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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

Instituto de Filosofia e Ciências Humanas

QUESTÃO DA DEFINIÇÃO

1 INTRODUÇÃO

"A tarefa de definir, fundamental na compreensão do significado das palavras e


na construção do conhecimento, é um desafio que tem intrigado filósofos e pensadores
ao longo da história" (Aristóteles, "Metafísica", Livro VII e VIII.). Neste estudo,
embarcaremos em uma jornada pela complexa questão da definição no contexto da
filosofia e da linguagem. Neste contexto, é imprescindível adentrar profundamente na
compreensão dos termos-chave associados a essa prática milenar: definiendum e
definiens.

O definiendum é o termo ou conceito que está sob escrutínio e almeja ser definido.
É a pedra angular, o ponto de partida, a gênese da clareza e da precisão do pensamento.
O definiendum estabelece a base para a compreensão de um determinado conceito e é a
estrutura sobre a qual o edifício do conhecimento é erigido.

O definiens, por sua vez, é a parte intrincada e meticulosa da definição que


desvenda os elementos que esclarecem e delimitam o definiendum. O definiens é o
intérprete que desempenha o papel de explicar e definir o termo em questão,
estabelecendo os critérios e características que o tornam distintivo.

A metodologia deste artigo se fundamenta em uma pesquisa bibliográfica


abrangente, uma vez que nosso objetivo é mapear o vasto território de pensamento
filosófico e linguístico sobre a definição. Nosso estudo será dividido em várias partes de
pesquisa, cada uma dedicada a explorar um aspecto específico da definição, desde suas
diversas espécies até as técnicas de definição. Esta abordagem permitirá uma análise
PARÁ – PA
2023
aprofundada das diferentes maneiras pelas quais os filósofos abordam a tarefa complexa
de definir conceitos e como essas definições desempenham um papel fundamental na
filosofia da linguagem e no pensamento conceitual.

2 ESPÉCIES DE DEFINIÇÃO

2.1 Definição Estipulativa

A Definição Estipulativa, que permite que os comunicadores estipulem


significados específicos de forma deliberada, tem implicações filosóficas profundas. Ela
desafia o relativismo linguístico - a ideia de que o significado das palavras e conceitos é
moldado pelo contexto cultural, social e histórico em que são usados.

No entanto, a imposição deliberada de significado também pode ser vista como


uma confirmação do relativismo, uma vez que reconhece que a linguagem pode ser
manipulada de acordo com necessidades específicas. Isso sugere que, em certos
contextos, é possível impor um significado específico a um termo, eliminando a
relatividade linguística.

Na filosofia, a Definição Estipulativa é frequentemente utilizada para esclarecer


termos e conceitos complexos. Por exemplo, na ética aristotélica, Aristóteles estipulou
que o “bem” é o que leva à realização da excelência moral ou virtude, conhecida como
“eudaimonia”. Essa definição estipulativa é fundamental para a ética aristotélica, pois
estabelece uma base para avaliar a moralidade das ações. (Aristóteles. Ética a Nicômaco.
1973).

Outro exemplo é a filosofia analítica, na qual os filósofos frequentemente


estipulam definições precisas para termos filosóficos complexos. Por exemplo, na
filosofia da mente, os filósofos podem estipular definições precisas para termos como
“consciência” ou “intencionalidade” a fim de conduzir discussões e argumentos mais
claros. Portanto, embora a Definição Estipulativa possa parecer simples à primeira vista,
ela tem implicações profundas para nossa compreensão da linguagem e da comunicação.
2.2 Definição Lexicográfica

O problema da verdade se dedica a abordar como determinamos se uma afirmação


é verdadeira ou falsa. No contexto da Definição Lexicográfica, as implicações filosóficas
estão enraizadas na crença de que o significado de uma palavra é determinado pela forma
como é utilizada em situações reais. Isso se relaciona diretamente com a teoria pragmática
da verdade.

Segundo essa teoria, a verdade de uma afirmação depende do contexto e da função


da linguagem. A Definição Lexicográfica, ao basear-se no uso comum da palavra, alinha-
se com a ideia de que a verdade está enraizada na prática e no uso da linguagem. Em
outras palavras, algo é considerado verdadeiro se estiver em conformidade com a maneira
como as palavras são normalmente usadas. Isso significa que a verdade, de acordo com a
teoria pragmática, não é uma entidade absoluta, mas sim uma construção que depende do
contexto e do uso da linguagem.

