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Manual de Formação - UFCD 10148 Sistema imunitário – imunidade e defesas do organismo


INDICE

Objetivos de aprendizagem ---------------------------------------------------- 5

1-Sistema Imunitário – definição ---------------------------------------------- 6

2-As células do sistema imunitário -------------------------------------------- 7

3-Mecanismos de defesa – espontâneos e adquiridos ----------------------- 11


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4-Reações imunitárias (com anticorpos, sem anticorpos) -------------------13

5-Sistema linfático – definição e sua constituição --------------------------- 15

6-Vacinação ------------------------------------------------------------------- 17

o Objetivo --------------------------------------------------------- 17

o Riscos ----------------------------------------------------------- 18

o Composição ----------------------------------------------------- 19

o Vias de administração ------------------------------------------ 20

o Plano Nacional de Vacinação (PNV) ---------------------------- 22

 Doenças alvo do PNV ------------------------------------ 22

 Campanhas de vacinação ------------------------------- 24

 Programa Nacional de Vacinação em vigor ------------- 24

 Vacinação complementar ------------------------------- 26

7-Vacinação extra plano ------------------------------------------------------ 27

o Prevenção sazonal ---------------------------------------------- 27

 Gripe ----------------------------------------------------- 27

o Prevenção Prolongada ------------------------------------------ 28

 Pneumocócicas 7, 13 e 23 serotipos -------------------- 28

 Meningocócicas grupo B --------------------------------- 29

 Hepatite A ------------------------------------------------ 29

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 Varicela -------------------------------------------------- 30

 Rotavírus ------------------------------------------------- 30

 Zona ----------------------------------------------------- 31

 Papiloma Vírus Humano --------------------------------- 31

 Tosse convulsa ------------------------------------------- 32

8-Lisados bacterianos --------------------------------------------------------- 33


3
9-Vacinação do viajante – prevenção ---------------------------------------- 34

o Vacina contra a cólera ------------------------------------------ 34

o Vacina contra doença meningocócica -------------------------- 35

o Vacina contra a hepatite A -------------------------------------- 35

o Vacina contra a hepatite A + B --------------------------------- 36

10-Alergias -------------------------------------------------------------------- 37

o Definição -------------------------------------------------------- 37

o Tipos de reação de hipersensibilidade (IV) --------------------- 37

o Reação anafilática: definição e terapêutica -------------------- 38

o Rinite alérgica --------------------------------------------------- 39

o Urticária --------------------------------------------------------- 40

o Dermatite de contacto ------------------------------------------ 41

o Reação alérgica a medicamentos ------------------------------ 42

11-Doenças autoimunes ------------------------------------------------------ 43

o Definição -------------------------------------------------------- 43

o Lúpus eritematoso ---------------------------------------------- 44

o Psoríase --------------------------------------------------------- 46

o Miastenia -------------------------------------------------------- 47

o Artrite Reumatoide --------------------------------------------- 49

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o Sarcoidose ------------------------------------------------------ 50

Bibliografia -------------------------------------------------------------------- 52

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Objetivos de aprendizagem

 Identificar as funções do sistema imunitário e sua constituição.

 Reconhecer a importância da vacinação.

 Identificar as doenças alérgicas.


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 Identificar as doenças autoimunes.

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1-Sistema Imunitário – definição

O sistema imunitário é um conjunto de moléculas, células, tecidos e órgãos que


tem como função proteger o organismo contra organismos patogénicos (bactérias,
vírus, fungos e parasitas).

Cada indivíduo é um ser único. No entanto, vivemos num meio que é povoado por
uma multidão de micróbios, bactérias, fungos e vírus, muitos dos quais são
patogénicos, ou seja, poderão, consoante a agressividade destes, provocar diversas
doenças.

Um agente patogénico é capaz:

 De ultrapassar diferentes barreiras do organismo e penetrar nos tecidos;

 De resistir à ação do sistema imunitário e multiplicar-se dentre do hospedeiro;

 De destruir diferentes tecidos do hospedeiro. Estes agentes podem entrar no corpo


dos seres vivos através do ar, da água, dos alimentos, através das lesões na pele ou
das mucosas.

Atendo, por isso, à facilidade com que estes microorganismos penetram o corpo, o
sistema imunitário é “obrigado” a intervir, fazendo desencadear mecanismos que
permite defender o nosso organismo destes agentes que lhe são “estranhos”.

O sistema imunitário é o conjunto de órgãos, tecidos, células e proteínas que


estabelecem proteção contra agentes patogénicos, como: bactérias, vírus, fungos e
parasitas. Além de assegurar a proteção ao hospedeiro, o sistema imunitário tem
igualmente um papel importante na manutenção da homeostase. Encontrando-se
subdividido em sistema imunitário inato (imunidade inata) e o sistema imunitário
adaptativo (imunidade especifica ou adquirida), que se diferenciam pela rapidez e
duração da resposta imunitária e pelas células que envolvem.

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2-As células do sistema imunitário

Os monócitos são as células do sistema imunitário com maior dimensão, e


correspondem a 10% do total das células do sistema imunitário (leucócitos) na
circulação sanguínea. São células apresentadoras de antigénios (APC) aos linfócitos
T, participando assim, na fomentação da resposta do sistema imunitário adaptativo.
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Estas células neutralizam os agentes patogénicos por fagocitose e produzem citocinas
próinflamatórias que possibilitam que estes se diferenciem em macrófagos e em
células dendríticas quando se deslocam para os tecidos no decorrer de uma resposta
inflamatória.

Os macrófagos provêm dos monócitos e, podem apresentar na sua diferenciação,


dois géneros de fenótipos, o M1 (macrófagos classicamente ativados) e o M2
(macrófagos alternativamente ativados).

Estas células são encontradas em todos os tecidos conjuntivos e órgãos do organismo


humano, persistindo nos tecidos por longos períodos de tempo. Estes libertam
citocinas pró-inflamatórias, como a IL-12, IL-1, IL-6 e o interferão gama (IFN-γ), que
permitem potenciar a ativação de outras células do sistema imunitário, para o local
da inflamação. Estas células são APC e possuem ainda a capacidade de eliminar os
microrganismos pelo processo de fagocitose sendo também eficazes na cicatrização
de tecidos.

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Os neutrófilos são as células do sistema imunitário que existem em maior
concentração na circulação sanguínea, correspondendo entre 50%-70% de todas as
células. Estes são a primeira classe de células do sistema imunitário inato a responder
às infeções, eliminando principalmente, os agentes patogénicos extracelulares
através do processo de fagocitose. São, também, as primeiras células a integrar o
início de uma resposta inflamatória.

Os eosinófilos correspondem entre 1% a 6% dos leucócitos presentes na circulação


sanguínea. Estes têm uma função relevante na proteção do hospedeiro, visto que o
protegem das infeções parasitárias, podendo neutralizar os agentes patogénicos
através do processo de fagocitose, sendo também capazes de originar apoptose em
células cancerígenas. Eles podem, igualmente, intervir no processo de cicatrização
de tecidos e intercedem em respostas alérgicas, que por sua vez estão implicados
em ações inflamatórias.

Mastócitos e basófilos são células que possuem funções idênticas e processos de


formação e maturação igualmente semelhantes. Os mastócitos representam 6% do
total dos leucócitos presentes na circulação sanguínea, apresentam um período de
duração de vida de meses, e localizam-se em tecidos, como na pele e os tratos
respiratório, trato gastrointestinal e urinário.

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Os basófilos representam menos de 1% do total dos leucócitos na circulação
sanguínea, sendo, as células do sistema imunitário presentes em menor quantidade
na circulação sanguínea. Estes apresentam um período de duração de vida de alguns
dias e, são identificados maioritariamente, na circulação sanguínea.

As células NK são linfócitos que correspondem a cerca de 10% dos linfócitos


presentes no sangue. Estas divergem dos linfócitos T e B em algumas características,
principalmente na ausência de recetores específicos para antigénios. Estas são
células que integram o sistema imunitário inato, mas também cooperam em
respostas do sistema imunitário adaptativo. Estas células desempenham como
principal função a eliminação de agentes patogénicos, como vírus, bactérias,
parasitas, fungos e até células cancerígenas.

