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Luanda
2023
ANTÓNIO GUSTAVO LUDI DIBANZILUA
Luanda
2023
INTRODUÇÃO
Em livros, colunas de jornais e revistas e demais artigos de opinião, feito por autores
ocidentais, é comum encontrar reproduções e reafirmações das políticas voltadas para o
domínio incessante do ocidente e a subjugação do resto do mundo aos seus ideais, com a
chamada ocidentalização. Propaga-se incessantemente a ideia de que, tem o mundo que
aprender e seguir o exemplo do ocidente. Como de costume em suas obras, Boaventura
Santos, reforça neste artigo, a tese de que, a dinâmica dos novos tempos exige uma postura
diferente do ocidente face ao seu relacionamento com o resto do mundo, e propõe que seja
a Europa a começar a aprender com o mundo.
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¹ https://www.boaventuradesousasantos.pt/pages/pt/homepage.php
²Ocidencentrica, é um termo que na nossa perspectiva se pode usar para designar a centralidade e
superioridade da visão ocidental sobre as outras visões do mundo.
1. O OCIDENTE VISTO PELO MUNDO
O artigo tem início com a menção à uma investigação cujo autor foi coordenador, intitulada
ALICE –Espelhos Estranhos, Lições Imprevistas: definindo para a Europa um novo modo
de partilhar as experiências do mundo, sobre o qual, Boaventura Santos lamenta o facto de
a Guerra na Ucrânia ter revelado que as propostas desta investigação pouco serviram aos
líderes europeus apesar da sua pertinência. Esta interessante pesquisa a qual o autor faz
referência, abarca quatro eixos temáticos.
Tendo o autor através das premissas abordadas nestes eixos temáticos, concluído que
depois de cinco séculos a procurar ensinar o mundo que em grande medida não fazia caso
a Europa, esta última ao em vez de propor isolamento progressivo, devia disponibilizar-se
a aprender com o mundo. Possibilitando o uso da experiência desta aprendizagem para
resolver alguns dos problemas que o mundo enfrenta. Bastante interessante o quarto e
último ponto dos principais eixos temáticos da pesquisa referenciada, pois este é um dos
pontos que mais divide a visão ocidental com muitos outros países do mundo, a cultura dos
povos muita das vezes é, em si só descrita como violadora dos direitos humanos. Na cultura
africana por exemplo, é mais fácil admitir o direito do homem a ter duas ou mais esposas,
do que a homossexualidade ou a transexualidade, porem no ocidente a visão é diferente e
a imposição desta, por parte do ocidente ao resto do mundo, se propaga como uma questão
de direitos humanos universais. Não muito distante deste antagonismo e imposição cultural
e de ideias, o autor apresenta o posicionamento e reação ocidental ou europeia ao conflito
que ``supostamente´´ opõe a Rússia à Ucraína. Com dados precisos sobre uma
investigação levada a cabo por um conhecido instituto da Universidade de Cambridge, que
através da harmonização de 30 inquéritos globais sobre atitudes em relação aos Estados
Unidos de américa (EUA), à China e à Rússia, realizado oito meses após a incursão militar
Russa na Ucrânia. Inquéritos estes que cobriram 137 países do mundo e 97% da população
mundial, tendo se obtido como resultado principal que, apenas 1,2 mil milhões de pessoas
no mundo têm uma opinião positiva sobre os EUA e uma atitude negativa sobre a China e
a Rússia, de forma inversa, ocorrendo com 6,3 mil milhões de pessoas no mundo, tem uma
opinião negativa dos EUA, e positiva em relação à China e Rússia. Hora várias outras
pesquisas confirmam esta realidade, José Pedro Teixeira Fernandes, num artigo intitulado
a nova guerra fria e a ascensão da China no médio oriente, afirma que, ʻʻ a crescente
influência chinesa no médio oriente tem implicações no poder global. ʼʼ (Fernandes,T., 2023,
p.4), reforça que a aposta da china por uma diplomacia que se apresenta como ʻʻ promotora
da paz, respeitadora da soberania de todos os estados do mundo e dos seus diferentes
sistemas sociais e políticos, ou seja não interferindo na vida interna de outros estados e
fazendo ponte entre inimigos, atrai mais a simpatia e a confiança dos estados ʼʼ (Fernandes,
T., 2023. p.3). Também Jorge de Almeida Fernandes afirma que, ʻʻ o poder viaja para o
oriente. O Ocidente já não é o centro de gravidade do mundo. Isto, que parecia dispare em
1990, não é sinónimo de declínio, ocaso ou catástrofe: é uma mudança de era. ʼʼ
(Fernandes, A., 2018, p.3).
