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PROFESSORES:

Íris Caramalho, Margarida Gama Carvalho


Federico Herrera e Teresa Pais

Aluno: Rodrigo Barriga Alves

APONTAMENTOS Ano letivo 2019-2020

DE IMUNOLOGIA
Licenciatura em Biologia e Bioquímica (3º Ano)

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Índice
Aula 1 – Breve perspetiva histórica ............................................................................................................ 2
Aula 2 – Visão global do sistema imunológico ............................................................................................ 5
Aula 3 – Hematopoiese e células do sistema imunológico ........................................................................ 12
Aula 4 – Linhagem linfoide e órgãos linfoides primários e secundários ..................................................... 22
Aula 5 – Imunidade inata (I) ..................................................................................................................... 33
Aula 6 – Imunidade inata (II) .................................................................................................................... 39
Aula 7 – Geração de diversidade do BCR e TCR (I) .................................................................................... 58
Aula 8 – Geração de diversidade do BCR e TCR (II) ................................................................................... 73
Aula 9 – MHC (Major Histocompatibility Complex): genética, função e associação a doenças ................... 80
Aula 10 – Continuação do estudo do MHC. Processamento e apresentação antigénica ............................ 94
Aula 11 – Desenvolvimento de linfócitos T ............................................................................................. 114
Aula 12 – Desenvolvimento de Linfócitos T no timo ............................................................................... 128
Aula 13 – Ativação e diferenciação de Linfócitos T na periferia (I)........................................................... 139
Aula 14 – Ativação e diferenciação de Linfócitos T na periferia (II).......................................................... 151
Aula 15 – Desenvolvimento de Linfócitos B (I) ........................................................................................ 165
Aula 16 – Desenvolvimento de Linfócitos B (II) e ativação e diferenciação de linfócitos B ....................... 178
Aula 17 – Ativação e diferenciação de linfócitos B (II) ............................................................................. 188
Aula 18 – Ativação e diferenciação de linfócitos B (III) ............................................................................ 196
Aula 19 – Processos de hipermutação somática e mudança de classe das imunoglobulinas; Mecanismos
efetores da resposta humoral ................................................................................................................ 206
Aula 20 – Mecanismos efetores da resposta humoral: recetores Fc e sistema do Complemento ............ 225
Aula 21 – Resposta imunológica a vírus, bactérias, parasitas e fungos (I) ................................................ 249
Aula 22 – Resposta imunológica a vírus, bactérias, parasitas e fungos (II) ............................................... 260
Aula 23 – Vacinação ............................................................................................................................... 274
Aula 24 – Tolerância imunológica (conceito e mecanismos) ................................................................... 288
Aula 25 – Autoimunidade....................................................................................................................... 301
Aula 26 – Resposta imunológica antitumoral e imunoterapia ................................................................. 316

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Aula 1 – Breve perspetiva histórica

A imunologia é o estudo das células e moléculas envolvidas na defesa de um organismo a um agente infecioso
(sistema imunológico, imunitário ou imune). Este termo deriva do latim (immunis) que significa “isento de”.
Note-se que desde a antiguidade que se reconhece que, após a exposição a uma dada doença, algumas pessoas
morrem, enquanto que as que sobrevivem quando expostas uma segunda vez à mesma doença, não adoecem.

A resposta conjunta e coordenada do sistema imunológico à introdução de substâncias “estranhas” (por


exemplo, microrganismos) é designada por resposta imune. Um exemplo de resposta imune são as alergias.

A imunidade é o estado de resistência de um organismo a agentes patogénicos, que previne o estabelecimento


de infeção e mantém a integridade do organismo. A primeira referência a imunidade contra agentes infeciosos
e memória imunológica decorre da História da Guerra do Peloponeso (Tucídides), em Atenas, com referência à
peste/febre tifoide (430 AC):

“Yet it was with those who had recovered from the disease that the sick and the dying found most compassion.
These knew what it was from experience, and had now no fear for themselves; for the same man was never
attacked twice-never at least fatally. And such persons not only received the congratulations of others, but
themselves also, in the elation of the moment, half entertained the vain hope that they were for the future safe
from any disease whatsoever.”.

Assim, para gerar imunidade sem induzir doença recorre-se à vacinação. Uma vacina (eficiente) foi
primeiramente administrada por Edward Jenner com pústulas de vacas contaminadas com varíola bovina, isto
é, uma forma atenuada da varíola (cowpox) num rapaz de 8 anos, James Phipps (14/05/1796). A doença da
varíola, em inglês, designa-se de smallpox (praga vermelha). Algumas semanas mais tarde Jenner inoculou
James com o vírus da varíola vivo. Esta doença é causada pelo vírus Variola major (pode causar cegueira) e
possui uma mortalidade que ronda os 30%, quando não tratada. Foi devido a esta que no século XVIII metade
dos jovens no Reino Unido não atingiam os 10 anos. Desta forma, a administração da vacina contra a varíola
(vacinação eficiente) foi um passo tão importante na história. Em 1798 Edward Jenner conjeturou que a pré-
exposição à doença protege contra a infeção pelo vírus da varíola. Atualmente (desde 1980) a varíola está
erradicada, devido aos esforços incessantes da OMS (Organização Mundial de Saúde).

Existem diversos marcos importantes na história da vacinação/adquirição de imunidade a uma doença:

- Séculos XI-XV: turcos e chineses induziam imunidade através da inação de fluído proveniente de pústulas de
doentes da varíola (variolação).

- 1718: Lady Mary Wortley Montagu (mulher do embaixador inglês na Turquia) introduziu a prática da
variolação no ocidente ao permitir que os seus filhos fossem inoculados com pústulas. A variolação é a prática
de inalação ou transferência para feridas na pele de smapllpox pústulas.

- 1796: Edward Jenner: inoculou um rapaz de 8 anos (James Phipps) com fluído proveniente de uma pústula
de varíola bovina e, mais tarde, infetou-o deliberadamente com o vírus (cowpox).

- 1878/1879: Louis Pasteur (“Pai” da Imunologia) isolou o microrganismo que causa a cólera nas galinhas
(Pasteurella multocida) onde as galinhas que foram expostas uma primeira vez a uma estirpe atenuada
(“vacina”) e uma segunda vez à estirpe virulenta sobreviviam, ao passo que as que eram imediatamente

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exportas à estirpe virulenta morriam. Notou-se então que as estirpes


atenuadas promovem imunidade à doença (cólera aviária ou
pasteurelose). A esta técnica, Pasteur designou de vacinação (do
latim vaccinus que significa vaca, em homenagem a Edward Jenner).

- 1885: Joseph Meister foi imunizado por Pasteur contra a raiva


(vírus da raiva). Note-se que a vacina antirrábica é uma das poucas
que é eficaz se administrada após exposição (ao vírus).

Assim a questão que remanesce é “ Qual ou quais os mecanismos


responsáveis pelo estabelecimento de proteção (imunidade)? “

Esta proteção pode ser mediada por células – imunidade celular - ou agentes solúveis – imunidade humoral.
Isto é, a imunidade envolve componentes humorais e celulares.

Imunidade humoral:

Em 1890 Von Behring (nobel em 1901) e Kitasato Imunidade celular:


administraram um soro com formas atenuadas de
Em 1883 Elie Metchnikoff publicou um estudo
difteria (Corynebacterium diphtheriae) e tétano
onde mostra células do sangue (fagócitos) a ingerir
(Clostridium tetani) a animais infetados com as
microrganismos, destruindo-os.
formas virulentas, protegendo-os. A atividade
protetora induzida pela vacinação estava presente A imunidade celular envolve primariamente
no sangue (humores). linfócitos T. Estes podem ajudar outras células do
sistema imunológico a eliminar o agente infecioso ou
A imunidade humoral combate patogénios via
a eliminar diretamente células infetadas.
anticorpos. Os anticorpos são produzidos por
linfócitos B e podem ser transferidos de um
indivíduo para outro (imunidade passiva).

As células envolvidas na
imunidade adaptativa são os
linfócitos B e os linfócitos T.

Os linfócitos B são assim


chamados por ter a sua origem
e amadurecerem na bursa de
Fabricius das aves (onde
primeiro foram identificados). Mais tarde veio a conhecer-se que nos mamíferos a maturação dos linfócitos B
se dava na medula óssea (bone marrow). Possuem os BCR ou B cell receptors nas suas membranas.

Os linfócitos T têm origem na medula óssea, mas amadurecem no timo. Possuem TCR’s ou T cell receptors nas
suas membranas.

Os linfócitos T CD8 são responsáveis por matar os vírus.

No entanto, ver-se-á posteriormente que existe outro tipo de imunidade (inata) cujas células envolvidas são
outras.

Distinguem-se ainda 2 conceitos: imunidade ativa e imunidade passiva.

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A imunidade ativa caracteriza-se por: A imunidade passiva:

Ser duradoura.
Ser mais lenta.
Confere uma proteção rápida.
Possuir múltiplos mecanismos efetores
Possui uma duração curta.
ativados.

Note-se que os recetores nas membranas dos


linfócitos se ligam a estruturas (especificamente)
denominadas de antigénios cuja ligação é
possibilitada pela presença de citocinas (que
atuam em diversas células).

A imunidade ativa resulta da indução de


imunidade após exposição a um antigénio, onde
os anticorpos são criados e guardados
permanentemente.

A imunidade passiva, por sua vez, é a


transferência da imunidade humoral ativa de
anticorpos já pré-concebidos.

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Aula 2 – Visão global do sistema imunológico

Os sistemas imunes dos vertebrados em resposta a patogénios possuem dois sistemas interligados onde a
defesa contra microrganismos é mediada por respostas sequenciais e coordenadas designadas por: imunidade
inata à qual se segue a imunidade adaptativa.

A imunidade inata ou natural é a primeira linha de defesa, rápida (horas) e não-específica, entrando de
imediato em ação. É essencial para a defesa nas primeiras horas e dias após a infeção. A resposta imune inata
é mediada por moléculas de reconhecimento codificadas na linha germinal do genoma e por mecanismos
“prontos” para responder mesmo antes de uma infeção, nomeadamente:

• Barreiras físicas e químicas (pele, mucosa gástrica, suor, lágrimas, pH ácido do estômago, epitélios,…).
• Células com capacidade fagocítica (macrófagos nos tecidos e neutrófilos
no sangue).
• Células NK (natural killer), células dendríticas (apresentam antigénios) e
células linfoides inatas.
• Proteínas circulantes (exemplo: complemento) ou péptidos
microbianos.
• Citocinas – moléculas de comunicação entre células que podem ser do
sistema inato ou indutivo produzidas por linfócitos T auxiliares.

As respostas imunes inatas baseiam-se no reconhecimento de moléculas por


recetores codificados na linha germinal designados por recetores de
reconhecimento de padrões ou PRR (pattern recognition receptors).

Estes ligam-se a moléculas genericamente


designadas por padrões moleculares associados
a patogénios ou PAMPs (Pathogen-associated
molecular patterns) que se encontram em tipos
muito diferentes de patogénios (ex:
lipopolissacáridos, peptidoglicanos, etc).

A ordem de grandeza dos PRR que se conhecem


atualmente é das centenas.

Os PRRs (exemplo: TLR) reconhecem os PAMPs


(exemplo: LPS – bactérias gram-negativas).

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A imunidade adquirida ou adaptativa é um tipo de imunidade (mais potente) que se adapta à infeção, de tal
forma que as respostas imunológicas adquiridas são específicas para diferentes antigénios e frequentemente
para diferentes porções de uma proteína, polissacarídeo ou outra macromolécula.

Assim, as respostas imunes adaptativas são respostas mediadas por células ou por anticorpos
(imunoglobulinas). Estes anticorpos são produzidos pelos linfócitos B, que usam recetores muito específicos
para antigénio gerados ao acaso. A resposta é lenta (5 a 6 dias, ou mais). A ordem de grandeza dos recetores
das células T e B é dos milhares de milhões.

As células envolvidas na imunidade adaptativa são os linfócitos B e os linfócitos T que expressam na sua
superfície recetores para antigénio designados por BCR (B cell receptor) e TCR (T cell receptor), respetivamente.
Em cada momento existem milhares de milhões (>109) linfócitos que diferem entre si nos recetores para
antigénio que expressam.

Dito isto, define-se antigénio como


qualquer substância que se liga
especificamente aos recetores dos linfócitos
B e T. Os BCR e TCR ligam-se a antigénios
específicos em vez de se ligarem a moléculas
comuns a muitos patogénios.

Relembre-se que os linfócitos B são assim


chamados por ter a sua origem e
amadurecerem na bursa de Fabricius das aves (onde primeiro foram identificados). Mais tarde veio a conhecer-
se que nos mamíferos a maturação dos linfócitos B se dava na medula óssea (bone marrow). Estes produzem
anticorpos e reconhecem diretamente o antigénio.

Os linfócitos T têm origem na medula óssea, mas amadurecem no timo. Estes não reconhecem diretamente
o antigénio, necessitando de moléculas apresentadoras de antigénios.

Assim, é possível comparar com facilidade os dois tipos de imunidade: inata/natural e adaptativa/adquirida:

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A imunidade adquirida demora bastante tempo a expressar-se, pelo que a imunidade inata é imprescindível.
Note-se que quem não produz linfócitos necessita de um transplante de medula óssea (visto que estas células
derivam de uma mesma célula estaminal). As duas imunidades comunicam.

A imunidade adaptativa é extremamente


específica. A especificidade desta deve-se à
existência de existe clones individuais de
linfócitos que expressam recetores
membranares que distinguem diferenças subtis
na estrutura de epítopos/determinantes
antigénicos diferentes, nomeadamente os
linfócitos T.

O epítopo ou determinante
antigénico é o local num
antigénio que é especificamente reconhecido pela molécula de anticorpo ou pelo recetor da
célula T. Este epítopo liga-se a uma molécula de MHC ou complexo maior de
histocompatibilidade, para que a célula T depois se possa ligar. Isto é, o TCR liga-se ao MHC.

Existem duas classes de MHC principais: classe I e classe II. Estas duas classes permitem
distinguir dois tipos de linfócitos T: CD4 e CD8.

Um linfócito TCD4 é um linfócito T que expressa uma proteína denominada de CD4. Esta
proteína é ativada por uma célula apresentadora de antigénio – APC (antigen-presenting
cell). Estas células (TCD4) são células auxiliares que permitem a ativação de macrófagos. A
proteína CD4 destas células reconhece um MHC do tipo classe II (restrito/específico para
células APC) no antigénio.

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Por outro lado, as restantes células (nucleadas) expressam um MHC de classe I que se pode ligar aos linfócitos
T que expressam a proteína CD8.

Assim, em resumo:

➢ As células APC expressam MHC classe II reconhecido por linfócitos T CD4 e MHC classe I reconhecido
por linfócitos T CD8.
➢ Todas as restantes células nucleadas expressam apenas MHC classe I reconhecido por linfócitos T CD8.

Os eritrócitos (anucleados) não expressam MHC.

Numa resposta imunitária, existem


respostas primárias e secundárias. A
primeira como o nome indica é a
primeira exposição ao antigénio pelas
células naive (“ingénuas”) que nunca
tinham sido expostas ao antigénio X.
Isto é, são linfócitos que ainda não
faram ativados pelo antigénio. Estas
células levam à produção de células
produtoras de anticorpos
(plasmócitos ou plasma cells – são
linfócitos B em estado tardio) e de
linfócitos de memória (memory cells).

Assim, numa exposição secundária


ao antigénio X (ou a um semelhante, Y)
a resposta é mais rápida e maior, visto
que os antigénios já são reconhecidos
pelas células de memória e já existem
anticorpos produzidos e específicos
para estes. Após a resposta imunitária, os níveis de anticorpos diminuem e o processo regressa à homeostasia.

Em indivíduos não imunizados estes


clones com diferentes
especificidades estão presentes e são
capazes de reconhecer e responder a
antigénios exógenos. A sua geração é
independente de exposição ao
antigénio (seleção clonal, Burnet
1957).

Hipótese da seleção clonal: admite


que deveria haver uma célula
precursora dos linfócitos B e T, que
iria amadurecer originando
diferentes.

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Note-se que os linfócitos são altamente específicos e


o seu desenvolvimento precede a exposição ao seu
antigénio específico. Assim, o antigéno (Ag) específico
“seleciona” os linfócitos específicos pré-existentes,
induzindo a sua ativação e consequente expansão.

Quando uma célula T ou B interage com o


correspondente antigénio (Ag) específico essa célula é
selecionada e é ativada.

A ativação resulta em proliferação produzindo-se um


grande número de clones dessa célula. Cada clone
reconhece e reage em resposta ao antigénio (Ag) que
inicialmente estimulou o linfócito (célula) original.

O número total linfócitos com especificidade


antigénicas diferentes (TCR e BCR) num indivíduo é
designado por repertório. Em humanos, o
repertório de células B é estimado ser maior que
1013. A capacidade de um repertório de linfócitos de
reconhecer um vasto número de antigénios é
designado por diversidade.

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Como é gerada esta diversidade?

As células B e as células T são distinguíveis pela estrutura do recetor de


antigénio que expressam – BCR e TCR, respetivamente. Estes recetores ligam-
se a antigénios. Os anticorpos também são designados de imunoglobulinas
(Ig). Note-se que os recetores de antigénios dos linfócitos B também podem
ser considerados imunoglobulinas designando-se de imunoglobulinas de
membrana (mIg) ou de superfície (sIg). Os
TCR estão relacionados com as
imunoglobulinas, mas são distintos na sua estrutura e propriedade de
reconhecimento.

Assim, os anticorpos/imunoglobulinas são moléculas proteicas


produzidas pelos linfócitos B, de tal forma que cada linfócito B apenas
expressa um tipo de anticorpo que se liga a um antigénio específico (os
anticorpos são secretados pelos plasmócitos, linfócitos B
tardios/diferenciados). Os Ab ou as Ig são glicoproteínas em forma de “Y”
cujo papel principal é a defesa contra patogénios. Existem 5 principais
classes onde as IgM são pentâmeros, as IgA são dímeros e as IgD, IgE e IgG
são monómeros.

Os anticorpos possuem duas cadeiras pesadas (H) e duas cadeias leves (L)
iguais, sendo que cada cadeia pesada e cada cadeia leve tem uma região
constante (CH e CL) e uma parte variável (VH e VL). É nesta parte variável
que se encontra o local de reconhecimento (reconhece o péptido) e que
confere tamanha diversidade.

As imunoglobulinas possuem um eixo de simetria estando cada parte


simétrica unida por ligações persulfureto. Estas apresentam também uma
região dobradiça que permite uma maior amplitude na ligação ao antigénio
(existem dois locais de ligação ao antigénio em cada imunoglobulina).

Por sua vez, os TCRs também são constituídos por uma região variável e
outra região constante. São, no entanto, constituídos por cadeias diferentes: uma α e outra β.

Os anticorpos podem ser monoclonais - se reconhecem apenas um epítopo do antigénio - ou policlonais – se


reconhecem vários epítopos do antigénio (Ag).

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Os antigénios ligam-se aos recetores de linfócitos e são capazes de serem reconhecidos por um anticorpo. No
entanto, se não tiver PAMPS pode não conseguir induzir uma resposta imune inata, não sendo, desta forma,
um imunogénio. Um imunogénio é um antigénio que desencadeia uma resposta imunitária adaptativa.

Os haptenos são pequenas moléculas que promovem respostas imunitárias quando conjugadas com o
antigénio de interesse e os imunoadjuvantes são substâncias que melhoram a imunogeneicidade por alteração
das propriedades físico-químicas ou adição de PAMPs.

Existem proteínas que levam à hidrólise de anticorpos,


entre as quais os enzimas pepsina e papaína.

Por hidrólise do enzima papaína obtêm-se 2 fragmentos


Fab e um Fc (possui funções efetoras, difere nas cadeias
pesadas). O fragmento Fab consegue reconhecer, sozinho, o
antigénio porque possui as regiões variáveis e que ligam ao
antigénio.

Por hidrólise do enzima pepsina obtêm-se os fragmentos F(ab’)2 – fragmento duplo – e o fragmento pFc’.

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Aula 3 – Hematopoiese e células do sistema imunológico

A hematopoiese é o processo de diferenciação e maturação celular de todas as populações celulares


presentes no sangue (eritrócitos, leucócitos e plaquetas) a partir de células estaminais hematopoiéticas
pluripotentes (CEH).

As células estaminais hematopoiéticas (HSC) possuem duas


características:

• Capacidade de se autorregenerarem
• Capacidade de se diferenciarem em diversos tipos
de células, algumas das quais circulam no sangue.

Todos os componentes celulares do sistema imunológico


(SI), como os leucócitos, derivam de CEH. No período pós-
natal CEH encontram-se na medula óssea, isto é, em
vertebrados adultos a hematopoiese ocorre na medula óssea.

Quando nascemos este processo ocorre em todos os ossos


do corpo humano. A partir dos 3 anos este processo ainda ocorre em alguns locais, nomeadamente:

▪ Esterno
▪ Costelas
▪ Vértebras
▪ Bacia
▪ Escápula
▪ Porções proximais dos úmeros e
fémures

Note-se que antes do nascimento, a


hematopoiese ocorre no fígado, baço e saco
vitelino.

O estudo das células estaminais


hematopoiéticas pluripotentes (CEH) é
complexo porque estas células são pouco
frequentes/difíceis de encontrar (afinal são
as únicas células capazes de se
autorrenovar e proliferar) e são difíceis de
cultivar in vitro. No entanto, são passíveis
de serem isoladas por citometria de fluxo.

Para se proceder ao enriquecimento na


cultura destas células recorre-se à seleção
negativa com recurso a anticorpos
específicos para células que pretendemos
retirar da cultura (células diferenciadas – a
branco). De seguida, recorre-se à seleção positiva para isolamento das células que pretendemos (a azul),
usando anticorpos (Fl) que se liguem a marcadores presentes nas células pluripotentes (Sca-1 e c-Kit).

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Após possuirmos uma cultura enriquecida com estas células estaminais hematopoiéticas pluripotentes,
observa-se a restauração da hematopoiese num ratinho que foi irradiado de uma forma letal (ficando
imunodeficiente), de tal forma que os ratinhos que recebem as CEH sobrevivem. Dependendo do
enriquecimento da cultura nestas células pluripotentes, a sobrevivência pode dar-se ou não, sendo que
populações de ratinhos onde a cultura em células CEH é superior, sobrevive tendencialmente. Com a diminuição
sucessiva do enriquecimento em CEH, existe uma maior necessidade de se usarem mais células para garantir a
sobrevivência dos ratinhos.

Na medula óssea as HSC (hematopoietic stem


cells) proliferam e diferenciam-se em dois tipos Pluripotentes
de células progenitoras:

Células progenitoras comuns


mieloides.
Multipotentes
Células progenitoras comuns linfoides.

“Unipotentes”

Com o processo de diferenciação, as células


pluripotentes perdem a sua capacidade de se
autorrenovarem passando a ser meramente
células multipotentes (ainda com capacidade de
proliferação e diferenciação). Assim, os

progenitores já não possuem a capacidade de


“autorrenovação” (self-renewal) e estão
“comprometidos” com uma linhagem celular
específica (mieloide ou linfoide). Portanto, a
produção de uma única célula é um processo
multipasse.

Basophils

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A hematopoiese é um processo altamente


regulado e coordenado, por exemplo, ao nível
da transcrição (fatores de transcrição):
diversos fatores de transcrição (FT)
desempenham um papel importante na
hematopoiese (exemplo: o IKAROS é
necessário para desenvolvimento linfoide; o
NOTCH é necessário para se decidir qual
célula linfocítica produzir: ou linfócitos B ou
linfócitos T).

Com o knockout do FT IKAROS os linfócitos


B, T e as interleucinas (IL’s) não se conseguem
separar, isto é, não ocorre uma diferenciação
correta da linhagem linfoide. Por outro lado,
após knockout do recetor do fator de
transcrição NOTCH, não existe a distinção dos
diferentes linfócitos.

Estes fatores de transcrição foram identificados em estudos com


ratinhos KO (gene inativado - se uma população específica não se
desenvolve nesse contexto, podemos concluir que a respetiva proteína
está envolvida no desenvolvimento dessa população celular, isto é, uma
dada via de sinalização específica desse fator de transcrição é afetada).

Por fim, o processo hematopoiético recorre a citocinas – moléculas


(péptidos) de comunicação (ou sinalização) entre células que podem ser
do sistema inato ou indutivo produzidas por linfócitos T auxiliares – para
se poder levar a cabo a diferenciação das células, sendo a sua presença
imprescindível no crescimento e na proliferação das mesmas. Existem
vários tipos de citocinas, nomeadamente as interleucinas (IL),
interferões (IFN), fatores estimuladores de colónias (CSF), fatores de
necrose tumoral (TNF) e fatores de transformação de crescimento.

Por exemplo, a linhagem mieloide é dependente da interleucina 3 para


ocorrer a diferenciação da célula hematopoiética pluripotente no
progenitor e neste no megacariótico.

De seguida, é possível separar as diferentes células do sistema


imunológico consoante a sua
linhagem (mieloide e
linfoide) e se pertencem ao sistema imune inato ou adquirido:

• Células sistema imunológico inato: maioritariamente da


linhagem mieloide - neutrófilos, basófilos, eosinófilos, mastócitos,
monócitos, macrófagos, células dendríticas e excecionalmente as
células linfoides inatas (todas menos as células linfoides inatas –
primeira linha de defesa - pertencem à linhagem mieloide).
• Células sistema imunológico adquirido: apenas células da
linhagem linfoide - linfócitos B e T.

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Existem diversas células do sistema imunológico. Em termos de frequência, dos vários leucócitos pertencentes
a este sistema, os neutrófilos são os que se apresentam em maior abundância (cerca de 50 a 70% dos glóbulos
brancos presentes no organismo). Um aumento destes no sangue, implica que estejamos perante um sinal de
infeção.

Os oito tipos principais de células da linhagem mieloide (eritrócitos, monócitos, macrófagos, neutrófilos,
eosinófilos, basófilos, mastócitos e plaquetas) desenvolvem-se a partir de progenitores comuns mieloides. Os
dois primeiros progenitores são:

• Granulócitos (e dão origem a…):


o Mieloblastos como:
▪ Neutrófilos - destruição direta de patogénios.
▪ Eosinófilos - atividade antiviral e atividade anti parasítica.
▪ Basófilos e mastócitos - inflamação e alergias.
o Monócitos e mais tarde estes originam macrófagos (os monócitos são precursores dos
macrófagos). Nota: os monócitos podem diferenciar-se igualmente em células dendríticas
(DCs).
• Megacariócitos (e dão origem a…):
o Eritrócitos.
o Plaquetas.

Os granulócitos diferem na coloração dos grânulos e no seu conteúdo e função proteica. Todos têm núcleos
multilobados. As proteínas dos grânulos têm funções como:

• Destruição direta dos patogénios.


• Regulação do tráfego e da atividade de outras células.
• Remodelação dos tecidos no local da infeção.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Neutrófilos:

- Também designados por leucócitos


polimorfonucleares (núcleo multiglobulado com
cromatina condensada) ou granulócitos
(grânulos presentes no citoplasma com atividade
microbicida).

- População mais abundante de leucócitos no sangue (50-70%).

- Medeiam a fase inicial da resposta inflamatória (primeira


população a chegar ao local de inflamação) – primeira linha de
defesa.

- Aumento do seu número é a primeira indicação de infeção.

- Possuem capacidade fagocítica (e de posterior digestão


intracelular) e de desgranulação (mecanismos microbiocidas).

- Possuem tempo de semivida muito curto (1 a 2 dias nos


tecidos) e em condições fisiológicas circulam no sangue.

- A produção dos neutrófilos é estimulada por G-CSF e GM-CSF.

Eosinófilos:

- Papel em infeções por parasitas (grânulos contêm


enzimas nocivos para a sua parede celular como o
peroxidase). Desgranulação (morte de parasitas
revestidos com anticorpos). Os grânulos também contêm
citocinas, enzimas e fatores de crescimento.

- Possuem capacidade fagocítica.

- Núcleo bilobado (geralmente em forma de luneta).

- Citoplasma com vários tipos de grânulos.

- Na superfície celular expressam recetores para a região Fc


de anticorpos.

Basófilos:

- Granulócitos com similaridades estruturais e funcionais com


mastócitos. Núcleo em forma de S. Desgranulação (aumento da
imunidade anti parasítica).

- Desempenham um papel nas reações alérgicas.

- Não possuem atividade fagocítica.

- Grandes grânulos específicos que contêm heparina, histamina,


leucotrienos, citocinas e quimiocinas.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Mastócitos:

- Presentes na pele e no epitélio das mucosas


(não estão em circulação).

- Possuem grânulos ricos em histamina


(libertam) e outros mediadores. Libertam
citocinas.

- Estão envolvidos no combate a parasitas e contribuem para as


alergias.

- A citocina SCF é essencial para o seu desenvolvimento.

- Núcleos redondos e citoplasma com muitos grânulos


(basofílicos) que contêm proteoglicanos acídicos aos quais se
ligam corantes básicos. Desgranulação (aumento da imunidade
anti parasítica).

Possuem recetores para as IgE que reconhecem o


antigénio/alergénico que, após reconhecimento, leva a que os
mastócitos libertam os seus grânulos e subsequente libertação
de histamina, promovendo-se a reação alérgica. Existem 2 tipos de células apresentadoras de antigénio (APC)
da série mieloide: macrófagos e células dendríticas (DCs). [da série linfoide são os linfócitos B, as APCs por
excelência].

Quando se refere à origem mieloide, estas


duas células derivam de um precursor
comum: monócito.

Os monócitos quando migram para os


tecidos diferenciam-se em macrófagos cuja
função é a de reparação/remodelação dos
tecidos, destruição de patogénios e
apresentação de antigénios. No entanto, os
monócitos podem diferenciar-se em células
dendríticas cuja função é a de internalizar e
processar/digerir antigénios seguida pela sua apresentação a linfócitos T para sua ativação.

De notar, no entanto, que as células dendríticas podem resultar da diferenciação direta de progenitores
(mieloide e linfoide!).

As APC são células que em contacto com o patogénio, são ativadas e depois comunicam este encontro a
linfócitos T nos gânglios linfáticos (LN) mostrando-lhes péptidos provenientes do patogénio num processo
denominado de apresentação de antigénio.

Monócitos/macrófagos:

- Os monócitos e macrófagos são também designados de fagócitos mononucleares. Os monócitos circulam no


sangue e migram para tecidos diferenciando-se em macrófagos após um processo de diferenciação que ocorre
na medula óssea e que recorre à citocina M-CSF (Macrophage Colony Stimulating Factor).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- Diferenciação dependente de M-CSF.

- A principal função dos macrófagos na defesa do hospedeiro é


ingerir e matar microrganismos.

- Os macrófagos também ingerem células mortas como parte


do “mecanismo de limpeza” após infeção ou lesão de tecidos

- Os macrófagos podem funcionar como APC.

- Os macrófagos promovem reparação de tecidos danificados


estimulando a angiogénese (crescimento de vasos sanguíneos) e a síntese de matriz extracelular rica em
colagénio (fibrose).

- Contrariamente a neutrófilos podem dividir-se nos locais de infeção.

- População mais importante em estadios mais tardios da resposta imune inata.

- Possuem maiores tempos de semivida.

- Aos monócitos derivados do período embrionário dá-se o nome de microglia.

Em adultos, quando existe uma inflamação, as


células hematopoiéticas estaminais pluripotentes na
medula óssea diferenciam-se nas respetivas
linhagens e na linhagem mieloide existe a
diferenciação em monócitos, possíveis precursores
das células dendríticas e precursores dos
macrófagos. Os monócitos são libertados para a
corrente sanguínea onde, nos tecidos, são ativados
em macrófagos. Por outro lado, durante o
desenvolvimento embrionário, o tecido embrionário
precursor do macrófago (pode autorrenovar-se e
diferenciar-se) vai dar a origem a macrófagos
específicos de dados locais, nomeadamente a
microglia (cérebro), as células de
Kupffer (fígado), macrófagos
alveolares (pulmões) e
macrófagos sinusoidais (baço).

A maioria dos macrófagos que


reside nos tecidos diferenciam-se
durante o desenvolvimento
embrionário e têm a capacidade
de se autorrenovarem (self-
renewal).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Os macrófagos possuem pseudópodes, contrariamente às células


dendríticas e ao seu precursor monócito.

Possuem fagossomas e capacidade fagocítica, de tal forma que um


microrganismo é retido nos fagossomas que se agregam a
lisossomas, libertando-se enzimas que promovem a digestão
intracelular e subsequente eliminação do microrganismo.

Quanto aos monócitos, existem dois tipos/subsets:

Monócitos clássicos ou inflamatórios - produzem mediadores


inflamatórios, são fagocíticos e são rapidamente recrutados para
locais de inflamação ou de lesão/insulto. Expressam pouca CD16,
bastante CD14 e expressam o recetor de quimiocinas CCR2.

Em humanos: CD14hiCD16negCCR2+ (CD = cluster of differentiation)

Em ratinho: Ly6hiCCR2+

Monócitos não clássicos - recrutados para os tecidos após


infeção ou lesão/insulto e podem contribuir para a reparação.
Expressam CD16, mas expressam pouca CD14. Expressam o recetor
de quimiocinas CX3CR1.

Em humanos: CD14lowCD16hiCX3CR1

Em ratinho: Ly6clow

Notas:

▪ Neg => proteína não expressa


▪ Hi => proteína bastante expressa
▪ Low => proteína pouco expressa
▪ + => proteína expressa

O subtipo intermédio expressa tanto CD14 como CD16, como se pode observar por citometria de fluxo.

Quanto aos macrófagos, dependendo das citocinas presentes no meio, existem dois tipos/subsets:

• M1 ou pró-inflamatório: associado a inflamações,


resistência de tumores e rejeição de transplantes – ativação clássica.
• M2 ou anti-inflamatório: associado a imunorregulação,
deposição de matriz, remodelação e aceitação de transplantes –
ativação alternativa.

Células dendríticas (DCs):

- Diferenciação dependente de Flt3L (Flt3 – citocina - kinase receptor


expresso no precursor). A maturação das DC é dependente de uma
citocina designada por ligando do Flt 3 que se liga ao recetor Flt 3 na célula precursora.

- Possuem extensões membranares que lembram dendrites em neurónios.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- São as células apresentadoras de antigénio mais importantes na ativação de


linfócitos T naïve. São as células mais potentes a apresentar antigénios (APCs por
excelência) para ativação das células T virgens.

- Tiram um “snapshot” do que está acontecer nos tecidos durante a infeção e


levam essa imagem para os gânglios linfáticos.

- Desempenham um papel primordial na resposta inata a infeções e na “ligação”


da resposta imune inata com a adquirida, conferindo portanto a ligação entre estes dois tipos de imunidade.

- São células fagocíticas residentes nos tecidos e que também circulam.

- Reconhecem e capturam microrganismos e iniciam respostas imunes inatas.

- Capturam microrganismos nos locais de infeção e degradam-nos, migrando desse local para órgãos linfoides
secundários onde apresentam a células T na sua superfície os péptidos dos microrganismos. Assim iniciam
respostas imunes adaptativas.

- Todas as DC expressam moléculas MHC classe I e classe II que são necessárias para a apresentação de
antigénios a células T.

A maturação das DCs inicia-se na


medula óssea a partir das células
estaminais hematopoiéticas (HSC) que
se diferenciam em precursores
mieloides (mas maioritariamente
linfoides) e, mais tarde, em monócitos.
De seguida, o monócito entra na
corrente sanguínea e começa-se a
diferenciar nos diferentes subtipos de
células dendríticas: clássicas ou
convencionais, plasmacitoides e
inflamatórias. Detalhadamente tem-se
que:

DCs clássicas ou
convencionais (cDC): subtipo envolvido na captura de antigénios (Ag) proteicos de microrganismos que entram
através do epitélio e na sua apresentação (dos péptidos) a linfócitos T nos gânglios linfáticos.
DCs plasmacitoides (pDC): produzem IFN-
I (interferão do tipo 1) em resposta a vírus e estão
possivelmente envolvidas na captura de
microrganismos que entram via corrente sanguínea
e na apresentação dos seus antigénios proteicos a
linfócitos T (LT) no fígado. Encontram-se no sangue
e, em menor quantidade nos órgãos linfoides. São
as maiores produtoras de interferões (IFN) em
resposta a vírus, viste que os IFN têm potente
atividade antiviral e têm um papel muito importante
na defesa inata a vírus. As pDC podem capturar
microrganismos no sangue e migrar para o baço
onde apresenta os seus antigénios a células T.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Aula 4 – Linhagem linfoide e órgãos linfoides primários e secundários

Existem quatro tipos de células que se desenvolvem a


partir de progenitores linfoides comuns:

• Linfócitos B.
• Linfócitos T.
• Células linfoides inatas (ILC) cujas mais
abundantes são células Natural Killer (NK).

Os linfócitos morfologicamente parecem-se todos uns


com os outros, mas existem diferentes populações que
apresentam moléculas diferentes chamadas de CD
(cluster of differentiation) na sua superfície, isto é, as
proteínas da membrana celular expressas pelas células
do sistema imune são referidas como CD.

As células B, células T. células NK, etc expressam


muitas proteínas CD diferentes e distinguem-se
fenotipicamente pela presença ou ausência dessas
proteínas.

Linfócitos T e B:

- Indistinguíveis ao microscópio.

- Imunidade adquirida.

- 20-40% leucócitos no sangue periférico e 99% células na linfa.

- Únicas células que expressam recetores de Ag (TCR e BCR), cada um com especificidade para um
determinante antigénico diferente.

- Células pequenas, com “pouco” citoplasma.

- Linfócitos que ainda não interagiram com o seu antigénio (Ag)


específico são designados de naïve/virgens.

- Interação com o Ag específico– proliferação e diferenciação em

células efetoras (exemplo: plasmócitos – células B


diferenciadas produtoras de
imunoglobulinas/anticorpos) e células de memória.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Linfócitos B:

- Local de desenvolvimento/maturação:

• Bursa de Fabricius nas aves.


• Medula óssea em mamíferos.

- Expressam BCR (“embebido” na membrana,


uma imunoglobulina); quando secretado (pelos
plasmócitos): anticorpo (Ab). Este anticorpo (Ab)
ou Imunoglobulina (Ig) possui 2 cadeias leves e 2
cadeias pesadas, com uma parte constante e
outra variada (onde se liga o antigénio). Existe a
ligação entre as cadeias por pontes persulfureto.

- Cada LB expressa um BCR com especificidade única e cada LB expressa ≈1.5–3×105 moléculas de BCR com
locais de ligação ao Ag idênticos.

- Os linfócitos B reconhecem diretamente o


antigénio, não necessitando de uma APC
(célula apresentadora de antigénio) como
intermediário (como as células dendríticas
para as células T reconhecerem o antigénio).

- Após interação com Ag específico (BCR-Ag), ocorre diferenciação:

• Plasmócitos (células terminalmente diferenciadas) – Ab é secretado, 1-2 semanas “de vida”.


• Células B de memória – expressam o mesmo BCR que o LB parental, maior tempo de semivida que os
plasmócitos.

- Única população não-mieloide capaz de funcionar como APC.

- LB melhoram a capacidade de ligação ao Ag (aumentam a afinidade do Ab para o Ag) através de um processo


designado por hipermutação somática.

- LB também são capazes de produzir Ab com diferentes funções através de um processo designado por
mudança de classe/isotipo.

- Podem ser considerados APCs por excelência.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Existem 3 classes ou subtipos de linfócitos B (imunidade humoral: produção de anticorpos):

• LB foliculares: subset de LBs mais abundante; produzem os anticorpos de mais alta afinidade e
originam, por diferenciação, células de memória. Encontram-se nos órgãos linfoides e no sangue.
• LB da zona marginal: originam anticorpos produzidos com pouca diversidade. Encontram-se
preferencialmente no baço.
• Linfócitos B1: originam anticorpos com pouca diversidade e são encontrados maioritariamente nas
mucosas e cavidade peritoneal.

Linfócitos T:

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- Local de desenvolvimento/maturação: Timo.

- Expressam TCR na membrana.

- Só reconhecem Ag apresentados no contexto de moléculas de MHC/HLA (HLA:


é o MHC de humanos). Isto é, necessitam de células APC (células apresentadoras
de antigénio) para reconhecerem o antigénio/péptido, por intermédio do MHC que
estas APCs expressem.

- Interação TCR com Ag específico conduz à diferenciação:

• LT efetores.
• Células T de memória.

- Principais subpopulações de LT:

• Linfócitos T auxiliares (CD4+) – reconhecem MHC classe II.


• Linfócitos T citotóxicos (CD8+) – reconhecem MHC classe I.
• Células T reguladoras.

Estes 3 subsets apresentam características únicas, nomeadamente:

- Linfócitos T auxiliares (TH):

• Expressam a glicoproteína CD4.


• Reconhecem Ag apresentado em moléculas MHC classe II.
• “Ajudam” na ativação de LB, LT citotóxicos e macrófagos.

- Linfócitos T citotóxicos (TC):

• Expressam a glicoproteína CD8.


• Reconhecem Ag apresentado em moléculas MHC classe I (tal como todas as células nucleadas).
• Eliminam células infetadas ou células tumorais.

- Células T reguladoras:

• Expressam as glicoproteínas CD4 e CD25.


• Foxp3 (fator de transcrição) fundamental para o
seu desenvolvimento, função e sobrevivência.
• Ajudam a suprimir o sistema imunitário após a
infeção estar resolvida, isto é, controlam a
extensão da resposta imunológica e impedem
imunopatologia associada à resposta
imunológica.
• Dependem da presença de interleucinas 2 (IL 2).

Em termos de frequência tem-se que a mais frequente


são as células T auxiliares, seguidas das citotóxicas e
depois as reguladoras.

As células T efetoras expressam MHC classe I à sua


superfície, reconhecida pelas células T citotóxicas (CD8 +).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Os linfócitos resultam de um progenitor


linfoide comum resultante da diferenciação de
uma célula estaminal hematopoiética. De
seguida, a maturação dos linfócitos inicia-se
nos órgãos linfoides primários, onde os linfócitos B se desenvolvem na medula óssea e os linfócitos T
amadurecem no timo. Aqui existe uma diferença crucial: os linfócitos T já saem do timo maturados, ao contrário
dos linfócitos B imaturos (que saem da medula óssea) que migram para os órgãos linfoides secundários (baço)
para terminarem a sua maturação. Até lá, circulam pela linfa e sangue. Por fim, os linfócitos virgens/naive (que
nunca reconheceram antigénios), podem-no fazer nos órgãos secundários a que inicialmente chegaram ou
recircular pelo sangue (pelos vasos linfáticos) até
outros órgãos linfoides secundários e aí serem
apresentados a um antigénio, sendo ativados.

Os linfócitos naive, que nunca foram presentes a um


antigénios, são ativados em órgãos linfoides
secundários e diferenciam-se em células efetoras e de
memória.

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Algumas notas importantes sobre APCs e Células T

Todos os linfócitos T (como os CD4+ e CD8+), tal como quaisquer células nucleadas, expressam moléculas de
MHC classe I à sua superfície. Assim, conseguem apresentar antigénios a linfócitos T CD8 +. No entanto, não
são considerados células apresentadoras de antigénios por excelência.

As APCs profissionais são as DCs, os macrófagos e os linfócitos B. Estes 3 tipos de células expressam moléculas
de MHC classe I e MHC II, podendo apresentar antigénios a linfócitos T CD8+ e T CD4+, respetivamente.

O TCR dos linfócitos T CD4+ é ativado por péptidos apresentados em moléculas de MHC II, isto é, o TCR dos
linfócitos T auxiliares reconhece o complexo péptido-MHC II, esta última expressa à superfície das APCs.

O TCR dos linfócitos T CD8+ é ativado por péptidos apresentados em moléculas de MHC I, isto é, o TCR dos
linfócitos T citotóxicos reconhece o complexo péptido-MHC I, esta última expressa à superfície das APCs.

Os linfócitos T CD4+ efetores (depois de terem sido ativados via TCR por complexos péptido-MHCII expressos
por APCs, proliferarem e diferenciarem-se em células CD4+ auxiliares) são capazes de ativar a função
citotóxica de CD8+. Os linfócitos T CD4+ efetores expressam à superfície MHC I, necessário para a apresentação
de antigénio a CD8+ (que reconhece MHC I) e produzem, por exemplo, IFN-γ.

Para a célula T que é ativada, o importante é interagir com uma APC que lhe apresente o seu péptido
específico no contexto de uma molécula de MHC I se for CD8 ou MHC II se for CD4. Pensar sempre em termos
do TCR da célula T a ser ativada. As DC que são APCs por excelência expressam tanto MHC I como MHC II,
logo conseguem ativar (se apresentarem os péptidos específicos para o TCR da célula T a ser ativada) CD8 e
CD4.

As células CD4 naives só são ativadas por APCs (DC, B, macrófagos) que expressam MHC II. Para ativação
eficiente de uma CD8 também é necessário uma APC, via interação do TCR das CD8 naive com complexo
péptido-MHC I expresso pelas APCs. A atividade citolítica das CD8 efetoras é desencadeada por qualquer
célula que expresse o "seu péptido" específico em MHC I. Concetualmente, como as CD4 expressam MHC I
(como quaisquer células nucleadas; reconhecem MHC II, no entanto – não confundir reconhecimento com
expressão!), podem ativar a função citolítica de CTLs (CD8 efetoras)) – não é eficiente.

As células CD4 efetoras ajudam na diferenciação ótima de CD8 naives em CTLs, mas usualmente via
modulação da atividade das APCs (o designado "APC licencing"). As células CD4 efetoras também produzem
citocinas que atuam diretamente nas CD8 ajudando na sua diferenciação.

Além do sinal via TCR que a célula T naive tem de receber para ser ativada, existem mais 2 sinais necessários
para a sua ativação ótima (coestimulação e citocinas). Quando a célula T naive já se diferenciou em célula T
efetora (auxiliar se CD4, citotóxica se CD8), o sinal via TCR fornecido pela interação com complexos MHC-
péptido expressos pela célula alvo é suficiente para desencadear a sua função efetora.

Todas as células nucleadas expressam MHC I, mas só as APCs é que também expressam MHC II ! Os linfócitos
T CD8 reconhecem MHC I e os linfócitos T CD4 reconhecem MHC II (pelo que ambos reconhecem APCs, que
expressam tanto MHC I como MHC II).

Células linfoides inatas (Innate lymphoid cells, ILCs):

- Imunidade inata.

- Células NK (Natural Killer) são representativas da população (pertencem ao grupo 1, ILC 1).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- Têm origem no CLP (common lymphoid progenitor), mas não expressam recetores Ag específicos (BCR ou
TCR).

- Subdivididas atualmente em 3 grupos


(ILC1, ILC2 e ILC3) distinguidos pelas
citocinas que secretam.

- Poderão providenciar a primeira linha de


defesa a microrganismos na pele e mucosas.

Células NK (Natural Killer):

- Resposta imunológica inata.

- Granulares (libertam os grânulos quando


determinados enzimas induzem a
apoptose).

- Reconhecem e eliminam tumores ou células infetadas com vírus (em função, são semelhantes às TCD8).

Sistema linfático:

- As células do SI (sistema imunológico) são altamente


móveis e utilizam dois sistemas para circular pelo corpo:
o sistema circulatório e o linfático.

- Os vasos sanguíneos têm acesso a virtualmente


todos os órgãos e são revestidos por células endoteliais
que são responsivas a sinais inflamatórios. Estas
cooperam com células do SI inato para recrutar
leucócitos do sangue para tecidos infetados.

- Apenas leucócitos têm acesso ao sistema linfático,


uma rede de vasos que transportam linfa, um fluido rico
em proteínas derivado do plasma. Estes vasos drenam
diversos tecidos e fornecem uma via para células
imunes ativadas e antigénios migrarem de locais de
infeção para órgãos linfoides secundários onde
encontram e ativam linfócitos.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- Os vasos linfáticos também recolhem fluido intersticial que ”banha”


todas as células, retornando-o de volta ao sistema circulatório. Impedem
o retrocesso da linfa por meio de válvulas.

- A linfa é recolhida por uma rede de vasos linfáticos de pequeno


diâmetro que se
unem em vasos
sucessivamente
maiores que, por sua
vez, se ligam às veias
perto do coração.

- O ducto torácico
(principal ducto do
sistema linfático)
coleta a linfa de todo
corpo exceto do
braço direito e lado
direito da cabeça (recolhida pelo ducto linfático direito) e
drena-o na veia subclávia esquerda.

- O timo, a medula, o baço, a amígdala e os gânglios


linfáticos fazem parte do sistema linfático.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Órgãos linfoides primários:

Medula óssea

- Local de desenvolvimento de linfócitos B.

- Progenitor de LT tem origem na médula (TSP, thymic settling


progenitors).

Timo

- Local de desenvolvimento e maturação de linfócitos T.

- Órgão bilobular sobre o coração.

- O timo induz apoptose de:

• LT incapazes de reconhecer/interagir com MHC (+).


• LT que “interagem demasiado” com MHC-Ag (-).

- A sua função diminui com a idade.

Se não houvesse indução da apoptose dos linfócitos T no timo,


os linfócitos que não reconhecem MHC nunca iriam ser
reconhecidos (e seriam inúteis). Por outro lado, os que
reconhecem demasiado poderiam levar à origem de doenças
autoimunes (seleção negativa).

Note-se que a hematopoiese inicial, isto é, a produção dos


progenitores linfoides e mieloides só acontece na medula
óssea!

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Órgãos linfoides secundários:

Gânglios linfáticos

- Órgão encapsulado.

- ≈500 em humanos.

- Localizados ao longo dos vasos linfáticos, assim com


acesso a antigénios presentes em tecidos drenados pelo
sistema linfático.

- Constituídos por 3 regiões:

• Córtex (LB, macrófagos e células dendríticas) –


região mais exterior.
• Paracórtex (LT e DCs) ou T cell zone.
• Medula (Plasmócitos).

As atividades das células B e das células T estão separadas


em microambientes distintos, respetivamente no córtex e
no paracórtex.

Os macrófagos e as células dendríticas encontram se no


córtex e paracórtex, respetivamente.

Os antigénios entram nos gânglios através de vasos


linfáticos aferentes.

Os linfócitos virgens entram nos gânglios através de


vénulas endoteliais altas (HEV, high endotelial venule) e saem do gânglio via vasos linfáticos eferentes.

Os linfócitos T ficam no paracórtex que é a região das células T e os linfócitos B migram para os folículos
linfoides no córtex.

A segregação anatómica de LB e LT em áreas distintas dos GL (gânglios linfáticos) é dependente de citocinas:

- LT naïve expressam CCR7 (recetor de quimiocinas), respondendo a CCL19 e CCL21 produzidas por células
estromais nas zonas T dos GL.

- DCs ativadas por microrganismos também expressam CCR7, assim também migrando para as zonas T dos GL.

- LB naïve expressam níveis baixos de CCR7, mas elevados de CXCR5, que reconhece CXCL13 produzida apenas
por FDCs (Follicular dendritic cells) nos folículos.

Baço

- Órgão altamente vascularizado cuja principal função é remover eritrócitos envelhecidos ou danificados de
circulação e iniciar respostas imunológicas a Ag resultantes de microrganismos que invadam a corrente
sanguínea

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- Compartimentos:

• Polpa vermelha (macrófagos e


eritrócitos).
• Polpa branca (linfócitos).

O baço no homem é constituído por vários


lóbulos, sendo que cada lóbulo é constituído
por polpa branca e vermelha e zona marginal.

PALS: bainha linfocitária periarteriolar

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Aula 5 – Imunidade inata (I)

Os vertebrados encontram-se protegidos por 2 sistemas de


imunidade:

-> Imunidade inata.

-> Imunidade adquirida.

A imunidade inata está presente em todos os organismos


multicelulares, desde plantas, a insetos e a vertebrados (750
milhões de anos). É a mais antiga.

A imunidade adquirida “desenvolveu-se” em vertebrados


mandibulares (350 a 500 milhões de anos).

Todos os vertebrados possuem o GALT (gut-associated


lymphoid tissue). No entanto, apenas os vertebrados com
mandíbula possuem timo e medula óssea bem desenvolvidos. A
medula óssea apareceu inicialmente com os sapos, ao passo que
o timo apareceu com a existência das trutas.

Todos os vertebrados possuem ainda 2 populações de populações de linfócitos (B e T), sugerindo que estes
estariam presentes no ancestral comum.

A imunidade inata e adaptativa


completam-se. A primeira resulta das
respostas iniciais contra infeções, ao
passo que a segunda, mais tardia, requer
a ativação de linfócitos. Adicionalmente,
a imunidade inata (à qual os
microrganismos patogénios estão
imediatamente sujeitados em entrada no
organismo) é constituída pela barreiras
epiteliais (e outras físicas), fagócitos
(exemplos: macrófagos, neutrófilos e
células dendríticas, estas últimas
essenciais à apresentação de antigénios
aos linfócitos T), complementos
(proteínas solúveis) e células NK (e outras
barreiras químicas). Por outro lado, a
imunidade adaptativa requer a ativação
dos linfócitos com desenvolvimento dos
plasmócitos a partir dos linfócitos B (e subsequente libertação de anticorpos) e das células T efetoras a partir
dos linfócitos T virgens.

Relembre-se da Aula 2:

A imunidade inata ou natural é a primeira linha de defesa, rápida (horas) e não-específica, entrando de
imediato em ação. É essencial para a defesa nas primeiras horas e dias após a infeção. A resposta imune inata

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é mediada por moléculas de reconhecimento codificadas na linha germinal do genoma e por mecanismos
“prontos” para responder mesmo antes de uma infeção, nomeadamente:

• Barreiras físicas e químicas (pele, mucosa gástrica, suor, lágrimas, pH ácido do estômago, epitélios,…).
• Células com capacidade fagocítica (macrófagos nos tecidos e neutrófilos
no sangue).
• Células NK (natural killer), células dendríticas (apresentam antigénios) e
células linfoides inatas.
• Proteínas circulantes (exemplo: complemento) ou péptidos
microbianos.
• Citocinas – moléculas de comunicação entre células que podem ser do
sistema inato ou indutivo produzidas por linfócitos T auxiliares.

As respostas imunes inatas baseiam-se no reconhecimento de moléculas por


recetores codificados na linha germinal designados por recetores de
reconhecimento de padrões ou PRR (pattern recognition receptors).

Estes ligam-se a moléculas genericamente


designadas por padrões moleculares associados
a patogénios ou PAMPs (Pathogen-associated
molecular patterns) que se encontram em tipos
muito diferentes de patogénios (ex:
lipopolissacáridos, peptidoglicanos, etc).

A ordem de grandeza dos PRR que se conhecem


atualmente é das centenas.

Os PRRs (exemplo: TLR) reconhecem os PAMPs


(exemplo: LPS – bactérias gram-negativas).

A imunidade adquirida ou adaptativa é um tipo de imunidade (mais potente) que se adapta à infeção, de tal
forma que as respostas imunológicas adquiridas são específicas para diferentes antigénios e frequentemente
para diferentes porções de uma proteína, polissacarídeo ou outra macromolécula.

Assim, as respostas imunes adaptativas são respostas mediadas por células ou por anticorpos
(imunoglobulinas). Estes anticorpos são produzidos pelos linfócitos B, que usam recetores muito específicos
para antigénio gerados ao acaso. A resposta é lenta (5 a 6 dias, ou mais). A ordem de grandeza dos recetores
das células T e B é dos milhares de milhões.

As células envolvidas na imunidade adaptativa são os linfócitos B e os linfócitos T que expressam na sua
superfície recetores para antigénio designados por BCR (B cell receptor) e TCR (T cell receptor), respetivamente.

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Em cada momento existem milhares de milhões (>109) linfócitos que diferem entre si nos recetores para
antigénio que expressam.

A imunidade adquirida demora bastante tempo a expressar-se, pelo que a imunidade inata é imprescindível.
As duas imunidades comunicam.

A imunidade adaptativa é extremamente específica. A especificidade desta deve-se à existência de existe


clones individuais de linfócitos que expressam recetores membranares que distinguem diferenças subtis na
estrutura de epítopos/determinantes antigénicos diferentes, nomeadamente os linfócitos T.

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Funções da imunidade inata:

- Mantém defesas físicas e químicas nas barreiras epiteliais


(exemplo: a pele) que impedem a entrada de microrganismos.

- Providencia a resposta inicial a microrganismos que


previne, controla ou elimina a infeção.

- Elimina células danificadas e inicia o processo de reparação


(proteção contra lesão/insulto de tecidos).

- “Desencadeia” uma resposta imunitária adquirida,


podendo influenciar a natureza da mesma de modo a torná-la
mais eficiente contra diferentes tipos de microrganismos.

- Os dois principais mecanismos de proteção mediados pela


resposta imunológica inata são a indução de inflamação e a de
resposta antiviral.

- A inflamação é o processo pelo qual leucócitos circulantes


e proteínas plasmáticas são atraídos para os locais de infeção
nos tecidos e são ativados para destruir e eliminar os agentes
infeciosos. A inflamação é uma consequência da resposta imune inata (e pode possuir uma componente
antiviral).

- A resposta antiviral previne a


replicação de vírus e promove morte de
células infetadas na ausência de uma
reação inflamatória.

- Esta resposta tem pouca (quase não


tem) memória.

Ambas as imunidades conseguem


discriminar com relativa facilidade os
microrganismos. No entanto, além das
diferenças anteriormente mencionadas,
os componentes solúveis no sangue
relativos a cada imunidade são
diferentes. A imunidade inata é constituída por diversos péptidos ou proteínas e mediadores como as citocinas,
ao passo que a imunidade adaptativa leva à libertação de anticorpos (recorrendo igualmente a citocinas que
acabam por pertencer a ambos os tipos de imunidade).

Claro está que a sua especificidade é diferente. A imunidade adaptativa é bastante mais específica e envolve
inclusive recetores e linhagens de células diferentes:

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Os recetores relativos à imunidade inata encontram-se codificados na linhagem germinativa (exemplos: Toll-
like receptor, N-formyl methionyl receptor, Mannose receptor e Scavenger receptor), ao passo que os recetores
relativos à imunidade adquirida provêm de recombinações de genes dos precursores que originam os linfócitos
B e T (BCR ou Ig/Ab e TCR). Adicionalmente, a primeira é não-clonal (uma mesma
linhagem de células leva à expressão dos mesmos recetores), ao passo que a segunda
é clonal (os linfócitos expressam recetores específicos e únicos nas suas células, TCR
e BCR). Aqui existe o reconhecimento específico de diferentes e únicos antigénios, ao
passo que na imunidade inata apenas existe o reconhecimento de
padrões moleculares e seus recetores (idênticos recetores de
manose, por exemplo) (PAMPs - pathogen-associated molecular
patterns) dos microrganismos patogénicos, onde células infeciosas
expressam recetores semelhantes e que são reconhecidos. Nesta
imunidade são ainda os padrões moleculares associados ao dano
(DAMPs) que informam o sistema imune inato de que existe um
dano. Estes DAMPs (damage-associated molecular patterns) são moléculas
endógenas produzidas ou libertadas por células danificadas ou mortas.

Várias barreiras quer físicas quer químicas existem para prevenir o acesso dos
patogénios aos tecidos.

Se essas barreiras forem quebradas, os recetores dos sistema imune inato


reconhecerão a ameaça sob a forma de PAMP dos microrganismos ou sob a forma de
estruturas do próprio danificadas, envelhecidas ou mortas - os DAMP. Estas
estruturas são reconhecidas pelos PRR (pattern recognition receptor).

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Os PAMP são moléculas vitais dos patogénios altamente conservadas e invariantes entre uma mesma classe
de patogénios, sendo raramente proteínas. São produzidos pelos microrganismos mas não o são pelo
hospedeiro.

PRR são os recetores nas células do hospedeiro a que se ligam os PAMP. Exemplos: β-1,3 glucano dos fungos,
peptidoglicano e LPS das bactérias, fosfoglicano dos parasitas, ácido lipoteicóico, dsRNA,… Os PRR podem ser
expressos na membrana plasmática (ex: TLR), nos endossomas/lisossomas (ex: TLR) e no citosol (ex: NLR, RLR).
As famílias de PRR reconhecem uma grande variedade de ligandos, os PAMP. Estes podem ser recetores
integrais de membrana (exemplos: recetores semelhantes ao Toll ou TLR; recetores das lectinas tipo C),
recetores citosólicos (NLR - NOD like receptors; RLR - RIG like receptors) ou recetores que reconhecem DNA.

O sistema imune inato recorre a diversos tipos de recetores, presentes em diferentes localizações nas células,
e igualmente moléculas solúveis no sangue e secreções das mucosas para reconhecer os PAMPs e DAMPs.

Alguns DAMPs reconhecidos são as HSPs (proteínas


ativadas por choque térmico) ou outras proteínas que
respondam ao stress, cristas (urato monossódico),
compostos hidrolisados da membrana extracelular por
proteases como proteoglicanos e péptidos, alguns
componentes mitocondriais (péptidos formilados e
ATP) e algumas proteínas nucleares como a HMGB1 e
as histonas.

Alguns PAMPs reconhecidos são, por exemplo, as


moléculas de ácidos nucleicos (RNA de cadeia simples,
RNA de cadeia dupla ou mesmo zonas ricas em GC),
algumas proteínas (pilina e flagenina), alguns
constituintes das membranas lipídicas (LPS e ácido
lipoteicoico) e alguns polissacarídeos (manoses e
outros derivados glicídicos).

Estes PAMPs geralmente encontram-se associados a


recetores, mas podem encontrar-se solúveis nas
células.

Alguns PAMPs associados a recetores são: TLRs


(Alguns Trolls podem encontrar-se em endossomas),
NLRs (no citosol de fagócitos e células epiteliais com os
NODs, onde se encontram os inflamassomas), RLRs (no
citosol de fagócitos, reconhecem RNA viral), CDSs
(reconhecem DNA bacteriano e viral), CLRs (na
membrana plasmática de fagócitos), scavenger
receptors (na membrana plasmática de fagócitos) e N-
formyl met-leu-phe receptors (na membrana plasmática de fagócitos). Outros padrões são solúveis,
nomeadamente as pentraxinas (existentes no plasma),
coletinas (presentes no plasma e surfactante
pulmomar), ficolinas (presente no plasma) e os
complementos (encontram-se no plasma) – estes
últimos formam o complexo de ataque à membrana dos
microrganismos patogénicos.

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Aula 6 – Imunidade inata (II)

PRRs (pathogen-recognition receptors):

Os PRRs podem ser expressos:

• Na membrana plasmática (ex: TLR e recetores de lectinas-C).


• Nos endossomas/lisossomas (ex: TLR).
• No citosol (ex: NLR, RLR).

Os TLRs localizam-se quer na membrana plasmática (exemplos: TLR-1, TLR-2, TLR-4, TLR-5, TLR-6), permitindo
o reconhecimento de ligandos no meio extracelular, como nas membranas dos endossomas (exemplos: TLR-3,
TLR-7, TLR-8 e TLR-9; cuja expressão na membrana endossomal e função requer a ação de uma proteína, UNC-
93B, cuja deficiência acarreta suscetibilidade a algumas infeções virais como infeções pelo vírus Herpes).

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Outros PRRs que se localizam na membrana plasmática são as lectinas do tipo C:

• O recetor de manose (CD206).


