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DOSSIÊ POÉTICAS CONTEMPORÂNEAS:

O uso das cores na narrativa de Olafur Eliasson

João Carlos Soares Teixeira

Dossiê apresentado na disciplina STCHA


1: Laboratório de Estudos em Poéticas
Contemporâneas, do Departamento de
Artes Visuais – IdA/VIS, ministrada pelo
Prof. Leonardo Motta Tavares, como
trabalho de conclusão da disciplina.

2023
Introdução
A trilha percorrida por Olafur Eliasson abrange não só como várias
plataformas como também diversas críticas em relação a alguns dos problemas
atuais (como o meio ambiente). E uma característica interessante de suas
obras é a forma como se utiliza das cores para entregar ao telespectador uma
experiência sensorial, sentimental e única.
Eliasson faz uso da vasta paleta de cores disponíveis em grande parte
de suas instalações, visando não só a luz como também o ambiente e o tempo.
Um exemplo notável desse método seria a imagem usada na capa desse
dossiê, “The Weather Project” (2003), na Tate Modern, Londres, onde se criou
uma atmosfera envolta de iluminação amarela e névoas artificiais, criando uma
experiência “natural” dentro do espaço, sem utilizar recursos externos do meio
ambiente.
Sua obra “Your Rainbow Panorama” (2006-2011), feita no telhado do
ARoS Aarhus Art Museum, na Dinamarca, também tinha como o foco as cores.
Uma passarela de 360º graus envidraçada panoramicamente formando um
círculo cromático, permitindo que o expectador veja diferentes pontos da
cidade sobre diferentes cores, tanto de dia quanto de noite, criando uma
experiência iluminada considerada “mágica”.
Seu outro trabalho “One-way colour tunnel” (2007), exposto no Museu de
Arte Moderna de São Francisco, segue a mesma linha de raciocínio,
construindo uma passarela composta de painéis triangulares de vidro acrílico,
alguns coloridos e outros espelhados, fazendo com que o telespectador veja
diferentes cores quando caminha por ele dependendo da luz que o atinge,
criando uma obra mística, como um portal para outra dimensão.

Justificativa
Eu não possuía nenhum conhecimento a respeito do artista quando a
ideia do dossiê foi imposta, e na busca sobre qual dos muitos seria
interessante uma pesquisa sobre, acabei me deparando com as suas obras e a
quantidade de cores diversas nas suas instalações. Me intriga a forma como
ele se utiliza dos materiais diversos para causar sensações tão vívidas, como o
uso de painéis translúcidos e coloridos em diversos cenários para dar ao
telespectador uma experiência sensorial e visual que traga uma emoção ou
sentimento.
Essa pesquisa tem como foco o uso das cores nas obras de Olafur
Eliasson, que afeta não só sua poética como também o método de produção
de suas obras, elementos que me fazem questionar meu processo artístico e a
criatividade envolvendo as cores e seus diferentes significados.

Apresentação do artista

O artista Olafur Eliasson nasceu em Copenhague, Dinamarca, no ano de


1967, tendo descendência da Islândia (que coincidentemente foi o país onde se
mudou quando ainda era uma criança). Ele passou a sua infância e
adolescência, sendo profundamente influenciado pela rica paisagem natural do
país, vista até hoje em suas obras. Desde cedo, Eliasson demonstrou esse
interesse pela arte e o natural. Esses elementos selvagens e imprevisíveis,
como a aurora boreal, moldaram a sua sensibilidade artística e se tornaram
uma fonte de inspiração constante em seu trabalho.
Após concluir seus estudos na Real Academia de Artes de Copenhague,
ele aprofundou sua formação na renomada Hochschule der Künste, em Berlim.
E foi nessa cidade que ele começou a explorar as diversas formas de
expressão artística, desde pintura e gravura até esculturas e instalações. A sua
abordagem ousada e inovadora logo chamou a atenção de outros, momento
que o permitiu abranger seus sonhos para além do exterior. Finalmente na
década de 90 (decidindo seguir com as instalações), Eliasson emergiu como
um artista em destaque, conhecido por suas obras que desafiavam as
fronteiras da percepção humana de forma imersiva e totalmente sensorial.

Olafur Eliasson – The Weather Project 2003

Por se tratar de instalações, seus trabalhos faziam uso de diversos tipos


de materiais, para alcançar a melhor versão desejada pelo artista. Alguns
recorrentes seriam a água, frequentemente incorporada em suas obras
representando um elemento físico da natureza, uma força imparável, mas
mutável. Eliasson também se utiliza de espelhos para criar reflexões e
duplicações, ampliando o espaço e a percepção visual do espectador, usados
para criar ilusões e distorcer cores, desafiando a nossa realidade. A própria luz,
seja natural ou artificial, desempenha um papel fundamental no seu trabalho
para criar os efeitos atmosféricos, jogos de sombras e as diferentes tonalidades
de cores. E claramente, além dos recursos naturais, Eliasson também
incorpora tecnologia em seu trabalho, focando não só na natureza como
também no humano, o atual, o tópico em que a humanidade já está mais
acostumada.

