Seus olhos flamejam para os meus por uma fração de segundos antes de se mudarem
para ele sem hesitar. Ela lambe os lábios com uma sugestão de sorriso enquanto Santaro se
aproxima, deixando Destiny para trás.
— Halo — diz, beijando as mãos dela enquanto os olhos disparam para os chifres em
sua cabeça. — Você é uma santa?
Ela desliza a mão pela lapela de seu terno bege e de sua camisa preta por baixo.
— Vou fazer você ver a Deus — promete, pegando sua mão.
Puxando-o junto com ela, eu sigo, pegando a garrafa na mesa.
— Jesus, porra… — Ele me olha por cima do ombro. — Você não estava brincando.
Meus olhos vão para as costas de Cam, a tatuagem de fênix estendida por sua cintura,
moldada em sua pele de forma que você quase sente inveja da porra da tinta preta.
Oficialmente, odeio tatuagens na pele de uma mulher.
Extraoficialmente? Bem... é complicado.
Entramos em um quarto privativo, a equipe de segurança de Anthony permanece do
lado de fora da porta e ele se joga no sofá cor de vinho, desabotoando o terno e abrindo as
pernas. Encho os copos enquanto Cam começa a música e confiro outra vez se a câmera está
desligada antes de me sentar.
— Ocasião especial? — Cam pergunta, caminhando e passando as mãos pelo peito de
Santaro.
— Meu parceiro aqui acabou de ficar noivo — digo a verdade a ela. Embora essa não
seja a razão para estarmos aqui.
— Parabéns. — Ela agarra a barra de pole dance no meio da sala e rapidamente pula
nela, usando o degrau bem na nossa frente em um único salto ágil, seus movimentos fluidos e
lascivos. Como um animal seduzindo. — Você deveria trazê-la. Eu aceito casais.
Anthony ri, a música começando a sair pelos alto-falantes.
— Há mulheres para foder e mulheres para casar, Halo. Acho que vou manter essas
pequenas viagens para mim mesmo.
Esposas da máfia, esposas do crime… elas praticamente têm o mesmo papel de
Primeiras Damas e precisam ser o mais respeitáveis. Elas servem para ser exibidas. Não para
diversão.
Uma música blues sombria e sensual toma a sala, a guitarra lenta e os vocais
crescentes, enquanto apoio o braço no encosto do sofá e viro na direção de Anthony. Cam
desliza contra a barra e lentamente solta as alças da parte de cima do biquíni por cima da
camisa. Forço o olhar para longe.
— Sete mil e quinhentos quilos, sem cortes… — confirmo, em tom baixo. — Conseguiu
transportar?
— Em barcaças. — Leva o copo à boca, seus olhos seguindo Cam. — Pelo rio para
Chicago, vindo do Golfo. Daqui, será enviado de Morehouse para Boston, Nova Iorque…
— L.A.?
— Os bolivianos abastecem o sudoeste, mas vamos invadir o mercado deles. — Toma
um gole. — Fique esperando.
Sopro uma risada. Deus abençoe quem quiser mexer com os bolivianos, que
descansem em paz. O frasco de remédios sacode na minha coxa e fecho os olhos, tomando um
grande gole do meu copo.
Cam fica de joelhos, abaixando-se lentamente e jogando a cabeça para frente e para
trás antes de se mover para a barra, empurrando suave e lindamente de novo e de novo.
Ela retira a parte de cima do biquíni, jogando longe, e seus seios ficam visíveis por
baixo do top transparente, um choque familiar em meu pau, enquanto seus olhos se movem
dele para mim.
— Como você vai passar pela fronteira? — pergunto.
— Drones.
Levanto uma sobrancelha.
— Quanto peso um drone carrega?
— Bem, precisaremos de um monte dessa porra. — Ele ri.
Cam desce do degrau e desliza um joelho entre mim e ele, envolvendo os braços em
seu pescoço e movendo-se em sua direção. Ela olha para ele — mas seu olhar passa direto —
como se seu corpo estivesse separado de sua mente. Isso é trabalho.
