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História do Pensamento Arqueológico e Patrimonial

A arqueologia processual
A arqueologia processual
 Sumário:
 Origens.
 Fundamentos teóricos.
 Novos objetivos no estudo da arqueologia.
 Principais autores processualistas.
A arqueologia processual
 Origens
 Contexto económico-social dos E.U.A. no pós-guerra e o
desenvolvimento tecnológico como chave para o progresso
humano (anos de 1950-60);
 neoevolucionismo na Antropologia norte-americana (anos de
1950-60):
 as sociedades humanas transformam-se, não por ação humana
(como se cria no século XIX), mas antes por determinismo
ecológico (Julian Steward), tecnológico (Leslie White), demográfico
e económico;
 elaboração de sequências de desenvolvimento cultural unilinear
(M.D. Sahlins e E.R. Service): Bando → Tribo → Chefatura →
Estado.
A arqueologia processual
 Origens
 A “teoria geral dos sistemas” e o conceito de ecossistema
enquanto modelos para o entendimento do comportamento
humano:
 as culturas são sistemas compostos por partes interativas
(subsistemas) com dinamismo próprio, cujas leis de funcionamento
poderão ser identificadas;
 as culturas são meios de adaptação e tendem para o equilíbrio (ou
homeostasia);
 as culturas sofrem alterações devido a fatores externos, como por
exemplo o meio ambiente (noção de adaptação) ou a ação de
culturas vizinhas (noção de competição).
A arqueologia processual
 Fundamentos teóricos
 Refutação de aspetos teóricos da arqueologia histórico-
cultural:
 nova noção de cultura: as culturas arqueológicas não são a soma dos
seus artefactos distintivos, são sistemas adaptativos integrados
interagindo entre si, com o meio ambiente e com processos internos
de transformação;
 recusa da difusão e da migração enquanto fatores de
transformação cultural;
 rejeição da visão normativa da cultura tal como definida pela
arqueologia histórico-cultural (isto é, a cultura enquanto conjunto de
ideias mantidas por um coletivo e transmitidas de geração em
geração).
A arqueologia processual
 Fundamentos teóricos
 As culturas são sistemas adaptativos compostos por três
principais subsistemas, refletidos nos artefactos (L. Binford):
 Tecnologia ⎯ “artefactos tecnómicos”: “Technomic signifies those artifacts
having their primary functional context in coping directly with the physical
environment” (ex.: machados, lareiras...).
 Organização social ⎯ “artefactos sóciotécnicos”: “material elements
having their primary functional context in the social sub-systems” (ex.: coroa de
um rei...).
 Ideologia ⎯ “artefactos ideotécnicos”: “items which signify and symbolize
the ideological rationalizations for the social system” (ex.: figuras de divindades,
símbolos clânicos...).
 O comportamento humano tem regularidades → negação do
particularismo histórico e busca de explicações (não apenas
descrever) e generalizações (rejeição dos particularismos).
A arqueologia processual
 Fundamentos teóricos
 Proposta da middle-range theory (L. Binford): estudos de
controlo das relações entre as propriedades estáticas dos
materiais do passado e das propriedades dinâmicas das
sociedades do presente → importância da observação
etnográfica para inferir comportamentos a partir dos dados
arqueológicos (raciocínio dedutivo).

 Desenvolvimento da noção de processos de formação dos
sítios arqueológicos (L. Binford, M. Schiffer): reconhecimento
dos fatores envolvidos e do seu encadeamento:
 Necessidade de investigações etnoarqueológicas.
 Desenvolvimento da “arqueologia experimental”.
A arqueologia processual
 Novos objetivos no estudo da arqueologia
 Principal questão transversal aos diversos projetos: o estudo
dos processos de intensificação económica e complexificação
social como resposta adaptativa.
 Exemplo 1: O Mesolítico europeu dispunha de todas as bases
ecológicas e tecnológicas para o surgimento autónomo da
agricultura e pastorícia (D. Clarke, 1976)
 as novas condições bioclimáticas do continente europeu no
Holoceno multiplicaram os recursos alimentares disponíveis;
 as populações desenvolveram novas tecnologias (sobretudo
utensilagens compósitas) que permitiram a exploração de um
leque maior de recursos e, por fim, a domesticação de plantas e
animais autóctones.
A arqueologia processual
 Novos objetivos no estudo da arqueologia
 Exemplo 2: A emergência da agricultura e da pastorícia no
Próximo Oriente entendida em função de fatores ecológico-
demográficos:
 hipótese da zona nuclear (R. Braidwood, 1967): ocorrência de
desenvolvimentos tecnológicos na zona onde existem as plantas e
animais selvagens potencialmente domesticáveis;
 hipótese da pressão demográfica (E. Boserup, 1965): o aumento
populacional no final do Pleistoceno conduz a processos de
domesticação;
 hipótese da zona marginal (L. Binford, 1968; K. Flannery, 1969): a
ocupação de regiões ambientalmente marginais ocorreu através da
introdução de plantas e animais exógenos (logo, em estado
domesticado).
A arqueologia processual
 Novos objetivos no estudo da arqueologia
 Exemplo 3: O megalitismo europeu foi resultado da
complexificação social e económica do Neolítico, e não um
fenómeno derivado do Mar Egeu por difusão ou migração (C.
Renfrew, 1973).

