Você está na página 1de 16

LITERATURA

INFANTOJUVENIL

Debbie Mello Noble


A prática da literatura
no espaço escolar
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Analisar a prática pedagógica com relação à literatura na escola.


 Examinar estratégias e práticas de leitura da literatura em sala de aula.
 Apontar os elementos constituintes de um plano de aula sobre lite-
ratura infantojuvenil.

Introdução
O papel da literatura na escola tem se transformado ao longo dos anos,
e ela tem perdido espaço, à medida que surgem, cada vez mais, outras
formas de leitura, principalmente com a ampliação do acesso às novas
tecnologias. No entanto, o cenário nem sempre foi esse. Por muito tempo,
segundo Cosson (2015), a leitura de obras literárias completas foi um
pressuposto básico da formação de um leitor. A literatura antiga foi base
para o ensino do grego e do latim e, posteriormente, para o ensino da
língua nacional.
Na sala de aula dos dias de hoje, o professor encontra diversos desafios
para efetivar com os alunos a prática da leitura literária. Dentre eles, está
tanto a necessidade de proporcionar o acesso mediado de literatura a
crianças e adolescentes de uma nova geração quanto a reflexão sobre
o seu papel de professor e mediador.
Neste capítulo, você verá uma reflexão sobre as possíveis concep-
ções de leitura que podem ser assumidas pelo professor, bem como
analisará o papel da escola em relação à leitura literária. Além disso,
aprenderá diferentes estratégias e práticas de leitura literária na sala
de aula e conhecerá os elementos que constituem um plano de aula
de literatura infantojuvenil.
2 A prática da literatura no espaço escolar

A literatura na escola
O espaço da literatura na escola sofreu diversas transformações ao longo do
tempo. Essas transformações foram de ordem social, uma vez que o acesso
ao livro e à literatura tornam-se cada dia mais distantes das classes menos
privilegiadas; e de ordem técnica e pedagógica, com a entrada massiva dos
livros didáticos, no século XX, e das novas tecnologias em sala de aula, nos
dias atuais, que demandam do professor novos aprendizados e que dê conta
de diferentes linguagens no seu dia a dia.
Tudo isso reduziu o espaço da leitura literária na escola, mas não a extin-
guiu. Para Cosson (2015), a leitura na escola tem se dividido pedagogicamente
em uma leitura para fruição e deleite, geralmente no ensino fundamental, e a
leitura aplicada, destinada ao aprendizado de algum outro elemento que não
ela mesma, por exemplo, a utilização de um texto literário como pretexto para
o ensino de gramática.
Para o autor, nenhuma dessas concepções, praticadas isoladamente ou em
apenas um dos níveis da educação básica, é eficaz. Segundo Cosson (2015,
documento on-line), “A leitura literária na escola, portanto, precisa ter obje-
tivos e práticas pedagógicas bem definidos que não devem ser confundidos
simplesmente com o ensinar um conteúdo sobre a literatura, nem com uma
simples atividade de lazer”.
Um importante ponto para se pensar na prática da leitura literária na escola
é compreender de que concepção de leitura está se falando. Esse aspecto é
ressaltado por Ezequiel da Silva (1999, p. 11), quando afirma que o modo de
compreender qualquer processo “[...] influencia diretamente as suas formas de agir
quando esse processo for acionado na prática, em situações concretas de vida”.
Assim, se o professor em formação entende que a leitura é um processo
mecânico de decodificação e que basta ensinar o código à criança para torná-la
leitora, esse é um aspecto que será reproduzido em sua prática docente. Para
Silva (1999), esta é uma das formas de concepção de leitura entendidas como
redutoras. Para o autor, essas concepções, se assumidas pelo professor, podem
se opor ao objetivo da escola de formar os leitores necessários à nossa sociedade.
Por esse motivo, é importante ressaltar que o acesso ao “código” da escrita
é, sim, essencial à compreensão da leitura, porém igualmente importante é
perceber que a criança já lê à sua própria maneira bem antes de ser alfabeti-
zada. Segundo Maricato (2007, documento on-line), ela o faz “[...] folheando
e olhando figuras, ainda que não decodifique palavras e frases escritas. Ela
aprende observando o gesto de leitura dos outros — professores, pais ou
outras crianças”.
A prática da literatura no espaço escolar 3