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As Células Dendríticas são essencialmente células especializadas em apresentar
antigénios a outras células, nomeadamente aos linfócitos T. Estas têm como função
estabelecer uma ligação entre o sistema imunitário inato e o adaptativo e, são a
classe de APC mais eficientes.

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3-Mecanismos de defesa – espontâneos e adquiridos

A imunidade espontânea ou inata é um “mecanismo” de defesa do organismo que


se traduz numa reação que não é específica para os microrganismos, sendo, no
entanto, de resposta rápida. 11

A imunidade inata é um mecanismo de defesa que envolve a ação conjugada de


fatores mecânicos, químicos e fisiológicos, mediadores químicos e células envolvidas
em fagocitose, onde o papel dos linfócitos é crucial. O poder da resposta inata não é
alterado mediante a exposição repetida ao antigénio.

A imunidade inata é constituída por barreiras mecânicas como a pele, as mucosas


que estão associadas ao trato gastrointestinal, respiratório e urinário e por
mediadores químicos de superfície, tais como as enzimas presentes na saliva e
noutras secreções corporais, muco e secreções ácidas.

A função destas barreiras consiste em impedir a entrada de agentes patogénicos. No


entanto, se os microrganismos conseguirem transpor as barreiras mencionadas
anteriormente e penetrarem no hospedeiro, nomeadamente na circulação sanguínea
ou nos tecidos, serão acionados outro mediador químico – o complemento e as
células características deste tipo de imunidade, isto é, os neutrófilos, macrófagos,
basófilos, eosinófilos, mastócitos, as células natural killer (NK) e as células
dendríticas (DC). O acionamento destas células para o local da infeção é causado
pela produção de citocinas.

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O sistema imunitário adquirido ou adaptativo é extremamente relevante para a
proteção do hospedeiro quando os microrganismos conseguem transpor as barreiras
da imunidade inata e assim, resistir às células do sistema imunitário inato. A
imunidade adaptativa apresenta uma ação mais tardia e específica. Esta resposta
específica deve-se à intervenção das células características deste tipo de imunidade,
os linfócitos B e os linfócitos T, que apresentam recetores muito específicos para os
antigénios, particularmente o recetor das células B (BCR) e o das células T (TCR). A
memória imunológica destas células, permite que identifiquem antigénios que já
foram expostos noutras respostas anteriores, possibilitando uma próxima resposta 12
mais rápida e eficaz.

Este sistema está dividido em dois subtipos. Subdivide-se no sistema imunitário


mediado por células, onde intervém os linfócitos T, na proteção contra
microrganismos intracelulares e, no sistema imunitário humoral, mediado pelos
linfócitos B, que potenciam a proteção contra microrganismos extracelulares.

A imunidade adaptativa corresponde a mecanismos imunológicos que conseguem


reconhecer, memorizar e responder a qualquer antigénio, sendo uma resposta
específica e levada a cabo por anticorpos específicos ou pela produção de células
efetoras, como linfócitos B e T e macrófagos.

A imunidade inata tem um papel fundamental no desencadear da resposta


adaptativa, como é o exemplo da resposta inflamatória. Quando a inflamação não é
suficiente para destruir os agentes agressores, esta torna-se crónica e continuada no
tempo. Assim, a permanência de certos atores no local da infeção permite que haja
as condições ideais para iniciar uma reação adaptativa.

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4-Reações imunitárias (com anticorpos, sem anticorpos)

Os anticorpos são proteínas específicas que circulam no plasma sanguíneo e outras


secreções. Cada anticorpo pode ligar-se quimicamente ao antigénio que estimulou a
sua produção. A especificidade depende dos determinantes antigénicos e da estrutura
do anticorpo.
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Um anticorpo é formado por duas cadeias mais longas denominadas cadeias pesadas
e duas cadeias curtas denominadas cadeias leves. Nos dois tipos de cadeias verifica-
se a existência de zonas constantes, com sequências de aminoácidos semelhantes
aos vários anticorpos, e de zonas variáveis, em que as sequências são singulares e
próprias de cada tipo de anticorpo.

As zonas variáveis constituem os sítios de ligação (dois por anticorpo) para um


determinante antigénico específico. A grande variedade de anticorpos produzidos
pelo organismo resulta da diversidade de sequências de ligação geradas no momento

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da diferenciação dos linfócitos B. Quando um antigénio se liga a um anticorpo forma-
se um complexo antigénioanticorpo ou complexo imune.

Os anticorpos não têm a capacidade de destruir diretamente os antigénios. A sua


função é assinalar essas moléculas para que possam ser posteriormente destruídas,
ou fixar-se a elas limitando a sua multiplicação e a sua proliferação.

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5-Sistema linfático – definição e sua constituição

O sistema linfático constitui uma parte vital do sistema imunológico, que inclui a
medula óssea, o baço, as amígdalas, o apêndice e as placas de Peyer no intestino
delgado, bem como uma rede de linfonodos conectados pelos vasos linfáticos. Este
sistema transporta a linfa por todo o organismo. Acaba por ser um sistema paralelo
15
ao circulatório, constituído por uma vasta rede de vasos semelhantes às veias (vasos
linfáticos), que se distribuem por todo o corpo.

As principais funções do sistema linfático são:

 Drenar o excedente intersticial;

 Absorver moléculas de gordura;

 Absorver substâncias com alto peso molecular;

 Defesa do organismo: filtra os corpos estranhos e microorganismos que


entram no organismo.

O linfoma é um grupo de doenças malignas do sangue. Desenvolve-se no sistema


linfático, que é composto por uma rede de vasos linfáticos que transporta a linfa. Os
linfócitos são um tipo de glóbulos brancos responsáveis pela defesa do organismo
contra agressões de agentes infeciosos como bactérias ou vírus e, como tal, peças-
chave do sistema imunitário.

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No linfoma, os linfócitos multiplicam-se de forma anómala e acumulam-se nos
gânglios linfáticos, fazendo com que estes aumentem de tamanho, ou podem circular
por todo o organismo e atingir outras regiões e órgãos, linfoides e não linfoides, como
o baço, o fígado, o tórax, o abdómen, a medula óssea e os pulmões.

O sistema linfático é constituído por:

 Linfa;
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 Órgãos Linfóides;

 Linfónodos;

 Ductos linfáticos;

 Tecidos linfáticos;

 Capilares linfáticos;

 Vasos linfáticos.

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6-Vacinação

o Objetivo

A vacinação é a intervenção de saúde pública mais eficaz e bem-sucedida para


salvar vidas e promover a saúde, logo após a disponibilização de água potável e de
esgotos e representam um dos maiores avanços da ciência e da medicina na luta 17
contra a doença. A vacinação fornece proteção individual e proteção da comunidade,
ou seja, garante proteção mesmo das pessoas não vacinadas, a partir de uma
determinada taxa de vacinação da população.

Nas últimas décadas houve uma redução drástica da incidência das doenças
preveníveis por vacinação, o que faz com que a atual geração de pais de crianças
pequenas não esteja familiarizada com as consequências dessas doenças,
contribuindo assim para a diminuição da perceção da gravidade e da suscetibilidade
para contrair estas doenças no público-alvo.

Primeiramente, as vacinas visam proteger os indivíduos vacinados de doenças


infeciosas. Além desta proteção direta, conferem também proteção indireta aos
indivíduos não imunes, pela presença e proximidade de indivíduos imunes pela
vacinação. Assim, as vacinas protegem não só os indivíduos vacinados, mas também
a própria comunidade. Este fenómeno designa-se «imunidade de grupo». O efeito
das vacinas na redução da incidência de doenças numa comunidade combina então

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estes dois mecanismos: proteção indireta dos não vacinados e proteção direta dos
vacinados.

Ao conferir proteção contra a infeção, e não apenas contra a doença, a vacinação é


crucial para evitar epidemias, pois limita a rapidez com que uma infeção se transmite,
e para erradicar doenças. Note-se que se a vacinação protegesse apenas contra a
doença, sem afetar a suscetibilidade à infeção ou a sua transmissão, ela não
contribuiria para a erradicação de doenças infeciosas.