• Dectina-1 e dectina-2.
• DC-Sign (CD209).
• Langerina (CD207).

Exemplos de PRRs localizados no citosol das células são:

• NLRs (NOD like receptors).


• RLRs (RIG like receptors).

Isto é, em resumo:

Recetores integrais de membrana:

• Recetores semelhantes ao Toll (TLR).


• Recetores das lectinas tipo C.

Recetores citosólicos:

• NLR (NOD like receptors)


• RLR (RIG like receptors)
• Recetores que reconhecem DNA.

TLRs (Toll-like receptors):

Os TLRs são pathogen-recognition


receptors (PRRs), isto é, são proteínas
membranares que compartilham um
elemento estrutural comum na região
extracelular: o domínio LRR (Leucine rich
repeats); é o domínio de ligação ao ligando
(PAMP; Pathogen-associated molecular
pattern), de tal forma que a ligação do
domínio LRR ao respetivo ligando (PAMP)
induz a dimerização de TLRs (ou quando
liga aos DAMP) e ativa a via de sinalização
correspondente.

Este domínio LRR é constituído por 20-30


aminoácidos com repetições LxxLxLxxN -
em que L é leucina, x qualquer outro
aminoácido e N corresponde à asparagina (domínios ricos em leucinas).

Além do domínio extracelular LRR, os TLRs possuem um domínio transmembranar e um domínio intracelular
o TIR (Toll/IL1R domain) responsável pela ativação da cascata de sinalização.

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Os TLRs são expressos ou na


membrana plasmática ou na
membrana dos endossomas ou
lisossomas.

Os TLRs que interagem com


ligandos extracelulares residem
na membrana plasmática, ao
passo que os TLRs que
reconhecem ligandos libertados
por microrganismos endocitados
estão localizados na membrana
dos endossomas ou lisossomas.

O TLR-4 é o único TLR conhecido que


Ligandos extracelulares apresenta expressão na membrana
plasmática, mas é capaz de migrar após
ligação ao respetivo ligando para o
compartimento endossomal/lisossomal.

Outro aspeto importante ilustrado na


figura é a formação de homodímeros ou
heterodímeros de TLRs, induzidos pelo
reconhecimento dos respetivos ligandos.

Reparar que apenas o TLR-1, TLR-2 e TLR-


6 formam heterodímeros.

Ligandos libertados por


microrganismos endocitados

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Lista dos diferentes TLRs conhecidos e respetivos ligandos reconhecidos. A origem de cada um dos ligandos
específicos (a que microrganismo pertencem) também é indicada:

- Todos os TLRs funcionam como homodímeros, exceto o TLR-1, TLR-2 e TLR-6 que formam heterodímeros:
TLR-1&TLR-2 assim como TLR-2&TLR-6.

- TLR-10 encontra-se presente apenas em humanos.

- TLR-11, TLR-12 e TLR-13 apenas identificados em ratinhos.

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TLRs: Vias de sinalização e tipo de resposta desencadeada

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- Os TLR-1, TLR-2, TLR-5 e TLR-6 utilizam a proteína


adaptadora MyD88 (Myeloid differentiation primary
response 88) e ativam os fatores de transcrição NF-kB
(Nuclear factor kappa B) e AP-1 (Activator protein 1).

- O TLR-3 utiliza a proteína adaptadora TRIF (TIR-domain-


containing adapter-inducing interferon-β) e ativa os
fatores de transcrição IRF3 e IRF7 (IRF: Interferon
regulatory factor). A ativação dos fatores de transcrição
IRF3 e IRF7 induz a produção de Interferão tipo I (IFN-α e
IFN-β), importante para a atividade antiviral.

- O TLR-4 pode ativar ambas as vias de sinalização


anteriormente descritas.

- O TLR-7 e o TLR-9 presentes no compartimento


endossomal/lisossomal sinalizam a via MyD88 e ativam os
fatores de transcrição NF-kB e IRF-7. A ativação do fator de
transcrição IRF7 induz a produção de Interferão tipo I (IFN-
α e IFN-β), importante para a atividade antiviral

- A ativação de NF-kB e AP1 induz a expressão de genes


envolvidos na resposta inflamatória como citocinas pró-
inflamatórias (exemplos: TNF e IL-1), quimiocinas

(exemplos: CCL2 e CXCL8) e moléculas de adesão endoteliais


(exemplo: seletina E). A ativação desta via de sinalização
aumenta também a expressão de moléculas
coestimuladoras como CD80 e CD86 importantes para uma
eficiente ativação de Linfócitos T.

A ligação de TLRs a PAMPs de diferentes microrganismos


ativa vias de sinalização distintas, dependendo do TLR e da
molécula adaptadora usada.

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NLRs (NOD like receptors):

Além de TLRs que detetam microrganismos


extracelulares ou em endossomas, o sistema imune
inato evoluiu para equipar células com PRRs
capazes de detetar infeção ou dano tecidular no
citosol.

São PRRs citosólicos os recetores tipo NOD, os RIG


e os Sensores citosólicos de DNA.

Os NOD like receptors também designados por


Nucleotide oligomerization domain/leucin-rich
repeat containing receptors (23 conhecidos
atualmente em humanos e 34 em ratinhos) dividem-se em 3 classes: os NLRB, os NLRC e os NLRP.

Os NOD1 e NOD2 pertencem à classe NLRC e reconhecem


produtos de degradação de peptidoglicano.

- NOD1 deteta e responde a ácido diaminopimélico (DAP).

- NOD2 deteta e responde a MDP (muramil dipéptido).

Quanto à estrutura de NOD like receptors a maioria possui


um domínio LRR na parte C-terminal e todos possuem um
domínio NDB (nucleotide oligomerization domain). O tipo de
domínio presente na parte N-terminal permite a distinção
entre as diferentes classes.

NLRB possuem um domínio BIR; NLRC um domínio CARD;


NLRP um domínio PYD.

O Inflamassoma NLRP3 - estrutura e ativadores:

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Alguns NLRs associam-se a grandes


complexos proteicos que ativam os
proteases (caspases) que lhes estão
associados convertendo formas precursoras
de citocinas (procitocinas) em formas
maduras e ativas como é o caso da IL-1β e da
IL-18. Ou seja, alguns NLRs possuem
domínios que lhes permitem associar com
outras proteínas e formar complexos. Um
exemplo é o domínio PYD de NLRPs.

O inflamassoma NLRP3 tem reunido


grande interesse, uma vez que mutações em
NLRP3 estão associadas a diversas doenças
auto-inflamatórias.

Os inflamassomas são complexos


multiproteicos que se formam no citosol em
resposta a PAMPs ou DAMPs citosólicos,
cuja função é produzir formas ativas das
citocinas pró-inflamatórias IL-1β and IL-18.

Este inflamassoma que é expresso em


monócitos, macrófagos, neutrófilos, células
dendríticas, alguns linfócitos e células
epiteliais é um complexo que contém cópias múltiplas de NLRP3, da proteína adaptadora ASC (que se liga a
NLRP3 via interação homotípica entre domínios PYD-PYD) e Caspase 1 (que se liga a ASC via interação
homotípica entre domínios CARD-CARD).

Os ativadores do inflamassoma NLRP3 estão divididos em 2 categorias: PAMPs


derivados de bactérias, vírus, fungos e protozoários e moléculas ”estéreis” como
moléculas do próprio (“self”, exemplo: ATP; DAMPs) e derivadas do ambiente
(exemplo: sílica).

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Os inflamassomas são, novamente, complexos


multiproteicos que se formam no citosol em resposta a
PAMPs ou DAMPs citosólicos, cuja função é produzir
formas ativas das citocinas pró-inflamatórias IL-1β and
IL-18.

A IL-1β e a IL-18 são produzidas na forma inativa (como


precursores) que precisa de ser clivada
proteoliticamente pelo Caspase-1 para se tornarem
citocinas biologicamente ativas, que após secreção pela
célula promovem uma resposta inflamatória.

Os inflamassomas são compostos por oligómeros de


um sensor (exemplo anterior: NLRP3), de caspase-1, e de
um adaptador (ASC).Estes complexos oligoméricos são
apenas formados quando os sensores respondem a
PAMPs, DAMPs ou a alterações na célula que indiquem
presença de infeção ou insulto.

Componentes celulares do sistema imunológico


inato:

Os principais componentes do sistema imunológico


inato são:

• Barreias epiteliais.
• Fagócitos.
• Células dendríticas (DCs).
• Células linfoides inatas (ILCs).
• Células Natural Killer (NK).
• Mastócitos.

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Barreiras epiteliais:

As barreiras epiteliais intactas formam barreiras físicas entre


microrganismos e tecidos. As células epiteliais produzem compostos
antimicrobianos que impedem a entrada de microrganismos.

Assim, os epitélios nos locais de entrada de microrganismos


funcionam como barreiras físicas, produzem substâncias
antimicrobianas e albergam linfócitos intraepiteliais capazes de
destruir microrganismos e células infetadas. São exemplos de
compostos antimicrobianos as defensinas e as catelicidinas.

As defensinas são pequenos péptidos de 29 a 34 aminoácidos, que


contêm regiões catiónicas e hidrófobas. Em humanos existem 2
famílias, α e β. São produzidas por células epiteliais das mucosas e
por leucócitos granulares como os neutrófilos, células NK e linfócitos
T citotóxicos. As células de Paneth no intestino são as principais
produtoras de defensina α.

As catelicidinas são produzidas por neutrófilos e barreira epitelial da pele e dos tratos
respiratório e intestinal.

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Fagócitos:

- Células com capacidade fagocítica, como


macrófagos e neutrófilos.

- São a primeira linha de defesa contra


microrganismos que evadem as barreiras
epiteliais.

- Na maioria dos tecidos existem macrófagos


residentes que funcionam como “sentinelas” a
infeção.

- Outros fagócitos, como monócitos e


neutrófilos, são recrutados para os locais de
infeção em resposta aos microrganismos ou
sinais produzidos pelas células sentinela.

Células dendríticas (DCs):

- As DCs detetam rapidamente microrganismos


invasores devido à sua localização nos tecidos e
à expressão de inúmeros PRRs.

- São as células do sistema imunológico inato


que expressam mais PRRs (diferentes
tipos/classes).

- Em resposta a microrganismos invasores secretam citocinas próinflamatórias que promovem o recrutamento


de outros leucócitos do sangue.

- As DCs plasmacitoides são as principais produtoras de Interferão tipo I, importante nas respostas antivirais.

- São fundamentais na ativação da resposta imune adquirida (ativação de linfócitos T).

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Células linfoides inatas (ILCs):

- Originadas a partir de células estaminais hematopoiéticas.

- As ILCs não expressam PRR e, portanto, não são ativadas diretamente


por patogénios mas por citocinas produzidas por outras células.

- Morfologia semelhante a linfócitos, mas não expressam BCR nem TCR.

- Existem 3 subtipos de ILCs: ILC1, ILC2 e ILC3, que produzem citocinas


distintas e expressam fatores de transcrição semelhantes a linfócitos
auxiliares Th1, Th2 e Th17.

- As citocinas que cada subtipo produz determina o seu papel de defesa


contra microrganismos.

- Os 3 subtipos de ILCs diferenciam-se a partir do progenitor linfoide


comum que também dá origem a linfócitos B, T e NK.

- O precursor de ILCs comum é identificado pela expressão do fator de


transcrição Id2 e dá origem aos 3 subtipos de ILCs.

- Cada subset é distinguido pela expressão de fatores de transcrição e


pelas citocinas que produzem após ativação. As citocinas que induzem a
diferenciação do progenitor comum em cada subtipo estão indicadas na
figura assim como as citocinas que induzem a ativação de cada subtipo.
Também indicadas estão as principais funções na resposta imunológica
que cada subtipo desempenha.

- Por exemplo, a ILC1 expressa o fator de transcrição T-bet e após


ativação com as citocinas IL-12 e IL-18 produz IFN-γ que desempenha um
papel importante na defesa antiviral.

- A ILC2 expressa o fator de transcrição GATA-3 e após ativação com as citocinas IL-25, IL-33 e TSLP produz IL-
5 e IL-13 com um papel fundamental na defesa contra helmintas e nas inflamações alérgicas.

- A ILC3 expressa o fator de transcrição RORγt e após ativação com as citocinas IL-1 e IL-23 produz IL-17 e IL-
22 com um papel fundamental na barreira intestinal e na organogénese linfoide (parte do processo de
desenvolvimento embrionário no qual os três folhetos germinativos - ectoderme, mesoderme e endoderme -
se diferenciam e dão origem aos órgãos internos, neste caso linfoides, do organismo).

Células NK (Natural Killer):

- A função efetora de células NK consiste em matar células infetadas e em produzir IFN-γ que ativa a função
microbicida de macrófagos.

- Quando células NK são ativadas, libertam grânulos nas células adjacentes.

- As proteínas presentes nos grânulos de NK (e também de Linfócitos T citotóxicos) são:

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• Perforina, que facilita a entrada de outras


proteínas no citosol de células infetadas (forma
um poro na membrana plasmática de células
infetadas).
• Granzimas, são enzimas proteolíticos que iniciam
uma sequência de eventos que causam a morte
das células alvo por um processo designado por
apoptose (morte celular controlada).

- Ao matar células infetadas por vírus e por bactérias


intracelulares, as NK eliminam os reservatórios da infeção.

- As células NK reconhecem ligandos expressos por células


infetadas ou por células em stress, induzindo a sua morte
por apoptose.

- As células NK respondem a IL-12 produzida por


macrófagos e secretam IFN-γ que ativa a função microbicida
de macrófagos, resultando na morte de microrganismos
endocitados.

- As células NK distinguem células infetadas e sob stress de


células saudáveis e a sua atividade é regulada pelo balanço
entre sinais ativadores e inibitórios produzidos por recetores
que expressam.

- Os recetores ativadores de NK reconhecem ligandos em


células alvo e ativam tirosina cinases (PTKs), cuja atividade é
inibida por recetores inibidores que reconhecem
moléculas de MHC classe I e ativam tirosina
fosfatases (PTPs).

- As células NK não destroem células saudáveis


que expressam MHC classe I.

- Se uma infeção viral ou outro stress inibe a


expressão de MHC classe I e induz a expressão de
ligandos ativadores adicionais, o recetor inibidor
de NK não é ativado e a sinalização via recetor
ativador induz morte celular da célula.

- Este mecanismo de ativação de NK é designado


por missing self.

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Mastócitos:

- Os mastócitos são células sentinela presentes na pele, epitélio das mucosas e tecido conetivo, capazes de
secretar citocinas pró-inflamatórias (exemplo: TNF) e mediadores lipídicos (exemplo: prostaglandinas) em
resposta à infeção.

- Estas células possuem grânulos com vários mediadores inflamatórios que são libertados após a sua ativação,
quer por PAMPs quer por um mecanismo dependente de anticorpos.

Componentes dos grânulos:

• Histamina, que causa vasodilatação e aumento da permeabilidade capilar.


• Enzimas proteolíticos que inativam toxinas ou causam morte de bactérias.

- Também providenciam proteção contra infeções por helmintas e são responsáveis pelos sintomas de
alergias.

Moléculas efetoras solúveis da


imunidade inata:

- Diferentes tipos de moléculas que


reconhecem microrganismos e
induzem uma resposta imunológica
inata estão presentes na forma solúvel
no sangue e fluidos extracelulares.

- Constituem a primeira linha de


defesa contra microrganismos
presentes fora das células ou que
nalguma parte do seu ciclo se localizam
fora das células.

- São exemplos destas


moléculas solúveis, o sistema do Complemento, Pentraxinas assim como
Colectinas e Ficolinas.

- Mecanismos de ação:

Ao ligar-se a microrganismos funcionam como opsoninas, aumentando a


capacidade fagocítica de macrófagos e neutrófilos. Após ligação a
microrganismos, promovem respostas inflamatórias que levam ao
recrutamento de mais fagócitos para os locais de infeção. Podem também
diretamente matar microrganismos.

A ativação da via do complemento pode ser iniciada por 3 vias distintas, todas
levando à produção de C3a, que promove a inflamação, e C3b (fase inicial).

A molécula de C3b inicia a fase final da ativação da cascata do complemento,


culminando com a produção de péptidos que também promovem inflamação
(C5a) e polimerização do C9, que forma o Complexo de ataque à membrana
(MAC, Membrane Attack Complex), que cria buracos na membrana plasmática
do microrganismo, levando à sua lise.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

A ativação, função e regulação do sistema do complemento vão ser discutidos em detalhe mais tarde.

Resposta inflamatória:

O principal mecanismo pelo qual o


sistema imunológico lida com a infeção e
dano tecidular é induzir inflamação aguda,
que consiste na acumulação de leucócitos,
proteínas plasmáticas e fluído derivado do
sangue num local de infeção ou lesão.

Os leucócitos e proteínas plasmáticas que


são críticas para a resposta inata
normalmente circulam no sangue e
precisam de ser recrutados para os locais
de infeção ou de lesão de tecidos.

Os primeiros leucócitos recrutados para


estes locais são os neutrófilos. Monócitos,
que se diferenciam em macrófagos nos
tecidos, tornam-se a população dominante
com o avançar da infeção.

Nesta resposta são importantes: as proteínas plasmáticas, os componentes da cascata do Complemento,


anticorpos e proteínas de fase aguda.

As bactérias entram no organismo do hospedeiro via feridas/cortes, ativando mecanismos da resposta


imunológica inata, incluindo ativação da fagocitose por células residentes nos tecidos, como macrófagos e DCs.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

O reconhecimento de bactérias por PRRs desencadeia a produção de citocinas, quimiocinas e outros


mediadores que alteram permeabilidade das células endoteliais nos vasos, levando a um influxo de fluidos
(contendo substâncias antimicrobianas) e fagócitos (primeiro neutrófilos e depois monócitos) para os locais de
infeção. Estes e subsequentes eventos causam o rubor, o inchaço, o calor e dor, característicos das respostas
inflamatórias locais.

Uma das respostas iniciais do sistema imunológico inato à infeção ou lesão consiste na produção de citocinas
pró-inflamatórias.

As citocinas da imunidade inata, as principais


populações celulares que as produzem e a sua
função encontram-se descritas na tabela 4.5.

Citocinas:

- Estas são produzidas principalmente por


macrófagos e DCs.

- A maioria tem uma ação parácrina.

- Diferentes citocinas têm funções semelhantes ou


sobreponíveis.

- As citocinas do sistema inato desempenham


diversas funções:

• Promover inflamação.
• Inibir replicação viral.
• Induzir respostas mediadas por linfócitos T.
• Limitar a extensão da resposta imunitária
inata.

- Muitas das citocinas produzidas por células do


sistema imune inato, como TNF, IL-17, IL-5 e IFN-γ são
também produzidas por Linfócitos T.

Ações locais e sistémicas das citocinas na


inflamação:

As citocinas pró-inflamatórias TNF-α, IL-1 e IL-6 têm


múltiplos efeitos locais e sistémicos:

- O TNF e IL-1 atuam em leucócitos e endotélio


induzindo inflamação aguda. Ambas as citocinas
induzem também a produção de IL-6 por leucócitos.

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- O TNF, a IL-1 e IL-6 medeiam os efeitos protetores da inflamação sistémica, incluindo a indução de febre,
síntese de proteínas de fase aguda pelo fígado e aumento da produção de leucócitos na medula óssea.

- O efeito de TNF sistémico pode causar choque séptico, incluindo função cardíaca diminuída, trombose,
aumento da permeabilidade capilar e alterações metabólicas devidas à resistência à insulina.

Fagocitose e destruição de microrganismos por fagócitos:

Os neutrófilos e os macrófagos que


são recrutados para os locais de
infeção ingerem microrganismos via o
processo de fagocitose, destruindo os
mesmos.

Tanto os neutrófilos como os


macrófagos expressam recetores que
reconhecem especificamente
microrganismos, sendo a ligação
destes microrganismos aos recetores
o primeiro passo da fagocitose. Alguns
destes recetores são PRRs como o
Recetor de manose e os Recetores
scavenger mencionados
anteriormente. A integrina MacI
reconhece microrganismos
opsonizados (com opsinas - moléculas que se ligam a um antigénio
e facilita o processo de fagocitose - fixadas) com proteínas do
sistema do complemento.

Os microrganismos
são então
internalizados em fagossomas, que se fundem com lisossomas
formando os fagolisossomas, o organito onde os microrganismos
são mortos por ação de espécies reativas de oxigénio ou de
nitrogénio e ainda pela ação de enzimas proteolíticos.

Funções de macrófagos:

Os macrófagos são ativados por compostos microbianos


(PAMPs), como o LPS ou IFN-γ produzido por células NK. O
processo de ativação de macrófagos induz a ativação de fatores
de transcrição, transcrição de vários genes e síntese de proteínas
que medeiam a função destas células.

No caso da imunidade adquirida, os macrófagos são ativados


por estímulos providenciados por Linfócitos T (IFN-γ e CD40L),
respondendo da mesma forma. Os macrófagos também podem
ser ativados por outros sinais para promover reparação de tecidos e fibrose.

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Respostas antivirais:

A principal forma pela qual o sistema inato inibe infeções virais é via indução de
expressão de Interferão tipo I, cuja principal atividade é a inibição de replicação viral.

Os interferões tipo I são uma família de citocinas estruturalmente relacionadas que


medeiam a resposta imunológica precoce a vírus. IFN-α e IFN-β são membros desta
família. Os interferões tipo I sinalizam via recetor tipo I, ativando a transcrição de diversos
genes que conferem resistência a infeções virais (indução de um estadio antiviral).

Funções mediadas por IFN I:

Sequestração de linfócitos T em gânglios linfáticos, de modo a maximizar a


possibilidade de ativação por antigénios microbianos.
Aumento da atividade citotóxica de células NK e células CD8+ citotóxicas, assim
como promover a diferenciação de células T CD4+ naïve em células T auxiliares produtoras
de IFN-γ (Th1).
Aumento de expressão de moléculas de MHC classe I, aumentando assim a
probabilidade de reconhecimento de células infetadas com vírus por linfócitos T CD8 +
citotóxicos. Deste reconhecimento, resulta a morte da respetiva célula infetada.

Ação biológica de membros da família de Interferão tipo I:

- Os interferões tipo I (IFN-α e IFN-β) são produzidos por células infetadas por vírus em
resposta a sinalização via TLRs (localizados na membrana endossomal) e a outros sensores
de RNA viral.

- Estes ligam-se a recetores expressos por células não


infetadas na vizinhança, ativando a via de sinalização JAK-
STAT, que induz a expressão de genes
cujos produtos interferem com a
replicação viral (indução de um
estadio antiviral).

- Os interferões tipo I também se


ligam a recetores em células
infetadas, induzindo a expressão de
genes, cujos produtos aumentam a
suscetibilidade da célula à atividade
citolítica de CTLs (Cytotoxic T
lymphocytes; Linfócitos CD8+
citotóxicos).

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Estimulação da imunidade adquirida pela resposta imunológica inata:

O reconhecimento de antigénio por linfócitos T, via TCR,


providencia-lhes o designado Sinal 1 (sinal via recetor de
antigénio). O mesmo é válido para Linfócitos B, aqui
representados.

Moléculas induzidas pela resposta imunológica inata a


microrganismos providenciam o designado Sinal 2:

- A natureza deste sinal 2 é diferente para linfócitos T e B.

- A integração destes 2 sinais pelos linfócitos induz a sua


proliferação e diferenciação.

Mecanismos de controlo da extensão da resposta


imunológica inata:

A magnitude e duração da resposta imune inata são


reguladas por mecanismos de feedback que limitam o dano
tecidular:

- A citocina IL-10, produzida por macrófagos e DCs, inibe a


ativação de macrófagos e DCs (mecanismo de feedback
típico).

- Fagócitos mononucleares produzem um antagonista


natural de IL-1 (IL-1RA; IL-1 receptor antagonist), que é estruturalmente homólogo a esta citocina e que se liga
aos mesmos recetores, funcionando como um competidor. Este antagonista é biologicamente inativo.

- A produção de citocinas pró-inflamatórias é regulada por produtos de genes envolvidos em autofagia


(processo de degradação de organitos e proteínas em lisossomas).

- Existência de vias de sinalização que inibem sinais de ativação induzidos por PRRs ou citocinas pró-
inflamatórias. Exemplo são as proteínas SOCS (Suppressors of cytokine signaling) que são inibidores da via JAK-
STAT induzida por recetores de citocinas.

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Aula 7 – Geração de diversidade do BCR e TCR (I)

As respostas humoral e celular dependem dos recetores de antigénio, nomeadamente o BCR e o TCR.

A imunidade humoral depende fortemente das células B ou linfócitos B cujo BCR se encontra ligado às suas
membranas. Estes linfócitos B quando se diferenciam originam plasmócitos (células B tardias) que produzem
imunoglobulinas/anticorpos e que as secretam para o meio extracelular.

A imunidade celular, por ouro lado, depende das células T cuja ativação/reconhecimento do antigénio
depende das APCs por intermédio do complexo MHC-péptido. Os linfócitos T expressam à sua superfície TCRs
que não devem ser confundidos com anticorpos/imunoglobulinas ou BCRs.

As imunoglobulinas apresentam várias estruturas quaternárias possíveis:

- IgM: pentâmero.

- IgA: monomérica, dimérica ou trimérica.

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- IgD, IgE, IgG: monómeros.

Estas imunoglobulinas têm cadeias leves (L) e pesadas (H)


ligadas por pontes persulfureto, assim como as cadeias
pesadas entre si. Adicionalmente possuem regiões
variáveis (V) e regiões constantes (C).

As células B, produtoras das Ig, desenvolvem-se na


medula óssea e depois circulam até aos órgãos linfoides
onde são maturadas. Aqui, ainda células B naive, produzem
dois tipos de imunoglobulinas diferentes: IgM e IgD. As IgM
são primeiramente produzidas, sendo-o ainda na medula
óssea.

Note-se que a região variável da imunoglobulina é


exclusiva de cada linfócito, pelo que se o mesmo linfócito
produzir IgM e IgD simultaneamente essa região variável
(de interação com o antigénio) é idêntica. Assim, dentro de
cada linfócito:

- É produzida a mesma região determinante antigénica.

- Diferentes regiões constantes (em diferentes subtipos


de imunoglobulinas).

- Existe uma expressão diferencial dos diferentes tipos de


Ig ao longo da diferenciação.

Os linfócitos B só produzem mais do que uma


imunoglobulina na fase em que ainda não houve a
apresentação ao antigénio (virgem, naive),
porque após a sua ativação e diferenciação em
plasmócito ou célula de memória apenas
expressam/secretam um tipo de imunoglobulina
(Ig).

Os TCRs têm uma estrutura


semelhante aos anticorpos, sendo
semelhantes ao fragmento Fab
dos mesmos. Estes não possuem
região constante, não são
secretados e possuem um
domínio proteico que os faz
permanecerem ligados à
membrana plasmática da célula T.

No anticorpo o fragmento Fab é


constituído por uma porção da
cadeia pesada e outra de cadeia leve, ao passo que nos TCR existem dois segmentos com uma estrutura
semelhante que são dímeros (as cadeias não são iguais) – α e β (mais comuns). No entanto existem algumas
células T que possuem dímeros γ (gama) e δ (delta).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Apesar de possuirmos apenas 30 000 genes para


os recetores, possuímos 100 mil milhões de
anticorpos diferentes (diferentes aminoácidos da
região variável), reconhecendo igualmente esse
número de diferentes antigénios. A questão que se coloca é como é que se
consegue gerar tamanha diversidade de aminoácidos.

Este

problema começou a ser estudado nos


anos 70, onde a sequenciação de
proteínas permitiu inferior que as
imunoglobulinas possuem os mesmos
aminoácidos exceto na parte variável
que difere de imunoglobulina para
imunoglobulina (e específica de cada
linfócito).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Dois investigadores, Hozumi e Tonegawa, recorreram ao


southernblot para elucidar o problema referido
anteriormente, para analisarem a estrutura dos genes das
imunoglobulinas.

Nesta técnica utilizam-se sondas/segmentos de DNA


marcadas com uma substância radioativa e, numa
membrana, detetar-se-iam onde se encontravam as suas
sequências complementares. Inicialmente, isola-se o DNA
genómico total de uma população de células, fragmenta-
se e separam-se os fragmentos por tamanho em
eletroforese. O gel, de seguida, era transferido para uma
membrana (com características semelhantes ao papel) que
é hibridada com uma sonda e, usando um filme de raios X,
para encontrar a mesma. Estes investigadores estudaram, pelo método descrito anteriormente, duas linhagens
de células: células embrionárias (precursoras de linfócitos B que ainda não sintetizavam Imunoglobulinas, isto
é, não expressavam estes genes) e linfócitos T tumorais (elevada proliferação) com a síntese de uma dada cadeia
leve de Ig específica. Isolaram o DNA e separaram por eletroforese, tendo hibridado com uma sonda/sequência
igual ao mRNA que codifica a Ig em estudo e
observaram diferentes resultados em cada
linhagem.

Quando não se expressavam ainda os genes de


Ig (ou seja, que ainda não as produziam),
observaram que a região codificante da cadeia
leve aparecia separada em dois segmentos do
DNA genómico distintos (duas bandas
diferentes), sendo o segmento maior (menor
migração) a região constante (C) e o segmento
menor a região variável (V) da sequência
codificante.

Quando havia transcrição ativa (e subsequente expressão e produção) das imunoglobulinas, observava-se que
as sondas iluminavam um único fragmento do DNA.

Concluiu-se assim que no processo de diferenciação das células estaminais em linfócitos B ocorreria um
rearranjo genómico para que as regiões V
(variável) e C (constante) passassem a estar
juntas, no mesmo fragmento de DNA.

O gene é composto por exões e intrões


sendo que estes últimos são removidos para
levar à produção do mRNA que possui uma
região codificante, que vai dar origem à
proteína.

O tamanho dos intrões (representados a


linha preta) é 10 vezes superior ao tamanho
dos exões (representados pelas caixas
azuis).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Nos genes das imunoglobulinas existem 3 regiões genómicas distintas associadas à produção de Ig. Duas
regiões em dois cromossomas diferentes para produzirem cadeias leves (λ e κ) e uma única região para produzir
cadeias pesadas.

Poder-se-ia pensar que as “caixas” são exões e a linha representa os intrões. No entanto, não se trata de um
gene único, mas sim de uma coleção de segmentos de genes (“biblioteca”) sendo que cada segmento de gene
tem capacidade de codificar uma parte da Ig, nomeadamente: a região linker inicial (L), a região variável (V),
uma região de junção (J), uma região constante (C) e uma região intermédia de junção/de diversidade (D).

Nos segmentos de genes que codificam para as


cadeias leves (L) estão presentes as regiões/loci L,
V, J e C e nos segmentos de genes das cadeias
pesadas (H) estão presentes o L, V, D, J e C.

O nosso genoma contém várias opções


diferentes para cada segmento codificante das
diferentes partes das Ig, isto é, as diferentes
regiões (representadas a diferentes cores) têm
mais do que uma opção de escolha. Por exemplo,
no locus λ da cadeia leve, a região variável (V)
possui cerca de 30 opções/possibilidades (até 30
segmentos capazes de codificar regiões variáveis
no locus das cadeias leve λ). Contém ainda 25 (na
figura mais recente 23) segmentos capazes de
codificar as porções intermédias da cadeia pesada
(D).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Assim, cada linfócito B recombina o seu genoma com estas várias possibilidades de combinações para a
produção de uma cadeia de Imunoglobulina única e exclusiva desta célula.

As cadeias leves surgem, portanto, da combinação dos segmentos génicos V, J e C. As cadeias pesadas surgem
da combinação de segmentos génicos V, D, J e C (este último com várias possibilidades distintas que codifica
para os diferentes subtipos de Ig), nomeadamente:

• γ (“gama”): IgG
• μ (“miu”: IgM
• α (“alfa”): IgA
• δ (“delta”): IgD
• ε (“épsilon”): IgE

O nome da Imunoglobulina é,
portanto, dado consoante a
região constante que a
codifica, sendo a letra do
segmento génico C no alfabeto
grego correspondente à letra
do nosso alfabeto do subtipo de Imunoglobulina (região constante C em grego = subtipo de Ig no nosso
alfabeto).

Este último esquema é a continuação do anterior onde o locus está prolongado e onde se mostra que a seguir
à região J nas cadeias pesadas existem diversos “pedaços” que codificam regiões constantes para produção dos
diferentes subtipos de anticorpos. Nesta aula só serão abordados a produção das IgM e IgD (as restantes serão
abordadas no estudo da ativação dos LB).

Sumariza-se o número de opções que existe para cada segmento génico. Por
exemplo, nas cadeias leves para codificar a região variável (V) têm-se entre 34
e 38 opções diferentes, no caso das cadeias do tipo κ. No caso das cadeias do
tipo λ têm-se entre 29 e 33 opções diferentes e para a cadeia pesada 38 a 46
opções diferentes. Note-se que o segmento D não existe nos loci das cadeias
leves.

Existem gamas variáveis, isto é, um intervalo de valores de segmentos


génicos em algumas situações, pois podem existir segmentos que se repetem
no genoma e não são essenciais. Além do mais, podem existir segmentos com
mutações (sendo-se na mesma um ser humano viável) que vão acumulando ao
longo do tempo. Assim, ao longo do tempo alguns segmentos acumulam
mutações tornando-se sequências não funcionais, passando a ser
pseudogenes (sequências genómicas com potencial codificante, mas que por
acumular de mutações deixam de ser expressos ou levam à síntese de mRNA
ou proteína não funcionais, mais tarde degradados). Isto acontece de forma
variável de indivíduo para indivíduo ou de linhagem familiar para linhagem
familiar.

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O gene da cadeia leve da Ig possui regiões


entre segmentos génicos representadas a
bege - região não codificante -, uma região
variável com 250 possibilidades, 4
segmentos joining e 1 cadeia constante
possível. Por um processo de recombinação
site-specific também denominada de
recombinação somática (detalhada
posteriormente, e que sucede em LB naive;
na ativação destes podem ocorrer mais
rearranjos; o nome advém do
reconhecimento de sequências bem
definidas, RSS) ocorre em cada linfócito um
rearranjo génico, onde um segmento V se reúne com um segmento J dando-se origem a um ponto de fusão (no
caso da figura V3J3). Isto é, segmentos V e J a mais de 20 kpb de distância passam a estar juntos. Assim, o
linfócito B possui a cadeia genómica rearranjada, de tal forma que aí se inicia a transcrição de um transcrito
primário que depois, por splicing, vai levar à junção da região VJ com a região constante (C), com a saída dos
intrões e do exão J4, neste caso.

Existem 250 possibilidades de regiões variáveis e 4 de regiões J, pelo que se podem ter 250(V) X 4(J) = 1000
combinações possíveis de cadeias leves diferentes que podem ser produzidas por este processo de
recombinação.

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Relativamente às cadeias
pesadas a situação é distinta.
Aqui dá-se a junção entre as
regiões D e J e, mais tarde, das V
com as DJ (nas cadeias leves não
há D, então juntam-se as V e J).
Aqui há 4 segmentos génicos, ao
passo que nas cadeias leves só há
3, existindo apenas uma
recombinação.

A estrutura do gene que


codifica para as cadeias pesadas é
diferente (tem a região D). Além
disso, neste caso existem 500 V’s,
12 opções da região de
diversidade (D), 4 regiões de joining ou de junção (J) e várias opções de C (para cada tipo de Ig, mas aqui
considera-se que é apenas uma para simplificar).

No primeiro momento de rearranjo, há a união de um segmento D e um segmento J, formando um exão


fundido DJ (segmento DJ). Seguidamente, existe a junção deste segmento DJ com um segmento V, ficando o
gene rearranjado no LB. O gene é transcrito (pré-mRNA) e sofre splicing, onde o segmento VDJ fica junto do
segmento C, onde se sintetiza o mRNA que codifica para a proteína (Ig neste caso).

Assim, existem 500 (V) X 12 (D) X 4 (J) = 24 000 combinações possíveis de cadeias pesadas.

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Nota: note-se que os valores de V’s, J’s, D’s e C’s é diferente dos valores mencionados na tabela anterior. Isto
deve-se ao facto de que essa tabela enumera as famílias dessas regiões, ao passo que nestes esquemas os
segmentos apresentados provieram de duplicação genética das pequenas famílias.

Em suma, nas cadeias leves só existe uma única etapa de rearranjo, com junção dos segmentos V com os
segmentos J (forma-se o segmento VJ), ao passo que nas cadeias pesadas existem 2 etapas de rearranjo, com
um rearranjo inicial que leva à junção dos segmentos D e J e, posteriormente, à junção do segmento DJ com o
segmento V. Forma-se
assim um segmento VDJ.
Os processos de splicing
permitem a união da
região constante às
restantes, formando-se o
transcrito maduro que irá
codificar para as
diferentes regiões
específicas da cadeia
peptídica
correspondente na
imunoglobulina.

O rearranjo dos
recetores de antigénio
envolve as RSS, isto é, as
recombination specific sequences que são sequências semelhantes adjacentes/flanqueadas aos segmentos
génicos a juntar e que permitem, portanto, a hibridação entre si. Estas sequências são reconhecidas por um
complexo proteico por um dímero de proteínas RAG (RAG 1 e RAG 2), recombination-activation genes. Estas
RAG são responsáveis pelo
desencadear da hidrólise e
“junção” dos segmentos
genómicos. É um processo
aleatório que depende da ligação,
ao acaso, das proteínas RAG às
diversas RSS espalhadas pelo gene.
Assim é um fenómeno de
recombinação aleatória.

O complexo proteico RAG ao


reconhecer as RSS leva à clivagem
do DNA que, de seguida, vai ser
recuperado por um complexo de
reparação para colocar nucleótidos
entre os segmentos genómicos a
juntar (de forma imprecisa => aumento de diversidade). Este complexo de recuperação de dsDNA ou DNA de
cadeia dupla denomina-se de NHEJ ou Non-Homologous End Joining, ativado no período de diferenciação dos
linfócitos B. Como se origina o gene recombinado a todo o complexo denomina-se o mesmo de complexo
Recombinase VDJ. Este complexo recombinase VDJ é constituído pelas RAG (proteínas mais importantes neste
processo e exclusivas dos LB e LT (SI) , daí que este processo só aqui ocorra) 1 e 2 e pelos fatores NHEJ (comuns
a outras células).

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Detalhadamente, o mecanismo de recombinação V(D)J pode ser descrito em alguns passos:

Considera-se 2 segmentos génicos, V e J e as respetivas RSS (triângulos) que lhes estão adjacentes.

1. Ligação das RAG e clivagem de ssDNA (DNA single-stranded): as proteínas RAG vão ligar-se às RSS e
fazem uma clivagem em cadeia simples e que deixa um grupo hidroxilo liberto/livre (-OH). Cada RAG
realiza a clivagem na RSS a que se liga do DNA em cadeia simples, pelo que as duas RSS adjacentes aos
segmentos genómicos ficam com os seus grupos hidroxilo livres.

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2. Sinapse: as proteínas RAG formam um


dímero e, por aproximação das 2 regiões
genómicas, criam uma sinapse, isto é, o
momento de ligação e aproximação de dois
segmentos de DNA genómico por ação das
proteínas RAG. Dá-se o ataque nucleófilo da
extremidade clivada (nick) à extremidade
não clivada, levando a uma quebra em cadeia
dupla (e da ligação fosfodiéster). A este
ataque designa-se de ataque nucleofílico
mediado por ácidos nucleicos.
3. Clivagem e formação do hairpin: o segmento
de DNA onde se encontram as RSS fica com as
extremidades livres, mas nas pontas
adjacentes aos segmentos V e J forma-se um
hairpin (“gancho”), isto é, os nucleótidos
fecham uns sobre os outros.

4. Abertura do hairpin e junção: este gancho é reconhecido


como uma sequência anormal pelo que são recrutados os fatores
NHEJ (proteínas de reparação do DNA) que vão permitir a abertura do
hairpin e a junção dos dois segmentos do DNA. Isto é feito na região
dos segmentos V e J codificantes como no pedaço de DNA com as RSS
(em círculo), posteriormente excisado e degradado.

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As proteínas envolvidas na reparação do DNA ou as non-homologous end joining, NHEJ, possuem diversas
funções e existem diferentes passos envolvidos no seu uso. Recorrem ao uso de cinases de DNA (DNA-PKcs), às
proteínas Ku70 e Ku86, à proteína Artemis, a um polimerase (Pol μ), ao complexo XRCC4, ao DNA Ligase IV e ao
TdT (Terminal deoxynucleotidyl transferase). Os passos detalhados da ação dos NHEJ são os seguintes:

1. Quebra de dsDNA: a quebra da cadeia dupla é realizada anteriormente (não pelo NHEJ) mas leva ao
recrutamento dos fatores NHEJ que reconhecem esta quebra.
2. Ligação nas extremidades: a ligação das extremidades do DNA é mediada pelos DNA cinases (DNA-
PKcs) e pelas proteínas Ku, Ku-70 e Ku-86.
3. Processamento das extremidades e abertura do hairpin: a proteína Artemis é responsável pela
abertura do gancho para o posterior preenchimento.
4. Preenchimento (1º) e ligação (2º): o DNA polimerase μ (Pol μ), o complexo XRCC4 e o DNA Ligase IV
são responsáveis pelo preenchimento e ligação da cadeia de DNA. É um passo onde o TdT (necessário
para adicionar alguns nucleótidos) pode ser necessário dependendo do tipo de adição (ver Aula 8).

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5. dsDNA: após ligação e preenchimento a cadeia de DNA está fechada novamente, com a junção de
nucleótidos livres e dos segmentos V e J (gene das Ig rearranjado).

A adição aleatório dos nucleótidos,


detalhada posteriormente, garante um
aumento da variabilidade (das Ig).
O uso dos fatores NHEJ não é exclusivo do
sistema imunitário (SI), ao passo que o uso
das proteínas RAG é exclusivo do SI. As RAG
apenas são expressas nos linfócitos B e T,
pelo que estas são as únicas células que
possuem capacidade para realizar esta
recombinação genómica.
Assim, o uso das RAG é exclusivo, mas o
processo que envolve o NHEJ é ubíquo e é
comum a todas as células.

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Aula 8 – Geração de diversidade do BCR e TCR (II)

5’ 3’

3’ CT 5’

Terminal
deoxynucleotidyl
transferase

Quando temos um hairpin formado nas extremidades dos segmentos que vão ser
recombinados (neste caso: D e J), existe uma ligação fosfodiéster entre os nucleótidos das
extremidades, “em gancho”. De seguida, este hairpin é clivado pelo que se pode iniciar a
reparação da cadeia de DNA dupla. Repare-se que a clivagem se dá no topo dos segmentos
D e J (ver setas), gerando-se extremidades livres em cadeia simples. Seguidamente existe
o preenchimento de nucleótidos que se pode dar de 2 formas: adição de nucleótidos P ou
adição de nucleótidos N.
Os enzimas de reparação vão, basicamente, adicionar nucleótidos por
complementaridade. Após esta reparação existe a posterior ligação.
A adição de nucleótidos P consiste numa adição
de nucleótidos de tal forma que as cadeias de DNA
resultantes (preenchidas) são complementares
entre si e a sua leitura de 5’ para 3’ ou de 3’ para 5’
é a mesma, isto é, é um palíndromo.
A outra adição possível, a adição de nucleótidos
N, leva à geração de uma maior variedade de
anticorpos (non-templated nucleotide addition).
Nesta adição existe o recrutamento do enzima TdT
(Terminal deoxynucleotidyl transferase) que, como
o nome indica, catalisa a reação de transferência
de novos (desoxi) nucleótidos para extremidades
livres para a criação de novas sequências. Aqui
existe uma adição de um conjunto de nucleótidos
totalmente novo aleatoriamente (porque o
enzima é non-templated, isto é, não usa nenhum molde). Assim, ao invés da junção se dar entre cadeias
palindrómicas (de nucleótidos tipo-P), dá-se entre sequências com uma parte nova.
Isto é, após sequenciação dos genes recombinados dos anticorpos foi possível observar-se que existiam
sequências palindrómicas (adição P, não usa TdT) e sequências com um conjunto novo e aleatório de
nucleótidos (adição N), sendo que nesta última existe o uso de TdT.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

O Quadro de leitura (ou Grelha de Leitura Aberta ou ORF, Open Reading Frame) é definido pelo codão de
iniciação e pelas sequências sucessivas seguintes de 3 nucleótidos reconhecidos que codificam a futura
proteína. Dependendo do tipo de junção ocorrido (consoante o tipo de adição), podem-se gerar rearranjos
produtivos (que mantêm o Quadro de leitura, mas introduzem novos aminoácidos => LB ou LT funcional) ou
rearranjos não produtivos (Quadro de leitura alterado com o aparecimento de codões de terminação,
formando-se mais tarde um linfócito com um tal rearranjo genético que é incapaz de produzir anticorpos). Estes
rearranjos podem dar-se com qualquer tipo de adição de nucleótidos (N ou P) e, portanto, em qualquer destas
adições pode ocorrer alteração no Quadro de Leitura Aberta dependendo apenas do local onde acontece o
corte. O rearranjo é não produtivo quando não dá origem à proteína, sendo a razão principal para isto a perda
do quadro de leitura.
Assim, a aleatoriedade nos processos de recombinação confere uma elevada diversidade de repertório de
anticorpos, mas tem como consequência a existência de um grande número de linfócitos inúteis (que não vão
ser capazes de produzir Ig) por rearranjos não produtivos. Produzem cadeias truncadas pelo que estes LB (ou
LT se estivermos a referirmo-nos ao TCR) acabam por morrer.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Os rearranjos genéticos (dos segmentos VDJ) são gerados por recombinação aleatória nas cadeias leves (1000
combinações) e nas cadeias pesadas (24 000 combinações) pelo que se obtém cerca de 2 X 107 combinações
possíveis. A estas acrescentam-se outros fenómenos que conferem ainda uma maior variabilidade,
nomeadamente:
- Flexibilidade juncional: o facto de haver grande variabilidade na posição em que ocorre a junção entre dois
segmentos devido ao facto do "corte e costura" não ocorrer sempre no mesmo local como acontece, por
exemplo, nas junções de splicing entre dois exões consecutivos.
- Non-templated nucleotide addition (adição de nucleótidos N pelo TdT).
- Hipermutação somática: após a formação das células naive, ainda podem ocorrer processos de diversificação
dos anticorpos.
Devido a estes fenómenos existem cerca de 1011 anticorpos distintos, pelo que a probabilidade de 2 anticorpos
serem exatamente iguais a nível das células B naive é muito baixa. Ao nível dos linfócitos de memória a
probabilidade é mais alta, pois resultam da expansão clonal de um linfócito naive que foi ativado.

Nota sobre expansão clonal de células naive e células de memória

O termo expansão clonal refere-se à proliferação celular seletiva de uma célula (B ou T) que foi ativada em
resposta à presença de um antigénio reconhecido pelos seus recetores. Todas as células que resultam da
divisão da original são seus clones genéticos, que se acumulam na população geral de linfócitos alterando a
frequência relativa com que cada locus rearranjado existe.

Imagine-se um evento específico de rearranjo que leva à formação de uma cadeia pesada de sequência A e
uma cadeia leve de sequência B. Dado o elevado número de combinações que podem ocorrer durante os
rearranjos, assumindo que existem 1 milhão de células naive a combinação A+B deverá aparecer apenas numa
ou duas células (já com muita sorte!), ou seja, numa frequência próxima de 1 por milhão (ou 0,0001%).

Já num indivíduo que tenha tido uma resposta imunitária contra este antigénio, devido à proliferação seletiva
desta célula (com esta resposta específica), ou seja, à sua expansão clonal, é perfeitamente possível que a
combinação A+B esteja presente em ≈10% das células B no pico da resposta imunitária, frequência essa que
será refletida depois na população de células de memória.

Ou seja, a probabilidade de se encontrarem duas células de memória que expressam exatamente o mesmo
anticorpo (porque têm o mesmo rearranjo) é muitíssimo superior à probabilidade de se encontrarem duas
células naive que apresentem o mesmo rearranjo.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Um linfócito B naive, após a recombinação VDJ, vai ter uma dada organização
genómica das cadeias pesadas da Imunoglobulina (ii) de tal forma que o gene
recombinado ainda se vai conjugar com cadeias constantes com características
diferentes. Após a ativação do LB, isto é, apresentação do antigénio ao BCR, inicia-se
um processo celular que recorre a enzimas específicos que vão introduzir mutações
genéticas (iii) no genoma destas células que se localizam predominantemente nas
regiões CDR (regiões que definem a superfície de interação entre o anticorpo e o
antigénio). O objetivo é a criação de uma diversidade tal para existir o aparecimento
de anticorpos com uma afinidade gigantesca para o antigénio (quanto maior a
afinidade Ab-Ag, maior é o estímulo de proliferação provocado pelo Ag), pelo que
acaba por se dar a seleção do linfócito mais apto, isto é, o linfócito que possui maior
afinidade para aquele antigénio. Além de uma
geração superior de afinidade, gera-se um aumento
de eficácia da resposta (anticorpos mais específicos
=> daí se fazerem imunizações sucessivas para se
obrigar a aumentar esta especificidade de forma a se
obter uma resposta mais eficaz).

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Encontra-se representado o locus que codifica as cadeias pesadas das imunoglobulinas:


• γ (“gama”): IgG
• μ (“miu”: IgM
• α (“alfa”): IgA
• δ (“delta”): IgD
• ε (“épsilon”): IgE

O nome da Imunoglobulina é, portanto, dado consoante a região constante que a codifica, sendo a letra do
segmento génico C no alfabeto grego correspondente à letra do nosso alfabeto do subtipo de Imunoglobulina
(região constante C em
grego = subtipo de Ig no
nosso alfabeto).

As IgG possuem 4
segmentos génicos distintos
(γ1, γ2, γ3 e γ4), ao passo
que as IgA possuem 2
segmentos (α1 e α2). As
restantes (IgM, IgD e IgE)
possuem apenas 1 segmento
génico. Estes segmentos são
usados de forma alternada,
mas regulada.
O linfócito B naive maduro
tem a possibilidade de
produzir IgM e IgD. Ao
observar-se o locus da cadeia
pesada nota-se que são

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

exatamente as regiões constantes mais próximas dos segmentos VDJ. Ou seja, para a região constante pode-se
recorrer aos segmentos μ ou δ pela sua proximidade espacial do segmento VDJ rearranjado.
O linfócito B virgem só consegue produzir um único tipo de anticorpo (aliás várias cópias de Ab idênticos!),
claro. Único pela recombinação génica (VDJ) e pertencente a uma dada classe consoante a cadeia constante (μ
– IgM ou δ – IgD). Note-se que, como a recombinação VDJ é a mesma, a região variável será igual tanto na IgD
como na IgM.
Entretanto, a IgD deixa de ser produzida e a IgM passa a predominar. Com a resposta imunitária, existe uma
transição para os restantes tipos – G (libertadas em circulação), A (predominantemente produzidas nas
mucosas) e E.
O segmento génico a cinzento ψ representa um pseudogene (neste caso pode dar origem a IgE), isto é, ao
longo da evolução acumulou mutações pelo que não tem capacidade de originar a um mRNA funcional (isto é,
não leva à síntese proteica produtiva).

Encontra-se
representado um
locus de cadeia
pesada já
recombinado
(isto é, o exão VDJ
já está formado,
determinante
para a
especificidade do
reconhecimento
do antigénio) com
diversas regiões constantes. Inicia-se a transcrição a montante da região L (líder). Assim, a célula após a
transcrição e quando já se formou o transcrito primário determina de uma forma regulada se faz um splicing
ou poliadenilação (não são mutuamente exclusivos, podem ocorrer ao mesmo tempo) do segmento VDJ para
a região μ (IgM) ou região δ (IgD). Relembrar que a poliadenilação é o processo que define onde termina a
molécula de mRNA (sinais de poliadenilação – pA1 e pA2).
Assim, no linfócito B naive o local de reconhecimento antigénio (VDJ) dos anticorpos produzidos é o mesmo,
mas a região constante pode ser diferente (μ ou δ) devido ao splicing alternativo. Note-se que a região variável
é a mesma na IgM e na IgD e a região constante varia.

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As sequências líder (L) estão codificadas num exão distinto e não são sujeitas a recombinação. Comuns em
todos os Ab. São os primeiros aminoácidos (tanto nas leves como nas pesadas) da Ig.

Existem outras cadeias desenvolvidas a partir de outras regiões constantes e que vão dar origem aos
anticorpos propriamente ditos (imunoglobulinas secretadas por plasmócitos – apesar de que se usam os termos
como sinónimos). Estas cadeias (α, γ e ε) só são usadas após a resposta de ativação dos linfócitos B nos órgãos
linfoides periféricos e a sua utilização envolve um processo de recombinação génica denominado de class-
switch recombination. Aqui os segmentos VDJ vão reunir-se com segmentos α, γ ou ε, dependendo local onde
o linfócito se encontra e o tipo de resposta imunitária em que este se encontra envolvido.
Nas células T todos os processos descritos anteriormente são semelhantes/análogos, à exceção da class-
switch recombination que nos LT não existe.

Os TCRs não têm cadeias pesadas sendo dímeros com cadeias com
aproximadamente o mesmo número de aminoácidos e uma estrutura de
região variável e região constante. Os dímeros mais comuns são os α-β. O
locus α é análogo à cadeia leve e sofre recombinação VJ; o β é análogo à
cadeia pesada e sofre recombinação VDJ, mas não possui a mesma
complexidade ao nível da região constante.

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Aula 9 – MHC (Major Histocompatibility Complex): genética, função e associação a doenças

O BCR (recetor de antigénio de linfócitos B) e anticorpos são


capazes de reconhecer o antigénio na forma nativa: direto, não
necessitando de qualquer outra célula para fazer a
apresentação do antigénio.
O TCR (recetor de antigénio de Linfócitos T) reconhece
pequenos péptidos (resultantes do processamento do Ag pela
maquinaria celular) apresentados na superfície celular por
moléculas de MHC: não direto. O TCR reconhece o conjunto
péptido-MHC e o processo envolve o processamento
antigénico (processo pelo qual são produzidos os péptidos a
partir de proteínas nativas) e a apresentação antigénica
(processo pelo qual os péptidos são expostos na superfície das
células por moléculas MHC).
A ilustração esquemática do reconhecimento de MHC-
péptido pelo TCR evidencia que o TCR reconhece o péptido,
mas também interage com moléculas de MHC (resíduo
polimórfico).

O MHC é um cluster de genes, altamente polimórficos, que codificam glicoproteínas expressas à superfície das
células que são especializadas na apresentação de antigénios a LT. Isto é, sem MHC não existe a ativação de
linfócitos T, pelo que este é fulcral na sua ativação.
Este complexo de maior histocompatibilidade desempenha também um papel crucial em determinar se um
tecido é aceite (histocompatível) ou rejeitado (histoincompatível) quando transplantado.
Note-se que MHC é o nome genérico:
• Em humanos: HLA (Human Leukocyte Antigen).
• Em porcos: SLA (Swine Leukocyte Antigen).
• No ratinho, por razões históricas, é designado por H2 (Histocompatibility 2).

A importância do MHC recai sobre:


1. Resposta imunológica (mediada por LT);
2. Transplante de órgãos;
3. Predisposição a doenças (determinados alelos de HLA estão associados a predisposição a algumas doenças,
nomeadamente doenças autoimunes e imunidade para algumas infeções – ainda não está perfeitamente
esclarecido).

Conceito de histocompatibilidade:
Graças a estes trabalhos o papel do MHC como responsável pela histocompatibilidade foi descoberto:
• Base genética da rejeição de transplantes:
Os transplantes de pele entre estirpes inbred (todos os genes são idênticos; é como se os animais fossem
gémeos homozigóticos) demonstrou que a aceitação ou rejeição é dependente do background genético.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Quando se realiza um transplante de pele de um ratinho para outro exatamente igual, o enxerto de pele é
aceite (existe histocompatibilidade). Contrariamente, ao fazer-se um transplante de pele de um ratinho
diferente (B) no primeiro ratinho (A), este enxerto é rejeitado (histoincompatível).

• Base imunológica da rejeição de transplantes:

Como já visto ao realizar-se um enxerto de pele do ratinho B no ratinho A existe a sua rejeição em cerca de 10
dias (resposta imunológica primária). Se usarmos linfócitos desse ratinho que rejeitou o enxerto e os
transferirmos para um animal naive e se após 6 meses fizermos novamente um enxerto de pele do ratinho B

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

nesse ratinho naive, existe uma rejeição do enxerto muito mais rápida, em cerca de 3 dias (há o
desenvolvimento de uma resposta imunológica secundária).
Por outro lado, se o ratinho naive que recebeu os linfócitos do ratinho A que tinha rejeitado o enxerto de pele
do ratinho B receber um outro enxerto de pele (de outra estirpe, imaginemos C), isto é, um enxerto não
relacionado, também rejeita o enxerto numa resposta primária que se faz sentir em 10 dias, por não ter tido
exposição prévia ao antigénio estabelecendo uma resposta imunológica primária.
Conclui-se, deste modo, que a rejeição de transplantes é devida a uma resposta imunológica específica e com
“memória”.

Imunogenética da rejeição de transplantes:

Ao cruzarem-se duas estirpes parentais (A e B) obtém-se um animal designado por AB ou F1. Este ratinho
possui a capacidade de aceitar enxertos tanto da estirpe B como da estirpe A.
Por outro lado, as estirpes parentais não conseguem aceitar enxertos de ratinhos F1, visto que só expressam
um tipo de MHC.

Os Linfócitos T “respondem” a MHC, pelo que:


• A rejeição de transplantes in vivo é mediada por linfócitos T.
• A correlação in vitro da rejeição de transplantes é designada por mixed lymphocyte reaction (Reação
mista linfocitária).

Se tivermos células T de um ratinho com MHC-A e expusermos estas células a células “estimulatórias”
irradiadas de um ratinho com MHC-A, os LT não respondem (eles só respondem àquilo que acham
“estranho”/diferente). Se, por outro lado, expusermos as mesmas células a células “estimulatórias” irradiadas
de um ratinho com MHC-B, como estas expressam um diferente MHC, gera uma resposta imunitária e os LT
proliferam. Conclui-se que os genes do MHC estão envolvidos na ativação de linfócitos T:

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

TCR

MHC’s

APC

O reconhecimento de antigénios por Linfócitos T requer APCs que expressem moléculas de MHC. Este
esquema demonstra em quais situações o antigénio é capaz de ativar os LT e levar à sua proliferação. Isto é, se
o antigénio se encontrar simplesmente solúvel, o TCR não o consegue reconhecer (o BCR consegue!). O mesmo
com casos em que o antigénio se encontre à superfície da membrana plasmática da APC. E a situação repete-se
com péptidos solúveis ou expressos à membrana das APCs. Ou seja, o TCR só consegue reconhecer o antigénio
na presença de moléculas de MHC e após esta apresentação permitir a proliferação das células T onde se
encontra expresso. Assim, o LT estabelece contacto/reconhecimento tanto com os péptidos como com o MHC.
Se o MHC for exógeno dá-se uma reação de alorreatividade onde os LT proliferam em resposta ao MHC
estranho.

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Os MHCs de classe I e de classe II apresentam péptidos provenientes de diferentes compartimentos celulares:

MHC I:
O MHC de classe I apresenta péptidos derivados de proteínas presentes no
citosol (por exemplo: antigénios virais).
É responsável por transportar/ligar péptidos de proteínas de
microrganismos que se repliquem no citoplasma (como os vírus). Estes
péptidos são apresentados a células T CD8 efetoras/citotóxicas (TC) que vão
levar à morte das células portadoras do MHC I.

Se um vírus infeta uma célula, vai existir a síntese de proteínas virais no citosol e de MHC classe I. Existe a
degradação dessas proteínas em péptidos que são transportados para o RE (retículo endoplasmático) e ligados
ao MHC I. O complexo MHC I:péptido migra, de seguida, para a superfície da célula.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

MHC II:

O MHC de classe II é responsável por apresentar péptidos derivados de


antigénios extracelulares ou péptidos originados em compartimentos
endocíticos (antigénios/péptidos adquiridos pela célula por endocitose ou
presentes em vesículas).

Por exemplo, os macrófagos que endocitem bactérias presentes do exterior


vão sintetizar péptidos (por degradação das proteínas a baixo pH) que se vão
ligar a MHC de classe II que irão ser apresentados a células T CD4 efetoras/
auxiliares (TH1). Esta apresentação do antigénio vai promover a ativação dos
macrófagos para levar à morte das bactérias (ou de parasitas intravesiculares).

No caso dos linfócitos B (onde o BCR captura os antigénios) os antigénios são


recolhidos em vesículas endocíticas (com baixo pH permitem a degradação das

proteínas em péptidos) e cujos


péptidos vão ser ligados a uma
molécula de MHC II e
apresentados a células T CD4
auxiliares. Aqui as TFH vão
promover a ativação das
células B para estas
promoverem a secreção de
imunoglobulinas (Ig) para
eliminar estes antigénios
extracelulares (ou toxinas ou
bactérias).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

As moléculas de MHC classe I


e II diferem na distribuição e na
estrutura. Assim, estas
moléculas não são expressas
em todas as células. Consoante
o tipo de célula pode haver
expressão de MHC I ou de MHC
II, nomeadamente:
• MHC classe I: todas as células
nucleadas (incluindo células
apresentadoras de antigénios
profissionais que também
expressem MHC II)
• MHC Classe II: só as células
apresentadoras de antigénios (DCs, macrófagos, LB).

Todas as células nucleadas expressam MHC I, mas claro que existem


células que expressam mais do que outras. As células do sistema
imunológico expressam bastante MHC. No entanto, por exemplo, as
células cerebrais, dos rins, os hepatócitos ou as células epiteliais do timo
expressam menos. Por fim, os eritrócitos sendo as únicas células
anucleadas são células que não expressam qualquer tipo de MHC.
As células apresentadoras de antigénio por excelência apresentam MHC
II (células
dendríticas,
macrófagos e linfócitos B). As células epiteliais do timo
também expressam MHC de classe II e, por vezes,
algumas células T ativadas ou até microglia. Mais
nenhumas células expressam esta classe de MHC.

Estrutura da molécula MHC classe I:

A molécula de MHC classe I é um heterodímero:


- cadeia α (43KDa), polimórfica (3 domínios: 1, 2 e 3):

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• α1 e α2: fenda de ligação ao péptido/peptide-binding cleft (par de hélices


α ou 2 hélices α apoiadas em folhas β antiparalelas).
• α3: domínio transmembranar (apenas 1 domínio atravessa a membrana).
- β-2 microglobulina (β2M; 12KDa), não polimórfica

A cadeia α está associada não-covalentemente à cadeia de β-2 microglobulina.


Esta β-2 microglobulina está associada a todas os domínios da cadeia α.

Estrutura da molécula MHC classe II:

A molécula de MHC classe II é um heterodímero com 2 cadeias transmembranares


e polimórficas:
- cadeia α (43KDa).
- cadeia β (29KDa).
• α1 e β1: constituem a fenda de ligação ao péptido/peptide-binding cleft
(par de hélices α apoiadas em folhas β antiparalelas); fenda aberta em
ambas extremidades.
• α2 e β2: domínios transmembranares (2 domínios que atravessam a
membrana).

