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Sistema Imunológico, imunidade e imunização.


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Introdução
O corpo humano encontra-se constantemente exposto a bactérias, vírus
e outros agentes estranhos que podem provocar vários tipos de doenças, por
essa razão, existem alguns sistemas de controle que mantêm o nosso corpo
em condições compatíveis com a vida. Quando esses patógenos ameaçam o
corpo, seus mecanismos de defesa são acionados na tentativa de restabelecer
o equilíbrio necessário a sua sobrevivência.

O termo imunidade então é definido como a resistência a doenças, mais


especificamente a doenças infecciosas. O conjunto de células, tecidos e
moléculas que são intermediários na resistência às infecções é chamado de
sistema imunológico, e a reação ordenada dessas células e moléculas aos
microrganismos infecciosos é conhecida como resposta imunológica. A
imunologia por sua vez é o estudo do sistema imunológico e de suas respostas
aos microrganismos invasores. A função fisiológica do sistema imunológico é
prevenir as infecções e erradicar as infecções estabelecidas.

Inicialmente é importante destacar que o termo imunidade é derivado do


latim immunitas, que se referia às isenções de taxas oferecidas aos senadores
romanos (Unicamp, 2016). Historicamente, imunidade representa proteção a
doenças, mais especificamente, doenças infecciosas.

Estima-se que cerca de 400 mil pessoas morreram no século XVIII em


decorrência de infecção pela varíola, o que corresponderia a algo em torno de
8% a 20% de todas as mortes durante aquele século. Descobrir um meio de
controlar a infecção por varíola era premente, e foi isso que motivou um médico
inglês chamado Edward Jenner (1749-1823). Em 14 de maio de 1796, Jenner
encontrou a jovem leiteira, Sarah Nelms, com lesões recentes de varíola bovina
nas mãos e nos braços. Ele já suspeitava que o pus das lesões poderia ter
uma substância que protegia as tiradoras de leite de contrair uma forma mais
grave da doença.

Extraiu, então, a secreção das lesões de Sarah e a inoculou em um


garoto de 8 anos de idade, James Phipps. Após essa primeira inoculação,
Jenner passou a injetar, diariamente, uma pequena quantidade desse material
em James, até que, finalmente, injetou o vírus da varíola, extraído de uma
lesão recente de outro paciente que teve a doença. James apresentou febre
branda e mal-estar, mas não desenvolveu a doença. Assim, Edward Jenner
conseguiu provar sua teoria de que alguma substância no pus das lesões das
tiradoras de leite protegia a pessoa de contrair a varíola.

Sua descoberta causou muita resistência e enfrentou


inúmeros preconceitos no mundo médico conservador da época.  A
comunidade científica da época resistia em aceitar que um simples médico
rural pudesse ter feito tamanha descoberta. Isso fez com que Edward Jenner
fosse até humilhado publicamente, ao levar suas descobertas para Londres.
Entretanto, como não se conseguiu negar o fato, finalmente a sua teoria foi
aceita. Em 1840, o governo britânico determinou que o tratamento preconizado
por Edward Jenner fosse a única forma utilizada para os casos de varíola.
Assim, em 1959, a Organização Mundial da Saúde (OMS) decidiu pela
realização de um programa global para a erradicação da varíola. Em 8 de maio
de 1980, a 33ª Assembleia Mundial da Saúde acatou a recomendação da
Comissão Global da OMS e declarou que “o mundo e todas as pessoas
estavam livres da varíola” (WORLD HEALTH ASSEMBLY, 1999),
estabelecendo, assim, o primeiro caso de erradicação global de uma doença.

Assim, após destacar a história da imunologia, o texto segue


apresentando os princípios básicos que preparam o terreno para discussões
mais detalhadas sobre o sistema imunológico, imunidade e imunização.

1. O Sistema Imunológico

É o sistema responsável pelo reconhecimento e pela resposta contra


antígenos potencialmente patogênicos. Mantem a homeostasia (equilíbrio),
juntamente com os sistemas Nervoso e Endócrino. Esse sistema reage a
partículas por meio das reações imunes, as quais seriam, portanto, definidas
como reações a substâncias estranhas e a pequenas substâncias químicas. É
essa resposta imune que determina a aquisição ou não de uma determinada
doença, e a duração da mesma.
A imunidade consiste de um conjunto de processos inespecíficos e
específicos. Há barreiras físicas e químicas que visam impedir a entrada de
microrganismos patogênicos no organismo. Quando essas barreiras são
transpostas, ocorre a infecção do indivíduo. De imediato, a imuni dade limita a
ação do invasor e, ainda, cria uma memória imunológica que impede novas
infecções pelo mesmo patógeno. A seguir, detalharemos mais essas barreiras.