— Quando? — questiono, meu pulso disparando.
Quando. Prendo a respiração.
Ele não responde e dou outro gole, um suor leve cobrindo minha testa. Estou indo
rápido demais.
— Pode tocá-la se quiser — aviso, mudando de assunto. — Ela gosta.
Cam tira a perna dele, vira e desliza a outra de volta, seus olhos travando nos meus por
uma fração de segundos antes de se apoiar nele, em um convite.
Vejo sua mandíbula se flexionar enquanto puxa as mãos de Anthony para sua cintura.
— Halo quer ser contadora — brinco, nós dois fazendo nossa parte para relaxá-lo.
Ela se contorce, deixando as mãos dele correrem por sua bunda e coxa, e subir por seu
corpo, os mamilos duros que ela provavelmente nem teve que usar gelo antes de subir no
palco saltando pela malha da camisa.
— Quer? — ele pergunta.
Ela vira os lábios para ele, sem tocar.
— Gosto de dinheiro — sussurra.
— Quanto você gosta?
Ele segura um seio em cada mão por cima da camisa e os aperta. Fica tensa apenas o
suficiente para que eu perceba quando meu intestino se aperta dentro de mim. Mas ignoro,
enchendo outro copo para mim.
— Isso vai custar um extra — provoca, recuperando-se.
Ele toca o meio de suas pernas.
— E isso?
Mordo o canto da boca com força e tomo outro copo.
— Depende de quão duro você está e quanto trabalho ela terá que fazer — adiciono,
em seguida viro-me para ela: — Quão duro ele está?
Ela se esfrega no pau dele, sem perder tempo, porque Cam sabe a porra do trabalho
dela.
— Como uma barra de aço que acabou de perder o emprego — murmura.
— Está assim o tempo todo — avisa a ela. — Sempre que quiser.
Ela se move mais rápido, pressionando mais forte, e sua respiração acelera, pronto
para explodir.
— Quando? — Aproveito o momento.
Ele tenta recuperar o fôlego enquanto ela mexe os quadris, esfregando-se nele.
— O carregamento de Colúmbia chega em Monterrey em uma semana a partir de
segunda-feira — ofega, olhando para ela pelos espelhos no teto. — Eles vão dirigir até a
fronteira, deixar no Texas, e Dallas vai colocar no rio em Nova Orleans em vinte e quatro horas.
Chicago recebe a primeira carga; a melhor cocaína de Colúmbia.
Pisco longamente e com força, exalando devagar. Que esse filho da puta não esteja
mentindo também. Jesus Cristo, eu consegui.
A barriga lisa de Cam se move por baixo da palma de sua mão e observo dedos dele
descerem pela tira de sua calcinha. A pele macia. O corpo dentro dela.
Engulo com força.
— Não falei que você iria gostar de fazer negócios comigo? — provoco.
Ele ri, mas não quer se levantar.
— Antes de sairmos… — começa, agarrando um punhado do cabelo dela e puxando-a
de volta para o seu peito. — Como ela é?
Os olhos da Cam encontram os meus e a mente que estava longe retorna enquanto ela
me encara, subitamente alerta.
— Uma coelhinha — digo, encarando-a de volta.
Ele se inclina em seu ouvido.
— Quero que você se dobre agora. — Empurra para frente e desce a mão, abrindo a
calça. Ele olha para mim. — Pode ficar para ver se quiser.
Vejo o lábio inferior da Cam tremer com sua respiração e abro a boca, mas um
telefone toca e ele para.
Anthony tira o telefone e olha para a porta.
— Ah, merda — rosna baixinho, empurrando Cam. — Espere um minuto, baby.
Ele se levanta e sai do sofá, levando o telefone ao ouvido, e sinto Cam me encarando,
mas não olho para ela. Forço minha respiração a se acalmar, inclino-me de volta e acendo um
cigarro, descansando o braço nas costas do sofá.
— Sim, sim, entendi. — Anthony caminha, abotoando as calças outra vez. — Filho da
puta.
Ele desliga e pega algum dinheiro da carteira, jogando no degrau. Meus ombros
relaxam.