Conforme mencionado por Copi, um autor renomado no campo da lógica, a


definição lexicográfica geralmente se baseia em dicionários que estabelecem o uso
corrente das palavras. Copi esclarece que "Sempre que a finalidade da definição é
eliminar a ambigüidade ou ampliar o vocabulário da pessoa para quem ela é construída,
então, se o termo definido não é novo, pois já tem um uso estabelecido, a definição será
lexicográfica e não estipulativa." Essa referência aos dicionários é crucial, uma vez que
essas obras são fontes confiáveis que compilam a linguagem conforme é utilizada em
diversas situações. (Copi, Irving M. "Introdução à Lógica", 1981, p. 115). No entanto, é
importante ressaltar que as definições lexicográficas possuem limitações em contextos
mais específicos, como aqueles encontrados em textos acadêmicos ou científicos. Nessas
situações, onde a precisão e a clareza são cruciais, definições mais específicas, como as
estipulativas ou teóricas, podem ser preferíveis

2.3 Definição Aclaradora

A Definição Aclaradora é uma técnica fundamental na construção do


entendimento e da comunicação. Ela visa esclarecer o significado de um termo que possa
ser complexo, ambíguo ou sujeito a múltiplas interpretações.
Guétmanova, em sua obra “Lógica,” descreve essa abordagem como a tentativa
de fornecer uma explicação mais minuciosa de um termo já conhecido. É uma técnica
valiosa para eliminar ambiguidades e garantir que todos os envolvidos na comunicação
compartilhem um entendimento comum. (Guétmanova, Alexandra. Lógica. Editorial
Progreso, 1989).
Sua contribuição sobre o livro "Introdução à Lógica" de Copi é valiosa. É
importante destacar que Copi, em seu livro "Introdução à Lógica," enfatiza que o principal
propósito da Definição Aclaradora é esclarecer o significado de uma palavra, muitas
vezes recorrendo a sinônimos ou expressões mais simples. Copi define as Definições
Aclaradoras como aquelas que buscam reduzir a vagueza de um termo que é estabelecido,
embora vago, e que transcende o uso corrente para tomar decisões sobre casos limítrofes.
Ele ressalta que, ao criar definições aclaradoras, o autor não tem a liberdade de atribuir
qualquer significado, mas deve permanecer fiel ao uso estabelecido até onde for possível.
A vagueza do definiendum pode ser reduzida, mas a medida exata desse esforço envolve,
em parte, a estipulação, embora não seja uma estipulação pura. Isso é particularmente
evidente em contextos legais, nos quais as definições aclaradoras frequentemente buscam
esclarecer termos jurídicos, levando em consideração as supostas intenções dos
legisladores e o interesse público. Em relação às definições aclaradoras, a avaliação se
baseia mais na conveniência ou inconveniência do que nos critérios tradicionais de
verdade ou falsidade (Copi, Irving M. "Introdução à Lógica," 1981, p. 117).
Quando se consideram as implicações filosóficas da Definição Aclaradora, é
possível perceber uma conexão intrínseca com o problema da ambiguidade na linguagem.
A ambiguidade ocorre quando um termo pode ter múltiplos significados ou interpretações
em um dado contexto. A Definição Aclaradora, ao esclarecer e detalhar o significado de
um termo, ajuda a mitigar esse problema. Ela busca reduzir a ambiguidade e fornecer uma
interpretação precisa do termo em uma situação específica.

2.4 Definição Teórica

A definição teórica, como indicada por Nérici em sua obra "Introdução à Lógica,"
desempenha um papel fundamental na lógica e na filosofia. Ela é uma abordagem que se
concentra em estabelecer conceitos com precisão e clareza em um contexto teórico.
No âmbito da lógica, a definição teórica é essencial para evitar ambiguidades e
garantir que os termos usados em argumentos estejam claramente definidos. Isso é
particularmente crucial na lógica formal, onde a precisão é fundamental para a validade
dos argumentos. Quando termos são definidos teoricamente, eles se tornam fundamentos
sólidos sobre os quais a estrutura do raciocínio pode ser construída.