18

o Riscos

Na década de 70 vários fatores contribuíram para o despertar dos movimentos anti


vacinação: a diminuição dos surtos doença infeciosa; o boom no desenvolvimento de
vacinas e a integração destas no calendário vacinal; e, os meios de comunicação,
permitindo a difusão generalizada de informação sem validade científica sobre os
danos das vacinas.

O conceito de segurança deve entrar em linha de conta com a carga e custo da


doença, o risco/benefício das alternativas terapêuticas e o risco de base dos doentes.
Neste último caso é fácil compreender que uma substância utilizada como
intervenção preventiva numa população, por definição sem doença, deve ter uma
taxa de efeitos adversos muitíssimo mais baixa do que a outra utilizada para tratar
por exemplo, uma doença maligna, em que o risco de base é muito mais alto e

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portanto está-se disposto a tolerar muito mais os efeitos adversos, já que o
prognóstico da doença não tratada é mau.

As vacinas são submetidas a estudos rigorosos antes de serem administradas


e continuam a ser vigiadas mesmo após a sua comercialização. Numa fase inicial são
testadas em cobaias não humanos suscetíveis ao agente infecioso e o seu efeito
protetor é estudado, por comparação com um grupo idêntico de cobaias não
vacinados, quando os dois grupos são expostos ao agente. Este tipo de estudos
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permite determinar a dose mínima capaz de induzir proteção e de normalizar a
composição da vacina. Numa fase mais avançada, as vacinas são também testadas
em voluntários humanos. Investiga-se a resposta imune (anticorpos produzidos e
sua titulação) e as variações individuais na resposta à vacina.

As contra-indicações são raras e podem ser permanentes ou transitórias. Qualquer


adiamento da vacinação devido a uma falsa contra-indicação constitui uma
oportunidade perdida de vacinação. Algumas das falsas contra-indicações às vacinas
são: reações locais ligeiras a moderadas a uma dose anterior; doença ligeira aguda,
com ou sem febre (exemplo: infeção respiratória, diarreia); terapêutica antibiótica
concomitante; história pessoal ou familiar de alergia; doença crónica cardíaca,
pulmonar, renal ou hepática; história anterior de sarampo, parotidite epidémica,
rubéola ou outra doença alvo de uma vacina.

o Composição

As vacinas são administradas a indivíduos saudáveis e por vezes vulneráveis (como


crianças e idosos). Acresce que, frequentemente, o são de forma massiva, como
sucede no âmbito de programas nacionais de vacinação. Entende-se assim que o seu
desenvolvimento e a sua produção sejam extremamente rigorosos.

Uma vacina é uma substância derivada, ou quimicamente semelhante, a um agente


patogénico causador de doença. Consideram-se, em geral, dois grandes tipos de
vacinas: vacinas vivas atenuadas e vacinas mortas ou inativadas.

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As vacinas vivas atenuadas contêm estirpes modificadas de um agente patogénico
(bactéria ou vírus), que foram enfraquecidas por meio de passagens por um
hospedeiro não natural ou por um meio que lhe seja desfavorável. Estas estirpes
mantêm a capacidade de se multiplicar dentro do hospedeiro e continuar a ser
suficientemente antigénicas para induzir uma forte resposta imunitária. Exemplos:
vacina contra a varicela-zoster, vacina oral contra o vírus da poliomielite-Sabin,
vacina contra a febre amarela, vacina contra o sarampo, papeira epidémicas rubéola
(VASPR) e vacina contra a tuberculose (BCG).

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As vacinas mortas ou inativadas contêm o agente bacteriano ou viral morto ou


inativado através de tratamento químico ou por calor, perdendo a capacidade de se
multiplicar. Exemplos: vacina inativada contra a poliomielite-Salk, vacina contra a
tosse convulsa/pertussis, vacina contra a raiva, vacina contra hepatite A e B, vacina
contra a doença invasiva por Streptococcus pneumoniae, vacina contra a doença
invasiva por Neisseria meningitidis C (MenC), vacina contra a doença invasiva por
Haemophilus influenzae, vacina contra a febre tifóide, vacina contra a cólera, vacina
contra a gripe e a vacina contra o tétano.

As vacinas têm um processo de produção complexo, combinando métodos de


fabrico biológico e farmacológico. A fase biológica envolve a preparação dos
antigénios, através de culturas dos microrganismos (bactérias ou vírus), que são
posteriormente purificados e atenuados ou inativados. A fase farmacológica consiste
na adição de outros componentes, utilizados para facilitar o desencadear da resposta
imunológica ou para conservar as vacinas em bom estado desde o seu fabrico até à
sua administração.

o Vias de administração

Uma vacina é uma preparação antigénica, cuja administração visa produzir no


indivíduo vacinado proteção contra um ou mais agentes infetantes. Uma
característica determinante das vacinas é serem «imunogénicas», ou seja,
desencadearem uma reação imunitária humoral e celular no vacinado sem
provocarem doença.

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A maioria das vacinas apresenta-se sob forma injetável. A via de administração
das vacinas é determinada durante a fase de pré-aprovação, com base na sua
composição e na sua imunogenicidade. As vacinas devem ser administradas em locais
onde induzam uma resposta imunitária adequada e onde a possibilidade de lesão
(local, neurológica ou vascular) seja mínima. Para evitar reações adversas locais ou
sistémicas e garantir uma resposta imunitária adequada, devem ser cumpridas as
recomendações do fabricante para administração, incluindo as que respeitam ao local
anatómico.

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Por exemplo, a imunogenicidade da vacina contra a hepatite B é substancialmente


menor quando administrada no glúteo em alternativa ao deltoide. Presume-se que
esta redução na resposta imunitária se deva à injeção inadvertida no tecido
subcutâneo ou adiposo em vez do músculo. Geralmente é recomendada a
administração por injeção IM profunda de vacinas adjuvadas, uma vez que a sua
administração SC ou intradérmica (ID) pode causar acentuada irritação, induração,
descoloração da pele e formação de granulomas. A via SC apresenta menor risco de
lesões neurovasculares, pelo que é recomendada para vacinas menos reatogénicas e
que sejam imunogénicas por esta via, como as vacinas vivas.

Para conferir uma proteção adequada, a maior parte das vacinas requer a
administração de várias doses. As recomendações sobre a idade e os intervalos
da vacinação são baseados em múltiplos fatores, como sejam:

> Capacidade de resposta do indivíduo à vacina;

> Consoante a idade, o risco de contrair a doença e suas complicações;

> Interferência potencial com resposta imunitária através de anticorpos maternos.

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o Plano Nacional de Vacinação (PNV)

 Doenças alvo do PNV

Em Portugal, o Programa Nacional de Vacinação, é universal, gratuito e


acessível a todos os cidadãos, incluindo imigrantes legais e ilegais e abarca um
conjunto de vacinas recomendadas para os diferentes grupos etários e para 22
determinados grupos de risco. Em Portugal, o Programa Nacional de Vacinação (PNV)
iniciou-se em 1965 e, mais recentemente, em junho de 2015 foi atualizado.

Desde a sua introdução, mais de 7 milhões de crianças e vários milhões de adultos


foram vacinados em Portugal e as doenças abrangidas pelo programa estão
eliminadas ou controladas, prova da sua efetividade e sucesso.

O PNV aplica-se, gratuitamente, a todas as pessoas presentes em Portugal.


Recomendam-se diferentes esquemas vacinais gerais, em função da idade e
do estado vacinal anterior e ainda esquemas vacinais específicos para
grupos de risco ou em circunstâncias especiais:

• Às crianças, dependendo da idade, recomendam-se 13 vacinas: contra hepatite


B, difteria, tétano, tosse convulsa, poliomielite, doença invasiva por Haemophilus
influenzae do serotipo b, infeções por Streptococcus pneumoniae de 13 serotipos,
doença invasiva por Neisseria meningitidis do grupo B e do grupo C, sarampo,

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parotidite epidémica, rubéola e ainda a vacina contra infeções por vírus do Papiloma
humano;

• Durante toda a vida recomendam-se as vacinas: contra tétano e difteria.