— Algum problema?
— Nada que nos preocupe — resmunga —, só um inferno acontecendo na Florida.
Carga roubada. — E depois aponta um dedo para mim. — É melhor você não perder nada
meu, nunca. Isso muda as coisas. Entendido?
Solto uma nuvem de fumaça.
— Você perde dinheiro, eu perco dinheiro. Não vai rolar.
Ele acena, pisca para Cam e sai do quarto, seus seguranças o seguindo pelo corredor
escuro.
Cam fica sentada lá por mais um momento e sinto seu olhar. Tudo que ela quer dizer,
mas sabe que não deve.
Fica de pé, pega o biquíni do chão e caminha para o espelho, arrumando o cabelo e
conferindo o delineador e o batom, que ficaram molhados pelo suor.
Ela se encaminha para a porta, os saltos batendo com mais força, e sorrio um
pouquinho agora que a pressão se foi.
— Halo? — chamo.
Cam para, suas costas ficando tensas antes de se virar e me encarar. Pego seu maço de
notas do degrau, sabendo que seria bem mais se ele fodesse com ela.
Seguro em sua direção e ela se aproxima, um olhar mortal nos olhos, mas se mantém
quieta.
Ela agarra o dinheiro, mas eu seguro mais forte.
— Mande a Destiny entrar, por favor — digo. Não estou pronto para sair ainda.
Solto o dinheiro, a forma como seu peito sobe e desce me dizendo tudo que preciso
saber sobre seu humor agora, e inclino-me de volta, dou uma tragada e ajusto meu pau. Ela
gira sobre os saltos e sai, o chão tremendo com a batida da porta.

***

Duas horas depois, estou de pé na janela da cozinha, a casa sombria como o cheiro do
piso de madeira teca que minha ex-esposa colocou em tudo há três anos e que compete com o
cheiro do meu cigarro.
Não fodi com Destiny. Embora seja bom que as pessoas pensem que eu faço esse tipo
de merda. Infelizmente, não é bom mexer com as mulheres que vivem na minha cidade,
porque a última coisa que eu quero é esbarrar em um desses casos de uma noite no mercado.
As cortinas da cozinha do meu vizinho estão fechadas, mas a luz acima de seu fogão
deve estar acesa, porque vejo a sombra de sua noiva, Jordan, trabalhando por cima dele, que
está sentado em uma cadeira. Duas cabeças, cabelo se movendo, algo sacudindo aqui e ali…
Dou um trago no cigarro, carrancudo, enquanto sopro a fumaça e olho o relógio.
— Porra, cinquenta minutos? — murmuro baixinho. — Ele está de brincadeira? Jesus,
goza logo.
Mulheres realmente gostam de transar por tanto tempo? Assim, ela não está cansada?
E ele? O cara é mais velho que eu, pelo amor de Deus. Só alguns anos, mas ainda assim mais
velho. Eu já estaria cansado.
Passos chegam às escadas de madeira da varanda de trás e estremeço quando porta se
abre, bate na secadora e sinto o cheiro do perfume da Cam antes mesmo de vê-la.
Ah, caralho. Seguro o cigarro entre os dedos enquanto coço a sobrancelha.
Chegando feito um furacão na minha cozinha, tenho tempo suficiente apenas para me
virar antes que ela pule em cima de mim em seu jeans e blusa de moletom, batendo no meu
peito. Cerro os dentes e finco os pés, dando um passo para trás para me estabilizar antes de
sua mão atingir meu rosto, um tapa perfurando o ar e fogo se espalhando em minha
bochecha.
— Odeio você — rosna, com tanta força que quase sai como um sussurro.
Seus braços voam novamente, vindo em minha direção e batendo no meu rosto e na
cabeça antes que ela pule em mim, envolvendo seus membros em mim e me atacando com
força total.
Droga. Inclino a cabeça, tentando proteger a mim mesmo enquanto meu cigarro cai no
chão. Pego seus braços e tiro-a de cima de mim. Puxo-a para longe da visão da minha varanda
e coloco-a no chão, apontando para sua cara.