Para Ezequiel da Silva (1999, documento on-line), uma perspectiva inte-


ressante de ser assumida pelo professor é a da leitura como “[...] uma prática
social de interação com signos, permitindo a produção de sentido(s) através da
compreensão-interpretação desses signos”. Em outras palavras, isso significa
que o leitor, diante de um texto, produz sentidos a partir dos signos grafados,
o que o permite acionar seu repertório prévio de experiências. Da mesma
forma que os repertórios de cada sujeito são diferentes, suas formas de atribuir
sentidos diante de um texto também serão.
A concepção de leitura proposta por Silva (1999) pode ser sintetizada da
seguinte maneira:

 ler é uma prática social;


 ler é interagir com o texto e com o repertório de experiências de cada um;
 ler é produzir sentidos;
 ler é compreender e interpretar.

Não é somente a concepção de leitura adotada por parte dos professores


que merece atenção. A prática da leitura literária nas escolas, muitas vezes, é
completamente baseada nos trechos de textos literários disponíveis nos livros
didáticos. E o livro didático, diante das precárias condições econômicas do
sistema público escolar como um todo, é, muitas vezes, a única opção de o
professor viabilizar o acesso a um mesmo texto por toda a classe.
Esse material, no entanto, é quase sempre pouco convidativo, e, além disso,
possui trechos reduzidos e descontextualizados de textos literários muito ricos.
Segundo Martins (1997, p. 25), “Esses textos condensados, supostamente
digeríveis, dão a ilusão de tornar seus usuários aptos a conhecer, apreciar e
até ensinar as mais diferentes disciplinas”, mas, pelo contrário, podem acabar
inibindo o gosto pela leitura. Por fim, ainda apresentam atividades de inter-
pretação com uma única resposta prevista, centrando ainda mais a perspectiva
de aluno e professor na leitura como tarefa e que não produz multiplicidade
de interpretações. É claro que há exceções tanto no que se refere ao modo
como o livro didático apresenta a leitura quanto à forma como a escola lida
com esse material. No entanto, essa série de elementos, quando aparecem
em uma sala de aula sem uma mediação adequada do professor, pode vir a
afastar o aluno da leitura.
É importante que a mudança de perspectiva de leitura se efetive, porém,
alerta Silva (1999, documento on-line), “[...] também deve ser acompanhada
de uma série de ações da organização escolar como um todo”. Isso quer dizer
que não somente os professores podem acrescer suas práticas pedagógicas de
4 A prática da literatura no espaço escolar

ações consistentes relacionadas à leitura, mas também articular com a escola


diferentes estratégias de promoção da leitura. A seguir, você verá algumas
sugestões de como realizar essa articulação necessária.

O papel da escola
Se as gerações que chegam à escola estão cada vez mais “conectadas” em relação
às novas tecnologias, o trabalho da escola não tem como ser outro além de uma
prática que leve os alunos a “[...] transpor fronteiras simbólicas” (GALLO, 2012,
p. 54). Esta transposição de fronteiras está diretamente relacionada à produção de
gestos de interpretação pelo aluno. Isto é, a escola não é lugar de instrumentação
técnica dos alunos, até porque esta geração já chega com uma bagagem diferente
do que a escola poderia ensinar nesse sentido, mas o trabalho possível — e neces-
sário — a ser realizado é o de “[...] compreensão dos vários tipos de organização
textual, que compõem o mundo da escrita” (SILVA, 1999, documento on-line).
Diante disso, existem algumas ações que podem ser tomadas pela escola
como um todo nesse sentido. Para que o aluno tenha acesso a diferentes tipos
de organização textual, dentre eles o texto literário, é preciso que a escola
descentralize as ações relacionadas à leitura, que geralmente ficam a cargo
somente dos professores alfabetizadores e de linguagens.
A seguir, veja ações sugeridas por Silva (1999) para que a escola promova
a leitura:

 discussão coletiva sobre a promoção da leitura a partir do projeto pe-


dagógico da escola;
 estruturação ou melhoria do acervo da biblioteca, levando-se em con-
sideração tanto os títulos canônicos quanto os best-sellers, obras pelas
quais os jovens costumam se interessar mais;
 reflexão sobre o currículo de leitura ao longo das diferentes séries,
para evitar redundâncias e permitir o planejamento de sequências mais
pedagógicas e menos improvisadas.

