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O CONCEITO DE NADA EM HEIDEGGER

Ingresson Oliveira de Jesus

Na cotidianidade a palavra nada é normalmente utilizada para indicar a


ausência de alguma coisa. Em termos filosóficos, o Nada pode ser entendido
como a não existência, ou seja, aquilo que de maneira alguma possa existir.
Segundo Heidegger (1979), o nada sempre foi rejeitado pela ciência,
abandonado como um elemento nadificante. Destarte, Heidegger elabora os
seguintes questionamentos: “E quando, assim, abandonamos o nada, não o
admitimos precisamente então? Mas podemos nós falar de que admitimos
algo, se nada admitimos?” (HEIDEGGER, 1979, p. 234). Dessa forma, o
filósofo alemão passa a investigar o conceito de Nada e qual seria a sua real
importância para o próprio campo científico. Ademais a ciência rejeita o nada,
porém, nas diversas elucubrações cientificas os pesquisadores apresentam o
nada em protagonismo com o ser. Destarte, Heidegger, em sua aula Que é
metafísica?(1929), procura saber o que acontece com este nada que é visto
com indiferença no campo da ciência.

Na referida obra, Heidegger faz uma estrutura para melhor discutir o


conceito de nada. A estrutura é dividida em três partes: 1) o desenvolvimento
de uma interrogação metafísica; 2) a elaboração da questão; 3) a resposta à
questão. Tentaremos expor algumas considerações sobre as elucubrações do
filósofo.

1. O DESENVOLVIMENTO DE UMA INTERROGAÇÃO METAFÍSICA

Nessa exposição, o filósofo nos informa uma característica que está


presente em qualquer pergunta de cunho metafísico. Essa característica é a
“totalidade”. O termo usado pelo Heidegger se refere ao saber metafísico,
como também, àquele que questiona. Destarte, o interrogador está
intrinsecamente ligado na questão. Diz Heidegger:

De um lado, toda questão metafísica abarca sempre a totalidade da


problemática metafísica. Ela é a própria totalidade. De outro, Toda
questão metafísica somente pode ser formulada de tal modo que
aquele que interroga, enquanto tal, esteja implicado na questão, isto
é, seja problematizado. (HEIDEGGER, 1979, p.233)

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Heidegger insere no âmbito de problemática a existência de quem faz a
questão, seja um professor, um estudante, um pesquisador, etc.
Logo, com o aporte da ciência, o homem tende a transformar o ente como
objeto de investigação. No entanto, “Justamente, sob o ponto de vista das
ciências, nenhum domínio possui hegemonia sobre o outro... nenhum modo de
tratamento dos objetos supera os outros.” (HEIDEGGER, 1979, p.233).
Contudo, para Heidegger, a ciência tem o seu valor para o conhecimento
existencial, pois possui características que promovem especulações científicas
levando o homem a uma aproximação sobre aquilo que é essencial em todas
as coisas. O filósofo cita algumas referências sobre o comportamento científico:
a referência de mundo que se caracteriza pela dominação e estudo do objeto
de pesquisa; a irrupção que se refere ao comportamento do homem em contato
com a totalidade do ente, isto é, a sua inserção na totalidade do ente; e o
comportamento do homem face o conhecimento científico.
Mais adiante, conforme apontado por Heidegger, a ciência sempre se
direciona ao ente como modo de dominação e apreensão de conteúdo. Porém,
nesse direcionamento, a ciência abandoa o elemento do nada o que é um erro,
pois este nada está vinculado ao ente e, por esse motivo, também deve ser
levado em consideração no comportamento científico. “A ciência nada quer
saber do nada. Mas não é menos certo também que, justamente, ali, onde ela
procura expressar sua própria essência, ela recorre ao nada. Aquilo que ela
rejeita, ela leva em consideração.” (HEIDEGGER, 1979, p.234). Assim, de
acordo com o filósofo alemão, o “nada” está integrado na existência científica e,
por esse motivo, deve ser considerado uma vez que a ciência tem como
objetivo dominar essa existência. O que acontece com o nada?

2. A ELABORAÇÃO DA QUESTÃO

Para elaborar uma questão sobre o nada, Heidegger observa que a


questão é privada em si mesma. Ainda assim, sua elaboração tem como
objetivo indicar a possibilidade de dar uma resposta que problematize o nada, e
assim encontra-lo. Não se pode tratar o nada como um ente, ele não pode ser
transformado em um objeto.