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Os locais de ligação dos correcetores


CD8 e CD4 a moléculas de MHC I e II,
respetivamente, estão localizados na
zona menos polimórfica, isto é, mais
perto da membrana plasmática (mais
afastados da fenda de ligação ao
péptido). Ou seja, o CD8 liga-se ao MHC
I no domínio α3 e o CD4 liga-se ao MHC
II no domínio β2. Na realidade isto é
mais complexo e existem outros
domínios envolvidos, mas estes são os
principais. Note-se que tanto a molécula
CD4 como a molécula de CD8 interagem
com as regiões menos polimórficas das
moléculas de MHC II e I,
respetivamente.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

O péptido apresentado em 8-10 aminoácidos


contexto da molécula de MHC
classe I é mais pequeno do
que o péptido apresentado
em contexto da molécula de
Resíduos âncora

MHC classe II.


Os péptidos carregados em
moléculas de MHC I têm cerca
de 8 a 10 aminoácidos. Aqui o
peptide-binding cleft é muito
restrito ou muito pouco
promíscuo na aceitação de
péptidos. Existem alguns
resíduos de aminoácidos
envolvidos na ligação (por pontes de hidrogénio) ao MHC que se denominam de resíduos âncora.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Os péptidos que se ligam a moléculas de MHC classe I ligam-se via resíduos


âncora.
Representam-se ao lado péptidos eluídos de 2 moléculas de MHC I (com 8
e 9 aminoácidos).
Os N e C terminais ou os terminais amina e carboxílico estabilizam o
contacto entre péptido e molécula de MHC I e os resíduos âncora indicados,
a verde, apesar de não serem iguais, são semelhantes (da mesma natureza
química)
Exemplos:
• F e Y são aminoácidos aromáticos.
• V e I são aminoácidos hidrófobos.

A ligação dos péptidos à molécula de MHC classe I é muito mais específica,


isto é, o carregamento dos péptidos pelo MHC I é mais estrito.

A molécula de MHC I é instável quando não carregada (o mesmo acontece


com MHC II). Nenhum MHC é expresso à superfície da célula não estando
carregados com antigénio/péptido.

≥ 13 aminoácidos

Os péptidos carregados na
molécula de MHC de classe II são
maiores tendo, pelo menos, 13
aminoácidos.
A ligação entre o péptido e a
molécula de MHC é estabelecido
essencialmente via pontes de
hidrogénio (pelos resíduos
âncora).
Os péptidos que se ligam a
moléculas MHC II são de
tamanho variável e os resíduos
âncora estão localizados em
diferentes posições (diferente
distância do N e C terminais).
Os péptidos carregados em
moléculas de MHC II têm pelo
menos 13 aminoácidos (até 17
aminoácidos).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

A porção N e C terminais não são conservadas, pelo que, não


estão envolvidas na estabilização da ligação do péptido ao
MHC II.
O binding pocket é mais permissivo/promíscuo e a molécula
de MHC II é instável quando não carregada com
antigénio/péptido (tal como MHC I), ou seja, MHC não é
expressa.

NOTA: existem resíduos âncora tanto em MHC classe I como


em MHC classe II. Estes são os responsáveis pela ligação MHC-
péptido que se estabelece via pontes de hidrogénio.
Adicionalmente, em MHC classe I o N e C terminais
contribuem para a estabilização da ligação péptido-MHC, ao
passo que em MHC II não!

Organização genética do locus do MHC:

Encontra-se representado
Chr 6 locus de MHC em humanos
(HLA):
Existem regiões com
designações específicas
correspondentes às diferentes
classes de MHC,
nomeadamente:
• MHC classe I: HLA-A +
Chr 17 HLA-B + HLA-C.
• MHC classe II: DR + DQ +
DP (A – codifica a cadeia α e B
codifica a cadeia β) + genes que
codificam proteínas envolvidas no
processamento antigénico (LMP, TAP –
envolvida no processamento antigénico de
classe I, transportando péptidos para o RE -, DM –
envolvido no processamento antigénico de classe II
-, etc).
Existe ainda uma zona que codifica moléculas de
MHC classe III (que não é relevante).
Assim, o locus contém não só os genes que
codificam o MHC em si como todas as proteínas
envolvidas no processamento antigénico.
O MHC em humanos encontra-se no cromossoma
6 e em ratinhos no cromossoma 17.
Em ratinho, o MHC I corresponde às regiões K e D
e MHC II corresponde às regiões IA e IE.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Características do MHC (exemplifica-se para o HLA):

Mais relevante saber é em humanos. O HLA está então dividido por regiões distintas que codificam as
diferentes classes de MHC, nomeadamente:
• Moléculas de MHC I: HLA-A, HLA-B e HLA-C.
• Moléculas de MHC II: DR, DQ e DP.
Assim, o MHC é poligénico, porque contém diferentes e vários genes que codificam MHC de classe I e MHC
de classe II.

O MHC é polimórfico,
isto é, apresenta alelos
múltiplos num dado
locus genético
(Polimorfismo: presença de alelos múltiplos num dado locus genético).
Em humanos (HLA) alguns loci têm centenas de alelos identificados até agora, sendo os genes mais
polimórficos de qualquer espécie analisada. Por exemplo, a cadeia β da molécula DR (MHC II) possui 1211 alelos
diferentes.
Claro está que existem variantes múltiplas de um gene na população, isto é, podemos expressar diferentes
alelos apesar de os termos a todos.
O polimorfismo concentra-se na fenda de ligação ao péptido (detalhes na Aula 10).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Por fim, existe outra característica que


aumenta a diversidade do MHC (de MHC I e
MHC II) que é a codominância, onde se
observam moléculas HLA herdadas da mãe e
do pai expressas simultaneamente na
membrana celular, isto é, existe a co-
expressão de vários alelos.

Então, o MHC é extraordinariamente diverso


porque:
- É poligénico.
- É polimórfico.
- Apresenta codominância.

O polimorfismo, a codominância e a poligenia geram:


- Mais alelos possíveis de moléculas de MHC.
- Maior divergência.
- Maior repertório de péptidos.

Uma pequena nota: o interferão γ (ou tipo II) é uma citocina produzida
pelas células TH1 que aumenta a expressão de MHC. Os interferões do tipo I
ou αβ estão envolvidos em respostas antivirais.

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Aula 10 – Continuação do estudo do MHC. Processamento e apresentação antigénica

Haplótipo: é o conjunto/combinação de alelos do MHC presente em cada cromossoma.


Mais detalhadamente: haplótipo é um grupo de alelos num organismo que são herdados conjuntamente de
um dos progenitores. No caso do MHC (Haplótipo de MHC), é a combinação de alelos de MHC que são herdados
em bloco de cada um dos pais. Assim, cada indivíduo herda 2 haplótipos de MHC (HLA), um de cada progenitor.

Os genes de MHC são herdados dos nossos pais em blocos (aos pares, 1 de cada progenitor, isto é, existem 2
alelos assim para cada uma dos genes constituintes do locus de MHC (2 alelos para HLA-A, 2 alelos para HLA-B,
etc).

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Os polimorfismos referidos anteriormente (Aula 9)


localizam-se sempre na peptide-binding cleft.
O resto da estrutura é extremamente conservada.
A variabilidade alélica no MHC ocorre
predominantemente na região de ligação ao péptido
(peptide-binding groove)

Observaram-se os resíduos de aminoácidos de determinadas cadeias das moléculas de MHC. Em MHC classe
I a maior variabilidade destes resíduos localiza-se nos domínios α1 e α2, que são exatamente os domínios de
ligação ao péptido. O mesmo se sucede com MHC classe II onde a maior variabilidade está presente na cadeia
de β1 (de ligação ao péptido/antigénio).

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Importância do polimorfismo do MHC:

A questão que se coloca é por que razão é tão


importante ter-se tamanha diversidade no MHC se
isso é um impasse à transplantação. Isto deve-se ao
facto de que as moléculas do MHC são o alvo dos
patogénios para escapar ao sistema imunológico
(SI) – daí a alta pressão seletiva dos patogénios de
fugir à resposta imunológica -, pelo que estas têm
de se “adaptar” /ser diversificadas. Além do mais,
estas moléculas de MHC são essenciais para a
ativação de linfócitos T que só são ativados após a
interação entre o recetor de antigénio e o
péptido/antigénio em contexto de MHC e que são
essenciais à resposta imune efetiva (sem LT não
existe uma resposta imune efetiva) contra esses
mesmos patogénios.
Por outras palavras, o MHC é o alvo preferencial
dos patogénios. Assim, os MHC têm de ser diversos.
E por que é que estes são o alvo preferencial? O
MHC é o alvo preferencial dos patogénios porque o
MHC está envolvido na ativação de LT que potencia
a resposta imunitária. E claro, sem resposta
imunitária (sem LT por não haver MHC) esta é mais fraca e os patogénios proliferam. Assim, claro que os
patogénios vão focar-se nas moléculas de MHC, pois traz como principal consequência a possibilidade de
escaparem à resposta do sistema imunológico (por menor proliferação de LT).
Então quais foram as estratégias adotadas pelas moléculas
de MHC para prevenir a invasão por parte de patogénios?
- Mais do que um tipo de molécula de MHC em cada
indivíduo (exemplo: 3 MHC I, em humanos).
- Diferenças consideráveis nas moléculas de MHC entre os
indivíduos (polimorfismos).
Se apenas tivéssemos um tipo de MHC e estivéssemos em
contacto com um microrganismo que conseguisse invadir
esse mesmo MHC, o microrganismo seria “invisível” ao
sistema imunológico, pelo que a resposta imunitária seria
comprometida (não existiria ativação de linfócitos T)
podendo o indivíduo morrer e todo o resto da população
que expressa o mesmo MHC (população extinta).

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Se na população existissem dois tipos de MHC


(genericamente X e Y) e o patogénio invadisse o MHC
X, os indivíduos YY e XY conseguiriam sobreviver, ou
seja, a população não seria extinta pois, neste caso,
o patogénio não invade o MHC Y.
Conclui-se assim que um maior número de
moléculas de MHC, resulta num aumento maior de
probabilidade da sobrevivência dos indivíduos e da
população onde se inserem.
O problema coloca-se é quando o microrganismo
patogénico possui a capacidade de invadir tanto o
MHC X como o MHC Y por mutação do patogénio.

Por exemplo, se apenas tivermos duas moléculas


de MHC na população e, entretanto, o
microrganismo consegue mutar-se e atingir ambas as
moléculas, então a sobrevivência dos indivíduos
todos (população) estaria em risco.
Torna-se um problema, pois o número de
moléculas de MHC possui um limite, não
aumentando eternamente.
Conclui-se, portanto que, a população “necessita”
de expressar variantes alélicas de cada molécula de
MHC para garantir a sobrevivência da espécie.

Assim, a população protege-se sem haver a


necessidade de aumentar o número de moléculas
de MHC.
Em suma, os patogénios cujo alvo preferencial é o
MHC são um verdadeiro problema porque
previnem a ativação de linfócitos T e por outras
razões como:
- A taxa de replicação de microrganismos
patogénicos é superior à reprodução humana.
- Brevemente um patogénio terá a capacidade de
mutar genes mais frequentemente que os
humanos, tendo a capacidade de facilmente de
invadir moléculas de MHC.
- O número de tipos de moléculas de MHC é
limitado.
Portanto, o MHC adotou estratégias para contrariar a flexibilidade dos patogénios:
- O MHC desenvolveu diversas variantes (alélicas) de cada tipo de molécula de MHC.
- Estas variantes, mesmo não protegendo todos os indivíduos deste patogénio, impede a extinção da
população.

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Existem determinados alelos de MHC de classe I e de classe II associados a doenças


autoimunes. Foi observado o alelo implicado numa dada doença e foi medido o risco
relativo (quociente entre a frequência de doentes com o alelo e a frequência de
controlo).
A associação com doenças autoimunes não é exclusiva de MHC Classe II sendo que
também há exemplos de associação de determinados alelos de MHC I com doenças
autoimunes. Como exemplo, é referida a associação de B27 com espondilite
anquilosante e uveíte anterior aguda.
O risco relativo (RR) é uma medida estatística que é definida realmente pelo
quociente da frequência de um determinado alelo em portadores da doença e a
frequência desse mesmo alelo em indivíduos não afetados (controlos). Assim, não é
uma percentagem e indica quantas mais vezes é provável ter uma determinada doença
se tivermos um determinado alelo em comparação com indivíduos não portadores desse mesmo alelo
A espondilite anquilosante é encontrada em indivíduos com o alelo de HLA B27, sendo que o risco relativo é
altíssimo (87.4). Isto é, indivíduos com este alelo têm elevada probabilidade de ter esta doença e/ou é frequente
encontrar este alelo em doentes com espondilite anquilosante. Claro que nem todos os indivíduos com este
alelo vão ser portadores desta doença.
Por outras palavras, indivíduos portadores de B27 têm 87.4x maior probabilidade de desenvolverem
espondilite anquilosante que indivíduos que não sejam portadores de B27. Mas tal não significa que todos os
portadores de B27 irão desenvolver a doença
Para indivíduos portadores de diabetes tipo-I o risco relativo dos indivíduos serem heterozigóticos para o
DR3/DR4 é cerca de 25. Isto é, indivíduos portadores deste alelo têm 25 vezes maior probabilidade de serem
portadores desta doença face ao controlo.
O RR também pode ser =1, o que significa que a frequência de um determinado alelo é igual em doentes e na
população controlo (não doentes), e assim o alelo não está associado à doença. Ou ainda ser <1, o que significa
que a frequência de um determinado alelo é menor em doentes que na população controlo (não doentes), que
na prática implica que a probabilidade de desenvolver a doença se formos portadores do alelo é menor em
comparação indivíduos não portadores do alelo (alelo protetor).

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Também é indicado o rácio por sexo (mulher/homem), isto é, qual dos


géneros tem maior probabilidade de ser portador da doença. A maioria
das doenças autoimunes tem maior prevalência nas mulheres (como
lúpus). Há 10 a 20 vezes mais mulheres do que homens a desenvolver
lúpus. Em diabetes tipo-1 não existe essa preponderância.

Restrição de MHC:

O conceito de restrição de MHC está relacionado com o facto de que


um linfócito T só é ativado se lhe for apresentado um péptido da mesma
“espécie”/família do MHC. Para se elucidar este conceito considere-se a
seguinte experiência.
Infetaram-se ratinhos H2k (classe I) com o vírus da coriomeningite
linfocitária (LCM) e após alguns dias isolou-se o baço dos animais
infetados, que é removido com posterior feitura de uma suspensão
celular (contém células CD8 citotóxicas).

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As células T CD8 foram expostas a outras células


marcadas com crómio radioativo (o crómio radioativo
é libertado se ocorrer lise celular)
Quando as células TC (ativadas in vivo) são colocadas
em contacto com essas células-alvo (com crómio) do
mesmo MHC, mas estes não tinham sido previamente
expostos a antigénios virais, não ocorre lise celular
das mesmas (não há radioatividade). [= MHC, sem
péptido]
Se as células TC forem colocadas em contacto com
células-alvo que expressem o mesmo MHC e que
possuam péptidos virais, ocorre lise das células-alvo
(mediada pelos LT CD8) e, consequentemente, há
libertação de crómio radioativo. [= MHC e péptido]
Por fim, se incubarmos as células citotóxicas com
células-alvo que contenham outro H2 (ou MHC),
tendo ou não péptidos virais, nunca ocorrerá lise
celular porque não há reconhecimento pelas células
T CD8 (como não há reconhecimento, não há a
indução da lise celular). [≠ MHC, = ou ≠ péptido]
Isto é, para ocorrer lise (ou seja, reconhecimento
pelas células T CD8 citotóxicas), o péptido e o tipo de
MHC têm de ser os mesmos e aqueles específicos
para o vírus. [=MHC e péptido]. Este conceito pode
ser elucidado ao observar-se o seguinte esquema:

Neste esquema o LT possui o MHC do


tipo a e o TCR só reconhece o péptido X,
pelo que quando uma APC lhe apresenta
um péptido que não é o específico e/ou
um MHC de outro tipo, não existe
reconhecimento, não existindo a
ativação do linfócito T. Isto é, não
ocorreria lise celular (no caso se fosse a
TCD8 citotóxica). Isto ocorreria sim,
apenas no primeiro caso com um
reconhecimento bem-sucedido (péptido
específico e MHC que “encaixe” na
perfeição no TCR), MHC restrito/self.
Portanto, apenas quando são reunidas
as duas condições (MHC do mesmo tipo
e péptido “ideal” /específico) é que se dá
o reconhecimento e ativação do LT.

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Esclarecimento acerca dos conceitos self e non-self

Todas as nossas células nucleadas expressam MHC classe I. Isto significa que à superfície de todas as células
nucleadas do nosso corpo, quer façam parte ou não do sistema imunológico, há expressão (presença) de
moléculas de MHC I. Este MHC I é um componente codificado pelo nosso genoma, é self (do próprio). O MHC
I expresso pelas minhas células é diferente do teu (com altíssima probabilidade, dado o elevado polimorfismo
neste locus). O teu MHC seria reconhecido como estranho (non-self) pelas minhas células do sistema
imunológico.

A expressão de MHC classe II é como já referido muito mais restrita e encontra-se apenas à superfície de
células apresentadoras de antigénio. No entanto, as moléculas de MHC II que as minhas células dendríticas
(DCs) apresentam à sua superfície são codificadas pelo meu locus de MHC, isto é, são self (componentes do
próprio).

Se eu tivesse um irmão gémeo monozigótico, as DCs dele poderiam apresentar Ag estranhos/exógenos/non-


self (por exemplo um péptido derivado de uma micobactéria) aos meus LT CD4+. Ativação eficiente ocorreria
se um dos meus LT CD4+ fosse específico para aquele péptido, isto é, se o TCR expresso por um clone dos
meus LT CD4+ reconhecesse especificamente o complexo MHCII-péptido apresentados pelas DCs do meu
irmão gémeo monozigótico (“verdadeiro”). Uma DC tua a apresentar exatamente o mesmo péptido da
micobactéria não seria capaz de ativar da mesma forma os meus LT CD4+, isto porque o teu MHC II é non-self
(estranho) para os meus LT CD4+. Poderia sim ocorrer uma reação de alorreatividade, em que os LT
responderiam ao teu MHC, mas não propriamente ao péptido que a tua DC estivesse a apresentar.

No timo, as células epiteliais, macrófagos e DCs expressam moléculas de MHC I e II que são self (do próprio).
Não há MHC estranho a fazer apresentação antigénica em situação normal. Tal acontece apenas em situação
de transplantação de órgãos ou nas designadas "mixed lymphocyte reaction" (MLR).

Dito isto:

Um LT naive é ativado (recebe sinal via TCR) quando o TCR que o LT expressa na membrana plasmática
interage com o seu péptido específico (cognate peptide) apresentado numa molécula de MHC (complexo
MHC/péptido) presente na membrana plasmática de uma célula apresentadora de antigénio. Isto é uma
interação entre 2 células, o LT (mediado pelo TCR) e pela APC (mediado pelo complexo MHC:péptido). Não
esquecer que o sinal 2 (coestimulação) também é necessário para a ativação eficiente de um LT naive
(abordado mais à frente).

De qualquer modo, o MHC I e II que é expresso numa APC é um componente do próprio - é self – e os LT
foram selecionados no timo para o reconhecer, ou seja existe restrição de MHC no reconhecimento. Um LT
reconhece o péptido específico apresentado por uma APC em self-MHC. A ativação de um LT por MHC non-
self designa-se por alorreatividade e é uma maneira não normal de ativação estando na base de rejeição de
órgãos e transfusões sanguíneas.

Os péptidos específicos apresentados pela APC em MHC self é que são usualmente (em situação fisiológica)
non-self. Quando os péptidos apresentados em MHC self são também self e são reconhecidos por um LT com
TCR específico, isto pode levar ao desenvolvimento de autoimunidade.

As células T reconhecem péptidos apresentados no contexto de self-MHC. É necessário garantir que estas
sejam capazes de reconhecer péptidos apresentados no “MHC do próprio”, mas eliminar todas que o fazem
com elevada afinidade (abordado mais à frente), senão pode-se gerar autoimunidade.

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Alorreatividade:

Como já observado, o
linfócito T tem de
reconhecer o péptido de
uma molécula de MHC
igual (MHC-self).
No entanto, na
denominada por
alorreatividade pode
acontecer existir um MHC
exógeno e um péptido diferentes, mas que induzam uma
resposta no LT. Ou seja, outra combinação péptido e MHC
podem ser reconhecidos na mesma pelo TCR e gerar um tipo
de resposta diferente: resposta alogeneica.
(Em termos de vocabulário, um enxerto transplantado entre
indivíduos geneticamente diferentes da mesma espécie é
conhecido por aloenxerto e, dito isto, as moléculas que
reconhecem este enxerto como estranho são aloantigénios.
Assim, os linfócitos que reagem a esses aloantigénios, por meio
do MHC, são aloreativos.)
(Um aloantigénio é um antigénio presente em apenas alguns
indivíduos da mesma espécie e que assim promove o
estabelecimento de uma resposta imunológica adquirida em
indivíduos que não o expressem.)
Ou seja, se o MHC-
péptido que é
reconhecido pelo TCR não for o “ideal” e que
não permita gerar a resposta “ideal”, pode na
mesma levar à proliferação de LT.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Isto é, os LT reconhecem aquele complexo


MHC:péptido como não sendo o preferencial e,
mesmo que não o seja, estes podem proliferar. É
uma resposta imunitária a algo que é estranho ao
nosso organismo. Assim, há na mesma uma
resposta (imunitária) face ao MHC estranho de
rejeição.
Por outras palavras, o hábito é o TCR reconhecer
um dado MHC-péptido específicos. No entanto,
podem existir outras combinações (estranhas ao
organismo) MHC-péptido que o TCR possa
reconhecer. Quando o TCR reconhece essas
estranhas combinações exógenas, dá-se também
uma resposta por parte dos LT (neste caso uma
resposta alogeneica) e que leva também à
proliferação dos LT, mas com um objetivo
diferente, visto que este MHC é estranho ao
organismo (rejeição).
Esta proliferação dos LT ao MHC estranho vai
levar à rejeição do aloenxerto.
Um exemplo clássico são os grupos sanguíneos.
Indivíduos A+ reconhecem e respondem ao
antigénio B expresso por eritrócitos, o que significa
que “rejeitam” sangue de indivíduos B+ (ocorre hemólise dos eritrócitos do dador).

Os MHCs I e II (convencionais)
apresentam antigénios proteicos a
linfócitos T αβ. No entanto, existem
antigénios não proteicos (glicolípidos,
lípidos ou lipoproteínas) que podem
ser apresentados por moléculas de
MHC não-clássicas como CD1.
As moléculas CD1 são pouco
polimórficas (pelo menos
estruturalmente) e são capazes de
apresentar estes antigénios não-
proteicos a células NKT.
Não são só antigénios proteicos que
são apresentados!

Superantigénios:
Os superantigénios são antigénios/moléculas produzidas por alguns microrganismos e que contribui para a
sua patogenicidade.
Estes são capazes de realizar um bypass ao processamento antigénico (estes compostos não precisam de ser
processados – mecanismos a seguir detalhados - para induzir uma resposta de células T). Fazem diretamente o
crosslinking do MHC e TCR, levando a uma ativação não específica dos linfócitos T, que está associada a uma
hiperativação destas células.
Os superantigénios não interagem com o peptide-binding groove, fazem sim o tal crosslinking!

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Processamento e apresentação antigénica:

Existiram experiências que demonstraram que


existe a necessidade do processamento
antigénico para a ativação de células T.
Por fixação da célula apresentadora de
antigénio (APC) seguida de uma exposição ao
antigénio (que não é processado porque a APC
está fixa/morta), a APC não é capaz de ativar
linfócitos T.
Por outro lado, se a APC estiver em contacto
com o antigénio (não processado – dá-se o
processamento) e só depois é que é fixada,
consegue ativar os LT.
Finalmente, se a APC estiver fixada
inicialmente, mas for exposta a antigénio já
processado, também consegue gerar uma
ativação dos linfócitos T.

Visão global de processamento de antigénio para carregamento em moléculas de MHC classe I e II:
Existem duas vias de processamento de antigénio e apresentação, que diferem na fonte de antigénio, tráfego
intracelular e associação a MHC
• Os antigénios intracelulares são apresentados em MHC I a células T CD8+.
• Os antigénios extracelulares são apresentados em MHC II a células T CD4+.
A via de processamento a apresentação de antigénio por moléculas MHC classe I é uma via citosólica ou
endógena, ao passo que a via de processamento e apresentação de antigénio por moléculas MHC classe II é
uma via exógena.

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• Processamento de antigénio para apresentação por moléculas


de MHC classe I:

Este processamento decorre nos seguintes passos:


1. Aquisição de antigénio – (por exemplo, um vírus/uma infeção
que induz a síntese de dadas proteínas no citosol);
2. Proteólise do antigénio, onde a degradação (proteínas em
péptidos) é efetuada por proteassomas (estrutura cilíndrica) no
citosol;
3.Transporte de péptidos do citosol para o retículo
endoplasmático para carregamento em moléculas de MHC I. É um
transporte mediado por TAP;
4. Carregamento de péptidos em moléculas de MHC I;
5. Expressão de complexos MHC/péptido à superfície celular.

Um vírus replica-se no
citoplasma e leva à síntese de
proteínas virais que são
degradadas em péptidos nos
proteassomas (vários tipos: 26 S
expressos na maioria das células,
contrariamente aos
imunoproteassomas – expressos
em células do sistema
imunológico, maioritariamente – e
aos proteassomas específicos do
timo – expressos em células
epiteliais tímicas), presentes no
citosol.
Os péptidos resultantes da
degradação das proteínas são transportados pelas TAP para o retículo endoplasmático (RE) onde se localiza a
molécula de MHC classe I. Aqui esta molécula é carregada e exportada via complexo de Golgi e vesículas
exocíticas para chegar à superfície da célula.

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Em resumo:
• Os péptidos para carregamento em MHC I são originados a partir das proteínas
citosólicas que são degradadas em estruturas cilíndricas designadas por
proteassomas.
• A molécula de MHC I, sintetizada no RE, entra em contacto com os péptidos gerados
no citosol via TAP. Os péptidos são transportados pelas TAP (Transporters associated
with antigen processing) num transporte dependente de ATP.

As TAP são constituídas por 2 cadeias polipeptídicas: TAP1 e TAP2. Cada uma destas possui
um domínio hidrófobo (que atravessa a membrana ou transmembranar) e outro domínio de
ligação ao ATP (virado para o citosol; proteína ABC).

Aqui observa-se claramente que o


retículo endoplasmático de que se trata é
o rugoso (RER), isto é, os péptidos gerados
no citosol juntam-se ao MHC presente no
retículo endoplasmático rugoso (RER).

No retículo endoplasmático
rugoso a cadeia α da MHC I
encontra-se ligada a uma
chaperona, a calnexina, até haver
a ligação pela subunidade β2-
microglobulina.
Esta associação da subunidade
da β2m leva a que a calnexina se
dissocie do MHC I. O MHC I, agora
completo (com todas as
subunidades ligadas), associa-se a
outras chaperonas,
nomeadamente a calreticulina, a
ERp57 e a tapasina. A tapasina
associa-se às TAPs e forma-se um
complexo denominado PLC
(peptide-loading complex)
constituído pela calreticulina,
ERp57, tapasina, TAPs e MHC I.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Este complexo permite que péptidos gerados no citosol passem via TAPs e que sejam devidamente carregados
na molécula de MHC classe I.
Adicionalmente, está presente o ERAAP (endoplasmic reticulum aminopeptidase associated with antigen
processing) que é um aminopeptidase cuja função é a de catalisar a hidrólise de péptidos demasiado longos ao
nível do N-terminal, permitindo assim o seu carregamento (tamanho ideal: 8 a 10 aminoácidos) em moléculas
de MHC I.
Após a molécula de MHC I estar carregada vai
ser exportada via Golgi para a superfície da
membrana plasmática da célula. Assim, esta
célula passa a expressar MHC I e pode fazer a
apresentação de antigénios a linfócitos T DC8.

Existem membros da família de herpesvírus


que interferem com o processamento antigénico
para MHC I. Isto porque, estes herpesvírus
codificam e expressam uma grande variedade de
proteínas que podem interferir em diversas fases
do processamento (da apresentação) antigénico
em MHC I (para impedir eliminação de células
infetadas por CTL ou Cytotoxic T lymphocytes).
Por exemplo, o EBV expressa a proteína EBNA1
que inibe a ação do proteassoma (tal como a
proteína LANA expressa por KSHV e MHV68).
Existem outras proteínas que interferem com
TAPs, com a movimentação da molécula de MHC I carregada para a superfície.

Nota sobre CTLs <-> Herpesvírus

Aqui representa-se o processamento antigénico que ocorre numa célula para carregamento em MHC I, assim
como diferentes proteínas expressas por membros da família herpesviridae capazes de interferir com este
processamento.

Para a célula ser eliminada por CTLs é necessário que na célula alvo péptidos virais sejam carregados em
moléculas de MHC classe I. Como está indicado, esta família de vírus codifica uma grande variedade de
proteínas que interferem com múltiplas fases do processamento antigénico para carregamento em MHC I.
Por exemplo, a proteína EBNA1 de EBV inibe a atividade do proteossoma.

Se uma célula “alvo” não apresenta MHC I à superfície ou no caso de células infetadas por vírus não apresenta
péptidos virais no contexto de MHC I, a mesma escapa à atividade de CTLs (a CTL para ser ativada e exercer a
sua função citotóxica tem que reconhecer o seu péptido específico no contexto de MHC I).

Desta forma, vírus desta família conseguem escapar à atividade mediada por CTLs.

Tumores que também são alvo de CTLs, conseguem escapar à ação mediada por estas células, via inibição de
expressão de MHC I.

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• Processamento de antigénio para apresentação por moléculas de MHC classe II:

Este processamento decorre nos seguintes passos:


1. Aquisição de antigénio via
macropinocitose, fagocitose ou
endocitose mediada por recetores
(endocitose mediada por clatrina);
2. Endereçamento do antigénio para o
compartimento endocítico onde o pH é
ácido;
3. Proteólise no compartimento
endocítico por abaixamento do pH (vai
ficando sucessivamente mais ácido
ativando-se proteases) -> degradação
por proteases;
4. Carregamento de péptidos na
molécula de MHC II (troca com péptido
CLIP que impede a ligação prematura de
outros péptidos à molécula de MHC
classe II);
5. Expressão de MHC II: péptido na superfície celular – constitutiva e indutível (IFN γ).
A expressão de MHC II é restrita a células APC profissionais e apesar de esta ser constitutiva nestas células,
pode ser aumentada por citocinas como o IFN-γ.

Estes passos serão agora detalhados:

Os patogénios que residem no interior de vesículas ou antigénios extracelulares que


são internalizados pelas APCs são apresentados via MHC classe II.
Os antigénios extracelulares são capturados em vesículas endereçadas para o
compartimento endossomal. De seguida, a acidificação das vesículas ativa proteases
que degradam os antigénios/proteínas em péptidos.
Existem diversos proteases acídicos envolvidos na degradação de antigénio,
nomeadamente da classe dos catepsinas - B, D, S e L (a L é a mais ativa).
As vesículas que contêm os péptidos fundem-se com as vesículas que contêm a molécula de MHC classe II
vinda do retículo endoplasmático rugoso.

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Em suma, a fagocitose ou endocitose de antigénios extracelulares por pAPCs (APCs profissionais como DCs,
macrófagos e linfócitos B) resulta no seu transporte através de uma série de vesículas intracelulares, com pH
cada vez mais baixo, nas
quais as proteínas são
degradadas em péptidos.
Estas vesículas fundem-se
finalmente com vesículas
contendo a molécula de
MHC com origem no RER.

No RER, a molécula de
MHC classe II é ligada a uma
“proteína” denominada de
invariant chain (Ii) que
impede a ligação de
péptidos ao MHC de classe
II. Ou seja, a ligação do
MHC-II à “invariant chain” (Ii) impede o seu carregamento com péptidos no RE. Adicionalmente, esta invariant
chain garante o endereçamento da MHC II para o compartimento endossomal onde estão as vesículas com os
péptidos resultantes da degradação (LIP10 contém motivos para “endereçamento” do complexo MHC II:Ii para
o compartimento endossomal). Assim, Ii direciona a molécula de MHC-II para compartimentos acídicos onde se
encontram com os péptidos resultantes de antigénios extracelulares.
À medida que o pH se torna mais acídico a Ii é clivada dentro das vesículas deixando um pequeno fragmento,
designado de CLIP. A invariant chain é mesmo clivada de forma a deixar o fragmento peptídico (CLIP, class II-
associated invariant-chain peptide) no groove da molécula de MHC II no RE, que impede a ligação de outros
péptidos.
HLA-DM facilita o carregamento de péptidos em moléculas de MHC II:

Como já visto a Ii (invariant chain) impede que péptidos não-requeridos se associem à molécula de MHC de
classe II no retículo endoplasmático rugoso. De seguida, esta Ii é clivada nos endossomas devido à diminuição
do pH que ativou os catepsinas que hidrolisaram esta invariant chain. No entanto, deixam sempre um pequeno
fragmento/péptido (CLIP) ao peptide-binding groove. Seguidamente, dá-se a fusão de vesículas que contêm os

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antigénios com a vesícula de MHC II ligada ao CLIP. Ao compartimento de fusão, onde se insere o MHC II + CLIP
e os antigénios designa-se de MIIC (MHC class II compartment) que é um endossoma/lisossoma com o MHC II
+ CLIP + péptidos a carregar na molécula de MHC II.
Para existir a troca do CLIP pelos péptidos resultantes do processamento antigénico é necessário HLA-DM. O
HLA-DM permite a troca CLIP <-> péptidos. Após MHC II estar devidamente carregada com os péptidos, é
endereçada via complexo de Golgi para ser expressa à superfície e poder apresentar antigénios a células T CD4.

Uma nota de revisão de alguns conceitos e inserção de outros adicionais:


A chaperona “invariant chain” liga-se no RE à molécula de MHC II recém-sintetizada, impedindo deste modo
que possa haver carregamento de péptidos presentes no RE, promovendo também a estabilização da própria
molécula de MHC II. Este complexo deixa o RE, migrando através do Golgi, chegando ao compartimento
endossomal. Para este endereçamento são fundamentais os sinais presentes na própria “invariant chain”, mais
propriamente na porção desta designada por LIP10.
Em vesículas endossomais, a “invariant chain” é primeiro clivada numa das extremidades (parte C terminal)
dando origem a uma porção designada por LIP22, sendo depois novamente clivada por cisteína-proteases dado
origem ao fragmento LIP10. A clivagem posterior do LIP10 resulta no CLIP que permanece associado ao “peptide
groove” da molécula de MHC II.
Assim, a digestão da “invariant chain” por proteases no compartimento endocítico dá origem primeiro ao
LIP22, depois ao LIP10 e finalmente ao CLIP. Tanto o LIP10 como CLIP são porções da “invariant chain”.

MIIC é o nome dado ao compartimento no qual ocorre carregamento de moléculas de MHC II com os péptidos,
ou seja o MIIC resulta da fusão dos endossomas onde as moléculas de MHC II estão associadas com o CLIP,
descritos anteriormente, com os fagolisossomas que contém os péptidos resultantes da digestão de antigénios
extracelulares. Assim, neste compartimento ocorre a substituição do CLIP por péptidos mediada pela molécula
HLA-DM.
Deste compartimento, as moléculas de MHC II carregadas com péptidos são transportadas para a membrana
plasmática, onde podem ativar linfócitos T CD4 cujo TCR reconhece (é específico) para estes péptidos.
O importante é reconhecer que ocorre fusão de endossomas com moléculas de MHCII:CLIP (CLIP este que
resulta da digestão da “invariant chain” por cisteína-proteases nos endossomas) com fagolisossomas que
contém péptidos. E saber a origem dos péptidos que são carregados. O nome que por vezes é dado a este
compartimento e a sequência de digestão da “invariant chain” (primeiro em LIP22, depois em LIP10 e finalmente
em CLIP) não é necessário saber.

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Ativação de DCs reduz expressão de MARCH-1 aumentando a semivida das moléculas de MHC II:

Em células dendríticas
imaturas há uma molécula
denominada de MARCH-1 que
leva à ubiquitinação das
moléculas de MHC II, marcando-
as para posterior degradação
pelo proteassoma. Quando não
há infeção (estado estacionário,
situação fisiológica), a MARCH-1
permite a diminuição do tempo
de meia-vida da MHC II.
Em situação de infeção, o TLR
(Toll-like receptor) dimeriza e
ativa uma via de sinalização que
resulta na diminuição da transcrição do gene que codifica o MARCH-1. Assim, este é menos expresso/sintetizado
levando a que MHC II não seja ubiquitinada, permitindo um aumento do seu tempo de semivida. Assim, as
moléculas de MHC classe II podem acumular-se à superfície da célula.
Ora, se o sinal inicial foi uma infeção (daí o TLR dimerizar), então assim o MHC II
pode apresentar péptidos resultantes dos microrganismos patogénicos à superfície.

Apresentação cruzada:

Apresentação de antigénios extracelulares por moléculas MHC I a CTLs


Há sempre exceções! Algumas células dendríticas têm a capacidade de apresentar antigénios extracelulares a
moléculas de MHC I a CTLs/células TCD8 citotóxicas (a regra é que geralmente antigénios extracelulares são
apresentados por MHC II e antigénios intracelulares são apresentados por MHC I).
Estas células dendríticas têm a capacidade de fazer com que os antigénios que são recuperados nas vesículas
endocíticas (vindos do exterior) possam ir parar ao citosol e, desta forma, entrar na via endógena, de
apresentação de antigénio para carregamento em MHC classe I e ativar células T CD8 desta forma.
A esta apresentação onde ocorre a mudança da via e que foge à regra chama-se de apresentação cruzada. É
um tipo de apresentação limitado a células dendríticas! Isto é, só as células dendríticas podem apresentar
antigénios extracelulares em MHC I a CTLs.

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Em resumo:
Existem duas vias de processamento antigénico: a endógena (MHC I) e a exógena (MHC II):

Via endógena (MHC classe I): Via exógena (MHC classe II):
1. Os antigénios endógenos (de microrganismos 1. No RER a invariant chain (Ii) liga-se ao MHC II,
que se replicam no citoplasma, como os vírus) não permitindo a ligação de outros péptidos e
são degradados pelo proteassoma localizado endereça o MHC II via aos endossomas.
no citoplasma. 2. Nos endossomas (via Golgi) começa a haver
2. Os péptidos resultantes são transportados via clivagem da Ii em fragmentos (por catepsinas –
TAP para o RER. proteases – ativados por abaixamento do pH),
3. No RER, a molécula de MHC I está associada à sendo que um deles fica associado ao MHC II, o
chaperona calnexina e, mais tarde, após CLIP.
associação da subunidade β2m a um complexo 3. Endocitose e fusão de vesículas endocíticas
de chaperonas, o PLC (constituído pela com os antigénios/péptidos a carregar
calreticulina, ERp57, tapasina e TAPs) que, por formando-se o MIIC.
intermédio da ERAAP, permitem o 4. Por ação da HLA-DM existe a troca do CLIP
carregamento dos péptidos na MHC II. pelos péptidos e posterior transporte da MHC
4. Transporte para a superfície da membrana via II para a superfície da membrana plasmática,
complexo de Golgi para apresentar antigénios podendo apresentar antigénios a LT CD4.
a LT CD8.

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Aula 11 – Desenvolvimento de linfócitos T

Recetor da célula T (TCR; T cell receptor) αβ:

Os linfócitos T (αβ) expressam na sua membrana o TCR, constituído por uma cadeia α e uma cadeia β
associadas por uma ligação persulfureto. Este possui uma região variável (V) e uma região constante (C).

Por outro lado, existem células T γδ que possuem, obviamente, uma cadeia γ e uma cadeia δ.

O complexo TCR αβ-CD3:

Para a sinalização da célula T, o TCR forma um complexo com


a molécula CD3 onde esta encontra-se ligada não-
covalentemente ao TCR.

O CD3 é constituído por 2 cadeias ε, 1 cadeia δ e uma cadeia


γ. No complexo TCR-CD3 ainda existem 2 cadeias ζ (zeta),
fundamentais para a sinalização na célula T.

Estão ainda indicados uns motivos denominados de ITAMs


(immunoreceptor tyrosine-based activation motif). A
fosforilação dos resíduos de tirosina destes motivos leva à
ativação da célula T e, consequentemente, ao início de uma via
de sinalização no LT que resultará na concretização de uma dada resposta pelo mesmo.

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Organização do locus das cadeias α e β do TCR em humanos:

Chr 14 Para possuirmos uma


cadeia α e uma cadeia β
no TCR é necessário
existir um rearranjo
genómico dos genes
que codificam estas
“Segmento de gene” cadeias.

Quanto ao locus da
Chr 7
cadeia α, este possui
vários segmentos de
gene V (região
variável), J (região de
junção) e C (região
constante) da cadeia α.
Esta cadeia α acaba por
possuir bastantes semelhanças com a cadeia leve das Imunoglobulinas (recombinação VJ).

No caso da cadeia β do TCR é necessário haver rearranjo de genes V, D (diversidade) e J tal como nas cadeias
pesadas das Ig (recombinação VDJ).

Organização do locus das cadeias γ


e δ do TCR em humanos:

Como anteriormente referido


também existem linfócitos T γδ.
Nestes loci acontece exatamente o
mesmo processo de recombinação.

Existe uma particularidade no locus


da cadeia δ, pois este localiza-se
dentro do locus da cadeia α. Isto
possui uma
consequência
direta: sempre
que há rearranjo
VJ na cadeia α, o
locus δ é
excisado.

Isto é, não existe rearranjo da cadeia δ terminando-se a diferenciação para células γδ.

É uma maneira hábil de garantir que o comprometimento de um timócito para a linhagem


αβ (os mais abundantes) bloqueia completamente a linhagem γδ (a linhagem alternativa).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

O pedaço de DNA excisado de locus δ


resultante do rearranjo VJ da cadeia α
designa-se por sjTREC (TCR Excision Circle
harbouring signal joint). Este DNA
epissomal é mantido nas células T mesmo
após a migração do timo para a periferia.

Os TRECs são muito importantes, pois


permitem:

• Identificar células que emigraram


recentemente do timo (pois estas mantém
estes TRECs). Estes TRECs são perdidos
quando a célula se divide na periferia,
porque eles não se dividem.
• Indicam a atividade tímica, isto é, se
existem problemas na função tímica. Se
esta atividade decresce, o contéudo de
TRECs diminui.

Este DNA epissomal resultante da deleção do locus δ do TCR é mantido nas células T após migração do timo
para a periferia. Os TRECs são estáveis e não se dividem, mas são diluídos por divisão celular.

Se um individuo não produz células T (por exemplo por ausência de timo), não existem TRECs no sangue
periférico.

Nota: aqui DNA epissomal é equivalente a DNA circular.

Rearranjo dos genes que codificam


para as cadeias α e β do TCR:

Para existir a expressão das cadeias


α e β do TCR à superfície de uma
célula T, tem de existir um rearranjo
VJ para a cadeia α e VDJ para a cadeia
β. No entanto, seguida desta
recombinação ainda existe tradução
destes genes, splicing e tradução do
mRNA maduro para originar a
proteína a ser expressa à superfície.
Para os processos de recombinação
são necessários: o complexo proteico
RAG (RAG 1 e RAG 2), o enzima TdT
(para adição de nucleótidos N) e os fatores NHEJ.

As células T diferenciam-se no timo, migrando depois para a periferia onde são ativadas por antigénios
exógenos:

Os progenitores T que se desenvolvem na medula óssea migram para o timo e é neste que completam o seu
processo de diferenciação, pelo que tem de haver a interação entre o precursor de células T com uma célula
estromal tímica pela via de sinalização Notch.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

A via de sinalização Notch é essencial ao comprometimento de um timócito para


a linhagem T (rearranjo genómico). Estas células sofrem uma posterior
diferenciação em diferentes compartimentos do timo.

O TCR que é rearranjado vai ser testado recorrendo a self-MHC, sendo que apenas as células que reconhecem
MHC do próprio com uma afinidade intermédia (interação/afinidade intermédia) é que são selecionadas
positivamente. Dá-se uma seleção negativa para as células cuja interação é excessiva (são eliminadas, pois
podiam desencadear doenças autoimunes). Os timócitos com uma afinidade demasiado baixa para o self-MHC
também são mortos, ainda que não seja um processo de seleção negativa. Os timócitos que expressam TCRs
com uma afinidade na gama do baixo-intermédia-alta (não muito baixa nem muito alta) com complexos MHC
próprios (expressos à superfície das células epiteliais) vão sair do timo e são enviados para os órgãos linfoides
secundários.

Após o processo de seleção e pós-maturação, os linfócitos T saem do timo e migram para os órgãos linfoides
secundários (exemplo: gânglios linfáticos) onde podem ser ativados por células dendríticas (apresentação de
antigénio pela APC) e desempenhar as suas funções usuais no contexto de infeção, nomeadamente:

- As células T CD4/auxiliares ativam macrófagos.

- As células TCD8/citotóxicas matam células infetadas com vírus.

Desenvolvimento de células T:

• Objetivo?

- Produzir células dotadas de (que expressem) um TCR funcional, e por isso capazes de reconhecer um
antigénio na periferia e montar uma resposta imunológica celular.

• Onde e quando ocorre este processo?

- No timo do adulto (e no fígado do feto).

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(Notar diferença em relação a células B: ocorre na medula óssea)

• Como?

- Através da diferenciação a partir de células pluripotentes (vindas da medula óssea), estas migram para o timo
e aqui sofrem alterações específicas de expressão génica que determinam a linhagem T.

- Cada uma dos muitos milhões de células T (e B) que circula no nosso corpo expressa um recetor de antigénio
(TCR/BCR) único: as células que entram no timo não estão ainda comprometidas para a linhagem T e não
expressam TCR. Ao passo que, as células T que saem do timo são funcionais e expressam um TCR único.

Ausência de timo => ausência de células T!

Se o timo não estiver operacional ou for inexistente, não existe diferenciação de linfócitos T. Por exemplo,
ratinhos que são timectomizados à nascença (sem timo), não desenvolvem células T na periferia. Por outro lado,
em humanos existe um síndrome (de DiGeorge) onde existe aplasia tímica (timo mal desenvolvido), pelo que
estes indivíduos têm uma ausência total de células T ou um repertório de células T muito oligoclonal (poucas
células T e com pouca diversidade), tendo consequências severas no estabelecimento da resposta imune. Este
síndrome deve-se a uma deleção no cromossoma 22 que não permite a síntese do fator de transcrição Tbx1.

Os ratinhos nude não têm pelo, por causa de uma mutação no gene do Foxn1 (Forkhead box number 1) que
leva a que os folículos pilosos não se desenvolvam. Nestes ratinhos não há desenvolvimento do timo, porque o
fator de transcrição Foxn1, cujo gene é mutado, é essencial para a diferenciação e manutenção das células
epiteliais do timo (TEC, Thymic epithelial cells).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Os ratinhos scid têm uma


deficiência numa proteína, PRKDC,
que se encontra envolvida na
recombinação VDJ (para a síntese
dos TCRs e BCRs) e assim estes
ratinhos não possuem linfócitos B e
T.

Os ratinhos nude/nu não têm timo


pela deficiência no Foxn1, pelo que
não existe diferenciação de células T
(estas estão totalmente ausentes).

Realizou-se um transplante de
timo do ratinho scid para a cápsula
renal do ratinho nude e uma
transferência de céulas estaminais
da medula óssea do ratinho nude
para um ratinho scid.

Ora, os ratinhos scid que


possuíam um impasse ao nível da
recombinação génica recebem
células estaminais (da medula
óssea) que possuem uma
recombinação VDJ não-deficiente
(as células estaminais da medula
óssea diferenciam-se
normalmente). Como este ratinho
tem timo, estes progenitores não
deficientes podem migrar para lá e
iniciar o processo normal de
diferenciação de células T.

Por outro lado, os ratinhos nude recebem um timo não-deficiente na cápsula renal. Como não existia problema
com os progenitores na medula, estes migram para este timo não-deficiente, havendo desenvolvimento normal
de células T.

Assim em ambos os ratinhos se observa que antes do transplante não existia a proliferação de células T (estas
são sintetizadas e existe a sua diferenciação), que passa a existir após os transplantes (observação do baço,
órgão linfoide secundário).

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Timo:

O timo é um órgão linfoide


primário e que se localiza
acima do coração. Em
humanos, a timectomia é
efetuada quando crianças têm
cardiopatias severas (os
cirurgiões para chegarem ao
coração têm de remover o
timo).

Possui dois lóbulos (com uma


forma a fazer lembrar um
cacho-de-uva) e é rodeado por
uma cápsula fibrosa. Os
lóbulos possuem duas regiões:
exterior (córtex, mais escuro) e
interior (medula, mais clara). A
diferente tonalidade no córtex
e na medula deve-se à
densidade dos timócitos (precursores dos linfócitos T que se estão a diferenciar no timo). Existem mais
timócitos no córtex do que na medula.

Além dos timócitos existem outras populações de células existentes no timo e que são fundamentais:

• Córtex: células epiteliais tímicas corticais e macrófagos (importantes na eliminação de células mortas
no timo).
• Medula: macrófagos, células dendríticas e células epiteliais tímicas medulares. São populações
importantes para o processo de seleção negativa.

Apenas 2% dos timócitos conseguem completar o processo de diferenciação no timo e migrar para a periferia,
por causa dos diversos checkpoints existentes ao longo do seu desenvolvimento

Desenvolvimento de células T no timo:

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As células hematopoiéticas estaminais


Tregs
IEL na medula óssea diferenciam-se no
NKT precursor hematopoético que migra para
o timo.

No timo a entrada destes precursores


dá-se pelos vasos sanguíneos da região corticomedular
(entre o córtex e a medula tímica). Este precursor
diferencia-se posteriormente no estadio mais imaturo de
timócitos, designado de DN1 (double-negative 1). É double-negative, pois estas células não expressam nem CD4
nem CD8 (co-recetores de LT). O timócito DN1 dá origem a um DN2 e, posteriormente, estes diferenciam-se
em DN3. Este é o passo de compromisso da linhagem T (DN2 -> DN3). As células DN3 sofrem o rearranjo
genómico do TCR e diferenciam-se em DN4. Tanto os estados DN3 com DN4 expressam à sua superfície um
recetor que se designa de pré-TCR. Este recetor é essencial para a continuação da diferenciação.

[A diferenciação de linfócitos γδ dá-se quando os timócitos ainda são double-negative (DN), 2 ou 3, pelo que
aqui tem de haver um rearranjo das cadeias δ (logo, não rearranjam a α porque o locus da δ se localiza no locus
da α) e γ do TCR. Nestes estados o locus da cadeia α ainda está intacto (logo também o da δ), daí poder haver
essa diferenciação. Os passos seguintes neste TCRγδ são mais simples e com menos estados (mas há controlos
na mesma!).] Todos os timócitos possuem no estado mais imaturo todos estes locus (α, β, γ, δ) não rearranjados.

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Os timócitos DN4
diferenciam-se em timócitos
DP (double-positive), isto é, expressam
CD4 e CD8 e estes timócitos já expressam
um TCR αβ completamente rearranjado.
Até chegar a este TCR rearranjado, houve
primeiramente a expressão da cadeia β
rearranjada com uma pré-cadeia α (pre-
Tα) e só depois é que há um rearranjo da
cadeia α que leva à formação do αβTCR DP.

Os timócitos DP que expressam CD4 e


CD8 diferenciam-se, por fim, em CD4 SP –
na periferia adquirem o fenótipo auxiliar -
ou CD8 SP (single-positive) – na periferia
adquirem o fenótipo citotóxico. A
maturação destas SP dá-se,
posteriormente, no timo.

Deve-se referir que os timócitos DP


podem também dar origem a outras
linhagens, nomeadamente, células T
reguladoras (Tregs), IEL (Intraepithelial
lymphocytes) e células NKT (Natural Killer
T, células NK que expressam um TCR pouco diverso).

Em alguns estados de diferenciação podem existir checkpoints/controlos (nos estados em que o TCR maturo
ou imaturo é expresso) de tal forma que se um timócito não reconhece um sinal de sobrevivência, pode haver
indução da apoptose. Isto acontece em casos
como, por exemplo, uma cadeia β mal
rearranjada.

Agora, deve-se ter em atenção a função do


TCR quando este é expresso no processo de
diferenciação T no timo. O precursor que vem
da medula diferencia-se em DN1 (estado mais
imaturo de diferenciação de LT) no timo. O
estado double-negative é dividido em 4 sub-
estados (DN1 a DN4), sendo que em DN3 se
começa a expressar um pré-TCR na membrana.
Os double-negative dão origem aos double-
positive (DP) e que expressam CD4 e CD8. Nesta
fase dá-se a fase de seleção positiva e de
seleção negativa (ou só de seleção positiva e
depois seleção negativa nos SP – ainda não se
sabe). Por seleção positiva, os DP diferenciam-
se em single-positive (SP), ou CD4+ ou CD8+.

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Um linfócito γδ é caracterizado pela expressão do TCR constituído por uma cadeia γ (rearranjada primeiro) e
por uma cadeia δ (também rearranjada).

Os estados DN (1, 2, 3 e 4) são distinguíveis/identificados pela expressão de marcadores à superfície:

• DN1: estas células expressam a proteína CD44 e ainda não expressam CD25 (CD44+ CD25-).
• DN2: expressam ambas as proteínas CD44 e CD25 (CD44+ CD25+).
• DN3: expressam CD25, mas deixam de expressar CD44 (CD44- CD25+).
• DN4: não expressam nem CD44 nem CD25 (CD44- CD25-).

CD44 e CD25 são usados para a discriminação dos diferentes estados de


double-negative (DN). A progressão dá-se com a imediata expressão de CD44,
seguida da expressão de CD25, perda da expressão de CD44 e que finaliza com
a perda da expressão de CD25.

Em DN3 o pré-TCR é constituído pela cadeia β do TCR completamente


rearranjada associada a uma cadeia α invariante/não-rearranjada (pre-Tα). Isto
é, todos os linfócitos T expressam a mesma cadeia α neste estado e a sua
cadeia β específica. Com esta inserção do pré-TCR iniciam-se os
checkpoints/controlos.

De DN3 para DN4 dá-se o primeiro checkpoint fundamental para:

- Iniciar o rearranjo da cadeia α.

- Estimular a expressão de CD4 e CD8.

- Induzir a proliferação dos timócitos neste estado.

- Transmitir um sinal à célula para parar o rearranjo da cadeia β, que já está devidamente rearranjada.

As células DN4 (ou pré-DP) ainda expressam pré-TCR, mas no estado a seguir (DP) os timócitos expressam TCR
(já com as cadeias α e β rearranjadas) e CD4 e CD8. Este TCR final ainda assim possui uma sinalização diferente
do TCR das células da periferia, imatura. Esta sinalização imatura faz com que este TCR seja fundamental para
os processos de seleção positiva e negativa.

No processo de seleção positiva as células que conseguem reconhecer MHC do próprio (numa afinidade
intermédia) sobrevivem (o TCR transmite um sinal de sobrevivência). As células que interagem com alta
afinidade com complexos MHC-péptido expressos à superfície de células epiteliais tímicas ou de células
dendríticas são mortas por apoptose (seleção negativa). Se a afinidade do TCR para complexos MHC: péptido é
demasiado baixa, a célula também morre por apoptose (processo designado por death by neglect – não é um
tipo de seleção negativa!). Pensa-se que neste caso o timócito não recebe sinais de sobrevivência via TCR.

As DPs são imaturas e o sinal do TCR é sobrevivência (se o TCR reconhece o MHC do próprio com afinidade
intermédia) ou morte (se o TCR reconhecer o self-MHC com demasiada afinidade).

No estado final SP (CD4+ ou CD8+) a via de sinalização do TCR transmite sinais de:

- Proliferação.

- Aquisição de resposta efetora (T CD4 auxiliares ou T CD8 citotóxicas).

Estes timócitos SP (diferenciadas) já possuem uma via de sinalização igual à dos timócitos na periferia. Os
marcadores ou proteínas de superfícies expressos podem ser detetados por anticorpos e, por exemplo, por
citometria de fluxo é possível distinguirem-se os vários estados da diferenciação.

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Uma nota importante sobre a seleção negativa

Apesar de se referir muito a seleção negativa associada ao estado DP, esta dá-se maioritariamente no estado
SP.

A seleção negativa ocorre principalmente no estado single positive (CD4SP ou CD8SP) ou seja, quando os
timócitos estão na medula tímica. No entanto, DP cujo TCR que interage com elevada afinidade com
complexos MHC-péptidos no córtex também são “selecionados negativamente” e assim eliminados. O
objetivo é impedir que células T com potencial autorreativo (que reconhecem na periferia antigénios do
próprio apresentados em MHC do próprio) sejam selecionadas no timo.

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Recetor da célula pré-T (pre-TCR):

O recetor pré-TCR é expresso nos estados DN3 e DN4 e


constituído por uma cadeia β totalmente rearranjada (isto é, já
ocorreu o processo de recombinação VDJ). Esta cadeia β
emparelha com uma cadeia α (não rearranjada) também
designada de pre-Tα ou pré-Tα.

O complexo pré-TCR é constituído por diversas cadeias de CD3


e que auxiliam na sinalização.

Os sinais que o pré-TCR transmite aos DN3 e DN4 são:

- Começar a rearranjar a cadeia α.

- Começar a expressar CD4 e CD8 para posterior diferenciação


em DPs.

- Estimular a sua proliferação (que aumenta a possibilidade de


existirem alguns timócitos salvaguardados/”guardados” caso
outros timócitos morram no processo de seleção negativa). Assim
se um morrer, outro clone (com a mesma cadeia β, mas diferente α) substitui-o.

- Parar o rearranjo da cadeia β (já rearranjada).

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Estrutura e atividade do TCR durante o desenvolvimento T:

Nas células DP (expressam tanto CD4 como CD8) e nas SP (expressam ou só CD4 ou só CD8), o TCR já é
constituído por cadeias α e β (uma α e uma β) totalmente rearranjadas.

O αβTCR DP transmite aos DPs um dos seguintes sinais:

• Seleção positiva, isto é, DP sobrevive se a afinidade entre o MHC do próprio e o TCR for intermédia.
Logo na periferia vai desenvolver a sua função (vai reconhecer os péptidos exógenos expressos à
superfície do self-MHC).
• Seleção negativa, ou seja, DP morre se a afinidade entre o MHC do próprio e o TCR for demasiado
elevada. Se esta célula não fosse eliminada, na periferia poderia reconhecer demasiado péptidos do
próprio podendo desencadear doenças autoimunes.

O αβTCR SP transmite aos SPs os seguintes sinais:

• Sobrevivência.
• Proliferação.
• Aquisição de função efetora (CD4 – auxiliares – e CD8 – citotóxicas).

Em vertebrados são produzidos 2 subsets de células T no timo:

- TCR-αβ -> subset dominante em respostas imunológicas adquiridas.

- TCR-γδ:

• Proteção das superfícies das mucosas.


• Primeiras células T a desenvolver-se durante o desenvolvimento fetal.
• Diferenciação deste subset é reduzido após o nascimento.

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• A diferenciação de linfócitos γδ dá-se quando os timócitos ainda são double-negative (DN), 2 ou 3,


pelo que aqui tem de haver um rearranjo das cadeias δ (logo, não rearranjam a α porque o locus da δ
se localiza no locus da α) e γ do TCR. Nestes estados o locus da cadeia α ainda está intacto (logo
também o da δ), daí poder haver essa diferenciação. Os passos seguintes neste TCRγδ são mais simples
e com menos estados.

Em termos de desenvolvimento de γδ, pensa-se que os timócitos que rearranjaram a cadeia γ e δ antes da
recombinação da cadeia β, expressam o complexo TCR γδ/CD3 na membrana plasmática. A sinalização via TCR
induz um processo designado por γδ-selection que confirma a geração de um TCR γδ funcional. O commitment
para a linhagem αβ é também inibido.

Durante o período embrionário o timo é primeiro colonizado por timócitos γδ e posteriormente por timócitos
αβ que predominam no adulto. O mesmo em ratinhos:

O TCR para ser expresso à superfície está associado a CD3, daí que seja a percentagem do complexo proteico
que se observa. Como todos os TCRs (sejam eles αβ ou γδ) expressam esta proteína, podem-se usar anticorpos
contra a mesma para observar a sua presença. Portanto, a percentagem avaliada corresponde a todas as células
T existentes (e depois no gráfico é feita a distinção entre os dois subtipos). Assim %CD3 é equivalente a
%linfócitos T.

No período embrionário e desenvolvimento fetal a vasta maioria dos timócitos são γδ. Próximo do tempo de
nascimento (nos ratinhos o período de gestação são 21 dias), cerca de 3 dias antes há um decréscimo acentuado
na diferenciação dos linfócitos γδ. Os timócitos αβ começam a desenvolver-se perto dos 16 dias, mas no 21º
dia, isto é, no nascimento já são a população de timócitos predominante no timo.

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Aula 12 – Desenvolvimento de Linfócitos T no timo

Seleção tímica:

- Seleção positiva

• Sobrevivência de timócitos cujos TCRs reconhecem moléculas de MHC do próprio.


• Garante restrição ao MHC.

- Seleção negativa

• Elimina células T cujos TCRs interagem com elevada afinidade com o MHC do próprio ou com
complexos MHC-péptidos.

- Seleção de um repertório de células T capazes de reconhecer antigénios exógenos apresentados por


moléculas de MHC do próprio (células T funcionais).

- Eliminação da maioria das células autorreativas (ativadas por complexos MHC-péptidos do próprio). Limita-
se assim a autoimunidade na periferia.

No córtex, os timócitos DP interagem com


células epiteliais tímicas corticais (cTEC). Os
timócitos que não conseguem interagir com
estas células (não reconhecendo o MHC do
próprio) são mortas por apoptose. Por
seleção negativa também são mortos os
timócitos DP que interagem com demasiada
afinidade com o self-MHC (também são
mortos por apoptose). Os timócitos DP de
afinidade intermédia são selecionados
positivamente.

Seguidamente, os timócitos DP que


interajam adequadamente com as células
epiteliais tímicas corticais diferenciam-se e
migram para a medula. Aqui sofrem um novo
processo de seleção negativa (caso a afinidade TCR-MHC do próprio seja muito alta) onde os timócitos SP
interagem com células epiteliais tímicas medulares (mTEC). As mTEC apresentam MHC do próprio e consoante
a afinidade da interação timócito-mTECs existe uma seleção:

Baixa afinidade: vão para a periferia e são células que vão originar células T convencionais.

Intermediária a alta afinidade: vão para a periferia e originam células T reguladoras.

Muito alta afinidade: apoptose/morte celular programada.

O esquema encontra-se bastante simplificado. Sabe-se que existem outras células na medula capazes de
permitir a seleção negativa de timócitos, nomeadamente células dendríticas.

NOTA IMPORTANTE: DP: seleção negativa e positiva; SP: seleção negativa (já sofreram seleção positiva em
DP).

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A população mais imatura de timócitos designada de DN


não expressa nem CD4, nem CD8, nem TCR rearranjado. Este
estado é dividido em 4 sub-estados (DN1, DN2, DN3 e DN4)
identificados consoante a expressão de CD44 e CD25. Aqui a
cadeia β do TCR é primeiramente rearranjada e só em DP se
tem a cadeia α rearranjada.

