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ANTÓNIO GUSTAVO LUDI DIBANZILUA

RECENSÃO CRÍTICA DO TEXTO DE


BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS INTITULADO:
O OCIDENTE VISTO PELO MUNDO

Universidade Agostinho Neto


Faculdade de Ciências Sociais

Luanda
2023
ANTÓNIO GUSTAVO LUDI DIBANZILUA

RECENSÃO CRÍTICA DO TEXTO DE


BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS INTITULADO:
O OCIDENTE VISTO PELO MUNDO

Trabalho apresentado para avaliação no


módulo de Problemas Políticos
Contemporâneos do Curso de Mestrado em
Ciência Política e Administração Pública,
conferido pela Faculdade de Ciências Sociais
da Universidade Agostinho Neto.

Docente: Ilonka Dilvânio de Assis e Costa PhD

Universidade Agostinho Neto


Faculdade de Ciências Sociais

Luanda
2023
INTRODUÇÃO

Como trabalho avaliativo para o módulo «problemas políticos contemporâneos» do curso


de Mestrado em Ciência Política e Administração Pública da Faculdade de Ciências Sociais
da Universidade Agostinho Neto, cujo docente é o Doutor Ilonka Dilvânio de Assis e Costa.
Apresentamos neste trabalho, uma recensão crítica do artigo «O ocidente visto pelo
mundo» de autoria do Sociólogo português, Boaventura de Sousa Santos, segundo o
seu site de internet¹, o autor de vários livros e numerosos artigos sobre sociologia política,
sociologia do direito, epistemologia, movimentos sociais, globalização etc. Onde podemos
destacar «a transição em Angola» publicada a 1 de Agosto de 2008. O artigo sobre o qual
realizamos esta recensão crítica, foi publicado pelo jornal português Diário de Notícias a 05
de Março de 2023, contendo originalmente 3 páginas. Com uma visão menos apaixonada
e mais criticamente construtiva do ocidente, neste artigo, Boaventura apresenta uma
alternativa a percepção ocidental dos problemas mundiais contemporâneos, alertando
sobre as transformações sociais que o ocidente, e em particular a Europa, devem aceitar
nas novas relações com o mundo. Tendo em conta o que a imprensa europeia e demais
ocidentais veiculam sobre o relacionamento do ocidente com o resto do mundo, baseado
quase sempre em uma visão eurocêntrica ou mesmo «ocidencentrica»², o autor destaca-
se pela sua frontalidade, realismo e crítica construtiva. Sua reconhecida originalidade,
objectividade e pragmatismo, incluso lhe valeram inúmeros prémios e reconhecimentos a
nível europeu e mundial, em referência o título de Doutor Honoris Causa em várias
Universidades na Europa e nas Américas.

Em livros, colunas de jornais e revistas e demais artigos de opinião, feito por autores
ocidentais, é comum encontrar reproduções e reafirmações das políticas voltadas para o
domínio incessante do ocidente e a subjugação do resto do mundo aos seus ideais, com a
chamada ocidentalização. Propaga-se incessantemente a ideia de que, tem o mundo que
aprender e seguir o exemplo do ocidente. Como de costume em suas obras, Boaventura
Santos, reforça neste artigo, a tese de que, a dinâmica dos novos tempos exige uma postura
diferente do ocidente face ao seu relacionamento com o resto do mundo, e propõe que seja
a Europa a começar a aprender com o mundo.

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¹ https://www.boaventuradesousasantos.pt/pages/pt/homepage.php
²Ocidencentrica, é um termo que na nossa perspectiva se pode usar para designar a centralidade e
superioridade da visão ocidental sobre as outras visões do mundo.
1. O OCIDENTE VISTO PELO MUNDO

O artigo tem início com a menção à uma investigação cujo autor foi coordenador, intitulada
ALICE –Espelhos Estranhos, Lições Imprevistas: definindo para a Europa um novo modo
de partilhar as experiências do mundo, sobre o qual, Boaventura Santos lamenta o facto de
a Guerra na Ucrânia ter revelado que as propostas desta investigação pouco serviram aos
líderes europeus apesar da sua pertinência. Esta interessante pesquisa a qual o autor faz
referência, abarca quatro eixos temáticos.