Barreiras inespecíficas

São chamadas inespecíficas as barreiras desencadeadas independentemente


do microrganismo ou do tipo de agressão, ou mesmo sem agressão alguma.
Muitas são as funções executadas pelo corpo, diariamente, sem que se pense
na sua importância imunológica. A barreira mais óbvia é a pele, que delimita
nosso espaço corporal no ambiente, ou seja, delimita o que está dentro e o que
está fora do nosso corpo. No sistema digestório, temos como barreiras a saliva,
a acidez do suco gástrico, a secreção biliar, o muco produzido ao longo do
sistema digestório, que funcionam neutralizando ou destruindo possíveis
causadores de agressão. Temos, ainda, como outros exemplos, a lágrima, os
cílios que recobrem internamente todo o trato respiratório, o líquido que
lubrifica naturalmente a vagina e a urina. Desde que nossas funções orgânicas
estejam em equilíbrio, as barreiras inespecíficas impedem uma série de
infecções sem que haja necessidade do envolvimento da imunidade celular ou
humoral.

1. Exemplo de fatores mecânicos

A movimentação conferida aos cílios e ao intestino (peristaltismo) ajuda a


manter os microrganismos longe das vias aéreas e do trato gastrointestinal. A
produção das lágrimas e da saliva cooperam para prevenir as infecções nos
olhos e na boca. Assim como o muco presente no trato respiratório e
gastrointestinal também ajuda a prevenir infecções nos pulmões e no sistema
digestivo.

2. Fatores químicos

Os ácidos graxos através de fatores químicos estão presentes no suor,e deste


modo inibem o crescimento de bactéria. Do mesmo modo, a lisozima e
fosfolipase encontrados na lágrima, saliva e secreção nasal tem a propriedade
de destruir as bactérias através da dissolução das paredes bacterianas e da
desestabilização de suas membranas. O pH também é uma importante
ferramenta para o combate a invasão de patógenos, o pH baixo, comum no
suor e na secreção gástrica ajuda a prevenir o crescimento bacteriano.

2. Fatores biológicos

Existem bactérias que convivem em harmonia com nosso organismo. Essa


flora normal da pele e no trato gastrointestinal ajudam a prevenir a colonização
de bactérias que causam doenças, através da secreção de substâncias tóxicas
ou pela competição com bactéria patogênica por nutrientes ou pela ligação à
superfície da célula.

Barreiras específicas

Tais barreiras são mais complexas, e seu acionamento se dá mediante


condições especiais que tentaremos simplificar. A primeira informação
importante para compreender as barreiras específicas é saber que elas são
desencadeadas por um estímulo. Esse estímulo ocorre pelo contato do nosso
organismo com um antígeno, ou seja, com um elemento ou substância capaz
de provocar a resposta imunológica. Essa resposta irá ocorrer com a formação
de anticorpos, que são as imunoglobulinas. As imunoglobulinas são proteínas
especializadas, divididas em cinco classes:

1.A imunoglobulina A (IgA) encontra-se presente nas secreções, como


leite materno, muco, lágrimas, suor, saliva, colostro, secreção vaginal e
secreção intestinal

2.A imunoglobulina D (IgD) é encontrada na forma de receptor em uma


das células de defesa que compõem o nosso sistema imunológico, o linfócito B.
Sua função é promover a ativação do linfócito B através da ligação com o
antígeno na superfície da célula, sinalizando a necessidade de se desencadear
uma resposta de defesa do organismo.

3.A imunoglobulina M (IgM) está presente nos primeiros dias de infecção


por até em média 15 a 21 dias, com pico entre 5 e 14 dias de infecção. Em
alguns casos, sua presença se prolonga por até 2 meses. Está diretamente
relacionada a infecções ou reações recentes à presença de substâncias
nocivas como por exemplo, picada de aranha).

4.A imunoglobulina G (IgG) é a única classe de imunoglobulina que


atravessa a placenta, fazendo uma imunização passiva do recém-nascido.
Encontra-se presente também no leite materno, porém em quantidades
menores que a IgA.

5.A imunoglobulina E (IgE) possui relevante papel na imunidade, mas não


se relaciona diretamente com a imunização. Encontra-se ligada às reações
alérgicas e à destruição de organismos parasitas em infestações, sendo
responsável pela neutralização do verme que será destruído pelos eosinófilos.