Os linfócitos DP expressam tanto CD4, como CD8 e TCRαβ


(associado ao complexo CD3). Ainda no córtex, estes
timócitos DP que não são capazes de reconhecer o complexo
MHC:péptido morrem por apoptose num processo
designado de death by neglect. Death by neglect é a
designação dada à deleção clonal de timócitos SP que não
recebem sinal de sobrevivência ao interagir com complexos
MHC-péptido (TCR com afinidade muito baixa para estes
complexos). Na realidade, estes timócitos também não
escapam à seleção negativa, mas o termo seleção negativa
aplica-se aos timócitos com TCR com alta/muito alta afinidade.

Adicionalmente, os timócitos que reconhecem com demasiada afinidade com self-MHC são selecionados
negativamente e são mortas por apoptose. O processo de seleção negativa é mediado pelas cTECs. Os de
afinidade intermédia são selecionados positivamente.

Os timócitos que passam a seleção positiva migram para a medula são expostas a APCs como as mTECs. Aqui,
já no estado SP, podem sofrer seleção negativa se tiverem demasiada afinidade com o MHC que lhes é
apresentado (morte por apoptose). Entretanto, os de afinidade intermédia permanecem na medula 3 a 4 dias
sofrendo maturação e depois podem migrar para a periferia.

Na periferia, os LT CD8 SP são designados de LT CD8 citotóxicos, os LT CD4 SP são designados de LT CD4
auxiliares e os LT Reguladores CD4 SP são designados de LT Reguladores (controlam a ação das células do
sistema imunitário tendo maior afinidade para complexos MHC-péptido). Apesar da alta afinidade destas, estas
conseguem escapar ao processo de seleção negativa, pois a afinidade não é excessiva.

O modelo de seleção de células T no timo é baseado na afinidade de


interação TCR (rearranjado): MHC-péptido

Observa-se no gráfico que células em que o TCR possui baixa afinidade para
o complexo MHC-péptido morrem (death by neglect), pois não conseguem
receber sinais de sobrevivência via TCR.

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De seguida, existe uma gama de afinidades intermédias que são selecionadas positivamente (e escapam à
seleção negativa) e que terminam o seu processo de diferenciação na medula e migram para a periferia.
Adicionalmente, existe uma pequena gama de afinidade mais alta que permite o recrutamento de timócitos
para a linhagem de células T reguladoras.

Por fim, um timócito que possua afinidade demasiado elevada para complexos MHC-péptido é eliminado por
seleção negativa, visto que é induzida a apoptose nessa célula.

Relembre-se que MHC I é essencial na apresentação


de péptidos a LT CD8 e MHC II essencial a LT CD4.

Ora, quando existe deficiência nos diferentes MHCs,


observa-se que:

• Deficiência em MHC I: a população DN, DP e


CD4 SP estão presentes. Não temos a população CD8
SP.

Isto acontece, pois existe MHC II que pode


apresentar péptidos a populações que expressem CD4
(a DP, apesar de positiva para CD8 é-o para CD4
também). No entanto, como CD8 SP apenas expressa
CD8, não lhe vão ser apresentados péptidos (pois não
há MHC I, que é o único MHC que se pode utilizar e garantir a sobrevivência da população).

Na periferia apenas existirão LT CD4.

• Deficiência em MHC II: analogamente a população DN, DP e CD8 SP sobrevivem, mas a população CD4
SP não.

Os péptidos podem ser apresentados em contexto de MHC classe I aos co-recetores CD8 (portanto qualquer
célula que o expresse, pode ser ativada), mas células (CD4 SP) que apenas expressem CD4 à sua superfície e que
necessitam de MHC II exclusivamente, não sobrevivem (não são selecionadas positivamente).

Na periferia apenas existirão LT CD8.

Questionou-se durante muitos anos quais


eram os péptidos apresentados no timo e
como é que o processo de seleção negativa era
tão eficiente.

Há um fator de transcrição designado de


AIRE (AutoImmune Regulator) que é
fundamental para a expressão de
autoantigénios (antigénios do próprio
expressos em órgãos na periferia como
péptidos específicos do intestino, cérebro,
estômago, língua, coração, etc) no timo,
nomeadamente, em mTECs (células epiteliais
tímicas medulares).

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Esta expressão não é restrita a mTECs. Foi já demonstrado


que LB expressos no timo também podem expressar este
fator de transcrição.

A expressão de AIRE nas mTECs é essencial para a deleção


de células autorreativas que reconhecem antigénios do
próprio e específicos de órgãos na periferia.

AIRE em mTECS leva à expressão de antigénios específicos


de órgãos da periferia e estes vão ser apresentados em
moléculas de MHC.

Quando há expressão de AIRE, todos os timócitos que


interagem com elevada afinidade para antigénios específicos
de órgãos são deletados (ou seja, células autorreativas são
eliminadas) e assim há uma manutenção da tolerância ao
próprio.

Na ausência de AIRE, as células autorreativas conseguem


escapar para a periferia (porque os péptidos não são
devidamente apresentados no timo), isto é, estas células não
são testadas e migram para a periferia pelo que podem causar
autoimunidade específica de alguns órgãos.

O processo de desenvolvimento de LT no timo é muito “custoso”!:

• 98% de todos os timócitos não terminam o seu processo de maturação, morrendo por apoptose no
timo. (apenas 2% terminam o processo de maturação)
• No entanto, este processo (fino) garante a diferenciação de células T funcionais (reconhecem MHC do
próprio e péptidos exógenos na periferia), com reduzido potencial autorreativo.

A via de deleção de células T no timo é por apoptose que se distingue de necrose, pois a primeira é uma morte
celular programada e garante que não haja libertação dos conteúdos intracelulares pelas células, limitando-se
o processo de inflamação.

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Duas vias de sinalização para indução de apoptose em células T:

A apoptose pode ser desencadeada por duas vias de sinalização: a via intrínseca e a via extrínseca. A via
intrínseca envolve o mitocôndrio e é a via recorrida durante o processo de diferenciação no timo, pelo que aqui
ocorre libertação do citocromo c no citoplasma e posterior indução dos enzimas caspases.Na periferia, a morte
celular por apoptose dá-se pela via extrínseca ativada por exemplo por CTL FASL+ que induz apoptose nas
células que expressem FAS a interagir com FAS-ligando. Processo na periferia que também leva a ativação de
caspases.

As moléculas da família das Bcl-2 são fundamentais na regulação da apoptose. Estas induzem a sobrevivência
de células T no geral.

Células T reguladoras:

- Expressam FOXP3 (fundamental para o seu


desenvolvimento e função) e a maioria expressa
CD25 (cadeia α do recetor da IL-2).

- Regulam a função de outras células do


sistema imunológico, como inibir a proliferação
de outras células T in vitro e in vivo.

- Previnem o desenvolvimento de doenças


autoimunes.

Estas resultam de timócitos com elevada


afinidade para o complexo MHC próprio-
péptido, mas não afinidade suficiente para
serem eliminados por seleção negativa.

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Estas células T reguladoras exibem certos possíveis mecanismos de ação para regularem a função de outras
células do sistema imunológico na periferia, nomeadamente:

1. Privação de citocinas: as células T reguladoras nesta situação expressam elevados níveis de CD25 ou
cadeias α do recetor da IL-2 de alta afinidade permitindo-lhes competir, recorrendo a IL-2, com outras
células por citocinas que células T necessitam para sobreviver e proliferar. Isto é resulta na inibição da
ativação de células T efetoras.
As células T reguladoras (Tregs) expressam CD25 (cadeia α do recetor da IL2), que conjuntamente com
as cadeias β e γ formam o designado high-affinity receptor da IL2. Este recetor de alta afinidade para
a IL2 expresso pelas Treg permite-lhes competir muito mais eficientemente que as outras células T
para a IL2. A IL-2 é uma citocina fundamental para a sobrevivência e proliferação de células T. Ao
“remover” este fator crítico, as Tregs reduzem a sobrevivência e a proliferação das outras células T.
2. Inibição de citocinas: as células TREGs secretam diversas citocinas inibitórias (para células T),
nomeadamente a IL-10 e a TGF-β, que se ligam a recetores de células T ativadas. Aqui induzem a
diminuição da atividade de sinalização.
3. Inibição de APCs: estas células T reguladoras podem interagir diretamente com a molécula de MHC
classe II das APCs e inibir a sua maturação, inviabilizando a sua capacidade de ativar células T. Isto é,
inibem a apresentação de antigénios, pelo que algumas células T naive não são ativadas.
4. Citotoxicidade: as TREGs podem exibir função citotóxica e matar células (por secreção de perforinas e
granzimas), por apoptose (tal como os linfócitos T citotóxicos).

A migração de timócitos do timo para a periferia


é induzida por sinalização via S1PR1:

Os timócitos que se diferenciaram e que


escaparam à seleção negativa (selecionados
positivamente) no timo permanecem 3 a 4 dias na
medula, após
essa mesma
seleção (a
migração não é
imediata). A
migração destas células do timo para a periferia
deve-se a um gradiente S1P (sphingosine 1-
phosphate). Como os níveis de fosfato de
esfingosina são muito elevados no sangue e os
timócitos passam a expressar um recetor para
este lípido (S1PR1, sphingosine 1-phosphate
receptor), então os timócitos migram em direção
a este composto. Passam para o sangue e vão
para a periferia (órgãos linfoides secundários –
gânglios linfáticos e baço -, por exemplo) onde
podem ser ativados.

Estas células T emigram, vindas do timo, pelo que podem ser designadas
de recent thymic emigrants (possuem TRECs).

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Num ratinho (em humanos é semelhante) ao remover-se o timo, realiza-se uma suspensão celular e marcam-
se as populações de LT CD4 e CD8 usando anticorpos contra estes co-recetores; observa-se o perfil à esquerda
(por citometria de fluxo). Vê-se que a população mais imatura (DN) é a que se encontra em menor quantidade
(≈3%). Estes DNs diferenciam-se em DPs (CD4+ e CD8+) que é a população mais frequente (cerca de 80%). Estas
por seleção positiva originam SPs (ou CD4 SP ou CD8 SP com uma frequência, respetiva, de 12 e 5%). Note-se
que a maioria das DPs não se diferenciaram em SP, pelo que foram selecionadas negativamente, isto é, sofreram
apoptose.

Fatores de transcrição envolvidos no comprometimento para a linhagem T:

Um progenitor vindo da medula óssea chega ao


timo, onde a via de sinalização Notch1 é
fundamental para se iniciar a diferenciação destes
progenitores em DN1 (e restantes estados) e
comprometimento para a linhagem T.

A via de sinalização Notch1 leva à expressão de


dois fatores de transcrição: TCF1 (T-cell factor 1) e
GATA-3. Estes dois fatores de transcrição são
essenciais para a expressão de genes específicos
da linhagem T (alguns codificam as proteínas do
complexo CD3 – associadas ao TCR - e as proteínas
RAG – essenciais na recombinação VDJ do TCR).
Estes fatores começam a ser expressos no estado
DN1.

Existe ainda outro fator de transcrição


denominado de Bcl11b que é induzido no estado
DN2. Este bloqueia todas as linhagens não-T (para comprometimento na linhagem T) e ativa outros genes
necessários (ativação completa) para o programa T.

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Existem muitas outras proteínas envolvidas no desenvolvimento de linfócitos T no timo, além dos fatores de
transcrição mencionados anteriormente. Alguns exemplos são os enzimas envolvidos no processo de
recombinação VDJ (RAG1 e RAG2 e TdT), as proteínas envolvidas na transdução de sinal do TCR, a IL-7
fundamental na sinalização, os co-recetores CD4, CD8 e CD3, a pTα (cadeia α não rearranjada associada a cadeia
β já rearranjada nos DN3 e DN4), a Notch (para a via de sinalização mencionada anteriormente) e a Kit para
sinalização.

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Modelos propostos para determinação da linhagem CD4 ou CD8 no timo:

Os timócitos DP expressam CD4 e CD8 e


diferenciam-se para CD4 SP ou CD8 SP.
Aqui o que se pretende explicar é como
se determina qual a linhagem a seguir,
isto é, se DP se vai diferenciar em CD4 SP
ou em CD8 SP.

Isto ainda não se sabe ao certo, mas


existem 3 modelos propostos para
explicar a determinação da linhagem CD4
ou CD8 no timo:

• Instrutivo.
• Estocástico.
• Sinalização cinética.

No modelo instrutivo mostra-se uma


cTEC (célula epitelial tímica cortical, APC)
que se encontra a interagir com uma
célula que tanto expressa CD4 como CD8.
Consoante o MHC (I ou II) que a célula DP
interage, a diferenciação dá-se em CD8
ou CD4 SP. Isto é, se a célula DP interage
com o MHC I, então vai diferenciar-se em
CD8 SP com subsequente
downregulation de CD4, que acaba por
desaparecer. Se a célula DP interage com
MHC II, então vai diferenciar-se em CD4
SP, pelo que o co-recetor CD8
começa a deixar de ser expresso. Ou
seja, a diferenciação de DP para SP
depende de qual o MHC com quem
interatua. Consoante o MHC com
quem interatua, diferencia-se na
célula específica para esse mesmo MHC (MHC I – CD8 e MHC II – CD4). Não esquecer que a afinidade é
intermédia.

O modelo estocástico defende que este processo de escolha da linhagem é ao acaso. Ou seja, o timócito DP
faz aleatoriamente downregulation de um dos co-recetores (CD4 ou CD8), sendo que o co-recetor que
permanece expresso determina a linhagem SP. Adicionalmente, depende ainda se esse mesmo timócito após a
diminuição da expressão de um co-recetor, consegue encontrar um complexo MHC-péptido específicos para o
co-recetor expresso. Senão, sofre apoptose. Por exemplo, se há uma menor expressão aleatória de CD4, o
timócito que expressa maioritariamente CD8 tem de encontrar um complexo MHC I-antigénio para se
diferenciar totalmente em CD8 SP senão morre por apoptose. Por outro lado, se há uma menor expressão
random de CD8, o timócito que expressa relativamente mais CD4 deve encontrar um complexo MHC II-péptido
senão sofre morte celular programada.

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Por fim, no modelo de sinalização cinética o timócito DP, aquando da seleção positiva (MHC apresentado por
uma cTEC/APC), sofre uma downregulation de CD8 e uma permanência na expressão de CD4. Se este timócito
que expressa menos CD8 conseguir interagir com um complexo MHC I-péptido e na presença de IL-7
(compromete a linhagem CD8) na seleção, o sinal de downregulation via TCR é interrompido e o timócito DP
acaba por se diferenciar em CD8 SP. Se o timócito encontrar um complexo MHC II-péptido na seleção positiva
então o sinal de CD8 downregulation mantém-se e a célula diferencia-se em CD4 SP.

Sabe-se ainda que existem dois fatores de transcrição envolvidos na determinação da linhagem: o Runx3 e o
ThPOK:

• Runx3 – necessário para a diferenciação de CD8+:

- Ativa a expressão de CD8.

- Inibe a expressão de CD4 e de ThPOK.

- Essencial para a diferenciação em CD8 SP.

• ThPOK – necessário para a diferenciação de CD4+:

- Ativa a expressão de CD4.

- Inibe a expressão de CD8 e de Runx3.

- Essencial para a diferenciação em CD4 SP.

Quando existe knockout de Runx3, os timócitos não se diferenciam em CD8 SP e se houver um knockout de
ThPOK, os timócitos não se diferenciarão em CD4 SP.

Declínio da função tímica com a idade:

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Existe um declínio da função tímica com a idade. No painel (a) observa-se um timo de uma criança (exterior,
córtex, mais escuro, estados iniciais de diferenciação e interior, medula, mais clara, seleção positiva) onde se
vê que a maioria do tecido é linfoide (função tímica intacta). No painel (b) observa-se um timo de adulto onde
se vê claramente a redução do tecido linfoide, começando a aparecer espaços no timo.

Aos 20 anos cerca de 80% é tecido linfoide, ao passo que aos 40 anos esta percentagem reduz para 5%. O
tamanho do timo diminui com a idade.

Claro está que esse adulto de 40


anos ainda tem hematopoiese
ativa e ainda há migração de
células T para a periferia.

O primeiro grande decréscimo da


função tímica dá-se na puberdade.
Pensava-se antigamente que a
partir dos 40 anos o timo deixava
de funcionar, mas isso não é
verdade e mesmo aos 80 anos
ainda existe alguma atividade
tímica.

Portanto, existe redução da


atividade tímica com a idade, mas
mesmo aos 80 anos existe
manutenção de alguma atividade
tímica.

Antigamente, aquando de
cardiopatias severas em crianças existia a remoção total do timo. Agora tenta-se ao máximo manter o timo
(timectomia parcial), por causa da sua importância no sistema imunológico.

Importante: nos jovens a maioria dos timócitos encontram-se no estado DP e em indivíduos mais idosos a
população maioritária de timócitos é SP.

Relembre-se que quando se falou do rearranjo VJ da cadeia α, existe a deleção do locus δ (inserido no locus
α) que circulariza num DNA circular denominado de TREC. Estes TRECs são usados para avaliar a função tímica.
No gráfico observa-se o número de TRECs obtidos por μg de cDNA obtido de PMBCs (peripheral blood
mononuclear cell). Observa-se um decréscimo acentuado no número de TRECs, ou seja, uma diminuição abruta
da atividade tímica ao longo de 80 anos, apesar de que nessa idade ainda existe atividade tímica.

O mesmo conceito é observado no uso de citoqueratina que marca as TECs (células epiteliais tímicas), ou no
uso de CD1a que marca timócitos ou no us de Ki67 que marca células em fase ativa do ciclo celular. Em todos
estes casos observa-se marcação positiva, mesmo sendo um timo de uma mulher de 78 anos (há função tímica!).

A redução da expressão do fator Foxn1 pode ser causadora da redução do timo. Em ratinhos velhinhos, a
indução de Foxn1 pode reverter uma baixa atividade tímica (muita da hematopoiese é recuperada).

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Aula 13 – Ativação e diferenciação de Linfócitos T na periferia (I)

Papel dos linfócitos T na erradicação de infeções:

Os LT têm um papel preponderante na


resposta imunológica, nomeadamente na
erradicação de infeções.

Observa-se o papel dos linfócitos T CD4+


efetores (TH), neste caso, Th1 e Th17, na
periferia. Quando estas interagem com
APCs em contexto de MHC II que
apresentem péptidos resultantes da
ingestão e degradação de microrganismos
retidos em vesículas, as células T efetoras
produzem citocinas.

As citocinas produzidas pelas Th1 vão


permitir a ativação de macrófagos. Os
macrófagos ativados vão matar os
microrganismos ingeridos.

As citocinas produzidas pelas Th17


(secretam IL-17) permitem o recrutamento
de outras células que vão auxiliar na eliminação do
microrganismo.

Os linfócitos T CD8+ diferenciam-se em células T citotóxicas


(CTLs) cuja ação efetora é ativada em contexto de MHC I
apresentado por APCs. Estas apresentam-lhes péptidos
derivados de microrganismos que se replicam no citosol. Esta
interação do MHC I:péptido permite a ativação de CTLs que
matam as células infetadas (indução da morte celular por
apoptose).

& memory cells


Sequência de eventos no estabelecimento da resposta
imunológica mediada por linfócitos T CD4+:

Os LT CD4+ que foram diferenciados migram do timo para,


por exemplo, órgãos linfoides secundários (como os gânglios
linfáticos). Nestes gânglios linfáticos são ativados por APCs
(preponderantemente células dendríticas que migraram dos
locais de infeção via vasos linfáticos) que lhes apresentam
antigénios processados e derivados de microrganismos. As
células TCD 4+ vão proliferar e diferenciar-se em células T
efetoras (Th cells) e células de memória.

Estas células diferenciadas vão migrar para os locais de


infeção onde exibem a sua função, nomeadamente a ajudar

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a função microbicida de macrófagos ou o recrutamento de outras células do sistema imunológico via secreção
de quimiocinas e citocinas, em prol da erradicação dos agentes infeciosos.

Reconhecimento de antigénio e ativação de linfócitos T - iniciação de uma resposta imunológica adquirida:

Para a ativação de um linfócito T é


requerida a interação entre a célula
T naïve e a APC. A ativação eficiente
da célula T naïve requer sempre o
sinal 1 e do sinal 2:

• Sinal 1: Fornecido pela


sinalização via TCR (interação do TCR
com complexo MHC/péptido da
APC), co-recetor CD4 (MHC II) ou
CD8 (MHC I) com MHC e moléculas
de adesão. Relevante para a
iniciação da ativação de uma célula T
naïve e ativação de células T
efetoras.
• Sinal 2: Coestimulação.
Fornecido pela interações do recetor
CD28 na célula T naive com
moléculas coestimuladoras
expressas apenas pela APC
(exemplos: B7.1/CD80 e B7.2/CD86).
Aumenta a sobrevivência e a
proliferação de células que receberam o sinal 1. Este sinal
também pode ser fornecido por intermediário do ICOSL, expresso
pelas APCs, na sua interação com ICOS – recetores presentes na
superfície das células T.
• Sinal 3: Citocinas. Sinal que dita qual o tipo de diferenciação será adotado pelas células T ativadas
(exemplos: Th1, Th2, Th17).

Quando a célula T virgem recebe sinais via TCR (1) e sinais via moléculas coestimuladoras (2) vai induzir-se:

- Expressão de fatores de transcrição e de genes que induzem a proliferação destas células T.

- Expressão de citocinas, nomeadamente a IL-2, fundamental para a proliferação das células. Esta pode atuar
de forma autócrina (na própria célula T que a produz) ou parácrina (noutras células T).

Novamente, a ativação da célula T naïve requer sempre o sinal via TCR e da coestimulação. As células T
efetoras já só precisam do 1º sinal.

Note-se que as APCs (profissionais: células dendríticas, macrófagos e LB) são as únicas células que expressam
moléculas coestimuladoras, daí serem preferenciais para a ativação de linfócitos T CD8 em contexto de MHC de
classe I, ainda que estes possam ser ativados por outras células nucleadas, mas nunca com a mesma eficiência
(visto que não expressam CD28 e, portanto, não induzem o sinal 2 para uma maior proliferação de células T).

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Interações responsáveis pela ativação de células T:

Observa-se a interação
entre as células T e as APCs.

Na interação de T CD4+ e
APC, observa-se uma
molécula de MHC II expressa
na membrana da APC e que
apresenta o péptido
resultante de antigénios
extracelulares para proceder
à ativação desta célula T a interagir com o complexo CD3/TCR. Também se vê o co-recetor CD4 a interagir com
o MHC II. A interação de T CD8+ é semelhante, com a exceção da apresentação do antigénio/péptido
intracelular/citosólico no contexto da molécula de MHC I.

Observam-se ainda dois exemplos de moléculas de adesão das células T: CD2 (que interage com LFA-3 da APC)
e LFA-1 (que interage com ICAM-1 na APC).

Também se observa o tal 2º sinal (de coestimulação) muito importante dado a partir de moléculas
coestimuladoras dos LT naive (CD28), que interagem com CD80 (=B7.1) ou CD86 (=B7.2) da APC.

Após a célula T receber o sinal via TCR ocorre uma reorganização das moléculas na zona de contacto da célula
T com a APC (sinapse imunológica). Esta sinapse imunológica é constituída por duas regiões: a cSMAC (central
supramolecular activation complex) e o pSMAC (peripheral supramolecular activation complex):

141
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

• Na cSMAC, parte central da sinapse imunológica, estão localizados o complexo CD3/TCR e a molécula
de MHC:péptido, o co-recetor CD28 e o co-recetor específico do subset de LT (CD4 ou CD8).
• Na pSMAC, parte periférica da sinapse imunológica, encontram-se as moléculas de adesão
(importantes para haver uma eficiente interação entre o LT e a APC).

Observa-se ao
microscóprio a sinapse
imunológica
(essencialmente o cSMAC)
entre o LT naive e a APC
(célula dendrítica). Não se
observa na primeira figura,
mas existe ainda o pSMAC.

Novamente:

cSMAC:

- TCR/CD3 (liga-se a
MHC:péptido).

- Co-recetores CD4 ou CD8


(ligam-se ao MHC).

- Recetor de coe-estimulação
CD28 (interage com
CD80/B7.1 ou CD86/B7.2).

pSMAC:

- Moléculas de adesão.

- CD2 (interage com LFA-3).

- LFA-1 (interage com ICAM-1).

Ativação de Linfócitos T:

Iniciada pela interação do


complexo TCR-CD3 com péptidos
apresentados por moléculas de
MHC:

• CD8+ - MHC classe I


(antigénios citosólicos).
• CD4+ - MHC classe II
(antigénios extracelulares).

+ coestimulação (sinal 2)

+ citocinas (exemplo: IL-2)

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

É estimado que apenas uma célula em cada 105/106 células é específica para um péptido apresentado em
contexto de MHC pela célula dendrítica. Quando se dá esta interação e a célula T virgem reconhece o seu
péptido específico na molécula de MHC por uma APC (ativação), dá-se o processo de expansão clonal
(proliferação das células T específicas) e sua diferenciação em células efetoras. De seguida, dá-se a contração
da resposta (sua diminuição; o organismo regressa à homeostasia), mas subsistem algumas células específicas
para o antigénio, as de memória (caso o organismo volte a ser “atacado”, a resposta é mais rápida).

Em suma, inicia-se uma cascata de eventos bioquímicos que induz uma célula a entrar em fase ativa do ciclo
celular, proliferar e diferenciar-se em célula efetoras e de memória.

Sinalização via TCR:

As cadeias α e β do TCR possuem um pequeno domínio intracelular que não é suficiente para proceder à
sinalização, pelo que as moléculas de CD3 que expressam os ITAMs são fundamentais para a sinalização via TCR.

O sinal 1 ou o sinal via TCR transmite uma mensagem de iniciação da ativação da célula T. Observa-se desta
forma na figura esta sinalização detalhada.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Quando a célula T interage com o MHC:péptido da APC e com o auxílio do co-recetor de CD4 ou CD8, inicia-se
uma cascata de sinalização:

1. Ativação do cinase Lck que catalisa a reação de fosforilação de ITAMs.


2. Fosforilação dos resíduos de tirosina dos
motivos ITAMs (Immunoreceptor tyrosine-
based activation motif) do complexo CD3
pelo Lck.
3. Recrutamento do cinase ZAP-70 para os
ITAMs e fosforilação do cinase ZAP-70 pelo
Lck, ativando-o.

4. O cinase ZAP-70 ativado catalisa a reação de fosforilação das moléculas adaptadoras de LAT e SLP-76.
5. A fosforilação destas moléculas adaptadoras culmina na iniciação de duas outras vias de sinalização e
ativação de fatores de transcrição, nomeadamente:
a. Sinalização via (iniciada por) RAS-ERK: permite a ativação de AP-1.
b. Sinalização via (iniciada por) PLC-γ: permite a ativação do NF-κB e de NFAT.
6. A ativação destes fatores de transcrição permite a ativação de genes que regulam a sobrevivência das
células, proliferação das células T e aquisição da função efetora (diferenciação em função efetora).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Coestimulação é necessária
para a ativação de linfócitos T:

A coestimulação é
absolutamente necessária para a
ativação de linfócitos T virgens.
Esta necessidade foi mostrada
em experiências onde se usaram
Células T isoladas de PBMC
células mononucleares T
isoladas de sangue periférico
humano (PBMC). Na ausência de
APCs podem usar-se reagentes
que mimetizam o sinal que as
células T recebem via TCR e via
coestimulação. Adicionalmente,
o uso de anticorpos contra o
complexo CD3 mimetiza a
situação em que o TCR está a
interagir com o complexo
MHC:péptido e contra o CD28
induz na célula T um sinal de coestimulação (se interagisse com CD80/B7.1 ou CD86/B7.2). Por fim, o PMA é
outra forma de ativar as células T via TCR.

Ao observarem a quantidade de uridina tritiada (indicador de síntese de RNA), verificaram que a síntese de
RNA é bastante pronunciada quando tanto o sinal via TCR
como o sinal de coestimulação se encontram presentes
(situações de PMA + α-CD28 e α-CD3 + α-CD28). O par α-CD3 +
α-CD28 revela ser o que consegue ativar mais eficientemente
as células T.

Por outro lado, a quantidade de RNA é menor quando só o


sinal 1 ou o sinal 2 são induzidos (PMA, α-CD28 e α-CD3).
Observa-se que já existe alguma síntese de RNA na presença
de apenas anti-CD3, isto é, na
situação de sinal via TCR
meramente (sinal 1) pode-se
ativar células T. No entanto,
uma exposição de uma célula T
naive apenas a um sinal via TCR
(sem coestimulação), a ativação
não é eficiente, pois pode
originar anergia nesta célula. É
garantido que ambos os sinais são necessários!

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Em relação às moléculas
coestimuladoras, existem o
CD28 (mais importante) e o
ICOS.

A primeira interage com


CD80 (=B7.1) ou com CD86
(=B7.2) expressas nas APCs
profissionais, que permite a
ativação de células T virgens.

A ICOS-L é expressa na
superfície de algumas APCs como LB (e até mesmo algumas células T) e interage com o ICOS do LT. Esta interação
é importante para a manutenção da atividade de células T diferenciadas (quando já são efetoras) e para a
interação células B-T nos centros germinativos (nos gânglios linfáticos ou no baço quando as células B estão a
sofrer o processo de hipermutação somática).

A célula T recebe sinais positivos quando interage


com uma APC via TCR (sinal 1) e quando o seu CD28
interage com a CD80 ou CD86 da APC, isto é, por
coestimulação (sinal 2). Ora, quando a célula T virgem
recebe o sinal via TCR e este é eficiente, passa a ser uma
célula T ativada e passa a expressar uma molécula à
superfície da célula, designada de CTLA-4 ou CD152.

O CTLA-4 (expresso 2 dias depois da ativação da célula T) é capaz


de ligar com maior avidez às moléculas coestimuladoras na
superfície das APCs (as CD80 e CD86) do que a CD28. Assim, esta
interação CTLA-4 com moléculas coestimuladoras B7.1 e B7.2 leva
à transmissão de um sinal negativo para a célula T. Isto é, é um
regulador da fase proliferativa das células T (reduzindo a extensão
da resposta imunológica).

Por outras palavras, as células T naïve expressam CD28 que, por


interação com moléculas coestimuladoras presentes em APCs (B7.1
e B7.2), promove a sobrevivência e expansão das células T. As
células T ativadas expressam níveis aumentados de CTLA4 (CD152)
que possui uma maior afinidade para moléculas de B7.1 e B7.2,
fornecendo um sinal inibitório à célula T ativada. CTLA4 serve assim
como um regulador da fase proliferativa das células T. Depois de
ativada, a célula T reduz a sua necessidade de coestimulação.

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Células T efetoras podem ser ativadas na ausência de sinal 2:

Para a ativação de uma célula T naive tem de existir sempre o sinal 1 e 2 (via TCR e via coestimulação,
respetivamente), mas quando a célula T já se diferenciou/adquiriu função efetora esta torna-se menos
dependente de coestimulação para exercer a sua função.

A célula dendrítica apresenta um péptido viral a uma célula T CD8 em contexto de MHC I, ativando-a. E aqui
observa-se a presença de CD28 (sinal 2, de coestimulação). Entretanto, esta célula diferencia-se em célula T
citotóxica que, na ausência de coestimulação, consegue via TCR reconhecer péptidos virais em células epiteliais
infetadas (via MHC I) e levar à libertação de grânulos citotóxicos para induzir a apoptose da célula.

Assim, para ativação de uma célula T naive são sempre precisos os dois sinais, mas para a célula T exercer a
sua função o reconhecimento do complexo MHC:péptido (sinal 1) é suficiente. Isto garante que quaisquer
péptidos citosólicos que são apresentados a moléculas de MHC classe I e expressos em todo o corpo vindos das
células infetadas que sintetizaram esses péptidos, possam ativar “diretamente” (apenas sinal 1) células T
citotóxicas e estas levarem à morte das células infetadas, não necessitando de CD28 ou outros coestimuladores
(apenas presentes em APCs).

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O sinal 1 é sempre necessário! E basta este para ativar células T efetoras.

Papel dos Recetores de “coinibição”:

- Papel importante na manutenção da tolerância na periferia.

- Ajudam a reduzir a inflamação no curso natural de uma infeção e durante infeções crónicas.

A expressão de CTLA-4 é induzida aquando da ativação dos LT naive via sinal TCR (sinal 1) que envia um sinal
negativo à célula (pois liga-se com maior avidez às moléculas de coestimulação, B7.1/CD80 e B7.2/CD86, do que
o CD28).

Existem outros recetores de coinibição expressos pelas células T, nomeadamente PD-1 (programmed death 1)
que se liga aos ligandos PD-L1 e PD-L2 expressos pelas APCs profissionais, algumas células B e T e ainda células
tumorais.

Tanto a sinalização via CTLA-4 como a via PD-1 levam a regulação negativa/inibição da resposta imunológica.

O ipilimumab é um
anticorpo usado contra
CTLA-4, bloqueando-a e
impedindo que esta interaja
com moléculas
coestimuladoras expressas à
superfície da APC. Assim,
este anticorpo impede que
seja dado um sinal negativo
à célula T, permitindo a sua
ativação (e maior
proliferação), sendo usado
como terapia antitumoral
em doentes em fases de
cancro muito avançadas.

Relembre-se que a
ativação de um LT naive
requer uma ativação via TCR

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

e via moléculas coestimuladoras (sinais 1 e 2) e que o CTLA-4 ao interagir com moléculas CD28 apresentadas à
superfície das APCs (células apresentadoras de antigénios) leva à inibição da célula T transmitindo-lhe um sinal
negativo, reduzindo a sua proliferação e extensão da resposta imunológica, consequentemente.

O uso de anticorpos que bloqueiem moléculas co-inibidoras como o CTLA-4 ou o PD-1 (como o ipilimumab),
fazem com que não haja este sinal inibitório nas células T, pelo que estas podem eliminar com maior eficiências
células tumorais.

Sinais que induzem anergia:

Ausência de coestimulação

Sinais inibitórios

Para a ativação de uma célula T naive são sempre necessários os sinais via TCR e de coestimulação.

Quando uma célula T (CD8) virgem interage com uma célula não-APC profissional (isto é, não é apresentadora
de antigénio profissional pelo que não expressa moléculas coestimuladoras, CD80 ou CD86, e não expressa MHC
II, apenas MHC I) e reconhece o seu complexo MHC I:péptido, a ativação do LT CD8 é ineficiente. Isto é, a célula
T CD8 fica anergizada.

Uma célula T CD8 anergizada é uma célula que não prolifera e que não exibe todas as características de uma
célula efetora/citotóxica, como o facto de não produzir citocinas.

Estas células anérgicas também podem ser geradas quando a célula recebe fortes sinais fornecidos pelas
moléculas co-inibidoras como a CTLA-4 ou a PD-1.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Em suma, sinais que induzem anergia de uma célula T são quando esta é ativada via TCR na ausência de
coestimulação ou na presença excessiva de co-inibidores.

A indução de anergia pode ser importante na manutenção da tolerância na periferia, isto é, para a célula T
CD8 não ficar com função efetora e acabar por “atacar” o próprio organismo. Por exemplo, no caso (b) uma
célula β pancreática (produtora de insulina) não vai ativar a célula T CD8 eficientemente para esta não ficar
citotóxica e poder atacar as próprias células do pâncreas (mecanismo de controlo da ativação de LT
autorreativos na periferia).

Isto é, células estimuladas com anti-CD3 até podem sobreviver durante algum tempo, mas acabam por
anergizar (nem mesmo voltando a estimulá-las via TCR).

Uma nota importante a ativação de LT CD8 por outras células que não as APCs

O que foi sempre dito é que todas as células nucleadas expressam MHC classe I e assim podem apresentar
antigénios a LT CD8. A questão é que, na realidade, para haver ativação eficiente de células T naive é
necessário sinalização via TCR, providenciada por interação com péptidos apresentados no contexto de MHC
I e coestimulação (sinal 2) providenciada pela interação de moléculas B7 nas APCs com o CD28 nas CD8. Sendo
assim, as células nucleadas apesar de expressarem MHC I, não expressando moléculas coestimuladoras, não
conseguem induzir a ativação eficiente de LT CD8+.

Foi também dito que qualquer célula nucleada pode ativar linfócitos T CD8 citotóxicos, desde que apresentem
o péptido específico destas células em MHC I (por exemplo, no caso das células infetadas por vírus). Isto
porque a ativação da função citotóxica de CTLs (como de outras células efetoras) é apenas dependente de
sinal 1.

Assim, qualquer célula nucleada pode em potência ativar CTLs (sempre dependente de apresentação do
péptido específico) mas não induzir diferenciação das mesmas a partir de células CD8 naive.

Uma nota importante anergia e moléculas co-inibidoras (CTLA-4 e PD-1)

A anergia é induzida por ativação de células T via TCR na ausência de coestimulação (uma célula anérgica não
responde ao ser estimulada via TCR). Não se sabe bem o que acontece a estas células, estas podem acabar
por morrer ou contribuírem para a tolerância periférica.

O CTLA-4 e o PD-1 são importantes para o controlo da extensão da resposta imunológica. A sua ligação na
célula T induz um sinal inibitório. Note-se que as células T reguladoras são a única população T que expressa
CTLA-4 constitutivamente na sua superfície.

É possível induzir anergia com estas moléculas co-inibidoras em células T naive, pois quando esta é ativada a
expressão destas moléculas já é regulada. Quando a T naive é ativada (apresentação de antigénio por APC),
passa a expressar CTLA-4 e PD-1 (transmitem um sinal negativo à célula) que competem com moléculas co-
estimuladoras (CD28).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Aula 14 – Ativação e diferenciação de Linfócitos T na periferia (II)

Células apresentadoras de antigénio (APCs) profissionais:

A ativação de uma célula T naive necessita de dois sinais: um via TCR e outro via coestimulação. Ambos são
garantidos pelas moléculas apresentadas à superfície de uma APC profissional, onde o complexo MHC:péptido
(péptido resultante do processamento antigénico) interage com o TCR do LT e as moléculas CD80/CD86
interagem com a CD28 (coestimuladora) do LT. Além destas, existem ainda moléculas de adesão essenciais para
que se garanta a interação. Note-se ainda que as células T efetoras só necessitam do sinal via TCR (sinal 1).

As células apresentadoras de antigénio profissionais expressam à sua superfície moléculas de MHC I e MHC II.
As profissionais são as células dendríticas (principais na ativação de células T), os macrófagos (importantes na
ativação de células T nos tecidos) e os linfócitos B.

Estas APCs exibem características específicas que as fazem denominar de “APCs profissionais”:

- Células dendríticas/DCs e macrófagos:

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

• São células fagocíticas.


• São células que expressam recetores para células apoptóticas, DAMPs (danger-associated molecular
patterns) e PAMPs (pathogen-associated molecular patterns). Reconhecem padrões de microrganismos ou
produtos resultantes de danos expressos à superfície de células do sistema imune inato essencialmente (e de
linfócitos B do sistema imune adquirido). As DCs são a população que expressa mais (e em maior diversidade)
recetores relacionados com a imunidade inata.
• São células que se localizam nos tecidos. As DCs que se encontram no local de infeção conseguem
fagocitar o patogénio, migrar para os gânglios linfáticos e fazer a apresentação de péptidos derivados de
antigénios desse microrganismo a linfócitos T.
• São células que se localizam na T cell zone dos gânglios linfáticos (ativação de LT por DCs), estruturas
altamente organizadas de tal forma que as células T se encontram na região do paracórtex.
• São células que expressam constitutivamente elevados níveis de MHC classe II e toda a maquinaria
para o processamento antigénico. (Também expressam, como quaisquer células nucleadas, MHC I)
• São células que expressam moléculas coestimuladoras após a ativação.
• Principalmente no caso das DCs existe uma elevada variedade de subgrupos, algumas migram, outras
são residentes, algumas são melhores a fazer apresentação cruzada (quase exclusivo de DCs, onde péptidos
derivados de antigénios extracelulares podem ser apresentados a LT CD8 em contexto de MHC I; usualmente
reconheceriam péptidos citosólicos de microrganismos que se replicam no citoplasma como os vírus e algumas
bactérias).
• Há subtipos diferentes que podem ser especializados em ativar diferentes tipos de células T.

- Linfócitos B:

• Têm a capacidade de internalizar antigénios via BCR (recetor de antigénios de células B).
• Expressam constitutivamente moléculas de MHC classe II e toda a maquinaria de processamento
antigénico (conseguem apresentar antigénios a LT CD4). (Também expressam, como quaisquer células
nucleadas, MHC I)
• Expressam moléculas coestimuladoras após a ativação (induzem eficientemente a ativação de células
T).

As células dendríticas são as mais usuais e as principais APCs.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Expressão de moléculas
após ativação de células
T:

Quando se dá a
interação eficiente célula
T <-> APC (sinais 1 e 2)
dão-se alguns
acontecimentos.
Imediatamente, começa
a existir a expressão de um fator de
transcrição c-Fos cuja expressão é
maior após 1 h e meia da interação se
ter dado.

Algumas horas após o pico de


expressão do c-Fos, mais ou menos 12
horas depois da interação, começa a
existir a existir a libertação de IL-2
(fundamental para suster a proliferação
eficiente de células T) e a expressão de
CD69, também designado de early
activation marker, pois é o primeiro
marcador que as células T expressam
quando são ativadas. Esta molécula
também possui a capacidade de induzir
a retenção das células T nos gânglios
linfáticos.

Após 24 h
(um dia) da
interação começa a haver níveis elevados de CD25 (IL-2R), recetor α da interleucina
2 (para a proliferação dos LT). Este CD25 (cadeia α do recetor de interleucina 2) e
conjuntamente com a cadeia β e γC do recetor da IL-2 formam o high affinity IL-2
receptor.

Entre as 24 e as 48 h (1 a 2 dias) a célula T, após a ativação eficiente, começa a


expressar o ligando de CD40 (importante para uma eficiente função pelas células T
CD4 efetoras e amplificação da função efetora das mesmas, resposta T e função
eficiente das APCs por parte do CD40 nestas expressa). Adicionalmente 1 a 2 dias
após a ativação, é expresso CTLA-4 (inibidora da ativação dos LT) necessária para o
controlo da resposta imunológica.

O pico da divisão das células T ocorre aproximadamente após 3 dias da


ativação/interação.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Papel do CD40 na ativação dos linfócitos T:

A célula T interage com uma célula apresentadora de antigénio, usualmente células dendríticas e recebe sinal
via TCR e CD28 (com ou sem coestimulação com CD80/B7.1 ou CD86/B7.2). Após 24 h (1 dia) desta interação a
célula passa a expressar níveis elevados do ligando CD40 que interage com o recetor de CD40 expresso à
superfície da APC/DC. Este sinal que a DC/APC recebe via CD40 é crucial para a ativação da própria célula
apresentadora de antigénio. Assim, a DC passa a expressar níveis mais elevados de moléculas B7 (aumentando
a coestimulação) e há a indução de secreção de citocinas que auxiliam na ativação e proliferação de células T
efetoras (amplificação da função efetora).

A interação do ligando CD40 expresso na célula T com o recetor de CD40 expresso na APC é essencial para o
licensing of APC (envolvido em vários processos inclusivamente na diferenciação de T CD8 em células
citotóxicas).

Regulação da expressão do recetor da IL-2:

O CD25 é o recetor da cadeia α da interleucina 2


Após ativação eficiente por parte das APCs (com
coestimulação e sinal via TCR) da célula T, a célula
T naive, no entanto, expressa apenas 2 cadeias do
recetor de IL-2: a β e a γC (common gamma chain,
também existente na IL-7). Este recetor é
suficiente para as células responderem a IL-2 –
intermediate affinity IL-2 receptor (complexo IL-
2RβγC, afinidade intermédia para IL-2, maior
constante de dissociação, Kd) – levando à
produção e secreção de IL-2 (ainda que não níveis
muito elevados).

A IL-2 permite que os LT passem a expressar


CD25, recetor α da IL-2. Assim, às cadeias α, β e γC
juntas (complexo IL-2RαβγC) complexadas
designa-se de high affinity IL-2 receptor (afinidade
elevada para a IL-2, menor Kd – consegue competir

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

e “ganhar” em situações de baixas quantidades de IL-2). Assim, a expressão deste recetor α


leva a uma produção mais eficiente de IL-2 e uma proliferação mais eficiente de células T em
resposta à interleucina 2 (em si
mesma, de uma forma
autócrina). A IL-2 é
maioritariamente produzida
por células T em ciclo celular,
em divisão para induzir
proliferação (as células T são
altamente dependentes de IL-
2). Quando começa a
proliferar, começa a produzir
mais. [nota: as células T
reguladoras não conseguem
produzir IL-2, mas são
altamente dependentes da
mesma produzida por estas
células T].

Atividade biológica da IL-2:

A IL-2 é importante para:

• A proliferação e diferenciação de células T efetoras e células T de memória.


• Proliferação/sobrevivência e manutenção das células T reguladoras.

A maioria das células TREG expressa CD25 e juntamente com as cadeias β e γC expressam o
high affinity receptor. Estas células T reguladoras são
muito eficientes em competir pela IL-2.

Ativação e diferenciação de células T naïve em células efetoras e de


memória:

As células T podem diferenciar-se em células T efetoras ou células de


memória (estas últimas em menor número, mas sobrevivem mais tempo =>
demonstra a eficiência da vacinação), onde a IL-2 possui um papel
primordial.

Após a tal ativação, dá-se a diferenciação da célula T naive em célula T de


memória estaminal (são células de memória com potencial de self-
renewal/autorrenovação elevado), que mais tarde se diferencia numa célula
T de memória central. Estas diferenciam-se em células T de memória
efetoras que, por fim, se diferenciam em células T efetoras. Isto é, as células
T efetoras são uma diferenciação terminal das células de memória, sem
potencial de autorrenovação (este potencial vai diminuindo ao longo da
diferenciação). Este é o modelo mais consensual, pois existem outros.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Diferenciação de funções efetoras:

Relembrar que a célula T necessita dos sinais 1 e 2 para ficar ativada. Agora, vai detalhar-se o sinal 3, das
citocinas, imprescindível para a diferenciação do LT (para a adoção da sua função efetora).

Que tipo de resposta imunológica deve ser induzida para eliminar?

A importância da diferenciação
das células T recai sobre o facto de
que cada tipo de microrganismo
ou células tumorais possui um
subtipo de célula efetora
apropriado para a sua eliminação.

Isto é, cada subtipo de célula T


efetora auxiliar (T CD4
diferenciadas) é específico para
cada microrganismo ou célula a
eliminar. Assim, isto justifica que a
diversidade de células T efetoras,
nomeadamente CD4 auxiliares,
seja muito elevada. A variedade é
imensa!

Diferenciação de subsets de células T CD4 auxiliares:

A célula T naive CD4+ interage com


uma APC em contexto de MHC
II:péptido cujo péptido pode provir de
patogéneos, alergénios (as reações
alérgicas advém do facto de que uma
célula T não reconhece um antigénio
como inócuo), antigénios presentes
na comida, toxinas, entre outros e
levar à ativação posterior desta célula
que vai adquirir uma dada função
(efetora). De notar que todas estas
células receberam sinais 1 e 2, mas é
o sinal 3 de citocinas que vai levar à
sua distinção (só é necessário saber
alguns subsets):

• TH17: além dos sinais 1 e 2, a


célula T recebe sinais via IL-6, IL-23 e
TGF-β (citocinas; a IL-6 e a TGF-β são
essenciais; a IL-23 ajuda) que vão
levar a que a célula T naive comece a
expressar um fator de transcrição
denominado de RORγt para se

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

diferenciar numa célula designada de auxiliar/efetora 17. Esta célula produz IL-17A, IL-17F e IL-22. Estas células
possuem um papel muito importante no combate a agentes patogénios extracelulares (algumas bactérias e
fungos) nas mucuosas. Um mau funcionamento destas células gera autoimunidade e inflamações nos tecidos.
• TH2: na presença de IL-4, a célula T naive induz a expressão do fator de transcrição GATA3, pelo que
se diferencia numa célula T auxiliar 2. Estas células produzem as citocinas IL-4, IL-5 e IL-13. Esta célula possui
um papel muito importante na resposta imunológica contra infeções por helmintas e na ativação de eosinófilos.
Uma desregulação destas células está associada ao desenvolvimento de alergias. [anti-inflamatórias]
• TH1: a diferenciação de uma célula T naive numa célula T efetora/auxiliar 1 são necessárias as citocinas
IL-12 (é a fundamental/suficiente), IFN-γ e IL-18. Esta célula expressa o fator de transcrição T-Bet (ou TBX21)
para a sua identidade celular. Estas células têm a capacidade produzir IFN-γ e TNF e têm um papel
preponderante no combate a microrganismos intracelulares e ativam a função microbicida dos macrófagos.
Uma desregulação nas TH1 leva a inflamação nos tecidos (células pró-inflamatórias).

As células TH1 são as mais pró-inflamatórias, seguidas das TH17 e as anti-inflamatórias são as células TH2.

• TFH (células T auxiliares foliculares): estas células diferenciam-se na presença de IL-6 e IL-21,
produzindo IL-21 e IL-4. A garantia da identidade destas células é dada pelo fator de transcrição Bcl-6 e são
células relacionadas com a regulação da maturação das células B nos centros germinativos localizados nos
gânglios linfáticos (células muito importantes no processo de maturação no processo de maturação dos LB).
• Células T reguladoras (TREG) na periferia: para a diferenciação a partir das células T naive é necessário
estarem presentes IL-2 e TGF-β (ambas essenciais) e a expressão do fator de transcrição FoxP3. São células que
produzem IL-10 e TGF-β (citocinas efetoras imunossupressoras). São supressores de respostas imunes e a sua
desregulação implica uma inibição de respostas antitumorais. São células importantes no desenvolvimento da
autoimunidade, porque impedem a atividade de células autorreativas. Estas células não são consideradas
células T auxiliares, mas estão no esquema porque são células T CD4+.

Os fatores de transcrição mencionados são obviamente os principais (master transcriptional regulator).


Existem mais, mas esses são os que conferem a identidade à célula T efetora respetiva. Existem outros subsets
como as TH9 e as TH22 que não vão ser abordados.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Funções de células efetoras Th1:

As Th1 diferenciam-se com IL-12 (sempre além do sinal via TCR e


coestimulação) e produzem IFN-γ (interferão gama). O seu master
transcriptional regulator é o T-bet.

Observa-se na figura um macrófago (APC) que internalizou uma


bactéria extracelular em fagolisossoma, pelo que vai existir a
apresentação de péptidos derivados de antigénios à célula T naive,
que se diferencia em Th1. Esta Th1 como produz IFN-γ, ao encontrar-
se com outro macrófago infetado com a mesma bactéria permite
que este aumente a sua atividade/capacidade microbicida,
ativando-o.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Ativação de macrófagos por células efetoras


Th1:

Observa-se a interação da célula Th1 que


produz IFN-γ com o macrófago infetado que
possui um recetor para esta citocina. O
macrófago, que expressa o IFN-γ receptor, ao
receber citocinas de Th1 responde:

- Produzindo espécies reativas de oxigénio


(ROS) e óxido nítrico (NO) para matar os
microrganismos presentes nos fagolisossomas
(atividade microbicida)

- Produzindo citocinas como o TNF, IL-1 e IL-12


e quimiocinas. TNF, IL-1 e quimiocinas para
recrutamento de células do sistema imunológico
(leucócitos) e IL-12 é importante na diferenciação
de células Th1 e na produção de IFN-γ.

- Aumentando os níveis de expressão de


moléculas coestimuladoras B7 e de moléculas de
MHC à superfície do macrófago para
amplificação da resposta da célula T.

Funções de células efetoras Th2:

O master transcriptional regulator das células Th2 é o


GATA3 e estas células diferenciam-se na presença de IL-
4 e produzem elas mesmo IL-4. Produzem ainda IL-5 e IL-
13.

A IL-4 é fundamental para ativar células B, isto é, para


induzir a diferenciação destas em plasmócitos e
subsequente produção e secreção do isotipo de
imunoglobulina IgE, que é importante para promover a
desgranulação de mastócitos.

A IL-4 e a IL-13 produzidas pela Th2 também têm a


capacidade de aumentar a produção de muco na
mucuosa intestinal e a peristalse (para expulsão de
vermes).

A IL-5 produzida pelas Th2 é essencial na ativação de


eosinófilos que são críticos na defesa contra helmintas.

As células Tfh são muito importantes na ativação de LB


nos centros germinativos.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Via clássica e alternativa de ativação de


macrófagos:

A atividade microbicida anteriormente referida


é característica dos macrófagos designados de
M1, que são ativados a partir de monócitos
numa via denominada de via clássica por
ligandos de recetores toll (TLR) e IFN-γ
(providenciado por Th1). A ativação destes M1
leva ao aumento da produção de ROS, NO e
enzimas lisossomais (que levam à morte dos
microrganismos nas vesículas) e à produção de
citocinas pró-inflamatórias (ajudam no processo
inflamatório – IL-1, IL-12, IL23 e quimiocinas).

Existe um outro subset de macrófagos que são


ativados a partir dos monócitos na presença de
outras citocinas (imunossupressoras), IL-13 e IL-
4 (providenciados por Th2), que são os M2,
numa via denominada de via alternativa. Estes
macrófagos conseguem secretar IL-10 e TGF-β –
citocinas imunossupressoras – que são as
mesmas citocinas produzidas pelas TREG
(citocinas anti-inflamatórias, inibindo o processo
de inflamação, que é o oposto dos M1). Auxiliam
ainda o processo de reparação de tecidos e fibrose (para acalmarem a
resposta imunológica estabelecida).

Espera-se que o seu efeito (de M2) se faça sentir após se sentir o efeito de
M1. Assim:

• M1 => promovem a inflamação.


• M2 => inibem a inflamação.

Papel das células TFH (T auxiliares foliculares) na resposta imunológica:

As células Tfh podem produzir citocinas como a IL-4 e a IL-21 que são
essenciais para induzir a proliferação dos linfócitos B nos centros
germinativos, para ajudar na mudança da classe das Ig e no ganho de
afinidade das Ig para o antigénio (hipermutação somática). São ainda
importantes para induzir a diferenciação dos LB em plasmócitos, células
produtoras de anticorpos.

Neste caso o péptido apresentado resultava de um vírus, pelo que os


plasmócitos resultantes da ativação pelas células Tfh conseguem produzir
anticorpos neutralizantes contra estes vírus.

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Funções de células efetoras Th17:

As Th17 necessitam de TGF-β e IL-6 (eventualmente IL-23) para


a sua diferenciação. Produzem IL-17 e IL-22.

A IL-17 possui um papel importante ao atuar em leucócitos e


células que estão nos tecidos. Induz a produção de quimiocinas,
citosinas como o TNF, IL-1 e IL-6 para recrutamento de
neutrófilos para o local de infeção. A interleucina 17 induz ainda
a produção de péptidos antimicrobianos, importantes na defesa
contra microrganismos que infetam as mucuosas.

A IL-22 possui uma função semelhante, pois nas células dos


tecidos também induz a síntese de péptidos antimicrobianos e
aumentam a função da barreira epitelial, impedindo a
translocação dos microrganismos do lúmen/exterior para o
interior do organismo (exemplo: tubo digestivo).

Indução e fase efetora da resposta imunológica mediada por


linfócitos T CD8+:

As células T CD8 possuem um processo de


ativação semelhante ao das T CD4. Observa-se
um gânglio linfático, onde as células T CD8 se
encontram na zona T dos gânglios linfáticos. A
APC/DC captura antigénios do microrganismo
no local de infeção, migra para os gânglios
linfáticos e apresenta péptidos derivados desses
antigénios em contexto de MHC I aos LT CD8.
Claro está que o sinal via TCR e coestimulação
são imprescindíveis para a diferenciação destas
células.

As células T CD8 diferenciadas normalmente


são células T citotóxicas (CTLs), apesar de que
existam outros subsets de células T CD8 que
produzem citocinas. Isto é, na maioria das vezes
um LT CD8 diferencia-se em CTL, mas pode
diferenciar-se noutro subtipo, ainda que menos
frequentemente.

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Quando se diferenciam em CTLs, estas entram em circulação, migram para o local onde foi recolhido o
antigéno pelas APCs, sejam estes locais de infeção, de crescimento de um tumor ou um local onde está a ocorrer
a rejeição de um enxerto.

A resposta final à célula-alvo que expressa os antigénios processados em péptidos reconhecidos pelo TCR dos
LT CD8 é sempre morte celular. Isto é, a CTL induz sempre a apoptose na célula causadora de infeção.

Papel das células T auxiliares na


diferenciação de linfócitos T CD8+:

Para a ativação dos LT CD8, o papel


das células T auxiliares é muito
importante, nomeadamente da Th1.

Há duas formas pelas quais Th1


pode ajudar na diferenciação dos LT
CD8:

(A) Uma APC está a apresentar um


antigénio específico à célula Th1 e à
célula TCD8 (que está em processo
de diferenciação). A célula Th1 pode
produzir citocinas como a IL-2 que
vão ajudar na proliferação e diferenciação dos LT CD8

(B) APC Licensing: as células Th1 pela sinalização via CD40 produzem citocinas que garantem o licenciamento
da APC, isto é, expressa mais moléculas
coestimuladoras sendo mais capaz de
ativar LT CD8 (em CTLs).

“Licenciamento” das APC e ativação


dos linfócitos CD8+:

A ativação de uma célula T CD8 por uma APC que não foi licenciada (não recebeu ajuda de uma célula auxiliar,
Th1) resulta em:

- Diferenciação ineficiente das CTLs e sua função;

- As células T CD8 possuem um tempo de vida curto, pois existe uma falha na expressão de moléculas anti-
apoptóticas;

- Estabelecimento de células T CD8 de memória ineficaz.

As células T auxiliares, Th1, são essenciais assim para a diferenciação de T CD8 em CTLs.

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Eventos para indução de lise das células alvo por CTLs:

Aqui representa-se como uma CTL mata uma célula alvo. Representa-
se a sinapse imunológica estabelecida, isto é, a zona de contacto entre
a célula T CD8 citotóxica (já ativada, já lhe foi apresentada um antigénio)
e a célula alvo. Mesmo que essa ativação tenha acontecido (sinais via
TCR e coestimulação), para ocorrer a interação CTL <-> célula alvo tem
de existir sempre o sinal 1, via TCR. Isto para reconhecer o péptido
apresentado em contexto de MHC I e co-recetor CD8, com o auxílio das
moléculas de adesão.

As CTLs vão libertar grânulos que vão entrar na célula alvo e induzir a
apoptose por, por exemplo, ativação de caspases. A célula T citotóxica
“desliga-se” e pode ir matar outras células alvo (que expressem o
mesmo péptido ou um semelhante).

Mecanismos utilizados pelas CTL para indução de apoptose das


células alvo:

As células T
citotóxicas podem
induzir a morte
das células alvo
por dois
mecanismos
recorrendo a:

• Grânulos com perforinas e granzimas


(desgranulação): as perforinas constituintes dos grânulos
são libertadas na sinapse imunológica e fazem um poro na
célula alvo e os granzimas que são enzimas libertados no
citoplasma das células alvo que ativam caspases para
indução de apoptose das células alvo.
• Fas/FasL: a apoptose da célula alvo também pode ser
conseguida via interação do ligando de Fas (expresso pela
CTL) com o recetor de Fas (expresso na superfície da célula
alvo) que ativa uma cascata de sinalização que ativa
caspases na célula alvo e que induz a sua morte celular
programada. [não mediada por grânulos, não tem de
haver desgranulação]

Existem 3 fatores de transcrição muito importantes para a função das células T citotóxicas e são estes:

• T-bet (tal como na TH1).


• Eomes.
• Blimp-1.

Não esquecer que existe sempre um péptido específico (cognate peptide) e um reconhecimento específico
(cognate recognition) para haver a morte da célula alvo.

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Modelos para desenvolvimento de subsets T de memória:

Foi mostrado um modelo para o desenvolvimento de subtipos de células T de memória, mas existem mais:

O modelo linear refere que provém de células efetoras, o modelo assimétrico refere que as células ativadas
se diferenciam em células efetoras e as “distais” (“ao lado”) em células de memória e o modelo simultâneo que
refere que existem subsets de células T auxiliares específicos que darão origem a células T efetoras e memória.

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Aula 15 – Desenvolvimento de Linfócitos B (I)

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Em muitos vertebrados (ratinho e humanos), após o nascimento, os linfócitos B (LB) desenvolvem-se na


medula óssea (diferenciação). A hematopoiese durante o período fetal dá-se no fígado e no baço, mas em
humanos após o nascimento esta dá-se na medula.

Fases de desenvolvimento B:

• Os progenitores rearranjam primeiro a cadeia pesada e depois a cadeia leve das imunoglobulinas (para
expressão do BCR à superfície que confere identidade aos LB e geração de diversidade).
• Após a expressão do BCR ocorre um processo de tolerância central onde há eliminação de células
autorreativas.
• Os LB imaturos que não reconheçam antigénios da medula e que expressam IgM deixam a medula =>
Migram para o baço => Onde ocorre o processo de maturação (T1 => T2 => LB maturo). T = transitional
• LB maturo deixa o baço (expressão de IgM e IgD) => migração para os folículos linfoides. Nos folículos
linfoides ocorre o encontro com antigénios nos centros germinativos => Ocorre a proliferação,
hipermutação somática e mudança de classe (mudança de isotipo).

Diferenciação de células B:

A diferenciação de LB ocorre na medula óssea, a partir de precursores imaturos:

O desenvolvimento inicia-se a partir das células estaminais hematopoiéticas que se diferenciam nas linhagens
mieloide ou linfoide. Aqui, diferencia-se num precursor linfoide e que se desenvolve em pró-B. Estas são as
primeiras células da linhagem B e estão já absolutamente comprometidas nesta mesma linhagem, isto é, é a
partir destas células que se dá o comprometimento da linhagem B.

Nas pró-B ocorre o rearranjo da cadeia pesada das Ig. Estas células diferenciam-se nas células pré-B que já
expressa à superfície um pré-BCR que dá um sinal à célula para iniciar o rearranjo da cadeia leve. De seguida, à
diferenciação numa célula B imatura já existe a expressão de um BCR completamente rearranjado (cadeia
pesada e cadeia leve rearranjadas), uma IgM. Ainda neste estado dá-se o processo de tolerância central, em

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

que as células autorreativas são eliminadas. As células que escapam a este processo migram para o baço onde
ocorre o processo de maturação. Aqui estas células diferenciam-se primeiro em T1, depois em T2 e, por fim, em
LB maturos. Os LB maturos expressam à superfície IgM e IgD.

HSC (Hematopoietic stem cell)


CLP (common lymphoid precursor)
MPP (Multipotent progenitor)
LMPP (Lymphoid-primed multipotent progenitor cell)
ELP (Early lymphoid progenitor cell)

Estadios de desenvolvimento B na medula:

O processo inicia-se na medula pelas células estaminais hematopoiéticas (HSC) que se diferenciam em
progenitores que garantem o comprometimento na linhagem linfoide e com cada vez menor capacidade de
autorrenovação (MPP => LMPP => ELP). Por fim, chegam aos CLP e este vai dar origem a um estado pré-pró-B
(muito imaturo) que acaba por se diferenciar em pró-B. Nestas existem duas fases e/ou dois estados de
diferenciação, sendo o mais imaturo designado de early e o mais maturo de late.