São quatro os principais eixos temáticos do ALICE: 1) a profunda reforma do Estado


moderno (refundação do Estado); 2) a democratização da democracia a partir da
demodiversidade; 3) as outras economias, onde estão incluídas formas não capitalistas
de produzir, trocar e consumir, assentes em valores como a solidariedade e a
reciprocidade e na recusa da hegemonia do mercado; 4) os direitos humanos a partir de
uma perspectiva intercultural, reconhecendo concepções não eurocêntricas da
dignidade humana. (Santos at al 2014, p.1)

Tendo o autor através das premissas abordadas nestes eixos temáticos, concluído que
depois de cinco séculos a procurar ensinar o mundo que em grande medida não fazia caso
a Europa, esta última ao em vez de propor isolamento progressivo, devia disponibilizar-se
a aprender com o mundo. Possibilitando o uso da experiência desta aprendizagem para
resolver alguns dos problemas que o mundo enfrenta. Bastante interessante o quarto e
último ponto dos principais eixos temáticos da pesquisa referenciada, pois este é um dos
pontos que mais divide a visão ocidental com muitos outros países do mundo, a cultura dos
povos muita das vezes é, em si só descrita como violadora dos direitos humanos. Na cultura
africana por exemplo, é mais fácil admitir o direito do homem a ter duas ou mais esposas,
do que a homossexualidade ou a transexualidade, porem no ocidente a visão é diferente e
a imposição desta, por parte do ocidente ao resto do mundo, se propaga como uma questão
de direitos humanos universais. Não muito distante deste antagonismo e imposição cultural
e de ideias, o autor apresenta o posicionamento e reação ocidental ou europeia ao conflito
que ``supostamente´´ opõe a Rússia à Ucraína. Com dados precisos sobre uma
investigação levada a cabo por um conhecido instituto da Universidade de Cambridge, que
através da harmonização de 30 inquéritos globais sobre atitudes em relação aos Estados
Unidos de américa (EUA), à China e à Rússia, realizado oito meses após a incursão militar
Russa na Ucrânia. Inquéritos estes que cobriram 137 países do mundo e 97% da população
mundial, tendo se obtido como resultado principal que, apenas 1,2 mil milhões de pessoas
no mundo têm uma opinião positiva sobre os EUA e uma atitude negativa sobre a China e
a Rússia, de forma inversa, ocorrendo com 6,3 mil milhões de pessoas no mundo, tem uma
opinião negativa dos EUA, e positiva em relação à China e Rússia. Hora várias outras
pesquisas confirmam esta realidade, José Pedro Teixeira Fernandes, num artigo intitulado
a nova guerra fria e a ascensão da China no médio oriente, afirma que, ʻʻ a crescente
influência chinesa no médio oriente tem implicações no poder global. ʼʼ (Fernandes,T., 2023,
p.4), reforça que a aposta da china por uma diplomacia que se apresenta como ʻʻ promotora
da paz, respeitadora da soberania de todos os estados do mundo e dos seus diferentes
sistemas sociais e políticos, ou seja não interferindo na vida interna de outros estados e
fazendo ponte entre inimigos, atrai mais a simpatia e a confiança dos estados ʼʼ (Fernandes,
T., 2023. p.3). Também Jorge de Almeida Fernandes afirma que, ʻʻ o poder viaja para o
oriente. O Ocidente já não é o centro de gravidade do mundo. Isto, que parecia dispare em
1990, não é sinónimo de declínio, ocaso ou catástrofe: é uma mudança de era. ʼʼ
(Fernandes, A., 2018, p.3).

Em relação a Rússia, em África por exemplo, o seu crescente domínio é uma questão
histórica relacionada com a luta pela independência, muitos países africanos, conseguiram
as suas independências de colonizadores ocidentais, através do apoio militar Russo, e esta
influência prevalece através de uma preferência no estabelecimento de relações em vários
domínios. O escritor e intelectual guineense Tierno Monenembo citado por António Cascais
num artigo sobre a relação da Rússia com a África, reforça que ʻʻ muitos estados africanos
nunca se libertarão do domínio da Rússia, especialmente dada a sua crescente
dependência das proezas militares de Moscovo. ʼʼ (Cascais, 2022, p.5).