— Cresça — mando.
Mas ela não obedece.
— Não sou a sua puta para você ficar me oferecendo por aí!
— Ah, por favor. — Saio de perto e paro perto da janela de novo. Esfrego a mão no
rosto, procurando sangue na mão. — Não chegaria tão longe. Você sabe que eu não deixaria
acontecer.
Ela solta um grunhido e mergulha de novo, batendo em mim outra vez. Endureço a
mandíbula contra o ataque, mas, antes que ela possa continuar, agarro seu punho e empurro
para trás da sua bunda.
— Bater em um policial é crime — solto, soltando seu braço. — Pare com isso.
Ela respira com força e dá para dizer que está puta e ficou morrendo para me colocar
no meu lugar nas últimas duas horas antes de sair do trabalho.
— Eu teria dito a ele que você estava menstruada ou algo do tipo — murmuro. —
Caras odeiam isso.
— E se ele quisesse que eu o chupasse, seu cuzão?
— Não vou deixar nada acontecer com você — digo a mesma merda que ela já sabe. —
Já te disse um milhão de vezes.
— Vai se foder, Cramer! — Aponta os dedos para mim, o rubor queimando as maçãs
de seu rosto. — Eu confiaria mais em um cafetão do que em você. Você gostou daquilo.
Adorou me ver sendo depreciada!
Nego com a cabeça, focando os olhos na casa de Pike Lawson. Ela não faz ideia, porra.
A mesma coisa de sempre. Como se eu não fosse arrancá-la de lá caso ele voltasse. Eu trouxe
outra dançarina apenas para garantir. Uma que abre a boceta por algumas notas extras.
Dou outro trago, sua respiração soando como se ela estivesse a dois minutos de chorar
ou me matar.
— Mesmo quando eu tinha quinze anos, eu sabia quem você era — reclama, em tom
duro. — Você gostava de me incomodar. Enquadrando-me nos lugares com a porra do seu
distintivo. Perseguindo-me por cada coisinha que eu fiz de errado. Tendo poder sobre mim,
porque eu era alvo fácil. Agora eu sou uma mãe solteira, não estudei, vivo contando a grana.
Sou mais fraca que você. Sei que gostava aquilo anos atrás e ainda gosta.
— Não pense em mim, Cam. — Puxo outro trago, ainda encarando a janela. — Eu nem
penso em você.
Pike e sua futura esposa ainda estão mandando ver por trás das cortinas, lembrando-
me das pequenas coisas que não percebi que sentia falta. Minha ex costumava amar transar
em qualquer lugar que não fosse a cama.
A fumaça irrita meus olhos e eu pisco.
— Além disso… — Bato as cinzas na pia. — Você deu para todo garoto punk de
fraternidade que apareceu naquele lugar. Por que não fazer por uma boa causa e ganhar
algum dinheiro enquanto isso? — Olho para ela. — Ouvi que você é ótima.
Ela mostra os dentes, um pequeno rugido escapando enquanto avança em minha
direção, mas eu cansei. Essa não era a porra da noite. Andando para ela, jogo o cigarro na pia,
tiro o distintivo do pescoço e largo no balcão, e tiro a arma, batendo com ela na bancada
enquanto empurro a mulher para a parede.
Ela encara a arma, os olhos assustados em mim.
— Você vai andar na linha, porque não tem escolha — digo, entredentes. — Se não
fosse por mim, Killian estaria em um orfanato e você estaria cumprindo de três a sete anos,
então mostre alguma gratidão e mantenha as mãos quietas.
Ela me dá trabalho desde que tinha catorze anos e eu cansei. Só não está presa agora
graças a mim.
Cam ainda insiste que não sabia que o namorado da época estava escondendo um
tijolo de cocaína no armário há quatro anos, e provavelmente não sabia mesmo, porque é uma
cabeça de vento, mas ninguém acreditaria nela e, graças a mim, ninguém sabe. Por minha
causa, ela não foi presa junto com ele e Killian perdeu apenas o pai em vez dos dois.
