PRU2 - Mas Alla de Las Casas - 06revisto

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ALL IN THE FAMILY…:

COMUNIDADES RURAIS NO
TERRITÓRIO CENTRO ALENTEJANO
NA IDADE DO FERRO ANTIGA
(SÉC. VI-V A.C.)
Rui Mataloto1

más allá de las casas. Cáceres, 2018, pp. 171-208

1
Município de Redondo (Portugal).
Las cosas nunca son como a primera vista las figuramos, y así
ocurre que cuando empezamos a verlas de cerca…
(C. J. Cela, La familia de Pascual Duarte, 1942)

O
campo tem vindo, cremos, a mostrar‑se mais complexo, denso e diverso do
que era inicialmente esperado, impondo novos modelos de entendimento
da realidade social, tal como novas formas de ocupar o território, que nos
devem fazer reflectir sobre os modelos disponíveis para entendermos a sociedade e as
suas formas de agregação comunitária.

1. E NTRE ÁGUAS: O ALENTEJO CENTRAL, DAS MARGENS DO


GUADIANA ÀS AREIAS DO TEJO

A imensa diversidade paisagística que vulgarmente se engloba na designação


Alentejo é, muitas vezes, unificada numa visão de um plaino sem fim, abrasador e
pobre, onde a sombra é a que vem do céu. Todavia, esta é uma imagem excessiva-
mente simplificada onde não se enquadram os múltiplos cambiantes da paisagem
alentejana marcada, isso sim, por extensos corredores naturais onde a transitabi-
lidade flui com facilidade, através de bacias hidrográficas de pouca monta, que se
enchem em torrente nas invernias rigorosas (Fig. 1).
O Alentejo central é o território genericamente associável ao distrito de Évora,
sendo caracterizado por paisagens abertas, apenas levemente onduladas, de onde
emergem, a espaços largos, destacadas elevações e serranias que o balizam, a norte
a Serra d’Ossa e o anticlinal de Estremoz e a sul a Serra de Portel/Mendro. Estas
linhas de cumeada, que marcam largamente a paisagem, dispõem‑se em sentido
aproximadamente SE‑NO alinhando a paisagem e favorecendo a criação de grandes
eixos naturais de circulação. O território centro alentejano é uma região claramente
marcada pela centralidade do festo entre as três grandes bacias hidrográficas do sul
do território português, reforçando as suas características de grande corredor natural
entre o curso superior descendente do Guadiana e o tramo final do Tejo e do Sado.
Deste modo, cremos importante realçar que se trata de uma grande área de transição
e passagem, um extenso corredor natural de ligação entre a bacia do médio Guadiana
e o mar, que certamente entraria nos longos estuários até bem mais a montante que
os dias de hoje.
174 Rui Mataloto

0 12,5 25 50

Fig. 1. O território do Alentejo Central e principais sítios mencionados no texto: círculos vazios ‑ necrópoles;
círculos preenchidos ‑ ocupações rurais; quadrado ‑ povoado de altura. 1. Necrópole da Tera; 2. Necrópole
das Casas; 3. Alto do Castelinho da Serra; 4. Herdade da Sapatoa 1‑3; 5. Outeiro dos Castelinhos 2;
6. Espinhaço de Cão; 7. Malhada das Taliscas; 8. Monte do Roncão 11; 9. Espinhaço 9.

Os escassos dados paleoecológicos, baseados em limitadas análises polínicas, pare-


cem determinar que o território em questão teria conhecido ainda uma importante
cobertura vegetal, de montado denso, e importantes coberturas ripárias nos inícios
do Iº milénio a.C., a qual entra em rápida regressão durante a primeira metade do
primeiro milénio a.C. (Hernández, 2008). Na realidade, cremos que a Idade do
Ferro no Alentejo central se terá desenvolvido num contexto ambiental de montado
aberto que, a espaços, se deverá ter adensado em bosques mediterrâneos, em parti-
cular nas principais linhas de cumeadas. Esta transformação da paisagem, que a terá
aproximado à actual, será por certo o resultado do incremento da ocupação rural,
que se instala agora até nas terras menos produtivas e atraentes onde, justamente, as
iremos ver com maior facilidade, dada a escassez de ocupações posteriores.
O vale do Guadiana, que margina este território a nascente, encaixa‑se por entre rele-
vos constantes de magros xistos, logo após contorcer‑se para o seu tramo descendente,
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 175

assumindo‑se em toda a sua extensão no Alentejo central como um vale fechado, quente,
de solos magros, onde apenas a água flui, por vezes em fio por entre “pegões” pedrego-
sos ou em torrente imparável, que tudo arrasa, impedindo uma exploração sustentável
das suas margens, quase sempre rochosas, com excepção de pequenas áreas aplanadas
de maior fertilidade, quase sempre na foz de alguns afluentes menores. Estamos assim
perante uma realidade totalmente contrastante com o médio Guadiana, onde este se
espraia por vastas áreas aplanadas de fertilidade única. Aqui, a aspreza do solo magro
e xistoso, por vezes muito enrugado, apenas é compensada pela presença do rio e do
modo como condiciona a travessia, tornando impossível uma deslocação longitudinal.
À medida que nos afastamos deste, para poente, a realidade transforma‑se, em par-
ticular quando os solos de xisto perdem a sua ondulação, se amainam, dando passo às
planícies graníticas, de maior fertilidade, que se espraiam pelas margens da ribeira do
Álamo, em Reguengos de Monsaraz, o plaino sul da Serra d’Ossa, ou o grande festo
granítico das planuras de Évora, de relevo ligeiramente ondulado, que separa as águas
do Tejo, do Guadiana e do Sado. Para ocidente e noroeste, nos caminhos do litoral, os
férteis solos dos granitos darão passo às areias das charnecas, que antecedem principal-
mente a chegada ao Tejo, enquanto a foz do rio Sado se torna passível de atingir através
de uma paisagem que pouco se altera face ao cerne alentejano. Se, por um lado, as mar-
gens agrestes do Guadiana definem o limite oriental deste território, para poente são as
inóspitas terras de areias, quase inabitáveis, que marcam boa parte da margem esquerda
do longo estuário do Tejo. Temos, então, um território geograficamente diverso, onde
as limitações pedológicas e ambientais serão determinantes paras as sociedades rurais
que delas dependem, impondo ritmos e determinando vivências.

2. ALENTEJO SIDÉRICO, TERRITÓRIO RURAL: CAMPO, CASAS E


FAMÍLIA
Em geral, após o colapso de sociedades com estruturas de povoamento diferen-
ciado, como parece ter ocorrido durante o final da Idade do Bronze (Mataloto, 2012
e 2013), geram‑se sistemas de solidariedade baseados em estruturas familiares restri-
tas, originando sistemas de povoamento de menores dimensões, mais isonómicos, mas
fortemente ligados por laços de sangue (Démoule 1999: 130). A teoria do colapso
das sociedades (Tainter, 1988; Yoffee e Cowgill, 1988; Schwartz e Nichols, 2006) e
mais recentemente de “involução” ou “devolution” (Hansen, 2012; Aranda, 2015) tem
vindo a ganhar visibilidade, integrando momentos de “regressão” na complexidade
social, retornando a formas mais básicas de interação, geralmente de índole familiar
restrita. Na sequência do colapso da sociedade micénica, em torno a 1200 a.C., parece
176 Rui Mataloto

justamente ocorrer um processo deste género, tal como se tem vindo a propor (Morris,
2006: 74), tornando evidente que mutação das sociedades mediterrâneas, inclusiva-
mente de índole urbana, não é linear e unívoco, no sentido do suposto incremento
da complexidade social, sem que, todavia, como bem sublinha Norman Yoffee (2006:
223), o regresso a formas mais elementares de estruturação social deva ser sempre enten-
dido como uma “involução”, derivada do fracasso de formas socialmente mais comple-
xas. Efectivamente, o colapso e abandono de formas tendentes à centralização do poder
poderá resultar em processos de “regeneração” com grande dinamismo, diversidade
e riqueza (Sims, 2006) assentes em formas mais simples de organização social, tendo
por base a estrutura familiar ou, como vem sendo defendido principalmente na última
década, a Casa, no sentido que lhe é dado nas designadas House Societies (González,
2006; González e Ruiz‑Gálvez, 2016). Cremos que o processo histórico de meados do
Iº milénio a.C. no Guadiana médio, tal como vem sendo entendido (Rodríguez Díaz,
2009) constitui um dos mais taxativos exemplos destes processo de “regeneração”.
Segundo a leitura que fazemos para o território centro alentejano terá sido justa-
mente este o processo de “devolution” e “regeneração” que decorreu entre os sécs. VII e
VI a.C., ainda mais fortemente marcado, segundo cremos, por uma profunda transfor-
mação cultural derivada do contacto com as populações da faixa litoral atlântica, onde
a instalação de populações forâneas, peninsulares e não peninsulares, tinha posto em
marcha um assinalável processo de mutação e aceleração económica, social e cultural.
No Alentejo central, tal como parece ter acontecido em todo o interior sul do
território actualmente português, desenvolve‑se um intenso e sistemático processo de
ruralização do povoamento a partir de finais do séc. VII a.C. (Mataloto, 2004, 2007 e
2009; Calado et al., 2007; Figueiredo e Mataloto, 2017), após o abandono das grandes
ocupações de cumeada do final da Idade do Bronze, num movimento desencadeado,
provavelmente, ainda na centúria anterior. Na realidade, apesar das grandes ocupações
de cumeada terem aparentemente conhecido um processo de abandono generalizado
entre finais do séc. VIII a.C. e o século seguinte (Mataloto, 2012 e 2013), o intenso
povoamento rural sidérico ter‑se‑á desencadeado mais de um século depois, gerando
um vazio difícil de preencher, e que carece de uma leitura mais aturada em outro
local. Se, por um lado, não acreditamos em qualquer ermamento, por outro, é possí-
vel a deslocação, durante este processo, de um considerável contingente populacional
para o litoral, que sofre justamente nesta fase um florescimento sem paralelo (Arruda,
1999‑00). Todavia, estamos certos que esta possibilidade carece ainda de uma análise
aturada, ainda que a quase sistemática solução de continuidade dos sítios rurais e de
altura da Idade do Bronze, associada a uma usual fundação ex nihilo das pequenas ocu-
pações rurais da Idade do Ferro deixa margem suficiente para se equacionar a hipótese.
Ainda que tenham sido intervencionadas mais de três dezenas de pequenas instalações
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 177