Dependendo do número de doses anteriores, da idade e do risco acrescido,
recomendam-se também, durante toda a vida, as vacinas contra sarampo, rubéola e
poliomielite;

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• Às grávidas, em cada gravidez, recomenda-se uma dose da vacina contra a tosse


convulsa;

• A grupos com risco acrescido para determinadas doenças recomendam-se


ainda, para além de várias das vacinas recomendadas à população em geral, as
vacinas contra: tuberculose, infeções por Streptococcus pneumoniae de 23 serotipos,
doença invasiva por Neisseria meningitidis dos grupos ACWY e hepatite A, quando
expressamente referidas nesta norma como recomendadas e gratuitas.

De acordo com o Despacho n.º 12434/2019, publicado no Diário da


República, 2ª série – N.º 250 de 30 de dezembro de 2019, o Programa
Nacional de Vacinação passa a incluir, no esquema vacinal recomendado:

• O alargamento a todas as crianças, aos 2, 4 e 12 meses de idade, da vacinação


contra doença invasiva por Neisseria meningitidis do grupo B (vacina MenB).

• O alargamento ao sexo masculino, aos 10 anos de idade, da vacinação contra


infeções por vírus do Papiloma humano (vacina HPV), incluindo os genótipos
causadores de condilomas ano-genitais. A vacina contra rotavírus será administrada
a grupos de risco a partir de dezembro de 2020.

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 Campanhas de vacinação

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O sucesso de um programa de vacinação depende da sua capacidade para


alcançar elevados níveis de imunidade da comunidade, que permitem prevenir surtos
locais e epidemias, da confiança do público na vacinação e da eficácia das vacinas.
Na maior parte dos países, o governo ou as autoridades de saúde pública, definem
um calendário de vacinação recomendada. O principal objetivo deste calendário é
conseguir a melhor proteção na idade mais adequada e mais precoce possível. A
vacinação deve ser cumprida na idade recomendada, sem atrasos, para evitar
complicações potencialmente fatais de doenças evitáveis.

 Programa Nacional de Vacinação em vigor

Calendário de vacinação recomendado, segundo o Programa Nacional de


Vacinação de 2020.

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 Vacinação complementar

O Programa Nacional de Vacinação é aplicado através de um Esquema Vacinal


Recomendado a toda a população presente em Portugal, de acordo com a idade. O
esquema vacinal recomendado tem como objetivo obter a melhor proteção, na idade 26
mais adequada e o mais precocemente possível.

Conforme as suas características e a epidemiologia das doenças numa determinada


zona ou país, as vacinas podem:

 integrar os programas de vacinação nacionais (com esquemas adaptados à


realidade de cada país ou região

 ser utilizadas para determinados grupos de risco ou em circunstâncias


especiais, como as viagens

 ser aplicadas mediante indicação médica, numa base individual

Em Portugal as alterações (introdução de novas vacinas, alterações ao esquema


vacinal ou à população alvo da vacina) no Programa Nacional de Vacinação (PNV)
são feitas sob proposta da Comissão Técnica de Vacinação (CTV), criada e definida
por Portaria (243/2013 DR II serie n.º 78 de 22 abril 2013) (hiperligação legislação).
Esta comissão é um órgão consultivo da Direção-Geral da Saúde constituída por
especialistas de diversas áreas do conhecimento que fundamentam cientificamente
todas as suas propostas, submetem-nas à Direção-Geral da Saúde que, por sua vez,
as submete à tutela.

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7-Vacinação extra plano

o Prevenção sazonal

 Gripe

A vacinação contra a gripe é a principal medida de prevenção contra a gripe e tem 27


como objetivo proteger as pessoas mais vulneráveis, prevenindo a doença e as suas
complicações. É uma doença contagiosa que, maioritariamente, cura
espontaneamente. Mas podem ocorrer complicações, particularmente em pessoas
com doenças crónicas ou com 65 ou mais anos de idade.

Nos anos mais recentes a maior atividade gripal tem sido observada entre os meses
de dezembro e fevereiro.

Os vírus da gripe estão em constante alteração e a imunidade provocada pela vacina


não é duradoura, pelo que as pessoas se devem vacinar anualmente.

A gripe é a doença mais frequente do adulto e pode ser prevenida pela vacinação.

A vacinação inicia-se em Outubro e deve ser feita preferencialmente até ao fim do


ano. A vacina pode ser administrada durante todo o outono e inverno.

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A vacinação contra a gripe é fortemente recomendada a:

 Pessoas com idade igual ou superior a 65 anos;

 Doentes crónicos e imunodeprimidos (a partir dos 6 meses de idade);

 Grávidas;

 Profissionais de saúde e outros prestadores de cuidados (ex.: lares de idosos).

Aconselha-se também a vacinação às pessoas com idade entre os 60 e os 64 anos.


28

o Prevenção Prolongada

 Pneumocócicas 7, 13 e 23 serotipos

Streptococcus pneumoniae é uma bactéria que pode causar um espectro amplo


de doença, desde otite média aguda, pneumonia, meningite e/ou sepsis. A nível
mundial estas infeções são frequentes em idade pediátrica, particularmente abaixo
dos 2 anos de idade. O aumento de estirpes resistentes aos antimicrobianos veio
colocar problemas adicionais de tratamento.

As vacinas comercializadas em Portugal contra infeções por Streptococcus


pneumoniae são:

• Vacina pneumocócica polissacárida conjugada de 10 valências (Pn10) – Synflorix®


(comercializada por GlaxoSmithKline Biologicals S.A.), licenciada para utilização
entre as 6 semanas e os 2 anos de idade;

• Vacina pneumocócica polissacárida conjugada de 13 valências (Pn13) – Prevenar


13® (comercializada por Pfizer), licenciada para utilização entre as 6 semanas e os
5 anos de idade;

• Vacina pneumocócica polissacárida de 23 valências (Pn23) – Pneumo 23®


(comercializada por Sanofi Pasteur MSD, S.A.), licenciada para utilização a partir dos
2 anos de idade. A vacina polissacárida conjugada recomendada é a Pn13, devido à
maior abrangência de serotipos e à concordância de cerca de 80% entre os serotipos
atualmente causadores de DIP em Portugal e os serotipos existentes nesta vacina.

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 Meningocócicas grupo B

A vacina meningocócica protege contra infeções causadas pela bactéria Neisseria


meningitidis (meningococo).

As infeções meningocócicas podem causar meningite (uma infeção do tecido que


recobre o cérebro), pressão arterial perigosamente baixa (choque) e morte. Essas
bactérias são a causa principal de meningite bacteriana em crianças e a segunda
causa principal de meningite bacteriana em adultos.
29

 Hepatite A

A hepatite A é uma infeção aguda, causada por um vírus ARN, membro do género
Hepatovírus, da família dos Picornaviridae, designado por vírus da hepatite A (VHA)
que, agora, à semelhança do que acontece em outros países europeus, exibe
expressão epidémica relacionada com os seguintes comportamentos em cidadãos
vulneráveis e, em particular, homens que fazem sexo com homens (HSH), quando
um dos parceiros está infetado:

o Sexo anal (com ou sem preservativo);

o Sexo oro-anal.

O principal modo de transmissão é por via fecal-oral através da ingestão de alimentos


ou água contaminados (pode ocorrer em pessoas que viajam para zonas endémicas),
ou por contacto próximo interpessoal com pessoas infetadas;

Embora a intensidade da epidemia atual, bem como a história natural da doença não
sejam inteiramente conhecidas, a infeção por VHA pode ser assintomática, subclínica
ou provocar um quadro agudo, quase sempre autolimitado, associado a febre, mal-
estar, icterícia, colúria, astenia, anorexia, náuseas, vómitos e dor abdominal;

A frequência e gravidade de sinais e sintomas depende, em regra, da idade do


doente. A infeção só é sintomática em 30% dos casos com idade inferior a 6 anos.
Em crianças mais velhas e nos adultos a infeção provoca, em regra, doença clínica
(hepatite aguda) em mais de 70% dos casos.