Encaro-a, um pouco de medo escondido por trás de um monte de raiva, o que eu
reconheço, porque é a mesma coisa que vejo quando olho a mim mesmo no espelho. Só que,
comigo, é diferente. Um monte de medo. Um pouco de raiva.
Nenhum de nós deveria estar ali. Sei disso. Eu era um policial de ronda — investigando
roubos a postos de gasolina e abuso doméstico — mas, em uma noite, aconteceu de eu estar
no lugar errado na hora errada. Ou, como os federais consideraram, no lugar perfeito na hora
perfeita. O agente deles tinha sido comprometido, eu já estava dentro, então seguimos.
Cinco anos. Cinco anos, caralho.
Dou um passo para trás, o peso nos meus ombros tornando quase impossível que eu
me mova, mas retorno para a pia e acendo outro cigarro.
Quando Cam fala outra vez, soa muito triste.
— E quando isso vai acabar? — indaga.
Solto a fumaça, encarando a janela.
Sua voz quebra meu coração, mas não vou admitir. A pergunta sai como um apelo.
— Não sei — murmuro.
Queria saber. Queria poder dar a ela uma resposta. Queria não tê-la arrastado para
isso, mas sabia que se tivesse que fazer tudo de novo, não faria nada de diferente. Cam
conseguia chegar onde quase ninguém mais conseguia. Ela era um recurso que eu precisava.
Vindo para o meu lado, ela pega uma maçã do cesto e eu exalo, agradecendo por ela
ter se acalmado. Ficamos ali por um minuto enquanto lava a maçã na torneira e pega uma
toalha de papel para secar.
Mas então ela para, e sei que percebeu o que está acontecendo na porta ao lado.
Vira a cabeça, nós dois observando.
— Eles fazem muito isso?
— Com frequência — solto. — Quase acho que aquele idiota está esfregando na minha
cara.
— É possível. Pike acha que você é desprezível.
— Não dou a mínima para o que o escoteiro pensa de mim — disparo. — Ele tem sorte
de eu fazer o que eu faço, assim pode viver na sua bolha agarrado com aquela adolescente,
sem preocupações.
Ela belisca meu braço.
— Ai. — Encaro-a.
— Aquela é a minha irmã — reclama. — E ela tem quase vinte e um.
Rio, fumaça saindo da minha boca.
— Ela quase consegue pedir no cardápio de drinks do Applebee’s.
— Cala a boca — Cam cospe a frase, dando uma mordida na maçã.
Mas não consigo parar de rir, meus nervos finalmente relaxando pela primeira vez em
dias. Cam tem quase vinte e cinco, o que ainda é quinze anos mais jovem que Pike Lawson,
mas fico me perguntando por que ele não escolheu a irmã mais velha.
Mas aí… eu já sei. Cam é difícil de lidar, com D maiúsculo, e as irmãs são
completamente opostas.
Jordan parece uma Barbie — lindo cabelo loiro, shortinho apertado, pernas
bronzeadas e um sorriso de miss. Casa dos sonhos. Carro dos sonhos. Ken dos sonhos.
Na primeira vez que parei Cam, ela tinha catorze anos e o cabelo laranja ia até a
bunda.
Jordan diz “por favor” e “obrigada”, faz reciclagem e espalha pôsteres pela vizinhança
toda vez que encontra a porra de um gato perdido.
Cam decidiu quando tinha dezesseis anos — na fase dos dreads loiros platinados —
que mostrar um dedo do meio para o policial Cramer não era mais suficiente. Ela vinha me
mostrando os dois nos últimos oito anos.
O corpo da Jordan foi feito para ser tocado por alguém. Cam parecia um garoto, sem
curvas e peito em uma tábua reta.
Até que eu levei um parceiro para o clube uma noite, no aniversário dele, e a vi
trabalhando lá. Porra, quase precisei me deitar. Peitos e bunda, o cabelo da cor normal pela
primeira vez, curvas perfeitas, pele bronzeada brilhando… Minha virilha endurece, só de
pensar sobre a transformação de anos atrás e o que ter um filho fez com seu corpo. Meu Deus,
ela parecia um desfile de carnaval. Eu não soube como processar.