rurais sidéricas nas últimas décadas em todo o Alentejo interior (Beirão, 1986; Maia
e Maia, 1996; Mataloto, 2004; Calado et al., 2007; Marques et al., 2013; Antunes et
al., 2017), apenas em Neves II, Castro Verde, foi possível reconhecer a sobreposição
directa de um pequeno núcleo habitacional do final da Idade do Bronze por uma
ocupação rural já da Idade do Ferro (Maia, 1988: 30). Contudo, com uma cronologia
preferencialmente do séc. V a.C., deve ter existido em Neves II um longo hiato entre
os dois momentos de ocupação. Os mais recentes dados, nomeadamente o exemplar
caso de Monte Bolor 3, com uma ocupação antiga dentro da Idade do Ferro, entre os
sécs. VII‑VI a.C. não deixam de assinalar como, apesar da presença de alguns elemen-
tos cerâmicos claramente devedores da tradição do final da Idade do Bronze, é com a
Idade do Ferro que arranca a ocupação do sítio, sem qualquer continuidade com uma
ocupação anterior (Antunes et al., 2017: 162 e ss.).
Ao longo do séc. VI a.C. ter‑se‑á estruturado, em todo o Alentejo central, uma densa
malha de pequenas instalações rurais que conhecerá o seu optimum provavelmente na
transição para o século seguinte, quando parece ocorrer uma verdadeira fome de terra,
que acabaria por determinar a exploração de todo o território disponível, incluindo
áreas agrícolas menos produtivas, num movimento sem precedentes e provavelmente
sem sucedâneos. A partir de meados do século V a.C., cremos, ter‑se‑ão desenrolado
novas dinâmicas populacionais, que irão determinar novas formas de ocupar e estru-
turar o território, desencadeando‑se um processo de concentração populacional em
povoados instalados em alcantilados rochosos, que acabará por acometer a maior
parte do povoamento rural em meados do século seguinte.
Em suma, o início da Idade do Ferro terá sido marcado em todo o Alentejo cen-
tral por um verdadeiro movimento de refundação do território, que se traduzirá na
criação de toda uma nova Paisagem Natural e Social, iminentemente rural.

2.1. Arquitecturas Sociais

No território centro alentejano é, sem dúvida, a realidade arquitectónica o material


cultural significante que melhor expressa o processo histórico e social ocorrido, pelo
focaremos a análise no modo como esta nos reflete a estruturação das comunidades
humanas deste período. A introdução de uma nova linguagem espacial, e de novos
métodos construtivos, resultante do contacto com as realidades arquitectónicas intro-
duzidas no litoral pelas comunidades mediterrâneas, conhecerá uma rápida dissemina-
ção, sendo desde cedo integradas nas instalações humanas em meio rural no território
alentejano. Para tal deve ter contribuído uma estrutura social em profunda transfor-
mação e segmentação, que rapidamente se apercebeu das vantagens apresentadas pelas
novas técnicas construtivas e de estruturação do espaço habitado; prova disso parece
178 Rui Mataloto

ser o facto de, ao invés da realidade arquitectónica, onde a novidade rapidamente eli-
minou a realidade anterior, a produção de cerâmica manual ou a metalurgia do bronze
se terem perpetuado por longo tempo. Por outro lado, e como dificilmente aceitamos
que a aquisição técnica e conceptual do espaço se possa fazer por mera observação ou
uso temporário, este pode ser mais um indicador da deslocação, em particular durante
os finais do séc. VIII a.C. e grande parte do séc. VII a.C., de importantes contingentes
populacionais para o litoral, em cujo refluxo, nos finais deste século, estaria a origem
do processo de intensificação da ocupação rural em moldes completamente novos.
Em termos técnico‑construtivos, o contacto com as presenças coloniais de âmbito
fenício resultará na disseminação, nos primeiros séculos da Idade do Ferro, de um
modo de construção substancialmente distinto ao conhecido pelas comunidades
locais. Ao invés das técnicas locais, com forte uso de materiais perecíveis, os novos
modos de construir faziam uso de uma técnica mista, com recurso a pedra e terra,
sendo o embasamento das paredes em pedra, usualmente xisto e escasso quartzo, de
maiores dimensões na base, sobre o qual se desenvolvia um muro em terra. Os ves-
tígios das coberturas são nulos, ainda que a detecção, sobre os pisos, de algum barro
cozido, associado a entramados de materiais perecíveis carbonizados, poderá estar a
remeter para as soluções utilizadas na cobertura.
Se é possível registar uma progressiva segmentação do espaço desde um momento
antigo da Idade do Ferro, patente principalmente em sítios de maiores dimensões e
complexidade, caso do Espinhaço de Cão (Mataloto, 2009) ou Monte do Roncão 11
(Marques et al., 2013: 45), por outro lado, em sítios menores e mais simples, como
os detectados na Herdade da Sapatoa (Mataloto, 2004), ainda que se registe alguma
divisão do espaço habitado, creio que os compartimentos seriam maioritariamente
plurifuncionais, seguindo uma tradição milenar, o que não obsta a que se identifi-
quem espaços diferenciados, como as prováveis áreas de armazenagem. A presença
de pátios interiores, bastante arreigados à tradição urbana de fundo mediterrâneo,
facilmente se integraria numa tradição local de utilizar como espaço de preparação e
confecção dos alimentos a área exterior fronteira ao edifício principal, que se man-
teve em alguns locais até aos dias de hoje.
O sítio do Espinhaço de Cão corporiza, com bastante clareza, todo o processo de
complexificação e segmentação do espaço habitado em meio rural ocorrida durante
o séc. VI a.C., tendo, segundo creio, igualmente subjacente um importante processo
social, no qual devemos atentar mais aprofundadamente. O conjunto arquitectónico
do Espinhaço de Cão implanta‑se sobre o topo e encosta sul de um destacado espo-
rão, sobranceiro ao Guadiana, apresentando bom controlo visual sobre o curso do
rio a jusante, integrando‑se numa área particularmente pobre em termos agrícolas,
mas com ampla viabilidade pecuária. O conjunto edificado apresenta‑se bastante
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 179

complexo, resultante de um intrincado faseamento interno, com desmantelamento


e aproveitamento parcial das estruturas mais antigas, de que resulta uma área total
edificada próxima dos 1.000 m2 (Fig. 2). O processo aditivo das construções parece
denunciar a consolidação e expansão desta comunidade durante pouco mais que um
século, ou seja, não mais de 3 ou 4 gerações.

A5 A2

ESPINAÇO DE CÃO
(Alentejo Central, Alandroal) 0 2 4m
Proposta de Faseamento

A27 A17
Fig. 2. Faseamento e imagens parcelares de Espinhaço de Cão (Alandroal).
180 Rui Mataloto