Nessas sugestões mais amplas de Silva, podemos englobar diversos outros


elementos específicos. Por exemplo, a partir de uma reflexão coletiva sobre a
promoção da leitura na escola, é possível organizar eventos literários, como
saraus e feiras de troca de livros envolvendo toda a comunidade escolar. Em
geral, os eventos literários, quando acontecem, centram-se na participação do
aluno, sendo mais uma atividade obrigatória da qual ele precisa “dar conta”.
Por outro lado, ao envolver verdadeiramente a comunidade escolar, contando
A prática da literatura no espaço escolar 5

não só com a presença de pais, familiares e amigos, mas com o envolvimento


na organização e na apresentação destes também, a escola tira a leitura do lugar
de obrigação e a coloca em um lugar de desfrute e reflexão coletivos.

Você conhece o Sarau Cooperifa?


A Cooperifa (2018) é um movimento cultural com 17 anos de atuação na periferia de São
Paulo, promovendo atividades poéticas junto à comunidade. Algumas das intervenções
culturais realizadas são: Cinema na laje, Chuva de livros, Várzea poética, Poesia no ar,
Ajoelhaço, Natal com livros, Mostra cultural, Sarau nas escolas, Canja poética.
O Sarau da Cooperifa ocorre toda terça-feira, no bar do Zé Batidão, localizado na
Zona Sul de São Paulo. Tendo como um de seus organizadores o poeta Sérgio Vaz,
o Sarau é uma oportunidade de descentralizar a literatura e fazer a comunidade da
periferia ter acesso a ela. Segundo o poeta, “O Sarau da Cooperifa é quando a poesia
desce do pedestal e beija os pés da comunidade”.

Veja, no link a seguir, o documentário sobre o Sarau da Cooperifa “Povo lindo, povo
inteligente!”:

https://qrgo.page.link/3RWcx

Tirar a literatura do “pedestal” é desfazer a ideia do livro como “objeto


sagrado”, segundo Soares (2007). Afinal, o livro é “[...] para estar nas mãos
das pessoas, ser manipulado pelas crianças” (SOARES, 2007, documento
on-line). Para que isso ocorra na escola, uma das possibilidades é desfazer a
imagem da biblioteca como um “santuário” inacessível.
Ao lançar um olhar coletivo para a biblioteca da escola, cabe repensar
seus espaços, tornando-os mais atrativos, pensando em um espaço adequado
para leitura, tirando a biblioteca de uma posição de “lugar que se vai visitar
ocasionalmente com o professor por obrigação” para colocá-la no centro do
cotidiano dos alunos, fazendo com que se apropriem do espaço, que sintam
vontade de estar lá e de cuidá-lo.
6 A prática da literatura no espaço escolar

Estratégias e práticas de leitura literária


em sala de aula
A leitura literária na sala de aula pode partir de diferentes abordagens por
parte do professor. Por um lado, ele deve se posicionar também como um
leitor curioso; também deve ser um mediador de leitura e, ao mesmo tempo,
ensinar literatura. Ler, mediar e ensinar, portanto, são os três verbos que
devem fazer parte das estratégias para levar a leitura literária para a sala
de aula. Veja, a seguir, como esses verbos podem se tornar práticas no dia
a dia do professor.

Ler
Para ensinar literatura, é necessário, primeiramente, que o professor seja um
leitor de literatura. É certo que os professores exercem grande influência na
vida de seus alunos. Por esse motivo, um professor que está constantemente
lendo, possui uma grande gama de histórias novas para abastecer seus alunos,
mesmo que aquelas obras não sejam necessariamente trabalhadas em sala de
aula. Logo, o professor curioso e leitor estará mais próximo de inspirar seus
alunos a serem leitores curiosos assim como ele.
Quando se fala na importância de um professor leitor de literatura, não se
trata apenas da literatura canônica, voltada ao adulto, mas também da leitura
de literatura infantojuvenil. É preciso que o professor desenvolva o interesse
nas obras de destaque voltadas ao público infantil e adolescente.