Nas early pró-B inicia-se o rearranjo da cadeia pesada, primeiramente o rearranjo DJ e depois o VDJ.
Entretanto, diferencia-se passando a designar-se de late pró-B finaliza-se o rearranjo VDJ e a cadeia pesada fica
totalmente rearranjada.

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De seguida, existe a diferenciação em pré-B e nesta a cadeia pesada rearranjada é expressa com uma
surrogate light chain (uma cadeia leve não rearranjada) expressando-se neste estado um pré-BCR. A sinalização
devido a esta expressão induz proliferação e divisão celulares e, após estas divisões, a célula recebe o sinal para
rearranjar a cadeia leve (não há segmento génico D de diversidade, recombinação VJ). Esta célula depois
diferencia-se na célula B imatura que expressa IgM (BCR) à superfície e que é submetida a um processo de
seleção negativa (células autorreativas são eliminadas) e a um processo designado de receptor editing e que
permite que LB autorreativos possam rearranjar novamente a sua cadeia leve do BCR e expressar um BCR que
volta a ser submetido a um teste de autorreatividade/seleção na medula. Assim, a célula tem uma nova hipótese
de passar o teste na medula.

As células B imaturas que escapam ao processo de seleção negativa e, portanto, que não são autorreativas
migram para o baço onde ocorre o processo final de maturação das células B (estados transicionais: T1 => T2 =
LB maturos). Os LB maturos expressam à sua superfície IgM e IgD.

A diferenciação das células B nos diferentes estados na medula é absolutamente dependente da interação
com nichos que se encontram localizados na medula óssea. Estas dão aos LB sinais que permitem progredir ao
longo da diferenciação B.

HSC e progenitores B estabelecem contacto com várias populações celulares da medula (nichos) à medida que
progridem no desenvolvimento:

A diferenciação de linfócitos B
ocorre a partir de uma célula
hematopoiética estaminal (HSC)
próxima do osso/dos osteoblastos e
estas células expressam um recetor, o
c-kit, que recebe sinais via SCF (stem-
cell factor) produzido pelas células
estromais da medula óssea
perfazendo o primeiro nicho com que
as células interagem. A HSC diferencia-
se no common lymphoid precursor,
CLP. O CLP estabelece interações com
células estromais da medula que
produzem a quimiocina CXCL12
(stromal cell-derived factor 1). O CLP
depois diferencia-se em pré-
pró-B e, posteriormente, em
pró-B. As células pró-B são
absolutamente
dependentes de IL-7
produzida pelas células
estromais (células no
estroma da medula óssea).
As células pró-B

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diferenciam-se em pré-B, que passam a expressar o pré-BCR à superfície e que recebem sinais via pré-BCR para
se diferenciarem em células B imaturas. A migração das células B imaturas para o baço é dependente do
gradiente S1P (sphingosine 1-phosphate). Isto é, estas células expressam o recetor de S1P à superfície, pelo que
seguem o gradiente deste (maior quantidade no baço do que na medula) para o capturarem (o mesmo acontece
com os timócitos a irem para a periferia).

Interação de progenitores com células estromais da medula é fundamental para o desenvolvimento B:

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Além dos fatores produzidos pelas células estromais importantes para a progressão da diferenciação B,
também é importante para a mesma o papel da interação dos progenitores com as células estromais via
moléculas de adesão:

- O CLP estabelece interações com as células do estroma mediadas por moléculas de adesão (CAMs) e via
integrina VLA-4 (α4β1) expressa pelo CLP com a VCAM-1 expressa à superfície da célula estromal. O CLP
expressa o recetor de IL-7 (IL-7R).

- A Pró-B é dependente de IL-7 e interage com a célula estromal a partir do Kit (CD117) – um recetor de tirosina
cinase – que interage com o SCF expresso pela célula estromal.

- A Pré-B também é dependente de IL-7 e adere às células do estroma via CAMs. Não esquecer que esta célula
já expressa o pré-BCR.

Fatores de transcrição na diferenciação de células B:

Além das interações dos precursores B com as células estromais, sabe-se que existem fatores de transcrição
muito importantes em diferentes estados na diferenciação B. A transcrição primária do Ikaros dá-se nas células
HSC ao qual se segue a transcrição de PU.1. Após a célula se ter diferenciado em CLP começa a existir a
transcrição de E2A, EBF, Foxo1, IRF4/8, c-Myb e de Runx1. Já em Pró-B existe a transcrição de PAX5, Foxp1 e
Foxo1 e em pré-B existe a transcrição de IRF4/8. Por fim, a célula diferencia-se em B imatura.

O PAX5 é absolutamente crítico, pois sem este não existe a diferenciação até às células B imaturas. Todos os
fatores de transcrição são importantes, mas sem este não existem células B diferenciadas na periferia. Além
destes fatores de transcrição, sabe-se que existem diversas modificações epigenéticas que são fundamentais.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Recetor da célula Pré-B:

A célula pré-B
expressa à
superfície o pré-
BCR.

Este pré-BCR tem


uma cadeia pesada
completamente
rearranjada e as
duas cadeias
pesadas associam-
se às duas
surrogate light
chain (cadeia leve
não rearranjada).
Esta cadeia leve não
rearranjada é
constituída por λ5 e
VpreB.

Existem duas
cadeias leves não
rearranjadas e duas cadeias pesadas
rearranjadas neste estado.

Tal como no TCR onde o complexo CD3 era


essencial para a sinalização via BCR, ao BCR
associam-se as Igα e as Igβ, que são duas
moléculas fundamentais para a sinalização via
BCR. É nestas duas moléculas que se localizam os
ITAMs, importantes para a iniciação da
sinalização via BCR.

O sinal que a célula pré-B recebe via pré-BCR


conjuntamente com sinais fornecidos pela IL-7 (recebidos pela célula via recetor da interleucina-7, IL-7R) levam
a:

1. Sobrevivência desta célula pré-B e proliferação.


2. Para um precursor proliferar no processo de diferenciação, há sempre redução da expressão das
proteínas RAG1 e RAG2 (envolvidas no processo de recombinação VDJ) e há silenciamento do locus
da cadeia pesada (a célula pré-B já expressa uma cadeia pesada completamente rearranjada e
funcional à superfície) cujo processo se designa de exclusão alélica da cadeia pesada.

171
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

3. A célula, entretanto, para de receber sinais via IL-7 e pré-BCR e para de proliferar.
4. Aumenta-se a expressão das RAG1 e RAG2.
5. Dá-se o rearranjo da cadeia leve (α no TCR).
O mesmo acontece com os timócitos no timo.

172
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Na célula pré-B o pré-BCR é expresso e é constituído pela cadeia pesada completamente rearranjada
(rearranjo funcional) e pela surrogate light chain. Esta é constituída pela Vpre-B e λ5. O pré-BCR associa-se, tal
como no BCR, às moléculas de Igα e Igβ, fundamentais para a sinalização via BCR. A sinalização via pré-BCR leva,
por último, a um sinal que induz rearranjo da cadeia leve e quando esta está completamente rearranjada, a
célula pré-B diferencia-se em célula B imatura e passa a expressar o BCR à superfície (IgM inicialmente).

O BCR é constituído por duas cadeias pesadas e duas cadeias leves completamente rearranjadas, que se
encontram associadas às tais moléculas de Igα e Igβ. No caso de IgM (BCR da B imatura), a cadeia pesada é
designada de μ e a cadeia leve pode ser ou κ ou λ.

Recapitulando…

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- Após o nascimento e durante a idade adulta a hematopoiese, que inclui o desenvolvimento das células B
ocorre na medula e é influenciada por vários nichos que são definidos pelas células estromais que se encontram
na medula.

- Os diferentes estados de desenvolvimento B são definidos pela presença de conjuntos de moléculas de


superfície (que incluem recetores de citocinas e quimiocinas e moléculas de adesão como a integrina VLA-4 no
precursor B que se liga a VCAM-1 das células estromais), expressão de fatores de transcrição específicos e por
rearranjos nos genes das imunoglobulinas.

- Os diferentes estados de desenvolvimento de células B são controlados por uma rede de fatores de
transcrição e por modificações epigenéticas que influenciam a expressão de genes-chave. Ao longo deste
processo as células ficam cada vez mais comprometidas com a linhagem B.

- Os diferentes estados de diferenciação B também são definidos pelo estado do rearranjo genómico das
cadeias leves e pesadas das imunoglobulinas.

- O locus da cadeia pesada é o primeiro locus a ser rearranjado, de tal forma que a região VH é primeiramente
rearranjada nas células pré-pró e pró-B, com a recombinação D-J a ocorrer inicialmente, seguindo-se-lhe a
recombinação V-DJ. Após o rearranjo da cadeia pesada, esta é expressa à superfície (pré-BCR) da célula
associada à surrogate light chain, isto é, a cadeia leve não rearranjada constituída pelo VpreB e λ5. Estas duas
cadeias (na verdade 2 cadeias pesadas e 2 leves associadas) constituem o recetor das pré-B (pré-BCR) associado
aos domínios de sinalização de Igα/Igβ formando-se o complexo pré-BCR.

- Os sinais que a célula recebe via pré-BCR, em ratinhos, e via recetor de IL-7 levam à paragem do rearranjo de
VH (assegurando a exclusão alélica da cadeia pesada, só um dos cromossomas é rearranjado), conferindo a estas
células pré-B sobrevivência, ativação de diversas divisões celulares (proliferação), seguidas pelo rearranjo da
cadeia leve das imunoglobulinas.

- Em ratinhos a IL-7 é essencial para a progressão na diferenciação (sem esta não há células B em ratinhos),
ao passo que em humanos esta não é crítica para a diferenciação/geração de células B! Ainda assim, tem
impacto, pois na presença de IL-7 a proliferação é superior.

- As divisões celulares permitem que múltiplas células B possam usar a mesma cadeia pesada rearranjada com
sucesso em combinação com outras e diferentes cadeias leves. A expressão do pré-BCR e a iniciação destes
eventos na célula pré-B constituem o primeiro ponto de controlo no desenvolvimento de células B.

- Após o rearranjo da cadeia leve no estado pré-B, a expressão completa da IgM à superfície (mIgM) como BCR
à superfície das células B imaturas para o rearranjo genómico da cadeia leve e induz um sinal de sobrevivência,
que constitui o segundo ponto de controlo (checkpoint) na formação de células B maturadas, isto é, o segundo
ponto de controlo dá-se no estado de células B imaturas.

174
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Tolerância central na medula óssea:

No estado de célula B imatura, esta expressa o


recetor de IgM à superfície e ocorre um passo crítico
designada de tolerância central. Nesta, as células
são submetidas ao processo de seleção negativa ou
deleção clonal, onde as células que não sobrevivem
e não passam este processo são deletadas. Algumas
células que reconheçam antigénios expressos pelas
células estromais da medula podem não ser
deletadas, podendo rearranjar uma nova cadeia
leve (que emparelhe com a cadeia pesada outrora
rearranjada) num processo designado de receptor
editing. Se o recetor “novo” deixar de reconhecer
os antigénios expressos pelas células estromais da
medula, a célula consegue escapar ao processo de
seleção negativa e pode migrar para o baço.

A evidência experimental do processo de


tolerância central, isto é, seleção negativa/deleção clonal na medula óssea no estado B imaturo foi conseguida
graças ao uso de animais transgénicos. Em (a) observam-se as células de ratinhos cujo MHC classe I é d
(transgénicos para o H2d) na medula óssea e que vão expressar a molécula Kd à superfície das células estromais.
Nestes animais os linfócitos B são específicos para a molécula Kk (são anti-Kk), pelo que quando se dá a interação
ou o reconhecimento de Kd pelas Kk, como o antigénio não é o mesmo (não há expressão do antigénio para o
qual o BCR é específico), as células não são deletadas na medula e escapam ao processo de deleção clonal ou
de seleção negativa, pelo que migram para a periferia (há produção de anticorpos).

Quando o animal transgénico expressa antigénios específicos, como em (b), em que o antigénio é específico
do BCR (aqui as células estromais expressam Kk tal como os linfócitos B que são anti-Kk), mas também não
específicos (como em (a), onde Kd é reconhecida por Kk). Nos casos em que o antigénio é reconhecido pelos
linfócitos B como sendo self (aqueles onde o antigénio é o mesmo, Kk), estas células B são deletadas e não são
maturadas (não há maturação na periferia de células anti-Kk).

Em (c) por uma análise mais detalhada revelou que existe o light-chain editing, onde o linfócito B que possua
um BCR que reconheça o antigénio específico expresso à superfície da célula estromal medular e que foi
selecionado negativamente, possa ter uma nova hipótese de rearranjar o novo locus da cadeia leve (que ainda

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

não tinha sido rearranjado) e se


este novo recetor não
reconhecer o antigénio
expresso pelas células
estromais consegue escapar e ir
para a periferia. Neste caso, a
maioria das células B que
reconheciam a molécula Kk
foram eliminadas (deleção
clonal ou seleção negativa),
mas nalgumas células verificou-
se que algumas células
rearranjavam a sua cadeia leve
(que não reconhecia a célula Kk
das células estromais),
mantendo a mesma
cadeia pesada.

Recapitulando…

- As células B
imaturas que
expressam IgM à
superfície são muito
sensíveis à indução de tolerância por eliminação células autorreativas. Este processo de
tolerância e seus mecanismos nas células B foram identificados recorrendo ao uso de
animais transgénicos para diferentes antigénios “do próprio” e BCRs que os reconheçam,
isto é, BCRs transgénicos específicos para aquele antigénio.

- As células B imaturas na medula óssea que são ativadas pelo seu BCR que reconhece
fortemente self antigénios podem sofrer o processo de receptor editing, o que significa que
iniciam o rearranjo do locus da cadeia leve de outro cromossoma alterando a especificidade
do seu BCR.

- Células B autorreativas que não realizam este processo de receptor editing


eficientemente (e funcional) e cujo sinal de sobrevivência é demasiado elevado (por terem
demasiada afinidade com o antigénio self expresso pela célula estromal) são deletadas por
apoptose (morte celular programada), pois estas células poderiam gerar autoimunidade.

- Estes processos constituem os mecanismos de tolerância central para os linfócitos B.

- No ratinho, 90% das células B produzidas diariamente na medula morrem por este processo de tolerância
central. A maior parte dos LB que chegam a este estado final de diferenciação na medula morrem, sendo um
processo altamente estringente/restritivo.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Sobre o processo de receptor editing

O processo de receptor editing, isto é, da capacidade dos linfócitos B imaturos poderem rearranjar novamente
a sua cadeia leve não é ad aeternum. Se fosse assim, então não existiriam células B autorreativas, o que não
é o caso.

Assim, em situações em que a afinidade com os antigénios presentes na medula é muito elevada, pode não
existir morte da célula B garantindo-se-lhe uma nova oportunidade de rearranjar a sua cadeia leve. Dá-se um
segundo rearranjo VJ (onde já tem disponíveis menos segmentos génicos, onde o resto do locus foi deletado
no primeiro rearranjo VJ). Ou seja, estes rearranjos são finitos, pelo que o rearranjo da cadeia leve também é
ele finito e vai chegar a uma altura em que esse rearranjo deixa de ser possível, existindo a morte da célula B.

A célula acaba sempre por tentar este processo de receptor editing, mas este pode já não ser possível.

Sobre a exclusão alélica (Ig)

Tanto a cadeia pesada como a cadeia leve sofrem o processo de exclusão alélica. Note-se
que todos os genes têm dois alelos, pelo que os que codificam para a cadeia pesada e leve
não são exceção. Ora, se existisse um rearranjo em ambos os loci dos alelos, existiria a
expressão de mais do que um tipo de especificidade à superfície da célula.

Ao parar-se o rearranjo do locus de uma das cadeias, impede-se que o locus presente no
outro alelo também possa rearranjar, permitindo-se assim que só haja uma cadeia leve e
uma cadeia pesadas específicas para o recetor de antigénio.

Experimentalmente, vê-se a exclusão alélica das cadeias pesadas (IgH) nos coelhos.
Existindo um progenitor que expresse apenas IgA e outro apenas IgB, o filho poderia
expressar uma combinação dos dois. No entanto, verifica-se que o filho ou expressa IgA
ou expressa IgB e nunca os dois ao mesmo tempo.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Aula 16 – Desenvolvimento de Linfócitos B (II) e ativação e diferenciação de linfócitos B

Desenvolvimento de células B:

Descreveu-se na aula anterior todo


o processo desde o precursor
linfoide até à célula B imatura e que
acontece na medula óssea. O
precursor linfoide e, de uma forma
detalhada, o CLP diferencia-se numa
célula pró-B comprometida para a
linhagem B e onde se inicia o
rearranjo da cadeia pesada das
Imunoglobulinas. Esta célula
diferencia-se em pré-B que expressa
à superfície um pré-BCR constituído
pela cadeia pesada completamente
rearranjada e pela surrogate light
chain. A sinalização via pré-BCR
induz o rearranjo da cadeia leve e a
célula diferencia-se em B imatura
que expressa um BCR totalmente
rearranjado, expressando IgM à sua superfície. Esta célula é sujeita a um processo de seleção negativa/deleção
clonal na medula óssea constituindo a tolerância central. Aqui, portanto, as células que reconheçam com
elevada afinidade antigénios expressos na medula são deletadas. As células que são selecionadas
positivamente, isto é, que escapam ao processo de seleção negativa, sobrevivem e não têm afinidade com o
antigénio (seleção tónica via BCR), migram para a periferia, nomeadamente para o baço para acabar o seu
processo de diferenciação.

A célula B imatura ao chegar ao baço diferencia-se em T1


(transitional one), estado transicional de desenvolvimento,
e depois em T2 (após tolerância periférica). As células T2 já
passam a expressar IgM e IgD à superfície seguida de uma
maturação final em célula B matura, que pode circular no
sangue e migrar para os gânglios linfáticos ou permanecer
no baço, etc. Detalhando-se esta parte:

Os linfócitos B imaturos que expressam IgM à superfície


deixam a medula óssea e migram para o baço, onde existem
duas “subpopulações” de transitional B cells (que são LB
ainda em processo de maturação/transição, daí o nome).
Estas células B imaturas quando chegam ao baço, já chegam
como T1, diferenciam-se em T2 e estas nos folículos sofrem
uma maturação final em LB maturos.

Nota: Todo este processo que se encontra a ser descrito é


totalmente válido e é o processo de diferenciação e
maturação de células B2 ou células foliculares que é a vasta
maioria dos linfócitos B que temos na periferia (órgãos

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

linfoides secundários, tecidos onde existe infeção, etc – fora dos órgãos linfoides primários, timo e medula
óssea).

Existe nestes estados T um teste de tolerância/seleção no baço onde os linfócitos T1 são testados. Se estes
são autorreativos (onde o BCR expresso reconhece com demasiada afinidade o antigénio/péptido no baço),
estas células LB T1 não se diferenciam em T2, num processo conhecido por tolerância periférica.

Pensa-se que dos vários LB, “apenas” os LB T2 conseguem migrar do baço para entrar nos folículos e que
algumas destas células migram para a zona marginal do baço dando origem às células B da zona marginal. Além
do mais, as células B2 ou as células foliculares são os LB mais abundantes, mas existem outras como as células
B da zona marginal e as células B1.

Pelo esquema anterior, observa-se que os linfócitos B imaturos e que expressam IgM à superfície entram para
a corrente sanguínea graças à expressão do recetor S1P (seguindo o seu gradiente). Migram para o baço, onde
os linfócitos entram via arteríola central, onde os linfócitos B imaturos já se
encontram diferenciados em T1. Vão para a polpa branca (onde se localizam as
populações linfoides), maioritariamente para a bainha periarteriolar linfoide
(constituída pela zona B e zona T; os linfócitos B maturos localizam-se nos folículos).
As células T1 vão para a zona T, diferenciam-se em T2 onde passam a expressar IgD
(além de IgM que já expressavam) e estas migram para os folículos onde se dá a
maturação final em LB maturos. Alguns LB T2, no entanto, podem ir para a zona
marginal do baço, dando origem às células B da zona marginal.

Processo de seleção positiva e negativa no baço:

No estado T1 ocorre um
processo de seleção muito importante para impedir a
autorreatividade, pelo que esta figura pretende
esquematizar esse processo.

Os linfócitos B T1 entram na bainha periarteriolar


linfoide e aqui ainda só existe expressão de IgM à
superfície. O seu BCR interage com antigénios neste local
e se houver um reconhecimento com elevada afinidade
destes antigénios, morrem por apoptose, isto é, dá-se um
processo de seleção negativa (tolerância periférica). Por
outro lado, os LB T1 que escapem a este processo (por não
terem elevada afinidade para o antigénio), recebem um
sinal que permite sobrevivência e diferenciação em T2,
entrando nos folículos.

Quando as células B T2 estão nos folículos, recebem um


sinal tónico (sinal de sobrevivência ou de afinidade
intermédia via BCR), este permite que as células B T2
passem a expressar o recetor de BAFF. A sinalização via
BCR e BAFF induz sobrevivência e diferenciação em
células B maturas, isto é, são selecionadas positivamente
(seleção positiva).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Recapitulando…

Uma célula B imatura migra da medula


óssea para o baço. As células que o
conseguem fazer passam a designar-se,
por diferenciação, de transitional 1 (T1) B
cells. A interação com antigénios “do
próprio” (self) no baço pode induzir que
essas células sejam deletadas por
apoptose, num processo designado de
seleção negativa.

As células B T1
que escapam à
seleção negativa,
começam a
expressar níveis
mais elevados de
IgD, de tal forma
que a expressão
desta é uma
característica dos
estados T2 para a
frente. As células B
T1 diferenciam-se em T2 e entram nos folículos. Nos folículos, recebem sinais via citocina
BAFF que se liga ao recetor de BAFF (BAFFR, expresso pelo LB T2 graças à sinalização tónica
via BCR) que são necessários para a sobrevivência destas células transicionais e para a
maturação final em linfócitos B maturos.

Para uma célula


B matura só sobrevive se tiver uma
afinidade intermédia com o antigénio
(sinalização via BCR) e com uma
sinalização via BAFF-BAFFR (sem esta
a resposta humoral fica
comprometida).

Principais populações de LB na
periferia:

As principais populações de LB na
periferia são as células B2 ou
foliculares (cujo processo de
desenvolvimento foi descrito), células
B1 e células da zona marginal.
Expressam todas IgM e IgD à
superfície, ainda que em diferentes
quantidades.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Células B2:

- Expressam CD19/CD21
(sinalização via células B e
sua resposta) e CD23. Não
expressam CD5 nem CD1.

- Encontram-se em órgãos
linfoides secundários (baço
e gânglios linfáticos,
especificamente nos
folículos).

- Têm origem nas células


estaminais hematopoiéticas
e o primeiro progenitor, em
ratinhos, aparece pelo
período embrionário E10.5
(período fetal).

- O desenvolvimento inicia-
se com as células
hematopoiéticas (HSC) na
medula óssea onde se
diferenciam em células B
imaturas, vão para o baço, onde se dá a maturação final.

- Absolutamente dependente de IL-7 (pré-B => B imaturo) e de BAFF (T2 => B maturo e sobrevivência de B
maturas), em ratinhos.

- Altamente diversa no que toca ao seu repertório na periferia (diversos BCRs originados a partir de muitos
rearranjos).

- Possui hipermutação somática (aumento da afinidade do anticorpo para o antigénio) e é muito importante
e frequente nestas células.

- Para indução de memória ou mudança de classe, estas células precisam de interagir com células T.

- Conseguem produzir níveis muito elevados de IgG (e outros isotipos, ocorrendo mudança de classe).

- Podem responder a antigénios de carbohidratos, mas limitada, pois a interação com células T só é conseguida
via antigénios proteicos.

- Respondem a antigénios proteicos (para auxílio de células T).

- A memória é “característica” das células B2 foliculares, quando são auxiliadas pelas células T.

Células B1:

- Possuem dois subsets: B1.a – que vai ser detalhada - e B1.b.

- Não expressam CD19 nem CD21 à superfície, nem CD23 e nem CD1.

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- Expressam uma molécula de CD5 (não restrito a células B1, mas característica desta dentro das populações
de LB; atenuador do sinal recebido via recetor de antigénio).

- Colonizam a cavidade peritoneal e pleural.

- O progenitor é mais precoce que B2, aparecendo pelo E9.5.

- Têm capacidade de self-renewing (autorrenovação), onde células B1 pré-existentes conseguem repopular o


nicho de células B1.

- Não são necessários os sinais via IL-7 e BAFF.

- Repertório restrito.

- Existe alguma hipermutação somática, ainda que limitada.

- Não precisam de interagir com células T.

- Produzem essencialmente IgM.

- Podem responder a antigénios de carbohidratos.

- Podem responder a antigénios proteicos.

- Não induz células de memória (ainda que na tabela diga que pode).

Células B da zona marginal:

- Expressam CD1 e CD19/CD21. Não expressam CD23 nem CD5.

- Localizam-se na zona marginal do baço.

- Podem provir tanto de células B T2 que entrem na zona marginal como de um precursor primordial.

- As que têm origem nas T2, têm origem nas células estaminais hematopoiéticas da medula.

- Elevado tempo de vida (long-lived).

- Há necessidade dos sinais via IL-7 e BAFF.

- Repertório ligeiramente restrito.

- Não se sabe se possui hipermutação somática.

- O auxílio das células T é variável.

- Produzem essencialmente IgM.

- Podem responder a antigénios de carbohidratos.

- Respondem a antigénios proteicos.

- Ainda não se sabe se pode leva à produção de células de memória.

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Recapitulando…

Adicionalmente à população predominante de células B convencionais que vêm da medula, também


designadas de células B2 ou de células foliculares, existem outros subsets (subtipos) de células B,
nomeadamente as células B1 e as células B da zona marginal, que se desenvolvem através de processos
separados e que se localizam em diferentes regiões anatómicas, possuindo distintas funções.

As células B1 (B1a – que expressam CD5 - e B1b) e as células B da zona marginal (MZ) diferem das B2 nos
marcadores de superfície e num repertório de especificidade de anticorpos mais limitando, que inclui reações
cruzadas entre antigénio do próprio e antigénios provenientes de microrganismos. Estas células sem ajuda de
células T, isto é, espontaneamente, conseguem produzir anticorpos de classe IgM e gerar uma resposta rápida
a infeções microbianas.

Estudos recentes mostram fortes evidências que as células B1a derivam de precursores que se diferenciam
em estados embrionários muito precoces (antes das HSC que vão dar origem às B2) e repopulam as cavidades
pleural e peritoneal (onde se localizam essencialmente) e são capazes de se autorrenovarem/replicarem,
garantindo uma pool de população ativa de células B1a durante a vida do indivíduo.

Pelo contrário, as células B1b e as células B da zona marginal (MZ) do baço são derivadas essencialmente de
células estaminais hematopoiéticas e as B2 provêm de células estaminais que se diferenciam em progenitores
linfoides. Algumas células B da zona marginal também se diferenciam a partir das células B2, no estado T2.

Quando se compara o desenvolvimento de células B e o desenvolvimento de células T, observam-se algumas


semelhanças e diferenças:

- Em ambas existe uma linhagem que repopula a periferia durante o desenvolvimento fetal, sendo válido para
as B1a e para as T γδ.

- Ambas provêm de células hematopoiéticas estaminais na medula óssea, sendo válido no caso das B2 e MZ e
nas T αβ.

- O desenvolvimento continua no timo apenas no caso das células T. Todo o desenvolvimento de células B
ocorre na medula, sendo que a maturação se dá no baço.

- Existe rearranjo VDJ tanto nas células T como nas células B. Existe um primeiro rearranjo da cadeia pesada e
depois da leve no caso dos LB e nos LT primeiro existe um rearranjo da cadeia β e depois da α.

- O pré-BCR e o pré-TCR são expressos à superfície onde a cadeia pesada/β rearranjada é expressa em conjunto
com uma cadeia leve/α não rearranjada.

- A sinalização via pré-BCR/pré-TCR é necessária em ambas as células para o prosseguimento do


desenvolvimento. Esta sinalização resulta na proliferação e rearranjo das cadeias não rearranjadas (leve/α).

- A cadeia leve e a cadeia α apenas necessitam de segmentos V e J para a recombinação das mesmas.

- A sinalização via BCR e TCR rearranjados é necessária para a sobrevivência dos LB e LT, respetivamente
(seleção positiva).

- A seleção positiva requer reconhecimento de antigénios do próprio nas B1 e MZ e nas T.

- O processo de receptor editing dá-se cadeia leve das Ig, mas é altamente controverso se acontece ou não na
cadeia α do TCR.

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- As células imaturas ao expressarem recetores com alta afinidade para antigénios “do próprio” são eliminadas
por apoptose (seleção negativa) acontece tanto em LB como em LT, nas primeiras nas células T1 e nas segundas
no timo.

- A seleção negativa envolve expressão de antigénios periféricos nos órgãos linfoides primários apenas nas
células T (timo), onde há expressão de antigénios periféricos mediados pelo fator de transcrição AIRE.

- A seleção negativa que envolve reconhecimento complexos MHC:péptido é característica do


desenvolvimento T.

- Existe exclusão alélica do recetor de antigénio em ambas as populações (B e T). Nas células B, quando o pré-
BCR é expresso (induz um sinal) leva à paragem do rearranjo da cadeia pesada (silenciamento do locus da cadeia
pesada). O mesmo acontece com a sinalização via BCR para a cadeia leve (cujo locus é silenciado). Nas células T
acontece o mesmo, sendo muito eficiente o silenciamento da cadeia β, mas é menos eficiente no locus da cadeia
α, podendo-se consequentemente expressar mais do que uma cadeia α associada à mesma cadeia β.

- A seleção da maior parte (mais de 90%) dos linfócitos dá-se antes de irem para a periferia nos LB e nos LT.

- Em ambas, os processos na periferia permitem o estabelecimento de tolerância a antigénios não expressos


nos órgãos linfoides primários (medula óssea e timo). Existem processos de tolerância na periferia tanto para
células B como para células T.

Assim, há grandes similaridades entre o processo de desenvolvimento B e T, incluindo um comprometimento


gradual para a respetiva linhagem e um rearranjo sequencial dos genes que codificam os recetores de antigénio,
com pontos de controlo que testam se o rearranjo é produtivo ou não, se há expressão dos recetores
polipeptídicos havendo seleção de células com especificidades apropriadas (cujo BCR e TCR são apropriados).
Há morte de células autorreativas ou que não respondem a sinalização via recetores de antigénio.

O resultado destes processos de desenvolvimento são células B e células T maturas com um repertório
(diverso) de recetores de antigénio apropriado que nos vão proteger contra infeções na periferia, evitando-se
claro uma autorreatividade indesejada que poderia gerar doenças autoimunes.

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Mutações em proteínas que intervêm no


processo de recombinação V(D)J:

Estas mutações são causadoras de


imunodeficiências severas (no BCR e TCR), que se
refletem na população B (e T). Estas proteínas
cujas mutações causam estas imunodeficiências
e que estão envolvidas na recombinação VDJ,
são:

- RAG 1;

- RAG 2;

- RAG 1 e RAG 2 simultaneamente.

- Artemis;

- DNA Ligase IV;

- DNA-PK p350.

Imunodeficiências primárias que afetam o


desenvolvimento precoce de células da
linhagem B:

Mutações que afetem a linhagem B:

- Btk-, agamaglobulinemia ligada ao


cromosoma X (XLA);

- IGHM, que impedem a expressão da cadeia


μ do BCR;

- Igα (CD79A);

- Igβ (CD79B);

- λ5 (IGLL1), essencial para o estabelecimento do pré-BCR;

- BLNK leva a uma ausência de células B, pois esta proteína está associada à sinalização do BCR.

Não esquecer que Igα (CD79A) e Igβ (CD79B) estão associadas ao BCR, permitindo a sinalização (onde se
localizam os ITAMs).

Ativação e diferenciação de linfócitos B:

Dois principais tipos de respostas B:

- Respostas dependentes de linfócitos T (Thymus (T)-dependent responses):

• Respostas exibidas pelas células B foliculares ou B2;


• Representa a maioria das respostas das células B.

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- Respostas independentes de linfócitos T (Thymus (T)-independent responses):

• Exibidas por células B1 e da zona marginal (localizadas na zona marginal do baço);


• Não necessitam de ajuda de células T para exercer a sua função.

Consoante a resposta é ou não dependente de LT, a ativação dos LB é mediada por antigénios dependentes
de células T ou independentes das mesmas.

Ativação de células B por antigénio:

- Antigénios “dependentes de células T” (TD, T-dependent): é necessário haver contacto direto com células T
para ocorrer ativação das células B (nesta há indução de células de memória, hipermutação somática, mudança
de isotipo, etc);

- Antigénios “independentes de células T” (TI, T-independent): não é necessário contacto direto com células
T para haver ativação B. Existem dois tipos de TI:

• TI-1: ativadores policlonais – reconhecem vários epítopos -, ultrapassam a especificidade do BCR


(funcionam como mitogénios de células B – ativam células B independentemente da especificidade
do BCR) - exemplo: LPS;
• TI-2: ativam os recetores de células B graças à presença de antigénios com epitopos repetidos -
exemplo: flagelina (presente nos flagelos).

Ativação de LB por antigénio dependente de células T:

Para a ativação de linfócitos B


por antigénios dependentes de
células T, a célula B precisa de
receber 3 sinais:

- Sinal 1: dado via cross-linking


do BCR (ligação por mais de um
BCR ao mesmo antigénio).

- Sinal 2: sinalização via CD40


que é expresso pela célula B e
que vai interagir com o ligando de
CD40 (CD40L) expresso pela
célula T auxiliar.

- Sinal 3: sinalização via


citocinas produzidas pela célula T
auxiliar, nomeadamente IL-4, IL-5 e IL-2. A sinalização via citocinas vai induzir sinais de sobrevivência,
proliferação e diferenciação para a célula B.

Para uma célula B ser ativada por uma célula T (CD4+ auxiliar, TH) é necessário que a primeira seja capaz de
apresentar o antigénio/péptido em contexto de MHC classe II. A célula B é uma APC, pelo que expressa MHC I
e MHC II. O péptido que vai ser apresentado provém do antigénio do cross-linking, isto é, o antigénio que
interage com o BCR fazendo cross-linking é internalizado/endocitado (BCR + antigénio internalizados) e
processado para que o péptido dele resultante seja apresentado à célula TH em contexto de MHC II.

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Aula 17 – Ativação e diferenciação de linfócitos B (II)

A diferenciação de linfócitos B resulta em plasmócitos – células produtoras de anticorpos – ou em células B de


memória.

A ativação de linfócitos B – resposta humoral – é desencadeada por antigénios T dependentes (TD) ou T


independentes (TI).

As células B T-dependentes (TD) envolvem antigénios proteicos (T-dependentes) e


células T CD4+ auxiliares para a sua ativação. No processo de ativação de linfócitos B
por antigénios T-dependentes é necessário que:

- O antigénio seja específico para o BCR e induza cross-linking do mesmo, existindo internalização do BCR +
antigénio pela célula B, processamento do antigénio e carregamento em moléculas de MHC classe II. Ou seja, é
necessário que o antigénio multivalente se ligue e realize cross-linking com os recetores de imunoglobulinas na
membrana.

- Células T auxiliares ativadas que reconheçam os complexos MHC II: péptido apresentados à superfície do LB
ligando-se-lhe via recetor de antigénio e via CD40 L (expresso na célula T) ao CD40 (expresso na célula B), sendo
esta interação absolutamente necessária.

As células B T-independentes (TI) envolvem antigénios T-independentes multivalentes ou altamente


polimerizados e muito específicos, não requerendo células T auxiliares para a sua ativação. Existem dois tipos
de antigénios T-independentes: TI-1 e TI-2.

- TI-1: um exemplo clássico é o LPS (ligando para o recetor TLR-4, expresso à superfície dos LB). É mitogénico
(induz proliferação/mitose/divisão celular das células B) em elevadas concentrações para a maioria das células
B devido à ligação aos PRRs (pattern recognition receptors) expressos à superfície da célula B.

- TI-2: o exemplo principal é a cápsula polissacarídea bacteriana. São antigénios altamente repetitivos, mas
não são mitogénicos (não induzem ativação policlonal ou de células B), apesar de induzir cross-linking dos
recetores de imunoglobulinas (BCR). Muitos estão ligados pela molécula de C3d, reconhecida pela CD21 (ou
complement receptor 2) – associada ao BCR/co-recetor.

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Ativação de LB por antigénio dependente de células T vs. Ativação de LB por antigénio independente de
células T:

A ativação de linfócitos B por antigénios dependentes de células T requer necessariamente 3 sinais (via BCR,
via CD40 e via citocinas) que induzem sobrevivência, proliferação e diferenciação (em plasmócitos – células
produtoras de anticorpos/Ig – e em células B de memória). Para existir esta ativação pelo antigénio dependente
da célula TH, é necessário existir o cross-linking dos BCRs pelo antigénio específico multivalente que envia sinal
via BCR e, consequentemente, este BCR e antigénio são internalizados e o antigénio é processado no péptido
que é apresentado na MHC II. Existe ainda um segundo sinal fundamental resultante da interação do CD40 da
célula B e ligando de CD40 (CD40L) da célula T e um terceiro sinal crítico via citocinas produzidas pelas células T
auxiliares, nomeadamente a IL-4, IL-5 e IL-2 (existem outras, no caso da reação do centro germinativo, a IL-21
produzida por células T auxiliares foliculares é fundamental para a resposta de uma célula B).

Estes 3 sinais ocorrem na ordem indicada: 1, 2 e 3. Isto é, existe uma pré-ativação primária via BCR (sinal 1) e
só depois é que o LB interage com o LT (sinais 2 e 3). Note-se que todos estes sinais (1, 2 e 3) são essenciais para
a correta ativação e destino do linfócito B e uma resposta humoral (mediada por células B) eficiente.

No caso da ativação de linfócitos B por antigénios independentes de células T obviamente que nem todos os
sinais anteriormente referidos são requeridos e, inclusive, podem ser diferentes. Existem dois tipos: 1 e 2.

Na situação das células B dependentes de antigénios TI-1, com o exemplo clássico do LPS, para existir a
ativação da célula B são necessários 2 sinais: um via BCR e outro via TLR-4. Aqui tem de existir cross-linking do
BCR com antigénio T-independente 1 e a sinalização via recetores de imunidade inata (recetores Toll). Assim,
requer-se o sinal 1 via BCR e o sinal 2 via TLR-4 (Toll-like receptor 4). Os antigénios TI-1 funcionam como
ativadores policlonais ou mitogénios B, induzindo proliferação de linfócitos B independentemente da
especificidade do BCR.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Na situação das células B dependentes de antigénios TI-2 a sinalização ocorre meramente via BCR, isto é, existe
cross-linking do BCR. Nestes antigénios T-independentes 2 existem epítopos muito repetitivos que permitem a
ativação de múltiplos BCRs. Existe, adicionalmente, reconhecimento do antigénio associado à molécula C3d
pelo CD21 (também designado de CR2), que é co-recetor do BCR (faz parte do complexo BCR e é recetor da
molécula de complemento C3d).

A ativação de linfócitos B por antigénios independentes de linfócitos T (TI-1 ou TI-2 – menos específicos que
os TD) dão origem a anticorpos de baixa afinidade, primariamente IgM (a maturação/o aumento da afinidade
dos anticorpos produzidos requer a presença de LT auxiliares). A vasta maioria (praticamente exclusivamente)
todos os linfócitos B ativados por antigénios T-independentes apenas expressam IgM. Este tipo de ativação, de
células B independentes de LT, não gera resposta imunológica eficiente (isto é, a diferenciação das células B em
células B de memória requer linfócitos T auxiliares – não se gera uma resposta secundária eficiente).

Complexo BCR:

Nos linfócitos B ativados por antigénios TI-2, é necessário o reconhecimento pelo fragmento de complemento
C3d que se encontra associado à superfície do antigénio pelo CD21 (ou CR2, recetor de complemento 2).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

O BCR é constituído por duas


cadeias pesadas e duas cadeias
leves. O BCR não sinaliza sozinho,
estando associado às moléculas
de Igα e Igβ (CD79αβ) que
possuem os ITAMs
(Immunoreceptor tyrosine-based
activation motifs), onde existem
tirosinas que vão ser fosforiladas
por cinases, após
reconhecimento do antigénio via
BCR.

O complexo BCR é constituído


ou está associado a CD19, o CD21
(ou CR2) e o CD81 (ou TAPA-1) e
que são cruciais para uma correta
sinalização. Estas moléculas como
conjunto (CD19 + CD21 + CD81)
designa-se por co-recetor do BCR.

Sabe-se que o reconhecimento do C3d associado ao antigénio pelo CD21, com o auxílio dos restantes membros
do co-recetor (CD19 e CD81) – sendo a ajuda do CD19 crucial – levam à amplificação do sinal recebido via BCR
e, desta maneira, permitem ao linfócito B responder a estímulos mais fracos (que na ausência do co-recetor não
seriam capazes de induzir eficiente ativação do LB).

Sinalização via BCR:

Na figura mostra-se que existem 2 BCRs a ligarem-se ao antigénio (multivalente) que fazem cross-linking. O
BCR sozinho não consegue sinalizar sendo necessárias as moléculas de Igα e Igβ que têm os tais ITAMs para
existir sinalização. Quando há cross-linking do BCR por antigénio, existe a fosforilação dos ITAMs (da Igα e Igβ)
por tirosina cinases da família de Src, nomeadamente Lyn, Fyn e Blk.

Estes tirosina cinases vão permitir o docking de um tirosina cinase denominado de Syk, que é
extraordinariamente importante na sinalização via BCR.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

O Syk vai propagar a sinalização via BCR por


indução da fosforilação de muitas
outras proteínas, nomeadamente
SLP-65 e da Btk.

O cross-linking do BCR pelo


antigénio leva à fosforilação dos
ITAMs localizados nos Igα e Igβ pelos tirosina cinases Scr (Lyn, Fyn e Blk) que permite o docking do Syk nos
resíduos de tirosina fosforilados nos ITAMs. Este docking leva ao docking de outras proteínas adaptadoras e
fosforilação das mesmas que culmina na ativação de fatores de transcrição, nomeadamente Myc, NFAT, NF-kB
e AP-1.

Sabe-se que mutações em Btk (Burton tirosine kinase) causam agamaglobulemia (ausência de anticorpos)
associada ao cromossoma X ou doença de Burton, provocando uma deficiência em todos os isotipos de
imunoglobulinas e, portanto, uma ausência de linfócitos B nos ratinhos. Em humanos a redução de LB é drástica,
ainda que não seja total (existe, obviamente, uma deficiência em todas as classes de Ig).

Papel do CR2 (CD21) na sinalização via BCR:

O co-recetor do BCR é constituído pela


molécula de CD21 ou CR2 que se vai ligar ao
fragmento C3d associado à superfície do
microrganismo (+ CD19 – essencial - e CD81). O
co-recetor do BCR amplifica dramaticamente a
sinalização via BCR e diminui o limite (threshold) de ativação dos
linfócitos B.

O CR2 não consegue sinalizar diretamente, sendo necessário o CD19


que tem a capacidade de ser fosforilado e induzir a ativação de
cinases PI3.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

CR2/CD21 + CD19 +
CD81/TAPA-1 => co-recetor do
BCR.

A ativação de linfócitos B por antigénios dependentes de células T dá-se concretamente ao nível das células B
foliculares ou B2 que reconhecem o antigénio via BCR, com internalização do mesmo e processamento do
antigénio e apresentação do péptido resultante em MHC II a uma célula T auxiliar, tendo de existir uma cognate
interaction (interação específica). Este tipo de ativação vai dar origem a anticorpos com alta afinidade, mudança
de classe de isotipos (nomeadamente, de IgM para IgG, IgA e IgE), geração de células de memória e de
plasmócitos (capazes de produzir anticorpos com um tempo grande de vida – são células long-lived), localizados
essencialmente na medula óssea num nicho.

A ativação de linfócitos B por antigénios independentes de células T dá-se ao nível das células B1 e células B
da zona marginal do baço. Esta ativação gera maioritariamente IgM, anticorpos de baixa afinidade e
plasmócitos com um tempo de vida muito curto (short-lived). Não estabelecem uma memória.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Resposta humoral primária e secundária:

Uma resposta humoral é uma resposta


mediada por linfócitos B. Esta divide-se em
resposta primária e em resposta
secundária, sendo que estas apresentam
diferenças.

No gráfico observa-se a quantidade de


anticorpos produzida e que se encontra no
soro, pelo que salta logo à vista que esta é
superior na resposta humoral secundária.
Também se observam os dias após a
exposição ao antigénio. Quando existe esta
interação de antigénio-BCR, existe a
ativação da célula B naive e proliferação e
diferenciação em linfócitos B,
nomeadamente em células B de memória
ou em plasmócitos (que produzem
inicialmente IgM). Se o antigénio
apresentado esteve em contacto com
linfócitos T pode dar-se mudança de classe
para outros isotipos, diferenciação em
plasmócitos com elevado tempo de vida na
medula óssea ou em células B de memória.

A resposta humoral secundária inicia-se


na reexposição ao antigénio, pelo que as
células B de memória reagem e os
plasmócitos secretam muitíssimos
anticorpos e mais elevada diversidade (IgG essencialmente). Em suma:

Resposta primária – mediada por antigénios T- Resposta secundária – mediada por antigénios T-
dependentes e T-independentes: dependentes:

Magnitude: baixa Magnitude: alta

Isotipo dos anticorpos: geralmente IgM (pode Isotipo dos anticorpos: IgG maioritariamente, mas
haver IgG em baixas quantidades). também IgA e IgE

Afinidade dos anticorpos: baixa Afinidade dos anticorpos: alta (os anticorpos
sofreram maturação da afinidade).
Induzida por todos os imunogénios (antigénios T-
dependentes e T-independentes) Induzida por antigénios proteicos (dependentes
de LT) apenas.

194
Ativação de células B por antigénios dependente de células T:

A ativação de células B por antigénios


dependentes de células T requer, como
já visto, 3 sinais (via BCR, via CD40-CD40L
e citocinas). Estes sinais seguem uma
ordem: 1, 2 e 3.

Assim, inicialmente existe o cross-


linking do BCR que é internalizado
juntamente com o antigénio (que depois
é processado e o péptido carregado em
MHC II). O cross-linking aumenta a
expressão de MHC classe II (para
apresentar ao LT) e de B7 (B7.1/CD80 e
B7.2/CD86, moléculas co-estimuladoras
– cruciais na ativação).

Num segundo passo vai haver um


reconhecimento pela célula T do
antigénio em MHC classe II e vai haver uma ativação via TCR e uma ativação via co-estimulação que ativam a
célula T auxiliar. Aqui é crítico que a célula T auxiliar expresse CD40L e se ligue ao CD40 do LB e que B7 (1 ou 2,
CD80 ou CD86) do LB se ligue a CD28 do LT (para ativação da LT). As citocinas que são produzidas pelas células
T auxiliares são cruciais para a diferenciação de linfócitos B.

Esta ativação dos linfócitos B vai permitir que as mesmas entrem em


fases ativas do ciclo celular, dividindo-se consequentemente.

Apresentação de antigénios a linfócitos T auxiliares por células B:

O linfócito B expressa o BCR, necessitando de reconhecer sempre um


antigénio que é específico. Existe a internalização do recetor com o
antigénio (endocitose) seguindo-se-lhe o processamento antigénico e
apresentação em MHC classe II e vai ser o péptido resultante deste
antigénio que vai interagir com uma célula T auxiliar específica.

Um antigénio microbiano proteico é reconhecido pelo determinante


antigénico dos BCRs dos linfócitos B (epítopo da célula B - hapteno). Os
linfócitos B não reconhecem péptidos! Da proteína existente um dos seus
péptidos irá dar origem a um antigénio que vai ser reconhecido
especificamente pelo BCR. O TCR mais tarde, na apresentação às células
T auxiliares, vai reconhecer o péptido (o epítopo é reconhecido pelo LB e
o péptido é reconhecido pelos linfócitos T, que pertenciam fisicamente à
mesma identidade) – linked recognition. Os linfócitos T é que
reconhecem péptidos. Os sinais ainda que sigam uma dada ordem, não
têm de ser dados
concomitantemente para a
ativação de LB (num processo dependente de células T).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Aula 18 – Ativação e diferenciação de linfócitos B (III)

Apresentação de
antigénios a células B
foliculares/B2 nos
gânglios linfáticos
(reação do centro
germinativo):

Um linfócito B maturo,
para se diferenciar em
plasmócitos ou células B
de memória, precisa de
interagir com um
linfócito T (antigénios T-
dependentes). Estes
processos ocorrem no
gânglio linfático,
esquematizado na
figura. Os linfócitos B
estão localizados nos
folículos, na B cell zone.
No entanto, eles (e os linfócitos T) entram nos gânglios via high endothelial venules (HEV) e vão para os folículos,
enquanto que os LT vão para o paracórtex ou T cell zone. Ora, a questão que se coloca é como é que há contacto
entre LB e LT.

Os antigénios, que vêm do local de infeção, circulam na linfa e chegam via vasos linfáticos aferentes ao seio
subcapsular (subcapsular sinus). Aqui encontram uma barreira de macrófagos e os folículos onde estão as
células B. Os antigénios pequenos têm acesso imediato a linfócitos B, porque passam a barreira e ativam os LB
aí presentes. Quanto aos antigénios grandes pensa-se que são capturados via recetores do complemento ou via
recetores FC – recetores para fragmentos de imunoglobulinas (FRCs) – em macrófagos da região do seio
subcapsular. Assim, estas células passam a barreira e conseguem passar estes antigénios grandes aos linfócitos
B.

Existe uma população importante para a reação do centro germinativo e que está essencialmente localizada
nos folículos, que são as follicular dendritic cells (FDCs). Atenção que estas células NÃO são células dendríticas!
Nem sequer derivam de um precursor das células hematopoiéticas estaminais, possuem um processo de
diferenciação completamente diferente, sendo de origem estromal! Estão sempre na zona dos folículos B e
possuem um reservatório de antigénios ao qual os linfócitos B acedem durante o processo de hipermutação

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

somática e na diferenciação ocorrida na


reação do centro germinativo. Assim,
nesta zona elas podem apresentar
antigénios grandes a linfócitos B
recebidos via linfa.

Isto é, ou os LB têm acesso direto aos


antigénios (pequenos) ou o acesso a
antigénios (grandes) é providenciado
pelos macrófagos (da barreia do seio
subcapsular) ou pelas FDCs.

Os linfócitos B maturos naive entram


nos gânglios linfáticos e precisamente
nos folículos devido à resposta à
quimiocina CXCL13, produzida pelas
células dos folículos, nomeadamente as
FDCs. A CXCL13 interage com o recetor
expresso pelos LB denominado de
CXCR5 ou CD185.

Isto é, o recetor CXCR5 dos LB capta e


“vai atrás” da quimiocina CXCL13,
levando-o para os folículos. Esta
quimiocina é produzida pelas follicular
dendritic cells.

Então e se os LB se encontram nos folículos e os LT no paracórtex, como é que se encontram para se dar a
ativação dos LB? Então, primeiro que tudo o linfócito T que providencie o sinal via CD40-CD40 ligando ao LB tem
de estar ativado primariamente. A sua ativação dá-se na T cell zone, no paracórtex, providenciada por uma
célula dendrítica. Quando este é ativado e diferenciado numa célula T auxiliar (TH), a expressão de CCR7
(quimiocina que os linfócitos T naive expressam, que lhes permite aquando da migração para os gânglios
linfáticos migrarem para a zona T em resposta à CCL19 e à CCL21 produzidas por células dendríticas desta região)

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

decresce e aumenta-se a expressão de CXCR5 o que leva ao linfócito T ativado migrar para a fronteira entre a
zona B e a zona T. Por outro lado, quando o BCR do linfócito B interagiu com o antigénio específico e a célula
recebeu sinal via BCR, o LB passa a expressar CCR7 que faz com que ela se aproxime da fronteira, da T cell zone.

Ativação de células B2 (foliculares)- T dependente:

As células
B e as células T encontram-se numa zona extrafolicular, fora dos folículos
dos linfócitos B.

Aquando da interação da célula T auxiliar e o LB (via 3 sinais – BCR, co-


estimulação/CD40 e citocinas), o mesmo pode ter 3 destinos possíveis:

- (primary focus - Local da “primeira” interação de LB com T auxiliares,


região extrafolicular) Pode diferenciar-se em células produtoras de
imunoglobulinas/anticorpos (plasmócitos) – Ig de baixo tempo de
semivida que migram essencialmente para a parte medular dos gânglios
linfáticos e manterem-se lá (o pool de plasmócitos encontra-se nesta
região). Os plasmócitos do primary focus secretam elevadas quantidades
de IgM (e IgG) não
mutadas que
providenciam uma
imunidade precoce e
protetiva humoral.

- Diferenciação em
células de memória
que só produzem IgM quando estimuladas.

- Entram na reação do centro germinativo.

O centro germinativo é constituído por linfócitos B que


foram ativados pelos LT, células T auxiliares que se
diferenciam em células foliculares e por FDCs (para a
apresentação do antigénio a LB).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Sequência de eventos na ativação de


LB por antigénios T dependentes:

As células dendríticas ativam os


linfócitos T nas zonas T e as células B
interagem diretamente com o antigénio
e recebem sinal via BCR e migram para a
zona de interação T-B (na fronteira).
Uma parte das células B origina
plasmócitos de curta duração, sendo que
parte destas migra para o centro
germinativo.

No centro germinativo também se


encontram as células dendríticas
foliculares (FDCs).

Não esquecer que uma parte das


células T auxiliares que interagiu com as
células B inicialmente, se vai converter
em células T auxiliares extrafoliculares (e
que vai ser evidenciado
posteriormente).

As células T quando
interagem com a célula B
recebem um sinal via
ICOS-ICOSL.

Existem dois tipos de


respostas mediadas por
células B: as que
resultam da interação de
uma célula B com uma
célula T auxiliar (resposta
extrafolicular) e a
resposta/reação do
centro germinativo.

Em relação à primeira
resposta, a localização da
mesma dá-se nos cordões medulares dos gânglios linfáticos (plasmócitos diferenciados extrafoliculares),
necessita de sinais via CD40 (ou seja, precisa de uma célula T auxiliar), necessitam de células T auxiliares
extrafoliculares. Adicionalmente, requerem um enzima denominado de citidina desaminase (AID, activation-
induced cytidine deaminase) e aqui existe mudança de classe das imunoglobulinas. Na resposta extrafolicular
existe algum (pouco) aumento de afinidade do anticorpo para o antigénio (pouca hipermutação somática). As

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células B diferenciadas deste processo são plasmócitos de curta duração (tempo de vida de 3 dias). Por fim, o
fator de transcrição essencial para a diferenciação das células B ativadas em plasmócitos é o Blimp-1 (B
lymphocyte-induced maturation protein 1) (o IRF-4 também é essencial).

Em relação à reação do centro germinativo dá-se como o nome indica no centro germinativo, precisa de uma
célula T (sinal via CD40) folicular auxiliar. Requerem o AID e aqui existe uma mudança extensiva de classe das Ig
e um elevado aumento da afinidade Ab-Ag (hipermutação somática). As células B diferenciadas deste processo
são plasmócitos de grande duração (que migram para a medula óssea) e células B de memória. Por fim, o fator
de transcrição essencial para a diferenciação das células B ativadas em plasmócitos é o Bcl-6 (B cell lymphoma
6) (Pax-5 também é essencial).

Os plasmócitos originados neste foco primário extrafolicular secretam quantidades elevadas de IgM
(maioritariamente) e algumas quantidades de IgG (não sofreram hipermutação somática, não mutados) que
fornecem uma proteção humoral precoce para controlo inicial da infeção.

Papel de fatores de transcrição


na determinação da
diferenciação de LB ativados em
plasmócitos ou entrada na
reação de centros germinativos:

As células B que migram para os


folículos do centro germinativo
expressam Bcl-6 e Pax-5
(expressam baixas quantidades
de IRF-4 e BLIMP-1). Estes fatores
de transcrição são fundamenais
para a reação do centro
germinativo onde as células
sofrem a hipermutação
somática, SHM – somatic
hypermutation, e seleção da
afinidade mediada por antigénio
apresentado pelas células
dendríticas foliculares.

As células que se diferenciam


em plasmócitos expressam
BLIMP-1 e IRF-4, expressando
poucas quantidades de Pax-5 e
Bcl-6. Estas células
vão produzir
anticorpos.

Estes fatores de transcrição envolvidos nesta decisão são os mesmos envolvidos, no centro germinativo,
quando a célula se decide diferenciar em plasmócitos ou células de memória.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Reação no centro germinativo:

Aqui o linfócito B necessita da ajuda por


parte do linfócito T auxiliar. O LB que foi
ativado na região extrafolicular migra para
os folículos no centro germinativo.

Neste, existem duas zonas: a zona escura


(dark zone) e a zona clara (light zone).

A zona escura é onde os linfócitos B se


encontram a proliferar ativamente e onde
ocorre o processo de hipermutação
somática. Como se estão a dividir, é altura
ideal para introduzir mutações (não são
aleatórias, são em locais específicos) na
parte variável dos genes das
imunoglobulinas. Os linfócitos B desta zona
são designados de centroblastos.

A zona clara é onde os linfócitos B que


acabaram de proliferar vão interagir com as
FDCs (células dendríticas foliculares), onde
vai ser testada a alteração da afinidade
gerada, podendo receber sinais de
sobrevivência via células T auxiliares e ao
mesmo tempo receber sinais de mudança
de classe das Ig. Os linfócitos B (mais
pequenos) desta zona são designados de
centrócitos.

Eventos moleculares na geração de células T auxiliares foliculares (TFh):

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

O linfócito T interage com o


LB na zona extrafolicular e há
uma interação fundamental
que tem de ocorrer para que
alguns destes linfócitos T
auxiliares se diferenciem em
T auxiliares foliculares que é
a interação entre o ICOS e o
seu ligando (ICOSL) ou ICOS-
ICOSL. Só após esta interação
é que existe a diferenciação.

O ICOS-L ou ligando do ICOS


é expresso pelo linfócito B
ativado e o ICOS é expresso pela célula T ativada (que expressa CXCR5) que se diferencia em T auxiliar folicular,
após a interação ICOS-ICOSL.

A consequência desta interação ICOS-ICOSL é a diferenciação da célula T em célula T auxiliar folicular com um
concomitante aumento de expressão de Bcl-6 (fundamental para a entrada dos LB nos folículos) nesta célula.
Este resulta de um sinal via TCR elevado (devido à interação com a célula dendrítica). Uma percentagem destas
células, após a interação com DCs (sinal 1 e 2) passam a expressar CXCR5 que as leva a migrar para os folículos.
As células T auxiliares foliculares (TFH ou Tfh) vão para o folículo formar o centro germinativo, onde estão
presentes as células dendríticas foliculares (FDCs) e os linfócitos B que para aí migraram.

Existe uma citocina produzida pelas células T auxiliares foliculares que é a IL-21 e que é fundamental para a
regulação da reação do centro germinativo.

Papel da IL-21 na reação do centro germinativo:

A IL-21 pelas Tfh no centro germinativo é muito importante para: a proliferação dos linfócitos B, para existir a
mudança de classe de IgG para IgA e para a diferenciação do LB em plasmócitos.

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Recapitulando-se…

- Quando os linfócitos B recebem ajuda dos linfócitos T (por antigénios dependentes de células T) entram nos
folículos e dividem-se rapidamente. As células B, conjuntamente com as células T auxiliares foliculares e as
células dendríticas foliculares, formam o centro germinativo.

- Os centros germinativos são constituídos por duas zonas: a zona clara e escura. A zona escura é onde os
linfócitos B se dividem muito rapidamente e sofrem o processo de hipermutação somática. A zona clara é onde
o LB interage com as células T e as células dendríticas foliculares e onde células B que possuam BCRs com alta
afinidade para antigénio são selecionados.

- As células B da zona escura denominam-se de centroblastos (blastos, células em divisão) e as células B da


zona clara são os centrócitos. O movimento entre estas duas zonas é orquestrado/”arranjado” por modificações
na expressão de recetores de quimiocinas.

- Os linfócitos B da reação do centro germinativo (GC B cells) são suscetíveis/propensos a sofrerem apoptose.
A sua sobrevivência requer interações produtivas com as células T foliculares auxiliares e com as células
dendríticas foliculares. As células B que mutaram o seu BCR resultando em alta afinidade para o antigénio, vão
ser capazes de apresentar níveis mais elevados de antigénio a linfócitos T e assim receber maior quantidade de
sinais de sobrevivência (fornecidos pelas células T foliculares auxiliares).

Recapitulam-se aqui as
funções e citocinas secretadas
por células T auxiliares:

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Aula 19 – Processos de hipermutação somática e mudança de classe das imunoglobulinas;


Mecanismos efetores da resposta humoral

Seleção de células B nos centros germinativos:

Este esquema relembra que uma


célula B folicular é ativada por interação
com um antigénio nos folículos dos
gânglios linfáticos, que é onde estas
células se localizam. Após esta
interação, o linfócito B ativado vai
interagir com uma célula T auxiliar na
região extrafolicular.

Alguns destes linfócitos B


diferenciam-se em plasmócitos e
produzem as imunoglobulinas que
constituem a primeira resposta
humoral. No entanto, há outros LB que
vão entrar na reação do centro
germinativo, fundamental para existir
hipermutação somática. No centro
germinativo existem duas zonas: a zona
escura (LB em fase intensa de ciclo
celular – ocorrem mutações pontuais
nos genes das imunoglobulinas na
parte variável que pode permitir
aumentar a afinidade do BCR para o
antigénio) e a zona clara.

A afinidade BCR-antigénio vai ser


testada na zona clara por interação com
as células dendríticas foliculares (FDCs)
e com as células T foliculares auxiliares
(Tfh).

No centro germinativo apenas linfócitos B que têm alta afinidade para o antigénio apresentado pelas células
dendríticas foliculares é que são selecionados. A interação com as Tfh também permite que os linfócitos B, que
sofreram a hipermutação somática, recebam um sinal de sobrevivência.

Todas as células cujas mutações acumuladas não aumentem a afinidade para o anticorpo não sobrevivem na
reação do centro germinativo, morrendo.

Há um enzima fundamental tanto para a hipermutação somática como para a mudança de classe que é o AID
(activation-induced cytidine deaminase). O AID é um desaminase que converte a citidina em uridina (também é
correto dizer citosina em uracilo, quando nos referimos às bases no DNA, isto porque citidina é a citosina
associada ao anel de ribose e a uridina é o uracilo ligado ao anel de ribose).

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Hipermutação somática ou maturação de afinidade:

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As imunoglobulinas são constituídas por duas cadeias pesadas e duas cadeias leves
com regiões variáveis e constantes. Na hipermutação somática, a partir de uma
molécula de IgM primária (expressa pelo LB imaturo), existe a introdução de mutações
na parte variável das imunoglobulinas.

Note-se que estas mutações não são aleatórias! Estas mutações tendem a acumular-
se nas regiões hipervariáveis ou determinantes de complementaridade – são as
regiões que entram em contacto direto com o antigénio.