A intervenção apenas parcial do conjunto dificulta, de sobremaneira, um cabal


discernimento do faseamento interno, que condensámos, em exercício anterior
(Mataloto, 2009: 284) em dois grandes momentos de construção sequenciais, com
um dinamismo interno bastante intrincado, complexo de isolar sequencialmente de
modo integrado. O crescimento da área edificada ter‑se‑á processado de um modo
essencialmente orgânico, derivado de um longo percurso de adaptação do espaço
habitado às mutações das vontades do grupo, sem que seja óbvio um claro planea-
mento construtivo prévio, conducente à implementação de um programa arquitec-
tónico concreto. Neste sentido, não é sem alguma estranheza que verificámos que
o conjunto edificado cresceu subindo a encosta, procurando ganhar visibilidade
e destaque, quando num primeiro momento favoreceu a proximidade ao rio. O
processo de desenvolvimento do edificado é, segundo cremos, bastante coerente e
elucidativo do que julgamos ser a consolidação e destaque do grupo humano aqui
instalado.
O primeiro grande momento construtivo compõe‑se, essencialmente, de um
conjunto de compartimentos de planta rectangular edificados de modo faseado,
na meia encosta, estruturando aparentemente entre si um pátio interior, ainda que
não tenha sido possível delimitar a metade sul do mesmo. O pátio, e através dele os
compartimentos mais baixos na encosta, relacionava‑se com o exterior, para norte
e a um plano mais elevado, através de um estreito corredor, para o qual se abria um
grande compartimento alongado, que deverá ter conhecido uma função essencial-
mente habitacional. Adjacente a este, para norte, situava‑se um alpendre aberto a
nascente, no interior do qual se identificou uma estrutura de planta subcircular,
com cerca de 2,5 m de diâmetro, maciça, com uma cobertura, eventualmente em
cúpula, de barro cozido. Este tipo de estrutura apresenta múltiplos paralelos um
pouco por todo o sudoeste peninsular, sem que a sua função esteja ainda clarificada,
oscilando, segundo os diversos autores, entre a de forno (Sanabria Murillo, 2008)
e a de silo aéreo (Jiménez e Ortega Blanco, 2001: 231). A sua ocorrência no meio
rural centro alentejano é frequente, sendo, justamente por este facto, um equipa-
mento certamente importante no contexto doméstico rural, surgindo tanto em
conjuntos de menor entidade, como na Herdade da Sapatoa 1 e 3 (Mataloto, 2009:
291), quer noutros de maior relevância, nomeadamente o Espinhaço de Cão ou o
Monte do Roncão 11 (Marques et al., 2013: 45) (Fig. 3), reforçando este aspecto a
sua associação a cada conjunto habitacional no povoado de características urbanas
de El Palomar (Oliva de Mérida) (Jiménez e Ortega, 2001: 231). O já citado cor-
redor mediava a ligação entre o interior do espaço habitado e o exterior, assinalado
o seu estreitamento a preservação da privacidade do mundo doméstico, desembo-
cando no pátio, que articularia toda a dinâmica quotidiana.
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 181

Fig. 3. Monte do Roncão 11 (Reguengos de Monsaraz): planta e conjunto artefactual (Marques et al.,
2013, adapt.).
182 Rui Mataloto

Na segunda grande fase arquitectónica procede‑se à expansão da área edificada em


direcção ao topo da encosta, assim à remodelação e segmentação de alguns espaços
pré‑existentes justamente no limite norte do anterior conjunto, gerando comparti-
mentos de menor dimensão, e à construção de todo um novo grupo edificado estru-
turado em torno a um novo pátio exterior, de planta genericamente trapezoidal. No
novo conjunto edificado destaca‑se, em posição inicialmente dominante e isolada,
um grande compartimento, com cerca de 30 m2 e planta sensivelmente quadrada,
com um amplo vão orientado a nascente, aberto sobre o pátio, numa orientação em
torno aos 100º (Fig. 2, A2). Num primeiro momento o edifício apresentava um piso
de cor avermelhada, de onde se erguia não mais de 0,2 m, em posição relativamente
descentrada em relação ao eixo do edifício, uma pequena estrutura em adobe, de
planta quadrangular e cerca de 0,70 m de lado; esta apresentava ainda o topo reves-
tido de argila ruborescida, provável indício de actividades de combustão. Adossado
ao lado sul documentou‑se o que parecia serem os vestígios de um longo banco em
adobe, imediato à estrutura descrita.
Posteriormente esta realidade foi amortizada, alteando‑se o pavimento e edifican-
do‑se uma larga escadaria de acesso, com pelo menos três degraus, que veio refor-
çar a monumentalidade e destaque do edifício, ao qual se adossa agora, também,
novo espaço rectangular, que lhe devia estar directamente relacionado. Esta pequena
remodelação parece fazer parte de um processo mais amplo de agregação e adição
de espaços diferenciados em torno do novo pátio, recentrando o conjunto edificado
num plano mais elevado, assinalando, com clareza a criação de um novo espaço
identitário da comunidade aqui instalada. Na construção desta nova entidade arqui-
tectónica, com manifesto sentido visual e simbólico, um outro edifício de planta
rectangular, que delimita pelo lado sul o pátio superior, desempenha igualmente
uma posição de relevo. Com cerca de 28 m2, este espaço apresenta‑se pavimentado
com grandes lajes de xisto, sob as quais, no sentido da pendente, foi construída uma
caleira que permitia o escoamento das águas pluviais do pátio para o exterior da área
habitacional (Fig. 2, A5). Não foi possível registar a presença de quaisquer vãos mas,
a sua inserção no edificado deixa entender que deveriam abrir para o pátio. Este
compartimento assume características únicas no quadro da arquitectura rural centro
alentejana, quer pelo pavimento, quer pelo cuidado posto na presença da caleira,
tendo sido apresentado como um espaço de representação (Jiménez, 2009: 94), inse-
rido num complexo residencial aristocrático.
A norte do pátio superior, mediado por um espaço de corredor, ergueu‑se um
grande compartimento de planta rectangular, de cariz aparentemente habitacional,
dada a sua lareira central (Fig. 2, A 17). A presença deste revela, uma vez mais, não
apenas a individualização de grandes edifícios isolados, ainda que unidos entre si por
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 183

muros perimetrais, como também o seu posicionamento destacado, justamente na


mesma fase em que, na área inferior, alguns grandes espaços eram segmentados em
unidades menores, revelando uma densidade arquitectónica antes inexistente. Na
metade inferior do conjunto edificado, para além da segmentação aludida, poucas
alterações foram documentadas, resultantes as existentes em pequenas adaptações.
Interessante pelo que representa de segregação e segmentação dos dois espaços estru-
turados em torno dos pátios é a construção de uma escadaria de acesso ao corredor
já existente na fase inicial de ligação com a área superior.
No geral, esta ampliação do conjunto arquitectónico visou principalmente dotar
o conjunto de três grandes espaços diferenciados, isolados mas interligados entre
si, que irão recentrar o espaço habitado num ponto mais elevado da encosta. Estes
parecem cumprir funções distintas, habitacional, no ponto mais elevado, simbó-
lica/ritual em posição central, orientada a nascente, seguindo uma tradição habitual
nestes espaços do sudoeste peninsular (Jiménez, 2009: 93), seguindo tradições ante-
riores de espectro mais amplo, como é possível verificar no modesto santuário dos
Ratinhos (Berrocal e Silva, 2010: 426) como no grandioso complexo do Carambolo
(Escacena e Izquierdo, 2008).
Por outro lado, estas construções ditarão um progressivo encerramento do espaço
exterior mais a norte, determinando a gradual privatização e isolamento dos com-
partimentos diferenciados, de que derivaria uma maior segregação e controlo de
acesso aos mesmos. Este complexo arquitectónico estruturado em torno do pátio
superior do Espinhaço de Cão constituiria, em nosso entender, um elemento agre-
gador de um grupo diferenciado de indivíduos, unidos por fortes laços sociais e
identitários, regularmente renovados. Este processo de privatização dos espaços de
prestígio encontra‑se bastante melhor documentado, para o período em questão, no
Médio Guadiana, tal como bem observou J. Jiménez Ávila para sítios como Cancho
Roano (Jiménez, 2005), representando em seu entender o reforço da componente
áulica e aristocrática destes conjuntos residenciais.
O Espinhaço de Cão surge‑nos, então, como um complexo rural dotado de um
amplo conjunto arquitectónico, que se consolidou e expandiu ao longo de pouco
mais de um século de existência, que deverá traduzir a crescente complexificação
do tecido humano e social que o compôs. Se no início da ocupação facilmente se
pode entrever uma unidade de tipo familiar, em momentos mais tardios esta pode
ter conhecido uma dimensão plurifamiliar, ou familiar alargada, ganhando marcada
complexidade social, ganhando o pátio superior um perfil que nos parece claramente
supra‑local, como área de agregação e mediação do poder num contexto mais alar-
gado que, todavia, se deveria cingir aos pequenos sítios localizados na envolvente, ao
longo do rio, particularmente para jusante.
184 Rui Mataloto

Não é sem dificuldade que assumimos um perfil aristocrático e palacial para o


conjunto edificado do Espinhaço de Cão, como proposto acima, ainda que a seg-
mentação e segregação de espaço deixe entender estarmos perante um edifício com-
plexo, que deve traduzir a presença de uma comunidade que vai além da estrutura
familiar simples. Neste sentido, não é igualmente fácil entrever que neste meio rural,
particularmente agreste e pouco produtivo, se estabeleçam relações de dependência
de perfil clientelar, tal como entendido para outras regiões do sul peninsular de
matriz essencialmente urbana (Ruiz Rodríguez, 2000: 18).
Perante tal, parece‑nos bastante mais operativo o conceito de Casa das Societés à
Maison de Lévi‑Strauss, cuja dispersão pelo contexto mediterrâneo tem vindo a ser
defendida recentemente (González e Ruiz‑Gálvez, 2016). Na realidade, a plasticidade
do conceito1, e a sua associação a conjuntos edificados complexos parece‑nos bas-
tante apelativa para explicar a diversidade e emergência de contextos diferenciados
em meio rural. Efectivamente, o Alentejo central, e o vale do Guadiana em parti-
cular, apresenta um conjunto de factores intrínsecos que favorecem a emergência de
House Societies, nomeadamente a presença de áreas pouco produtivas do ponto de
vista agrícola, uma marcada ausência de poderes centralizados de corte estatal durante
um momento antigo da Idade do Ferro, associado ao que parece ser um intenso
crescimento populacional (González e Ruiz‑Gálvez, 2016: 391). Se, por um lado, o
Espinhaço de Cão parece materializar a entidade arquitectónica das House Societies,
patente na consolidação e expansão de um conjunto edificado marcadamente diferen-
ciado da maioria dos conjuntos rurais, com edifícios diferenciados, associáveis a fun-
ções não produtivas, de cariz simbólico e agregador, de nível supra‑local, por outro,
faltam‑nos traços identificadores claros destas sociedades, como elementos materiais
indicadores de poder e status ou, à falta de necrópoles associadas, que nos afirmem
um sistema de parentesco bilateral, cognático, assente na sua relação com o passado
ancestral. Todavia, é certo que alguns deles existiriam na região neste período, como
se pode depreender de algumas necrópoles mais a sul, em que as presenças femininas