Em relação a Rússia, em África por exemplo, o seu crescente domínio é uma questão
histórica relacionada com a luta pela independência, muitos países africanos, conseguiram
as suas independências de colonizadores ocidentais, através do apoio militar Russo, e esta
influência prevalece através de uma preferência no estabelecimento de relações em vários
domínios. O escritor e intelectual guineense Tierno Monenembo citado por António Cascais
num artigo sobre a relação da Rússia com a África, reforça que ʻʻ muitos estados africanos
nunca se libertarão do domínio da Rússia, especialmente dada a sua crescente
dependência das proezas militares de Moscovo. ʼʼ (Cascais, 2022, p.5).
Esta crescente influência da Rússia em África é uma questão preocupante para o ocidente
e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). No ano passado, durante a 68ª
sessão anual da Assembleia Parlamentar da OTAN, a ministra da defesa de Espanha
Margarita Robles, afirmou:
A Rússia está a invadir a Ucrânia, mas está a expandir-se em África e temos de estar
todos conscientes disso. Está a encontrar um campo de expansão perfeito. Qualquer
vazio deixado pela Europa ou pela NATO, está a ser perfeitamente aproveitado pela
Rússia. (Voz da América [VOA], 2022)
No primeiro ponto da sua fundamentação, o autor faz menção a posição marcada pela
retórica em lugar de ações concretas por parte da Europa face aos problemas que afetam
o sul global, tais como as consequências da pandemia da covid-19, os juros da dívida
externa, cuja boa parte desta é referente a países ocidentais, os impactos da crise climática,
a pobreza, a escassez de alimentos, a seca e os altos preços da energia.
Assistimos por exemplo durante a crise pandêmica que recentemente assolou o mundo,
(apesar de ainda pairarem alguns fantasmas da mesma), uma tímida intervenção ocidental,
houve como afirma o autor, maior apoio para o sul global vindo da China e da Rússia, cujas
patentes das vacinas produzidas nestes países estiveram disponíveis para uma ampla e
barata vacinação das populações dos países menos favorecidos. Por isto temos também
de concordar com o autor quanto ao seu ponto de vista em relação a este assunto, pois
assistimos durante a fase crítica da pandemia um ocidente capitalista, onde as suas
empresas estavam mais preocupadas em lucrar do que com questões humanitárias. Da
parte dos governos, para além de pouco fazerem, ajudados pela mídia, disseminavam um
clima de desconfiança face as ações da Rússia e a China, ao porem em pratica os seus
planos de ajuda humanitária concretas a nível global.
Estes dois países considerados emergentes tiveram um papel preponderante na luta contra
a covid-19, não só nos países do sul global como afirma o autor, como também podemos
acrescer que tanto os EUA como a Europa, também beneficiaram desta ajuda, são
exemplos a cidade de Nova York e a Itália. Num artigo publicado no Jornal Gazeta do Povo³,
a autora Helen Mendes, afirma que ʻʻ as ações de auxílio à pandemia de covid-19 que a
Rússia e a China têm enviado aos países ocidentais mais afetados é descrita por alguns
analistas como sendo mais estratégia de publicidade do que altruísmo ʼʼ (Mendes, 2020,
p.10).
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³Jornal Gazeta do Povo é um jornal brasileiro, sediado no estado do paraná, em Curitiba, o periódico circula
semanalmente no formato impresso e as notícias diária se pode acessar de forma online através do link:
www.gazetadopovo.com.br
No entanto não restam dúvidas que o recente momento pandêmico antecessor a chamada
invasão Russa da Ucrânia, marcada por esta ajuda da Rússia e da China ao sul global,
para supera-la, tal como ressalta o autor, constitui um elemento de peso no atual
posicionamento dos países do sul quanto ao desejo do ocidente em tornar a Rússia num «
estado pária internacional»⁴. Apesar de todos os países estarem de acordo com a
inviolabilidade territorial consagrado na Carta das Nações Unidas no ponto 4 do seu artigo
artº.2 que diz que ʻʻ todos os membros deverão evitar em suas relações internacionais a
ameaça ou o uso da força contra a integridade territorial ou a independência política de
qualquer estado, ou qualquer outra ação incompatível com os propósitos das Nações
Unidas ʼʼ (ONU, 1945, p.6). Não obstante isto, muitos dos estados, em referência estados
africanos, preferem tomar uma posição neutra, nesta guerra que realmente a Rússia não
trava só com a Ucrânia, mas com o ocidente, repetindo-se desta forma um cenário parecido
ao da guerra fria em que os países do sul preferiram criar um bloco dos não alinhados.