Esta crescente influência da Rússia em África é uma questão preocupante para o ocidente
e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). No ano passado, durante a 68ª
sessão anual da Assembleia Parlamentar da OTAN, a ministra da defesa de Espanha
Margarita Robles, afirmou:

A Rússia está a invadir a Ucrânia, mas está a expandir-se em África e temos de estar
todos conscientes disso. Está a encontrar um campo de expansão perfeito. Qualquer
vazio deixado pela Europa ou pela NATO, está a ser perfeitamente aproveitado pela
Rússia. (Voz da América [VOA], 2022)

No seguimento do artigo, Boaventura Santos apresenta quatro pontos para fundamentar


que o ocidente está mais isolado do que nunca, tentando explicar, o porque a grande
maioria dos países do mundo se tenha recusado a aplicar sanções à Rússia decretadas
pelos Estados Unidos de América (EUA) e a União Europeia (UE).
1.1 Os desafios do Sul Global

No primeiro ponto da sua fundamentação, o autor faz menção a posição marcada pela
retórica em lugar de ações concretas por parte da Europa face aos problemas que afetam
o sul global, tais como as consequências da pandemia da covid-19, os juros da dívida
externa, cuja boa parte desta é referente a países ocidentais, os impactos da crise climática,
a pobreza, a escassez de alimentos, a seca e os altos preços da energia.

Assistimos por exemplo durante a crise pandêmica que recentemente assolou o mundo,
(apesar de ainda pairarem alguns fantasmas da mesma), uma tímida intervenção ocidental,
houve como afirma o autor, maior apoio para o sul global vindo da China e da Rússia, cujas
patentes das vacinas produzidas nestes países estiveram disponíveis para uma ampla e
barata vacinação das populações dos países menos favorecidos. Por isto temos também
de concordar com o autor quanto ao seu ponto de vista em relação a este assunto, pois
assistimos durante a fase crítica da pandemia um ocidente capitalista, onde as suas
empresas estavam mais preocupadas em lucrar do que com questões humanitárias. Da
parte dos governos, para além de pouco fazerem, ajudados pela mídia, disseminavam um
clima de desconfiança face as ações da Rússia e a China, ao porem em pratica os seus
planos de ajuda humanitária concretas a nível global.

Estes dois países considerados emergentes tiveram um papel preponderante na luta contra
a covid-19, não só nos países do sul global como afirma o autor, como também podemos
acrescer que tanto os EUA como a Europa, também beneficiaram desta ajuda, são
exemplos a cidade de Nova York e a Itália. Num artigo publicado no Jornal Gazeta do Povo³,
a autora Helen Mendes, afirma que ʻʻ as ações de auxílio à pandemia de covid-19 que a
Rússia e a China têm enviado aos países ocidentais mais afetados é descrita por alguns
analistas como sendo mais estratégia de publicidade do que altruísmo ʼʼ (Mendes, 2020,
p.10).

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³Jornal Gazeta do Povo é um jornal brasileiro, sediado no estado do paraná, em Curitiba, o periódico circula
semanalmente no formato impresso e as notícias diária se pode acessar de forma online através do link:
www.gazetadopovo.com.br
No entanto não restam dúvidas que o recente momento pandêmico antecessor a chamada
invasão Russa da Ucrânia, marcada por esta ajuda da Rússia e da China ao sul global,
para supera-la, tal como ressalta o autor, constitui um elemento de peso no atual
posicionamento dos países do sul quanto ao desejo do ocidente em tornar a Rússia num «
estado pária internacional»⁴. Apesar de todos os países estarem de acordo com a
inviolabilidade territorial consagrado na Carta das Nações Unidas no ponto 4 do seu artigo
artº.2 que diz que ʻʻ todos os membros deverão evitar em suas relações internacionais a
ameaça ou o uso da força contra a integridade territorial ou a independência política de
qualquer estado, ou qualquer outra ação incompatível com os propósitos das Nações
Unidas ʼʼ (ONU, 1945, p.6). Não obstante isto, muitos dos estados, em referência estados
africanos, preferem tomar uma posição neutra, nesta guerra que realmente a Rússia não
trava só com a Ucrânia, mas com o ocidente, repetindo-se desta forma um cenário parecido
ao da guerra fria em que os países do sul preferiram criar um bloco dos não alinhados.
Frank Gardner, repórter de segurança da BBC News escreveu:

Depois que a Rússia invadiu a Ucrânia em 24 de fevereiro, a ONU realizou uma votação
de emergência -141 nações dos 193 estados membros da ONU votaram uma semana
depois para condenar a atitude. Mas vários países importantes optaram por se abster,
incluindo China, índia e África do Sul. Portanto, seria ilusório para os lideres dos EUA
e da Europa acreditarem que o mundo inteiro compartilha da visão da OTAN – de que
a Rússia é inteiramente culpada por esta guerra catastrófica – porque o resto do mundo
não pensa assim. (Gardner, 2022)