A definição teórica também tem implicações significativas na filosofia. Ela pode


ser usada para apoiar ou refutar teorias filosóficas. Por exemplo, se alguém define "bem"
como "o que promove a felicidade," isso pode ser usado para fundamentar uma teoria
ética consequencialista. Por outro lado, se alguém define "bem" como "o que está de
acordo com a natureza humana," isso pode ser usado para embasar uma teoria ética
deontológica.

A clareza na definição dos termos filosóficos é essencial para o debate e a


construção de argumentos sólidos. Sem uma definição teórica adequada, o diálogo
filosófico pode se perder em ambiguidades e mal-entendidos.

Portanto, essa abordagem de definição não apenas contribui para a precisão e a


validade de argumentos lógicos, mas também desempenha um papel fundamental na
filosofia, onde a clareza conceitual é essencial para o desenvolvimento e a avaliação de
teorias e argumentos.

2.5 Definição Persuasiva

A definição persuasiva, desempenha um papel crucial na construção de


argumentos e na retórica. A sua principal finalidade é influenciar a opinião do público-
alvo por meio da escolha cuidadosa de palavras e definições que evocam uma resposta
emocional ou psicológica. Guétmanova, Nérici e Sant’Anna abordaram a questão da
definição sob diferentes perspectivas, mas todas têm em comum a importância da clareza
e da precisão na comunicação.

No entanto, a definição persuasiva vai além da mera definição de termos; ela busca
conquistar a adesão do público. Nos textos acadêmicos, especialmente aqueles que
buscam persuadir o leitor de um ponto de vista específico, a definição persuasiva pode
ser aplicada de várias maneiras. Por exemplo, ao definir termos-chave em uma
dissertação, um autor pode optar por incluir nuances que acentuam os aspectos positivos
de sua argumentação ou, inversamente, destacar características negativas ao definir
termos associados a perspectivas concorrentes. Essa estratégia influencia sutilmente a
maneira como o leitor percebe os conceitos e, consequentemente, como avalia o
argumento apresentado.

2.6 Gênero e diferença

A referência a 'gênero e diferença' nos textos de Guétmanova, Nérici e Sant’Anna


abre espaço para uma discussão mais ampla sobre como os conceitos de gênero e
diferenciação podem afetar as definições. Essa abordagem pode ser feita sob várias
perspectivas, incluindo a filosofia, estudos de gênero e análises linguísticas. Conforme
Copi destaca em seu livro 'Introdução à Lógica', 'Existem certas regras tradicionalmente
estabelecidas para a definição por gênero e diferença' (Copi, 2023, p. 131). Sob uma
perspectiva filosófica, a relação entre gênero e diferença nas definições levanta questões
profundas sobre a natureza da linguagem e do pensamento. Pode-se discutir como a
linguagem é intrinsecamente influenciada por estruturas de poder e normas sociais, o que,
por sua vez, afeta as definições de conceitos relacionados ao gênero.

Nos estudos de gênero, a relação entre gênero e diferença é central. Pode-se


analisar como as definições de identidade de gênero e papéis de gênero são moldadas por
concepções tradicionais ou preconceitos de gênero. Como as definições de "feminino" e
"masculino" variam culturalmente e como essas variações podem refletir as
complexidades da identidade de gênero.

Em resumo, a relação entre gênero e diferença nas definições é um campo fértil


para discussões profundas que tocam questões filosóficas, sociais e linguísticas. Isso
envolve a compreensão de como as definições são moldadas pelas normas de gênero e
como as definições, por sua vez, influenciam a maneira como entendemos o mundo ao
nosso redor.

3 TÉCNICAS DE DEFINIÇÃO

3.1 Definição Denotativa


A definição denotativa, como enfatizada por Nérici, concentra-se na identificação
das características essenciais de um termo, destacando o núcleo do seu significado. Isso
implica uma abordagem que visa a precisão, a objetividade e a delimitação das
características fundamentais que um termo representa. (Nérici, Imídeo G. Introdução à
lógica. Nobel, 1976).

Primeiramente, a definição denotativa se relaciona com questões fundamentais da


filosofia da linguagem. Ela aborda a busca por um entendimento claro e universal das
palavras, buscando capturar a essência dos conceitos. Isso se liga a debates filosóficos
sobre a natureza da linguagem, a realidade dos conceitos e a possibilidade de
conhecimento objetivo.