Olafur Eliasson – One-way Color Tunnel 2007

O trabalho de Eliasson transcende a mera apreciação estética,


buscando esse despertar da consciência sobre a relação entre os seres
humanos e o meio ambiente. O ambiente e as cores de suas obras convidam
os espectadores a refletirem sobre sua percepção do mundo de forma sutil,
desafiando esses conceitos preestabelecidos e estimulando uma maior
conexão com o sentimental.
Além do sensorial e natural, a exploração do espaço físico e da
arquitetura é uma preocupação constante no trabalho de Eliasson, visto que a
maioria de suas obras tem como foco a estrutura que as pessoas se
encontram, construindo esse vínculo com o local em si. A própria ciência é
frequentemente combinada com o artístico. Ele investiga questões
relacionadas à física, ótica, percepção visual e fenômenos naturais. E por
último mas não menos importante, sua abordagem ao tema político e social
contemporâneo de forma indireta, causando não só a participação do público
como simples espectador mas também como um crítico do seu próprio
ambiente diário. É claro que as cores são usadas para diversos tópicos
atualmente, e o uso dela em suas obras, mesmo que inconscientemente, é
vista como um “movimento” sobre tais temas.

Olafur Eliasson – Your Rainbow Panorama 2006-11

Através de sua trajetória artística notável, Olafur Eliasson consolidou-se


como um dos artistas contemporâneos mais influentes e inovadores. Sua
abordagem multidisciplinar e sua capacidade de criar experiências únicas têm
inspirado e cativado públicos ao redor do mundo, estabelecendo um diálogo
profundo entre arte, natureza e percepção humana.
Revisão de literatura

Quando se observa de um ponto de vista geral, é evidente que o uso


das cores na arte sempre esteve presente com diversas finalidades de
diferentes métodos. Essa linha histórica em meados do século XV que permitiu
os pigmentos de cores expandirem suas fronteiras para outros suportes,
colaborou não só com o avanço da criatividade em relação aos materiais
criados pelo homem, como também permitiu o estudo sobre as cores em
diferentes materiais e situações. Foi na década de 1960 onde termos como
“instalação” começaram a ser amplamente utilizados para descrever uma forma
de arte, envolvendo a criação de um ambiente imersivo e sensorial para o
público, onde em sua parte, o uso de cores era de certo modo fundamental
para criar uma obra onde o suporte seja a própria visão.
Essa discussão sobre o que deveria ser considerado arte seguia de uma
forma irregular, visto que o foco geralmente era voltado para obras em tela. Foi
necessário que alguns artistas se desprendessem da pintura em superfície e
envolvesse o cotidiano da população para o choque de realidade em meio ao
público, como os trabalhos monumentais de Christo e Jeanne-Claude. A
proposta do casal de adotar uma nova linguagem artística com a apropriação
escultural de espaços públicos, como sua obra Mur provisoire de tonneaux
métalliques1 de 1962, fez com que a simples paisagem humana se
transformasse em algo que atraísse a curiosidade do espectador, criando cores
em locais onde costumavam ser vistos como “acromático” quando observadas
diversas vezes por dia.
Com o passar do tempo, instalações foram se tornando algo complexo
de se determinar, já que é um gênero que mescla com diversos outros, desde
escultura a Land art2. Essa ousadia levava os artistas a irem além do esperado,
com obras maiores e com mais uso de cores para reter a curiosidade do

1
Tradução do francês: “Muro provisório de barris de metal”
2
corrente artística surgida no final da década de 1960, que se utilizava do meio ambiente, de espaços e
recursos naturais para realizar suas obras.
público. Desvio para o vermelho (1967), de Cildo Meireles, é uma obra que tem
como foco principal a cor vermelha, não só no chão, mas também em todos os
móveis de uma sala. O uso da cor na instalação cativa os olhos de quem a
observa, criando esse desafio visual que levanta o questionamento sobre qual
cor deveria estar aqui e qual não. Com o uso do vermelho, ele liga não só aos
sentimentos como a paixão, mas também a raiva e violência da ditadura militar,
sensações transmitidas apenas pelo pigmento.
A poética de Olafur em suas instalações também buscou, em sua
maioria, o uso das cores no cotidiano, principalmente em ambientes públicos,
para remeter ao natural, sempre buscando mostrar o quanto que a cor afeta,
não só o local, como também a pessoa em si. Conforme ele demonstra em
uma de suas citações:

“Isso nos torna conscientes dos limites de nossos sentidos e


nos ajuda a ver a relatividade de nossa percepção de cores.
Entender como vemos as cores pode nos fazer reconsiderar
como constituímos o mundo”. (Eliasson, 2017, pg. 211,
traduzido)

Cildo Meireles – Desvio para o vermelho 1967


Artistas em diálogo

Seguindo essa linha de visão em relação as mais diversas cores em


diferentes suportes de arte, temos a Katharina Grosse (1961) com sua
instalação The horse Trotted Another Couple of Metres, Then it Stopped
(2018), onde o espectador fica no epicentro de uma parede de tecidos
manchada de diversas cores, que caem do teto ao chão com uma fluidez que
remete ao natural, como água. Transforma o ambiente contemporâneo em algo
sensorial, curiosamente frenético e calmante ao mesmo tempo, como um
abrigo em meio a realidade atual.