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 Varicela

A varicela é uma doença predominantemente da infância, benigna e altamente


contagiosa, com taxas de transmissão aos contactos suscetíveis de 61-100%(1).
Pode contudo associar-se a complicações graves, quer associadas a sobre-infeção
bacteriana (celulite, pneumonia, fasceíte, choque tóxico), quer ao próprio VVZ
30
(cerebelite, encefalite, pneumonia). Estas ocorrem sobretudo em situações de
imunodeficiência celular, mas também em crianças previamente saudáveis. Nas
leucemias e transplante de órgão, cerca de 50% das crianças desenvolvem
complicações com uma mortalidade global de 7 a 17% se não forem tratadas com
aciclovir2.

Os adolescentes e os adultos são mais suscetíveis a complicações graves, com um


aumento vinte vezes superior na mortalidade entre os 15 e os 44 anos.
A infeção na grávida acarreta um risco adicional para a mulher, nomeadamente pela
maior incidência de pneumonite que, sem tratamento, pode ser fatal em cerca de
40% dos casos5. Também no feto, pode ocorrer a síndrome de Varicela Congénita6
e, no recém-nascido, varicela grave quando a doença materna se manifesta 5 dias
antes ou 2 dias após o parto.

 Rotavírus

A gastroenterite aguda é uma doença muito comum nos primeiros dois anos de
vida. Frequentemente é de causa viral e, nos países de clima temperado, o agente
mais implicado é o rotavírus. Nos países desenvolvidos, grande parte dos casos de
gastroenterite aguda por rotavírus não necessita de internamento, mas esta doença
tem um impacto importante na saúde pública.

A vacina contra o rotavírus, principal causador de gastroenterites em crianças,


passou a integrar o PNV, mas será aplicada apenas para grupos de risco.

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 Zona

A zona é uma erupção cutânea dolorosa com formação de vesículas.


Ocorre geralmente numa parte do corpo e pode durar várias semanas. Poderá
originar uma dor intensa e prolongada e cicatrizes. Menos frequentemente, podem
ocorrer infeções bacterianas na pele, fraqueza, paralisia muscular e perda de audição
31
ou visão. A zona é causada pelo mesmo vírus que provoca a varicela.
Após ter tido varicela, o vírus que a provocou permanece nas células nervosas do
seu corpo. Por vezes, ao fim de muitos anos, o vírus torna-se novamente ativo e
provoca a zona. Após a cicatrização das vesículas da zona, a dor pode durar meses
ou mesmo anos e ser intensa. Esta dor prolongada no nervo denomina-se nevralgia
pós-herpética ou NPH. É uma vacina usada para prevenir a zona (herpes zoster) e a
nevralgia pós-herpética (NPH) associada ao herpes zoster, a dor prolongada no nervo
que surge após a zona. É utilizado para vacinar indivíduos com 50 ou mais anos de
idade. Não pode ser usado no tratamento da zona ou da dor associada à zona já
existente.

 Papiloma Vírus Humano

Passou a estar disponível no PNV para os rapazes nascidos a partir de 1 de janeiro


de 2009. Esta vacinação protege global e indiretamente contra o cancro do colo do
útero feminino, mas também contra condilomas ano-genitais, lesões pré-cancerosas
genitais e cancro do ânus nos dois géneros.

O HPV é considerado o segundo carcinogéneo mais importante a seguir ao tabaco.


Está associado a 4,5% dos cancros (8,6% na mulher e 0,8% no homem) e estima-
se que ocorram cerca de 630 mil novos casos por ano no mundo.

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 Tosse convulsa

A tosse convulsa, também denominada como tosse coqueluche ou pertússis, é uma


doença infeciosa aguda, causada pela bactéria Bordetella pertussis, que compromete
o aparelho respiratório (traqueia e brônquios).

A tosse convulsa caracteriza-se por três fases:


32
Na fase catarral (1-2 semanas), ocorre inflamação e corrimento nasal, tosse não
produtiva, febre baixa (sintomas do trato respiratório alto).

Na fase paroxística (2-6 semanas), verifica-se um agravamento da tosse com


momentos de intensidade, que podem ser acompanhados de cianose (coloração
azulada da pele e dos lábios) e inchaço da língua. Tipicamente existe um ruído
inspiratório e a tosse pode provocar o vómito. A tosse é mais frequente no período
noturno e agrava-se com o choro ou a deglutição.

Na fase de convalescença (2-6 semanas), há uma diminuição progressiva da


intensidade e frequência da tosse, desaparecendo o ruído inspiratório e os vómitos.
Pode prolongar-se durante meses com episódios recorrentes de tosse,
desencadeados por infeções respiratórias virais.

Podem ocorrer formas atípicas de doença em:

 recém-nascidos e lactentes, em que a fase catarral é muito curta ou mesmo


ausente, inexistência de guincho inspiratório, apneia e dificuldade respiratória

 crianças vacinadas, adolescentes e jovens adultos, em que a sintomatologia


é menos pronunciada, podendo manifestar-se como tosse persistente

A vacinação constitui a medida preventiva mais importante. No Programa Nacional


de Vacinação (PNV) está contemplada a administração de 5 doses da vacina pertussis
acelular, segundo o esquema: 2, 4, 6, 18 meses e 5 anos.

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8-Lisados bacterianos

A Agência Europeia do Medicamento (EMA) recomenda que os medicamentos


contendo lisados bacterianos sejam utilizados apenas na prevenção de infeções
respiratórias recorrentes, com exceção da pneumonia.

Esta recomendação teve origem numa revisão efetuada pelo Comité para 33
Medicamentos de Uso Humano (CHMP) da EMA que concluiu que não existem dados
robustos que demonstrem a eficácia destes medicamentos no tratamento de infeções
respiratórias, nem na prevenção da pneumonia, pelo que não devem ser utilizados
para estes propósitos.

Os medicamentos contendo lisados bacterianos estimulam o sistema imunitário para


reconhecer e combater infeções, estando disponíveis em diferentes formas
farmacêuticas e vias de administração.

Apesar da limitação dos dados considerados nesta revisão, foi evidenciada alguma
eficácia na prevenção de infeções recorrentes do trato respiratório.

Os medicamentos contendo lisados bacterianos não devem ser prescritos para o


tratamento de infeções respiratórias nem para a profilaxia de pneumonia devido à
falta de dados de eficácia.

As indicações terapêuticas destes medicamentos serão restringidas apenas para a


profilaxia de infeções recorrentes do trato respiratório.

Os medicamentos contendo lisados bacterianos apenas devem ser utilizados para


prevenir o aparecimento de infeções das vias aéreas respiratórias (exceto
pneumonia) em doentes que apresentem estas infeções com frequência.

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9-Vacinação do viajante – prevenção

o Vacina contra a cólera

A cólera é uma doença que se pode apresentar desde uma forma subclínica,
passando pela diarreia do viajante autolimitada, até a casos mais graves com início
súbito de diarreia abundante, aquosa, com náuseas vómitos, que podem levar à 34
desidratação e, em casos extremamente graves, causar mesmo à morte.

Deve-se evitar o consumo de água, bebidas e alimentos potencialmente


contaminados em países em que a cólera é endémica ou em que ocorram surtos de
cólera.

A vacina contra a cólera é uma vacina inativada, para administração oral, em


indivíduos com idade igual ou superior a 2 anos e está indicada para viajantes para
zonas endémicas/epidémicas da doença. O esquema vacinal para crianças entre os
dois e os seis anos de idade é de três doses com intervalo de uma semana entre
cada toma. Os indivíduos maiores de seis anos devem tomar duas doses com
intervalo de uma semana.

A vacina contra a cólera protege contra as infeções causadas por uma bactéria
denominada Vibrio cholerae, toxinogénico do serogrupo O1. A infeção é contraída de
forma direta pela ingestão de alimentos, como saladas ou mariscos, ou água

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contaminados e indiretamente pelo contacto com fezes ou vómitos de pessoas
infetadas. A doença só afeta o ser humano, não havendo hospedeiros animais ou
vetores.

A vacina confere imunidade à bactéria uma semana após a conclusão do esquema


vacinal. A vacina pode provocar efeitos secundários incluindo dor abdominal, diarreia,
perda de consistência das fezes, náuseas e vómitos.