Imunidade

Classificação da imunidade

Para fins didáticos, visando facilitar o entendimento, a imunidade pode ser


organizada nas seguintes categorias:

1.Quanto à sua produção

a) Imunidade passiva: pode ser obtida naturalmente, através da via


placentária e/ou da amamentação, ou artificialmente pela administração de
anticorpos específicos, como as imunoglobulinas homólogas ou heterólogas,
por exemplo, imunoglobulina contra hepatite B e soro antidiftérico,
respectivamente.

Outra forma de produzir imunização passiva é a utilização de soros. Eles


são produtos imunobiológicos indicados para quem necessita de uma
imunidade protetora contra certas doenças infecciosas, ou para neutralizar
toxinas ou venenos de forma mais rápida. Os soros já são anticorpos prontos
(imunoglobulinas, a maioria da classe IgG). São obtidos de humanos
(imunoglobulinas de origem humana ou soro homólogo), ou de outras espécies
animais (soros heterólogos), sendo atualmente utilizados equídeos, por seu
grande porte e facilidade de manejo. O tipo de imunização induzida pelo soro é
chamado de passiva artificial.

Os soros, diferente da imunização ativa artificial (vacinas), não induzem


memória imunológica, motivo pelo qual, quando catabolizados, o indivíduo volta
a se tornar suscetível. A durabilidade da proteção varia de acordo com as
condições de saúde de quem o recebe, sendo que a proteção, diferente das
vacinas, é transitória

b) Imunidade ativa: obtida por produção de anticorpos específicos pelo


organismo, após a introdução do agente nocivo por contato Imunoglobulinas
homólogas são aquelas conferidas por anticorpos obtidos do plasma de seres
humanos. Imunoglobulinas heterólogas, também conhecidas como soros, são
conferidas por anticorpos obtidos do plasma de animais previamente
vacinados.

A amamentação é importantíssima na formação das defesas imunológicas


do bebê. Foto: Daniel Peinado (2011). Soros heterólogos e homólogos serão
abordados no Capítulo 2, “O calendário de vacinação brasileiro e as estratégias
para imunização da população”, do livro Rede de Frio: gestão, especificidades
e atividades (SILVA; FLAUZINO, 2016). resultante de infecção, inoculação
acidental ou através de vacinas próprias para conferir a imunização que se
deseja alcançar. Ainda sobre imunidade ativa, existe também a imunidade de
rebanho.

Isso diz respeito ao fato de que crianças não vacinadas podem desenvolver
anticorpos específicos sem receber diretamente a vacina, mas tendo contato
com o vírus atenuado expelido via oral ou fecal por uma criança devidamente
vacinada. Esse contato resulta em redução do número de doentes e da chance
de transmissão de seus agentes causadores, protegendo indiretamente
aqueles que não tiveram acesso à vacinação. Dessa forma, toda a comunidade
poderá se beneficiar.

A vacina oral pólio retrata o melhor exemplo desse fato. É por esse motivo
que se recomenda, nas campanhas de vacinação da poliomielite, que mesmo
as crianças já vacinadas com esquema completo recebam novamente a
vacina, para que possam contribuir para a disseminação do vírus vacinal no
ambiente.

2) Quanto aos agentes que geram resposta imunológica no organismo

A imunidade natural e a adquirida são formas diferentes de respostas


imunológicas contra agentes microbianos. A imunidade natural ou inata foi
incorporada ao nosso patrimônio imunológico ao longo de milhões de anos de
evolução biológica. A resposta anti-infecciosa da imunidade inata envolve
elementos (como proteínas de fase aguda, do sistema complemento e
citocinas) e células (monócitos, macrófagos, granulócitos, linfócitos NK e
células dendríticas) e apresenta a característica de permanecer inalterada em
encontros sucessivos com o mesmo antígeno, ao contrário da imunidade
adquirida.

Quando a imunidade natural não é suficiente para a eliminação dos


antígenos, são acionados outros mecanismos imunológicos que visam criar
defesa específica contra o microrganismo invasor. A imunidade adquirida
apresenta especificidade para antígenos e memória imunológica. A
especificidade é exercida através de anticorpos (imunidade humoral) e células
programadas para combater antígenos específicos (imunidade celular).

A imunidade humoral e a celular tratam de diferentes funções do sistema


linfoide: a) imunidade humoral: trata da resposta imunológica realizada por
moléculas existentes no plasma sanguíneo, ou seja, por anticorpos produzidos
pelos linfócitos B. b) imunidade celular: traduz a capacidade da resposta
imunológica mediada por células como linfócito T, macrófagos, leucócitos.