1
O conceito de Casa não apenas apresenta grande plasticidade, como também enorme longevidade efectiva,
sendo clara a sua manutenção, com as características genéricas que aqui se utilizam, até ao final do séc. XX no
território alentejano onde a “pertença a uma Casa” era elemento diferenciador, e verdadeiramente identitário,
de muitos dos trabalhadores, nomeadamente os permanentes. Com o meu Pai compreendi a identificação com
a Casa onde trabalhou até aos seus últimos dias, evidenciando uma relação muito além da laboral mas por com-
pleto identitária, marcada desde os hábitos de trabalho à verdadeira integração e devoção para com os “Patrões”,
que ganhava contornos verdadeiramente familiares. Este foi igualmente um conceito operativo no estudo da
aristocracia do final do Antigo Regime, onde o conceito de Casa “entendida como um conjunto coerente de bens
simbólicos e materiais a cuja reprodução alargada estavam obrigados todos os que nela nasciam ou dela depen-
diam”, estendendo‑se a noção de “família”, então, a todos os criados e dependentes (Monteiro, 1998: 91). Deste
modo, e ao invés do assinalado por alguns autores, cremos, na esteira deste último, que o sistema de Casa pode
claramente coexistir no tempo e no espaço com entidades políticas estatais e hierarquizadas, como fica patente
neste último estudo.
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 185

3 cm

3 cm

Fig. 4. Asa de “braseiro” e cerâmica com grafitos fonéticos de Outeiro dos Castelinhos 2 (Gomes et al.,
2013, adapt.).

assumem posições de destaque (Figueiredo e Mataloto, 2017; Arruda et al., 2017),


ou da existência de “braseiros” tanto em contexto de necrópole, como em Fareleira 3
(Figueiredo e Mataloto, 2017) ou de ocupação rural, caso do Outeiro dos Castelinhos
2 (Gomes et al., 2013: 168) ou São Cucufate (Alarcão et al., 1990: 242). Em Outeiro
dos Castelinhos 2 registou‑se ainda a presença de grafitos fonéticos apostos sobre reci-
pientes de consumo individual, deixando claro o conhecimento da linguagem escrita
em meio rural, podendo, então, assumir‑se como mais um indício de diferenciação
social (Fig. 4). Mas, regressando ao Espinhaço de Cão, se efectivamente a ocupação
evoluiu para uma estrutura social de Casa, tal acabou por não vingar realmente, dada
a sua extinção na terceira ou quarta geração, não havendo propriamente tempo para
a consolidação do sistema. Todavia, tal facto não impede que em outras situações se
tenha desenvolvido realmente uma “Sociedade de Casa” no território alentejano, para
o que existem outros indícios dispersos, como ainda tentaremos assinalar.
Neste quadro, cremos que a família ou comunidade instalada no Espinhaço de
Cão teria sido capaz de gerar, ao longo de boa parte do séc. VI a.C., elementos de
diferenciação económica e simbólica que conduziram não apenas à consolidação e
expansão do conjunto edificado, e da realidade produtiva e social que lhe era ine-
rente, mas igualmente a agregação a si de um pequeno território e comunidade
rural ligada por laços de directos ou simbólicos. Assim, algures no final do séc. VI
a.C., quando o complexo arquitectónico do Espinhaço de Cão se encontra no seu
máximo expoente, esta Casa seria o elemento central de uma pequena comunidade
rural estruturada ao longo da margem do rio Guadiana, que integrava para além
dela outros sítios de menor entidade, implantados essencialmente para jusante, de
onde o seu conjunto edificado seria facilmente visível, assumindo uma verdadeira
função de coordenação produtiva, mas igualmente identitária e agregadora, patente
na dinâmica dos espaços de representação identificados em torno do pátio superior,
revelando‑nos, muito provavelmente uma “Sociedade de Casa”.
186 Rui Mataloto

Este sistema de organização e estruturação do povoamento rural assumiria,


então, um perfil hierárquico entre si, enquadrado num âmbito mais alargado,
ao longo do vale, numa organização heterárquica, assente em edifícios de maior
dimensão, parcialmente contemporâneos daquele, caso do Monte do Roncanito 4
ou Monte do Roncão 11 (Marques et al., 2013: 35 e 45), mais a sul, que organi-
zariam pequenos territórios rurais de modo hierarquizado. Assim, tal como de há
muito se vem assinalando (Crumley, 1995), os modelos heterárquicos, ou mesmo
o próprio “modelo celular” proposto para o território extremenho (Rodríguez
Díaz, 2009: 177), podem assumir contornos bastante distintos e hierarquizados
dentro de cada território.
Ao invés do Espinhaço de Cão, que parece não conseguir manter a estruturação
conseguida, sendo abandonado na viragem para o séc. V a.C., ou no seu início, em
outros casos tal não sucede, mantendo‑se até momentos mais tardios, caso do Monte
do Roncão 11 que, além de um conjunto arquitectónico complexo, apresenta igual-
mente sinais de consumo diferenciado, com a presença de cerâmica grega, nomea-
damente uma taça Cástulo (Marques et al., 2013: 45). Em simultâneo, e reforçando
este cariz dinâmico e diverso do povoamento rural do vale do Guadiana, emergem
de raiz conjuntos arquitectónicos rurais de corte diferenciado, caso da Malhada das
Taliscas, sem o processo de engrandecimento verificado em Espinhaço de Cão e apa-
rentemente em Monte do Roncão 11, ainda que com menos propriedade. Obvia-
mente que a par destes, em coordenação ou não com eles, continua uma diversa e
densa rede de instalações rurais de menor entidade, que se dispersam tanto no tempo
como ao longo do vale (Moinho da Cinza, Moinho Novo de Baixo, Casa da Moi-
nhola, Monte do Gato ou Espinhaço 9, de entre os escavados, mas que serão largas
dezenas mais, por entre os não intervencionados) (Fig. 5).
O conjunto arquitectónico da Malhada das Taliscas 4 apresenta característi-
cas substancialmente distintas dos anteriores, afigurando‑se claramente como um
sítio diferenciado no contexto rural centro alentejano, atendendo à sua cuidada
planimetria monofásica, desenvolvida algures entre os meados do séc. V a.C. e os
inícios da centúria seguinte, apresentando, então, um espectro cronológico curto
(Calado e Mataloto, 2008). A Malhada das Taliscas 4 implanta‑se numa ampla
rechã adjacente ao rio Guadiana, sendo o complexo arquitectónico composto por
dois edifícios, de planta ortogonal, e com o eixo maior no sentido S‑N, contabi-
lizando mais de uma centena de metros quadrados de área coberta (Fig. 6). Estes
implantam‑se numa área muito aplanada, ligeiramente inclinada para sul, encon-
trando‑se separados por uma dezena de metros, aparentando corresponder a um
plano pré‑estabelecido e resultar de um único momento de construção, contras-
tando claramente com os conjuntos rurais anteriores.
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 187

0 1m

LEYENDA
ALQUEVA - Bloco 14
Espinhaço 9 - EDIA Nº 95 272
Plano Final das Sondagens
2000

Fig. 5. Planta de Espinhaço 9 (Reguengos de Monsaraz) (Marques, et al., 2013, adapt.).