35
o Vacina contra doença meningocócica

A doença meningocócica é uma infeção causada pela bactéria neisseria meningitidis,


dos serogrupos A,C,W135, Y, na qual as meninges (membranas que revestem o
cérbero e a medula espinhal) inflamam e pode levar a um quadro de septicemia
meningocócica. Transmite-se através de aerossóis e gotículas respiratórias vindas do
nariz e faringe de pessoa infetadas. A maioria dos infetados é assintomática, sendo
apenas portadores da doença. Caso existam sintomas, manifestam-se com dores de
cabeça intensas, febre, náuseas, vómitos e rigidez na nuca.

O tratamento é feito no hospital, através de antibióticos e líquidos administrados via


intravenosa. A vacina contra a doença meningocócica invasiva provocada pelos
serogrupos A, C, W135, Y é uma forma de prevenir a doença e é administrada com
uma dose a indivíduos com mais de um ano.

o Vacina contra a hepatite A

A hepatite A é uma infeção provocada por um vírus ARN, do género hepatovírus.


Transmite-se através do consumo de água ou alimentos contaminados, do contacto
direto com pessoas infetadas, ou contacto sexual, mais comum em homens que
praticam sexo com homens.

A hepatite A provoca sintomas como a febre, mal-estar, náuseas, vómitos, dor


abdominal, falta de apetite, urina escura e icterícia (pele e olhos amarelados).
Geralmente, os sintomas desaparecem ao fim de dois meses, mas podem durar até

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seis. Esta doença não tem um tratamento específico, dependendo dos casos e
sintomas, mas a não ingestão de bebidas alcoólicas é uma das recomendações dos
médicos, de modo a não danificar (mais) o fígado.

A vacina contra a hepatite A é uma forma de prevenção da doença, não faz parte do
Programa Nacional de Vacinação (PNV), mas é gratuita. É recomendada a jovens
entre os 12 e 17 anos que tenham contacto próximo a doentes, adolescentes com
comportamentos de risco na transmissão da doença, e a viajantes com destino à
América Latina, África e Ásia. É administrada em duas doses com seis meses de
intervalo. 36

o Vacina contra a hepatite A + B

No âmbito do PNV a idade máxima para iniciar o esquema vacinal desta vacina é <18
anos e não existe limite de idade para completar o esquema vacinal. A vacinação é
a forma mais efetiva de prevenir a doença (cerca de 95% a 99% das pessoas,
desenvolvem anticorpos protetores, após a vacinação).

Para reduzir a incidência e mortalidade por hepatite B, mantendo a doença


controlada, uma vez que o vírus circula na comunidade, através de portadores
crónicos.

Para evitar a doença na sequência de viagem a país em que seja endémica. Para
promover a imunidade de grupo, protegendo também os que não podem ser
vacinados ou não respondem à vacinação.

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10-Alergias

o Definição

As alergias são respostas exageradas do organismo após o contacto com o


ambiente que o rodeia, sendo mais frequentes quando existe uma tendência familiar,
isto é, um risco genético para a sua ocorrência. Ou seja “as alergias são um excesso 37
de defesas”, por oposição a outras situações clínicas em que existe falta de defesas.

Para além da genética, muitos fatores de risco relacionados com o estilo de vida das
sociedades ocidentais – sedentarismo, alteração da dieta, obesidade, poluição dentro
e fora dos edifícios, exposição a alergénios, consumo excessivo de medicamentos,
nomeadamente de antibióticos – são algumas dos atributos com peso significativo no
aumento da expressão quase explosiva que ocorreu nas doenças alérgicas nas
últimas décadas. Na Europa, estas enfermidades afetam cronicamente mais de um
terço da população e Portugal não é exceção.

o Tipos de reação de hipersensibilidade (IV)

A hipersensibilidade a fármacos difere dos efeitos tóxicos e adversos que podem ser
esperados dessas substâncias e de problemas decorrentes de interações
medicamentosas. A hipersensibilidade diminui com o tempo. Os anticorpos IgE estão
presentes em 90% dos pacientes 1 ano após a reação alérgica, mas apenas em 20 a
30% após 10 anos. Pacientes que sofreram reações anafiláticas estão mais propensos
a manter os anticorpos por mais tempo.

Deve-se ensinar as pessoas com alergia a fármacos a como evitar o fármaco e a


carregar uma identificação ou um bracelete de alerta. Os sinais e sintomas das
alergias a fármacos variam de acordo com o paciente e o fármaco, podendo um
mesmo fármaco causar diferentes reações em diferentes pacientes. A mais grave é
a anafilaxia (reação de hipersensibilidade tipo I); exantema (p. ex., erupção
morbiliforme), urticária e febre são comuns.

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o Reação anafilática: definição e terapêutica

A anafilaxia surge quando a reação alérgica é muito intensa. No extremo, o paciente


pode evoluir para um choque anafilático, que é um colapso circulatório provocado
por uma intensa reação alérgica. A anafilaxia costuma ocorrer em pacientes com
histórico prévio de alergias a alguma substância, mas pode também ocorrer em
38
pessoas que nunca tiveram episódios alérgicos. O quadro é imprevisível. Os sintomas
costumam ter lugar em poucos minutos após o contato com os alergénios mas podem
demorar até 1 hora a produzir efeito.

Os dois sintomas mais comuns e que ocorrem em até 90% dos casos são:

Urticária: é uma erupção cutânea, muito pruriginosa, caracterizada por placas


avermelhadas distribuídas pelo corpo

Angioedema: trata-se de um inchaço da pele ou mucosa. Os mais comuns são os


edemas em volta dos olhos, nos lábios, na língua. O mais perigoso é o edema da
laringe, também conhecido como edema de glote.

Hoje a resposta à anafilaxia está numa caneta de injeção de adrenalina que pode
literalmente salvar vidas. O paciente com sintomas de anafilaxia deve ser
imediatamente transportado para um hospital. Quadros novos de angioedema ou
urticárias também devem ser avaliados por um médico, já que é possível prever a
sua evolução para choque anafilático. O tratamento é feito com adrenalina,
corticóides, broncodilatadores e anti-histamínicos.

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Alguns doentes com história clínica de reação anafilática têm sempre consigo
uma injeção automática de adrenalina para autoadministração em caso de
emergência. A epinefrina, uma substância geralmente conhecida
como adrenalina, é uma solução eficaz que pode salvar vidas.

O que é que faz? Ao ser injetada, esta hormona aumenta a pressão arterial através
de um estreitamento dos vasos sanguíneos e normaliza a respiração relaxando os
músculos dos pulmões. Por outro lado, a epinefrina aumenta a frequência cardíaca e
reduz o inchaço que se pode formar no rosto e nos lábios devido à reação alérgica.
Uma ação rápida que reverte o choque anafilático. 39

o Rinite alérgica

A rinite alérgica é causada pela exposição da mucosa nasal a agentes


alergénios a que o doente se sensibilizou. Os principais sintomas de rinite alérgica
são:

 Espirros;

 Comichão nasal persistente;

 Pingo do nariz alternando com o nariz entupido;

 Dificuldade na perceção dos odores.

Estes sintomas mais comuns podem acompanhar-se de prurido ou comichão na


garganta, nos ouvidos e olhos.

Nos casos mais graves, a rinite alérgica pode associar-se a hemorragias nasais
frequentes ou a tosse frequente.

Nas crianças e adolescentes a rinite afeta a qualidade de vida de forma


significativa, com:

 Perturbações de sono;

 Despertares frequentes durante a noite devido ao bloqueio nasal intenso;

 Secura da orofaringe.

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Tudo isto se reflete na capacidade de aprendizagem e um maior cansaço no dia-a-
dia.

As principais causas de rinite são:

 Exposição a pó doméstico,

 Exposição a pólenes,

 Exposição a pelos de animais,

 Manifestações de rinite no contexto de alergia a medicamentos ou a 40


alimentos.

Como deve ser feito o tratamento da rinite?