Frank Gardner, repórter de segurança da BBC News escreveu:
Depois que a Rússia invadiu a Ucrânia em 24 de fevereiro, a ONU realizou uma votação
de emergência -141 nações dos 193 estados membros da ONU votaram uma semana
depois para condenar a atitude. Mas vários países importantes optaram por se abster,
incluindo China, índia e África do Sul. Portanto, seria ilusório para os lideres dos EUA
e da Europa acreditarem que o mundo inteiro compartilha da visão da OTAN – de que
a Rússia é inteiramente culpada por esta guerra catastrófica – porque o resto do mundo
não pensa assim. (Gardner, 2022)
Porem se pode acrescer outras razões que motivam esta opção por não condenar a Rússia,
principalmente pelos países africanos, tais como a fome no continente, na medida em que
a Rússia representa um grande exportador mundial de cereais e fertilizantes para a
agricultura, e com o atual cenário relativo a fome no continente, não seria prudente por
parte dos governos, que se encontram na posição dependente dos cereais e fertilizantes
da Rússia, uma condenação direta as ações desta última. Também podemos acrescer o
fator instabilidade no continente, onde os regimes instalados, precisam de armas para a
manutenção do poder. De acordo com uma análise de 2020 do instituto internacional de
pesquisa da paz (SIPRI) sigla em inglês, entre 2016 e 2020, cerca de 30% de todas as
armas exportadas para países da África subsaariana vieram da Rússia (Cascais, 2022).
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⁴ Estado Pária internacional é aquele estado que a sociedade internacional repele ou exclui, alguns expertos
em relações internacionais, o definem como um estado cujas condutas não seguem as normas internacionais
de comportamento definidas pela comunidade internacional.
1.2 Problema nosso é problema do mundo
No segundo ponto do autor para justificar a sua tese de que o ocidente está mais isolado
do que nunca, faz menção a atual falta de credibilidade e autoridade para impor regras
unilaterais que devem ser consideradas por todos como de respeito a «ordem internacional
baseada em regras». Também corroboramos neste sentido, num momento em que hoje
mais do que nunca, começam a surgir em todas as direções do sul global, vozes que
apresentam moções de protesto por esta postura que já dura a séculos. Para além do
ministro dos negócios estrangeiros indiano Subramaniam Jaishankar, o qual o autor faz
referência, que também é autor da frase que escolhi como título para comentar este ponto,
cuja posição de que «a Europa tem de deixar de pensar que os problemas do mundo são
os problemas da Europa e começar a pensar que os problemas do mundo não são os
problemas da Europa», é compartilhada por muitos outros líderes mundiais não ocidentais.
Recentemente na sua visita à China, o presidente Brasileiro Luís Inácio Lula da Silva, teceu
grandes críticas ao sistema económico e financeiro internacional dominado pelo ocidente,
marcando uma posição firme quanto a pretensão de mudar o quadro, o presidente brasileiro
insistiu no seu discurso que ʻʻ é inadmissível que a irresponsabilidade e a ganancia de uma
pequena minoria coloquem em risco a sobrevivência do planeta e de toda a humanidade ʼʼ.