O edifício de maiores dimensões, construído no ponto mais elevado do local,


compõe‑se de dois blocos que se dispõem perpendicularmente, em “L”. O maior,
em posição dominante e larga fachada, abre para um amplo terreiro que se encon-
tra ladeado a poente por um renque alongado de compartimentos que o sepa-
ram do edifício mais a sul. Ainda que bastante degradado e apenas parcialmente
intervencionado, o edifício central parece corresponder, segundo propostas ante-
riores, a um modelo bem conhecido que foi designado recentemente de edifício
em “tridente”, dada a organização do espaço a partir de um amplo corredor lon-
gitudinal, a partir do qual se abrem três espaços alongados (Jiménez, 2009: 92;
188 Rui Mataloto

Mataloto, 2009: 288). O evidente cariz mediterrâneo deste edifício aproxima‑o,


apesar das óbvias diferenças de escala, de edifícios “aristocráticos” como Cancho
Roano (Celestino, 2001) ou La Mata (Rodríguez Díaz, 2004), devendo buscar‑se a
origem deste modelo arquitectónico na realidade próximo‑oriental, integrando‑se
nos edifícios de tipo III4, definido por Braemer (1982: 81).
A poente deste situa‑se um único edifício, de construção cuidada e planta rec-
tangular, de ampla porta aberta a nascente, pavimentado a lajes de xisto. Para este
espaço foram já propostos usos diversos, entre os relacionados com a armazenagem
ou estabulação (Mataloto, 2009: 288), ou com aspectos do sagrado, dada a orien-
tação do vão único (Jiménez, 2009: 93). Segundo este autor, em proposta que
acompanhamos, este seria um conjunto arquitectónico residencial de corte “aris-
tocrático”, na esteira dos processos sociais e políticos de concentração e represen-
tação identitária do poder, de claro perfil dinástico (Jiménez, 2009: 95), que nos
parece contrastar com a realidade local descrita acima, e típica do século anterior.

MALHADA DAS TALISCAS 4


(Alandroal, Alentejo Central)
Planta geral de estrururas / proposta de reconstruçao

0 4m

Fig. 6. Planta e vistas parcelares de Malhada das Taliscas 4 (Alandroal).


All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 189

A emergência de um conjunto edificado com estas características, resultante de um


plano arquitectónico prévio, complexo e grande dimensão poderá estar a indiciar‑nos a
entrada na região de modelos sociopolíticos novos, a partir do médio Guadiana, onde
os traços de perfil aristocrático associados a edifícios singulares assumem particular
relevo durante este séc. V a.C., rompendo‑se com o prévio modelo de “Sociedade de
Casa” que se vinha estruturando durante o século anterior. Todavia, nada obsta que
ambos modelos possam ter coexistido no território alentejano durante algum tempo,
vindo depois, na viragem para o séc. IV a.C., a sofrer uma mutação profunda.
De há vários anos vimos defendendo que, em determinadas áreas, talvez as menos
produtivas e mais afastadas dos eixos principais de circulação, possam ter‑se man-
tido, durante os sécs. VI‑V a.C. formas de organização sociopolíticas mais simples,
baseadas no parentesco e na estrutura familiar base, organizando‑se em pequenas
comunidades relativamente isonómicas e interligadas por laços familiares, como
poderia ser o caso da Herdade da Sapatoa, que no total poderia envolver várias deze-
nas de pessoas (Mataloto, 2004: 2008).
Na Herdade da Sapatoa identificou‑se uma pequena comunidade estruturada
ao longo da margem da Ribeira de Vale de Vasco, constituída por quatro pequenas
ocupações de cariz rural, distante entre si não mais de um quilómetro, ainda que por
vezes estejam a poucas centenas de metros. Os trabalhos arqueológicos incidiram,
até ao momento, em apenas dois destes sítios, que se encontram quase integralmente
escavados. Trabalhos de prospecção recentes permitiram identificar outra pequena
comunidade rural escassos quilómetros mais a montante.
Os resultados obtidos até ao momento permitem‑nos traçar um panorama basi-
camente semelhante para ambas instalações, que são genericamente contemporâ-
neas, ainda que apresentem um historial construtivo ligeiramente distinto. Creio,
então, que se deverá ter estruturado na Herdade da Sapatoa, algures entre os meados
do séc. VI a.C. e os inícios do século seguinte, uma pequena comunidade aldeã,
relativamente isonómica, eventualmente de base familiar e fortes conexões sociais,
dispersa ao longo das margens da ribeira de Vale de Vasco, desenvolvendo uma eco-
nomia agro‑pastoril. Cada unidade familiar ocupava um pequeno núcleo rural, pas-
sível de albergar uma família pouco extensa, sendo complexo, na minha perspectiva,
acomodar mais que uma dezena de pessoas por cada aglomerado.
O sítio 3 da Herdade da Sapatoa apresentou, como veremos, um processo arqui-
tectónico mais complexo e faseado que o identificado no sítio 1, levando a crer que
terá conhecido uma ocupação algo mais prolongada no tempo. Em termos arquitec-
tónicos, a construção de ambos os sítios seguiu soluções concordantes com as anota-
das na generalidade das instalações rurais sidéricas centro alentejanas, revelando uma
forte inspiração nos modelos de cariz mediterrâneo, quer do ponto de vista técnico,
190 Rui Mataloto

quer ao nível da organização do espaço edificado, onde pontuavam compartimentos


de planta quadrangular, dispostos em torno de um pátio.
No sítio 1 da Herdade da Sapatoa escavou‑se integralmente um conjunto arqui-
tectónico com cerca de uma centena de metros quadrados, que deveria ser origi-
nalmente maior, na medida em que se encontrava fortemente truncado no seu
desenvolvimento para sul e este. A intervenção permitiu, apesar da avançada afecta-
ção, isolar dez compartimentos destinados a cumprir diversas actividades de âmbito
doméstico, dos quais se destacavam os dois espaços de cariz eminentemente resi-
dencial, Amb. I e II, com cerca de 18/20 m2, virados a sul, que apresentavam um
pequeno anexo de cerca de 4/5m2 adossado do lado nascente, provavelmente desti-
nado a funções de armazenagem. Estes, de planta basicamente idêntica, seriam cla-
ramente os elementos estruturantes da ocupação, o espaço residencial por excelência,
correspondendo os restantes espaços de apoio aos mesmos, estruturados em torno de
um pequeno pátio interior, longe, portanto, dos complexos habitacionais descritos
acima. Ainda que tenha conhecido um momento prévio, o conjunto arquitectónico
deste sítio não conhece substanciais alterações até ao seu abandono.
O conjunto edificado da Herdade da Sapatoa 3, situado apenas 500m a jusante deste
último, ao invés do anterior, conheceu ao menos dois grandes momentos de constru-
ção/reconstrução (Fig. 7), tendo resultado um complexo edificado composto por dois
grandes blocos, distribuído por mais de dezena e meia de Ambientes, que compõem
um total de mais de 200m2 de área edificada disposto em torno de dois pátios exteriores
com o piso lajeado. Uma vez mais o conjunto edificado era dominando pela presença
de dois compartimentos de maiores dimensões abertos a um pátio, aos quais se adossava
um outro menor, com funções de armazenagem, exactamente como registado no sítio
anterior. Tal como aí, os restantes compartimentos dispunham‑se como áreas de apoio
à actividade habitacional e produtiva em torno do pátio exterior para o qual abriam.
O conjunto de um grande compartimento rectangular e uma área menor, com
características de espaço de armazenagem, documentados na Herdade da Sapatoa 1
e 3, deverá ter correspondido, à célula habitacional base, enquanto unidade espacial
mínima de um pequeno agregado familiar, na medida em que conjuga um espaço
multifuncional/residencial e um espaço de pequena armazenagem do quotidiano.
A sua presença evidencia a existência de modelos arquitectónicos aplicáveis a con-
juntos semelhantes, em resposta a necessidades idênticas. Poderão, igualmente, ser
lidos como o resultado do mesmo mestre construtor ou da mesma “escola” de cons-
trutores, desenvolvida neste espaço rural, na medida em que não apresenta, até ao
momento, um paralelo exacto nas restantes unidades habitacionais rurais conhecidas
no território centro alentejano, mais a nascente (Calado et al., 2007; Calado e Mata-
loto, 2008; Mataloto, 2009).
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 191

Herdade da Sapatoa 3 Herdade da Sapatoa 1


(Redondo, Alentejo Central) (Redondo, Alentejo Central)
Fase II Planta estruturas da Fase II

Célula habitacional base

Fase I

Amb. III e VI
Amb. I

Amb. III e II Amb. II


Heredade da Sapatoa 3 Heredade da Sapatoa 1

HSap3
HSap2
HSap1

Fig. 7. Planta dos conjuntos arquitectónicos de Herdade da Sapatoa 1 e 3 (Redondo), com o faseamento
deste último. Proposta de planta de célula habitacional base na Herdade da Sapatoa. Vista geral, a partir
da margem esquerda, do troço da Ribeira de Vale de Vasco em que se implanta a comunidade da Sapatoa.