As mutações na região variável aumentam com o tempo e com imunizações


repetidas, de tal forma que, a afinidade do anticorpo para o antigénio tende a
aumentar também.

Note-se que apenas os linfócitos B cujas mutações introduzidas nas regiões variáveis
lhes permite ter mais afinidade com o antigénio é que são selecionados.

As mutações, portanto, vão acumulando-se de tal forma que nas regiões V (variável)
das Imunoglobulinas, CDR1, CDR2 e CDR3, vão aumentando o número de mutações
ao longo das imunizações. Isto é, se na primeira imunização existe uma mutação em
CDR3, na segunda ou passados alguns dias já existe em outros e vai aumentando
sucessivamente. Concomitantemente, Kd (constante de dissociação do BCR para o
antigénio) vai diminuindo com o aumento das mutações, ou seja, a afinidade
anticorpo-antigénio aumenta.

O enzima AID é absolutamente essencial/necessário para a reação de hipermutação


somática, pois induz mutações no DNA por desaminação da citosina em uracilo (que
é reconhecido como timina), passando-se de G:C para U:G.

O objetivo da hipermutação
somática é aumentar a afinidade
dos anticorpos para os antigénios,
isto à custa de introdução de
mutações nas regiões variáveis.
Apenas mutações que aumentem
a afinidade são depois
selecionadas na reação do centro
germinativo. O AID inicia este
processo porque introduz esta point mutation (C>U),
promovendo a ativação dos mecanismos de reparação de
DNA. A uridina não só não é parte do DNA como não
emparelha com a guanosina na cadeia de DNA
complementar. A ativação destes mecanismos de reparação
de DNA (mismatch repair ou base-excision repair) leva à introdução de novas mutações no local C:G original e
também na vizinhança deste.

Regiões hipervariáveis:

A parte variável de um anticorpo reconhece os epítopos ou determinantes antigénicos do antigénio. Ora, o


contacto com o antigénio ocorre nas tais regiões hipervariáveis – CDR1, CDR2 e CDR3 – onde existe maior
variabilidade de aminoácidos.

209
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

As regiões hipervariáveis estão localizadas na parte variável das imunoglobulinas isto é, na parte variável das
cadeias pesadas e das cadeias leves. Estas regiões hipervariáveis estão em contacto com o antigénio. A parte
do antigénio que é reconhecida pelo anticorpo são os epítopos ou determinantes antigénicos. As mutações que
ocorrem durante o processo de hipermutação somática tendem a localizar-se nestas regiões hipervariáveis dos
anticorpos.

Mudança de classe/isotipo:

Um linfócito B na presença de antigénios T-


independentes, isto é, sem o auxílio de células T
dá origem a plasmócitos de curta duração que
secretam essencialmente IgM.

A mudança de classe dá-se após a


IL-21
diferenciação de linfócitos B em plasmócitos
(por antigénios T-dependentes: sinal via
CD40/CD40L, BCR, citocinas). Estes sinais
determinam qual vai ser a classe que a molécula
de anticorpo vai expressar. O isotipo determina
as funções efetoras que o anticorpo vai
desempenhar:

- IgM: importante para a ativação do


complemento.

- IgG1 e IgG3: a mudança de isotipo para estas


subclasses é induzida por IL-21, que são cruciais
na opsonização e fagocitose; também possuem
um papel na ativação do complemento e são
igualmente importantes na transferência da
imunidade da mãe para o feto. O IFN-γ promove switch para IgG3, mas inibe switch para IgG1.

- IgE e IgG4: a IL-4 induz a mudança de IgM para IgE e IgG4, que são importantes na imunidade contra
helmintas, apesar de terem um efeito secundário menos benéfico que é a indução da desgranulação de
mastócitos que pode levar a reações alérgicas (hipersensividade).

- IgA: é um isotipo de Ig fundamental na imunidade das mucuosas e epitélios. A mudança de isotipo de IgM
para IgA requer as citocinas TGF-β, APRIL, BAFF, entre outras.

210
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Diferentes citocinas produzidas por LT auxiliares promovem switching para diferentes isotipos:

IL-4: induz a mudança de IgM para IgG1, IgG4 e IgE. Inibe IgM, IgG3 e IgG2a; esta inibição é um papel indireto,
por indução da mudança para os primeiros isotipos mencionados.

É importante saber que são as citocinas produzidas pelo LT CD4 + que determinam a mudança de classe. Dentro
destas, é importante reter que IL-4 promove a mudança de classe para IgE, que TGF-β promove switch para IgA,
e IL-21 para IgG1 e IgG3.

Não esquecer que IgG2a e IgG2b existem apenas em ratinhos. Em humanos as subclasses de IgG são IgG1,
IgG2, IgG3 e IgG4.

211
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Recombinação switch/para mudança de classe ou isotipo:

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Na mudança de classe ou isotipo, não existe qualquer alteração na parte


variável do anticorpo, isto é, muda apenas a parte constante de Ab.

Representou-se a organização do locus da cadeia pesada após o rearranjo VDJ


e antes da mudança de classe (class switching), onde já se deu o rearranjo na
parte variável da imunoglobulina. Existem umas regiões essenciais para a
existência da mudança de classe denominadas de switch (S) – são específicas e
sempre localizadas a montante de cada gene constante (por exemplo, S μ é a
região switch específica a região constante da IgM, Sε é a região switch
específica a região constante da IgE, as várias Sγ da IgG e a Sα para a IgA),
excetuando a IgD que não possui a região switch a montante. Em suma, a
recombinação para mudança de classe envolve recombinação entre regiões
switch específicas (sequências de DNA repetitivas localizadas a montante de
cada gene C exceto para a δ – IgD).

É um processo iniciado pelo AID (activation-induced cytidine deaminase),


também envolvido no processo de hipermutação somática. UNG, APE1 e
maquinaria DSBR (exemplos de alguns constituintes: DNA-PK e Ku) – Double-
Strand Break Repair - também estão envolvidos neste processo.

Para existir a mudança de classe, por exemplo de IgM para IgE, existe a
deleção do DNA entre as regiões switch da IgM e da outra classe para a qual se
pretende mudar (neste caso ε, IgE). Assim, a parte variável passa a estar
imediatamente a montante da região Cε (neste exemplo).

Na recombinação switch ocorre mudança de classe nos anticorpos


produzidos, na sua cadeia pesada da região constante, mantendo-se a região variável antes rearranjada. A parte
variável da Ig nunca se altera!

Por fim, um anticorpo que faça switch para IgG3 pode ainda fazer switch para IgE, IgG1, IgG2 ou IgA, pois estes
locus ainda não foram deletados. Por exemplo, um linfócito B que realize switch de IgM para IgE, só pode fazer
mais tarde um switch para IgA porque as outras regiões S já foram deletadas (só se mantém S α).

Sobre IgD

Contrariamente a todos os outros isotipos, não existe região switch para IgD no ratinho e assim não ocorre switch de IgM para
IgD. As células B maturas expressam tanto IgM como IgD à superfície. O mRNA da cadeia pesada das Igs nas células B maturas
codifica a região variável rearranjada e as regiões contantes de C μ e Cδ. Splicing alternativo é utilizado para gerar a forma
membranar de IgM ou IgD expressas à superfície dos LB maduros. Como também irá ser mencionado, a mudança de BCR (forma
membranar) para anticorpo (forma secretada) é também controlada por splicing alternativo.

Só por curiosidade (não é suposto saberem), em humanos existem atualmente algumas evidências que poderá haver213
uma região
não canónica de switch (switch-like region) que permite mudança de IgM para IgD. Mas a informação que se pretende que se
retenha, que é válida no ratinho, é a do parágrafo anterior.
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Recapitulando…

- A hipermutação somática é iniciada pela desaminação da citidina catalisada pelo enzima AID. Os mecanismos
seguintes de reparação do DNA causam alterações da sequência da região variável dos genes das
Imunoglobulinas. A atividade do AID relaciona-se com a transcrição de sequências que possuam muitas partes
específicas sinalizadas para transcrição. Estas sequências sinalizadas encontram-se frequentemente em áreas
dos genes das imunoglobulinas envolvidos em SHM (somatic hypermutation) e CSR (class-switch
recombination).

- O processo de recombinação para mudança de classe resulta na substituição da cadeia pesada da região
constante de um anticorpo por uma região constante diferente, originalmente localizada a 3’ (a montante) da
primeira. A regulação para a qual a cadeia pesada da região constante vai ser alterada é mediada pelas citocinas
que são produzidas pelos linfócitos T auxiliares ou por outras células do sistema imune (mas essencialmente
das citocinas produzidas pelas TH).

- A Cμ localiza-se a montante das outras regiões constantes. Pode ocorrer switch de IgM para qualquer outro
isotipo a jusante (com a exceção de IgD). No caso de IgE, o switch só poderá ocorrer para IgA (a única região
constante presente a jusante). As regiões de switch encontram-se a montante de cada uma das regiões
constantes.

AID => crítica para SHR (hipermutação somática) e CSR (recombinação para mudança de classe):

• Ratinhos KO (knockout) para AID não são capazes de efetuar hipermutação somática nem mudança
de classe das imunoglobulinas (Muramatsu et al. 2000 Cell);
• Pacientes com mutações em AID (perda de função) não efetuam mudança de classe e exibem uma
redução dramática na capacidade de hipermutação somática (Revy et al. 2000 Cell);
• Ratinhos KO para AID e doentes com mutações em AID produzem elevados títulos (concentração de
anticorpos que aumenta por imunização) de anticorpos IgM contra proteínas (não conseguem fazer
mudança de classe para outro isotipo, acumulando IgM) => síndrome de hiper IgM tipo 2 (síndrome
de IgM que resulta de mutações no enzima AID).
• O síndrome de hiper IgM tipo 1 resulta de mutações em CD40L (X-linked), sinal crucial vindo do LT.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

A diferenciação de um LB em plasmócito requer alteração das cadeias pesadas da forma membranar para a
secretada:

hidrófoba

O BCR à superfície da célula encontra-se embebido na membrana plasmática possuindo, portanto, um


segmento hidrófobo. Este recetor está sempre associado às moléculas de Ig α e Ig β que permitem a sinalização
via BCR, visto que a porção citoplasmática do recetor é muito pequena (o mesmo acontece com o TCR).

Assim, o segmento hidrófobo, para estancar o BCR na membrana, é constituído por aminoácidos hidrófobos.
No entanto, a região C-terminal hidrófoba do BCR, aquando da secreção do anticorpo, é substituída por uma
região hidrófila.

215
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

A forma membranar (BCR) ou secretada (Ab) das Ig deriva da mesma sequência da cadeia pesada e é
determinada por splicing alternativo:

A síntese das porções hidrófilas e hidrófobas são levadas a cabo pelo splicing alternativo, que permite a
distinção da forma membranar da forma secretada.

Mostra-se o locus da sequência de DNA que codifica para a IgM transmembranar é o mesmo da IgM secretada
e encontra-se totalmente rearranjado (sendo a IgM expressa num LB maturo). A diferença vai-se notar na
escolha entre a região SC (secretion-coding, que codifica para o C-terminal da forma secretada) ou a região M
(2 exões - M1 e M2 - que codificam para a região transmembranar). Têm ainda 2 locais de poli-adenilação (AS e
AM), onde apenas se mantém um, tendo em conta se a IgM vai para a superfície (mantém-se AM) ou vai ser
secretada (mantém-se AS).

Assim as regiões para secreção (sequência SC e AS) são deletadas por splicing alternativo se o objetivo for
introduzir a molécula de IgM na superfície (os exões M1 e M2 – região hidrófoba - mantêm-se, assim como AM);
senão, e se o objetivo for secretar a IgM, então eliminam-se por splicing alternativo as regiões que codificam
para a IgM transmembranar (nomeadamente, são excisados os exões M1 e M2 e A M) e mantêm-se SC – região
hidrófila - e AS. Por fim, há a poli-adenilação no local correspondente.

216
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Entretanto, a molécula de DNA é transcrita e o mRNA traduzido na proteína correspondente.

Mecanismos efetores da resposta humoral:

- A resposta humoral do sistema imune refere-se às atividades dos anticorpos secretados pelos plasmócitos
(diferenciação terminal de linfócitos B).

- A especificidade de antigénio, classe ou subclasse, e a capacidade de ligação ao recetor Fc (FcR) são


características importantes dos anticorpos para determinar a sua função efetora.

- Os anticorpos podem exibir várias funções, nomeadamente inibir e eliminar infeções por bloqueio da
capacidade dos microrganismos patogénicos de se ligarem a recetores celulares (não infetado – neutralização),
por cross-linking destes mesmos patogénios (pelo processo de aglutinação), por “revestimento”/ligação aos
microrganismos permitindo que estes sejam reconhecidos e fagocitados pelas células do sistema imune inato
(opsonização), podem recrutar o complemento ao patogénio (ativação do complemento), podem direcionar
outras células do sistema imune inato a matar células infetadas (por exemplo: NK – por um processo de
citotoxicidade dependente de anticorpos) e podem induzir desgranulação e libertação de mediadores dos
granulócitos (exemplo: desgranulação dos mastócitos).

Função efetora dos anticorpos:

217
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Demonstram-se as funções efetoras que os anticorpos podem exibir, anteriormente mencionadas. Os


anticorpos podem neutralizar patogénios e toxinas; podem impedir a ligação às células e aumentar a sua
eliminação via aglutinação dos antigénios; podem facilitar a opsonização de fagócitos como macrófagos ou
neutrófilos; podem recrutar complemento e induzir morte dos microrganismos por ativação do complemento
via formação do complexo de ataque que leva à lise dos microrganismos; podem ativar a citotoxicidade células
NK via citotoxicidade dependente de anticorpos; podem induzir desgranulação em granulócitos (como a dos
mastócitos – importante na resposta contra helmintas, apesar de favorecer reações alérgicas).

Estrutura das diferentes Classes de Imunoglobulinas:

• IgM é sempre secretada por linfócitos B que não interagiram com LT. É um pentâmero.
• A IgG, a IgE e a IgD são monómeros (uma molécula de anticorpo).
• A IgA é um dímero.

A IgA e a IgM funcionam como polímeros (várias moléculas de anticorpos). Para a formação destas moléculas
é necessária a peça secretória (importante para a proteção dos polímeros nos tecidos, impedindo a proteólise)
e a cadeia J (junta os vários monómeros).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

• IgG:

- Em humanos há 4 diferentes subtipos/subclasses: IgG1, IgG2, IgG3 e IgG4.

- É a imunoglobulina mais presente no soro (constitui 80% das Ig no soro).

- É a imunoglobulina com maior tempo de semivida (7 a 21 dias).

• IgA:

- Forma dímeros, sendo duas moléculas de IgA ligadas pela peça secretória e cadeia J.

- Em humanos, há duas subclasses: IgA1 e IgA2.

- Tem um tempo de semivida de 5 a 6 dias.

- É uma imunoglobulina pouco frequente no soro (250 a 300 mg/dL).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- A maioria da IgA que está no soro é de IgA1.

- A IgA é a imunoglobulina mais presente nas mucuosas (é a imunoglobulina em maior quantidade no geral,
porque a extensão das mucuosas é superior à do soro).

- Na boca, esófago e estômago predomina a IgA1.

- No intestino delgado e no intestino grosso predomina a IgA2.

- A IgA2 tem a vantagem de ser resistente a proteases de bactérias que degradam a IgA1.

- Papel crucial na resposta imunológica das mucosas.

- Neutralização de patogénios e suas toxinas no lúmen.

- Peça secretória/componente secretor: protege a IgA da


degradação por ácidos gástricos e enzimas do aparelho
digestivo.

Encontra-se representada uma célula epitelial entre o lúmen


e a submucosa e nesta encontra-se representado um
plasmócito que produz IgA (ligada pela cadeia J) que se liga a
um recetor – Poly-Ig receptor - que permite a passagem da IgA
da submucosa para o lúmen onde se encontra com os
microrganismos. Ao ligar-se ao recetor, a IgA é endocitada para
a célula epitelial e aqui há degradação do recetor de poli-
imunoglobulinas, sendo que da clivagem enzimática do recetor
resulta o componente secretor ou peça secretora que se
associa ao dímero de IgA. Este componente protege a IgA da
degradação por ácidos gástricos e enzimas do aparelho
digestivo.

Este recetor
Poly-Ig é um
exemplo de recetor Fc (muito importantes para a função que os anticorpos desepenham).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

• IgE:

- É uma imunoglobulina muito pouco presente no soro


(cerca de 0,0015-0,2 mg/dL).

- Tem um tempo de semivida de 2 dias e meio (2.5).

Encontra-se representado um mastócito que tem


à sua superfície recetores de Fc específicos de IgE
(Fcε), de tal forma que as IgE ligadas a um alergénio
se ligam a esse recetor.

Esta ligação leva a desgranulação dos mastócitos


e libertação dos grânulos. Nos grânulos
encontram-se componentes como a histamina e
outras substâncias que medeiam as reações
alérgicas.

• IgD:

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- É uma imunoglobulina raramente secretada.

- Até há pouco tempo pensava-se que nem teria qualquer função.

- Sabe-se atualmente que a IgD pode ser secretada na mucosa do trato respiratório superior e aí exercer
algumas funções importantes, como a proteção contra patogénios que colonizem o trato respiratório superior.

- Pensa-se que a IgD, no trato respiratório superior, leva à libertação por basófilos de fatores imunoativadores,
pró-inflamatórios e antimicrobianos como a IL-4, BAFF, IL-1β, TNF e catelicidina.

- Tem um tempo de semivida de 3 dias e uma abundância de 0,3 a 3,0 mg/dL no soro.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Funções principais das imunoglobulinas:

- A IgM é a imunoglobulina mais pesada (970


kDa), visto que forma pentâmeros.

- As IgG são as mais frequentes no soro,


nomeadamente a IgG1, enquanto que a IgE é
quase inexistente assim como a IgD. As IgG são
igualmente as que têm maior tempo de
semivida, sendo a IgE a que tem menor tempo
de semivida.

- A IgM principalmente, a IgG3 e a IgG1 são


importantes para a ativação da via clássica do
complemento.

- A IgG1 e a IgG3 são as imunoglobulinas


transferidas da mãe para o feto pela placenta.

- A capacidade de funcionar como opsoninas,


isto é, ligar a recetores Fc em fagócitos como
macrófagos e neutrófilos para facilitar a
fagocitose e atividade microbicida é
característica das IgG1, IgG3, IgA e IgE.

- A capacidade de ligação a mastócitos e


basófilos via recetores Fcε e induzir a
desgranulação dos mesmos é característica
das IgE.

- A IgD leva à libertação por basófilos, no trato respiratório superior, de fatores imunoativadores, pró-
inflamatórios e antimicrobianos como a IL-4, BAFF, IL-1β, TNF e catelicidina.

- A IgA possui um papel crucial na resposta imunológica das mucosas (mais abundante no geral).

NOTA IMPORTANTE (esclarecimento do papel das IgD e IgE):

A IgE liga-se aos FcεRI expressos em mastócitos e basófilos e quando o antigénio se liga a esta ocorre
desgranulação dos mastócitos e basófilos.

O papel da IgD secretada é ainda pouco claro. Mas foi demonstrado recentemente que no trato respiratório
superior esta liga-se a um recetor específico expresso em basófilos (não o FcεRI), induzindo a produção por
basófilos de citocinas como IL-4, IL-13, BAFF, TNF e IL-1β assim como de catelicidina.

É importante realçar que crosslinking com IgD não promove libertação de histamina por basófilos, o que
acontece com a IgE. E o efeito de crosslinking por IgD, contrariamente a IgE, não se traduz em desgranulação,
mas sim na produção destes mediadores.

A IgE quando ligada ao recetor FcεRI e associada ao antigénio, induz desgranulação dos mastócitos e basófilos.

A IgD não se liga via o mesmo recetor e não induz desgranulação de basófilos, mas sim induz produção de
vários mediadores por estas células.

224
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Aula 20 – Mecanismos efetores da resposta humoral: recetores Fc e sistema do Complemento

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Função dos Recetores Fc:

Os recetores Fc são
responsáveis pela maioria
dos efeitos/das funções
das diferentes classes das
imunoglobulinas.

Aqui demonstram-se os
diferentes recetores Fc e as
diferentes funções que
estes podem
desempenhar. Existem
diferentes tipos de
recetores e estes são
expressos em diferentes
tipos de células.

Em basófilos e mastócitos existe o recetor Fcε (FcεR), de tal forma que a ligação das imunoglobulinas,
nomeadamente IgE, a este recetor, leva à desgranulação destes, isto é, libertação dos grânulos que contêm,
por exemplo no caso dos mastócitos, histamina.

Algumas imunoglobulinas como a IgG e a IgA (recetores Fcα e Fcγ ou FcαR e FcγR, respetivamente) têm a
capacidade de funcionar como opsinas facilitando a opsonização – capacidade de aumentar a eficiência da
fagocitose. Células como macrófagos e neutrófilos expressam estes recetores, recetores Fcα (IgA) e Fcγ (IgG),
que por ligação às imunoglobulinas aumentam a sua capacidade fagocítica.

Por outro lado, existe o recetor FcRN (recetor Fc neonatal) que se liga à IgG. Este recetor de IgG´s é
fundamental para o transporte de imunoglobulinas (IgG) da mãe para o feto.

Adicionalmente, existe o recetor Fcγ que, além de estas envolvido na opsonização, FcγR está ainda associada
à citotoxicidade mediada por células NK (processo de citotoxicidade dependente de anticorpos). Os recetores
Fcγ são expressos em células NK e a ligação das IgG’s desencadeia a ação citotóxica destas células por libertação
de grânulos citotóxicos.

Por fim, o recetor de imunoglobulinas poliméricas (plgR ou Poly-Ig receptor) auxilia o transporte de IgA – que
forma dímeros – e IgM – que forma pentâmeros. É essencial no transporte de IgA da submucosa para o lúmen,
de tal forma que, por transcitose (passagem/transporte de macromoléculas em vesículas por endocitose e
exocitose), o dímero de IgA passa pelas células epiteliais e forma o componente secretor/peça secretória que
protege os dímeros de IgA contra proteases.

Em suma:

- Os recetores Fc que ligam a classes ou subclasses de imunoglobulinas específicas, são responsáveis por
muitas das funções efetoras dos anticorpos. Estas funções incluem fagocitose de complexos anticorpo-antigénio
por macrófagos e neutrófilos; transcitose de anticorpos através de células epiteliais (dímeros de IgA); lise de
células infetadas, às quais se ligam anticorpos, por células NK (ADCC – antibody-dependent cell-mediated
cytotoxicity); proteção de anticorpos presentes no soro da degradação; indução de desgranulação (Fcε expresso
em mastócitos) com libertação de mediadores dos granulócitos; regulação da atividade de células do sistema
imune inato.

226
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- Os FcR’s são expressos por muitos tipos de células no corpo e geram/originam sinais quando se ligam a
complexos anticorpo-antigénio. Estes recetores ligam imunoglobulinas que estão associadas a um antigénio.
Estes recetores Fc geram sinais que podem ser tanto ativadores (só se mencionaram deste tipo) como inibidores
da atividade da célula. Se um FcR é ativador ou inibidor depende se na via de sinalização de recetor inclui ou
está associado a um motivo proteico ITAM (ativador) ou a um ITIM (inibidor).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Sistema do complemento:

- Mecanismo da imunidade inata (parte do sistema imune inato);

- É um dos principais mecanismos efetores da imunidade humoral (mediada por


anticorpos);

- Tem esta designação porque se trata de uma cascata bioquímica que ajuda ou
“complementa” a capacidade dos anticorpos de eliminar microrganismos de um
hospedeiro;

- No entanto, pode ser recrutado e colocado em ação pelo sistema imune


adquirido/adaptativo (a via clássica é ativada por complexos antigénio-anticorpo);

- O sistema de complemento consiste num conjunto de proteínas do soro e da


superfície da célula que interagem com outras moléculas do sistema imune de uma
maneira altamente regulada para gerar produtos cuja principal função é a eliminação
de microrganismos;

- O sistema de complemento é ativado por microrganismos e por anticorpos que se


ligam e reconhecem microrganismos ou outros antigénios;

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- A ativação do complemento envolve uma proteólise sequencial de proteínas


para gerar complexos enzimáticos que possuem atividade proteolítica;

- Muitos dos produtos biologicamente ativos resultantes da clivagem do


complemento (componentes do sistema do complemento) associam-se
covalentemente às superfícies das células dos microrganismos, a anticorpos a
reconhecer/ligados a microrganismos e outros antigénios e a corpos apoptóticos.

A ativação da via clássica do complemento é iniciada por ligação de C1q a


anticorpos que estão ligados a epítopos expressos à superfície de
microrganismos. Este é um exemplo de um membro do sistema do complemento
associar-se a anticorpos ligados a microrganismos.

A MBL, ficolinas e C1q ligam-se a células apoptóticas, promovendo a sua


remoção por células fagocíticas via ligação aos recetores C1qR e CR1 expressos
por estas células. Este mecanismo está ilustrado mais à frente e é um exemplo da
ligação de componentes do sistema de complemento a corpos apoptóticos,
levando à remoção dos mesmos

Funções biológicas do Complemento:

• Indução da lise Celular: via formação do Complexo de ataque (MAC - conjunto de


proteínas do complemento que forma um poro inserido na membrana dos
microrganismos induzindo-lhes morte celular);
• Opsonização:
Fagocitose
(principalmente C3b,
mas também iC3b e
C4b) de macrófagos e neutrófilos;
• Ajudam no processo de inflamação:
quimitaxia, anafilatoxinas (C3a, C4a e C5a) –
aumentam a inflamação;
• Remoção de complexos imunes (antigénio-
anticorpo) e deposição dos mesmos no baço e fígado;
• Remoção de células apoptóticas por fagócitos
(C1q e MBL);
• Estimulação de respostas B: Facilitam a
ativação de células B por antigénios T-independentes
(componentes do complemento associados ao BCR
que facilitam a ativação do LB por diminuição do
threshold/limite).

229
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

A figura anterior mostra os diferentes componentes da cascata do complemento que possuem as diferentes
funções biológicas agora excecionalmente detalhadas:

- Inflamação:

• C3a: anafilatoxina que pode induzir desgranulação de


mastócitos e basófilos com libertação de substâncias
vasoativas como a histamina;
• C4a: anafilatoxina que ativa neutrófilos que libertam
prostaglandinas (PG) e espécies reativas de oxigénio e de
nitrogénio (ROS e RNS); aumenta a expressão de moléculas
de adesão e da quimiotaxia (resposta por um movimento
orientado por parte do organismo)
• C5a: anafilatoxina que atua em monócitos e macrófagos,
aumentando a expressão de moléculas de adesão e
induzindo a secreção de ROS e RNS, de PG’s e de IL-1 e IL-6.

A ligação dos compostos pró-inflamatórios C3a, C4a e C5a (também designadas por anafilatoxinas) a recetores
expressos por mastócitos e basófilos leva à libertação de histamina e outros mediadores vasoativos. Estas
mesmas anafilatoxinas, em neutrófilos induzem libertação de prostaglandinas, espécies reativas de oxigénio e
azoto e aumento de expressão de moléculas de adesão e quimiotaxia. No caso de macrófagos e neutrófilos, a
resposta a estas anafilatoxinas é semelhante à exibida por neutrófilos e inclui também produção de IL-1 e IL-6.

Todas estas anafilatoxinas têm potencial de atuar nestas diferentes populações.

- Fagocitose:

Principalmente C3b, mas também iC3b (C3b inativo) e C4b são importantes na ativação de neutrófilos e
macrófagos para o processo de fagocitose (opsonização). Assim, o C3b, o C3b inativo e o C4b ligam-se ao
microrganismo, sendo que o reconhecimento destes componentes do complemento por recetores expressos
em neutrófilos e macrófagos (CR1, CR3 e CR4) vai induzir a fagocitose destes microrganismos pelos neutrófilos
e macrófagos.

- Ativação e diferenciação de células B:

O processo de ativação de linfócitos B por componentes de complemento já foi referido, visto que associado
ao BCR encontra-se a molécula de C3d (reveste o antigénio – Ag) que se liga ao CR2 das FDCs (células dendríticas
foliculares). A ligação do antigénio com o fragmento C3d permite uma ativação mais eficiente do LB via BCR por

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

antigénios T-independentes (componentes do complemento associados ao BCR que facilitam a ativação do LB


por diminuição do threshold/limite).

- Remoção de complexos imunes (antigénio-anticorpo) e deposição dos mesmos no baço e fígado:

Os complexos imunes ativam o sistema do complemento. O C3b gerado liga-se a esses complexos e ao CR1
presente na superfície dos eritrócitos. Durante a circulação das hemácias através dos sinusoides no fígado e
baço, fagócitos aqui residentes removem-lhes os complexos ligados (aos eritrócitos) permitindo a sua libertação
e deposição.

- Indução da lise celular via formação do complexo de ataque de membrana ou MAC:

O MAC é um conjunto de proteínas do complemento que forma um poro inserido na membrana dos
microrganismos induzindo-lhes morte celular.

Anticorpos específicos como MBL/ficolinas e a hidrólise espontânea de C3 (C5b-C9) ativam o complemento


na superfície de microrganismos infetados permitindo a formação dos membrane-attack complexes (MAC), que
causam a sua lise.

- Remoção de células apoptóticas por fagócitos:

Lectina ligada a manoses, ficolinas (MBL) e C1q ligam-se a dedritos de células apoptóticas, que são
subsequentemente removidas através da ligação aos recetores de C1qR e CR1 em células fagocíticas.

Propriedades gerais do sistema de complemento:

- Presente no soro de todos os mamíferos e outros animais, incluindo aves, anfíbios e peixes.

- Componente sorológico (no soro) não-específico: complemento de uma espécie pode reagir com anticorpos
de outras espécies (exemplo: o complemento de humano funciona bem com anticorpos de galinha).

- As proteínas do complemento correspondem a cerca de 5% das proteínas do soro e a quantidade de


proteínas do complemento não aumenta por imunização (contrariamente aos anticorpos que aumentam por
imunização). [O título é a concentração dos anticorpos. Esta aumenta com a imunização.]

- Sensível ao calor; destruído em 30 min a 56˚C (suficiente para inativar o complemento).

- Soro inativado (soro do meio de cultura): soro sem complemento ativo (inativado) para impedir que as células
possam ser lisadas.

Componentes do complemento:

As proteínas do complemento são sintetizadas por:

- Essencialmente hepatócitos (a maioria das proteínas do complemento são produzidas por células do fígado);

- Monócitos;

- Macrófagos;

- Neutrófilos;

- Células epiteliais (do trato gastrointestinal e geniturinário - relativo aos órgãos genitais e à excreção da urina
= urogenital).

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Apesar da maioria ser produzida por hepatócitos, podem-no ser por célula do sistema imune inato e pelas
células epiteliais como anteriormente referido.

Nota: os componentes do complemento circulam como proenzimas, isto é, circulam como enzimas inativos a
serem ativos no local (inativos – indicado por “i”, como iC3b) que são clivados de modo a expor o sítio ativo.

Por fim, os componentes do complemento têm um tempo de semivida curto.

Designação:

A nomenclatura do complemento é complexa e variável. Aos componentes (C) da cascata do complemento


dá-se um número de 1 a 9. Existem outros que são designados por letra, nomeadamente os componentes da
via alternativa designados por fatores. Existem nomes triviais como decay-accelerating factor (proteína
reguladora da cascata do complemento).

Os fragmentos designam-se por um número e uma letra, sendo o fragmento a o mais pequeno (à exceção do
C2, onde o C2a é o maior) como C3a (os fragmentos menores usualmente têm outras funções, como a C3a e a
C5a que funcionam como anafilatoxinas – aumentam a inflamação) e o b o fragmento maior que continua
envolvido na cascata de ativação como o C3b.

Os fragmentos b são sempre os maiores e são aqueles que participam na cascata do complemento. A única
exceção é realmente o C2. Neste caso o fragmento C2a é o que está envolvido na cascata e é maior que o C2b
̅̅̅̅̅̅̅̅̅
Por fim, a barra em cima dos diferentes complexos significa que eles estão ativos (como, por exemplo, 𝐶4𝑏2𝑎
que é o fragmento “b” do C4 associado ao fragmento “a” do C2 sendo o complexo C3 convertase ativo – pode-
se omitir o segundo C ou não).

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3 vias de ativação de complemento:

Existem 3 vias de ativação do


complemento: a clássica, a da lectina e a
alternativa.

A via clássica requer a formação de


complexos antigénio-anticorpo (precisa de
anticorpos); na via da lectina existe
reconhecimento dos resíduos de manose
ligados a lectinas expressas na parede celular
dos microrganismos por parte das MBL
(mannose-binding lectin) ou ficolinas (é uma
via que não precisa de anticorpos); a via
alternativa não requer anticorpos.

Todas estas vias levam à formação de um


complexo denominado de C3 convertase,
posteriormente C5 convertase e, por fim,
forma-se sempre o complexo de ataque de
membrana (MAC) – poro na membrana dos
microrganismos, induzindo choque osmótico
e subsequentemente a lise celular.

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Vias de ativação do Complemento:

- Passos iniciais diferentes culminam com a


formação de C3 convertase que cliva o C3 em C3a
e C3b; o C3b associa-se ao C3 convertase
formando o C5 convertase; isto pode ocorrer
pelas 3 vias: clássica, alternativa ou da lectina.

- Passos finais levam à formação do MAC

(membrane-attack complex) e são idênticos


nas 3 vias.

A figura mostra que na ativação do


complemento pela via clássica existem
anticorpos que reconhecem antigénios
expressos à superfície do microrganismo onde
o C1q é fundamental para reconhecer estes
complexos. Forma-se o C3 convertase e
subsequente formação do C5 convertase e
finalmente do complexo de ataque de
membrana e sua inserção na membrana celular
dos microrganismos, com disrupção da
integridade da membrana e consequente
entrada de água e sais (choque osmótico) e lise
dos microrganismos.

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Geração de C3 e C5 convertases:

As 3 vias – da lectina, clássica e alternativa – levam à formação primária do C3 convertase e, depois, do C5


convertase, independentemente da ativação destas vias ser diferente. O C3 convertase e o C5 convertase
funcionam como amplificação da cascata do complemento.

Na via clássica e na via lectina, o C3 convertase é constituído pelos mesmos fragmentos: fragmento do C4 e
fragmento a do C2 (C4bC2a). No caso da via alternativa, o C3 convertase é constituído pelo fragmento b do fator
B associado ao fragmento b do C3 (C3bBb).

Tal como para o C3 convertase, também o C5 convertase é igual nas vias clássica e da lectina e diferente na
alternativa. Além disso, o C5 convertase é sempre o C3 convertase associado a um fragmento b do C3. (C5
convertase = C3 convertase + C3b). Assim, nas vias da lectina e clássica, o C5 convertase é o C4bC2aC3b e na via
alternativa é o C3bBbC3b.

A iniciação de cada uma das vias será abordada posteriormente. A terminação pode resultar na formação do
complexo de ataque (com lise do microrganismo – C5b), ou de intermediários como para a inflamação pelos
componentes C3a e C5a (pró-inflamatórios/anafilatoxinas) e ainda na opsonização pelo C3b (facilita a fagocitose
por parte dos macrófagos e neutrófilos).

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Ativação do Complemento pela Via Clássica:

- Única via dependente de anticorpos.

- Ativada por complexos antigénio-anticorpo


(usualmente IgM e IgG, classes de imunoglobulina capazes de ativar eficientemente o complemento). Uma IgM
é suficiente (a IgM ativa mais eficazmente); são necessárias várias IgG. Anticorpos ligados a antigénio (o
anticorpo tem de estar associado ao antigénio para ativar o complemento); Anticorpos solúveis ou circulantes
não ativam o complemento.

- Nos estadios iniciais são necessários os componentes: C1, C2, C3 e C4, para formação do C3 convertase.

A cor-de-pele representa-se a
membrana celular do
microrganismo onde se encontram
antigénios expressos e estes são
reconhecidos pelos anticorpos (a
verde). O primeiro componente da
ativação da via clássica do
componente é o C1q. Este liga-se
ao complexo anticorpo-antigénio e
por indução de uma modificação
conformacional ativa a molécula
de C1r. Esta, por sua vez, ativa o
C1s (protease de serina). Após a
ativação deste complexo C1, o C1s
cliva o C4 em C4a e C4b. O C4b liga-
se à superfície do microrganismo
num local perto de onde o C1 se
encontra ligado. O C4b liga-se ao

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C2 e o C1s cliva o C2 em C2a e C2b, de tal forma que o C2a permanece ligado
ao C4b formando o C4bC2a ou C4b2a ou C3 convertase.

O C3 convertase atua sobre C3, clivando-o em C3b e C3a, de tal forma que o
C3a é libertado e o C3b associa-se ao C3 convertase para formar o C5
convertase (C4b2a3b). O C5 convertase cliva C5, em C5a e C5b. O C5b liga-se à
superfície do microrganismo e C5a é libertado.

Com a formação do C5b, é desencadeado o passo final da cascata do


complemento onde se dá a formação do MAC.

Aqui C5b liga-se a C6, C7, C8 e várias moléculas de C9 formando o complexo


de ataque de membrana.

MAC:

- Forma
poros na
membrana
celular do

microrganismo.

- Iões e moléculas pequenas podem passar através dos


poros.

- Células não conseguem manter a estabilidade osmótica,


com lise celular dos microrganismos.

- Formação do MAC ocorre nas 3 vias de ativação do


complemento, e cascatas são similares (do C5b até à
formação do MAC é exatamente igual nas 3 vias).

O MAC é o complexo de ataque de membrana e induz lise


dos microrganismos via inserção na membrana plasmática.

O MAC é “montado” à superfície dos microrganismos. A maioria das bactérias possuem uma parede celular
externa à membrana plasmática e o poro formado pelo MAC tem que atravessar esta parede. De facto, a lise

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mediada pelo MAC tende a ser bem mais eficiente no caso de bactérias gram-negativas que gram-positivas,
uma vez que a camada de peptidoglicano é mais fina nas primeiras.

Recapitulando…

- A ativação do complemento ocorre por 3 vias – clássica, da lectina e alternativa. Todas estas convergem
numa sequência comum de eventos que leva à lise dos microrganismos, apesar de serem iniciadas de maneiras
diferentes.

- O objetivo inicial é formar o C3 convertase e o C5 convertase que funcionam como amplificadores da cascata
do complemento. O C5 convertase permite a clivagem de C5 em C5a e C5b. O C5b é o primeiro componente
que, associado a C6, C7, C8 e C9 forma o poro à superfície da membrana dos microrganismos.

- A via clássica é iniciada por anticorpos das classes de IgM ou IgG a antigénios multivalentes expressos pelos
microrganismos. De seguida, a molécula de C1 liga-se ao anticorpo ativando proteases de serinas associados ao
C1 (C1s) que catalisam a hidrólise do C2 e do C4 (segundo e quarto componentes do complemento), libertando
os fragmentos C2a, C2b, C4a e C4b. O C2a associa-se à membrana num local próximo do C1, a reconhecer o
complexo antigénio-anticorpo. O C4a associa-se ao C2b formando um protease de serina ativado, denominado
de C3 convertase. O C3 convertase cliva C3 em C3a e C3b. O C3b associa-se ao complexo C3 convertase (C2a4b)
formando um protease de serina ativado denominado de C5 convertase (C2a4b3b). O C5 convertase cliva o C5
em C5a e C5b.

- A ativação terminal da cascata do complemento requer o C5b, C6, C7, C8 e C9 que resultam na deposição de
um complexo de ataque de membrana (MAC – membrane attack complex), na membrana celular do
microrganismo. Este complexo introduz poros grandes na membrana, que previnem a célula de estabelecer um
equilíbrio ou uma integridade osmótica, acabando por morrer (por lise celular).

Via Alternativa de Ativação do Complemento:

- Complexos antigénio/anticorpo não são necessários para ativação da via.

- C3 convertase e C5 convertase diferentes da via clássica e da via da lectina.

- Componente do sistema imunológico inato (não precisa de anticorpos, do sistema adquirido).

- Para ativação da via são necessárias 4 proteínas: C3, Fatores B e D; e Properdina.

- Existem vários iniciadores da via alternativa do complemento (componentes de microrganismos e até não
patogénicos), por exemplo, LPS e veneno de cobra. Existem outros como o zimosano de fungos e leveduras.

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Passos da ativação da via alternativa do complemento:

1. Hidrólise espontânea de C3 em C3b (fragmento maior) e C3a


(fragmento mais pequeno);
2. Fator B liga-se a C3b, tornando-se suscetível à ação pelo Fator D, que
o cliva, formando o complexo C3bBb, que possui atividade de C3 convertase
(fragmento b do C3 associado ao fragmento b do Fator B);
3. Ligação da Properdina estabiliza o C3 convertase;
4. C3 convertase cliva C3 adicional (em C3a e C3b), fragmento C3b
resultante forma com C3bBb o complexo C3bBbC3b (C5 convertase);
5. C5 convertase cliva C5 em C5a e C5b; fragmento C5b liga-se à
membrana celular do microrganismo iniciando a fase final da cascata
(formação do MAC).

Ativação do Complemento pela Via da Lectina:

- Ativação independente de anticorpos.


- Cascata mais semelhante à via clássica, utilizando os componente C4 e C2
(apesar da ativação/iniciação ser diferente).
- Via é ativada pela ligação de MBL (mannose-binding lectin) a resíduos de
manose presentes em glicoproteínas à superfície dos microrganismos.
- MBL é uma proteína de fase aguda produzida no fígado (imunidade inata),
cuja concentração aumenta durante a inflamação. Tem uma estrutura e
função semelhante a C1q (molécula que reconhece o complexo antigénio-
anticorpo na via clássica).
- Após ligação de MBL a resíduos de manose expressos à superfície dos
microrganismos, os proteases de serinas MASP-1 e MASP-2 (MBL associated
serine proteases 1 e 2) ligam-se à MBL. Este complexo ativo cliva C4 em C4a e
C4b; C4b fica associado à superfície do microrganismo; C2 é clivado em C2a e

C2b e, de seguida, o C2a


associa-se ao C4b dando
origem ao C3 convertase que
cliva C3 em C3a e C3b e C3b
liga-se ao C3 convertase
originando C5 convertase
(cliva C5 em C5a e C5b). C5b
integra O MAC
conjuntamente com o C6, C7,
C8 e C9.
Este complexo ativa o C4 e
C2, dando origem ao C3
convertase e posteriormente
C5 convertase. Por fim, ao
MAC.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Um pequeno
esclarecimento:

A ativação da
cascata de
complemento pela
via da lectina ocorre
por

reconhecimento/ligação de
polissacarídeos microbianos
(polissacarídeos expressos à superfície
dos microrganismos) por MBL ou
ficolinas. MBL e ficolinas são
semelhantes ao C1q que ativam a via
clássica do complemento. Tanto a MBL
como as ficolinas (ficolina-L e ficolina-
H) são proteínas plasmáticas.

A MBL liga-se a resíduos de manose


presentes nos polissacarídeos
microbianos, enquanto que as ficolinas
reconhecem e ligam-se a resíduos de n-
acetilglucosamina.

Tanto a MBL como as ficolinas


associam-se a MASPs (MBL-associated
serine proteases) para
ativação da cascata de
complemento por esta via.

As ficolinas e MBL são


moléculas diferentes, ambas
efetores solúveis da
imunidade inata capazes de
ativar a cascata do
complemento pela via da
lectina.

Estas moléculas foram


mencionadas brevemente na
aula teórica 6. A MBL
pertence à família das
colectinas.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Neste esquema observa-se a ligação da MBL


aos resíduos de manose expressos à superfície
dos microrganismos nas lectinas.

A MBL (recetor de lectina) e as MASP’s (MASP-


1 e MASP-2) associam-se num complexo
semelhante ao complexo C1q responsável pela
iniciação da via clássica.

Regulação do Complemento:

- A via do complemento é altamente regulada.

- Evita o esgotamento dos componentes do


Complemento num único sítio de inflamação.

- Evita a ativação e formação do MAC em


células do próprio. É suposto o complemento
apenas atuar em microrganismos.

Existem diversas proteínas que regulam a via do


complemento, antes e depois da formação do complexo
C3 convertase e na regulação do complexo de ataque de
membrana (MAC):

- O C1Inh (inibidor de C1) atua antes da formação do C3


convertase e causa dissociação de C1r e C1s (necessário
na clivagem do C4 e C2) de C1q.

- O decay-acclerating factor (DAF) ou CD55 leva à


dissociação do C3 convertase, atuando, portanto,
posteriormente à formação deste.

- O CD59 ou MIRL (membrane inhibitor of reactive lysis)


inibe a formação do complexo de ataque de membrana (MAC).

Existem outras proteínas que regulam o complemento, mas estas são as principais a saber.

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Proteínas reguladoras:

Encontra-se a lista das principais proteínas reguladoras detalhadamente descrita:

O C1Inh ou C1 inhibitor é uma


proteína solúvel que afeta a via
clássica.

É um inibidor dos serinas


proteases (C1s) levando à
dissociação do complexo C1q.
Inibe ainda o fator de Hageman.

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O DAF ou CD55 encontra-se presente na membrana, atuando nas vias clássica, alternativa e da lectina (todas).
Permite a dissociação do C4b2a e C3bBb (C3 convertases das vias clássica e alternativa, respetivamente).

O CD59 ou MIRL está ligado à membrana e atua no final das 3 vias, com a inibição da formação do complexo
de ataque de membrana (MAC) por ligação ao C5b678, não permitindo a ligação de C9.

Mecanismos de evasão da atividade do complemento exibidos por microrganismos:

A cascata do complemento é tão importante que diversos microrganismos apresentam mecanismos de evasão
da atividade do complemento. Por exemplo:

- Estirpes resistentes de E.coli e Salmonella previnem a inserção do MAC na membrana das bactérias.

- Estirpes resistentes de Neisseria e gonorrhoeae impedem a inserção do MAC na membrana das bactérias.

- Pseudomonas aeruginosa possui elastases que inativam o C3a e o C5a (anafilatoxinas – mediadores da
inflamação).

Assim, a cascata do complemento é tão importante que os microrganismos tentam arranjar mecanismos de
proteção e de evasão da atividade do complemento.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Doenças associadas a deficiências em


componentes da cascata do
complemento:

As consequências mais frequentes


aquando de deficiências em componentes
da cascata do componente são:

- Suscetibilidade a infeções.

- Autoimunidade.

Por exemplo, deficiências em


componentes da via clássica,
nomeadamente, C1q, C1r, C1s, C4 e C2
causam lúpus eritematoso sistémico (SLE).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Doenças associadas a
deficiência em proteínas
reguladoras da cascata do
complemento:

- Deficiências no inibidor de C1
ou C1Inh leva angioedema.

- Deficiências em DAF/CD55 e
CD59/MIRL levam a
hemoglobinúria paroxística
noturna.

- Deficiências nos fatores I e H


levam a deposição de complexos
imunes associada a doenças
renais. Se não eliminarmos os
complexos antigénio-anticorpo
que produzimos, há lesão do rim
pela tentativa de excreção desses complexos pela urina.

Deficiência na expressão de CD55/DAF ou CD59/MIRL => Hemoglobinúria paroxística noturna:

A expressão de CD59 impede que, à superfície da membrana dos eritrócitos, haja deposição de complexos de
ataque de membrana (MAC), isto é, com CD59 não há formação do MAC. Em indivíduos que não possuam CD59
(proteína reguladora da atividade do complemento), existe ativação do complemento nos eritrócitos (porque
há formação do MAC) e subsequentemente existe lise destas células.

O tratamento destes doentes é feito com eculizumab que é um anticorpo monoclonal que impede a
ação/atividade de C5 (clivado pelo C5 convertase em C5a e C5b), pelo que não permite a formação do MAC,
visto que o C5b não é formado (atividade de C5 impedida) e este era um componente do complexo de ataque
de membrana.

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Aula 21 – Resposta imunológica a vírus, bactérias,


parasitas e fungos (I)

As doenças infeciosas são uma das principais causas de morte (à volta de 14 milhões de vidas humanas
perdidas anualmente). Em 2016 (WHO – World Health Organization, em português OMS – Organização Mundial
da Saúde) existiam 3 no TOP 10:

- Infeções do trato respiratório inferior: 3.0 milhões mortos. (1º lugar nos países em desenvolvimento)

- Infeções virais ou bacterianas associadas a diarreia: 1.4


milhões mortos (2º lugar em países em desenvolvimento).

- Tuberculose: 1.3 milhões mortos.

Dados de 14 de maio de 2020 (WHO):

SARS-COV-2: 4248389 infetados; 294046 mortes.

Em crianças que morrem com menos de 5 anos (dados


de 2017) 6 das TOP 10 causas de morte são doenças
infeciosas.

Os agentes causadores de infeções podem ser bactérias


extracelulares, bactérias intracelulares, vírus, parasitas,
fungos e priões.

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Uma infeção ocorre quando um microrganismo evade o sistema imunológico inato e estabelece colonização
num hospedeiro.

Os agentes patogénicos podem ser classificados em duas classes:

• Patogénios primários - capazes de causar doença em hospedeiros imunocompetentes (componentes


do sistema imunológico a funcionar devidamente).
• Oportunistas - causam doença em hospedeiros imunocomprometidos (ou quando o microrganismo
ganha acesso a um local onde não é
normalmente encontrado), ou seja,
quando um ou vários componentes da
imunidade estão deficientes e não
funcionam devidamente ou quando se
dá a evasão num local onde
normalmente o agente patogénico
não se encontraria.

Uma infeção aguda define-se como a


infeção onde se dá a eliminação total
do agente patogénico/microrganismo
no fim da infeção.

Geralmente, o curso típico de uma


infeção aguda, ou seja, o crescimento do microrganismo segue a forma de uma distribuição normal/gaussiana.
O modelo inicia-se com a entrada do microrganismo e a resposta primária por parte do sistema imune inato,
fundamental para controlar o início da infeção e modelar o tipo de resposta adaptativa que vai ser
posteriormente estabelecida. Se estas defesas primárias não forem suficientes, a infeção estabelece-se e
quando existe a passagem de um certo limite de antigénios há ativação do sistema imune adaptativo/adquirido.
Assim, este é induzido, há a resposta adaptativa/adquirida que permite o controlo da infeção, isto é, do
crescimento deste microrganismo com posterior indução de memória (as células de memória garantem que
num próximo contacto com este agente patogénico a resposta desencadeada é mais rápida e eficiente) e
eliminação do agente patogénico.

Claro está que muitas vezes o sistema imune consegue “dar conta do recado” e não chega a ser necessária a
indução de uma resposta imune adaptativa, porque a eliminação do microrganismo se dá precocemente.

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Infeções agudas vs persistentes (modelos de doença):

- Alguns exemplos de infeções agudas são: a do vírus influenza causadora da gripe, a do rotavírus causadora
de diarreias severas, em crianças, que podem ser mortais e ainda o agente causador da tosse convulsa. Nestas
infeções existe um pico do crescimento do microrganismo (da doença/infeção) e um threshold/limite a partir
do qual começamos a sentir sintomas da doença. Nestas também existem os mecanismos da imunidade que
levam ao decréscimo e eliminação do agente patogénico.

Existem outros modelos/outros tipos de infeções, nomeadamente as que originam doenças persistentes:

- Infeção persistente, sem reativação: é


o caso do vírus Epstein-Barr (EBD) e alguns
helmintas, onde após a fase da doença
aguda em que há decréscimo do
microrganismo se observa que este nunca
é eliminado na totalidade e persiste no
hospedeiro. Usualmente neste caso não
tende a existir reativação do agente
patogénico. Estima-se que cerca de 90% da
população adulta se encontra infetada com
EBD, em que esta infeção permanece
persistente, mas não causa sintomas.
Tendencialmente consegue-se controlar
este vírus, salvo casos em que o nosso
sistema imunológico fique comprometido,
como em casos de transplante de órgãos.
Muitos transplantados reativam EBD pós-
transplante que pode ter consequências
dramáticas na sobrevivência dos mesmos.
Outros casos são o uso de drogas com
funções imunossupressoras e deleções de
medula óssea, etc.

- Infeção persistente, com reativação: casos como o vírus herpes, varicela, tuberculose e malária que possuem
um controlo inicial semelhante ao da função aguda com uma seguinte persistência latente do microrganismo.
No entanto, após algum tempo existe reativação deste microrganismo patogénico, com um novo crescimento
do mesmo e doença.

Existe um terceiro tipo de infeção persistente:

- Infeção de evolução lenta: é o que acontece no caso do HIV (AIDS ou SIDA), onde existe um episódio de
infeção aguda e respetiva recuperação da mesma (com decréscimo da carga viral). No entanto, segue-se-lhe
uma evolução lenta do microrganismo ao longo do tempo que culmina com uma doença fatal, sem tratamento.
O HIV é eficazmente conturbado com cocktails antirretrovirais.

Esta infeção, assim, caracteriza-se por longos períodos de incubação. O desenvolvimento da doença tem um
curso longo, progressivo e frequentemente fatal (se não tratado).

Passos obrigatórios para o estabelecimento de uma infeção por parte de um microrganismo:

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

• Entrada do microrganismo (vence as barreiras físicas e químicas da imunidade inata como as mucosas);

• Invasão e colonização dos tecidos do hospedeiro (localizada ou sistémica); Fundamentais ao estabelecimento


• Evasão dos mecanismos de imunidade (inata) do hospedeiro; da infeção

• (Alguns microrganismos levam à) Lesão dos tecidos do hospedeiro (não é obrigatório).

Propriedades gerais da resposta imune/imunológico a microrganismos:

• Defesa: inclui mecanismos efetores da resposta imunológica inata e adquirida:

- Inata: defesa inicial e está sob uma pressão evolutiva (para os microrganismos escaparem à resposta inata)
=> se os microrganismos escaparem a esta resposta estabelecem uma colonização e infeção eficiente.

- Adquirida: de maior intensidade e mais específica.

• Maneiras distintas e especializadas para diferentes tipos de microrganismos para termos uma resposta mais
eficiente.

• A sobrevivência e patogenicidade de microrganismos é influenciada pela sua capacidade de evadir ou resistir


aos mecanismos efetores de imunidade.

• A resposta imunológica por vezes controla, mas não elimina o microrganismo, o qual sobrevive sem propagar
infeção (o caso das infeções persistentes).

A lesão de tecidos do hospedeiro é muitas vezes causada pela resposta imunológica do hospedeiro ao
microrganismo (imunopatologia) e não pelo microrganismo diretamente.

A imunopatologia resulta dos mecanismos de defesa do sistema imunológico para deletar um


microrganismo/a infeção.

Imunidade e resposta imunológica a bactérias extracelulares:

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Neste quadro indicam-se alguns exemplos de bactérias extracelulares, doenças causadas por estas e
mecanismos de patogenicidade que estas bactérias possuem. Muitas delas recorrem a toxinas (difteria, tétano,
cólera) e outras recorrem a superantigénios.

As bactérias extracelulares replicam-se fora das células do hospedeiro nas regiões intersticiais do tecido
conectivo, lúmen dos tratos respiratório, urogenital e gastrointestinal e no sangue. Produzem toxinas,
exotoxinas ou endotoxinas:

- Exotoxinas são proteínas tóxicas ativamente secretadas por bactérias Gram-positivas e Gram-negativas.

Exemplos:

Exotoxina de Vibrio cholerae liga-se a células epiteliais do intestino, provocando diarreia severa característica
da Cólera.

Clostridium botulinum produz uma neurotoxina que bloqueia a transmissão de impulsos nervosos para os
músculos, causando a paralisia característica do Botulismo.

- Endotoxinas como o LPS (componente da parede celular de bactérias Gram-negativas), reconhecido em


células do sistema imune inato pelo TLR-4. As endotoxinas não são secretadas pelas bactérias extracelulares
como as exotoxinas, mas apenas libertadas aquando dano da parede celular das bactérias Gram-negativas.

Exemplo: LPS de bactérias Gram-negativas ativa macrófagos induzindo a produção de citocinas pró-
inflamatórias como TNF-α e IL-1. Uma elevada concentração destas citocinas, produzida em resposta a infeção
por bactérias Gram-negativas, pode levar a choque séptico (pode ser letal para o hospedeiro).

Mecanismos efetores da resposta imunológica a bactérias extracelulares:

• As infeções por bactérias extracelulares são controladas por uma combinação de mecanismos efetores da
imunidade inata e adquirida.

Estes microrganismos não entram nas células do hospedeiro, pelo que são alvo para a ação de anticorpos, no
que toca à imunidade adquirida.

Componentes da imunidade inata (na ausência de anticorpos):

Os principais mecanismos da imunidade inata são a ativação do sistema de complemento, fagocitose (por
neutrófilos e macrófagos) e resposta inflamatória.

• Ativação do complemento:

Via alternativa - peptidoglicano (PG, componente da parede celular de Gram-positivas) ativa a via alternativa
do complemento; LPS (componente da parede celular de Gram-negativas) ativa a via alternativa do
complemento.

Via da lectina- resíduos de manose (presentes em glicoproteínas à superfície dos microrganismos).

- Ambas as vias levam à formação do MAC e consequente lise de bactérias.

- Intermediários de ambas as vias participam na opsonização de bactérias e potenciam a fagocitose por


macrófagos e neutrófilos (exemplo de mediador: C3b – coating do microrganismo).

- Intermediários de ambas as vias funcionam como anafilatoxinas (C3a, C4a e C5a), aumentando a resposta
inflamatória (pró-inflamatórias).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

• Ativação de fagócitos e inflamação:

Os neutrófilos e macrófagos (fagócitos) utilizam recetores de superfície como recetores de manose e


scavenger para reconhecer bactérias extracelulares e facilitar a sua fagocitose. Estes fagócitos também
reconhecem bactérias opsonizadas via recetores do complemento (exemplo: o C3b), e esta interação promove
a fagocitose das bactérias e a sua ativação (e destruição das bactérias extracelulares).

Productos microbianos como LPS e PG (o peptidoglicano é um agonista do TLR-2) ativam DCs e fagócitos,
levando à produção de citocinas que induzem recrutamento de leucócitos para os locais de infeção. Leucócitos
recrutados ingerem e destroem bactérias (perpetuação do processo inflamatório).

Células dendríticas e fagócitos como neutrófilos e macrófagos expressam na sua membrana plasmática
recetores Toll (TLRs; Toll-like receptors; uma classe de PRRs, isto é, Pathogen recognition receptors) que
reconhecem PAMPs (Pathogen-associated molecular patterns) presentes em bactérias extracelulares. Dois
exemplos destes padrões moleculares, presentes nalgumas bactérias extracelulares (não esquecer que LPS é
um componente de bactérias gram-negativas e não presente em todas as bactérias), que podem ativar DCs,
macrófagos e neutrófilos são então o LPS (reconhecido pelo TLR-4 expresso em células imunes) e o
peptidoglicano (reconhecido pelo TLR-2 também expresso por estas populações da imunidade inata).

• Células linfoide inatas (ILC):

Secretam IL-17, IL-22 e GM-CSF que reforçam a função da barreira epitelial e promovem recrutamento de
neutrófilos para os locais de inflamação (papel contra bactérias extracelulares).

Componentes da imunidade adquirida (na presença de anticorpos):

A imunidade humoral (mediada por anticorpos) é o principal mecanismo protetor da resposta adquirida
contra bactérias extracelulares, atuando no bloqueio da infeção (via neutralização), na eliminação de
microrganismos e na neutralização das suas
toxinas.

Antigénios proteicos de bactérias


extracelulares também ativam células T
CD4+ auxiliares, que produzem citocinas e
expressam moléculas de superfície que
induzem inflamação local, aumentam a
capacidade fagocítica e microbicida de
macrófagos e neutrófilos, e que estimulam a
produção de anticorpos.

Este esquema mostra o papel da


imunidade humoral (imunidade mediada
por anticorpos, ou seja, é transferida
aquando da transferência de soro) e
imunidade celular (mediada por células T na
imunidade adaptativa, não sendo
transmitida pela transferência de soro) na
imunidade adquirida.

Os linfócitos B reconhecem via BCR


componentes presentes à superfície de

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

bactérias extracelulares com o auxílio de células T auxiliares (para os LB poderem levar à produção de anticorpos
com elevada afinidade e de outros isotipos além de IgM e ainda poderem levar à criação de células B de
memória). Existe a diferenciação de LB em plasmócitos que secretam anticorpos.

Estes anticorpos possuem diversos papéis protetores, nomeadamente:

- Neutralização (os anticorpos neutralizantes impedem que, as bactérias que não entram nas células do
hospedeiro, mas que adiram a recetores nas células de forma a não serem eliminadas, não se consigam ligar).

- Opsonização (os anticorpos funcionam como opsoninas facilitando a fagocitose pelos fagócitos).

- Ativação da via clássica do complemento (com produção de C3b que funciona como opsonina facilitando a
fagocitose pelos macrófagos e neutrófilos; produção de anafilatoxinas como C3a, C4a e C5a que auxiliam no
processo inflamatório, isto é, servem para recrutar novos leucócitos para o local de infeção; formação de MACs
com lise dos microrganismos).

Na resposta adaptativa a microrganismos extracelulares, o componente mais importante é a imunidade


humoral apesar das células T aqui possuírem igualmente um papel fundamental:

As células T são necessárias para que os linfócitos B possam orquestrar devidamente a sua resposta. A bactéria
extracelular é apresentada a DCs (células dendríticas), sendo que o antigénio é devidamente processado a
péptidos que são apresentados a linfócitos T CD4 + auxiliares que podem produzir citocinas como:

- IL-17, TNF e outras citocinas: ajudam no processo inflamatório. A IL-17 é crucial para o recrutamento de
neutrófilos para os locais de infeção.

- IFN-γ: fundamental na ativação dos macrófagos por aumento da sua capacidade fagocítica e bactericida.

- Várias citocinas: permitem que a classe de anticorpos produzidas pelos plasmócitos seja adequada. Assim,
controlam o tipo de resposta humoral exibida pelos linfócitos B.

Muitas destas bactérias extracelulares produzem superantigénios (SAg). Algumas características dos SAg:

- Ligam-se ao TCR e a moléculas de


MHC II;

- Ativam uma grande percentagem de


células T (que expressam vβ e existe a
ativação de alguns destes segmentos);

- Produzem larga quantidade de


citocinas (por ativação de LT), levando a
inflamação sistémica.

No quadro ao lado demonstram-se


superantigénios produzidos por
bactérias extracelulares e são referidos
alguns exemplos:

- SEB: pode ativar células de ratinho e células de humanos, nomeadamente linfócitos T. Nos humanos os LT
são Vβ 3, 12, 14, 15, 17 e 20.

- TSST-1: ativa linfócitos T que são V β 2 em humanos.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Mas o que são “V β’s”?

Os Vβ são os segmentos V utilizados no rearranjo da cadeia β do TCR. A região variável da cadeia β do TCR é codificada por
segmentos V, D e J. Cada um destes segmentos V é identificado por um número (Vβ1, Vβ2,..., Vβn). Só como exemplo, se um
superantigénio ativa LT Vβ2, vai ativar todos os linfócitos T que utilizaram o segmento V β2 no rearranjo da parte variável da
cadeia beta do TCR que expressam.

Ativação de células T por


superantigénios bacterianos:

Numa situação normal tem-se uma


APC a expressar uma molécula de MHC
II que vai apresentar um péptido a um
linfócito T CD4 +, cujo péptido é
específico para o TCR, sendo o LT
ativado pela APC. TCR SEB
Note-se que o número de células T vβ3 Any peptide
específicos para um dado antigénio é
excecionalmente baixo.