Ela não tinha idade suficiente para fazer strip. Não tinha idade suficiente para transar.
E agora os homens…
Ela…
Em sua cabeça, ela encontrou uma forma de as pessoas a quererem. Lembro-me de
sentir algo estranho. Como uma responsabilidade ou territorialidade, ou alguma outra merda,
sei lá, mas não sei o tanto de ar que precisei respirar quando ela subiu no meu amigo e
começou a dançar para ele, devagar e sexy, como se fosse uma mulher adulta com anos de
experiência, mas era só uma menina de dezenove anos esfregando a bunda em seu pau. Vi
seus dedos apertarem as tiras da sua calcinha enquanto tocava os quadris suaves e bonitos.
Que porra ela estava pensando? Crescer e se transformar nisso? Parecer assim?
Em um minuto, ela tem catorze anos, é desajeitada, chuta e grita toda vez que não
está fumando algo e então, quando me dou conta, estou quase arrastando-a de lá como fazia
quando ela estava em prédios abandonados com uma lata de tinta spray anos atrás. Por que
não fiz isso daquela vez?
Porque ela é uma adulta. Uma mulher.
— Quero uma arma — avisa, arrancando um pedaço de maçã com o dente.
Rolo os olhos, soltando fumaça. E então ela fala esse tipo de coisa estúpida, o que me
lembra de que ela nunca vai deixar de ser criança.
— Absolutamente não.
— Estou em risco — replico.
Encaro-a.
— De jeito nenhum que vou deixar uma arma de fogo em suas mãos, Hadley — digo,
severamente. — Não com um garoto de seis anos de idade em casa.
— Você tem várias armas.
— E de jeito nenhum vou deixar uma arma de fogo com você. Se fizer algo estúpido,
eles irão rastreá-la até mim.
— Meu Deus, você é tão nervosinho — cospe. — Está precisando transar.
— Eu transo.
— Digo com alguém com quem você se importe — devolve, falando com a boca cheia
de fruta. — Precisa pagar uma visita para a ex-esposa e meter o pau nela algumas vezes.
Não consigo evitar a risada enquanto aperto a ponte do meu nariz. Senhor, ela é tão
idiota.
— Então, falando da arma — volta ao assunto. — De novo, estou em risco.
— E quando não esteve? — Dou outro trago longo. — Você atrai problema naquele
trabalho e, vamos encarar, atrairia de todo jeito. — Olho para a sombra de Jordan, sabendo
perfeitamente bem por que Pike nunca ficou tentado por Cam. E por que fico feliz com isso. —
Aquela, por outro lado, é realmente uma boa garota, não é? — Aponto para a irmã dela. —
Pessoas boas conseguem vidas boas para si, não acha?
— Odeio você.
— Não diga isso, Cam. — Encaro a janela. — Sou tudo que você tem.
De verdade. Sou o único que deu disciplina a ela e estou quase tentado a acreditar que
essa é a razão de ela ter continuado a fazer merda na minha frente, para que eu a
enquadrasse.
Ela era má. Eu sou mau. Nós dois vamos nos queimar, de todo jeito. Talvez possamos,
fazer isso, juntos.
Acho que não quero mais o que Pike Lawson tem. Amor, bolos de aniversários,
compromisso. Eu me acostumei a viver nas sombras — garotas do clube, pílulas e observar a
escória onde eu estava infiltrado fazer merdas desagradáveis e tentar convencer a mim
mesmo que eu não estava me tornando um deles. Que eu ainda era um bom homem.
Houve um tempo, bem recente, em que eu conseguia contar o número de mulheres
com quem dormi antes da minha esposa. Mas depois que ela me deixou e levou as crianças,
deixei a cerca entre minhas duas vidas cair e não há mais separação entre a realidade e o
disfarce. Agora, meus dias são apenas uma noite longa, um remédio para me acordar e outro
para me fazer dormir.
Fecho os olhos e esfrego o couro cabeludo, meu cabelo preto precisando ser lavado
tanto quanto a porra da minha mente. Não vejo meus filhos há semanas.