Todo produto comercializado para uso farmacológico em humanos


necessita ser desenvolvido por meio de estudos, com protocolos rigorosos, que
passam por algumas fases de testes; a fase de segurança e eficácia é
denominada Fase III. Leucócitos polimorfonucleares são também conhecidos
como granulócitos; incluem os neutrófilos, eosinófilos e basófilos.
polimorfonucleares e outras células da imunidade inata, que realizam
fagocitose de antígenos e que, ao serem ativadas pelo antígeno, reconhecem
antígenos livres na superfície.
Caso as barreiras de defesa não tenham sido suficientes para conter a
entrada do patógeno, a primeira linha de defesa entra em ação. Esta linha de
defesa consiste em combater os microorganismos que entram nas células,
incidindo em mecanismos de defesa celulares e bioquímicos que já existiam
antes do estabelecimento de uma infecção. Trata-se de um mecanismo inato,
que não mudarão durante toda a vida.

Esta linha de defesa elimina cerca de 12% dos antígenos seus


componentes celulares consistem nos Fagócitos (Macrófagos e Neutrófilos) e
Linfócitos NK. O sistema Inato possui habilidade de reconhecer padrões
moleculares associados a patógenos (PAMP’s). Deste modo, esta linha de
defesa possui baixa especificidade, sendo capaz de reconhecer
microrganismos que expressam determinado padrão molecular, mas não
diferenciando os entre si. Filogeneticamente mais antiga e está presente em
todos os organismos multicelulares, incluindo plantas e insetos).

Já a imunidade adquirida é mais especializada que a imunidade inata, e


complementa a proteção proporcionada por essa última. A imunidade é
adquirida por contato com o invasor e é específica somente àquele invasor.
Uma característica particular do sistema imune adquirido ou adaptativo
consiste na capacidade de produzir memória imunológica, de modo que, tendo
sido exposta uma vez a um agente infeccioso, uma pessoa produzirá uma
resposta forte e imediata contra qualquer exposição subsequente ao mesmo
patógeno, isto é, ela terá uma imunidade protetora contra ele.

Buscar maneiras de produzir imunidade de longa duração contra patógenos


que não provocam essa imunidade naturalmente é um dos maiores desafios
dos imunologistas hoje. O contato inicial com determinado agente externo
(imunização) desencadeia uma série de eventos que leva a ativação de
determinadas células e à síntese de proteínas. Existem dois tipos de imunidade
adquirida, a imunidade humoral (anticorpos) e a imunidade celular.
Imunidade Humoral x Imunidade Celular

Imunidade humoral é mediada por anticorpos, produzidos por Linfócitos


B, e é o principal mecanismo de defesa contra microorganismos extracelulares
e suas toxinas. Já a imunidade celular é mediada por Linfócitos T, que
promovem a destruicão dos microoganismos presentas em fagócitos ou a
destruição de células afetadas para eliminar os reservatórios da infecção -
Anticorpos A proteção da imunidade humoral é intercedida por um conjunto
muito importante de glicoproteínas: os anticorpos (Ac).

Essas substâncias conseguem se ligar de forma peculiar aos antígenos


(Ag) na tentativa de inativá-los, diretamente ou por intermédio de outros
componentes do sistema imune. Os anticorpos possuem maior variabilidade de
reconhecimento antigênico, conseguem fazer maior distinção de antígenos, e
conferem maior força de ligação com a molécula do antígeno.

Imunidade Ativa x Imunidade Passiva

Na imunidade ativa, o próprio organismo, após exposição a determinado


microrganismo, encontra meios de eliminá-lo. Já a passiva, o organismo
infectado recebe anticorpos ou linfócitos específicos para realizar o combate a
infecção. A passiva é mais rápida; a ativa apresenta memória imunológica.

A imunidade adquirida ainda pode ser dividida em dois grupos que


interagem entre si, com o intuito de eliminar o antígeno. Um desses grupos é
mediado essencialmente pelo linfócito B e os anticorpos circulantes, chamado
de humoral. O outro grupo é mediado pelas células T, que atacam o antígeno
através da liberação de citocinas, este grupo é chamado de imunidade celular.

Considerações finais

Podemos perceber, ao finalizar desse texto, o quanto se faz importante


conhecer sobre a imunidade, seus componentes e mecanismos de ação.
Referências

AYRES, A.R.G. Noções de imunologia: sistema imunológico, imunidade e


imunização. In: SILVA, M.N., FLAUZINO, R.F., GONDIM, G.M.M., eds. Rede
de frio: fundamentos para a compreensão do trabalho [online]. Rio de Janeiro:
Editora FIOCRUZ, 2017, pp. 239-256. ISBN: 978-65-5708-091-7

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