Além disso, a definição denotativa também está ligada à filosofia da lógica. A


lógica é uma disciplina que se baseia na precisão da linguagem, e a definição denotativa
desempenha um papel crucial na garantia de que os termos usados em argumentos lógicos
tenham significados claros e inequívocos. Isso levanta questões sobre a natureza da
verdade e da validade dos argumentos, uma área importante na filosofia.

3.2 Definição Conotativa

A definição conotativa, como discutida por Sant'Anna, concentra-se nas


associações e implicações de um termo, reconhecendo a riqueza de significados que
podem variar de acordo com o contexto e a cultura. Isso tem implicações igualmente
filosóficas significativas.

Em um sentido filosófico, a definição conotativa nos leva a explorar a natureza


subjetiva da linguagem. Ela nos faz questionar como as pessoas atribuem significado a
palavras com base em suas experiências, perspectivas e contextos culturais. Isso levanta
questões sobre a relatividade da linguagem e do significado, uma área estudada na
filosofia da linguagem e na filosofia da cultura.. A definição conotativa nos leva a
considerar as nuances e as camadas de significado presentes nas palavras. Isso é relevante
para a filosofia hermenêutica, que lida com a interpretação de textos e a compreensão das
múltiplas interpretações que podem surgir de uma única palavra ou conceito.
4 CONCLUSÃO

A definição é um processo de atribuir significado a um termo ou conceito. Na


filosofia, a definição é uma ferramenta fundamental para a compreensão, a comunicação
e o raciocínio.

As diferentes espécies de definição desempenham papéis distintos na


comunicação. Exploramos as diversas espécies de definição, cada uma com seu propósito
e alcance: A Definição Estipulativa, desafiando o relativismo linguístico, nos permite
estipular significados específicos de forma deliberada. Encontramos exemplos notáveis
na ética aristotélica e na filosofia analítica, onde ela lança luz sobre conceitos complexos.

A Definição Lexicográfica, alinhada à teoria pragmática da verdade, nos conduz


à compreensão de que a verdade está ancorada na prática e no uso da linguagem cotidiana.
Entretanto, percebemos suas limitações em contextos mais específicos, como textos
acadêmicos ou científicos. A Definição Aclaradora, essencial para eliminar ambiguidades
e promover um entendimento comum, desempenha um papel vital na interpretação de
termos técnicos e conceitos complexos.

A Definição Teórica, fundamental na lógica e na filosofia, cria alicerces sólidos


para argumentos válidos e contribui para o desenvolvimento e avaliação de teorias
filosóficas. A Definição Persuasiva, uma ferramenta retórica poderosa, busca influenciar
o público-alvo ao selecionar palavras e definições que evocam respostas emocionais ou
psicológicas. Utilizamos a persuasão de maneiras sutis ao definir termos-chave em
dissertações e argumentações acadêmicas.

E, por fim, ao abordar a referência a "gênero e diferença" nas definições, abrimos


espaço para discussões profundas sobre como esses conceitos podem afetar as próprias
definições, considerando perspectivas filosóficas, estudos de gênero e análises
linguísticas.

Em conclusão, as definições são ferramentas valiosas que podem ser usadas para
promover a compreensão e a comunicação. No entanto, é importante estar ciente de suas
implicações filosóficas para garantir que sejam usadas de forma eficaz.
5 REFERÊNCIAS

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução de Leonel Vallandro e Gerd Bornheim da


versão inglesa de W.D.Ross. 1ª ed. São Paulo: Abril Cultural, 1973. (Os Pensadores, v.2).
ARISTÓTELES. Metafísica, livros VII e VIII. Tradução Lucas Angioni. Clássicos da
filosofia, cadernos de tradução nº11. Editora Unicamp, 20051.
COPI, Irving. Introdução à lógica. 2ª ed. São Paulo: Ed. Mestre Jou, 1978.
GENSLER, Harry. Introdução à lógica. São Paulo: Ed. Paulus, 2016.
GUÉTMANOVA, Alexandra. Lógica. Moscou: Ed. Progresso, 1989.
NÉRICI, Imideo. Introdução à lógica. São Paulo: Ed. Nobel, 1971.
SANT’ANNA, Adonai. O que é uma definição. São Paulo: Ed. Manole, 2005.

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