Porem se pode acrescer outras razões que motivam esta opção por não condenar a Rússia,
principalmente pelos países africanos, tais como a fome no continente, na medida em que
a Rússia representa um grande exportador mundial de cereais e fertilizantes para a
agricultura, e com o atual cenário relativo a fome no continente, não seria prudente por
parte dos governos, que se encontram na posição dependente dos cereais e fertilizantes
da Rússia, uma condenação direta as ações desta última. Também podemos acrescer o
fator instabilidade no continente, onde os regimes instalados, precisam de armas para a
manutenção do poder. De acordo com uma análise de 2020 do instituto internacional de
pesquisa da paz (SIPRI) sigla em inglês, entre 2016 e 2020, cerca de 30% de todas as
armas exportadas para países da África subsaariana vieram da Rússia (Cascais, 2022).

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⁴ Estado Pária internacional é aquele estado que a sociedade internacional repele ou exclui, alguns expertos
em relações internacionais, o definem como um estado cujas condutas não seguem as normas internacionais
de comportamento definidas pela comunidade internacional.
1.2 Problema nosso é problema do mundo

No segundo ponto do autor para justificar a sua tese de que o ocidente está mais isolado
do que nunca, faz menção a atual falta de credibilidade e autoridade para impor regras
unilaterais que devem ser consideradas por todos como de respeito a «ordem internacional
baseada em regras». Também corroboramos neste sentido, num momento em que hoje
mais do que nunca, começam a surgir em todas as direções do sul global, vozes que
apresentam moções de protesto por esta postura que já dura a séculos. Para além do
ministro dos negócios estrangeiros indiano Subramaniam Jaishankar, o qual o autor faz
referência, que também é autor da frase que escolhi como título para comentar este ponto,
cuja posição de que «a Europa tem de deixar de pensar que os problemas do mundo são
os problemas da Europa e começar a pensar que os problemas do mundo não são os
problemas da Europa», é compartilhada por muitos outros líderes mundiais não ocidentais.
Recentemente na sua visita à China, o presidente Brasileiro Luís Inácio Lula da Silva, teceu
grandes críticas ao sistema económico e financeiro internacional dominado pelo ocidente,
marcando uma posição firme quanto a pretensão de mudar o quadro, o presidente brasileiro
insistiu no seu discurso que ʻʻ é inadmissível que a irresponsabilidade e a ganancia de uma
pequena minoria coloquem em risco a sobrevivência do planeta e de toda a humanidade ʼʼ.

Reforçando esta ideia Andrew Sheng, pesquisador do instituto Global da Ásia da


Universidade de Hong Kong, no Jornal South China Morning Post ⁴, num artigo intitulado o
mundo, da América do Sul ao Leste da Ásia, afirma que ʻʻ o mundo está cansado da
hipocrisia do ocidente na política externa. ʼʼ (SputnikBrasil, 2023a). O autor acrescenta:

O ocidente decepciona e afasta os países com sua abordagem dominante, onde


apenas as ações dos países ocidentais estão certas. Ao mesmo tempo, todos se
lembram dos resultados do ocidente no Afeganistão, no Iraque e na Líbia e ao que eles
levaram. Agora os líderes europeus, insistem na vitória total da Ucrânia, o que não faz
sentido nem é racional. (SputniknewsBrasil, 2023a)

O Jornalista e presidente do Partido Socialista da Zambia, Fred M´membe, criticando a


segunda cúpula para a democracia ocorrida no final do mês de março último,

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⁴Jornal South China Morning Post é um renomado jornal de lingua inglesa da cidade de Hong Kong criado em
1903, actualmente o jornal que é propriedade da empresa Alibaba Group tem uma tiragem diária de 104 000
exemplares.
organizada pelos Estados Unidos, Costa Rica, Países Baixos, Coreia do Sul e Zâmbia em
formato online, para além de afirmar que «a política externa dos estados unidos se está
convertendo em uma arma de destruição em massa», expressou:

O que os EUA podem nos ensinar sobre democracia e eleições, um pais que iniciou
tantos golpes de Estado na África e outras partes do mundo, assassinou tantos lideres
nossos e ajudou a manipular as eleições em muitos países? Suas próprias eleições
estão sendo questionadas. (SputniknewsBrasil, 2023b)