A professora Lizbeth Völker desenvolveu um trabalho que unia os interesses literários


de seus alunos, geralmente ligados a best-sellers e obras adaptadas para o cinema, com
a necessidade da escola de formar leitores competentes para a ampliação do corpus
de leitura. A professora demonstrou verdadeiro interesse pelos livros que seus alunos
do 8º ano do ensino fundamental estavam lendo e percebeu que, estruturalmente,
essas obras possuíam muitas semelhanças com obras canônicas que poderiam ser
trabalhadas naquela turma. A partir dessa constatação, ela desenvolveu um trabalho
em que os livros indicados por seus alunos serviam de mediadores da leitura canônica.
Dessa forma, ela captou o interesse de seus alunos para outras obras que ampliassem
seu repertório de leituras.
A prática da literatura no espaço escolar 7

Outra possibilidade de prática de leitura na sala de aula é a criação de


espaços físicos e temporais de leitura para os alunos. É importante que os
alunos percebam sua sala de aula não apenas como local onde atividades
obrigatórias e muitas vezes maçantes ocorrem.
Criar um espaço físico de leitura na sala de aula não necessita de muitos
recursos: o professor pode criar uma “caixa do livro”, escolhendo um espaço
da sala onde ela fique localizada e decorá-lo, desenvolvendo um “cantinho da
leitura”, com almofadas ou mesmo criando rodas de leitura com as próprias
cadeiras da sala de aula. Já o espaço temporal para a leitura deve ser pensado
dentro do planejamento da aula do professor. É possível abrir espaços em sua
aula destinados ao desfrute, pelos alunos, de obras que estejam na caixa de
leitura, que sejam emprestadas da biblioteca ou trazidas de casa. A atividade,
nesse caso, é a própria leitura, sem obrigações e tarefas extras. É importante
que esta seja uma das formas de se criar o hábito da leitura, mas não a única.
Veja, a seguir, a importância da mediação de leitura pelo professor.

Mediar
Segundo Cosson (2015), a mediação da leitura literária é, muitas vezes, perce-
bida como “animação”. Ou seja, o professor acaba sendo o único responsável
por desenvolver diferentes atividades criativas e despertar o interesse dos
alunos pela leitura literária. No entanto, como você já viu anteriormente neste
capítulo, esta deve ser uma das estratégias de introdução da leitura literária na
escola, mas jamais deve ser tomada como única possibilidade. O ideal é que
professor e comunidade escolar estejam unidos nesse propósito, bem como
que o professor não seja apenas um mediador “animador”, como alerta Cosson
e como você verá posteriormente.

Veja um trecho da entrevista com o escritor Ricardo Azevedo (2006, documento on-line)
na revista LeituraS sobre a importância da oralidade na leitura escolar:

Na minha visão, desde o momento em que a criança aprende a ler, ela deve-
ria saber que existem textos que são utilitários — que trazem informações
concretas, funcionais — e também outros tipos de textos, de ficção, em
prosa ou verso, que trazem uma série de maneiras de se lidar, por meio
8 A prática da literatura no espaço escolar

do texto, com a subjetividade. Em relação à literatura popular (quadras,


adivinhas, contos de espanto, esse tipo de texto que vem da tradição oral)
há um aspecto muito importante: quando um professor apresenta um
conto popular, uma adivinha, a criança que tem os pais pouco letrados
tem a oportunidade de reconhecer naquela história algo familiar. ‘Minha
avó sabe contar essa história...’. Assim, pode-se criar um círculo virtuoso,
essa criança pode voltar, no dia seguinte, com um livro, para mostrar aos
seus pais que aquela história que eles conhecem também tem na escola.
Como 80% da população brasileira se encontra muito próxima da cultura
popular, da linguagem oral, inclusive por influência da música, esse tipo
de literatura deveria estar mais presente na escola, na minha opinião.

Veja, a seguir, algumas possibilidades de mediação necessárias para que


a curiosidade sobre o mundo da literatura seja despertada nas crianças e nos
adolescentes. Uma das práticas de leitura mais comuns nas salas de aula é a
Hora do Conto, na qual o professor, o bibliotecário ou um convidado realizam
a leitura de um conto atrativo para uma turma de crianças. Essa atividade é
bastante interessante para desenvolver o gosto das crianças pelas histórias, e
despertar nelas, especialmente naquelas ainda não alfabetizadas, a vontade
de adentrar no mundo das letras por meio dos livros.