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⁴Jornal South China Morning Post é um renomado jornal de lingua inglesa da cidade de Hong Kong criado em
1903, actualmente o jornal que é propriedade da empresa Alibaba Group tem uma tiragem diária de 104 000
exemplares.
organizada pelos Estados Unidos, Costa Rica, Países Baixos, Coreia do Sul e Zâmbia em
formato online, para além de afirmar que «a política externa dos estados unidos se está
convertendo em uma arma de destruição em massa», expressou:
O que os EUA podem nos ensinar sobre democracia e eleições, um pais que iniciou
tantos golpes de Estado na África e outras partes do mundo, assassinou tantos lideres
nossos e ajudou a manipular as eleições em muitos países? Suas próprias eleições
estão sendo questionadas. (SputniknewsBrasil, 2023b)
A falta de credibilidade do ocidente a qual o autor referência, é hoje muito mais expressada
pelos líderes do sul global, no meu entender, começa-se a desenhar a nível internacional,
a ideia de que é possível o desenvolvimento sem o ocidente. No final do século XX e
princípio do XXI, era quase impossível ouvir-se críticas públicas e diretas ao ocidente por
parte dos líderes do sul global, apenas acontecia em ciclos fechados. Porem hoje é
frequente, o expressar da insatisfação das políticas ocidentais por parte dos líderes do sul
global, se pode depreender que, a existência de uma alternativa na China e na Rússia, com
vista ao desenvolvimento sem depender do ocidente, começa a tornar-se cada vez real, e
o alastramento do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), o banco das economias
emergente, BRICS⁵, como alternativa as Instituições de Bretton Woods⁶ é um exemplo
disto.
Neste segundo ponto da sustentação da sua posição, o autor termina fazendo menção ao
silencio ocidental, com relação a sabotagem dos gasodutos Nord Stream. Como refere o
autor, estas rupturas nos gasodutos localizados no fundo do mar báltico, ocorridas a 26 de
setembro de 2022, desencadearam alertas de perigo público e sérios danos ambientais,
para além das questões de segurança energética envolvendo não só o mais industrializado
país da Europa que é a Alemanha, como também outros países nórdicos. Reforçando assim
a ideia que o silencio, quando os atos bárbaros são cometidos por um dos seus, é um
costume ocidental. Noticiou-se o possível envolvimento ucraniano ou norte americano nesta
sabotagem, e a cautela logo imperou nos discursos dos líderes europeus, assim como
aconteceu com o míssil ucraniano que atingiu solo polaco.
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⁵ BRICS - é um bloco de desenvolvimento económico composto por países considerados emergentes, fundado
em 2009 pelo Brasil, Rússia, Índia, e China, posteriormente se incorporou a África do Sul.
⁶ Instituições de Breton Woods- são instituições de ordem económica e monetária criadas na conferência de
Breton Woods em 1944 nos EUA, impulsionada pelo presidente Norte Americano Donald Rosevelt, fazem parte
o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Grupo Banco Mundial.
Primeiramente quando foi atribuído o ataque ao lado Russo, todo ocidente afirmava que os
responsáveis têm de pagar pela atrocidade, a própria Ucrânia qualificou como «teoria da
conspiração» e parte da «propaganda russa», quando os russos afirmaram que o míssil
teve origem em base militar ucraniana. Logo após confirmar-se este último facto, o ocidente
minimizo-os. Na altura, o Secretário Geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte
(OTAN), Jens Stoltenberg declarou que ʻʻ uma análise preliminar mostrou que os destroços
filmados no local são parte de um míssil da defesa aérea ucraniana. Mas, no entanto, a
OTAN não culpa a Ucrânia pelo ataque, pois o país tem direito a defender-seʼʼ (British
Broadcasting Corporation [BBC], 2022).
O autor soube de uma forma desapaixonada pouco comum a imprensa ocidental, descrever
o atual cenário mundial, que exige maior preocupação com o futuro da humanidade. Pois,
diante de tantos problemas ainda presentes e fruto das ambições imperialistas, nos
esquecemos das tristes memórias e lições que o século XX nos deixou com as duas
grandes guerras e a chamada guerra fria e ainda assim perdemos mais tempo com os
mesmos problemas de guerras e persecuções desmedidadas de poder. Situação que
atrasa ainda mais o alcance das metas que a comunidade internacional ambiciosamente
traçou no campo da luta contra a fome, as alterações climáticas, a pobreza extrema e outros
problemas que afligem a humanidade.
É digno de se realçar o quanto foi frutífero refletir em torno a estes problemas políticos da
contemporaneidade mundial, tendo constituído este exercício, um aporte reflexivo bastante
significativo no que se refere a missão da academia de e para a resolução destes mesmos
problemas.
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O romance com o ocidente acabou, diz especialista de Hong Kong (n.d).Sputnik News
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