As coisas que tive que fazer para ganhar confiança nos últimos cinco anos… Estive à
venda mais do que Cam como stripper.
Coço as cicatrizes em meu peito, por baixo da camisa, sentindo a picada da unha
contra a carne sensível, mas, depois de um momento, Cam puxa minha mão e segura. Sigo seu
olhar e vejo sangue em meus dedos, finalmente registrando a umidade fria na minha camisa,
grudando na pele. Minha mão treme e os olhos dela saltam para os meus, sabendo que não é
da dor também.
Sua boca abre e fecha algumas vezes, mas ela não precisa falar nada para que eu
entenda. Não tenho que falar para ela também. Cam é tudo que eu tenho. Essa porra dessa
garota é a única para quem eu não tenho que mentir.
Afasto a mão.
— Mills vai entrar em contato com você sobre o show em Chicago.
Ela me encara, limpando a garganta.
— Vou usar uma escuta?
— Não estou tentando fazer com que você morra — respondo. — Só confirme que o
grupo está presente e eu vou assumir. Não peça a noite de folga no The Hook. Vou cuidar disso
no dia. Não quero alertar que estará fora caso alguém esteja atrás de você.
— E o…
— Mills vai ficar com o telefone descartável — garanto a ela. — Sabemos nossos
trabalhos, Cam.
Ela fica lá por um momento, mas eventualmente se vira para sair.
— Leve os remédios — digo a ela.
Eles estão no meu bolso, enrolados no meu punho, e eu não deveria ter dito isso. Sei
que vou me arrepender.
Mas não posso confiar em mais ninguém. Odeio a mim mesmo todos os dias e não
posso continuar com isso. Usei para encobrir a dor de quando fui esfaqueado, cortado e
espancado há três anos, e agora os usei para reunir a porra da coragem que precisava para
continuar nesse trabalho. Isso me venceria e eu preciso viver.
Ela vai até meu bolso e tira da minha mão, forçando meus dedos a se abrirem. Ela pega
o frasco e olha para mim.
— Você pode parar quando quiser.
Encaro-a, odiando o que fiz para ela. Como usei minha ajuda para tirá-la de problemas
com o namorado para justificar tê-la arrastado para isso, mas a verdade é que eu não
conseguiria sozinho.
Ela pode me odiar, mas não sabia quão ruim isso realmente era. Cinco anos do meu
trabalho. Cinco anos. Arruinei meu casamento. Meus filhos praticamente não me conhecem.
Fui torturado, quase morto. Se eu desistir agora, seria por nada.
Puxo a mão.
— E o que você sabe?
E viro as costas para a janela, sinalizando que ela pode ir embora agora.
Jordan e Pike diminuíram, ainda se movendo, provavelmente se beijando, mas a
maratona olímpica parece ter terminado e inalo poucas respirações curtas para me controlar
de novo.
Pelo canto da minha visão, Cam se encaminha para a porta dos fundos por onde entra
e sai para não ter que continuar mentindo para sua irmã de que estamos dormindo juntos para
explicar por que ela entra e sai da minha casa.
Fumo o final do cigarro.
— O que você teria feito? — pergunto, enquanto ela escapa. — O que teria feito se eu
tivesse comprado outra dançarina para Santaro hoje… e comprado você para mim?
Ela para, mas não se vira.
— Se você achasse que eu dançaria para você, já teria pedido a essa altura — diz. —
Nunca vou dançar para você.
Sopro e bato o cigarro na pia, ligando a água para apagar as brasas.
— Boa noite, Cam.
Ela sai e eu caminho até a mesa, os copos de cerâmica que meus filhos pintaram para
mim no Dia dos Pais bem no centro. Descansando os cotovelos nos ouvidos, abro o aplicativo e
toco a música que ela dançou naquela noite, I Feel Like I’m Drowning. Coloco o telefone na
mesa e fecho os olhos, deixando-me fingir que voltamos para aquele lugar.
Sem Santaro. Sem Chicago.
Nada de pílulas. Nada de dor.
Só nós.

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