No caso de superantigénios como o


SEB, conseguem ativar muitas mais
células T. No caso do SEB ativa
linfócitos T Vβ3 em humanos (por
intermédio de MHC II) que são cerca de
2% das células T.

O superantigénio liga-se
ao TCR e ao MHC II fazendo
um cross-linking forçando
a sua ligação
independentemente da
especificidade do péptido
que está a ser apresentado
pela APC. No caso do SEB,
todas as células T Vβ3 vão
ser ativadas, proliferar e
produzir citocinas na
presença deste SAg.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Mecanismos de evasão do sistema imunológico por bactérias extracelulares:

Existem diversas bactérias com diferentes mecanismos de evasão. Há bactérias que impedem a ativação da
via do complemento por impedimento da ligação do C3b à superfície da membrana por ausência de dadas
proteínas necessárias para a ligação do C3b ou pela presença de proteínas muito grandes que causam
impedimento estereoquímico ou por degradação do C3b, entre outros.

- Interferência com PRRs (pathogen recognition receptors) do hospedeiro:

• Heliobacter Pylori contém formas modificadas de LPS e flagelina que ligam anormalmente TLR-4 e TLR-5,
respetivamente, interferindo com a via de sinalização (não é eficiente).

• Y. enterocolitica produz antigénio V que é reconhecido por


TLR-2 e induz produção de IL-10 (é raro, pois geralmente a
ativação de vias de TLRs leva à libertação de citocinas pró-
inflamatórias como TNF ou IL-1) imunossupressora,
geralmente, inibindo IFN-γ e TNF-α.

- Evasão da atividade protetora mediada por anticorpos:

• Gonococci alteram a sequência de aminoácidos da proteína


bacteriana utilizada para ligação à superfície do hospedeiro,
deste modo anticorpos neutralizantes já não conseguem
bloquear a ligação desta proteína que serve de adesão às
células do hospedeiro.

• H. influenzae produz um protease que degrada


especificamente IgA no sangue e muco, impedindo o papel
protetor da IgA na infeção.

- Evasão da atividade de neutrófilos:

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

• Streptococcus pyogenes produz uma toxina


que inibe a produção de quimiocinas
necessárias para recrutamento de neutrófilos
para o local de infeção (impede que estas
bactérias sejam fagocitadas e destruídas por
neutrófilos).

- Inibição de fagocitose:

• Y. enterocolitica injeta em macrófagos um


fosfatase microbiano que se liga a proteínas
fosforiladas no hospedeiro necessárias para
sinalização intracelular e reorganização de
actina (mecanismos necessários para
fagocitose). Quando ocorre desfosforilação
destas proteínas, a fagocitose da bactéria é
inibida.

Mecanismos efetores da resposta imunológica a bactérias intracelulares:

Existem diversos exemplos


de bactérias intracelulares
como a causadora da
tuberculose (mycobacterium
tuberculosis é residente nos
macrófagos), salmonela
(febre tifoide), a causadora da
meningite, causadoras da
lepra, clamídia e rickettsia.

As bactérias intracelulares
possuem certas
características:

- Capazes de sobreviver e
replicar em fagócitos.

- Inacessíveis a anticorpos circulantes (o papel destes é reduzido, exceto quando funcionam como opsoninas
– na imunidade celular para os fagócitos).

A principal resposta protetora contra bactérias intracelulares consiste no recrutamento e ativação de fagócitos
por células T (imunidade celular) aquando da resposta adquirida/adaptativa.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Componentes da imunidade inata (na ausência de anticorpos):

- A imunidade inata a bactérias intracelulares é mediada por fagócitos (neutrófilos e macrófagos) e células NK,
ambas ativados pelas bactérias intracelulares.

- Os fagócitos (neutrófilos e macrófagos) ingerem as bactérias, que são usualmente resistentes a degradação.

- Os fagócitos expressam TLRs e NLRs que reconhecem compostos microbianos, levando à sua ativação (dos
fagócitos por componentes das bactérias intracelulares)

- Bactérias intracelulares ativam células NK via indução de expressão de ligandos ativadores nas células
infetadas e via indução de expressão por macrófagos e DCs de IL-12 e IL-15, ambas citocinas ativadoras de NK.

- As células NKs ativadas produzem IFN-γ que ativa macrófagos e induz morte das bactérias fagocitadas, tendo
assim um papel crucial antes da ativação da imunidade adquirida.

Os neutrófilos e os macrófagos fagocitam as bactérias intracelulares e o IFN-γ é fundamental para ativar a


função microbicida dos macrófagos. Numa fase mais precoce do IFN-γ, ou seja antes de componentes da
imunidade adquirida poderem entrar em ação, este é produzido por células NK (células da imunidade inata).

Ratinhos scid (ratinhos que têm uma deficiência numa proteína, PRKDC, que se encontra envolvida na
recombinação VDJ - para a síntese dos TCRs e BCRs - e assim estes ratinhos não possuem linfócitos B e T)
controlam infeção por L. monocytogenes via IFN-γ produzido por NK.

A imunidade inata é, no entanto, normalmente incapaz de erradicar infeções por bactérias intracelulares,
sendo necessária a ação de componentes da imunidade adquirida.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Aula 22 – Resposta imunológica a vírus, bactérias, parasitas e fungos (II)

Mecanismos efetores da resposta imunológica a bactérias intracelulares – continuação e recapitulando:

As bactérias intracelulares são capazes de sobreviver e mesmo replicar-se dentro de fagócitos. São assim
inacessíveis a anticorpos circulantes e à ação do Complemento.

- A imunidade inata a bactérias intracelulares é mediada primariamente por fagócitos e células NK.

- A função microbicida de fagócitos contra bactérias intracelulares é ineficiente sem ativação por linfócitos
Th1.

- Células NK produzem IFN-γ, estimulando a função microbicida dos macrófagos, sendo


assim cruciais para a primeira linha de defesa contra estas bactérias antes da ação da
imunidade adquirida.

Neste esquema representa-se um macrófago que fagocitou uma micobactéria num


fagossoma. O macrófago não consegue eliminar a micobactéria, pelo que secreta IL-12 que
ativa a célula NK (por intermédio do recetor de IL-12). A célula NK ativada produz o IFN-γ
que ativa o macrófago (tendo como intermediário o recetor de IFN-γ) para garantir o
controlo da infeção até se iniciar a atividade de outras células do sistema imune
adaptativo.

Componentes da imunidade adquirida a bactérias intracelulares:

- Imunidade mediada por LT e constitui a resposta protetora principal. Contrariamente ao caso das bactérias
extracelulares, aqui (nas bactérias intracelulares) a proteção não é transferível por anticorpos, mas por linfócitos
(imunidade celular).

- LT CD4+ Th1 – produzem IFN-γ que recruta e ativa fagócitos:

• Th1 expressam CD40L e IFN-γ que ativam macrófagos.


• Macrófagos ativados possuem atividade microbicida aumentada, matando bactérias por ROS, NO
(óxido nítrico) e enzimas lisossomais.
• Mutações em IL-12 (importante para diferenciação de células T naive em células TH1) e IFN-γ levam a
suscetibilidade a infeção por micobactérias.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

• No caso de antigénios bacterianos ou bactérias


que escapem ao fagolisossoma e acedam ao
citosol de fagócitos (mecanismo de evasão da
bactéria intracelular L. monocytogenes) => quando
há bactérias presentes no citosol, os mecanismos
microbicidas dentro do fagolisossoma não são
eficientes, pelo que a ação de CTLs (linfócitos T
CD8+ citotóxicos) é fundamental para eliminar
células infetadas.

Nesta figura mostra-se o exemplo da infeção por L.


monocytogenes. Aqui observa-se o macrófago (expressa
CD40 e MHC classe I e II – é uma APC!) com a bactéria
fagocitada no fagossoma, apesar de que outras bactérias
conseguiram escapar para o citoplasma. A célula T CD4+ Th1
vai reconhecer via interação CD40-CD40L péptidos
derivados de antigénios da bactéria apresentados em
moléculas de MHC classe II. A produção de IFN-γ pelas
células Th1 e o sinal via interação CD40-CD40L induzem o
aumento da atividade microbicida do macrófago e à
morte das bactérias intracelulares presentes no
fagolisossoma.
T cells
No entanto, não se conseguem matar as bactérias no
citoplasma, isto é, fora do fagolisossoma. Aqui a NK cells ILC1
atividade dos linfócitos T CD8+ citotóxicos (CTLs) é
crucial. As CTLs reconhecem péptidos derivados de
antigénios da bactéria em contexto de MHC classe I,
induzindo a apoptose do macrófago infetado. Ao existir
morte da célula infetada, há a resolução da infeção. Neutrophils Macrophage Macrophage
s s

Controlo de infeção por bactérias intracelulares:

O controlo da infeção por bactérias intracelulares


requer componentes da imunidade inata e
componentes da imunidade adquirida.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

A imunidade inata é a
primeira a entrar em ação e
possui os seguintes
constituintes fundamentais:
neutrófilos e macrófagos
(fagócitos) e células NK.

No que toca à imunidade


adquirida/adaptativa é
fundamental ação de células
Th1 que produzem IFN-γ que
aumenta a atividade
microbicida dos macrófagos e,
consequente, erradicação da
infeção. No caso da bactéria
conseguir escapar para o
citoplasma, a ação das CTLs é fundamental.

Mecanismos de evasão da resposta imunológica por


bactérias intracelulares:

- O mycobacterium tuberculosis e a legionella pneumophila


conseguem inibir a formação do fagolisossoma, ou seja, a fusão
do fagossoma onde as bactérias se encontram com o lisossoma
(com enzimas hidrolíticos). Assim, as micobactérias possuem esta propriedade e conseguem sobreviver no
fagossoma, pois não permitem que o seu fagossoma se una ao lisossoma. Existem muitos indivíduos infetados
com tuberculose sem sintomas ativos, que possuem infeções crónicas, pois a bactéria reside nos macrófagos
destes indivíduos “sem dar sinal de vida”. Acabam por saber quando a imunidade baixa dando-se a reativação
da infeção.

- O mycobacterium leprae possui a capacidade de inativar ROS (espécies reativas de oxigénio) e RNS (espécies
reativas de nitrogénio) que são dois mecanismos essenciais para eliminar a bactéria no fagolisossoma. Consegue
fazê-lo pela presença de um glicolípido fenólico.

- A listeria monocytogenes (como visto anteriormente) devido à presença da proteína hemolisina consegue
romper a membrana do fagossoma, conseguindo escapar para o citoplasma (ficando incólume/salva à ação
microbicida dos fagócitos – necessita-se de CTLs).

262
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Em suma:

- As bactérias intracelulares
desenvolveram uma série de
estratégias para resistir à
eliminação por fagócitos. Estas
incluem inibição da formação de
fagolisossomas ou escapar para o
citosol, protegendo-se assim dos
mecanismos microbicidas de
lisossomas, ou ainda inativando
substâncias microbicidas, como
ROS.

- A consequência da infeção por


estes microrganismos depende
muitas vezes do balanço entre a
eficiência da atividade
microbicida de fagócitos ativados
por células T e os mecanismos de
resistência a estes desenvolvidos
por bactérias intracelulares.

- A resistência destes
microrganismos à eliminação
mediada por fagócitos é também
um fator que contribui para o
estabelecimento de infeções
crónicas por estes
microrganismos, que são assim de longa duração (até anos) e de difícil erradicação.

Imunidade a infeções virais:

- Os vírus são microrganismos intracelulares obrigatórios.

- Os vírus tipicamente infetam diferentes células do hospedeiro via endocitose após ligação a moléculas de
superfície das células do hospedeiro.

- A replicação viral (que necessita da maquinaria das células do hospedeiro) interfere com a função normal
das células do hospedeiro e com o mecanismo de síntese proteica, podendo levar à morte das células.

- As respostas imunológicas inata e adquirida visam bloquear a infeção e eliminar as células infetadas.

Mecanismos da imunidade inata contra vírus:

- Os principais mecanismos de imunidade inata contra vírus consistem na inibição da replicação viral por IFN-
I (IFN-1) e indução de morte celular de células infetadas mediada por células NK.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- A produção de IFN-I é induzida pelo reconhecimento por PRRs de PAMPs (do vírus) como dsDNA e ssRNA. As
pDCs (células dendrítica plasmacitoides) são as principais produtoras de IFN-I (interferão de tipo I). Esta citocina
também é produzida pelas próprias células infetadas.

- IFN-I inibe eficientemente a replicação viral, tanto em células infetadas como em não infetadas (induz o
estadio de proteção nas células).

-Uma vez que a expressão de MHC I é usualmente diminuída em células infetadas por vírus (mecanismo de
evasão dos vírus), como um mecanismo de evasão à atividade por CTLs, as células infetadas por vírus tornam-
se alvo de células NK.

Mecanismos da imunidade adquirida contra vírus:

- A resposta da imunidade adquirida protetora contra infeções virais é mediada por anticorpos que bloqueiam
a entrada do vírus nas células do hospedeiro e por CTLs que induzem apoptose de células infetadas, eliminando
a infeção.

- Componente humoral protetora requer anticorpos de alta afinidade, produzidos na reação de centros
germinativos (dependentes de ajuda T).

• Os anticorpos são apenas eficientes durante o estadio extracelular dos vírus (antes de entrar nas
células do hospedeiro), ou seja, no início da infeção ou quando libertados de células infetadas ou
mortas, isto é, os anticorpos previnem tanto a infeção inicial como a propagação da infeção de célula
para célula.
• Os anticorpos (Ab) ligam-se a antigénios (Ag) do envelope ou capsídeo viral, funcionando
primariamente como anticorpos neutralizantes, impedindo assim a adesão e entrada do vírus nas
células do hospedeiro.
• Os anticorpos também podem ter um papel importante na opsonização (os anticorpos na superfície
dos microrganismos são reconhecidos por fagócitos via recetores Fc e facilitam a fagocitose) e na
ativação do complemento (via clássica).

Resposta imunológica protetora contra infeções


virais:

Existem dois componentes importantes na


resposta imunológica: a imunidade inata e a
imunidade adaptativa/adquirida. Na primeira o
interferão tipo I e as células NK são cruciais e na
segunda as CTLs (induzem a apoptose de células
infetadas) e os anticorpos (impedem a entrada do
vírus nas células do hospedeiro e a disseminação
da infeção de célula para a célula) são
fundamentais.

Claro está que a imunidade inata é primária e a


imunidade adquirida secundária, ainda que esta
última seja essencial para a eliminação da infeção.

264
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Na imunidade inata o interferão tipo


I (IFN-I) atua via recetor de interferão
tipo I, induzindo na célula o estadio
antiviral, impedindo que células que
não estejam infetadas o sejam pelo
vírus. As células NK levam à morte de
células infetadas por vírus.

A imunidade adaptativa é mediada


por linfócitos B e T. Os LB produzem
anticorpos neutralizantes e os LT CD8+
citotóxicos (CTLs) matam as células
infetadas.

O interferão tipo I (IFN-I) e os


anticorpos neutralizantes induzem
uma proteção contra a infeção, ao
passo que as células NK e as CTLs
eliminam as células infetadas e,
portanto, erradicam a infeção estabelecida.

Mecanismos de evasão da resposta imunológica por vírus:

Existem diferentes mecanismos de evasão à resposta imunológica usados por


diferentes vírus:

- Variação antigénica: influenza, rinovírus e HIV.

- Inibição de processamento antigénico para carregamento de péptidos em


moléculas de MHC classe I de diversas formas: CMV (citomegalovírus) e HSV
(herpes). Estas células ao não expressarem MHC I não são alvos de CTLs, pelo
que não sofrem apoptose mediada por estas.

- Produção de falsas moléculas de MHC que inibem a ação de células NK:


CMV (citomegalovírus) em ratinhos.

- Produção de proteínas homólogas a citocinas imunossupressoras: Epstein-


Barr (EBV) que produz uma proteína homóloga à IL-10.

- Infeção de células T CD4+: HIV.

- Entre outros (ao lado na tabela).

Variação antigénica é um mecanismo de evasão à atividade do sistema


imunológico pelo qual microrganismos, neste caso vírus, modificam os
antigénios que expressam à sua superfície. A seguir é apresentado o mecanismo
de variação antigénica exibido pelo Influenza. A introdução de mutações em 2
glicoproteínas expressas pelo Influenza (a hemaglutinina e a neuraminidase) faz
com que anticorpos protetores (neutralizantes) para um subtipo de vírus
deixem de ser eficazes contra um novo subtipo. Por isso, todos os anos é administrada uma nova vacina da gripe
em grupos de risco. Mais à frente será discutido este mecanismo de evasão utilizado por parasitas,
nomeadamente pelo Trypanossoma e Plasmodium.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Influenza:

- Agente causador da gripe.

- Responsável por algumas das


piores pandemias na história
(exemplos: gripe espanhola, H1N1 ou
gripe suína).

- Virião esférico rodeado por uma


bicamada lipídica derivada do
hospedeiro:

• 2 glicoproteínas
importantes: hemaglutinina
(HA) e neuraminidase (NA).
• Variação antigénica nestas glicoproteínas (mutações resultando em novas espécies) causam
problemas no desenvolvimento de imunidade a longo prazo na população.

- Possui 8 cadeias ssRNA (cadeia única de RNA) que codificam para todas as proteínas do vírus, nomeadamente
a hemaglutinina e a neuraminidase.

Todos os anos as pessoas têm de ser vacinadas contra a nova espécie de influenza. As pessoas geralmente
vacinadas têm respostas imunológicas menos eficientes como as pessoas mais idosas. Mas por que é necessário
existir essa vacinação anual? Existem dois mecanismos que levam a que isso tenha de acontecer:

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- Antigenic drift: é o fator de


menor importância. Nesta
situação, as glicoproteínas
hemaglutinina (HA) e
neuraminidase (NA) são
especificamente reconhecidas por
anticorpos induzidos por
imunização. No entanto, ao longo
do tempo, vão existindo mutações
pontuais nestas proteínas (single
point mutations) que podem levar
à incapacidade dos anticorpos, que
anteriormente conseguiam
reconhecer estas glicoproteínas,
deixarem de as reconhecer.

- Antigenic shift: fator de maior


importância, causador de grandes
pandemias. Nesta situação, existe
troca genética entre diferentes
estirpes. Por exemplo, na figura
mostram-se as cadeias ssRNA de
duas diferentes estirpes de influenza: a humana e a suína. O que se
observa é que, pelo processo de antigenic shift, é que existem trocas
entre estas cadeias de RNA resultando numa estirpe com uma parte do
genoma do influenza humano e outra parte com o genoma de influenza
suíno. Assim, os anticorpos que se ligariam inicialmente às
glicoproteínas de cada uma das estirpes iniciais, não se consegue ligar à
nova estirpe (que é uma junção de humano e porco) e, portanto, o ser
humano deixa de ter imunidade.

Para ocorrer esta via é necessário que diferentes vírus infetem o


mesmo hospedeiro.

O caso da H1N1, responsável da pandemia de 2009, foi gerado via


sortment, isto é, por trocas de cadeias de RNA únicas de porcos, aves,
humanos.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Mecanismos de inibição de apresentação antigénica por vírus:

Vários vírus como o EBV (Eipstein-Barr) e o CMV (citomegalovírus) humano têm a capacidade de inibir a
atividade do proteassoma, ou seja, inibe a capacidade de degradação de proteínas que se encontram no citosol.
Assim, os péptidos não são carregados pelas TAPs (que permitem a passagem dos péptidos do citosol para o
retículo endoplasmático rugoso) e, portanto, não se vão ligar à molécula de MHC classe I (presente no RE), pelo
que não serão reconhecidos por CTLs .

Outras situações análogas com consequências semelhantes à do EBV e CMV em inibirem o proteassoma:

- O herpes (HSV) bloqueia o transporte pelas TAPs, com as mesmas consequências anteriormente referidas.

- O adenovírus e o CMV impedem a síntese de MHC classe I ou fazem com que esta permaneça no RER.

Estas situações levam a que não exista reconhecimento por LT CD8+ citotóxicos, não existindo indução da
apoptose.

Outros vírus como o CMV de murganho produzem um decoy (uma armadilha), ou seja, uma molécula viral
semelhante ao MHC I que é um recetor inibitório das moléculas NK, impedindo a ação das mesmas.

Resposta imunológica protetora a infeção


por fungos:

É menos detalhado e conhecido do que as


respostas por parte de vírus e bactérias. Ao
lado encontram-se alguns fungos e as doenças
que causam. Por exemplo, a candida ou
cryptococcus neoformans causador da
pneumonia e da meningite.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

O pneumocystis carinnii é um oportunista muito conhecido porque aparecia em doentes com HIV não
tratados, numa fase inicial, provocando-lhes pneumonia (em indivíduos saudáveis não causa qualquer
transtorno), levando à sua morte.

- Infeções fúngicas ou micoses, são importantes causas de morbilidade e mortalidade em humanos.

- As infeções designam-se por endémicas ou oportunistas:

• Endémicas: causadas por fungos presentes no meio ambiente;


• Oportunistas: quando fungos causam doença leve (ou não causam doença de todo) em indivíduos
saudáveis, mas são responsáveis por doença severa em indivíduos imunocomprometidos (muitas
vezes mortais).

Exemplos de situações de imunidade comprometida: deficiência em neutrófilos (neutropenia); HIV;


quimioterapia (contra tumores) e terapias imunossupressoras em recetores de transplantes.

- Resposta imunológica protetora a fungos envolve células da imunidade inata como neutrófilos, macrófagos
e ILCs (células linfoides inatas), assim como LT Th17 (imunidade celular), que produzem IL-17.

- Os macrófagos e DCs (células dendríticas) expressam PRRs que reconhecem a presença de fungos via TLRs e
recetores de dectina (que reconhecem β-glucanos à sua superfície; é um tipo
de lectina – imunidade inata). Estes libertam citocinas (como IL-23 e IL-17)
que recrutam e ativam neutrófilos diretamente ou via ativação de ILCs
residentes nos tecidos.

- Os neutrófilos libertam substâncias fungicidas, como ROS e enzimas


lisossomais, fagocitando fungos para posterior morte intracelular.

- Muitos fungos extracelulares induzem fortes respostas de Th17. Estas


células estimulam inflamação e recrutam neutrófilos e monócitos que
destroem os fungos.

- As respostas Th1 são protetoras contra fungos intracelulares (que


replicam dentro das células). IL-17 GM-CSF
IL-22
- Os fungos também podem levar à produção de anticorpos específicos
com algum potencial protetor.

Nesta figura representa-se uma célula dendrítica (DC) ou um macrófago


que expressam recetores Toll (TLRs) ou dectin receptors (recetores de
dectina, CLRs – C-type lectin receptors) que reconhecem componentes dos
fungos. A via de sinalização destes recetores da imunidade inata leva à
produção de IL-1 e IL-23 que atuam sobre ILC3 que produzem IL-17 (muito
boa a recrutar neutrófilos – muito produzida por Th17 e produzida por ILC3),
IL-22 (muito produzida por ILC3 e produzida por Th17; importante para
indução de péptidos antimicrobianos e de proteção das mucosas) e GM-CSF.
Estas citocinas atuam sobre células epiteliais e induzem a produção de
péptidos antimicrobianos que são importantes no controlo da infeção por
fungos. O GM-CSF atua na medula óssea e leva à produção de neutrófilos.

Numa resposta adaptativa, as citocinas IL-23, IL-6, IL-1 e TGF-β são


importantes na indução de linfócitos T naive em Th17 que produz IL-17, que
perpetua este mecanismo protetor contra as infeções por fungos.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Esclarecimento: A citocina primordial para o recrutamento de neutrófilos é a IL-17. Macrófagos e DCs


reconhecem fungos via PRRs (TLRs e Dectinas). Este reconhecimento leva à produção de citocinas como IL-23 e
IL-1 que ativam ILC3 (células linfoides inatas tipo 3) residentes nos tecidos. As ILC3 são excelentes fontes de IL-
17. Outras citocinas produzidas por DCs e macrófagos (via reconhecimento por TLRs de PAMPs presentes em
fungos) que recrutam e ativam neutrófilos diretamente são a IL1-β e TNF-α. Citocinas produzidas por DC
também são importantes na diferenciação de Th17, produtoras de IL-17, a partir de células T naive. Os
neutrófilos recrutados para os locais de infeção também podem ser ativados diretamente por fungos, via PRRs
que estes expressam.

Mecanismos de evasão do sistema imunológico por fungos:

- Evasão de reconhecimento
por PRRs:

• Para evitar
reconhecimento por PRR,
alguns fungos (dimórficos)
alteram a sua morfologia de
levedura para hifas, de modo a
reduzir a presença de PAMPs
(pathogen associated
molecular patterns).
• C. albicans expressa
uma proteína que cobre as
moléculas de β-glucano na sua
parede celular, impedindo o
seu reconhecimento por fagócitos que expressam dectin-1.

- Evadir a fagocitose:

• A morfologia de hifa exibida por C. albicans confere-lhe uma massa demasiado grande para ser
fagocitada por fagócitos.
• Cryptococcus neoformans secreta uma proteína designada por App1, apenas induzida em condições
de baixa glucose como no pulmão. App1 interage com CR1 e CR3 (recetores de complemento de 1 e 3),
impedindo a sua fagocitose por fagócitos).

- Promover uma resposta Th menos eficiente (Th17 e Th1 são as eficientes):

270
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

• Muitos fungos produzem toxinas e outras moléculas com propriedades imunossupressoras e que
promovem desvio da resposta
para Th2, que é ineficiente
(para estas infeções por
fungos).
• Reconhecimento de
ligandos de fungos por alguns
PRRs presentes em células
epiteliais induzem a produção
de TSLP (Thymic stromal
lymphopoietin) e IL-25, que
amplificam respostas Th2 e
promovem diferenciação de
iTreg (células T reguladoras
imunossupressoras).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Resposta imunológica protetora a parasitas:

Estão pouco caracterizadas (são as menos detalhadas).


Entende-se infeção por parasitas como a infeção por
protozoários, helmintas e ectoparasitas. Alguns exemplos
são: o trypanosoma cruzi que é um protozoário causador
da doença de Chagas, trypanosoma brucei que causa a
doença do sono, o trypanosoma gondii que causa a
toxoplasmose, o plasmodium falciparum que causa a
malária, alguns helmintas como lombrigas, o schistosoma,
etc.

Componentes da imunidade inata:

Fagocitose (por fagócitos) está envolvida, mas os


parasitas são resistentes à atividade microbicida de
fagócitos. A imunidade inata não é eficiente para infeções
por parasitas.

Componentes da imunidade adquirida:

Diferentes parasitas desencadeiam diferentes tipos de


resposta imunológica, dependendo do tamanho e
celularidade do invasor e do seu ciclo de vida. No geral, os
protozoários usualmente licitam uma resposta Th1 que é
protetora, ao passo que infeção por helmintas e
ectoparasitas são controladas por respostas Th2.

Nesta tabela encontram-se alguns protozoários como os causadores da malária, leishmaniose (leishmania
donovani) e doença do sono.

No caso de plasmodium os principais mecanismos de imunidade protetora são a imunidade humoral mediada
por anticorpos e a ação de linfócitos T CD8+ citotóxicos (CTLs).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

No caso da leishmania o principal mecanismo de imunidade protetora é a ação de células T CD4 + Th1 que
ativam macrófagos, aumentando a sua atividade microbicida, para matarem os parasitas fagocitados.

No caso de schistosoma os eosinófilos e macrófagos possuem um papel protetor importante.

O principal mecanismo de defesa contra protozoários que sobrevivem em macrófagos é a imunidade celular,
particularmente a ativação de macrófagos por IFN-γ produzido por Th1.

Uma célula T naive diferencia-se para uma


célula Th1 que produz IFN-γ e TNF. O IFN-γ é
crucial para a ativação dos macrófagos para
matar os parasitas fagocitados pelos
macrófagos.

No entanto, se a resposta é reorientada para


uma resposta mediada por Th2 que produz IL-
10, IL-4 e IL-13 existe uma inibição da ativação
dos macrófagos (da sua atividade), por
inibição da via clássica de ativação de
macrófagos com consequências dramáticas
por infeções com protozoários (disseminação
da infeção).

Por exemplo, em ratinhos infetados com


leishmania major (usam-se geralmente as
estirpes B6 –mais propensos a Th1 ou BALB/c
– mais propensos a Th2), os ratinhos
B6 – propensos a Th1 - conseguem
sobreviver (recuperam da infeção),
mas os ratinhos BALB/c – propensos
a Th2 – não conseguem sobreviver
(por disseminação da infeção).

A defesa contra muitas infeções


por helmintas é mediada por
ativação de Th2, que resulta na
produção de IgE e ativação de
eosinófilos.

As IgE’s possuem um papel crucial


na infeção por helmintas.

Uma DC que expresse um PRR


reconhece o antigénio derivado do
helminta e leva à ativação de uma
célula T naive em Th2. Esta Th2 ativa
o LB e devido às citocinas secretadas
pela Th2 (IL-4, IL-5 e IL-13) leva a
que o LB se diferencie em
plasmócitos que secretem IgE’s.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

As IgE’s (resposta mais importante) em mastócitos provoca a desgranulação de mastócitos que leva à
libertação de histamina (induz a peristalse do intestino para eliminar o microrganismo).

Os eosinófilos também são importantes no combate contra helmintas porque a ligação FcεRI ao anticorpo
induz desgranulação do eosinófilo com possibilidade de matar parasitas.

Além da produção de IgE, a produção de IgA pelos LB/plasmócitos essencial para a proteção das mucosas das
infeções por parasitas (por impedimento da adesão e entrada destes).

Evasão da resposta imunológica protetora por parasitas:

Os parasitas evadem respostas


protetoras via redução da sua
imunogenicidade e inibição das respostas
imunes do hospedeiro.

- Alguns parasitas alteram a expressão


de antigénios de superfície durante o seu
ciclo de vida no hospedeiro (exemplos:
Trypanossoma e Plasmodium recorrem ao
mecanismo de evasão por variação
antigénica).

- Alguns parasitas inibem a resposta


imune do hospedeiro por múltiplos
mecanismos (exemplos: Schistosoma
induz anergia de células T e Leishmania
induz a diferenciação de células T
reguladoras).

Existe, inclusive, uma teoria de que infeções por helmintas induzam bastante bem células T reguladoras, que
pode serem usadas para tratamento de doenças autoimunes.

Aula 23 – Vacinação

O que é uma vacina?

A palavra vacina deriva do latim Variolae vaccinae


(Varíola bovina), que em 1798 Edward Jenner
demonstrou ser eficaz na prevenção da Varíola em
humanos (observou que as criadas que ordenhavam
o leite não desenvolviam a doença mortal, ou
desenvolviam uma mais leve).

Atualmente, o termo vacina é aplicado a todas as preparações biológicas, produzidas a partir de


microrganismos vivos, que aumentam a imunidade contra a doença causada por esse microrganismo (isolado).

Vacinas eficazes: Varíola, Difteria, Sarampo, Papeira, Poliomielite, Tétano.

274
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Em 1800 iniciou-se a vacinação da varíola do norte da América e Europa e pelo ano de 1900 esta já teria sido
eliminada da maioria dos países industrializados. Em 1959, elaborou-se o programa contra a erradicação desta
doença e em 1979 foi considerada erradicada pela OMS.

No final do século XVIII, 400000 pessoas morriam por ano na Europa de varíola. A Varíola foi erradicada em
1979.

A poliomielite levava a paralisia ou sequelas em termos de mobilidade.

- Número de casos de poliomielite diminuiu


dramaticamente com a introdução da vacinação.

- 1988: campanha mundial para a erradicação


da doença.

- Em Portugal, a doença está considerada


erradicada.

- Em 2005 eram muito poucos os países em que


esta doença ainda persistia.

Existiu, no final do século XVIII, um aumento


considerável da esperança média de vida em
países industrializados com a massificação da
vacinação que permitiu o controlo de doenças
infeciosas.

Antigamente, vivia-se até pouco mais dos 60 anos, agora já se vive até aos 80/90 anos.

Com a introdução das vacinas, nos EUA, levou-se a uma redução dramática do número de mortos por estas
doenças.

No entanto, vacinas eficazes são ainda necessárias no combate de muitas doenças (e.g. SARS-COV-2, HIV,
tuberculose).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Vacinas eficazes já disponíveis precisam


de ser administradas => existem
movimento anti vacinas com considerável
expressão nalguns países (colocam em
causa os planos de campanha de
vacinação) ou dificuldades de campanhas
por parte de países ainda em
desenvolvimento.

Têm surgido recentemente casos de


sarampo, inclusivamente em Portugal.
Com a vacina na década de 60, o número
de casos de sarampo diminuiu. No
entanto, como algumas pessoas não
quererem ser vacinadas, aparecem esporadicamente alguns surtos.

Desenvolvimento de uma vacina:

• Investigação básica intensiva:

- Requer muito tempo e dinheiro.

- Delineação prévia dos alvos imunológicos específicos do programa de vacinação (estabelecer os correlatos
de proteção imune – encontrar nos indivíduos vacinados sinais de que a vacina foi administrada com eficiência,
por exemplo contra um vírus quer-se a formação de anticorpos).

• Ensaios clínicos envolvendo humanos são estritamente regulamentados (atraso na disponibilização de


uma vacina).
• Mesmo que uma vacina eficaz seja encontrada, a presença de efeitos adversos impede a utilização da
mesma.
• Nas vacinas, a proteção é providenciada quer por componentes pré-existentes da resposta
imunológica ou mais frequentemente, por indução da geração de células de memória específicas para
um determinado antigénio. A imunização pode ser assim dividida em passiva e ativa:

- Passiva- via transferência de anticorpos (exemplos: transferência de anticorpos da mãe para o feto, sendo
protetores contra infeções no bebé; leite materno (IgA); transferência de anticorpos é usando na terapia contra
mordedura de cobras (fica-se imune ao veneno); transferência de IvIg [pool de imunoglobulinas] em doentes
com imunodeficiências em linfócitos B, suscetíveis a infeções, ou o uso de antibióticos como o profilaxia).

- Ativa- induz proteção duradora, envolve formação de células de memória.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Imunização passiva é temporária (depende da semivida dos anticorpos, que


depende dos isotipos – 3 semanas nas IgG):

- Exemplos de imunização passiva (transferência de anticorpos específicos


contra os agentes infeciosos): veneno da mordedura de aranhas (viúvas negras)
usado em cavalos; nestes também se usam toxinas que causam o botulismo.
Anticorpos humanos policlonais contra o citomegalovírus, utilizados em doentes
infetados com este vírus. No caso de toxinas da difteria também se usam em
cavalos. [mais ao lado]

Eficaz para a recuperação de indivíduos infetados com determinados


microrganismos.

Para imunidade duradora é necessário proceder a uma imunização ativa.

Imunização ativa versus passiva:

Na imunização ativa: Na imunização passiva:

- Temos de injetar um antigénio do microrganismo ou o - Injetam-se anticorpos preformados nos indivíduos;


microrganismo atenuado/morto;
- É uma proteção imediata, mas de curta duração;
- Requer, muitas vezes, a adição de adjuvantes, isto é,
- Só providencia imunidade humoral – o patogénio alvo
compostos que vão aumentar a imunogenicidade do
tem de ser suscetível a proteção mediada por anticorpos;
antigénio;
- Existe, por vezes, o risco de se poder transferir
- Desenvolvimento de respostas imunológicas in vivo;
patogénios (apesar de reduzido).
- Este tipo de imunização requer tempo, mas induz a
- Iniciou-se este tipo de imunização em Portugal para
proteção duradoura por parte de linfócitos B e T de
combater o SARS-CoV-2 utilizando soro/plasma
memória.
caulescente de indivíduos que recuperaram da infeção
- Utilizada pela maioria das vacinas; (por transferência de anticorpos).

- Ativação de uma resposta celular (muito eficaz em


infeções por bactérias intracelulares) como uma resposta
humoral (muito eficaz nas infeções virais).

277
Objetivo da vacinação:

Nos gráficos ao lado


observa-se a magnitude de
uma resposta imunológica.

Num primeiro encontro


com antigénios de um
microrganismo, a
magnitude da resposta é
baixa. Apesar disso, há
geração de células B e T de
memória. Assim, esta
resposta imunológica
primária é fraca e de pouca
duração.

No entanto, ao existir vacinação e, portanto, subsequente encontro com o patogénio viável, vai ser
estabelecida uma resposta imunológica secundária – forte, de maior longa duração/extensão, rápida e eficaz
(contra a infeção). Isto deve-se ao facto de existirem células de memórias resultantes da vacinação (primeiro
encontro com o patogénio).

Efeitos secundários das vacinas:

Existe uma possibilidade de efeitos adversos num número muito reduzido de indivíduos. É controlado por
programas de vacinação.

- Este é o caso com qualquer medicamento.

- No entanto, os benefícios para a população são muito superiores ao risco de efeitos adversos e as vacinas
têm de ser utilizadas para proteger a maioria da população.

As vacinas têm de ser utilizadas numa grande parte da população. Neste contexto, ouve-se falar do conceito
de imunidade de grupo (Herd immunity) que é importante, visto que existem sempre pessoas que não podem
ser vacinadas (doentes com cancro, alergias, etc). Na situação do SARS-CoV-2, a Inglaterra era um dos países
que defendia este tipo de imunidade deixando a disseminação do vírus e criar esta imunidade de grupo (tendo
acabado por desistir desta ideia, adotando medidas de confinamento).

Numa situação onde a


população não se encontra
imune a uma doença, como o
caso atual da pandemia do
Covid-19, o microrganismo
consegue transmitir-se pela
população.

Se existir uma imunidade de


grupo, existem indivíduos
imunes (a laranja na figura
seguinte), pelo que mesmo quando um indivíduo contrai a doença, não consegue transmitir essa mesma doença

278
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

por esses indivíduos. Assim,


estes indivíduos imunes
protegem os indivíduos não-
imunes, visto que não
possuem a capacidade de
lhes transmitir a doença.
Assim, não desenvolvem a
doença.

Para garantir este tipo de


imunidade tem de existir um
número mínimo de
indivíduos vacinados para garantir a sua proteção e a da restante população (que não era o caso de Inglaterra).

Em relação ao limite para se poder proceder à imunidade de grupo, é necessário que uma certa percentagem
da população esteja vacinada para uma dada doença. Alguns exemplos são: para a difteria é 85% (85% da
população tem de estar vacinada para existir imunidade de grupo), no sarampo é 83-94% (à volta de 90% dos
indivíduos têm de estar vacinados para haver imunidade de grupo).

A proporção de indivíduos imunes numa população que vão impedir a disseminação da doença é conhecida
pelo limite de imunidade de grupo. Cada doença tem o seu próprio limite (threshold) e quanto mais facilmente
esta doença é transmitida, mais alto tem de ser este limite. No caso do Covid-19, sendo muito facilmente
transmitida, a quantidade ou percentagem de indivíduos que vão ter de estar imunes (vacinados, recuperados)
para se controlar a transmissão recorrendo a imunidade de grupo vai ter de ser elevada, pelo menos 90%.

Quanto mais alto o threshold, maior tem de ser a cobertura da vacinação e eficiência para interromper a
transmissão da doença. Doenças facilmente transmissíveis como o sarampo, podem continuar a ser
transmitidas na comunidade mesmo com elevada cobertura de vacinação e elevada eficiência da vacina.

279
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

 Este é o plano nacional de


vacinação em Portugal (2020).

Aqui encontram-se as doenças


para as quais existem vacinas
obrigatórias em Portugal, como a
hepatite B, difteria, tétano, tosse
convulsa, poliomielite, sarampo,
rubéola, vírus do papiloma
humano, etc.

Para existir um correto


desenvolvimento de vacinas
eficientes tem que se:

- Atingir imunidade protetora: o


mecanismo de proteção contra
infeção natural tem de ser tido em
atenção.

- Tem de se produzir memória


imunológica, isto porque uma
vacina que induza apenas resposta
imunológica primária (mas não
secundária) não é eficiente.

Existem diferentes tipos de vacinas e,


portanto, existe uma classificação referente
às mesmas:

- Vacinas com microrganismos (1ª geração


de vacinas – mais antigas):

• Vacinas com microrganismos


atenuados como a do sarampo, papeira,
poliomielite, rotavírus, tuberculose,
varicela, febre amarela, etc.
Vantagens: Estas vacinas induzem uma
resposta imunológica muito forte/eficaz e
induzem imunidade duradoura com poucas
doses.
Desvantagens: Este tipo de vacinas
atenuadas requer refrigeração aumentando
o custo destas vacinas (um problema para
países em desenvolvimento). Podem ocorrer
mutações dos microrganismos (que estão
vivos) para formas virulentas (é pouco
frequente, mas é possível).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

• Vacinas com microrganismos inativados ou mortos como a cólera, a gripe/influenza, hepatite A,


peste, etc por uso de métodos químicos como formaldeído que inativa os microrganismos.

Vantagens: vacinas estáveis e seguras do que as vacinas com microrganismos vivos atenuados. Não é preciso
refrigeração.

Desvantagens: a resposta imunológica licitada por estas vacinas é mais fraca do que vacinas com
microrganismos atenuados, pelo que pode ser necessário existir exposição a novas doses ou múltiplas
inoculações da vacina.

- Vacinas que consistem em macromoléculas purificadas de microrganismos (2ª geração de vacinas):

• Toxoides como os da difteria e do tétano; os microrganismos causadores destas doenças produzem


exotoxinas inativas formando o toxoide que é administrado aos indivíduos.
Vantagem: o sistema imunológico fica preparado face a estas toxinas, conseguindo posteriormente neutralizá-
las. Vacinas muito eficazes.
Desvantagem: podem requerer várias inoculações/doses, como no caso do tétano cujo reforço é de 10 em 10
anos.
• Vacinas de subunidades como a hepatite B e a pneumonia.
Vantagem: utilizam-se antigénios específicos dos microrganismos, diminuindo a hipótese de ocorrerem
reações adversas.
Desvantagem: são vacinas difíceis de desenvolver.
• Vacinas conjugadas que se utilizam em casos em que o antigénio é pouco imunogénico, pelo que se
acopla o mesmo a outro que seja mais imunogénico para se produzir uma resposta imunológica
eficiente.
Vantagem: prepara-se o sistema imunológico para receção de certas bactérias.

- Outros (3ª geração de vacinas – mais recentes e em ensaios clínicos):

• Vacinas de DNA – está a tentar estudar-se em HPV/vírus do papiloma humano e Zika vírus, pois
conferem elevada e forte resposta imunológica humoral e celular, além de ser um método barato.
• Vacinas de vetores recombinantes – tenta mimetizar uma infeção natural, resultando numa resposta
imune forte (ensaios clínicos com ébola).

Vai agora detalhar-se cada um destes tipos…

Vacinas com microrganismos vivos atenuados:

- Os microrganismos são atenuados de maneira a perderem a capacidade de causar doença no hospedeiro,


isto é, retêm a capacidade de crescimento no hospedeiro (o crescimento do microrganismo é reduzida, para
que a resposta imunológica desencadeada seja suficiente para eliminar a infeção).

- As bactérias são cultivadas por longos períodos de tempo em condições adversas; aquelas que sobrevivem
não são capazes de se adaptar às condições ótimas no hospedeiro. No caso da BCG ou Bacilo de Calmette-
Guèrin, faz-se crescer Mycobacterium bovis in vitro em concentrações elevadas de ácidos biliares durante
bastante tempo e as bactérias que sobrevivem, são as que sofreram mutações e adaptações para crescimento
em ambientes de elevadas [ácidos biliares].

- No caso dos vírus, estes podem ser cultivados em células de hospedeiros não naturais, acumulando mutações
que os podem enfraquecer (reduzindo a viabilidade destes microrganismos para a inoculação em humanos,
posteriormente).

- Exemplos de deste tipo de vacinas: vacina do sarampo, da papeira, da rubéola e da BCG, etc.

281
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

A origem da vacinação e, nomeadamente, deste


tipo provém do uso de fluídos de pústulas do vírus
da varíola de bovinos (cowpox) injetados em
humanos por Jenner (1796) para proteção contra a
varíola.

Outra contribuição importante foi a de Pasteur


(1879) que produziu a vacina contra a cólera.

A imunização ativa de microrganismos vivos atenuados possui vantagens e desvantagens:

Vantagens Desvantagens

• Necessitam de um baixo número de • Pode ocorrer reversão para uma forma


inoculações. virulenta.
• Induz respostas celulares (não só • Há risco de contaminação com outros
humorais) duradouras. microrganismos.
• Não são necessários adjuvantes (são • Elevado custo de produção e tempo de
altamente imunogénicas por si). semivida curto.
• Menor risco de hipersensibilidade (mais • O armazenamento requer refrigeração
semelhantes ao natural) (rede de frio: 20 a 80% do preço).
• Mais barata. • Para vírus é um tipo de vacinação
• Vacinas eficazes (resposta imunológica adequado, mas é mais difícil para
forte) e os efeitos adversos altamente bactérias.
controlados.

Os riscos associados à
toma de uma vacina são
muito menores dos
causados pela infeção
natural.

Na tabela ao lado
encontram-se os riscos
associados à não-toma e
toma da vacina do sarampo
e como se pode observar
nenhum indivíduo vacinado
com a vacina do sarampo
morre, ao passo que a
infeção do sarampo (sem
vacinação) possui

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

mortalidade (5 a 15% dos infetados em países em desenvolvimento). Outro exemplo é o desenvolvimento de


diarreia severa em 66% dos indivíduos infetados, ao passo que nenhum dos vacinados sofre com esta. O mesmo
com as otites.

Podem existir alguns efeitos secundários, mas estes são mesmo muito raros, como encefalomielite de 1 em 1
milhão de indivíduos, mas é muito menos raro aquando da infeção natural por sarampo.

Vacinas com microrganismos mortos ou inativados:

- Inativação de microrganismos pelo calor ou métodos químicos como:

• Formaldeído (“crosslinking” de proteínas e ácidos nucleicos);


• Acetona ou álcool (desnaturação);
• Alquilação, óxido de etileno (crosslinking de ácidos nucleicos sem afetar as proteínas de superfície).

- Esta inativação deve-se à Incapacidade de replicação no hospedeiro;

- Os epítopos têm de ser mantidos após o processo de inativação dos microrganismos para a vacina ser
eficiente.

- Requer boosts frequentemente (inoculações constantes).

- Riscos associados:

• O microrganismo tem de ser crescido em largos números antes de inativação, o que implica riscos
para quem está diretamente envolvido no processo de manufaturação/produção da vacina.
• A inativação pode não ser 100% eficiente.

- Exemplos: Vacina contra Bordetella pertússis que causa a tosse convulsa, vacina contra febre tifoide, vacina
da gripe, etc.

A imunização ativa de microrganismos vivos inativados (mortos) possui vantagens e desvantagens:

Vantagens Desvantagens

• Estáveis no armazenamento. • Imunização menos potente.


• Mais seguras de que vacinas • Imunizações repetidas (aumento do custo
vivas/atenuados. – limitação em países em
• Menor risco de provocar doença por desenvolvimento).
virulência residual. • Uso de adjuvantes para aumentar a
• Menor probabilidade de conter imunogenicidade que pode levar a reações
microrganismos contaminantes devido aos indesejáveis (exemplo:
métodos químicos ou calor. hipersensibilidades).
• Não requer refrigeração. • Pode ser variável de lote para lote.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Vacinas de subunidades:

- Utilizam-se macromoléculas purificadas de microrganismos.

- Antigénios isolados que melhor estimulem a resposta imune.

- Exemplos: hepatite B e a pneumonia.

Vantagens: Desvantagens:

• Evitam alguns dos riscos presentes em • São vacinas difíceis de desenvolver.


vacinas com microrganismos atenuados ou • Necessário selecionar antigénios
inativados. importantes.
• Utilizam-se antigénios específicos dos • Selecionar modo de administração de
microrganismos, diminuindo a hipótese de antigénios de modo a estimular respostas
ocorrerem reações adversas. imunes protetoras.
• Na ausência de adjuvantes alguns
antigénios podem induzir tolerância.

Vacinas de toxoides:

- Algumas bactérias são patogénicas devido à produção de exotoxinas; estas são purificadas, inativadas com
formaldeído dando origem ao toxoide que é utilizado na imunização.

- O sistema imunológico é então capaz de neutralizar a toxina aquando da infeção natural, pela produção de
anticorpos.

- Toxoides como os da difteria e do tétano; os microrganismos causadores destas doenças produzem


exotoxinas inativas formando o toxoide que é
administrado aos indivíduos. O toxoide é, em suma,
a exotoxina libertada por bactérias extracelulares
inativada por formaldeído, deixando de ser
patogénica. Retém a capacidade de induzir
anticorpos neutralizantes.

Vantagem: o sistema imunológico fica preparado


face a estas toxinas, conseguindo posteriormente
neutralizá-las. Vacinas muito eficazes.

Desvantagem: podem requerer várias


inoculações/doses, como no caso do tétano cujo
reforço é de 10 em 10 anos.

Vacinas conjugadas:

- Quando as vacinas de subunidades são pouco


imunogénicas, estas podem ser acopladas a
estimuladores fortes. Exemplo – polissacárido de
Haemophilus influenzae (não imunogénico) associado com toxoide tetânico que é altamente imunogénico,
resultando em imunidade ao Haemophilus.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- Vacinas conjugadas utilizam-se em casos em que o antigénio é pouco imunogénico, pelo que se acopla o
mesmo a outro que seja mais imunogénico para se produzir uma resposta imunológica eficiente.

Vantagem: prepara-se o sistema imunológico para receção de certas bactérias.

Vacinas de DNA:

• Vacinas de DNA – está a tentar estudar-se em HPV/vírus do papiloma humano e Zika vírus, pois
conferem elevada e forte resposta imunológica humoral e celular, além de ser um método barato.

- Partículas de DNA ou DNA contendo genes que estimulem respostas imunitárias.

Vantagens:

• Proteínas expressas na sua forma natural no hospedeiro.


• Induzem resposta humoral e celular eficientes.
• Conferem memória imunológica.
• Custo de produção reduzido.
• Eficazes sem necessitar de adjuvantes.
• Baixo risco, não necessitam de refrigeração.

Desvantagem:

• Só são eficazes contra apenas antigénios proteicos.

Existe uma clonagem para o antigénio proteico de interesse num


plasmídeo de eucariota. Este plasmídeo recombinante é injetado em
células do músculo dos indivíduos a imunizar, onde vai haver expressão da proteína e apresentação da mesma
a LT CD4+ e CD8+, existindo um desencadeamento de respostas humorais e celulares e estabelecimento de
memória imunológica.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Esta figura procura demonstrar a capacidade que estas vacinas, que utilizam vetores de expressão eucarióticos
no qual o gene que codifica para a proteína de interesse é clonado, de induzir o desenvolvimento de respostas
celulares e humorais. Vacinas de DNA utilizam “apenas” estes vetores, ao passo que nas vacinas de vetores
recombinantes os genes que codificam para antigénios de microrganismos são introduzidos em vírus atenuados
ou bactérias. O microrganismo atenuado serve como vetor, replicando-se no hospedeiro e expressando a
proteína de interesse do patogénio. Existem alguns exemplos de vacinas de DNA que entraram em ensaios
clínicos contra diferentes agentes infeciosos e cancros.

Vacinas de Vetores Recombinantes:

• Vacinas de vetores recombinantes – tenta mimetizar uma


infeção natural, resultando numa resposta imune forte
(ensaios clínicos com ébola).
• Uso de um vírus ou bactéria atenuada para introduzir DNA
microbiano nas células do corpo.

Vantagem: Mimetizam infeção natural resultando em fortes


respostas imunes (eficientes).

Microrganismos recombinantes: introdução de genes que


codificam para proteínas de diferentes microrganismos ou em
bactérias (ex. BCG ou Salmonella, Shigella, Listeria) ou em vírus (ex.
poxvirus).

É semelhante à estratégia de DNA recombinante. Existe clonagem


do antigénio de interesse do microrganismo num vetor de
expressão (neste caso, é um vetor de vírus vaccinia). De seguida, há
transfeção de células alvo tanto do vírus vaccinia como o vetor
recombinante existindo recombinação homóloga e, por fim,
selecionam-se as células-alvo que possuem o vírus vaccinia onde foi
incorporado o plasmídeo de interesse. Desta maneira consegue-se que este vírus quando inoculado num
indivíduo vai produzir a proteína de interesse e levar ao desenvolvimento de uma resposta protetora.

Dúvidas de nomenclatura

Classificação dos diferentes tipos de vacinas que existem atualmente: as derivadas de microrganismos inteiros, que se podem
subdividir em vacinas que incluem microrganismos vivos atenuados e as que utilizam microrganismos inativados ou mortos (1ª
geração de vacinas); a classe de vacinas que utilizam macromoléculas purificadas de microrganismos, que se podem subdividir
em 3 tipos: toxoide, subunidades ou conjugadas (2ª geração de vacinas); e finalmente uma classe de vacinas que ainda não
estão disponíveis na clínica, mas em teste: as vacinas de DNA e de vetores recombinantes (3ª geração de vacinas). A segunda
classe pode ser designada tanto por vacinas de subunidades como macromoléculas purificadas de microrganismos. Neste caso,
em vez de microrganismos inteiros (estratégia inicialmente utilizada na elaboração de vacinas), esta classe de vacinas inclui
componentes do microrganismo ou antigénios mais relevantes. Apesar desta característica tornar estas vacinas mais seguras e
fáceis de produzir, é muitas vezes necessário incluir na sua formulação adjuvantes para estimular uma resposta imunológica
eficiente. As vacinas conjugadas também podem incluir toxoides, mas toxoides são também uma subclasse independente deste
tipo de vacinas.
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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Fatores requeridos para uma vacina bem-sucedida/desenvolvida:

- Tem de ser eficaz: tem de induzir uma resposta protetora apropriada (humoral e celular) e de duração
adequada.

- Tem de ser de fácil obtenção.

- Idealmente estável (não necessitar de refrigeração).

- Custo adequado (barata, devido aos países em desenvolvimento).

- Segura (eliminar qualquer patogenicidade).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Aula 24 – Tolerância imunológica (conceito e mecanismos)

Tolerância imunológica:

- Refere-se à ausência de resposta a um antigénio que é induzida por exposição prévia a esse mesmo antigénio.
Tolerância imunológica pode então definir-se como a ausência de resposta imunológica agressiva a um conjunto
de antigénios, num sistema imunológico competente. Tolerância imunológica ao próprio ou self-tolerance é a
ausência de respostas a antigénios do próprio (self-antigens). Os mecanismos de tolerância imunológica
também são importantes para impedir que haja respostas imunológicas a antigénios que são inócuos,
nomeadamente alergénios (a tolerância imunológica possui uma resposta mais abrangente).

- Falência de mecanismos de manutenção de tolerância ao próprio (self tolerance) resulta em respostas


imunológicas contra antigénios do próprio => autorreatividade; e as doenças causadas pela perda da tolerância
designam-se por doenças autoimunes.

- Self/non-self descrimination: capacidade do sistema imunológico de reconhecer e responder a antigénios


non-self (exógenos) e a não a antigénios do self (do próprio). A propriedade de discriminar o que é nosso e o
que está fora do nosso organismo é fundamental para impedir o desenvolvimento de autoimunidade.

- Burnet´s “Horror Autotoxicus” (década de 50) - postula que linfócitos específicos para antigénios do próprio
são eliminados durante o período embrionário/neonatal para prevenir respostas imunes anti-self
(autoimunidade).

- Tolerância e autoimunidade são propriedades do organismo (inteiro) e não de células ou moléculas.

- A elucidação dos mecanismos de tolerância ao próprio é fundamental para compreender a patogénese de


doenças autoimunes.

Em 1957 o imunologista
Burnet desenvolveu a teoria
da Seleção clonal e adicionou
um corolário para explicar
porque é que o organismo se
mantinha tolerante.

Tanto no timo como na


medula óssea ocorre a
diferenciação de linfócitos T e
B, respetivamente que devido
ao processo aleatório de
recombinação VDJ existe o
potencial de gerar linfócitos
que têm possibilidade de
reagir contra componentes
do próprio. O Burnet tentou
explicar que no período
embrionário ou neonatal que
o desenvolvimento de
linfócitos ocorre antes do nascimento (no ratinho, só na altura do nascimento é que começam a existir linfócitos
T αβ a serem produzidos pelo timo) leva a que células autorreativas sejam deletadas, estando ausentes no

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

adulto. A teoria da seleção clonal defende que um clone de linfócitos específico para um dado antigénio quando
ativado vai expandir (expansão clonal).

Características da tolerância imunológica:

- Os mecanismos de tolerância eliminam ou inativam linfócitos B e T que expressam recetores de antigénio


com elevada afinidade para o antigénio do próprio (no timo, no desenvolvimento de LT, LT que reconheçam
com elevada avidez complexos MHC:péptido são eliminados pelo processo de seleção negativa; LB quando
interagem com elevada afinidade com antigénios expressos pela medula óssea ou são eliminados ou sofrem
reedição do recetor). Estes dois mecanismos são essenciais/cruciais/fundamentais para a manutenção da
tolerância ao próprio.

O processo de recombinação VDJ é aleatório; alguns linfócitos podem reconhecer antigénios do próprio;
mecanismos de tolerância imunológica previnem a resposta imunológica mediada por estes linfócitos.

- A tolerância imunológica é específica para um determinado antigénio, resultando do reconhecimento de


antigénio por clones individuais. Se um
indivíduo é tolerante ao antigénio A, vai
montar uma resposta ao antigénio B (é
restrito para o antigénio), para o qual é
intolerante.

Nesta figura mostram-se experiências


demonstradas em meados do século XX,
onde se demonstrou a existência de
tolerância neonatal a enxertos
alogénicos (com MHC díspar).

Um ratinho A que expresse um MHC A,


adulto, ao receber um enxerto de pele
de um ratinho B com outro MHC, este
ratinho A rejeita o enxerto de pele da
estirpe. Mas se durante o período
neonatal se injetarem leucócitos de
ratinho B e às 6 semanas (adulto), o
ratinho A receber o enxerto do ratinho
B, não ocorre rejeição e o enxerto é aceite. Assim, a tolerância no período neonatal é muito eficiente.

No entanto, se no mesmo ratinho se fizer um enxerto de pele de um ratinho C (para o qual não existiam
leucócitos respetivos), então de uma a duas semanas depois, o ratinho A rejeita o enxerto.

Estas experiências demonstram que a tolerância é específica e que o período neonatal é um período
permissivo para indução de tolerância.

- Existem mecanismos de Tolerância imunológica centrais, que atuam em linfócitos T e B imaturos durante o
seu processo de diferenciação no timo e na medula óssea (órgãos linfoides primários), respetivamente, assim
como mecanismos de Tolerância periféricos, que atuam em linfócitos T e B maturos na periferia (órgãos
linfoides secundários).

- Tolerância central ocorre durante o estadio de diferenciação de linfócitos no qual uma interação de elevada
afinidade com antigénios do próprio pode levar à apoptose ou substituição do recetor de antigénio por outro
não reativo (restrito para LB – reedição do BCR).

289
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- Mecanismos periféricos de indução de tolerância incluem indução de anergia ou deleção clonal, pelos quais
linfócitos maturos que reconhecem antigénios do próprio na periferia se tornam ou “não responsivos” após
nova exposição ao antigénio ou morrem por apoptose, respetivamente. Na periferia existem (até agora) dois
mecanismos: anergia e deleção clonal.

- Existe um terceiro mecanismo na periferia designado de ignorância clonal - é também um mecanismo de


manutenção de tolerância na periferia. Ignorância (exibida por clones de LB e LB) ocorre quando os antigénios
específicos para os linfócitos estão sequestrados em locais designados por “imunologicamente privilegiados”
como o olho, cérebro, útero (feto) e testículos. Alternativamente, a concentração destes antigénios pode ser
demasiado baixa para ativar eficientemente um linfócito.

Existem 3 formas pelas quais a ignorância pode ocorrer, mas só se descreverão duas. Imaginemos que temos
um LT específico para um antigénio do olho. O mecanismo que mantém este LT sob controlo designa-se por
ignorância, porque o antigénio que é específico para este linfócito T encontra-se num local “imunologicamente
privilegiado”. Há também a possibilidade da [antigénio] específico ser demasiado baixa para ativar o linfócito,
ou seja, este não responde a este antigénio.

- Anergia, deleção e ignorância são mecanismos passivos de tolerância periférica, em contraponto a


mecanismos ativos (tolerância periférica mantida por células T reguladoras).

- A tolerância periférica é também mantida por células T reguladoras (Treg) que suprimem a ativação de
linfócitos específicos para auto-antigénios (antigénios/componentes do próprio). A manutenção de tolerância
mediada por Tregs é considerada um mecanismo ativo de tolerância periférica.

- A indução de tolerância imunológica é uma possível estratégia terapêutica para prevenir respostas
imunológicas indesejáveis, sendo explorada na prevenção e tratamento de autoimunidade, na aceitação de
transplantes de órgãos, tratamento de alergias, terapia genética (exemplo: deficiência em fator VIII ou
hemofilia, importante para a coagulação, por indução do mesmo sem haver resposta imunológica de rejeição
deste), etc.

Em suma (esquema essencialmente correto para LT):

- A seleção negativa elimina timócitos que possuem TCR’s que reconhecem com elevada afinidade complexos
MHC:péptido.

- LB reativo passar a não reativo por reedição do BCR.

- As células T reguladoras desenvolvem-se no timo.

290
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Tolerância central e periférica a antigénios self:

Neste esquema encontram-se representados os


mecanismos de tolerância, ainda que falte a
ignorância (mecanismo passivo na periferia).

No esquema encontram-se acima os mecanismos


de tolerância central que ocorrem nos órgãos
linfoides primários (timo e medula óssea) e em baixo
os mecanismos de tolerância periférica que ocorrem
nos órgãos linfoides secundários/periféricos (como o
baço).

A partir de um precursor linfoide, os linfócitos


diferenciam-se em T e em B. Ambos possuem
recetores de antigénios (TCR e BCR) que são
submetidos/testados à capacidade de
reconhecerem componentes/antigénios do próprio.
No caso dos linfócitos T, timócitos que reconhecem
com elevada afinidade/avidez estes self antigens
apresentados por APCs, sofrem apoptose/deleção
clonal (tolerância central). Quando a afinidade é
intermédia-alta existe o recrutamento para a
linhagem de células T reguladoras (tolerância
central), que na periferia são capazes de regular e
inibir a ativação e proliferação de células T
autorreativas (mecanismo ativo de
supressão/tolerância na periferia).

No caso dos linfócitos B, ao serem submetidos a


antigénios do próprio e serem autorreativos, podem
sofrer reedição do BCR antes de serem deletados (tolerância central).

Na periferia, os mecanismos passivos de tolerância periférica são a


indução de anergia, apoptose/deleção clonal e ignorância de linfócitos
T e B maturos.

291
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Mecanismos de tolerância
central a Linfócitos T:

No timo ocorre a deleção de


células autorreativas e o
desenvolvimento de células T
reguladoras que vão para a
periferia e exercem uma função
crucial na manutenção da
tolerância na periferia.