A definição desta unidade familiar poderá indiciar estarmos na presença de con-


juntos bifamiliares, provavelmente interligados por laços de sangue (irmãos, filho
primogénito …, etc), ou estruturas familiares alargadas. Efectivamente, não deixa de
ser relevante que o compartimento principal, Ambiente I em Sapatoa 1 e Ambiente
III do sítio 3, congreguem sempre a maioria dos conjuntos cerâmicos de uso e
armazenagem, surgindo‑nos os outros, relativamente semelhantes, sempre vazios,
192 Rui Mataloto

deixando a entender que a uma certa igualdade na distribuição do espaço não corres-
pondia a mesma capacidade de controlo e acesso aos bens produzidos e guardados.
Este facto pode estar‑nos, de certo modo, a remeter‑nos para a velha parábola bíblica
do filho pródigo, descrita em Lucas 15:11‑32, onde o filho mais velho fica na casa
do pai, dispondo dos mesmos bens que este, mas trabalhando a seu lado, enquanto
o filho mais novo parte em busca da sua subsistência. Esperemos que na Herdade da
Sapatoa possa ter terminado de modo distinto do da parábola...
Deste modo, a semelhança registada a nível arquitectónico entre os dois sítios da
Herdade da Sapatoa poderá indiciar uma verdadeira norma de comportamento social,
com reflexo na arquitectura destes conjuntos rurais, respondendo a determinações do
grupo, dando igualmente a entender estarmos na presença de uma comunidade rela-
tivamente isonómica, estruturada neste troço da Ribeira de Vale de Vasco, marcada
por uma vincada ligação familiar. Inclusivamente a ligeira décalage cronológica entre
ambos os sítios, com o sítio 1 a ser ligeiramente mais antigo e sem qualquer processo
de remodelação arquitectónica, poderá reforçar a ideia de uma comunidade fundada
por um agregado familiar que se expande progressivamente gerando novos agrega-
dos semelhantes, atomizando as presenças, num movimento contrário ao processo de
agregação e expansão subjacente ao modelo de “House Society” proposto para o vale
do Guadiana, não mais que três dezenas de quilómetros para nascente. O relativo iso-
lamento destas comunidades rurais agregadas em áreas muito concretas dos vales de
pequenas ribeiras, dependentes de pequenas várzeas e solos pouco produtivos, deixa
margem para aceitação de um certo grau de autarcia, que ocupam o agro alentejano
durante o séc. VI a.C., a par de soluções de estruturação sociopolítica heterárquica/
hierarquizada com base na Casa ou mesmo com novas instalações rurais devedoras de
modelos de corte mais aristocrático‑dinástico, deixando entender a enorme variabili-
dade das formas de entrosamento sociopolítico passíveis de se reconhecerem em meio
rural, particularmente numa região e num período em que a capacidade de agrega-
ção comunitária nunca conseguiu gerar núcleos de fundo urbano com a capacidade
de coordenarem e controlarem um território alargado fortemente ocupado por uma
enorme diversidade de ocupações rurais, de cariz bastante variado.

3. PARA ALÉM DA VIDA: A NECRÓPOLE DA TERA E A SOCIEDADE RURAL


Ao invés do que vem sucedendo no território baixo alentejano, na envolvente
alargada de Beja, no Alentejo central os espaços sepulcrais associáveis aos sécs. VI‑V
a.C. são manifestamente escassos, e nunca associados a contextos habitacionais esca-
vados. Na realidade, apenas conhecemos para esta cronologia uma necrópole que
importa trazer aqui à colação.
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 193

Necrópole da Tera
Planta de enterramentos
0 1m

Fig. 8. Vista e planta geral de enterramentos da necrópole da Tera. Menires da Tera (Calado, 2004).
194 Rui Mataloto

A necrópole da Tera situa‑se nas proximidades de Pavia, implantando‑se numa


zona aplanada, bastante indiferenciada, com um relevo apenas levemente ondu-
lado, no qual se recorta o vale profundo da Ribeira da Tera, escassos quilómetros a
sul. O caminho que atravessa a necrópole parece integrar‑se numa antiga e impor-
tante via de transitabilidade natural, que ligava o interior alentejano às margens
dos Tejo. Esta caracteriza‑se pela presença de uma grande estrutura tumular, com-
posta por pedras pequenas e médias, sobre a qual estavam amontoados os menires
no momento do seu achamento (Fig. 8). Acreditamos que o cairn pétreo delimi-
tado até ao momento na necrópole da Tera deverá corresponder a cerca de metade
do espaço funerário, que se prolongaria para nascente. Não deverá ter apresentado
uma diacronia muito longa, eventualmente um século, compondo‑se, então, de
não mais que três ou quatro gerações.
Durante os trabalhos de escavação não se obtiveram dados concludentes sobre
a associação dos menires à necrópole. Contudo, cremos que alguns dados parecem
apontar para que os mesmos tenham sido erigidos durante a formação da necró-
pole. Um dos menires, relativamente pequeno, tinha ainda a base in situ, apesar
de estar partido e tombado, estando localizado na margem da área tumular, e não
integrado nela. O facto de não apresentar qualquer estrutura de apoio, isto é,
um alvéolo estruturado de implantação, deixa margem para que o mesmo tenha
acontecido com os restantes, dificultando a identificação de outras estruturas de
implantação dos mesmos. O desmonte desta carapaça tumular permitiu a iden-
tificação de diversas estruturas subjacentes, que pareciam enquadrar algumas das
deposições funerárias, ou mesmo nenhuma. Estas eram essencialmente de dois
tipos: de planta rectangular ou cistas.
O ritual funerário utilizado foi a cremação em ustrinum, com a recolecção cuidada
dos restos cremados. A área de ustrinum não foi claramente identificada, contudo, uma
estrutura de planta rectangular, que integrava um menir e se sobrepunha a uma ampla
área com um denso estrato de terras muito negras e compactas, localizada na mar-
gem sul da necrópole, poderia ter desempenhado essa função. Na margem sudeste da
necrópole registou‑se a presença de uma extensa área de terras muito negras, argilosas
e compactas, que sobrepunham pequenos covachos, nos quais estavam amortizados
alguns elementos de adorno, associados a possíveis ossos humanos de dimensões mili-
métricas. Todavia, a sua dimensão, completamente distinta das registadas em todas
as cremações documentadas, leva a que tenhamos que considerar esta área não como
um espaço de enterramento, ao menos em grande parte do seu uso, mas sim como
a área de amortização de terras provenientes da limpeza do ustrinum, ou mesmo o
próprio. É provável que o espaço de ustrinum possa ter variado ao longo da formação
da necrópole, como a presença do enterramento da urna [306] indicía.
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 195

Os enterramentos são principalmente em urna, posteriormente depositada num


pequeno covacho, sendo com frequência estruturada por blocos pétreos, que a envol-
viam, sobrepondo, por vezes, o espólio funerário. Em diversos casos era claro que
parte das cinzas e dos restos cremados se depositavam no exterior da urna, dentro
do covacho onde aquela era depositada. Em diversas situações registou‑se a presença
de várias urnas agrupadas, ainda que a norma seja estarem isoladas, em covacho
único, ainda que disseminadas em redor, ou dentro, das várias estruturas tumulares
de planta quadrangular, que parecem coordenar a distribuição das mesmas. Cremos
que será ainda de mencionar a deposição de uma urna dentro de uma das duas cistas
identificadas, estando a outra completamente vazia. Os enterramentos apresentam
uma clara concentração numa zona relativamente central do cairn, entre duas das
estruturas tumulares rectangulares identificadas sob aquele.
No total foram registadas 39 deposições possivelmente funerárias, das quais ape-
nas uma parte foi confirmada, tendo em conta que dos 12 enterramentos registados
antes da nossa intervenção, a maior parte deveria corresponder apenas a pequenas
ocorrências de ossos humanos. Antes da nossa intervenção publicaram‑se três possí-
veis enterramentos (Rocha, 2003: 124), dos quais assumimos com segurança dois.
Deste modo, não é ainda possível assegurar um número exacto de enterramentos na
área escavada da necrópole, devendo situar‑se entre as três e quatro dezenas.
As urnas são, em geral, recipientes de média dimensão, de bordo exvertido, com
colo curto, produzidas a torno (Fig. 9). Alguns dos exemplares apresentam‑se em
cerâmica cinzenta, seguindo morfologias conhecidas em outros contextos funerários
do sudoeste peninsular, como Medellín (Lorrio, 2008) ou Torre de Palma (Langley
et al., 2007).
Todos os enterramentos documentados eram secundários, com cremação dos
corpos e a deposição dos restos em urnas2. A recuperação dos restos cremados na
pira para subsequente alocação em urna era algo variada, sendo que em alguns casos,
apenas uma fração do esqueleto foi depositada, enquanto em outros, quase todos os
elementos ósseos cremados foram recolhidos. Não é hoje possível determinar se esta
situação resulta de um comportamento aleatório ou de uma prática deliberada. No
que diz respeito a qualquer inclusão preferencial de partes esqueléticas específicas nas
urnas, as tendências principais registadas referem‑se à sub‑representação do tronco e
à sobre‑representação dos membros superiores. Não foi documentado um qualquer
padrão claro que revelasse uma prática funerária específica e bastante homogénea na

2
A David Gonçalves se deve a coordenação dos trabalhos de Antropologia Física, cujos resultados foram parcial-
mente apresentados recentemente (Gonçalves et al., 2015), e no qual nos baseamos.
196 Rui Mataloto