Uma variação dessa atividade, voltada a adolescentes, é colocá-los no centro da


contação de histórias. Inicialmente, essa atividade pode causar certo desconforto e
vergonha, pois a idade em que geralmente se encontram os alunos de 6º a 9º ano do
ensino fundamental é realmente um desafio em termos de desinibição e engajamento
em atividades como esta. Contudo, com o incentivo do professor, que também pode
se colocar em um papel vulnerável para iniciar, a atividade pode ser bem-sucedida.
Assim, os alunos podem indicar aos colegas o que têm lido, possibilitando uma forma
de ampliar o repertório de leitura de todos.

Segundo Tébar (2011 apud COSSON, 2015, documento on-line):

[...] nessas atividades de mediação, o professor deve guiar-se por princípios


que envolvem diversidade, sensibilidade, valorização da experiência e da
contemplação, afetividade e fortalecimento da autoestima para possibilitar
ao aluno o desenvolvimento de suas potencialidades.
A prática da literatura no espaço escolar 9

Ensinar
Essas e outras atividades são muito interessantes e podem motivar e gerar o
prazer da leitura. No entanto, o professor não pode assumir um papel de mero
“animador” de leitura; ele ainda deve estar na posição de ensinar literatura.
E o que compõe a função de ensinar literatura? Para Colomer (2007 apud
VÖLKER, 2014), a função do ensino literário seria a de capacitar os alunos
para que possam ampliar seu corpus de obras literárias de modo mais amplo
e complexo.
No ponto de vista de Galvão e Batista ([201-?], documento on-line), o
prazer e a alegria de ler são muitas vezes destacados quando se fala em
ensino de leitura. Esse aspecto, no entanto, não era sequer comentado no
passado, “[...] quando os ensinamentos morais e instrutivos eram consi-
derados mais importantes e se pensava que a busca do prazer na leitura
era prejudicial à formação de qualquer leitor — criança ou adulto”. Atu-
almente, esse aspecto é tão fortemente cobrado dos professores, que estes
acabam por colocar em segundo plano a necessidade de desenvolver as
competências de leitura.
Para que seja possível efetivamente ensinar a leitura literária na escola,
Cosson (2015) resume algumas das recomendações dos principais estudiosos
do tema no País:

 levar o aluno a desenvolver sua autonomia, construindo sua própria


história de leituras;
 ser um leitor de literatura, ou seja, o professor deve ter construído seu
repertório de leituras previamente;
 formar mais do que informar, isto é, acima de tudo, ensinar a ler, colocar
a leitura efetiva dos textos no centro do processo;
 ser uma presença ausente, ou seja, ser uma presença sutil, conduzindo
o processo de descoberta da leitura ao mesmo tempo que deixa o aluno
se encantar por suas próprias descobertas.

No ensino de leitura literária, principalmente para crianças e adoles-


centes, é preciso também, segundo Frantz (2011), evitar alguns aspectos,
como o didatismo e o pedagogismo, isto é, pensar a leitura apenas como
meio para atingir um fim. Como visto anteriormente, a leitura pode ter
função em si mesma, não precisando ser usada como pretexto para ativi-
dades posteriores.
10 A prática da literatura no espaço escolar

Para refletir sobre a importância de poder “desfrutar” a literatura, assista à animação


vencedora do Oscar de 2012, Os fantásticos livros voadores do Sr. Morris Lessmore.

https://qrgo.page.link/Cv3vM

Além disso, a autora aponta o moralismo, presente em diversas obras


literárias infantojuvenis, como um aspecto a evitar. Quer dizer, é preciso
escolher obras que não tenham por princípio a transmissão de morais e normas
de comportamento. Além disso, é preciso que o professor evite a escolha de
obras excessivamente infantis, que subestimem a capacidade de compreensão
de crianças e adolescentes.
Por outro lado, é importante que o professor seja capaz de, por meio do
ensino de literatura, levar o aluno a perceber e valorizar as coisas do seu
mundo, as suas próprias histórias de leitura e sua forma de compreensão e
interpretação destas. Isso pode ser feito a partir tanto da escolha de obras para
leitura que atinjam esses objetivos quanto por meio de atividades que levem
ao gesto de interpretação próprio do aluno.

