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O ESTADO NO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO

A burocracia é apresentada como um elemento essencial da administração capitalista,


servindo como uma ordem voltada para a dominação da classe burguesa. Sua função é
viabilizar a produção e apropriação privada da mais-valia, proveniente da exploração da força
de trabalho. No entanto, o Estado, ao não atender automaticamente aos interesses do capital,
age de forma contraditória ao buscar tanto materializar a dominação quanto buscar o
consenso dos explorados e dominados, atendendo certas demandas das classes subalternas.

A construção de uma gestão democrática, conforme proposto, depende da criação de uma


hegemonia na sociedade civil que influencie o Estado e sua estrutura administrativa a
implementar políticas públicas econômicas e sociais que garantam a expansão dos direitos.
Isso requer um Estado forte na esfera social e, consequentemente, uma burocracia pública
capacitada para executar as ações necessárias para efetivar esses direitos.

A partir da crise da década de 1970, surgiram propostas de reforma do Estado, especialmente


na dimensão administrativa, configurando-se como um movimento de contra-reforma
neoliberal, conforme destacado por Behring (2003).

Pode-se identificar quatro elementos que se unem para superar a crise dos anos 1930: o
sistema fordista, o modelo macroeconômico keynesiano, o estado de bem-estar social e o
modelo de controle social e administração burocrática. Essa base foi crucial para o período de
ouro do capitalismo moderno.

Netto observa que as crises do capitalismo, marcando ciclos econômicos, não possuem uma
única causa, mas são resultados da dinâmica contraditória do modo de produção capitalista.

A proposta gerencialista para a gestão do aparelho estatal e organizações da sociedade civil,


no contexto da contra-reforma do estado e da reestruturação do capital, tem como objetivo
central reduzir gastos destinados às classes subalternas para direcionar mais recursos para a
acumulação capitalista. Assim, o gerencialismo identifica a administração do campo da
produção, principalmente empresarial, com o campo da reprodução social, em especial a
administração pública estatal.
É importante ressaltar que, do ponto de vista da reprodução social, podem existir propostas
com foco mais consistente em atender demandas, necessidades e interesses das classes
subalternas do que outras. O gerencialismo, como uma proposta hegemônica de
contra-reforma administrativa, está diretamente ligado ao projeto neoliberal. A orientação da
reforma do estado é subordinada ao projeto político que a define, fazendo com que as
dimensões que compõem essa reforma (econômica, fiscal, previdenciária, administrativa)
também estejam subordinadas ao projeto político hegemônico.

A relação intrínseca entre dominação e ordem administrativa é uma temática complexa e


profundamente enraizada na estruturação do Estado, organizações civis e na dinâmica da
gestão no Brasil. O ponto de vista marxista oferece uma perspectiva rica ao observar a ordem
administrativa como uma superestrutura da sociedade, cuja origem está nas determinações
das relações sociais de produção. Esta visão também a enxerga como um instrumento que
materializa a dominação de classe.

Neste contexto, a lógica capitalista é compreendida como uma dinâmica que se fundamenta
na superexploração da força de trabalho. Isso se manifesta de maneira peculiar no processo
de acumulação capitalista, especialmente nas relações sociais dependentes, incluindo
economias de base escravista.

O desenvolvimento do aparato estatal dependente está diretamente associado às ações


administrativas necessárias para impulsionar a expansão do capitalismo dependente. Esse
processo muitas vezes mergulha nas práticas do patrimonialismo e na burocratização, ambas
derivadas do desenvolvimento do capitalismo.

A administração pública brasileira, em seu estado patrimonialista, não apenas se conecta à


oligarquia agrária cafeeira, mas também é resultado do processo de colonização portuguesa.
Esta estrutura estatal e administrativa foi trazida para o Brasil, organizando a sociedade
colonial sob o padrão patrimonialista vigente. Sua ordem administrativa se consolida pela
imbricação do patrimonialismo com a burocracia, estando funcionalmente ligada à
dominação constituída por frações oligárquicas senhoriais e burguesas para conduzir o
processo de expansão capitalista.

Durante grande parte do século XX, o modelo patrimonialista predominou na administração


pública brasileira, caracterizando-se pelo clientelismo, nepotismo e baixa eficiência na gestão
dos recursos públicos. Entretanto, a partir da segunda metade do século, surgiram mudanças
significativas com a criação de órgãos de controle, regulação e a implementação de políticas
que busquem propor a universalização de direitos.

O livro "Gestão Democrática e Serviço Social" serve como referência para compreender e
aprofundar essa relação entre a ordem administrativa, a dominação e a dinâmica da gestão no
contexto brasileiro. Ele proporciona insights valiosos sobre a evolução da administração
pública no país e como ela se relaciona com as estruturas de dominação e desenvolvimento
do capitalismo dependente.

Referências

GURGEL, Cláudio; SOUZA FILHO, Rodrigo de. Gestão democrática e serviço social:
princípios e propostas para a intervenção crítica. 7. ed. São Paulo: Editora Cortez, 2016.
129 p. (MA - Capítulos de Livros - Ciências Sociais).

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