0 5cm

Fig. 9. Urnas, unguentários, incensário, cálice e taças de cobertura da Necrópole da Tera. Em baixo, urnas
in situ.
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 197

deposição dos restos ósseos. Em alguns casos as oferendas fúnebres foram colocadas
cuidadosamente sobre os restos ósseos, procedendo‑se em seguida à deposição das
urnas em pequenos covachos no solo, cobertas por outros recipientes, muitas vezes
estruturadas com pedras. Por vezes as cinzas e alguns restos cremados eram colocados
em redor das urnas, juntamente com unguentários.
As baixas taxas de identificação tornam a avaliação da representação esquelética
muito difícil. Nenhuma prática clara de discriminação de idade foi registada na
necrópole da Tera. Quanto à composição sexual da necrópole, embora este parâme-
tro não tenha sido alcançado com sucesso para a maioria dos restos, existem algumas
indicações de que ambos os sexos estavam realmente presentes –um enterramento
feminino em [217] e provável em [278] e masculinos prováveis ​​nas urnas [128],
[216] e [300]. Além disso, atestou‑se na urna [290] a presença de uma criança.
O espólio que acompanha as deposições raras vezes é extenso (Fig. 10), sendo com-
posto em vários casos apenas por pratos, que sobrepunham a urna, e pequenos recipien-
tes, do tipo unguentário, por vezes bicónicos, depositados junto da mesma. Dentro da
urna [278] foram documentados dois unguentários em cerâmica, acompanhados por
dois anéis em prata. Estes unguentários eram de tipo alabastron que se asemelham, tal
como o documentado na necrópole de Medellín (Lorrio, 2008: 712), aos conhecidos em
alabastro distribuídos no âmbito do comércio fenício. O exemplar da necrópole extre-
menha parece enquadrar‑se algures pelos finais do séc. VII a.C. (Lorrio, 2008: 712).
Na urna [278], correspondente a um enterramento feminino, foram recolhidos
dois anéis em prata, um com aro simples, e outro ornado com engaste central, per-
dido, apoiado em quatro pequenas volutas. Este anel apresenta algumas semelhanças
com um exemplar identificado na designada necrópole da Favela Nova, em Ourique,
enquadrado entre meados do séc. VI a.C. e meados do seguinte (Dias e Coelho, 1983:
204). Também em prata foi recolhido um pendente em “bolota estilizada” com canevão
em “T”, bastante deteriorado, oco, com uma espessura de parede ínfima. Estas peças
encontram‑se bem atestadas nas diversas necrópoles da envolvente de Beja, usualmente
associadas a enterramentos também femininos, como Palhais (Santos et al., 2009: 763),
Vinha das Caliças (Arruda et al., 2017) ou Estácio 6 (Pereiro et al., 2017) onde surgem
em número mais alargado. Recentemente foi registado um importante conjunto destes
pendentes, aqui designado de “colgante piriforme”, na sepultura 27 de La Angorrilla
(Bandera e Ferrer, 2014: 441), na qual se documentaram 26 ou 27 exemplares, também
em prata, assinalando‑se como são bem conhecidos no Mediterrâneo Central (Bandera
e Ferrer, 2014: 442), mas igualmente em território peninsular, onde se incluem, em
ouro, nalgumas das sepulturas mais emblemáticas de finais do séc. VII a.C. (Almagro
Gorbea, 2008: 378; Nicolini, 1990: 555), caso da sepultura 9 de La Joya, em Huelva
(Prados, 2010‑11: 298). Atendendo aos dados disponíveis para os contextos sepulcrais
198 Rui Mataloto

alentejanos, cremos que estes elementos em prata parecem disseminar‑se, essencial-


mente, durante o século seguinte, estando ausentes em contextos considerados mais
antigos, seguindo os estudos de La Angorrilla, que lhe atribuem uma cronologia entre
finais do séc. VII e meados do séc. VI a.C. (Bandera e Ferrer, 2014: 442).

1 2

4 5 6

7 8 9

12
0 5cm
10 11

Fig. 10. Conjunto de espólio funerário cerâmico, em bronze, prata e vidro da necrópole da Tera.
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 199

No interior das urnas foi possível registar também fíbulas do tipo Alcores, nomea-
damente nas urnas [216], com duas, e [300], com uma, aparentemente ambas asso-
ciadas a indivíduos masculinos, na esteira, aliás, do que temos vindo a verificar em
outras áreas do sul peninsular (Figueiredo e Mataloto, 2017: 387; Ferrer e Bandera,
2014: 398), as quais são usualmente integradas entre finais do séc. VII a.C. e o séc.
VI a.C. (Figueiredo e Mataloto, 2017: 391; Bandera e Ferrer, 2014: 398). Os ador-
nos documentados contam ainda com raras contas de colar e um pequeno bracelete
“acorazonado”, recolhido na urna [217], que continha certamente os restos demais
que um indivíduo, sendo um deles feminino. As armas, nomeadamente uma ponta
de lança, de tipo indeterminado e o seu conto, apenas surgem documentadas junto
da urna [312], estando depositadas ao lado da mesma, conjuntamente com um fecho
de cinturão de placa romboidal de 3 garfos (DIII3/DIII5 de Cerdeño). Para além
deste registou‑se a presença de outro fecho de cinturão de placa romboidal, mas de
um só garfo, do tipo CII ou CIII de Cerdeño, a que devíamos acrescer parte de dois
outros, de tipo indeterminado, mas que deverão integrar‑se nos já documentados
presentes. Estes elementos de cinturão assinalam, claramente, tal como as fíbulas,
a introdução e uso de nova indumentária durante os séculos VI e V a.C. na região,
deixando bem patente a sua integração em redes mais amplas de distribuição de bens
de grande circulação, mas igualmente de modelos identitários e culturais traduzidos
na ostentação dos mesmos.
Igualmente de clara origem forânea sobressai a presença de um ânforisco em
vidro polícromo, do Grupo Mediterrâneo I, forma 2 de Harden (1981), com uma
cronologia centradas em torno dos finais do séc. VI e o século seguinte. A presença
de unguentários junto dos mortos, tanto este em vidro como os registados na urna
[278], poderá estar relacionada com a existência de rituais de lavagem e unção com
perfumes do féretro, prévios à sua cremação, que visavam mediar a sua entrada no
mundo dos mortos, desempenhando igualmente um papel relevante na menorização
de odores durante o alargado período em que o processo se desenvolveria (Delgado
e Ferrer, 2012: 131).
A presença usual de vestígios de fauna carbonizados junto dos restos humanos
cremados e depositados no interior de urnas, nomeadamente de ovis/capra (Gonçal-
ves, et al., 2015: 84) pode indiciar não apenas a oferenda de bens cárneos aos defun-
tos, como também a celebração de banquetes e libações durante o ritual funerário,
acto relativamente comum nas comunidades mediterrâneas (Delgado e Ferrer, 2012:
148), mas que poderá ter antecedentes regionais desde a Idade do Bronze (Porfírio
e Serra, 2010).
A identificação de um incensário, [64], e de vários cálices dissociados das depo-
sições funerárias, parece apontar para uma utilização ritual da área sepulcral para
200 Rui Mataloto

além do acto fúnebre em si, e eventualmente à margem ou em paralelo a estes, cons-


tituindo‑se como um espaço de veneração dos antepassados, onde se encenariam
homenagens e libações, enquadradas pela presença dos antepassados transfigurada
nos monólitos erguidos.
A veneração dos antepassados e a construção de memória é, obviamente, indis-
sociável dos espaços sepulcrais; todavia, na necrópole da Tera este factor assume
um cariz único, desde logo pela sua própria arquitectura megalítica, atendendo à
presença dos citados menires e do próprio túmulo pétreo, mas igualmente pela sua
integração numa paisagem funerária pré‑histórica, atendendo à presença de vários
monumentos megalíticos nas imediações. A construção de uma paisagem funerária
com um fortíssimo cariz identitário, solidamente enraizado nas edificações pré‑his-
tóricas, pode ser facilmente entendida como um acto de legitimação e coesão de um
grupo rural e da sua posse da terra, num momento de grande pressão demográfica.
A necrópole da Tera constituiu‑se como um elemento fulcral na construção
da identidade do grupo que aí se fez sepultar. O seu cariz tumular, agregador de
diversas estruturas de menor dimensão num todo único, parece assinalar que em
dado momento houve a necessidade de reforçar o sentido comunitário em torno
dos antepassados. Efectivamente, a necrópole parece estruturar‑se inicialmente em
torno de pequenas estruturas funerárias de planta quadrangular, de origem familiar,
em torno das quais se implantarão alguns, escassos, enterramentos. Apenas no caso
da estrutura tumular situada mais a nascente, 2, foi possível obter dados antro-
pológicos fiáveis, que nos permitem vislumbrar quem eram os sepultados. Assim,
sabemos hoje que a amálgama composta pelas urnas [278], [281], [290], [291]
e [300] deveria corresponder a um pequeno grupo familiar restrito, atendendo à
identificação de um adulto feminino, [278], uma criança, [290], um adulto mas-
culino, [291] e um adulto masculino jovem, [300]. A inexistência de cortes ou
destruição, apesar do alinhamento e justaposição das urnas, deixa entender que
mediou escasso tempo entre o seu sepultamento. Situação similar pode ter ocorrido
em dois outros casos, onde uma única vala agregava cinco enterramentos cada. No
caso mais próximo ao anterior, composto pelas urnas [216][217][245][246][255],
é interessante assinalar que as duas primeiras urnas, que se encontravam justapos-
tas, apresentavam ossos duplicados, sendo claro que [217] apresenta mais que um
indivíduo, sendo um deles feminino, enquanto [216], que apresenta duas fíbu-
las Alcores, corresponde a um adulto masculino. Em ambos existem vestígios de
fauna, eventualmente correspondente a oferendas cárneas. Deste modo, é plausível
que estejamos, uma vez mais, perante um grupo familiar falecido em simultâneo,
podendo a duplicação das presenças ósseas na duas urnas assinaladas derivar, justa-
mente, da cremação conjunto.
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 201