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Pelo fato de assim nos ficar vedado converter, de algum modo, o
nada em objeto, chegamos já ao fim com nossa interrogação pelo
nada — isto, pressuposto que nesta questão a ”lógica” seja a última
instância, que o entendimento seja o meio e o pensamento o caminho
para compreender originariamente o nada e para decidir seu possível
desvelamento. (HEIDEGGER, 1979, p.235).

Portanto, questionar o nada por princípios lógicos é um empreendimento


impossível visto que não pode ser colocado por vias de pensamento. Mais
adiante Heidegger afirma: “O nada é a plena negação da totalidade do ser”
(HEIDEGGER, 1979, p.236). Assim, através da negação da totalidade do ente,
surge o nada.
Para compreender a negação da totalidade do ente é preciso
compreender a totalidade. A totalidade do ente pode ser investigada através da
manifestação dos sentidos. Essa manifestação se dá na vida cotidiana através
dos sentimentos. Essas manifestações ocultam a presença do nada. Assim,
Heidegger muda a elaboração visto que a o nada está inserido na totalidade do
ser. Destarte, a revelação do nada deve ser concebida através sentimentos.
Qual sentimento?
Heidegger responde: “A angústia manifesta o nada” (HEIDEGGER,
1979, p.237). Essa manifestação causa a sensação de afastamento do ente
com a sua totalidade.

O fato de nós procurarmos muitas vezes, na estranheza da angústia,


romper o vazio silêncio com palavras sem nexo é apenas o
testemunho da presença do nada. Que a angústia revela o nada é
confirmado imediatamente pelo próprio homem quando a angústia se
afastou. Na posse da claridade do olhar, a lembrança nos leva a
dizer: Diante de que e por que nós nos angustiávamos era
“propriamente” — nada. Efetivamente: o nada — mesmo — enquanto
tal —estava aí. (HEIDEGGER, 1979, p.238).

Portanto, não há como definir o nada com palavras. No entanto,


podemos caracteriza-lo pelo estranhamento. De acordo com o filosofo, não se
pode dizer o nada, mas podemos sentir e padecer o nada na angústia do vazio.

3. A RESPOSTA À QUESTÃO

Nessa terceira e última parte da estrutura discursiva Heidegger


apresenta suas conclusões. É destacado que o nada não é um ente, mas se

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revela no ente como algo que foge de sua totalidade. Como também, não pode
ser tratado como um objeto. A angústia não é uma apreensão do nada, porém
se manifesta através dela. Heidegger reitera:

O nada não é nem um objeto, nem um ente. O nada não acontece


nem para si mesmo, nem ao lado do ente ao qual, por assim dizer,
aderiria. O nada é a possibilitação da revelação do ente, mas
pertence originariamente à essência mesma (do ser). No ser do ente
acontece o nadificar do nada. (HEIDEGGER, 1979, p.239).

Com isso, o filosofo responde o questionamento sobre o que é o nada.


Em resumo, conforme foi citado, o nada é a possibilitação da revelação do
ente. Quando o homem busca o nada, nada se encontra porque a investigação
está lançada no ente, ao se lançar no ente, o homem se afasta ainda mais do
nada. Ademais, “Quanto mais nos voltamos para o ente em nossas
ocupações, tanto menos nós o deixamos enquanto tal, e tanto mais nos
afastamos do nada.” (HEIDEGGER, 1976, p.239). O nada está imerso no ente,
em sua totalidade, se revela em sua nadificação e tem origem na sua própria
negação.

CONCLUSÃO

Tendo em vista o que foi abordado compreendemos que, através de sua


problematização, Heidegger estabelece uma nova postura relacionada ao
comportamento científico. Assim, nessa perspectiva filosófica acerca do
conceito, entende-se que o ente e o nada estão relacionados e ambos devem
ser levados em consideração nas pesquisas científicas. Fica claro que na
angústia tudo se torna efêmero e insignificante. O vazio existencial emerge no
homem através da inquietação, da ansiedade e do desespero. Portanto, é na
angústia que o homem percebe que sua vida se encontra vazia, e esse vazio é
que precisa ser preenchido para assim a vida ter um horizonte de sentidos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

HEIDEGGER, Martin. Conferencias e escritos filosóficos. Trad. Ernildo


Stein. São Paulo: Abril Cultural, 1979.

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