 Identificar quais os agentes causadores;


 Medidas de higiene e controle ambiental;
 Tratamento com fármacos como anti-histamínicos e/ou corticoides nasais
e/ou antileucotrienos;
 Vacinas antialérgicas.

o Urticária

A urticária caracteriza-se pelo aparecimento súbito de edema localizado ou


disseminado da pele acompanhado por sensação de prurido, queimadura ou picada.
O angioedema é um tipo semelhante mas dos ocorre nos tecidos mais profundos sob
a pele. Falamos de urticária quando surgem placas ou babas na pele que dão
comichão. Podem aparecer em qualquer lugar e ter tamanhos variados. Geralmente
cada baba dura menos de 24 horas. No entanto, aparecem novas quando as
anteriores desaparecem. Habitualmente não se estende para lá das seis semanas.

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o Dermatite de contacto

A palavra “dermatite” é utilizada para descrever qualquer inflamação ao nível da


pele, um fenómeno relativamente frequente e que pode ter diversas causas. Assim,
a dermatite de contacto é a inflamação causada, como o nome indica, pelo contacto
direto com algumas substâncias. Por norma, desenvolve-se poucos minutos após a
41
exposição e pode traduzir-se por:

 Vermelhidão;

 Comichão, por vezes, intensa;

 Edema (inchaço);

 Pele seca, gretada e a descamar;

 Sensibilidade ao toque;

 Pequenas borbulhas e/ou bolhas, que podem formar crostas.

Existem dois grandes tipos de dermatite de contacto, dependendo do


mecanismo que a causa:

 Irritativa ou traumática– É a mais comum e resulta do contacto repetido


ou prolongado com substâncias que danificam a camada protetora da pele,
deixando-a mais sensível. Pode surgir em qualquer pessoa, sendo
particularmente comum em profissões que envolvem o contacto frequente das
mãos com detergentes e/ou outros produtos potencialmente agressivos (ex:
enfermeiros, cabeleireiros e cozinheiros). O álcool etílico e alguns champôs e
detergentes também têm potencial para despoletar esta reação;

 Alérgica– por norma, ocorre após contacto com substâncias às quais a


pessoa já tenha sido exposta. Este tipo de dermatite surge apenas em pessoas
suscetíveis e, uma vez sensibilizadas pela substância, basta uma pequena
quantidade para desencadear uma reação. Alguns exemplos de substâncias
que podem despoletar este tipo de reação são o níquel (utilizado em joalharia
e fivelas de cintos, por exemplo) e o formaldeído (utilizado em desinfetantes
e roupas).

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o Reação alérgica a medicamentos

O sistema regulador garante que os medicamentos disponíveis no mercado, incluindo


as vacinas, são eficazes, seguros e de qualidade. Contudo, segurança não significa
ausência de risco. Segurança significa que a relação benefício-risco é favorável, ou
seja, que os riscos são aceitáveis tendo em conta os benefícios esperados e as
42
alternativas existentes.

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11-Doenças autoimunes

o Definição

O sistema imunitário permite-nos viver num mundo preenchido por bactérias, vírus,
fungos e outros seres vivos. Muitos destes organismos não interagem negativamente
connosco, mas outros são patogénicos, alimentam-se das nossas células ou 43
parasitam-nos de alguma forma, podendo causar doenças e até a morte. Ao longo
da evolução, os animais e os mamíferos foram desenvolvendo um sistema imunitário
que lida com estas ameaças em batalhas microscópicas. No entanto, por razões que
não são inteiramente conhecidas, em algumas pessoas este mecanismo de proteção
ataca os próprios órgãos e tecidos, desenvolvendo-se assim as doenças autoimunes.
As doenças imunomediadas (doenças autoimunes) podem acontecer em pessoas com
predisposição genética ou porque a agressão vinda do exterior é para lá do normal.

Basta fazer uma pequena ferida na pele para o mundo exterior ter acesso ao nosso
interior. Mas as bactérias, os vírus e outros agressores podem também entrar no
nosso organismo pela boca e por outros orifícios como os dos órgãos sexuais. O corpo
está preparado para receber estes intrusos. O sistema imunitário é útil porque ajuda-
nos a viver todos os dias lutando contra estes agressores.

Esta defesa é formada por células chamadas glóbulos brancos ou leucócitos que
viajam na corrente sanguínea e estão alojados em certos locais como os gânglios
linfáticos. Quando um agente patogénico é encontrado num determinado tecido, os
glóbulos brancos são chamados para o local e atravessam as paredes dos vasos
sanguíneos para combater o organismo estranho. Tecidos em contacto com o exterior
como os intestinos e os pulmões, onde há mais micro-organismos, são lugares com
uma forte presença destes polícias do organismo, que têm várias formas de atuar.

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O próprio corpo reconhece proteínas nossas como sendo estranhas. Por algum
motivo, os linfócitos produzem anticorpos que se ligam a proteínas das células de um
tecido do corpo, promovendo uma resposta imunitária contra esse tecido. É uma
resposta que se autoalimenta e entra num ciclo vicioso. Não se sabe qual o motivo
primário que inicia este processo de inflamação. Achamos que é uma combinação do
agressor, do funcionamento do sistema imunitário da pessoa e da sua disposição
genética.

44
o Lúpus eritematoso

O lupus eritematoso sistémico (LES) é uma doença crónica imunomediada.


Caracteriza-se pela produção de anticorpos contra componentes do próprio
organismo que podem causar lesão de diversos órgãos.

O LES afecta 0.07% dos portugueses, tipicamente mulheres em idade reprodutiva.


O início da doença ocorre entre os 16 e os 49 anos em cerca de 75% dos casos, mas
a doença pode também ocorrer em crianças ou em indivíduos com mais de 65 anos.
O LES é mais frequente nos africanos, asiáticos e hispânicos e pode apresentar
características clínicas distintas nestas populações.

A evolução do LES é muito variável, podendo apresentar-se como uma doença com
constante atividade e persistência de sintomas ao longo do tempo, ou evoluir com
períodos de agudização intercalados com períodos de remissão.

O LES é uma doença de causa desconhecida. Contudo, estudos realizados sugerem


que a sua etiologia é multifatorial, em que fatores genéticos, hormonais,
imunológicos e ambientais estão envolvidos. A exposição solar parece ter um papel
crucial no despoletar da doença e também no desencadear de agudizações.

O tratamento do LES é complexo e depende das manifestações clínicas e da sua


atividade.

Os objetivos principais são a indução da remissão: visando o rápido controlo da


atividade da doença e a terapia de manutenção: destinada a manter a remissão e
prevenção de agudizações.

Como medidas não farmacológicas, é crucial para o tratamento que os doentes


evitem a exposição solar, usem protector solar com elevado fator de proteção
durante todo o ano, façam exercício físico regular, realizem uma dieta equilibrada e

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suspendam o consumo de tabaco. O tratamento e monitorização de condições
associadas, como a diabetes, a hipertensão ou a dislipidemia é também outra medida
importante nos doentes com LES.

45

Relativamente aos fármacos, os mais utilizados para o tratamento do LES


são:

– Anti-inflamatórios não esteróides: especialmente nas manifestações articulares,


musculares, pericardite, pleurisia e cefaleia.

– Corticosteróides (cortisona): devido às suas propriedades anti-inflamatórias


constituem o pilar do tratamento de várias doenças autoimunes sistémicas. Pode ser
administrada por via tópica (lesões cutâneas), intra-articular (artrite), oral,
intramuscular ou intravenosa. Em particular, a via intramuscular ou intravenosa é
utilizada para administração de doses elevadas para tratar manifestações mais
graves da doença (por exemplo, no caso de envolvimento renal ou do sistema
nervoso).

– Antipalúdicos de síntese: o tratamento com antipalúdicos de síntese (p.ex:


hidroxicloroquina, cloroquina) está associado a menos complicações no curso da
doença, a redução da mortalidade e a redução da incidência de exacerbações,
devendo ser considerada uma “terapia de base” do LES. São atualmente
recomendados para todos os doentes a menos que haja contra- indicações para a
sua prescrição.

– Imunossupressores: inibem as reações de autoimunidade do LES. Os mais usados


são a azatioprina, a ciclofosfamida, o micofenolato mofetil e o metotrexato. As

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imunoglobulinas humanas endovenosas também podem ser usadas nalgumas
manifestações.

o Psoríase

46
É uma doença crónica da pele, de natureza autoimune, o que significa que surge
quando o sistema imunitário emite sinais anómalos que aceleram o normal ciclo de
crescimento das células da pele.