Perante estes dados emerge um panorama familiar restrito, que partilha um


sentido comunitário muito forte, dentro de um quadro de relativa isonomia, o que
não impede a diferenciação, como o deixa entender a presença de elementos em
prata unicamente no agregado familiar sepultado na estrutura tumular 2, acima
descrito ([278], [281], [290], [291] [300]), mas que não apresenta, por si, indícios
claros de destaque social e capacidade de coordenação supra familiar. Todavia, é
certo que a necrópole se parece estruturar essencialmente entre as duas estrutu-
ras tumulares identificadas, em torno das quais se dispersam os enterramentos
isolados, ou mesmo os gregários não estruturados. Se, por um lado, a ligação aos
antepassados e a necessidade de legitimação da posse da terra através da incorpora-
ção no novo discurso paisagístico‑identitário dos velhos monumentos megalíticos
nos parece reportar à formação de uma “Sociedade de Casa”, por outro, o modo
multipolar de índole familiar da necrópole, a sua escassa longevidade, a relativa
isonomia e a ausência de indícios claros de sucessão bilateral cognática, patente
em enterramentos femininos destacados no seio familiar, deixa escassa margem,
parecendo‑nos estarmos perante uma pequena comunidade unida por laços de
parentesco, tendo a família restrita como célula‑base, que partilha um mesmo ter-
ritório, com o qual se identificam através de uma estratégia comum de valorização
da paisagem e monumentos antigos.

4. “EU DEVO O MEU CORPO À TERRA”3: O CAMPO ENTRE OS SÉCS.


VI‑V A.C.

As dinâmicas da natureza impõem às comunidades rurais modos de vida e con-


vivência monótonos, sequenciais e constantes. A agricultura e a pecuária agarram
as pessoas à terra, fixando‑lhes ritmos e padroniza‑lhes vivências, em especial num
momento, o que aqui tratamos (séc. VI‑V a.C.), onde as inovações eram recentes,
como o cultivo das vinhas e das oliveiras, e a submissão aos caprichos da natureza,
total. Esta condição deve fazer‑nos sempre lembrar da fragilidade e dependência
de qualquer comunidade rural, que terá sempre exposta à mais pequena oscilação
dos ritmos, que poderão provocar a desestruturação da produção, mas igualmente
do grupo humano que se lhe encontra agregado. Deste modo, é com alguma
naturalidade que vemos a dificuldade com que a “Sociedade de Casa” emerge
neste território, sendo por outro lado a causa da sua própria existência, como

3
Popular alentejano: Eu devo o meu corpo à terra/ a terra m’o está devendo/ que terra m’o pague em vida/ que pago
à terra em morrendo.
202 Rui Mataloto

parece estar em vias de suceder no Espinhaço de Cão. Efectivamente, perante os


dados apresentados vemos que a inconstância das ocupações rurais, que poucas
vezes se prolongam mais de uma centena de anos dificilmente, nos territórios
que estudámos, teriam tempo e margem produtiva excedentária para desenvol-
ver estruturas sociais mais complexas, resultantes de um processo de acumulação
e controlo prolongado. Deste modo, e mesmo aceitando um crescimento efec-
tivo da população rural instalada no território centro alentejano, quer por cresci-
mento demográfico, quer por processos de ocupação decorrentes da reinstalação
de populações litoriais, não cremos que se tenha desenvolvido um modelo único
de entrosamento comunitário, sendo perfeitamente aceitável, em nosso enten-
der, a convivência de múltiplas soluções dispersas pelo território, por vezes em
áreas contiguas. Enquanto em determinadas áreas, como no vale descendente do
Guadiana é possível que se tenha desenvolvido um esquema de ocupação hete-
rárquico, assente em diversos grandes núcleos rurais, caso do espinhaço de Cão,
Casa da Moinhola, Malhada das Taliscas 4, Gato, Monte do Roncão 11 ou Monte
do Roncanito 4, que por sua vez poderiam ter desenvolvido, ou não, uma Casa,
à qual estivessem agregadas, do ponto de vista produtivo e ideológico, pequenas
células rurais estabelecidas na envolvente. Noutras, caso da região da Herdade
da Sapatoa ou da Tera, poder‑se‑ia ter desenvolvidos esquemas sociais assentes
no parentesco, numa base essencialmente igualitária. É igualmente plausível que
nas regiões de solos mais férteis se possam ter desenvolvidos esquemas sociais e
produtivos ainda mais complexos e hierarquizados, não enquadráveis nos casos
mencionados, como pode ser o caso do Cabeço Redondo (Monge Soares, 2012),
na região de Moura, muito mais afim da realidade do Guadiana médio (Rodríguez
Díaz, 2009), com verdadeiros “senhores do campo”. Deste modo, acreditamos que
o campo, na sua fragilidade, diversidade e dependência dificilmente se agregará
apenas num modelo social único durante este período, nunca criando condições
que permitissem romper por completo com a sujeição à natureza, que acabaria por
ditar a necessidade de novas formas de entrosamento, a partir dos finais do séc.
V a.C. Efectivamente, cremos que o desde finais do séc. VI a.C. a tendência de
crescimento e expansão da ocupação rural diminui, começando, desde logo, pelo
abandono das regiões menos fertéis, como se pode ver pelo abandono da área da
Herdade da Sapatoa, mas igualmente através do abandono de muitos outros no
vale do Guadiana, como o próprio Espinhaço de Cão, cuja dimensão dificilmente
lidaria com uma sucessão de maus anos agrícolas ou, pior, uma qualquer crise
demográfica interna. Todavia, aqueles que conseguem manter‑se, ou ocupar de
raiz novas terras, caso do Monte do Roncão 11 ou Malhada das Taliscas 4, respec-
tivamente, o séc. V a.C. parece constituir ainda um momento de alguma dinâmica
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 203

0 5cm

Pintura Vermelha

Fig. 11. Espólio funerário recolhido na necrópole da Herdade das Casas (séc. IV) (Redondo).
204 Rui Mataloto

produtiva e social, notada quer através dos consumos sumptuários, caso das cerâ-
micas gregas e dos unguentários de óleos perfumados, quer através da construção
ou manutenção de complexos habitacionais de evidente cariz mediterrâneo, por
vezes com claro sentido e planeamento ideológico, como na Malhada das Taliscas,
que nos pode indiciar a introdução de novas formas de estar e ocupar o território,
originárias de outras regiões. Contudo, estas começam a ter que partilhar o espaço
com as primeiras aglomerações humanas de cariz mais aldeão que urbano, as quais
começam lentamente a emergir, provavelmente a partir de movimentos de sine-
cismo, provocado pelo abandono de pequenos núcleos rurais. Os dados disponí-
veis são particularmente escassos, conhecendo‑se apenas pontualmente ocupações
nas quais se registou a presença de cerâmica ática do séc. V a.C., mas das quais
desconhecemos tudo, como acontece com a ocupação do Alto Castelinho da Serra
(Montemor‑o‑Novo), onde se detectou a presença de taças “Cástulo” (Gibson
et al., 1998). A escassez de dados sobre a natureza da ocupação, nomeadamente
fundacional, e o conhecimento que temos sobre a modéstia estrutural que alguns
destes povoados apresentaram numa fase inicial, como ficou patente em Mesas do
Castelinho (Estrela, 2010), não autoriza a formulação de grandes considerandos
sobre a estrutura social que se lhe encontrava subjacente, mas que vemos mais
como gregária comunal, de relativa isonomia, do que o resultado da agregação de
uma comunidade em torno de um grande senhor. Este movimento gregário, em
instalações com claro sentido defensivo, patente nos modelos de instalação com
evidentes defesas naturais, parece acelerar‑se nos finais do séc. V a.C., num ver-
dadeiro movimento de encastelamento, que acabará por acometer a esmagadora
maioria do povoamento rural em meados do século seguinte.
O campo, esvaziado todavia da densidade de demográfica anterior, continuará a
ser ocupado, agora de modo mais esparso, acolhendo, mesmo assim, uma enorme
diversidade social patente nas pequenas necrópoles rurais, onde emergem importan-
tes panóplias guerreiras, como acontece na Herdade das Casas (Fig. 11) (Mataloto, et
al., 2014: 23). Na realidade, o modo progressivo como as armas parecem vir a surgir
nos espólios funerários, estando quase ausentes, como se viu, em necrópoles como a
Tera, parece traduzir justamente este processo lento, mas inexorável, de complexifi-
cação social e emergência dos “senhores da terra”, que culminará na amortização de
verdadeiras panóplias guerreiras durante a segunda metade do milénio, ao invés das
monótonas séries de lanças longas e contos que parecem dominar durante o segundo
quartel do Iº milénio a.C. (Figueiredo e Mataloto, 2017). Assim, o campo perma-
necerá como um elemento relevante na estruturação das comunidades da segunda
metade do milénio, após o generalizado abandono em torno aos finais do séc. V e
inícios do séc. IV a.C.
All in the family…: Comunidades rurais no território centro alentejano... 205

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