Durante o processo de
diferenciação no timo, timócitos
imaturos que reconhecem
antigénios com elevada avidez
morrem por apoptose. Alguns

timócitos escapam ao processo de seleção negativa (gama de avidez abaixo


do limiar de seleção negativa) e são recrutados para a linhagem de Tregs.

Papel de AIRE na deleção de linfócitos T no


timo:

No timo para ocorrer uma eficiente deleção


de linfócitos T é fundamental o papel do
autoimmune regulator ou AIRE, que é um fator
de transcrição expresso fundamentalmente por
células tímicas epiteliais medulares (mTECs),
que ativa a expressão de antigénios restritos a
tecidos periféricos (TRAs), antigénios do
próprio. Os timócitos que reconheçam com
elevada afinidade estes antigénios são
deletados, sendo esta deleção de LT
autorreativos é fundamental para impedir que
na periferia estes linfócitos T autorreativos
reconheçam antigénios do próprio específicos
expressos por tecidos na periferia, que poderia
levar ao desenvolvimento de autoimunidade.

Deficiências em AIRE (perda da função deste


fator de transcrição) leva ao desenvolvimento
de autoimunidade designada de APS-1 ou
APECED (sinónimos).

292
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Mutações hipomórficas (quando um alelo produz uma quantidade reduzida de produto ou um produto com
menor atividade) em AIRE (mutações não tão graves) na periferia também podem levar ao desenvolvimento de
outros tipos de autoimunidade (não APS-1 ou APECED que leva a hipotiroidismo, candidíase, etc),
nomeadamente autoimunidade específica de órgãos.

Tolerância central na medula óssea de linfócitos B imaturos:

A tolerância central e periférica não


é restrita a linfócitos T. Os linfócitos B
também podem ser deletados ou
rearranjar o BCR, quando
reconhecem antigénios
multivalentes na medula óssea.
Adicionalmente, linfócitos B imaturos
que reconhecem antigénios solúveis
na medula podem ser anergizados,
na periferia.

Por outro lado, linfócitos B imaturos


que reconheçam com baixa afinidade
antigénios que não façam cross-
linking (que não ativam tanto o BCR
como um antigénio multivalente),
podem ser induzidos num estadio de
ignorância, também na periferia, isto
é aqui não reagem ao seu antigénio específico.

Não esquecer que para um linfócito B responder a um antigénio


dependente de células T com elevada afinidade necessita de ajuda T, o que
significa que os mecanismos de tolerância de linfócitos T de alguma forma
garantem a tolerância nos linfócitos B. Isto é, ao manter-se o nível de células T autorreativas sob
controlo, garante-se que LB autorreativos não vão causar dano no organismo.

Figuras página 290 vs. 293

Aqui (p. 293) ilustram-se os mecanismos de tolerância a que os linfócitos B imaturos são submetidos na medula óssea (daí a
designação central). No caso dos Linfócitos T, existem "apenas" 2 mecanismos de tolerância centrais: a deleção (seleção
negativa) e o recrutamento para a linhagem de Tregs. Olhando atentamente para a figura acima, a deleção, anergia e ignorância
também estão indicados como mecanismos de tolerância periférica para linfócitos B (“migração para a periferia”). No caso de
linfócitos T, a tolerância periférica também é mantida por estes mecanismos, e adicionalmente pela atividade de células T
reguladoras. Na realidade, também é verdade que as Tregs podem controlar a ativação de Linfócitos B autorreativos na periferia,
visto impedirem a ativação de LT autorreativos que poderiam providenciar ajuda a LB autorreativos.

O esquema da página 290 ilustra os principais mecanismos de tolerância que operam em linfócitos. Apesar de se focar
primariamente em LT, é verdade que menciona a reedição de BCR, que é exclusiva de LB. No entanto, apesar de deleção e
reedição de BCR serem os mecanismos de tolerância central mais importantes para LB, a anergia e ignorância clonal também
podem ocorrer (como mecanismos de tolerância central – e periférica, menos importante - em LB, periféricos em LT).

293
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Presença de células T autorreativas na periferia:

A questão que se
coloca é a de qual é
a necessidade
existirem
mecanismos de
tolerância na
periferia se os
mecanismos de
tolerância central
são eficientes. A
resposta prende-se
com o facto de que
os mecanismos de
tolerância central
não são 100%
eficazes. No caso dos linfócitos T (também se aplica aos B), existem sempre linfócitos T autorreativos que
conseguem migrar para a periferia, ou seja, conseguem escapar ao processo de seleção negativa.

Além disso, apesar da expressão do fator de transcrição AIRE que garante expressão de muitos dos antigénios
expressos nos tecidos da periferia, nem todo o espetro de antigénios que um linfócito T pode encontrar na
periferia são expressos no timo (como antigénios que só aparecem em determinados períodos, por exemplo,
na puberdade) => contribui para que haja mais células T autorreativas (que reconhecem antigénios do próprio)
na periferia (fora dos órgãos linfoides primários).

294
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Por citometria de fluxo, observam-se


células T CD4+ e CD25- (células T efetoras).
A marcação destas células foi conseguida
com sangue humano periférico. À
esquerda apresenta-se um controlo e à
direita a situação experimental (onde se
observam diferenças consideráveis).

O GAD (descarboxilase do ácido


glutâmico) é um antigénio do próprio
expresso em células β pancreáticas e do
sistema nervoso central (SNC ou CNS). O
tetrâmero serve para determinar
células que são específicas para determinados antigénios (neste caso é MHC II: péptido onde o péptido é o
GAD), ou seja, reconhece células T CD4+ específicas para GAD.

Portanto, em células T CD4+ controlo que não expressem CD25 ou cadeia α do recetor de IL-2 e cujo tetrâmero
não é específico para GAD (MHC controlo sem um antigénio específico), possuem uma menor frequência, ou
seja, as células T efetoras específicas para esse antigénio não-específico são menos abundantes. Quando se usa
GAD, antigénio específico ou autoantigénio, na ausência de células T reguladoras (mais autorreativas), o número
de células específicas e autorreativas para este antigénio aumentam (5,3%). Conclui-se que na periferia existem
células T autorreativas.

Imunização de ratinhos saudáveis com autoantigénios pode quebrar tolerância e induzir autoimunidade:

Outra maneira de
evidenciar a presença de
células T autorreativas é de,
em ratinhos saudáveis,
imunizá-los com antigénios
self induzindo-lhes doenças
autoimunes como a
encefalomielite (por
injeção em B6/ratinho
saudável com MOG ou
myelin oligodendrocyte
glycoprotein).
Basicamente, usa-se um
adjuvante num animal
saudável, quebra-se-lhe a
tolerância por inserção de
um autoantigénio como o
myelin basic protein e o animal fica doente. Mas também há estirpes que não ficam doentes; isto deve-se ao
repertório nos ratinhos, isto é, o seu MHC que influencia a seleção tímica ou do repertório e a apresentação de
péptidos na periferia.

Assim, a quebra da tolerância na periferia faz-se por injeção de péptidos de autoantigénios em adjuvantes
fortes como o complete freunds adjuvant (CFA), que é um óleo mineral com microbactérias mortas. Ativam-se

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

TLRs e induz-se a inflamação, potenciando-se assim a apresentação de antigénios. A estirpe de ratinhos usada
é muito importante, pois nem todos ficam doentes. Por exemplo, em B6 não se conseguem induzir cardiopatias
com miosina cardíacas, mas em BALB/c já se consegue.

Principais mecanismos de
manutenção de tolerância na
periferia:

Para um linfócito T ser ativado


normalmente precisa de receber um
sinal via TCR mediado pelo
reconhecimento do seu péptido numa
molécula de MHC classe II, se for T
CD4+. Precisa ainda do sinal via
coestimulação via B7 da DC/APC e
CD28 da célula T. Assim induzem-se
células efetoras e de memória T.

No caso de anergia, recebe-se o sinal


via TCR, mas não se recebe o sinal via
coestimulação (sinal 2), pelo que a
célula T não prolifera e não responde
mesmo após nova estimulação com
outros antigénios, ao que se designa
de functional unresponsiveness. A anergia num linfócito T é induzida quando o linfócito T recebe sinal via TCR,
na ausência de sinal 2 de coestimulação (B7/CD80 ou CD86-CD28).

As células T reguladoras têm a capacidade de bloquear a ativação de células T efetoras (existem diversos
mecanismos pelos quais as Tregs podem exercer esta função).

Na periferia, células T autorreativas podem ser deletadas quando reconhecem o antigénio à superfície de uma
célula dendrítica.

Note-se que a presença de antigénios do próprio na periferia é devido a shading/oclusão de órgãos, etc em
situações de homeostasia, não sendo normalmente num contexto de inflamação. No entanto, uma lesão por
inflamação num órgão numa resposta imunológica extensa pode levar à apresentação de autoantigénios e levar
à ativação de células T autorreativas. Num contexto normal, os autoantigénios da periferia são apresentados na
ausência de coestimulação ou de moléculas coestimuladoras, podendo ficar anérgica, bloqueada ou morrer por
apoptose. Ainda assim, a apotose de células T autorreativas na periferia deve-se normalmente por activation-
induced cell death, onde uma célula T ativada autorreativa passa a expressar FAS e por interação com o ligando
de FAS, há morte celular programada desta célula. Mutações em FAS-FASL leva a linfoproliferação, doenças
linfoproliferativas em humanos.

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Anergia - Specific functional


unresponsiveness:

A ativação normal de LT requer sinal via


TCR e moléculas coestimuladoras para
poder existir proliferação e diferenciação
de células T.

No caso de anergia, a célula T recebe o


sinal 1 via TCR na ausência de sinal 2 via
moléculas coestimuladoras, levando a
um bloqueio de sinal (que se pode dever
a um recrutamento de fosfatases, à área
da sinapse imunológica, ativação de
ligases de ubiquitina que degradam
complexos da via de sinalização, etc).

In vitro, uma forma de induzir células T


anérgicas é usar anticorpos anti-CD3
imobilizados que vão fornecer sinal 1,
sem sinais de coestimulação, logo as
células ficam anergizadas, deixam de
crescer, apesar de se manterem viáveis durante dias/semanas.

Ignorância:

- Linfócitos T autorreativos presentes na periferia podem ignorar a presença do seu antigénio


específico por diversas razões:

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

• O antigénio específico está presente em concentrações muito baixas (abaixo do threshold para
ativação do TCR) => célula não é ativada.
• O antigénio encontra-se sequestrado em “locais privilegiados” (exemplos: olhos, cérebro, testículos e
útero/feto). Um trauma no olho (uma simples cirurgia) pode levar à libertação destes antigénios e possível
desenvolvimento de oftalmia simpática (doença autoimune).

Um linfócito T autorreativo pode não ser ativado mesmo que o seu antigénio específico esteja presente na
periferia se este estiver pouco expresso ou presente num local onde os LT não possam aceder (onde não há
estabelecimento de respostas adaptativas, como os locais imunologicamente privilegiados).

Na oftalmia simpática existe um trauma no olho que resulta na libertação dos antigénios sequestrados, que
vão ser levados por células dendríticas (DCs) para gânglios linfáticos onde ocorre a ativação T. Aqui há a ativação
de células T autorreativas e vão migrar de volta para o olho, onde podem causar a doença autoimune.

Tolerância mediada por células T reguladoras:

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

As células T reguladoras (CD4+ CD25+ - expressam a cadeia α


do IL-2R) são diferenciadas no timo por interação com
complexos MHC:péptido com mais elevada afinidade de que
os timócitos selecionados positivamente, mas mais baixa dos
que são selecionados negativamente. Estas células vêm então
para a periferia. As células derivadas do timo designam-se de
tTreg ou thymus-derived Treg (Treg diferenciadas no timo).

Existem evidências de que pode existir indução de células T reguladoras na periferia, isto é, células T naive que
em dados contextos como na mucosa intestinal, na presença de TGF-β1 – citocina fundamental para esta
diferenciação em células T reguladoras na periferia. Estas células T reguladoras designam-se de pTreg ou
peripherally-derived Tregs (Tregs diferenciadas na periferia).

No entanto, quando em humanos (sangue periférico) ou ratinhos (gânglio linfático ou um baço) são tanto
células T reguladoras que vieram do timo como as que vieram da periferia. Em situações normais, as que migram
do timo encontram-se em maior quantidade do que as que são geradas na periferia. Existe um terceiro tipo de
células T reguladoras que são as iTregs ou induced Tregs (Tregs diferenciadas in vitro a partir de células T naive,
por ativação via TCR na presença de TGF-β1 e IL-2).

As células T reguladoras in vivo (tTregs e pTregs) – a tolerância é uma propriedade dos indivíduos – expressam
o fator de transcrição Foxp3 e são fundamentais para impedir a ativação de células T naive autorreativas
mediando a proliferação de células T efetoras. Mas a ação destas não é exclusiva para os LT CD4 +, e inclusive
conseguem atuar em linfócitos B, em células NK, LT CD8+, outras células do sistema imune inato como
macrófagos, etc. As células T reguladoras são capazes de regular a função de todas as células do sistema
imunológico.

O Foxp3 é o master transcriptional regulator destas células T reguladoras, sendo o fator de transcrição que
confere identidade a estas células e é fundamental para a geração destas células, sua função e manutenção
destas na periferia.

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Mutações em Foxp3 causa IPEX em humanos:

Os humanos que possuem perda de função do fator de transcrição Foxp3, desenvolvem síndromes de
autoimunidade múltipla (diferentes órgãos afetados) sendo uma autoimunidade que começa muito cedo,
inclusivamente crianças que nascem logo com diabetes tipo I. É uma autoimunidade letal se as crianças não
forem submetidas a transplantes com células estaminais hematopoiéticas.

IPEX é o acrónimo de Immune dysregulation, Polyendrocrinopothy, Enteropathy, X-linked (isto é, no


cromossoma X – o gene que codifica para o Foxp3 encontra-se neste cromossoma, XLAAD - X-Linked
Autoimmunity-Allergic Disregulation) é uma doença caracterizada por autoimunidade de início muito precoce
(3 a 4 semanas após o nascimento) associada a linfoproliferação, diabetes tipo I, tiroidite autoimune,
enteropatia (doença inflamatória do intestino), anemia hemolítica severa, trombocitopenia, eczema severo,
elevados níveis de IgE, eosinofilia (elevados níveis de eosinófilos), alergia alimentar (as células T reguladoras
controlam reações alérgicas), infeções severas, etc podendo ser fatal.

Por citometria de fluxo, observa-se que num indivíduo IPEX a população de Tregs que expressa Foxp3 e CD25
está ausente, em contraponto a indivíduos normais Foxp3+ CD25+.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Aula 25 – Autoimunidade

Autoimunidade:

- Resposta imunológica adaptativa a antigénios (Ags) do próprio que induz dano de tecidos e doença.

- Representa uma quebra ou falência de mecanismos de tolerância imunológica (ao próprio).

- Ativação de linfócitos autorreativos não conduz necessariamente ao desenvolvimento de


autoimunidade/doenças autoimunes. As doenças autoimunes (DAI) só se desenvolvem se um conjunto de
mecanismos de proteção/tolerância ao próprio são neutralizados, conduzindo a uma resposta sustentada
contra componentes do próprio, que inclui geração de células T efetoras e moléculas que destroem os tecidos.

- As doenças autoimunes (DAI) afetam aproximadamente 5% da população ocidental, e a sua incidência tem
vindo a aumentar consideravelmente nas últimas décadas. Existem à volta de 80 DAI distintas.

Patogénese multifatorial de DAI (doenças autoimunes):

As DAI resultam da combinação de fatores genéticos de


suscetibilidade, de quebra de mecanismos de tolerância ao
próprio (regulação imune) e de fatores ambientais.

Este esquema pretende explicar o


desenvolvimento de doenças autoimunes
específicas de órgão.

Em indivíduos com uma suscetibilidade


genética, pensa-se que a mesma pode levar a
uma falência dos mecanismos de tolerância
ao próprio e, portanto, a uma ativação de LT
Self-reactive autorreativos (que reconheçam componentes
effector do próprio).
lymphocytes
O papel dos fatores ambientais como, por
exemplo, infeções, será o de levar à ativação
de APCs nos tecidos que levam à ativação dos
linfócitos T autorreativos e, por ação destes,
ocorre lesão do tecido e desenvolvimento de
doenças autoimunes (DAI).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Características gerais de doenças autoimunes:

Classificação em específica de órgão ou sistémica, dependendo da distribuição dos autoantigénios que são
reconhecidos pelos LT ou autoanticorpos.

• Específicas de órgão: Função efetora visa autoantigénio(s) restrito(s) a órgão(s) particular(es). Nalguns
casos, a destruição mediada pelo sistema imunológico do órgão alvo leva à cessação da reação autoimune (à
terminação desta resposta imunológica).

Exemplos clássicos de doenças autoimunes específicas de órgão:

- Tiroidite de Hashimoto: linfócitos T e autoanticorpos reconhecem proteínas específicas da tiroide, levando à


destruição do órgão (tiroide) e hipotiroidismo.

- Diabetes tipo I: início em idade muito jovem, causada por LT que reconhecem componentes das células β
pancreáticas produtoras de insulina, causando destruição destas com consequente perda de produção de
insulina e dependência de insulina exógena para a vida.

- Esclerose múltipla: DAI neurológica causada por células T autorreativas que reconhecem componentes do
SNC (sistema nervoso central), levando à destruição da bainha de mielina que envolve os nervos e disfunção
neurológica progressiva.

- Miastenia gravis: causada por autoanticorpos que reconhecem recetores de acetilcolina nos músculos,
bloqueando a ligação deste neurotransmissor e levando à fraqueza progressiva dos músculos (pode ser fatal).

• Sistémica: Causa inflamação em múltiplos órgãos porque os autoantigénio alvo estão presentes na
maior parte das células do corpo. Tendem a ser crónicas se não tratadas (autoantigénios não são eliminados).

Exemplos clássicos de doenças autoimunes sistémicas:

- Lúpus sistémico eritematoso (SLE): resulta da produção de anticorpos dirigidos contra componentes celulares
comuns, especialmente proteínas nucleares, levando à formação de complexos imunes que bloqueiam vasos
sanguíneos (exemplo: dos rins) e causam progressivamente falência de órgão.

- Artrite reumatoide: DAI que aparece em idade mais tardia (em jovens é diferente), causada por anticorpos
contra antigénios proteicos citrunilados (citrunilação é a conversão do aminoácido arginina em citrulina,
modificação pós-traducional), induzindo a formação de complexos imunes que se depositam nas articulações e
levam à destruição progressiva destas via atividade do sistema do complemento.

Nota: nem todas as DAI podem ser estritamente classificadas. Dois exemplos:

- Anemia hemolítica autoimune (destruição de eritrócitos) pode ocorrer como entidade única (específica de
órgão – antigénios reconhecidos expressos pelos eritrócitos) ou conjuntamente com SLE/lúpus (sistémica).

As doenças autoimunes são geralmente causadas por respostas adaptativas a antigénios do próprio, mas há
uma exceção => IBD.

- Doença inflamatória do intestino (IBD), em humanos inclui Colite ulcerosa e doença de Crohn’s.

• Antigénios alvo pertencem à microbiota residente no intestino;


• Resposta imunológica dirigida contra microbiota residente (“self”);
• Primariamente localizada a um órgão (intestinos).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

A IBD é considerada uma doença autoimune (inclui as doenças autoimunes colite ulcerosa e doença de
Crohn’s) apesar do antigénio alvo reconhecido pelos linfócitos T não ser componente do próprio, mas sim
antigénios pertencentes à microbiota do intestino que de alguma forma se pode designar de self. É uma
resposta que visa primariamente um órgão que é o intestino.

Esta tabela indica uma lista de doenças consideradas autoimunes específicas de órgão ou sistémicas, onde se
encontra o ou os órgãos alvos de ação do sistema imunológico e o tipo de mediadores responsáveis pelo
estabelecimento da lesão do órgão.

Existem múltiplos mecanismos efetores


responsáveis por dano de tecidos em
diferentes DAI.

Um exemplo destes mediadores patogénicos


de doenças autoimunes são os
autoanticorpos.

No caso de Miastenia gravis, DAI específica


de órgão, autoanticorpos específicos contra o
recetor do neurotransmissor de acetilcolina
bloqueiam a sua função na junção
neuromuscular dos músculos esqueléticos, por
impedimento da ligação da acetilcolina e
consequente inativação dos músculos. Mais
ainda, estes autoanticorpos levam à
degradação do recetor de acetilcolina.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Sabe-se que soro de doentes afetados por Miastenia gravis podem transferir esta doença para animais
saudáveis, demonstrando a patogenicidade dos autoanticorpos.

Os autoanticorpos em doenças autoimunes podem ser patogénicos, causadores de doença (como é neste
caso) ou podem ser biomarcadores de doenças. Esta última também é importante no diagnóstico de doenças
autoimunes por ELISA.

Um autoanticorpo só é patogénio se, por transferência do soro que contém esses autoanticorpos, conseguir
transferir doença para um indivíduo saudável. Usualmente usam-se ratinhos para testar a patogenicidade
desses autoanticorpos.

Uma doença é classificada como autoimune quando esta é transferida de um


indivíduo doente para um saudável via transferência de autoanticorpos e/ou linfócitos
T autorreativos. Se a doença não puder ser transmissível desta forma, não é
considerada autoimune, apesar de poder ter envolvimento de células do sistema
imunológico.

Nesta figura o que se evidencia é a identificação dos autoanticorpos contra os


recetores de acetilcolina que são patogénicos em Myasthenia gravis ou Miastenia
grave ou Miastenia gravis.

Usa-se o sangue recolhido de doentes com esta doença, pois o soro destes doentes
contem estes autoanticorpos. Por imunoprecipitação, usando-se lisados de músculo
conseguem-se identificar os autoanticorpos específicos para o recetor de acetilcolina.
Assim, a doença pode ser transferida para animais por transferência destes
autoanticorpos.

Não esquecer que para a produção de anticorpos patogénicos contra AchR


(qualquer isotipo que não IgM, como IgG), o mesmo doente tem de possuir células T
CD4 específicas para AchR (recetor de acetilcolina). Neste recetor tem de existir um
epítopo reconhecido por LB
(hapteno) e um antigénio
que possa ser apresentado
a LT, isto é, tem de haver o
fenómeno de linked recognition. O LB e o LT reconhecem o antigénio e o péptido
derivado desse antigénio, respetivamente (ver fim da Aula 17).

O conceito de “linked recognition” defende que os linfócitos T e linfócitos B têm de reconhecer determinantes
antigénicos na mesma molécula para que eficiente ativação de linfócitos possa ocorrer, isto obviamente no
âmbito de uma interação B-T específica. Assim, este conceito é válido para todos os exemplos de interação de
linfócitos B com T que se falou nas aulas teóricas, nomeadamente ativação de Linfócitos B por antigénios
dependentes de células T, interação T-B nos gânglios linfáticos, etc.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

As células mononucleares do sangue periférico contêm LT que se podem demonstrar in vitro que são
específicos para o recetor de acetilcolina, podendo ser expandidas a partir de células de um doente.

Na gravidez o papel patogénico de autoanticorpos em DAI é evidenciado:

A gravidez é um setup natural que permite identificar a presença de autoanticorpos patogénicos em doenças
autoimunes. No caso de uma grávida que possua a doença de Graves (doença mediada por autoanticorpos
específicos contra o recetor da hormona estimuladora da tiroide ou thyroid-stimulating hormone receptor ou
TSHR), os autoanticorpos atacam especificamente a tiroide. Os anticorpos da classe IgG podem atravessar a
placenta (para o feto), isto é, os anticorpos contra a TSHR passam para o feto e o recém-nascido sofre de doença
de Graves. Atualmente o que se faz é o tratamento do bebé por plasmaferese que remove os autoanticorpos
patogénicos vindos da mãe, curando a doença no recém-nascido.

Em suma:

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

- IgG, mas não LT podem atravessar a placenta (IgA por amamentação).

- Autoanticorpos maternos podem causar doença no feto ou neonato.

- Sintomas de doença tipicamente


desaparecem no recém-nascido (por
plasmaferese), mas em alguns casos os
autoanticorpos podem causar lesão de órgão
antes de remoção de anticorpos maternos
(dependendo acessibilidade do antigénio no
feto).

Aqui indicam-se diversas doenças


autoimunes onde os autoanticorpos são
mediadores de patogenicidade, podendo-se
transferir doença para o recém-nascido/feto
via transferência dos anticorpos pela
placenta, como a doença de Graves ou a
Myasthenia gravis.

Um outro exemplo destes mediadores


patogénicos de doenças autoimunes são os
linfócitos T.

Neste tipo de doenças autoimunes (como a encefalomielite ou EAE), os LT reconhecem autoantigénios (DT1
ou diabetes tipo 1, psoríase, EM ou esclerose múltipla) ou péptidos derivados da microbiota (IBD, doença
inflamatória do intestino) que são apresentados por moléculas de MHC do próprio.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

EAE é um modelo animal de esclerose múltipla que é induzida, no ratinho, por injeção de myelin basic proteins
(MBP) com o adjuvante complete Freund’s adjuvant e dependendo da estirpe pode ou não haver indução da
doença por esta proteína. Também são usados MOG’s (outros péptidos para imunização).

EAE é uma doença mediada por linfócitos Th17 que produzem IL-17 e Th1 que produzem IFN-γ e TNF-α, que
faz com que a transferência da doença de animais doentes para animais saudáveis seja eficiente.

Tanto anticorpos como linfócitos T efetores podem causar dano de tecidos em doenças autoimunes:

Esta tabela possui uma lista


de doenças autoimunes, onde
se encontram os
autoantigénios reconhecidos
pelos efetores e respetivas
consequências.

Existem doenças causadas


por autoanticorpos contra
proteínas celulares ou
antigénios de matriz/de
superfície como: a anemia
hemolítica, a trombocitopenia
púrpura, síndrome de
Goodpasture, etc.

Existem outras doenças


autoimunes causadas por
complexos imunes como: a
crioglobulinemia e a artrite
reumatoide.

Por fim, existem doenças


autoimunes causadas por
linfócitos T como: diabetes
tipo-1, artrite reumatoide,
esclerose múltipla, doença de
Chron e psoríase.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Destruição de tecidos por


autoanticorpos:

Exemplo do mecanismo da Anemia


hemolítica autoimune

- Os antigénios dos eritrócitos são alvo de


reconhecimento por anticorpos.

- Os autoanticorpos podem ser IgM e IgG,


e são específicos para antigénios
localizados na superfície de eritrócitos
induzem destruição rápida (hemólise)
destes por 2 mecanismos:

1. RBC com anticorpos IgM e IgG associados são removidos de circulação por
interação com recetores Fc ou de complemento, expressos em macrófagos do
baço, sendo assim eliminados.

2. Hemólise (essencialmente da classe IgM fixam o complemento), por


formação de complexo de ataque de membrana (sistema do complemento) à
superfície dos eritrócitos.

Autoanticorpos contra recetores causam doença


via estimulação ou inibição da função do recetor:

Myasthenia gravis: Autoanticorpos contra a


cadeia α do recetor da acetilcolina e bloqueiam a estimulação da contração
muscular (funcionando como antagonistas); Os autoanticorpos promovem
internalização e degradação do recetor, pelo que os doentes desenvolvem
fraqueza muscular progressiva que pode ser fatal.

Numa situação normal os recetores de acetilcolina recebem o neurotransmissor


acetilcolina e via influxo de Na+ (sódio) contrai-se os músculos. Numa situação de
doença, os anticorpos contra a cadeia α do AchR impedem a ligação da Ach,
degradando e internalizando o recetor, pelo que o músculo fica incapaz de
responder à acetilcolina.

Há outras DAI (doenças autoimunes) causadas por autoanticorpos contra


recetores celulares:

• Doença de Graves (O autoanticorpo é agonista do recetor, estimulando o


TSHR; recetor da TSH).
• Diabetes insulinorresistente (Anticorpo é antagonista, inibe o recetor de
insulina). ≠ Diabetes tipo
I

308
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Os autoanticorpos contra
recetores podem funcionar como
agonistas ou como antagonistas.

Esta tabela demonstra doenças


autoimunes mediadas por
autoanticorpos específicos para
recetores, inclusive
demonstrando o antigénio que é
alvo (em parênteses) e o
funcionamento do autoanticorpo.

São exemplos de autoanticorpos


agonistas o da Doença de Graves
(contra a TSHR), Hipoglicémia
(recetor de insulina) e urticária
crónica (IgER).

São exemplos de autoanticorpos


antagonistas os casos da
Myasthenia gravis (AchR) e diabetes insulinorresistente (recetor de insulina).

Autoanticorpos contra antigénios extracelulares causam lesão por indução de inflamação:

Os autoanticorpos contra moléculas da matriz/antigénios


extracelulares são pouco frequentes, mas podem causar
muito dano (falência de órgão) por indução de inflamação.

Síndrome de Goodpasteur: autoanticorpos contra cadeia


α 3 do colagénio tipo IV ligam-se à membrana basal
alveolar (pulmonar) e glomerular, causando
glomerulonefrite progressiva (no rim) e hemorragia
pulmonar (no pulmão).

- Autoanticorpos ligados à membrana basal (do glomérulo


ou alvéolos) induzem a ativação de complemento e
recrutamento e ativação de monócitos e neutrófilos.

- Rapidamente fatal, se não tratado.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Eliminação ineficiente de complexos imunes contendo ácidos nucleicos promove uma produção excessiva
de BAFF e IFN-I que podem causar lúpus:

Complexos imunes: presença de anticorpos contra


antigénios solúveis (os complexos imunes são
usualmente eliminados por eritrócitos e
complemento).

O anticorpo (IgG) pode ligar-se a duas moléculas de antigénio (pequeno complexo


imune), mas podem formar complexos imunes muito grandes.

Em SLE (systemic lupus erythematosus):

Células necróticas libertam ssRNA e células apoptóticas libertam dsDNA, de tal forma
que estes componentes são reconhecidos por anticorpos formando-se complexos
imunes que são reconhecidos via recetores Fc por células dendríticas plasmacitoides
(pDCs). As moléculas de cadeia simples de RNA e de dupla cadeia de DNA são
reconhecidas por recetores Toll no endossoma, TLR-7 e TLR-9, respetivamente. Aqui
ocorre a produção de IFN-α.

O IFN-α vai estimular células mieloides (nomeadamente monócitos) ou células


dendríticas para produzirem a citocina BAFF que aumenta a sobrevivência dos
linfócitos B autorreativos.

É uma forma pela qual se pensa que os autoanticorpos podem ser patogénicos,
nomeadamente neste caso em lúpus.

Outra forma pela qual os autoanticorpos via formação de complexos imunes podem
ser patogénicos:

Uma eliminação deficiente de complexos imunes (exemplo: redução da expressão de componentes do sistema
do complemento ou seus recetores em SLE/lúpus) levam à sua deposição em vasos no rim, articulações, etc, e
consequente ativação de fagócitos, via recetores Fc.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Linfócitos T em doenças autoimunes promovem dano de tecidos indiretamente via produção de citocinas
pró-inflamatórias ou diretamente por morte celular de células alvo:

Um linfócito T CD4+ por produção de citocinas pró-


inflamatórias pode induzir inflamação via recrutamento
e ativação de neutrófilos e monócitos que libertam
enzimas e espécies reativas de oxigénio que provocam
lesão de tecido.

Também existem doenças autoimunes, como a


diabetes tipo I, onde a lesão de tecido é causada
diretamente pelos linfócitos T citotóxicos, que
reconhecem antigénios específicos das células β
pancreáticas e este reconhecimento/ativação dos CTLs
leva à libertação de grânulos citotóxicos e indução de
apoptose das células β produtoras de insulina.

Diabetes tipo I:

No pâncreas existem células α que produzem glucagina (glucagon), células β produtoras de insulina e células
δ produtoras de somatostatina. O que acontece é que os linfócitos T citotóxicos (CTLs) apenas induzem a
apoptose das células β pancreáticas produtoras de insulina (pois reconhecem antigénios específicos de células
β e não de células α e δ), na diabetes tipo 1. Portanto, as células α e δ escapam incólumes à ação dos CTLs e
continuam a libertar glucagina e somatostatina, respetivamente.

Por imunohistoquímica observa-se a insulina a castanho claro e a glucagina a castanho escuro (à esquerda) e
à direita observa-se a ação das CTLs onde a insulina praticamente desaparece por completo (as células β
pancreáticas são eliminadas mas as células α pancreáticas permanecem).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

DAI (doenças autoimunes) mediadas por linfócitos T:

Nesta tabela encontra-se indicado um conjunto de doenças autoimunes mediadas por linfócitos T e qual o
tipo de LT envolvidos, sendo que geralmente estão envolvidos os Th1, Th17 e CTLs.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Associação de alelos de HLA com DAI:

A associação genética do MHC humano com doenças autoimunes tende a ser


a associação que confere maior probabilidade de ter a doença (odd ratio).

No caso de diabetes tipo 1 (T1D) há haplótipos de HLA de classe II associados


à doença. Por exemplo, o haplótipo DRB1*0301-DQA1*0501-DQB1*0201 ou
simplesmente DR301 confere um risco 4 vezes superior de ter a doença (em
relação a quem não o tem). Outro exemplo é o haplótipo DRB1*0401-
DQA1*0301-DQB1*0302 ou simplesmente DR401 confere um risco de 8 vezes.
Por fim, indivíduos heterozigóticos para o haplótipo DRB1*0301/0401 (ou seja,
os dois anteriores) possuem um odd ratio de 35 (um risco muito maior de
desenvolver a doença quando comparado com outros indivíduos que não
possuem este haplótipo).

Na doença celíaca o haplótipo DQA1*0501-DQB1*0201 confere um risco


aumentado 7 vezes de desenvolver a doença.

Ainda não se sabe muito bem como se dão as associações HLA-DAI, isto é, não
se sabe bem como os haplótipos específicos conferem maior probabilidade de
desenvolver a doença, mas pensa-se que pode ter a ver com apresentação de
antigénios a células T autorreativas. Isto é, na presença destes
haplótipos/alelos a apresentação antigénica a estas células T autorreativas
poderá ser mais
eficiente.

Fatores genéticos de suscetibilidade a DAI


independentes de HLA:

Existe um grande número de fatores genéticos


de suscetibilidade a doenças autoimunes
independentes de HLA (localizados fora do MHC
de humanos).

Usualmente, apesar de depender da doença


autoimune, o risco associado à presença destes
outros fatores genéticos que não HLA tende a ser
menor do que o conferido pelos alelos do HLA.
Isto é verdade para doenças autoimunes com
componente poligénica, isto é, quando vários
fatores de suscetibilidade genéticos conferem
risco ao desenvolvimento da doença autoimune.

Por exemplo, a diabetes tipo 1 (T1D), lúpus e


esclerose múltipla são consideradas doenças
autoimunes poligénicas. As que foram
anteriormente referidas nesta aula são
poligénicas, pois vários fatores genéticos de
suscetibilidade contribuem para o risco de
desenvolver doença.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Existem diversos tipos de fatores genéticos de suscetibilidade a DAI independentes de HLA conhecidos (fora
da região de HLA), como: genes envolvidos na sinalização e fatores de transcrição, genes envolvidos na
imunidade inata (NOD2 e componentes da cascata do complemento, estes últimos muito importantes no
desenvolvimento de lúpus porque diminuem a eficiência de clearance/libertação destes complexos imunes e
de células apoptóticas), citocinas, recetores de citocinas ou moléculas envolvidas na sinalização das citocinas,
moléculas associadas a regulação de linfócitos (como CTLA-4, inibidor da ativação de LT e importante na função
das células T reguladoras, e Fcγ que confere um sinal inibitório a LB, envolvido na suscetibilidade a lúpus),
polimorfismos nos autoantigénios associados a desenvolvimento de doenças autoimunes, etc.

Deficiências num só gene associadas a autoimunidade:

No caso de doenças poligénicas, existem diversos fatores de suscetibilidade. No entanto, existem outras
doenças autoimunes causadas por perda de um fator genético ou gene essencial para regulação de tolerância
imunológica. Por exemplo, mutações em AIRE que leva a APECED ou APS-1, CTLA-4 relacionado com a doença
de Graves, Foxp3 relacionado com a doença de IPEX e FAS em ALPS sendo causas monogénicas que conduzem
a mecanismos de autoimunidade. C1q em SLE, ATG16L1 em IBD, IL10Rα e IL10Rβ em IBD e polimorfismos em
INS (insulina) associada a baixa expressão no timo podem aumentar o risco de desenvolvimento de diabetes
tipo 1 (não é causa única da doença).

Na tabela estão indicados um grupo de genes que estão associados ao desenvolvimento de autoimunidade.
No caso de alguns destes genes, mutações com perda de função são responsáveis sozinhas pelo
desenvolvimento de autoimunidade (exemplos: AIRE, FOXP3, FAS, C1q e CTLA4), e assim estes são considerados
causas monogénicas de autoimunidade. Noutros, como por exemplo o caso do gene INS (insulina), existem
variantes que estão associadas com o desenvolvimento de diabetes tipo 1 (DT1), mas estas variantes em INS
não desencadeiam sozinhas o desenvolvimento de DT1. Aumentam sim consideravelmente o risco de
desenvolver DT1. No caso de variantes na INS, o mecanismo envolve diminuição da expressão de insulina no
timo com consequente impacto no processo de seleção negativa.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Maior prevalência de DAI em mulheres que em homens:

As doenças autoimunes têm maior prevalência nas mulheres


(em relação aos homens). Isto representa-se ao lado, com as
prevalências em mulheres a rosa e a de homem a azul.

Exceções são a colite ulcerosa que não possui diferenças


significativas entre os dois géneros e diabetes mellitus (tipo 1)
que é mais prevalente em homens.

Os números nas barras indicam o número de milhões nos


Estados Unidos. Por exemplo, existem nos EUA 2,0 milhões de
mulheres com síndrome de Sjogren, e 300 mil com SLE.

Sexo feminino constitui um risco 4 vezes maior para SLE do


que qualquer outro fator de suscetibilidade genético
conhecido:

Só ser do género feminino já constitui um risco 4 vezes


superior a qualquer outro fator de suscetibilidade genético
conhecido e confere uma probabilidade 9 X superior de ter
uma doença autoimune.

Uma causa possível pode ser a hormona estrogénio


diminuir a expressão de AIRE no timo, influenciando-se a
seleção de células T autorreativos contribuindo para a
falência de mecanismos de tolerância central.

Terapias em doenças autoimunes:

- Tratamento com drogas imunossupressoras (não


específico, primeira linha de tratamento em DAI, mas não-
ideal);

- Plasmaferese (remoção de complexos imunes ou de anticorpos patogénicos);

- IgG intravenosa/IVIg (exemplos: trombocitopenia e anemia hemolítica);

- Biológicos (CTLA4-Ig em AR, artrite reumatoide; anticorpos antagonistas de citocinas);

- Indução de tolerância (exemplos: doses baixas de IL-2 em DT1 ou diabetes tipo 1 por aumento de TRegs ou
transferência de Tregs para reverter a doença autoimune).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Esta tabela mostra anticorpos contra citocinas que estão a ser usados na clínica atualmente.

Aula 26 – Resposta imunológica antitumoral e imunoterapia

Conceito de vigilância imunológica contra cancro (cancer immunosurveillance):

Este conceito foi originalmente postulado por Paul


Ehrlich (1909), o mesmo do “Horror Autotoxicus”, que
levantou a hipótese que o sistema imunológico
protege contra o desenvolvimento de cancro.

Quase 50 anos depois, em 1957, Lewis Thomas e


Macfarland Burnet propõem o conceito de vigilância
imunológica contra cancro. Inclusivamente, Thomas

propõe que a função primordial da imunidade celular é


a de proteger o organismo contra cancro.

William Coley, “pai da imunoterapia de cancro”, em


1891 iniciou tratamento de doentes com cancro com
injeções intratumorais de Streptococcus pyogenes e
Serratia marcescens inativadas na tentativa de
reproduzir remissões espontâneas de sarcomas

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

observadas raramente em doentes pacientes que desenvolviam erisipelas (infeção bacteriana).

A vacina BCG é usada no tratamento cancro de bexiga, inspirado por experiências de Lloyd Old em 1959.

Evolução histórica do conceito de vigilância imunológica contra cancro e da imunoterapia:

Ao longo do tempo o conceito de vigilância imunológica foi recebido com aceitação/entusiasmo, mas em
determinados períodos este conceito não era tão bem recebido. Os tumores são componentes do próprio, onde
mecanismos de tolerância imunológica estabelecem respostas adaptativas contra esses mesmos componentes,
pelo que se esperaria que a eficiência de respostas antitumorais fosse limitada. A partir dos anos 2000, esta
vigilância e manipulação do sistema imunológico é considerada uma mais-valia. Algumas experiências
importantes foram: uma em que ratinhos imunodeficientes tinham respostam antitumorais menos eficientes
contra tumores inoculados; o aparecimento de inibidores de pontos de controlo (checkpoints) imunológicos
como CTLA-4, PD-1 e ligando de PD-1.

Em 2018, James Allison e Tasuku Honjo receberam o prémio nobel da Fisiologia/Medicina pela descoberta da
terapia contra o cancro por inibição de imunorregulação negativa.

Funções do sistema imunológico na prevenção de cancro:

- Proteção do hospedeiro contra infeções virais, impedindo assim o desenvolvimento de tumores induzidos
por vírus.

- Previne o estabelecimento de um ambiente pró-inflamatório que facilita a tumorigénese por eliminação de


patogénios e resolução de inflamação pró-tumoral.

- Elimina células tumorais, uma vez que estas frequentemente expressam ligandos de recetores expressos em
células do sistema imunológico inato (tumores muitas vezes expressam ligandos ativadores de células NK) e
antigénios tumorais reconhecidos por recetores de antigénios expressos em linfócitos.

São evidências de que o sistema imunológico tem um papel na prevenção de cancro.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Previsões da teoria de vigilância


imunológica contra cancro:

Maior incidência de tumores em


modelos animais e humanos com
deficiências em componentes da
imunidade inata e adquirida (maior
incidência de sarcomas em animais
imunodeficientes).

Schrelber, em 2001, demonstrou


que ratinhos Rag2KO (não têm LB,
nem LT e nem NKT –
imunodeficientes) tratados com
MCA (para indução de sarcomas)
desenvolvem uma maior incidência
destes tumores quando comparados
com ratinhos WT (imunocompetentes). Neste mesmo artigo demonstra-se que o recetor de IFN-γ é
fundamental para a prevenção de tumores, porque ratinhos KO deficientes neste recetor inoculados com MCA
desenvolviam mais facilmente sarcomas. Adicionalmente, deficiências na sinalização via IFN-γ que ativaria
STAT1 também leva a incidência de sarcomas. Por fim, em ratinhos duplamente KO (sem RAG2 e STAT1)
possuem uma incidência ainda superior de sarcomas.

Estes resultados mostram que os linfócitos são essenciais no impedimento de desenvolvimento de tumores e
o papel do IFN-γ na proteção contra estes sarcomas.

Maior incidência de tumores espontâneos em animais imunodeficientes:

É expectável que, como o


sistema imunológico tem um
papel na vigilância contra
cancro, que exista uma maior
incidência de tumores
espontâneos em animais com
imunodeficiências.

Mostra-se ao lado a
percentagem de ratinhos WT
(imunocompetentes) e até aos
21 meses de idade, só 20% é
que desenvolveu lesões pré-
malignas ou adenomas sendo
que 80% nem desenvolveu
qualquer tipo de cancro.

Por outro lado, ratinhos


RAG2KO, sem linfócitos B nem
linfócitos T, pelos 15/16 meses de idade, demonstram que 50% possuem carcinomas/cancros (do cólon e do
pulmão) e outros 50% adenomas no intestino.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

E, por fim, animais com 12 a 18 meses de idade sem LB, LT (RAG2KO) e impedidos de sinalizar para IFN-γ
(STAT1KO), a incidência de tumores é ainda maior (à volta de 80%).

As populações não-linfoides que produzem IFN-γ são as células NK, pelo que estas terão um papel
fundamental na prevenção de incidência de tumores (as Th1 são a população linfoide fundamental, por
excelência, produtora desta citocina e, portanto, também serão fundamentais).

Evidências de vigilância imunológica contra o cancro em humanos:

1. Regressão espontânea de cancro (melanoma, carcinoma renal, neuroblastoma) em indivíduos


imunocompetentes (muito pouco frequente):

- Remissão parcial de melanoma primário é comum, ao passo que que remissão espontânea total é muito rara.

- Histologicamente, lesões de melanoma que regridem estão associadas a infiltrados de linfócitos, expansão
clonal e acumulação de LT auxiliares, indicativos que rejeição envolve um mecanismo imunomediado.

2. Infiltração linfocitária em tumores sólidos (o tipo de infiltração linfocitária está associada a um prognóstico):

Neste paper procedeu-se à análise de células T que infiltram tumores (cancro de ovário). O cancro de ovário
é bastante letal porque o diagnóstico costuma já dar-se em fases muito tardias onde já existe
metastização/metastatização para a cavidade peritoneal.

Linfócitos infiltrantes de tumor (TILs; Tumor-infiltrating lymphocytes): correlação com sobrevivência em


doentes com cancro de ovário:

Estes investigadores constataram os


factos recorrendo a análise de
infiltração. Por imunofluorescência
observam-se as células tumorais
(marcada por citoqueratina) e com o
anticorpo anti-CD3 marcam-se os
linfócitos T. Existem linfócitos dentro da
massa tumoral e nas vizinhanças desta.
Ao compararem indivíduos com
infiltrações de células T na massa
tumoral, os investigadores observaram

319
Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

que a sobrevivência dos que possuíam células T intratumorais (CD3+) era muito superior à dos que não tinham
infiltração.

Em 2006, foi publicado um artigo (Jérôme


Galon) onde se mostrou que em tumores
colorretais, por análises de níveis de mRNA,
uma taxa de reincidência elevada (relapse)
se devia à expressão baixa de 7 genes
associados a respostas de Th1 (granzimas,
IFN-γ, TBet – fator de transcrição essencial
no desenvolvimento de células T naive em
células Th1 -, CD3, CD8, etc), ou seja, a
baixa expressão destes genes implicaria
uma nova exibição do tumor.

A densidade de linfócitos T na vizinhança


ou dentro do tumor é um bom prognóstico
de sobrevivência:

Estes investigadores também


observaram que a densidade de LT na
vizinhança ou no tumor é um melhor
prognóstico de sobrevivência em relação
aos parâmetros usuais de estadiamento,
nomeadamente tamanho e
disseminação/metástase do tumor.

A sobrevivência dos indivíduos é superior


quando há infiltração de linfócitos T
(CD3+), no centro do tumor, margem do
tumor e nas duas regiões (onde ainda
existe uma diferença ainda mais
significativa).

Prognóstico de infiltração de diferentes populações linfocitárias:

Desde 2006 uma série de tumores infiltrados foram analisados e


para quase todos uma infiltração por células Th1 ou linfócitos T
CD8+ ativados levam a um bom prognóstico, sendo sem qualquer
impacto ou mau prognóstico raríssimos.

Por outro lado, infiltrações de Th2, Th17 (que produzem IL-17) e


TReg são indicativas de mau prognóstico geralmente.

Atualmente, há um esforço mundial para estadiar tumores e


caracterizar a sua infiltração (“immunoscore” de infiltração) para se
possuir um biomarcador (immunological biomarker) e seguir
doentes com cancro.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Importância de linfócitos T CD8+ nas


respostas antitumorais:

Os linfócitos T CD8+, IFN-γ e Th1 são


importantes nas respostas antitumorais, ao
passo que Th2, Th17 e TRegs são usualmente
indicativos de mau prognóstico.

Foram realizadas experiências que


demonstraram inequivocamente o papel
dos LT CD8 em ratinhos. Os ratinhos ao
serem tratados com um químico
carcinogénico (MCA) desenvolvendo
tumores. A seguir, remove-se o tumor e
isolam-se as células antitumorais. Quando
estas células eram transferidas no mesmo
ratinho inicial que tinha o tumor e a quem
foi feita uma cirurgia, observava-se que o
tumor não crescia (desenvolvia-se uma
resposta imunológica a antigénios tumorais
presentes no tumor, eliminando-o).

Se a transferência se der para um novo ratinho geneticamente igual, o tumor cresce. Mas quando se
transferem linfócitos T CD8 do animal de onde se retiraram as células antitumorais (o primeiro) para o novo
ratinho com tumor, as células T CD8 conseguem eliminar o tumor (isto é, os LT CD8 confere-lhes proteção
antitumoral).

Antigénios tumorais reconhecidos por linfócitos T humanos (e em ratinhos) pertencem a quatro categorias
(de duas classes, TSA e TAA):

- TSA (minoria/menos comum, Tumor-specific antigens – antigénios específicos de tumores):

1. Antigénios codificados por genes expressos exclusivamente por tumores (TSA; Tumor-specific antigens) –
não há muitos destes, pois a resposta imunológica contra estes antigénios seria extraordinariamente eficiente
(seria uma remissão eficiente);

2. Antigénios codificados por variantes de genes normais que sofreram mutação (TSA) – introduz algo
específico ao tumor, o que é bom para o combater.

- TAA (maioria/mais comum, Tumor-associated antigens – antigénios associados a tumores):

1. Antigénios expressos apenas em alguns estadios do desenvolvimento ou por linhagens específicas (TAA;
Tumor-associated antigens). Por exemplo, antigénios expressos no desenvolvimento fetal são expressos após o
nascimento apenas em tumores.

2. Antigénios codificados por variantes de genes normais, que são sobreexpressos em alguns tumores (TAA).
Antigénios normais altamente expressos em células tumorais, funcionando como TAA.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Diferentes mecanismos originam TSA ou Tumor-specific antigens e TAA ou Tumor-associated antigens:

Numa célula normal, péptidos que resultam de proteínas citosólicas são apresentados a moléculas de MHC
classe I a linfócitos T CD8+.

- Se ocorrer uma mutação no gene que codifica para a proteína citosólica, vão existir péptidos “novos” a serem
apresentados em MHC classe I, designando-se de neoantigénios (neoantigens), sendo antigénios específicos de
tumor (TSA). Também existem antigénios TSA específicos de “genes tumorais” (não representados).

- Se ocorrer expressão inapropriada em vida adulta de genes expressos no período embrionário – um exemplo
é a alfafetoproteína A (AFP, marcador para diagnóstico e monitorização de cancro) – existem
péptidos/antigénios apresentados oncofetais ou ainda a sobreexpresão destes mesmos antigénios/proteínas
associados a um tumor (TAA).

Exemplos de antigénios tumorais comuns:

Muitos dos antigénios da tabela seguinte são utilizados em monitorização clínica e em imunoterapia.

Já houve tentativas de imunização com antigénios específicos de tumores para aumentar a eficiência das
respostas antitumorais.

Um exemplo: o CEA é um TAA muito frequentemente expresso por células tumorais do cólon e os níveis deste
antigénio (CEA) são controlados quando há suspeita de cancro do cólon. Isto faz-se observando os títulos de
anticorpos contra este autoantigénio, que tendem a aumentar num tumor. Com cirurgia e quimioterapia estes
níveis tendem a reduzir (os níveis portanto, pretendem observar a eficiência da quimioterapia).

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

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Estabelecimento de respostas antitumorais mediadas por linfócitos T CD8 +:

Células tumorais, por morte celular ou lesão, libertam DAMPs que ativam células dendríticas (DCs). As DCs
fagocitam antigénios tumorais e migram via vasos linfáticos aferentes para os gânglios linfáticos onde ativam
LT CD8+ específicos para os antigénios tumorais apresentados no contexto de MHC classe I. Os LT CD8+ ativados
(citotóxicos, CTLs) migram para os tumores onde exercem a sua função.

As DCs que fagocitam antigénios tumorais também são eficientes a fazer o priming de células T CD4+. Apesar
destas não serem os mediadores mais importantes nas respostas antitumorais, estas são fundamentais para
uma eficiente diferenciação de CTLs. Assim, as DCs que apresentem antigénios a LT CD4 (MHC II) e LT CD8 é
extraordinariamente importante para a eficácia deste processo. Isto é, as respostas T CD4+ também são
importantes no contexto antitumoral.

Apresentação cruzada de antigénios tumorais a LT CD8 +:

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

As DCs endocitaram antigénios de células tumorais e depois apresentam-nos a linfócitos T CD8+ que
reconhecem antigénios presentes no citosol. Isto é possível devido à existência de apresentação cruzada dos
antigénios tumorais a CTLs.

As células dendríticas fazem uptake de células (e antigénios) tumorais. Os antigénios presentes nas vesículas
endocitadas são boas para apresentação via MHC classe II (e ocorre), mas alguns destes antigénios vão para o
citosol, são processados e apresentados em MHC I (apresentação cruzada a linfócitos T CD8+).

Mecanismos efetores antitumorais:

Há diversos múltiplos mecanismos efetores


antitumorais.

Células T CD4+, células T citotóxicas e células NK são


fundamentais na resposta a tumores.

Células T γδ também são cruciais neste combate por


produzirem IFN-γ (mas dependendo do
microambiente podem produzir IL-17 que tem um
papel pró-tumoral).

ADDC: Antibody-dependent cellular cytotoxicity

Promoção de crescimento do tumor pelo ambiente


anti-inflamatório estabelecido no microambiente
tumoral:

O tumor consegue estabelecer um


ambiente anti-inflamatório que é
prejudicial para a manutenção de
respostas antitumorais eficientes. Há
uma promoção de crescimento do
tumor pelo ambiente anti-
inflamatório estabelecido no
microambiente tumoral, criado pelo próprio tumor.

Os tumores são capazes de condicionar células


dendríticas, diminuindo a sua capacidade de ativar LT
(CD4+ e CD8+), ou seja, reduz a sua capacidade de
apresentação de antigénio, tornando mais eficiente a
diferenciação em células T reguladoras e Th2
(prejudiciais em contexto antitumoral). As Th2 e TRegs
secretam citocinas promovem a diferenciação e
acumulação de populações imunes com capacidade de
suprimir respostas antitumorais eficientes (ou seja,
estimulam a acumulação e diferenciação de populações
pró-tumorais), nomeadamente macrófagos do tipo M2
(anti-inflamatórios) – que estimulam eles mesmos o
crescimento de tumores por produção de fatores pró-

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angiogénicos e de crescimento – e MDSC’s (myeloid-derived supressor cells) que inibiriam a atividade das células
efetoras primordiais nas respostas antitumorais como as CTLs e as Th1.

Mecanismos explorados por tumores para escapar à atividade do sistema


imunológico:

Os tumores também exploram uma série de mecanismos para escapar à atividade


do sistema imunológico:

• Produção de proteínas imunossupressoras ou expressão de proteínas de


superfície inibitórias: os tumores produzem citocinas imunossupressoras (anti-
inflamatórias) como TGF-β que inibe a ação de linfócitos T CD4+ e CD8+. Os tumores
expressam ainda ligandos de recetores que promovem um sinal negativo aos LT
como o ligando de PD-1 ou PD-L1 (inibe a atividade dos CTLs) (inibição da ativação
de células T).
• Incapacidade de produção de antigénios tumorais: os tumores também
tentam evadir a ação de LT CD8+ por interferência com a apresentação de antigénio
(por perda da expressão de variantes antigénicas reconhecidas por células
tumorais, os tais antigénios específicos ou associados a tumores ou TSA ou TAA),
deixando de expressar o antigénio antitumoral (as CTLs mesmo devidamente
ativadas ou estando no local, não reconhecem a célula tumoral, não podendo fazer
nada, não induzindo a sua apoptose) (incapacidade de reconhecimento pelas
células T).
• Mutações nos genes de MHC ou genes
necessários para processamento antigénico: há
tumores que conseguem fazer a inibição da expressão
de MHC classe I, pelo que mesmo expressando os
antigénios tumorais, estes não irão ser
reconhecidos/devidamente apresentados, pelo que os
linfócitos T CD8+ não os reconhecem, pelo que os
tumores escapam à sua ação (incapacidade de
reconhecimento pelas células T).

Diminuição da expressão de MHC classe I em


tumores para escapar à atividade de CTLs:

Este esquema descreve a interação que ocorre nos


locais do microambiente do tumor, onde este começa a
diminuir progressivamente moléculas de MHC classe I
para escapar à ação do sistema imunológico. O próprio
sistema imunológico contribui para este mecanismo de
evasão, começando a ser selecionados clones de células
tumorais que expressam níveis muito baixos ou não
expressem moléculas de MHC classe I.

A perda de expressão de MHC I em células tumorais é


um exemplo de mau prognóstico clínico.

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Três fases da resposta imunológica antitumoral - Eliminação, Equilíbrio e Escape (3Es):

A teoria vigente em termos de respostas antitumorais designa-se de imunoedição de cancro, sendo a resposta
antitumoral constituída por 3 fases (3E’s): eliminação (cancer immunosurveillance, LT CD8+ eliminam células
tumorais), equilíbrio (crescimento das células tumorais mantido sob controlo , apesar de que começa a existir
uma pressão seletiva do sistema imunológica para haver o aparecimento de mutações para escapar ao sistema
imunológico, seleção de clones de células tumorais) e escape (os tumores escapam por completo à ação do
sistema imunológico).

Na fase de eliminação estão envolvidas células T CD8+, NKT, NK, T CD4+ e macrófagos do tipo M1 e as citocinas
envolvidas são IFN-γ, IL-12 (ajuda na diferenciação de Th1), IFN-α/β (importante para aumento da expressão de
MHC classe I). Estes mecanismos levam a uma eliminação muito extensa de células tumorais.

A fase de equilíbrio, onde o cancro se encontra dormente, é mantida por T CD8+, T CD4+, IFN-γ e IL-12. A
posterior pressão seletiva do sistema imune faz com que haja células que escapem aos mecanismos do sistema
imunológico.

A fase de escape é mantida por macrófagos do tipo M2, MDSC’s, PD-L1, CTLA-4 em TRegs e em LT CD8+,
contribuindo para a progressão de cancro.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Na clínica, há uma tendência


para se arranjarem formas de
prolongamento da fase de
equilíbrio (transformar uma
doença oncológica numa doença
crónica), uma vez que nem todos
os cancros são facilmente
elimináveis.

Ratinhos tratados com o


carcinogénico MCA, alguns
desenvolvem sarcomas. Os
imunocompetentes, que não
desenvolviam tumores, injetaram
anticorpos contra CD4, CD8 e IFN-
γ e observaram o crescimento de
tumores.

Com cIg ou anticorpos


“controlo” o tumor continua
controlado (fase de equilíbrio), mas nos ratinhos onde houve a nova injeção contra CD4, CD8 e IFN-γ (eliminam
a função) observou-se um crescimento do tumor (deixou de estar sob controlo).

Imunoterapia de cancro - diferentes estratégias:

Existem diversas
imunoterapias existentes
contra o cancro,
nomeadamente:

- Anticorpos monoclonais
contra proteínas expressas
por tumores: os anticorpos
monoclonais podem ou não
estar conjugados com
toxinas e se estiverem
conjugados induzem
apoptose direta da célula
maligna, tratamento usado
contra leucemias; anti-CD20
contra linfomas.

- Reinfusão de DCs
carregadas com TAA ex vivo
(fora do organismo): isolamento a partir de doentes com cancro células dendríticas e carregá-las com os tumor-
associated antigens específicos para o tumor e reeinfudi-las de novo no doente, esperando que as DCs sejam
capazes de ativar eficientemente respostas antitumorais mediadas por CTLs.

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- Expansão de TILs: faz-se rescisão do tumor de indivíduos doentes, isolando-se os linfócitos infiltrados no
tumor (TILs) e ou expandem-se-los (usando IL-2) ou modificam-se-los, infundindo-se-los de volta nos doentes.
Era uma terapia muito usada nos anos 2000.

- Células CAR-T específicas para proteínas expressas por tumores: para tratamento de leucemias, são
transferidas células T do doente e que são manipuladas de modo a expressar recetores que reconhecem
proteínas especificamente expressas pelos tumores, como as células T CAR que reconhecem CD19.

- Inibidores de pontos de controlo/checkpoints imunológicos: a terapia de cancro mais referida atualmente,


que recorre a anticorpos contra CTLA-4, PD-1 e PD-L1.

Expansão de TILs:

Isolam-se os linfócitos que estão infiltrados no


tumor, expande-se estes LT em cultura com IL-2 e
retorna-se-los ao doente e em alguns casos
(melanoma) pode haver regressão do tumor. O
problema é que muitas vezes nos infiltrados tumorais
temos células T reguladoras que vão expandir com IL-
2, explicativo do facto desta terapia não ser tão
eficiente. Agora o que se tenta fazer é remover as células T reguladoras das células infiltradas no tumor.

Terapias adotivas celulares na tentativa de superar barreiras que impedem respostas T antitumorais efetivas.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Anticorpos monoclonais aprovados para tratamento de cancro:

Lista de anticorpos que foram aprovados, sozinhos ou associados a toxinas, aprovados para o tratamento de
cancro.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Imunoterapia por transferência de


células CAR (Chimeric Antigen
Receptor)-T:

Terapia dirigida a CD19.

Nesta terapia recorre-se sangue do


doente, isolam-se as células T CD4 e
CD8 por citometria e expande-se-las
ou com pérolas (com anticorpos anti-
CD3 e anti-CD28 para indução de uma
expansão policlonal muito intensa das
células) ou com APCs artificiais na
presença de citocinas que sustêm a
proliferação celular.

De seguida, pegam-se nas células


expandidas e ativadas e dá-se a transdução
com CAR (recetor de antigénio quimérico)
nos LT, retomando-os ao doente.

Encontra-se representado um linfócito T.


scFv reconhece a molécula alvo, por
exemplo, CD19 (uso de domínios de
imunoglobulinas específicos para esse
reconhecimento). Na parte citoplasmática
da primeira versão/geração encontra-se
CD3ζ (“CD3 zeta”) para sinalização, mas
outras versões/gerações começaram a
introduzir novos domínios para aumentar a
produção de citocinas, proliferação,
sobrevivência, etc.

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Imunologia: Rodrigo Barriga Alves nº 50958 Bioquímica FCUL 3º Ano 2019/2020

Pode-se observar, por mera curiosidade, o que se tem tentado incluir na parte citoplasmática destas células
CAR-T para melhorar a resposta antitumoral.

Vacinas antitumorais (cancro de próstata):

Esta figura mostra vacinas antitumorais em que se


pegam em DCs dos doentes e faz-se transdução com
antigénios tumorais e GM-CSF para ativar as DCs,
colocando-as de volta nos doentes de modo a aumentar o
priming dos linfócitos T CD8+ (e T CD4+ ajuda).

Imunoterapia de cancro - transfeção de tumores com


moléculas coestimuladoras:

Outra estratégia é transfetar células tumorais


com genes que codificam moléculas
coestimuladoras para não fazerem bypass à
ativação eficiente de linfócitos T CD8+ (porque as
células tumorais não expressam moléculas coestimuladoras, pelo que não conseguiam ativar CTLs) e assim estes
linfócitos podem permitir a destruição do
tumor.

Inibidores de checkpoints/pontos de controlo


imunológicos no tratamento de tumores:

Utilizam-se os anticorpos anti CTLA-4 e anti-


PD1 que, tanto nos órgãos linfoides como no
microambiente do tumor, libertam estes
inibidores/”travões” (sinal negativo) a que os
linfócitos T CD4+ e T CD8+ estão a ser submetidas
de forma a tornar a resposta mediada por
linfócitos T CD8+ eficiente.

FIM!!!!!

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