 a “revolução do radiocarbono” (década de 1960) fez recuar as
cronologias até então supostas para os diversos eventos pré-
históricos;
 a aplicação da datação por radiocarbono reduziu a importância da
seriação e do comparativismo tipológico na determinação de
cronologias.
Lewis R. Binford
Principais autores processualistas: L.
Arqueólogo e antropólogo
Binford: norte-americano que
 Defende que, recorrendo à middle range produziu inúmeros estudos
theory, se pode estudar as sociedades do marcantes para a definição
teórica da arqueologia
passado (arqueologia) como as do processual.
presente (antropologia) → uso de
método científico para a realização da
antropologia do passado;
 o registo arqueológico deve ser uma base
de dados para a reconstrução do
comportamento humano e não apenas
um registo das mudanças na cultura
material;
Fotografia de Lewis Roberts Binford (1932-2011), à direita.
 a arqueologia tem uma vantagem sobre a
antropologia: o estudo do passado permite
observar a evolução das adaptações e
evolução humanas no tempo longo;
 os arqueólogos devem providenciar
explicações sobre o comportamento
humano (que devem ser suportadas pelo
registo arqueológico e não através de
especulação) e ultrapassar as descrições
da arqueologia histórico-cultural;

A única obra de Binford publicada em Portugal (1983, 1992).


 a middle range theory:
 parte do estudo etnoarqueológico dos
nunamiut (caçadores-recolectores do
Alasca) para abordar as sociedades do
Paleolítico europeu → ligação entre a
atualidade e o passado (atualismo) → passar
do registo arqueológico (estático) para os
processos culturais (dinâmicos);
 low range theory: explicação de aspetos
culturais específicos (ex.: a agricultura neolítica
mediterrânea);
 upper range theory: explicações (leis) gerais
aplicáveis a qualquer sistema cultural.

Frontispício de Nunamiut Ethoarchaeology (1978), à direita.


François Bordes
 o “debate mustierense”:
 F. Bordes considerava que os cinco tipos Pré-historiador e geólogo
quaternarista francês que
principais de indústrias mustierenses
trabalhou sobretudo nos
correspondiam a diferentes etnias neandertais
estudos do Paleolítico,
 tendo desenvolvido
perspetiva étnica da arqueologia histórico- abordagens tecnológicas
cultural; para o estudo do talhe da
pedra.

 L. Binford contrapõe que se tratam de


especializações funcionais para responder a
necessidades concretas

perspetiva funcional / sistémica da arqueologia
processual.

Fotografia de François Bordes (1919-1981), à direita.


David L. Clarke
Principais autores processualistas: D.
Arqueólogo britânico que
Clarke: desenvolveu e aplicou
 Demonstrou a importância da “teoria dos perspetivas processualistas
sistemas” para o entendimento das no estudo de fenómenos da
Pré-História europeia
sociedades humanas (logo, o papel da (Mesolítico, Campaniforme,
geografia e ecologia nesse processo); etc.).
 introduziu o uso de parâmetros
quantitativos (matemáticos) para a
apreciação de aspetos do comportamento
humano → buscava a implementação de
um “método científico”.

Fotografia de David Leonard Clarke (1937-1976), à direita.


Colin Renfrew
Principais autores processualistas: C.
Arqueólogo, conservador e
Renfrew: paleolinguista inglês que
 Entre outros tópicos de investigação: desenvolveu teorias
processualistas no âmbito
 Expôs em 1973 a “revolução do radiocarbono”
das origens do megalitismo
enquanto fator que permitiu romper com o
e das línguas indo-
paradigma do ex oriente lux como chave europeias.
explicativa das transformações culturais na
Europa pré-histórica (designadamente no
megalitismo).
 Tentou correlacionar a origem das línguas
indo-europeias com o processo de expansão
do Neolítico próximo-oriental (Anatólia, c.
7000 a.C.), e não com a expansão kurgan a
partir do Cáucaso e das estepes pônticas em
c. 4000 a.C.
Fotografia de Andrew Colin Renfrew (1937-...), à direita.
A arqueologia processual

“Before civilization. The radiocarbon “Archaeology and language. The


revolution and Prehistoric Europe.” puzzle of Indo-European origins.”
(1973) (1990)
Michael B. Schiffer
Principais autores processualistas: M.
Arqueólogo americano que
Schiffer: desenvolveu métodos de
 No estudo dos processos de formação análise dos processos de
dos sítios arqueológicos (ou a formação do registo
arqueológico e o que
transformação de “contextos sistémicos” chamou de “Behavioral
em “contextos arqueológicos”) definiu a Archeology”.
combinação de:
 fatores naturais (movimentos dos
sedimentos, ação dos animais, efeito do vento
e da água, etc.): “n-transforms”;
 fatores culturais (pisoteamento, limpeza dos
espaços, abertura de estruturas negativas, etc.):
“c-transforms”.

Fotografia de Michael Brian Schiffer (1947-...), à direita.

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