Katharina Grosse – The horse Trotted Another Couple of Metres, Then it Stopped
2018
Gerhard Richter - 1024 colours 1973

James Turrel – Bridget’s Bardo 2009


A obra 1024 colours (1973) de Richter é uma obra que levou 13 anos
para ser finalizada. Sua inspiração foram as cartelas de cores comercial, porém
agrupadas em ordens diferentes, distribuídas aleatoriamente pela grade.
Mesmo que não tenha um significado aparente, e mesmo sendo uma pintura,
ele mostra que mesmo com essa organização exata e matemática, de acordo
com ele seria impossível combinar cores de forma significativa. Essa ligação
indireta com o comércio, que remete com os azulejos de cerâmica em casas da
nossa realidade brasileira, faz com que seu trabalho seja curioso em sua
maioria.
Outro trabalho que deixa claro o seu objetivo com as cores é o Bridget’s
Bardo 2009 de Turrel, onde o público entra em uma sala monocromática com
uma “ponte” no centro, até que a luz do ambiente começa a mudar, como um
controle das emoções do espectador, manipulada de forma a exagerar a
intensidade das cores. Esse conhecimento das tonalidades que permite esse
efeito, pois cores contrastantes, como rosa e azul, parecem mais intensas do
que realmente são, provocando uma resposta no público, que se desliga do
real e se liberta por total para os seus sentimentos internos. Cada direção da
sala em que visualiza procura “alterar” a mente de quem olha, como uma
parede muito distante do normal, uma desorientação em relação ao físico, e
outras questões psicológicas, como um jogo de hipnose intenso e impactante
que aparenta possuir risco, mas não tem.
Síntese

A pesquisa sobre o significado e o visual colorido das instalações de


Eliasson trouxe sem dúvidas uma vasta gama de conhecimentos acerca do
humano em relação ao natural. É de se imaginar que as cores sejam algo
fundamental na vida como um todo, mas fica claro que não é dada a devida
importância para ela em meio a sociedade. Artistas como esses citados no
dossiê trabalharam com o colorido de diferentes maneiras com diferentes
significados, mas todos tinham como foco o sentimental e emocional.
Não é novidade quando se fala que as cores estão diretamente ligadas a
vida nas obras, visto que as pinturas sempre retrataram isso de diversas
formas. Mas trazer essa pesquisa para a o gênero da instalação, em um
ambiente onde a arte passa despercebido dentre os demais no dia a dia, é uma
perspectiva fundamental, principalmente para as cores em nossa volta que
ficam mais vibrantes quando alguém decide chamar de “arte”.

Palavras-chave:
Cor; sentimental; sensorial; natureza; Olafur

Referências Bibliográficas e Sites:

Monochrome: Painting in Black and White, National Gallery Company


Limited, Londres, 2017.

Portal Olafur Eliasson: Olafur Eliasson Biography.


Disponível em:
<https://olafureliasson.net/>
Acesso em 19 de junho de 2023

Portal MoMA: Artist Olafur Eliasson.


Disponível em:
<https://www.moma.org/search/?bucket=1&query=Olafur+Eliasson>
Acesso em 19 de junho de 2023

Portal TED: Playing with space and light.


Disponível em:
<https://www.ted.com/talks/
olafur_eliasson_playing_with_space_and_light/transcript>
Acesso em 23 de junho de 2023

Portal The Art Newspaper: Olafur Eliasson on how his light installation at
the National Gallery changes perception.
Disponível em:
<https://www.theartnewspaper.com/2017/11/27/olafur-eliasson-on-how-
his-light-installation-at-the-national-gallery-changes-perceptionsin-more-ways-
than-one>
Acesso em 23 de junho de 2023
Portal História das Artes: Instalação.
Disponível em:
<https://www.historiadasartes.com/nomundo/arte-seculo-20/instalacao/
#:~:text=O%20termo%20instala%C3%A7%C3%A3o%20foi
%20incorporado,milhas%20de%20fio%2C%201942>
Acesso em 23 de junho de 2023

Portal DASartes: Katharina Grosse.


Disponível em:
<https://dasartes.com.br/materias/katharina-grosse/#:~:text=
%C3%89%20o%20que%20vemos%20em,%C3%A2ngulo%20do%20ch
%C3%A3o%20%C3%A0%20parede>
Acesso em 24 de junho de 2023

Portal Toda Matéria: Instalação artística: obras e artistas.


Disponível em:
<https://www.todamateria.com.br/instalacao-artistica-obras-e-artistas/
#:~:text=A%20palavra%20instala%C3%A7%C3%A3o%20surgiu%20nos,a
%20interagir%20com%20as%20obras>

Portal WikiArt: 1024 Colours.


Disponível em:
<https://www.wikiart.org/en/gerhard-richter/1024-colours-1973>
Acesso em 24 de junho de 2023

Portal Atmospherics 3: Bridget’s Bardo by James Turrell.


Disponível em:
<https://atmospherics3.wordpress.com/2-bridgets-bardo/>
Acesso dia 24 de junho de 2023

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