A falta de credibilidade do ocidente a qual o autor referência, é hoje muito mais expressada
pelos líderes do sul global, no meu entender, começa-se a desenhar a nível internacional,
a ideia de que é possível o desenvolvimento sem o ocidente. No final do século XX e
princípio do XXI, era quase impossível ouvir-se críticas públicas e diretas ao ocidente por
parte dos líderes do sul global, apenas acontecia em ciclos fechados. Porem hoje é
frequente, o expressar da insatisfação das políticas ocidentais por parte dos líderes do sul
global, se pode depreender que, a existência de uma alternativa na China e na Rússia, com
vista ao desenvolvimento sem depender do ocidente, começa a tornar-se cada vez real, e
o alastramento do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), o banco das economias
emergente, BRICS⁵, como alternativa as Instituições de Bretton Woods⁶ é um exemplo
disto.

Neste segundo ponto da sustentação da sua posição, o autor termina fazendo menção ao
silencio ocidental, com relação a sabotagem dos gasodutos Nord Stream. Como refere o
autor, estas rupturas nos gasodutos localizados no fundo do mar báltico, ocorridas a 26 de
setembro de 2022, desencadearam alertas de perigo público e sérios danos ambientais,
para além das questões de segurança energética envolvendo não só o mais industrializado
país da Europa que é a Alemanha, como também outros países nórdicos. Reforçando assim
a ideia que o silencio, quando os atos bárbaros são cometidos por um dos seus, é um
costume ocidental. Noticiou-se o possível envolvimento ucraniano ou norte americano nesta
sabotagem, e a cautela logo imperou nos discursos dos líderes europeus, assim como
aconteceu com o míssil ucraniano que atingiu solo polaco.

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⁵ BRICS - é um bloco de desenvolvimento económico composto por países considerados emergentes, fundado
em 2009 pelo Brasil, Rússia, Índia, e China, posteriormente se incorporou a África do Sul.

⁶ Instituições de Breton Woods- são instituições de ordem económica e monetária criadas na conferência de
Breton Woods em 1944 nos EUA, impulsionada pelo presidente Norte Americano Donald Rosevelt, fazem parte
o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Grupo Banco Mundial.
Primeiramente quando foi atribuído o ataque ao lado Russo, todo ocidente afirmava que os
responsáveis têm de pagar pela atrocidade, a própria Ucrânia qualificou como «teoria da
conspiração» e parte da «propaganda russa», quando os russos afirmaram que o míssil
teve origem em base militar ucraniana. Logo após confirmar-se este último facto, o ocidente
minimizo-os. Na altura, o Secretário Geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte
(OTAN), Jens Stoltenberg declarou que ʻʻ uma análise preliminar mostrou que os destroços
filmados no local são parte de um míssil da defesa aérea ucraniana. Mas, no entanto, a
OTAN não culpa a Ucrânia pelo ataque, pois o país tem direito a defender-seʼʼ (British
Broadcasting Corporation [BBC], 2022).

1.3 A Rússia e a China ajudaram a libertar os países colonizados do Sul

Um facto irrefutável da história, é o elemento crucial que representou o apoio tanto da


Rússia como da China, nos processos para a independência da maioria das nações do sul
global, em África por exemplo, podemos considerar que as relações diplomáticas entre a
República da Unida da Tanzânia com a China a partir de 1964, marcou um ponto muito
importante para que muitos movimentos independentistas pudessem adquirir treinamento
militar, o campo militar do Kongua na Tanzânia, serviu de ponto de concentração de muitos
nacionalistas para seguirem para China, onde recebiam treinamento militar.
Particularmente, um dos nossos partidos nacionalistas, a União Nacional para a
Independência Total de Angola (UNITA), beneficiou desta relação diplomática, ʻʻos onze
(11) primeiros Comandantes da UNITA partiram do Campo do Kongua para a Academia
Militar de Nanking, na República Popular da China ʼʼ (Kandanda, 2019, p.11). Este apoio da
China aos países do continente, transladou-se do campo militar para o económico depois
das aquisições das independências, e a China hoje é um dos grandes parceiros
económicos de África. Dados levantados pela Iniciativa de Pesquisa China-África (CARI)
na sua sigla em inglês, da Universidade John Hopkins, nos Estados Unidos, demostram
que ʻʻ nos últimos 10 anos a China injetou em África 34 bilhões de dólares norte-americanos
ʼʼ (Cardoso & Mano, 2022). A Rússia, natural herdeira da Ex-União das Repúblicas
Soviéticas, tal como afirma o autor também estabeleceu relações com muitos movimentos
de libertação nacionais africanos, como é o caso do nosso Movimento Popular para
Libertação de Angola (MPLA), com apoios que iam do setor militar ao setor político, estas
relações russo-africanas que foram praticamente quebradas com a queda do bloco
soviético, foram retomadas recentemente, e na primeira cimeira Rússia - África o presidente
russo Vladimir Putin, afirmou que a Rússia está determinada a continuar a construir uma
parceria estratégica no sentido pleno da palavra com os amigos africanos, e está pronta a
dar forma à agenda global em conjunto, e na altura, segundo noticiou a agencia de noticia
Reuters. O presidente russo disse que ʻʻ tal como a África, a Rússia também defende os
valores morais tradicionais ao resistir à ideologia neocolonial imposta pelo ocidente ʼʼ (Jornal
de Angola, 2023). Estes e outros factos pesam bastante para que o ocidente não consiga
atualmente um apoio desejado em África com vista a sua pretensão de tornar a Rússia num
estado pária a nível internacional.