Elementos para um plano de aula


A elaboração de um plano de aula consistente é parte essencial do planeja-
mento de qualquer aula. No entanto, quando se trata da promoção e do ensino
da leitura literária na escola, é essencial que o professor atente para alguns
elementos que não podem deixar de ser contemplados.
Primeiramente, o professor deve pensar na temática a ser abordada em
relação ao público-alvo, ou seja, à faixa etária adequada de seus alunos. A
temática e a faixa etária são, portanto, o ponto de partida para uma aula ou
um projeto de ensino de leitura adequados. Em seguida, é preciso elaborar um
título relacionado ao tema escolhido para a aula. Também é essencial, nesse
momento, refletir sobre a finalidade da aula para o público a quem se destina,
pensando sempre no contexto de aprendizagem que se quer encaminhar.
Com isso planejado, é possível passar à escolha dos gêneros textuais a serem
trabalhados, tendo alguns gêneros principais como foco, para que as crianças/
os adolescentes tenham contato com uma certa normatização apropriada de
A prática da literatura no espaço escolar 11

cada gênero, necessária para, posteriormente, serem capazes de produzir


textos coerentes com os objetivos a que se destinam.
A propósito de objetivos, é necessário que o professor determine os objetos
do conhecimento envolvidos na aula planejada, bem como as práticas de
linguagem que serão mobilizadas.
Veja, no Quadro 1, um modelo de plano de aula sobre contação de histórias
no 2º ano do ensino fundamental.

Quadro 1. Exemplo de plano de aula

Tópicos Descrição

Título da aula Ouvir e contar histórias

Finalidade da aula Refletir sobre o contexto de produção de um conto


de fadas tradicional, reconhecendo suas finalidades,
espaços e tempo em que ocorrem as interações

Ano 2º ano do ensino fundamental

Gênero Contos de fadas

Objeto(s) do Reconstrução das condições de


conhecimento produção e recepção de textos

Prática de linguagem Leitura/escuta (compartilhada e autônoma)

Fonte: Adaptado de Kimura (2018).

Para embasar o plano de aula, os objetivos imediatos, gerais e específicos


deste, é preciso destacar, ainda, as habilidades envolvidas, de acordo com a
Base Nacional Comum Curricular ou com o projeto político-pedagógico da
escola. Veja um exemplo disso a seguir.

 EF15LP15
■ Anos iniciais.
■ 1º ano.
■ Leitura/escuta (compartilhada e autônoma).
■ Reconhecer que os textos literários fazem parte do mundo do
imaginário e apresentam uma dimensão lúdica, de encantamento,
valorizando-os, em sua diversidade cultural, como patrimônio ar-
tístico da humanidade.
12 A prática da literatura no espaço escolar

 EF15LP01
■ Anos iniciais.
■ 1º ano.
■ Leitura/escuta (compartilhada e autônoma).
■ Identificar a função social de textos que circulam em campos da vida
social dos quais participa cotidianamente (a casa, a rua, a comunidade,
a escola) e nas mídias impressa, de massa e digital, reconhecendo
para que foram produzidos, onde circulam, quem os produziu e a
quem se destinam.

A importância da avaliação
Um plano de aula de leitura adequado deve também prever as formas de
avaliação dos alunos. Isso não quer dizer realizar atividades específicas de
avaliação, como provas e exercícios de interpretação de texto. Pelo contrário,
é essencial que todo o processo seja valorizado, e não apenas um momento
da aprendizagem.
Em relação ao ensino de leitura, as formas de avaliação não são tão evidentes
quanto em outros objetivos de aprendizagem. Assim, é possível elencar algu-
mas sugestões de avaliação do processo de leitura, por exemplo, a observação
contínua da participação do aluno nas atividades de leitura, sejam rodas de
leitura, trocas de indicação de leituras entre os colegas ou outras; comentários
sobre os gestos de leitura de cada aluno em relação às obras específicas que
têm sido debatidas em aula; autonomia na escolha de obras a serem lidas em
sala ou no empréstimo da biblioteca.
Para dar conta de, posteriormente, levar essas avaliações aos pais, é
possível criar uma forma própria de registro do desenvolvimento de cada
aluno, como por meio de um memorial do professor sobre o desenvolvimento
da turma, onde vá destacando, ao longo do projeto de leitura, como cada
aluno tem se expressado e vivenciado as atividades realizadas, ou, ainda,
por meio do registro, em vídeo, de algumas atividades mais lúdicas, ou
até mesmo produzindo uma montagem teatral com os alunos a partir de
suas diversas leituras ao longo de um projeto. Estas são apenas algumas
sugestões para que você se inspire e crie seus planos de aula e formas de
acompanhar e avaliar os alunos ao longo de sua prática de ensino de leitura
literária na escola.
A prática da literatura no espaço escolar 13