A psoríase é bastante comum e não é contagiosa. Este aspeto é importante, porque


pode existir o receio de contrair esta patologia ao nadar numa piscina ou pelo
contacto com pessoas afetadas.

Existem cinco tipos, sendo a forma mais comum aquela que surge em placas elevadas
e avermelhadas cobertas de uma área esbranquiçada (que corresponde a células de
pele mortas).

Uma forma particularmente incapacitante é a que afeta as articulações e que ocorre


em cerca de 10% dos doentes. Designa-se por artrite psoriática e causa dor e
deformação das articulações das mãos, pés, membros ou coluna.

Embora a psoríase se possa manifestar em qualquer idade, a maioria dos casos


ocorre entre os 15 e os 30 anos, sendo também comum entre os 50 e os 60 anos.
Afeta 1% a 3% da população e pode surgir em qualquer parte do corpo, estando
associada a doenças como a diabetes, doença cardíaca e depressão. As áreas mais
afetadas tendem a ser os cotovelos, joelhos, couro cabeludo, unhas e a região
lombar.

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Existem muitas opções terapêuticas. Como a pele apresenta características
diferentes em diversos locais do corpo, o tratamento tem de ser também distinto. De
um modo geral, a fototerapia ou os cremes são utilizados em áreas afetadas
limitadas. Os medicamentos orais ou injetáveis são úteis quando o impacto da
psoríase na qualidade de vida é importante.

Para muitos casos da psoríase em placas, o recurso a cremes hidratantes, pomadas


ou champôs é suficiente para controlar a doença. Esses tratamentos locais controlam
a inflamação e reduzem a taxa de multiplicação das células da pele. Na fototerapia
recorre-se à exposição a raios ultravioleta A ou B que conseguem também abrandar 47
a multiplicação dessas células.

Noutras situações, a exposição à luz do sol pode ser benéfica, sendo sempre
importante avaliar as melhores opções com o médico dermatologista. Outra opção é
associar um medicamento, o psoralen, à exposição solar, para se conseguir melhores
resultados.

Finalmente pode ser necessário o recurso ao laser ou a medicamentos administrados


por via oral ou injetável.

o Miastenia

A miastenia grave é uma doença autoimune relativamente rara e de causa


desconhecida, que atinge a junção neuromuscular através da produção de anticorpos
contra os recetores da acetilcolina (neurotransmissor). Como consequência, o
estímulo nervoso deixa de ser corretamente transmitido aos músculos e estes
passam a funcionar de forma menos adequada. Existem cerca de 150 casos de
miastenia grave por milhão de habitantes. A doença atinge sobretudo mulheres na
segunda e terceira décadas e homens na sexta e sétima décadas de vida.

O sintoma inicial mais frequente é a fraqueza de um músculo ou grupo muscular


localizados e não uma fraqueza muscular generalizada. Um dos locais mais
frequentemente afetados são os músculos que coordenam o olho, levando a visão
dupla e ptose palpebral (pálpebra caída). Raramente, o doente apresenta fraqueza
muscular generalizada sem atingimento ocular.

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48

Os sintomas variam e tendem a evoluir com o tempo ao atingir diversos grupos


musculares. Incluem:

 Alteração da expressão facial

 Dificuldade em mastigar e engolir

 Dificuldade em suster, fletir e estender a cabeça

 Diminuição da força muscular nos membros (tendencialmente mais nos


músculos da cintura: anca/coxa e ombros/braço)

 Atingimento dos músculos respiratórios, levando a dificuldade na respiração


que, no seu estado mais grave, pode levar à necessidade de ventilação
mecânica

Como a fraqueza muscular agrava com a utilização repetida do(s) músculo(s)


afetado(s) e a força muscular recupera depois de repouso, por vezes, o diagnóstico
clínico pode não ser fácil.

A miastenia grave é crónica e progressiva, mas tem tratamento. Este inclui fármacos
inibidores da acetilcolinesterase, imunossupressores (incluindo corticoides) e
imunoglobulina endovenosa. Associada a estes, a realização de plasmaferese (um
tipo de filtração do sangue que remove os anticorpos causadores da doença) pode
ser uma opção em determinados casos.

Também em casos particulares, a remoção cirúrgica do timo (órgão situado na


cavidade torácica e que é responsável pela maturação e otimização do sistema
imunitário) poderá estar recomendada no tratamento da miastenia grave.

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o Artrite Reumatoide

A Artrite Reumatóide (AR) é uma doença reumática sistémica e a forma mais


comum de artrite. É uma doença inflamatória que causa dor, edema (inchaço),
rigidez e perda de função nas articulações.

Existe de forma característica uma inflamação de diversas articulações, podendo 49


atingir e causar alterações na cartilagem, osso, tendões e ligamentos de diversas
articulações.

Existem vários tipos de artrite. Na AR, é característico existir um envolvimento


simétrico, ou seja, afetar ambos os punhos ou ambos os joelhos e não apenas uma
das localizações. A AR afecta frequentemente os punhos e os dedos (com maior
frequência nas articulações perto dos punhos), mas pode também atingir pés,
ombros, joelhos, cotovelos, ancas e coluna cervical, entre outros.

Ocasionalmente, a inflamação pode atingir o revestimento dos pulmões (causando


pleurite) ou o revestimento do coração (causando pericardite). Pode ainda atingir o
pulmão ou associar-se a secura dos olhos ou da boca, devido à inflamação das
glândulas que produzem a saliva e as lágrimas. Mais rara é a inflamação dos vasos
que provoca a vasculite.

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A AR pode, por vezes, existir com febre baixa, sensação de se estar doente e redução
da força com fadiga intensa. A anemia existe muitas vezes associada à AR.

o Sarcoidose
50

A sarcoidose é uma doença granulomatosa multisistémica de etiologia desconhecida


que afeta principalmente os pulmões e os gânglios linfáticos intratorácicos, atingindo
preferencialmente mulheres jovens e de meia-idade.

A sarcoidose caracteriza-se por uma grande heterogeneidade no que toca à


prevalência, à forma de apresentação clínica e à gravidade da mesma, variando
sobretudo em função da localização geográfica e da raça dos pacientes. O
envolvimento orgânico depende ainda do sexo e da idade dos doentes. Apesar da
epidemiologia da doença se manter controversa, a sua prevalência parece ser maior
nos países escandinavos e entre os afroamericanos dos Estados Unidos da América,
sendo mais grave na raça negra.

Por seu lado, Portugal parece apresentar uma das mais baixas prevalências de
sarcoidose. As múltiplas formas de apresentação clínica da sarcoidose podem
agrupar-se em três padrões distintos: doença assintomática, sintomas
constitucionais inespecíficos e sintomas relacionados com envolvimento orgânico

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específico. Os pulmões e os gânglios linfáticos intratorácicos são os órgãos mais
afetados, ocorrendo em mais de 90% dos doentes. O estadiamento radiográfico
pulmonar é uma das melhores formas de caracterizar as manifestações intratorácicas
e avaliar o seu prognóstico. Além do estadiamento radiográfico existem outros
fatores clínicos com valor prognóstico, a maioria deles relacionados com o
comprometimento extratorácico e também com a forma de instalação aguda ou
crónica.

A frequência das diferentes manifestações clínicas atribuídas ao envolvimento


orgânico específico é variável, dependendo dos meios de investigação diagnóstica 51
aplicados. Na sua forma extratorácica, a sarcoidose pode atingir músculos, fígado,
baço, olhos, pele, 4 nódulos linfáticos extratorácicos, sistema nervoso, coração, rins,
ossos e glândulas parótidas, entre outros. Apesar do seu curso clínico ser muitíssimo
variável, a sarcoidose é uma doença que apresenta uma baixa taxa de mortalidade,
variando entre 1 e 5%. As causas habituais de morte estão relacionadas com as
complicações decorrentes do envolvimento pulmonar, cardíaco, neurológico e
hepático.

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