1.4. Está a emergir um novo movimento dos não alinhados

O quarto e último ponto da justificativa de Boaventura Santos, faz referência ao surgimento


de um novo cenário de guerra fria, na minha ótica, este cenário que hoje se assiste é fruto
da atenção ocidental representado pelo seu principal ator, os Estados Unidos da América,
as teses levantadas por Samuel Huntington quando afirma que ʻʻ as sociedades Islâmica e
sínicas que veem o ocidente como seu antagonista têm assim, razões para cooperar entre
si contra o ocidente da mesma maneira como os aliados e Stalin o fizeram contra Hitlerʼʼ (
Huntington, 1997 citado por Brigola & Albuquerque 2012). Desta feita os EUA, sabendo das
potencialidades da China, e do perigo que representa a sua aliança com a Rússia, encontra
o bode expiatório na Ucrânia para desestabilizar, enfraquecer e desacreditar a Rússia
internacionalmente, enquanto quer atingir a China, isto como forma de manutenção da sua
hegemonia, ameaçada por esta última, originando um senário em que ʻʻ a guerra fria do
século xx entre o Kremlin e a Casa Branca ameaça voltar no século XXI, dessa vez entre o
antigo vencedor, os EUA, e a nova potência em ascensão, a China ʼʼ (Liy & Mars, 2020).
Sendo a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, um reflexo deste cenário, os países do sul
global, preferem não tomar partido, no nosso continente por exemplo:

Poucos países africanos condenaram oficialmente a guerra, ao contrário do ocidente, que


reagiu com veemência, sanções, pedidos de investigações sobre crimes de guerra e
ameaças de fazer parar a economia russa. Apenas 28 dos 54 estados do continente
africano aprovaram, na quarta-feira, uma resolução da Assembleia Geral da ONU que
condena a invasão e exige a retirada imediata das tropas russas, enquanto a Eritreia votou
contra 16 abstiveram-se, entre esses Angola e Moçambique. (Deutsche Welle [DW],
2022).
CONCLUSÃO

De caráter acadêmico, e com objetivos definidos como avaliativo, apesar de quebrar


algumas regras formais para a elaboração de uma recensão crítica, acadêmico-
cientificamente, revelou-se bastante interessante realizar a recensão crítica a este artigo de
Boaventura Sousa Santos. Principalmente pelo seu caráter aglutinador de vários problemas
políticos contemporâneo em um só artigo.

O autor soube de uma forma desapaixonada pouco comum a imprensa ocidental, descrever
o atual cenário mundial, que exige maior preocupação com o futuro da humanidade. Pois,
diante de tantos problemas ainda presentes e fruto das ambições imperialistas, nos
esquecemos das tristes memórias e lições que o século XX nos deixou com as duas
grandes guerras e a chamada guerra fria e ainda assim perdemos mais tempo com os
mesmos problemas de guerras e persecuções desmedidadas de poder. Situação que
atrasa ainda mais o alcance das metas que a comunidade internacional ambiciosamente
traçou no campo da luta contra a fome, as alterações climáticas, a pobreza extrema e outros
problemas que afligem a humanidade.

É digno de se realçar o quanto foi frutífero refletir em torno a estes problemas políticos da
contemporaneidade mundial, tendo constituído este exercício, um aporte reflexivo bastante
significativo no que se refere a missão da academia de e para a resolução destes mesmos
problemas.
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