AZEVEDO, R. Oralidade é porosidade. LeituraS, 2006. Disponível em: http://portal.mec.


gov.br/seb/arquivos/pdf/2006/leituras1.pdf. Acesso em: 11 jun. 2019.
COOPERIFA. São Paulo: [S. n.], 2018. Disponível em: http://cooperifa.com.br/?page_id=9.
Acesso em: 11 jun. 2019.
COSSON, R. A prática da leitura literária na escola: mediação ou ensino? Nuances: Estu-
dos sobre Educação, v. 26, n. 3, p. 161-173, set./dez. 2015. Disponível em: http://revista.
fct.unesp.br/index.php/Nuances/article/viewFile/3735/3153. Acesso em: 10 jul. 2019.
FRANTZ, M. H. Z. A literatura nas séries iniciais. Petrópolis: Vozes, 2011.
GALLO, Solange Leda. Discurso da Escrita e Ensino. Campinas, SP: Editora da Unicamp,
1992.
GALVÃO; A. M. O.; BATISTA, A. A. G. A leitura na escola primária brasileira: alguns elementos
históricos. In: IEL. Campinas: IEL, [20-?]. Disponível em: https://www.unicamp.br/iel/
memoria/projetos/ensaios/ensaio21.html. Acesso em: 10 jul. 2019.
KIMURA, C. D. Ouvir e contar histórias. Nova Escola, dez. 2018. Disponível em:
https://novaescola.org.br/plano-de-aula/3505/ouvir-e-contar-historias. Acesso
em: 10 jul. 2019.
MARICATO, A. O prazer da leitura se ensina. Revista Criança, v. 40, 2007. Disponível
em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/eduinf/revcrian40.pdf. Acesso em:
10 jul. 2019.
MARTINS, M. H. O que é leitura? São Paulo: Brasiliense, 1997.
SILVA, E. T. Concepções de leitura e suas consequências no ensino. Revista Perspectiva, v.
17, n. 31, jan./jul. 1999. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/perspectiva/
article/viewFile/10708/10213. Acesso em: 11 jun. 2019.
SOARES, M. O prazer da leitura se ensina. Revista Criança, v. 40, 2007. Disponível em: http://
portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/eduinf/revcrian40.pdf. Acesso em: 11 jun. 2019.
VÖLKER, L. K. M. A utilização dos Best-Sellers como objeto mediador na sala de aula: estudar
literatura é estudar com prazer. Dissertação (Mestrado em Letras) — Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2014. Disponível em: https://lume.ufrgs.
br/handle/10183/116460. Acesso em: 11 jun. 2019.

Leituras recomendadas
A MENINA que odiava livros. [S. l.: s. n.], 2012. 1 vídeo (7 min). Publicado pelo canal
ProLetramentoUEPG. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=y8hb5fsnrRM.
Acesso em: 11 jun. 2019.
14 A prática da literatura no espaço escolar

OS FANTÁSTICOS livros voadores do sr. Morris Lessmore. [S. l.: s. n.], 2012. 1 vídeo (15
min). Publicado pelo canal Leo Madureira. Disponível em: https://www.youtube.com/
watch?v=LjkdEvMM5xs. Acesso em: 11 jun. 2019.
SARAU da Cooperifa "Povo lindo, povo inteligente!". [S. l.: s. n.], 2013. 1 vídeo (50
min). Publicado pelo canal DGT Filmes. Disponível em: https://www.youtube.com/
watch?v=wwIy5pyoq0M. Acesso em: 11 jun. 2019.

Você também pode gostar